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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM GOIÁS


3° OFÍCIO DO NÚCLEO DA TUTELA COLETIVA

EXMO( A). SENHOR( A) JUIZ(ÍZA) FEDERAL DA ___ª VARA DA


SEÇÃO JUDICIÁRI A DO ESTADO DE GOIÁS

Procedimento preparatório n° 1.18.000.003307/2016-48

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDER AL , pelo Procurador da


República que esta subscreve, no uso de suas atribuições constitucionais e
legais, com fundamento nos artigos 127 e 129, II e III, da Constituição
Federal, com fulcro nas informações reunidas no procedimento preparatório
em epígrafe, vem, à presença de V. Exa., propor

AÇÃO CIVIL PÚBLIC A

COM PEDIDO DE AN TECIPAÇÃO LIMINAR DE TUTELA DE EVIDÊNCI A

em face de:

UNIÃO FEDER AL, pessoa jurídica de direito público interno, que


deve ser citada na pessoa do seu representante judicial, o Procurador-Chefe
da União em Goiás, com endereço na Rua 10, esquina com Rua 9, Qd. F-7,
Lts. 62/82, Setor Oeste, Goiânia-GO, CEP 74.120-020; e

MUNICÍPIO DE GOIÂNI A , pessoa jurídica de direito público


interno, que deve ser citado na pessoa do seu representante judicial, o(a)
Prefeito(a) do Município, com endereço na Avenida do Cerrado, n° 999, Park
Lozandes, CEP: 74.884-092 – Goiânia/GO , pelos fatos e fundamentos a
seguir expostos.
A v. O l i n d a , Q u a d r a G , L o t e 2 , S e t o r P a r k L o z a n d e s , C E P 7 4 8 8 4 - 1 2 0 , G o i â n i a – G O .
F o n e : ( 6 2 ) 3 2 4 3 - 5 4 0 0 – h o m e p a g e : h t t p : / / w w w. p r g o . m p f . m p . b r
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1 – INTROITO

Esta ação civil pública tem suporte nos elementos acostados ao


procedimento preparatório (PP) nº 1.18.000.003307/2016-48 (em anexo),
instaurado, nesta Procuradoria da República, para apuração das falhas na
prestação de serviço de hemodiálise aos pacientes da rede pública de saúde do
Município de Goiânia/GO, cujos recursos para custeio são repassados pelo
Fundo Nacional de Saúde (FNS) ao Fundo Municipal de Saúde do Município de
Goiânia/GO.

Com efeito, esta demanda tem por objetivo lograr provimento


judicial que assegure o tratamento de hemodiálise aos pacientes SUS no
Município de Goiânia, que dependem do procedimento para a manutenção da
vida e recuperação da saúde .

2 – COMPETÊNCI A DA JUSTI ÇA FEDER AL

Os fatos que deram ensejo à presente ação encontram-se, sem


sombra de dúvidas, no âmbito de competência da Justiça Federal , porque
envolvem interesses caros à União , haja vista a ofensa ao direito fundamental
à saúde, bem como a dispensação de recursos federais direcionados ao
tratamento em comento, mas, por algum motivo, não utilizados para a
finalidade predita.

A competência da Justiça Federal, na hipótese de ações cíveis, é


estabelecida ratione personae ; isto é, na condição de autora, ré, assistente ou
oponente, devem estar a União, entidade autárquica ou empresa pública
federal submetidas à jurisdição federal, ao teor do artigo 109, I, da
Constituição da República.

Como se não fosse o suficiente, nada obstante o Ministério Público


Federal seja instituição autônoma, porquanto não é dotado de personalidade
jurídica própria, tem-se reconhecido que se situa na estrutura federativa como
órgão da União. Destarte, a sua presença na ação, seja como autor, seja como
assistente ou oponente, fixa a competência da Justiça Federal.

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Procedimento preparatório n°: 1.18.000.003307/2016-48
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Nessa direção, a 4ª Turma do STJ deu provimento ao Recurso


Especial nº 1.283.737/DF, assentando que o fato de o MPF figurar como autor
de ação civil pública é suficiente para atrair a competência da Justiça Federal
para o processo 1 .

Em suma, basta a presença do Ministério Público Federal no


polo ativo para afirmar a competência da Justiça Federal .

3 – LEGITI MIDADE ATI VA

Mirando a efetiva proteção dos direitos assegurados ao cidadão, a


Constituição Federal, artigo 127, estabelece que o Ministério Público é
instituição permanente, essencial à função jur isdicional do Estado, incumbindo-
lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses
sociais e individuais indisponíveis .

Dispõe, ainda, a Carta Magna, artigo 129, incisos II e III, que são
funções institucionais do Ministério Público: a) zelar pelo efetivo respeito dos
Poderes Públicos e dos ser viços de relevância pública aos direitos
assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua
garantia; e b) promover o procedimento preparatório e a ação civil pública,
para a proteção do patrimônio público e social , do meio ambiente e de outros
direitos difusos e coletivos . Nessa previsão, inclui-se o dever-poder de zelar
para que sejam observadas as normas constitucionais pertinentes à
Administração Pública.

Por sua vez, prescreve a Lei Complementar federal nº 75/93, artigo


6º, incisos VII, alíneas “a” e “d”, que dispõe sobre a organização, as

1
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DISSÍDIO NOTÓRIO. 1. Os arts. 8º, inciso III e artigo 26, § 3º
d a L e i n . 6 . 3 8 5 / 1 9 7 6 , a r t s . 1 0 , I X e 11 , V I I , d a L e i n . 4 . 5 9 5 / 1 9 6 4 ; e a r t i g o 8 1 , p a r á g r a f o ú n i c o , i n c i s o I ,
da Lei 8.078/1990, tidos por violados, não possuem aptidão suficiente par a infirmar o fundamento
central do acórdão recorrido - a competência para apreciação da ação civil pública ajuizada pelo
M i n i s t é r i o P ú b l i c o F e d e r a l - , o q u e a t r a i a i n c i d ê n c i a a n a l ó g i c a d a S ú m u l a 2 8 4 d o S T F, d o s e g u i n t e
teor: É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir
a exata compreensão da controvérsia. 2. A ação civil pública, como as dem ais, submete-se, quanto à
competência, à regra estabelecida no artigo 109, I, da Constituição, segundo a qual cabe aos juízes
federais processar e julgar "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal
forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as
d e a c i d e n t e d e t r a b a l h o e a s s u j e i t a s à J u s t i ç a E l e i t o r a l e à J u s t i ç a d o Tr a b a l h o " . A s s i m , f i g u r a n d o
como autor da ação o Ministério Público Federal, que é órgão da União, a competência para a causa é
da Justiça Federal. 3. Recurso especial parcialmente conhecido e nesta parte provido para determinar
o prosseguimento do julgamento da presente ação civil pública na Justiça Federal. (STJ. Quarta
Tu r m a . R E s p . n º 1 . 2 8 3 . 7 3 7 / D F. R e l . L u í s F e l i p e S a l o m ã o . J . 2 2 . 1 0 . 2 0 1 3 )
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atribuições e o estatuto do Ministério Público da União, que compete a essa


instituição promover o procedimento preparatório e a ação ci vil pública
para a defesa : a) dos direitos constitucionais ; b) e de outros interesses
individuais indisponíveis , homogêneos, sociais, difusos e coletivos.

Portanto, é insofismável a legitimidade ad causam do Ministério


Público Federal para manejar esta ação civil pública, voltada para a
concretização do direito fundamental à saúde dos usuários do Sistema Único
de Saúde 2 .

4 – LEGITI MIDADE PASSIVA

A conjugação dos dispositivos da Constituição Federal e da


legislação infraconstitucional fixam, de modo harmônico, entre as competências
estatais da União, Estados/Distrito Federal e Municípios, o dever de garantir a
efetivação do direito à saúde .

Notadamente sobre a Política Nacional de Atenção ao Portador de


Doença Renal , a legislação impõe que a União atue de forma articulada, junto
aos Munisípios, a fim de garantir a uni versalidade , a equidade, a
integralidade , o controle social e o acesso às diferentes modalidades de
Terapia Renal Substituti va (diálise peritoneal , hemodiálise e transplante) 3 .

A União, pelo do Fundo Nacional de Saúde (FNS) - unidade


administrativa integrante da estrutura regimental do Ministério da Saúde - é
responsável pelas transferências de recursos fundo a fundo, inclusive quanto
aos serviços de média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar dos
Municípios, que inclui os recursos direcionados ao tratamento de hemodiálise.

Ainda, conforme a portaria do Ministério da Saúde n° 2617/2013, a


União preceitua o prazo “ de até o 5º dia útil, após o Ministério da Saúde
creditar na conta bancária do Fundo Estadual/Distrito Federal/ Municipal de
Saúde, para que os gestores efetuem o pagamento dos incentivos financeiros
2
A D M I N I S T R AT I V O . P R O C E S S O C I V I L . A Ç Ã O C I V I L P Ú B L I C A . F O R N E C I M E N T O D E M E D I C A M E N T O .
G A R A N T I A C O N S T I T U C I O N A L . L E G I T I M I D A D E D O M P F. P o s s u i l e g i t i m i d a d e a t i v a o M i n i s t é r i o P ú b l i c o
Federal em se tratando de ação civil pública que objetiva a proteção de interesses difusos (direito à
saúde, assegurado constitucionalmente) e a defesa de direitos individuais homogêneos
(obtenção de medicamento gratuito ). (9257 PR 2009.70.00.009257-0, Relator: JORGE ANTONIO
MAURIQUE, Data de Julgamento: 02/08/2010, Data de Publicação: D.E. 13/08/2010) (grifei)
3
P o r t a r i a d o M i n i s t é r i o d a S a ú d e n ° 11 6 8 / 2 0 0 4 .
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aos estabelecimentos de saúde que prestam assistência de forma


complementar ao SUS”. Todavia, conforme se exporá, não há qualquer
fiscalização da União referente ao cumprimento do prazo estabelecido.

O Município de Goiânia, enquanto gestor local SUS, é responsável


pelo pagamento dos incentivos financeiros aos estabelecimentos de saúde que
prestam assistência de forma complementar ao SUS. No entanto, embora
receba recursos do FNS (fundo a fundo), não os transfere às clínicas de
hemodiálise no prazo previsto pela Portaria supramencionada, frustando a
continuidade dos tratamentos dos usuár ios SUS.

5 – MÉRI TO

5.1 – FUNDAMENTOS DE FATO

Instaurou-se nesta Procuradoria da República o procedimento


preparatório n° 1.18.000.003307/2016-48, haja vista notícia extraída do sítio
G1 – Goiás 4 , relatando que nove clínicas particulares de hemodiálise do
Município de Goiânia, conveniadas ao SUS e responsáveis pelo atendimento
de 90% dos doentes renais crônicos, suspenderam o atendimento a novos
pacientes da rede pública por não estarem recebendo pelo serviço prestado.
Anuncia, ainda, que novos diagnósticos serão atendidos apenas pelos três
hospitais públicos que realizam serviço de hemodiálise, quais sejam, Santa
Casa de Misericórdia de Goiânia, HC/UFG e HGG. Retratando, por fim, que há
falta de materiais que podem comprometer o tratamento inclusive dos pacientes
já cadastrados na SMS de Goiânia, bem como que, segundo a Sociedade
Brasileira de Nefrologia, os repasses estão sendo feito com atraso desde
outubro/2015.

Instado a se manifestar, o Município de Goiânia alega que,


conforme os contratos firmados com os estabelecimentos prestadores
(clínicas), possui o prazo de até 90 (noventa) dias – após cada mês de serviço
prestado - para realizar o pagamento, sem que o serviço seja interrompido (fls.
14 e 48 do PP anexo).

4
Disponível em: <http://g1.globo.com/goias/bom-dia-go/videos/t/edicoes/v/clinicas-suspendem-hemodialise-para-
novos-pacientes-do-sus-em-goiania/5334257/>
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Por outro lado, as clínicas manifestaram-se, no dia 7/10/2016,


informando que o Município atrasa os pagamento há mais de um ano e que há,
inclusive, prestações remanescentes referente ao ano de 2015. Ponderam o
risco real do fechamento das clínicas; e que não estão recebendo novos
pacientes. Por fim, salientaram o descumprimento da Portaria do Ministério da
Saúde n° 2617/2013, que prevê o prazo de até o 5º (quinto) dia útil, após o
Ministério da Saúde creditar na conta bancária do Fundo Federal/Municipal de
Saúde, para que os gestores locais efetuem o pagamento aos estabelecimentos
(fls. 51/54 do PP anexo) .

O Ministério da Saúde acostou aos autos documentos que


comprovam o repasse ao Município de Goiânia, das verbas que atendem à
nefrologia, quanto ao tratamento para hemodiálise (fls. 125/134 do PP anexo),
dados que também podem ser observados no sítio eletrônico
www.fns.saude.gov.br.

Em outro momento, no dia 10/11/2016, a Divisão de Convênio e


Gestão do Ministério da Saúde afirmou a possibilidade de suspensão dos
repasses ao Município se o pagamento aos estabelecimentos não for realizado
no prazo definido na portaria ministerial (fls. 113/115 do PP anexo).

Vale salientar as cláusulas dos contratos firmados entre o


Município e as clínicas: a) de fato, o parágrafo sexto do contrato prevê: “ o
contratado ficará exonerado de responsabilidade pelo não atendimento de
usuários do SUS, na hipótese de vir a ocorrer atraso superior a 90 (noventa)
dias nos pagamentos devidos pela contratante [...] ”; b) sem embargo, a
cláusula quarta estabelece “ a contratante deverá deverá efetuar o pagamento
ao contratado até o 5° (quinto) dia útil do mês subsequente ao da prestação
dos serviços das faturas apresentadas pelo prestador [...] ” (fls. 12/29 do PP
anexo).

Veja-se que a regra de pagamento é prevista na cláusula quarta


(quinto dia útil), sendo o parágrafo sexto situação excepcional que possa
ocorrer, o que não representa a regra habitual de pagamento. De qualquer
modo, os contratos firmados pelo Município devem obedecer às

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regulamentações da União, neste caso, especialmente o artigo 1° da Portaria


do Ministério da Saúde n° 2617/2013:

Art. 1º - Fica estabelecido o prazo de até o 5º dia útil, após o Ministério da


Saúde creditar na conta bancária do Fundo Estadual/Distrito Federal/Municipal
de Saúde, para que os gestores ef e t u em o pagamento dos incentivos
f in a n c e i r o s a o s e s t a b e l e c im e n t o s d e s a ú d e q u e p r e s t a m a s s i s t ê n c i a d e f o rm a
complementar ao SUS.

Portanto, torna-se ilegítima e inaceitável a conduta do Município


de utilizar, como regra, o prazo de até 90 (noventa) dias para realizar o
pagamento; afrontando a portaria ministerial e o próprio contrato firmado.

Vale lembrar que o ser viço executado pelas clínicas é


imprescindí vel e de alta relevância ; sendo o prazo previsto no parágrafo
sexto de uso excepcional; ainda mais que há repasse mensal do FNS/MS, não
inviabilizando, em tese, o pagamento às clínicas.

Deveras, a inadimplência corriqueira traz efeitos nocivos ao


usuários SUS do serviço, bem como às clínicas, que detêm despesas mensais e
carga tributária inadiáveis, o que acarreta risco à continuidade das atividades.

Destarte, face à gravidade da situação acima delineada, tendo em


vista a especial e vital necessidade de pacientes de hemodiálise em tratamento
no SUS, não subsiste outra providência eficaz inserta nas atribuições deste
órgão ministerial, a não ser ajuizar esta ação civil pública, a fim de lograr a
tutela jurisdicional pertinente.

5.2 – FUNDAMENTOS DE DIREITO MATERI AL

5.2.1 – Direito à Saúde

No direito constitucional brasileiro, notadamente a partir da


Constituição Federal de 1988, pode-se asseverar, sem receio de equívoco, que
a saúde é um direito fundamental .

Com efeito, além de se encontrar expressamente incluída no rol de


direitos sociais insculpidos na Constituição Federal, artigo 6º, a saúde é
definida como “ direito de todos e dever do Estado ”, a ser garantido mediante a
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adoção de políticas públicas voltadas para a redução do risco de doença e


de outros agravos e para o acesso uni versal e igualitário às ações e
ser viços para sua promoção, proteção e recuperação , à luz da Carta Magna,
artigo 196.

Nessa perspectiva, coerente com as normas constitucionais,


assenta a doutrina preponderante que o direito à saúde , tal como assegurado
na Constituição Federal, quadra-se na categoria de direito fundamental de
segunda dimensão (geração) , que consubstancia os direitos sociais, culturais
e econômicos, caracterizados por exigirem prestações positivas do Estado para
a sua consecução. Não se trata, aqui, à semelhança dos direitos de primeira
dimensão (geração), de apenas impedir a intervenção do estatal em desfavor
das liberdades individuais, mas de reclamar do Estado a execução do que lhe
é cominado.

Cumpre lembrar, ainda, que se qualificam de relevância pública as


ações e os serviços de saúde , segundo Constituição Federal, artigo 197.
Evidencia-se, com efeito, o propósito de realçar, indelevelmente, o caráter de
essencialidade do direito fundamental à saúde na nova ordem constitucional,
independentemente de ser prestado diretamente pelo Estado ou por entes
privados.

O principal consectário do enquadramento de uma norma na


categoria dos direitos fundamentais é o reconhecimento da sua supremacia
hierárquica – não apenas do ponto de vista formal, mas também axiológico –
e, consequentemente, da sua força normativa diferenciada . A
fundamentalidade de que se revestem tais direitos não pode passar
despercebida ao intérprete, a quem cabe, através da hermenêutica
especificamente constitucional , extrair deles o significado que proporcione
máxima possibilidade de gerar efeitos práticos .

Nessa linha, ensina-se que “o princípio da dignidade da pessoa


humana exprime, em termos jurídicos, a máxima kantiana, segundo a qual o
Homem deve sempre ser tratado como um fim em si mesmo e nunca como um
meio. O ser humano precede o Direito e o Estado , que apenas se justificam
em razão dele . Nesse sentido, a pessoa humana deve ser concebida e tratada
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como valor-fonte do ordenamento jurídico , como assevera Miguel Reale,


sendo a defesa e promoção da sua dignidade, em todas as suas dimensões, a
tarefa primordial do Estado Democrático de Direito. Como afirma José Castan
Tobena, el postulado primário del Derecho es el valor próprio del hombre como
valor superior e absoluto, o lo que es igual, el imperativo de respecto a la
persona humana ” 5 .

Corolário indefectível: a saúde é direito fundamental , cuja não


salvaguarda por parte do Estado representa violação gravíssima da Carta
Política, Capítulo II – Dos Direitos Sociais – artigo 6°, que, de modo expresso,
a fim de que não subsistam dúvidas, densifica- o, no seu artigo 196: “a saúde é
direito de todos e dever do Estado , garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção,
proteção e recuperação ”.

Prosseguindo o raciocínio, pegue-se o disposto na Carta Magna,


artigo 197, que estabelece o propósito do legislador constituinte de realçar o
caráter de essencialidade do direito fundamental à saúde , à medida que: “são
de relevância pública as ações e serviços de saúde , cabendo ao Poder Público
dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscali zação e controle,
devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também,
por pessoa física ou jurídica de direito privado ”.

Ainda, doutrinariamente, entremostra-se a fundamentalidade do


direito à saúde , à medida que, ao “qualificar os serviços e ações de saúde
como de relevância pública, não pretendeu o legislador constituinte di zer que
os demais direitos humanos e sociais não têm relevância; quis o legislador
talvez enunciar a saúde como um estado de bem- estar prioritário, fora do qual
o indivíduo não tem condições de go zar outras prestações proporcionadas pelo
Estado, como a educação, antecipando-se, assim, à qualificação de
“relevância” que a legislação infraconstitucional deverá outorgar a outros
serviços, públicos e privados (...) ”. 6

5
D A N I E L S A R M E N T O , A p o n d e r a ç ã o d e I n t e r e s s e s n a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l , 1 ª e d . , 3 t i r. , E d i t o r a L u m e n
Juris, 2003.
6
G U I D O I VA N D E C A R VA L H O e L E N I R S A N T O S , S i s t e m a Ú n i c o d e S a ú d e – C o m e n t á r i o s à L e i O r g â n i c a d a
Saúde, 3ª edição, Editora da Unicamp, Campinas, 2002, p. 317.
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É insofismável, pois, o dever do Estado de disponibilizar os


recursos necessários para que o direito subjeti vo dos indivíduos à saúde ,
tratado extensivamente pela Constituição Federal, seja levado a efeito. Mas a
prestação desse serviço público essencial deve ocorrer, importa não olvidar, de
modo imediato, sem que seja admitida nenhuma espécie de escusa ou
justificativa e, ainda, de maneira perfeita e acabada, conforme se depreende da
Constituição Federal, artigo 198, caput , inciso II, que estabelece que as ações
e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e
hierarquizada e constituem um sistema único organizado de acordo com a
seguinte diretriz: atendimento integral , com prioridade para as atividades
preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais.

Semelhantemente, a Lei federal nº 8.080/90, editada com o intuito


de regulamentar os dispositivos constitucionais referentes ao direito à saúde e
dispor sobre o SUS, ressalta os valores primordiais que tem a saúde no
ordenamento jurídico brasileiro, um direito fundamental do ser humano ,
devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu exercício. 7

Essa Lei estabelece, outrossim, que as ações e ser viços públicos


que integram o SUS serão desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas
na Carta da República, artigo 198, obedecendo, ainda, aos princípios a
universalidade de acesso , da integralidade de assistência , da igualdade da
assistência à saúde , da conjugação de recursos financeiros , tecnológicos e
humanos . 8
7
Lei federal nº 8.080/90:
“Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições
indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formul ação e execução de políticas
econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no
estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços
para a sua promoção, proteção e recuperação.
(...)
Art. 4°. O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas
federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta e das funções mantidas pelo Poder
Público, constitui o Sistema Único de Saúde – SUS.”
8
Lei federal nº 8.080/90,
Artigo. 7° (...)
I – universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;
II - integralidade de assistência, entendida como um conjunto articulado e contínuo de serviços
preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de
compl exidade do sistem a;
(...)
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Conseguintemente, não disponibilizar adequado tratamento aos


pacientes do SUS, por meio de acesso às diferentes modalidades de terapia
renal substitutiva, como a hemodiálise, a fim de lhes assegurar o direito à
saúde , traduz conduta ilícita da União e do Município de Goiânia,
constitucional e legalmente qualificada.

Então, consoante se verifica acima, a conjugação dos dispositivos


da Constituição Federal e da legislação infraconstitucional fixa, de modo
harmônico, entre as competências estatais , o dever de garantir a efeti vação
do direito à saúde .

Dessa feita, impede ressaltar que a Corte Suprema brasileira pôs


um ponto final nas frequentes tentativas dos entes públicos de se esquivarem
da responsabilidade de prestar adequadamente os serviços de saúde . 9

Como se percebe, a inobservância dos preceitos constitucionais e


legais, independentemente das alegações inaceitáveis de impossibilidade
financeira , deve ser combatida com rigor, sob pena de se deixar exposta
parcela considerável de pacientes do SUS ao risco de perecimento . 1 0

IV – igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;


(...)
XI – conjugação de recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, na prestação de serviços de assistência à saúde da população.”
9
“O preceito no artigo 196 da Carta da República, de eficácia imedi ata, revela que “a saúde é direito
de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua
promoção e recuperação”. A referência, contida no preceito “Estado”, mostra-se abrangente, a alcançar
a U n i ã o , o s E s t a d o s p r o p r i a m e n t e d i t o s , o D i s t r i t o F e d e r a l e o s M u n i c í p i o s . Ta n t o é a s s i m q u e ,
relativamente ao Sistema Único de Saúde, diz-se do financiamento, nos termos do artigo nº 195, com
recursos do orçamento, da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, além de outras fontes. (...). Reclamam-se do Estado (gênero) as atividades que lhe são
precípuas, nos campos da educação, da saúde e da segurança pública, cobertos, em si, em termos de
receita, pelos próprios impostos pagos pelos cidadãos. É hora de atentar-se para o objetivo maior do
próprio Estado, ou seja, proporcionar vida gregária segura e com o mínimo de conforto suficiente a
atender ao valor maior atinente à preservação da dignidade do homem. (...)” Agravo de Instrumento nº
2 3 8 . 3 2 8 / R S , p u b l i c a d o n o D J d e 11 / 5 / 9 9 .
10
“Entre proteger a inviol abilidade do direito à vida que se qualifica com o direito subjetivo inalienável
a s s e g u r a d o p e l a p r ó p r i a C o n s t i t u i ç ã o d a R e p ú b l i c a ( a r t . 5 º , c a p u t ) , o u f a z e r p r e v a l e c e r, c o n t r a e s s a
prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez
configurado esse dilema - que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só e possível
ação: o respeito indeclinável à vida.”
“(...)
O preceito no artigo 196 da Carta da República, de eficácia imedi ata, revela que “a saúde é direito de
todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua
promoção e recuperação”. A referência, contida no preceito “Estado”, mostra-se abrangente, a alcançar
a U n i ã o , o s E s t a d o s p r o p r i a m e n t e d i t o s , o D i s t r i t o F e d e r a l e o s M u n i c í p i o s . Ta n t o é a s s i m q u e ,
relativamente ao Sistema Único de Saúde, diz-se do financiamento, nos termos do artigo nº 195, com
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Por conseguinte, sucedendo violação do direito fundamental à


saúde, compreende- se irrefutável o dever imposto ao Estado de efetivar as
normas constitucionais e legais existentes, não consistindo abuso de qualquer
ordem o remanejamento de recursos insertos no orçamento e destinados a
áreas merecedoras de menor prioridade do Estado brasileiro, como a
publicidade e a doação de recursos públicos a governos estrangeiros, para o
campo da saúde pública.

E que não se replique com uma suposta invasão da


discricionariedade administrativa, ou do tão propalado “poder discricionário da
Administração Pública”, uma vez que esse atributo da atividade administrativa
pública não atribuiu ao administrador estatal a possibilidade de optar por
permanecer em situação totalmente ilícita, visto que a única forma de a União
cumprir o que lhe ordena o direito p átrio é promover e manter a terapia renal
substitutiva de hemodiálise.

5.2.2 – Procedimento de hemodiálise e os riscos de interrupção


do tratamento

De acordo com a Sociedade Brasileira de Nefrologia 11 , a


hemodiálise é um procedimento através do qual uma máquina limpa e filtra o
sangue, auxiliando no controle de água corporal, nível de eletrólitos, PH do
sangue, pressão arterial; síntese de hormônio que estimulam a produção de
hemácias, controle da saúde e etc. O tratamento é indicado para pacientes com
insuficiência renal aguda ou crônica grave.

A hemodiálise funciona como um substituto dos rins em algumas


funções, como a de elim inar substâncias tóxicas e retirar excesso de água do
organismo. A interrupção do tratamento ou caso o procedimento de diálise não
seja iniciado, agrava o quadro do paciente, podendo levá- lo a óbito. Importante

recursos do orçamento, da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, além de outras fontes. (...). Reclamam-se do Estado (gênero) as atividades que lhe são
precípuas, nos campos da educação, da saúde e da segurança pública, cobertos, em si, em termos de
receita, pelos próprios impostos pagos pelos cidadãos. É hora de atentar-se para o objetivo maior do
próprio Estado, ou seja, proporcionar vida gregária segura e com o mínimo de conforto suficiente a
atender ao valor maior ati nente à preservação da dignidade do homem. (...)” Agravo de Instrumento nº
2 3 8 . 3 2 8 / R S , p u b l i c a d o n o D J d e 11 / 5 / 9 9 .

11
http://sbn.org.br/publico/tratatamentos/hemodialise/
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asseverar que, em certos casos, o paciente só poderá descontinuar o


procedimento se for submetido a um transplante renal.

É irrefragável, pois, o dever perene do Estado de manter as


condições necessárias do tratamento de hemodiálise , com o desígnio de
resguardar o direito subjetivo dos indi víduos à saúde .

5.2.3 – Conduta ilícita dos réus

Quanto às responsabilidades dos réus na prestação de serviço SUS


aos pacientes de hemodiálise, traz-se à colação alguns artigos da Portaria do
Ministério da Saúde n° 1168/2004:

A r t . 2 ° E s t a b e l e c e r q u e a P o l í t i c a N a c i o n a l d e At e n ç ã o a o P o r t a d o r d e
Doença Renal seja organizada de forma articulada entre o Ministério da
Saúde, as Secretarias de Estado da Saúde e as Secretarias Municipais de
Saúde, permitindo:

I - d e s e n v o l v e r e s t r a t é g i a s d e p r om o ç ã o d a q u a l i d a d e d e v i d a , e d u c a ç ã o ,
proteção e recuperação da saúde e prevenção de danos, protegendo e
desenvolvendo a autonomia e a equidade de indivíduos e coletividades;

II - o r g a n i za r uma linha de cuidados integrais (promoção, prevenção,


tratamento e recuperação) que perpasse todos os níveis de atenção,
p r o m o v e n d o , d e s s a f or m a , a i n v e r s ã o d o m o d e l o d e a t e n ç ã o ;

I I I - i d e n t i f i c a r o s d e t e rm i n a n t e s e c o n d i c i o n a n t e s d a s p r i n c i p a i s p a t o l o g i a s q u e
levam à doença renal e ao desenvolvimento de ações transetoriais de
responsabilidade pública, sem excluir as responsabilidades de toda a
sociedade;

I V - d e f i n i r c r i t é r i o s t é c n i c o s m í n i m o s p a r a o f u n c i o n am e n t o e a v a l i a ç ã o d o s
s e r v i ç o s p ú b l i c o s e p r i v a d o s q u e r e a l i za m d i á l i s e , b em c o m o o s m ec a n i s m o s d e
s u a m o n i t o r a ç ã o c om v i s t a s a d i m i n u i r o s r i s c o s a o s q u a i s f ic a e x p o s t o o
portador de doença renal;

V - a m p l i a r c o b e r t u r a n o a t e n d im e n t o a o s p o r t a d o r e s d e i n s u f i c i ê n c i a r e n a l
crônica no Brasil, garantindo a universalidade, a equidade, a integralidade,
o c o n t r o l e s o c i a l e o a c e s s o à s d i f e r e n t e s m o d a l i d a d e s d e Te r a p i a R e n a l
Substitutiva (diálise peritoneal, hemodiálise e transplante );

VI - ampliar cobertura aos portadores de hipertensão arterial e de diabetes


m el l i t u s , p r i n c i p a i s c a u s a s d a i n s u f i c i ê n c i a r e n a l c r ô n i c a n o B r a s i l ;

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V I I - f om e n t a r, c o o r d e n a r e e x e c u t a r p r o j e t o s e s t r a t é g i c o s q u e v i s em a o e s t u d o
do custo-efetividade, ef i c á c i a e qualidade, b em c om o a incorporação
t e c n o l ó g i c a d o p r o c e s s o d a Te r a p i a R e n a l S u b s t i t u t i v a n o B r a s i l ;

V I I I - c o n t r i b u i r p a r a o d e s e n v o l v im e n t o d e p r o c e s s o s e m ét o d o s d e c o l e t a ,
a n á l i s e e o r g a n i za ç ã o dos resultados das ações decorrentes da Política
N a c i o n a l d e A t e n ç ã o a o P o r t a d o r d e D o e n ç a R e n a l , p e rm i t i n d o q u e a p a r t i r d e
s e u d e s em p e n h o s e j a p o s s í v e l u m a p r i m o r a m e n t o d a g e s t ã o , d i s s e m i n a ç ã o d a s
i nf o rm a ç õ e s e u m a v i s ã o d i n âm i c a d o e s t a d o d e s a ú d e d a s p e s s o a s c o m
doença renal e dos indivíduos transplantados;

I X - p r om o v e r i n t e r c âm b i o c om o u t r o s s u b s i s t em a s d e i n f o rm a ç õ e s s e t o r i a i s ,
im p l em e n t a n d o e a p e rf e i ç o a n d o p e rm a n e n t e m e n t e a p r o d u ç ã o d e d a d o s e
g a r a n t i n d o a d e m o c r a t i za ç ã o d a s i n f o r m a ç õ e s ; e

X - q u a l if i c a r a assistência e p r om o v e r a educação p e rm a n e n t e dos


p r of i s s i o n a i s d e s a ú d e e n v o l v i d o s c o m a i m p l a n t a ç ã o e im p l em e n t a ç ã o d a
P o l í t i c a d e A t e n ç ã o a o P o r t a d o r d e D o e n ç a R e n a l , em a c o r d o c o m o s p r i n c í p i o s
d a i n t e g r a l i d a d e e d a h um a n i za ç ã o .

A r t . 3 ° D ef i n i r q u e a P o l í t i c a N a c i o n a l d e A t e n ç ã o a o P o r t a d o r d e D o e n ç a
Renal, de que trata o artigo 1º desta Portaria, deve ser instituída a partir dos
s e g u i n t e s c o m p o n e n t e s f u n d am e n t a i s :

I - a t e n ç ã o b á s i c a : r e a l i za r a ç õ e s d e c a r á t e r i n d i v i d u a l o u c o l e t i v o , v o l t a d a s
para a promoção da saúde e prevenção dos danos, bem como as ações clínicas
p a r a o c o n t r o l e d a h i p e r t e n s ã o a r t e r i a l , d o d i a b e t e s m el l i t u s e d a s d o e n ç a s d o
r im q u e p o s s a m s e r r e a l i za d a s n e s t e n í v e l . Ta i s a ç õ e s t e r ã o l u g a r n a r e d e d e
serviços básicos de saúde (Unidades Básicas de Saúde e Equipes da Saúde da
F am í l i a ) . D e a c o r d o c o m a n e c e s s i d a d e l o c a l , o g e s t o r p o d e r á i n s t i t u i r u m a
e q u i p e d e r e f e r ê n c i a d a a t e n ç ã o b á s i c a c om a f u n ç ã o d e t u t o r i a e , o u
r ef e r ê n c i a assistencial à rede de serviços básicos de saúde, cuja
r e g u l am e n t a ç ã o s e r á d ef i n i d a e m p o r t a r i a d a S e c r e t a r i a d e A t e n ç ã o à S a ú d e ;

II - média complexidade: r e a l i za r atenção diagnóstica e terapêutica


e s p e c i a l i z a d a g a r a n t i d a a p a r t i r d o p r o c e s s o d e r ef e r ê n c i a e c o n t r a r ef e r ê n c i a
do portador de hipertensão arterial, de diabetes mellitus e de doenças renais.
Essas ações devem ser o r g a n i za d a s segundo o Plano Diretor de
R e g i o n a l i z a ç ã o ( P D R ) d e c a d a u n i d a d e f e d e r a d a e o s p r i n c í p i o s e d i r e t r i ze s d e
u n i v e r s a l i d a d e , e q u i d a d e , r e g i o n a l i za ç ã o , h i e r a r q u i z a ç ã o e i n t e g r a l i d a d e d a
a t e n ç ã o à s a ú d e . P a r a d e s em p e n h a r a s a ç õ e s n e s t e n í v e l d e a t e n ç ã o , o g e s t o r
p o d e r á i n s t i t u i r u m C e n t r o d e R ef e r ê n c i a e s p e c i a l i za d o em h i p e r t e n s ã o e
diabetes, cuja regulamentação será definida em portaria da Secretaria de
Atenção à Saúde;

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III - alta complexidade: garantir o acesso e assegurar a qualidade do


processo de diálise visando alcançar impacto positivo na sobrevida, na
m o r b i d a d e e n a q u a l i d a d e d e v i d a e g a r a n t i r e q u i d a d e n a e n t r a d a em l i s t a d e
espera para transplante renal. A assistência na alta complexidade se dará por
m ei o d o s S e r v i ç o s d e N ef r o l o g i a e d o s C e n t r o s d e R e f e r ê n c i a e m N ef r o l o g i a ,
c u j a r e g u l am e n t a ç ã o s e r á d ef i n i d a em p o r t a r i a d a S e c r e t a r i a d e A t e n ç ã o à
Saúde;

No caso específico, mostra-se evidente que a União e o Município


de Goiânia conduzem-se ilicitamente, pois infringem seus deveres-poderes de
modo a prejudicar substancialmente o direito fundamental à saúde e à
dignidade da pessoa humana.

Veja que a União, conforme ditou a portaria supramencionada, deve


atuar de forma articulada junto aos demais entes políticos, a fim de resguardar
aos pacientes de hemodiálise “ o acesso às diferentes modalidades de Terapia
Renal Substitutiva (diálise peritoneal, hemodiálise e transplante) ”.

In casu, a União repassa recursos à nefrologia do Município, fundo


a fundo, mas se abstem de executar qualquer outra atividade ou fiscalização
quanto à correta e tempetiva aplicação das verbas – mesmo após ter ciência da
situação calamitosa do Município de Goiânia.

Por outro lado, não menos infausto, o Município de Goiânia deixa


de efetuar o pagamento aos estabelecimentos que executam o serviço de
hemodiálise, ao argumento de que pode utilizar o prazo excepcional
estabelecido no contrato, de até 90 (noventa) dias, em desacordo ao prazo real
do contrato e ao artigo 1° da portaria do MS n° 2617/2013:

Art. 1º - Fica estabelecido o prazo de até o 5º dia útil, após o Ministério da


Saúde creditar na conta bancária do Fundo Estadual/Distrito Federal/Municipal
de Saúde, para que os gestores ef e t u em o pagamento dos incentivos
f in a n c e i r o s a o s e s t a b e l e c im e n t o s d e s a ú d e q u e p r e s t a m a s s i s t ê n c i a d e f o rm a
complementar ao SUS.

Destarte, por qualquer ângulo que se exam ine o problema, não há


como olvidar o dever da União e do Município de Goiânia de viabilizar, aos
pacientes do SUS, o acesso contínuo ao tratamento de hemodiálise ,
conforme predito expressamente na legislação e nos preceitos constitucionais.
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Sobreleve-se que, na espécie, a ausência de discricionariedade


na atuação do Estado fica mais evidente, à medida que pessoas correm risco
de vi da enquanto o Poder Público nega-lhes tratamento adequado.

Cumpre destacar, por conseguinte, que eventual impossibilidade


de atuação jurisdicional no caso vertente traduzir-se-ia em ver dadeira
legitimação da violação do direito fundamental à dignidade da pessoa
humana . Máxime, levando-se em conta que a gravidade dos fatos se dá em
consequência de notória omissão dos réus. Destarte, a indispensabilidade da
intervenção judicial nessas hipóteses decorre diretamente do princípio da
inafastabilidade da tutela jurisdicional , em estrita consonância com a ideia
de força normati va da Constituição.

Nessa ordem de raciocínio, vale advertir que a moderna


concepção do direito fundamental à inafastabilidade da jurisdição, sufragado
pela Carta Constitucional, artigo 5º, inciso XXXV, assegura não só o acesso à
Justiça, mas o direito a uma tutela jurisdicional efetiva e adequada .

A primazia que ocupa a dignidade da pessoa humana na escala


de valores constitucionais, em cotejo com a urgência que o caso requer,
justifica a intervenção do Estado- Jurisdição na espécie, fazendo atuar o
cumprimento imediato do direito fundamental à saúde , diante da ausência ou
falha de atuação pelo Estado-Administração.

Portanto, evidenciada a recalcitrância do Estado em tornar


realidade o direito exposto no tópico “5.2.1 – Direito à saúde”, retro, impõe-se
ao Ministério Público Federal, com supedâneo nos argumentos esgrimidos,
nenhuma outra providência, senão manejar esta demanda, com o escopo de
lograr satisfazer as pretensões adiante reveladas.

5.2.4 – Dever-poder de agir do Estado com observância aos


princípios da discricionariedade mínima e da efic iência

Ao tratar da inércia estatal , obrigatoriamente adentra-se no âmbito


que compreende o dever-poder de administrar. Os deveres-poderes do
administrador público são expressos em lei , impostos pela moral
administrativa e exigidos pelos interesses da coleti vidade .
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O poder de agir se converte no dever de agir, para que a


Administração Pública o exerça em benefício da coletividade: “(...) os poderes
são, pois, irrenunciáveis”. 1 2 Logo, se, no direito privad o o poder de agir é uma
faculdade, no direito público é uma imposição, um dever infligido ao agente
público, pois não se admite a omissão da autoridade diante de situações que
exijam a sua atuação.

Ao lado do dever-poder de administrar está o dever de eficiência ,


que inflige a todo agente público realizar suas competências com presteza,
perfeição e rendimento funcional . É o mais moderno princípio da função
administrati va , que já não se contenta em ser desempenhada apenas com
legalidade, exigindo resultados positivos para o ser viço público e satisfatório
atendimento das necessidades da comunidade e dos seus membros.
Semanticamente, eficiência significa a ação que produz efeito, que dá bom
resultado . Juridicamente, a eficiência impõe ao administrador estatal que atue
as suas funções com presteza, perfeição e rendimento apropriado.

Por tudo isso, as medidas pretendidas com a propositura da


presente ação devem ser acolhidas integralmente, vez que não se inserem no
âmbito do poder discricionário da demandada , cuja observância estaria
jungida a critérios de conveniência e oportunidade. Antes, constituem
imposições normati vas, deveres inafastáveis , previstos pela Constituição
Federal e legislação infraconstitucional, como, há algum tempo, já vem
ressaltando a melhor jurisprudência pátria.

Verdadeiramente, as normas constitucionais relativas à ordem


social impõem ao Estado o dever de mecanismos de proteção e efeti vo
exercício dos direitos sociais , econômicos e culturais, engendrando
correlatamente para o cidadão o direito a prestações , que se concretizam por
meio de políticas públicas.

No âmbito constitucional, que também implica renovação das


práticas políticas, o administrador público está vinculado às políticas
públicas . A sua omissão é passível de responsabilização e a sua margem de
discricionariedade é mínima , não contemplando o não fazer.
12
M A R I A S Y LV I A Z A N E L L A D I P I E T R O , D i r e i t o A d m i n i s t r a t i v o , 7 ª . e d . , E d i t o r a A t l a s , S ã o P a u l o , 1 9 9 6 .
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Conclui-se, pois, que hoje impera o princípio da


discricionariedade mínima da Administração Pública na estruturação e
funcionamento das políticas públicas constitucionais , o que, destarte, acha-
se longe da conduta omissiva do Estado ao não disponibilizar, no âmbito do
Sistema Único de Saúde, adequado tratamento a todos os pacientes da
hemodiálise, no Município de Goiânia.

Dito isso, vislumbra-se que não há possibilidade de se exercer


qualquer juízo de oportunidade ou de conveniência relativamente à
concretização de políticas públicas imprescindíveis a realizar os direitos
fundamentais e, assim, os objeti vos constitucionais , mormente ao se cuidar
do direito à saúde , objeto desta ação.

Reconhecer-se, pois, a inexistência de discricionariedade na


concepção e execução das referidas políticas públicas é afirmar que elas
devem estar sempre de acordo com os parâmetros de constitucionalidade e
legalidade.

6 – PRETENSÕES DESTA DEMANDA

6.1 – PRETENSÕES DE DIREI TO MATERI AL

Consoante o debatido, as condutas dos réus vêm dando azo à


violação do direito à saúde e à dignidade da pessoa humana , infringindo
normas constitucionais e legais que dever iam nortear sua atuação do Poder
Público. A correção dessa prática ilícita dos réus far-se-á mediante
pretensões e respecti vas tutelas jurisdicionais inibitórias .

A pretensão de natureza inibitória e a correlata tutela


jurisdicional : “prestada por meio de ação de conhecimento , e assim não se
liga instrumentalmente a nenhuma ação que possa ser dita '‘principal’'. Trata-se
de 'ação de conhecimento’' de natureza preventi va destinada a impedir a
prática, a repetição ou a continuação do ilícito ” 1 3 .

13
L U I Z G U I L H E R M E M A R I N O N I . T é c n i c a P r o c e s s u a l e Tu t e l a d o s D i r e i t o s , E d i t o r a R e v i s t a d o s
Tr i b u n a i s , S ã o P a u l o , 2 0 0 4 , p . 2 5 1 .
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Por sua vez, a tutela inibitória funda-se : “no próprio direito


material . Se várias situações de direitos substanciais, diante de sua natureza,
são absolutamente invioláveis, é evidente a necessidade de admitir ação de
conhecimento preventiva . Do contrário, as normas que proclamam direitos, ou
objetivam proteger bens fundamentais , não teriam qualquer significação
prática, pois poderiam ser violadas a qualquer momento, restando somente o
ressarcimento do dano” 1 4 .

A tutela inibitória pressupõe : “a possibilidade do ilícito , ainda


que se trate de repetição ou continuação . Assim, é voltada para o futuro , e
não para o passado. De modo que nada tem a ver com o ressarcimento do
dano e, por consequência, com os elementos para imputação ressarcitória – os
chamados elementos subjetivos, culpa ou dolo” 1 5 .

Concernente às técnicas processuais colocadas à disposição da


tutela inibitória , a sentença jurisdicional mandamental se adéqua à mesma,
porquanto essa: “tem, por fim, obter, como eficácia preponderante da
respectiva sentença de procedência, que o juiz emita uma ordem a ser
observada pelo demandado (...). É da essência, portanto, da ação
mandamental que a sentença que lhe reconheça a procedência contenha uma
ordem para que se expeça um mandado . Daí a designação de sentença
mandamental. Nesse tipo de sentença, o juiz ordena , e não simplesmente
condena . E nisso reside, precisamente, o elemento eficacial que a faz
diferente das sentenças próprias do processo de conhecimento” 1 6 .

Normati vamente , a tutela jurisdicional inibitória fundamenta-se


constitucionalmente : “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito” (artigo 5º, inciso XXXV, da Carta Magna).
Infraconstitucionalmente , o instrumento processual colocado a ser viço da
indigitada tutela jurisdicional se inserta na Lei federal nº 7.347/1985, artigo
11: “Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não

14
LUIZ GUILHERME MARINONI. Op. cit. p. 251.

15
LUIZ GUILHERME MARINONI. Op. cit. p. 255.

16
O V Í D I O A . B AT I S TA D A S I LVA . C u r s o d e P r o c e s s o C i v i l , Vo l u m e I I , 5 ª e d . E d i t o r a R e v i s t a d o s
Tr i b u n a i s , S ã o P a u l o , 2 0 0 2 , p . 3 3 6 .
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fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a


cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de
cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível,
independentemente do requerimento do autor”.

Assim sendo, no caso em apreço, a tutela jurídico-processual à


disposição das pretensões inibitórias desta demanda é a sentença de
eficácia preponderantemente mandamental , por meio da qual o magistrado
deve impor ordens ou vedações aos réus, com vistas ao total adimplemento
dos seus deveres-poderes , até agora negligenciados frente ao risco de
interrupção de tratamento de pacientes, bem como o não atendimento a novos
pacientes que necessitam de hemodiálise.

Compreendida, portanto, a tutela jurisdicional almejada, torna-se


imprescindível propugnar pela antecipação da tutela pretendida , com base
na evidência .

6.2 – ANTECIPAÇÃO DE TUTEL A DE EVIDÊNCI A

O novo Código de Processo Civil, no seu artigo 311, incisos I ao IV,


institui a tutela de evidência , a qual será concedida, entre outras hipóteses,
independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao
resultado útil do processo , quando, dentre outras hipóteses, a petição inicial
for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do
direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida
razoável 1 7 .

17
a r t i g o 3 11 . A t u t e l a d a e v i d ê n c i a s e r á c o n c e d i d a , i n d e p e n d e n t e m e n t e d a d e m o n s t r a ç ã o d e p e r i g o d e
dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da


parte;

II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese


firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;

III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de


depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de
multa;

IV - a petição inicial for instr uída com prova docum ental suficiente dos fatos constitutivos do
d i r e i t o d o a u t o r, a q u e o r é u n ã o o p o n h a p r o v a c a p a z d e g e r a r d ú v i d a r a z o á v e l .

Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.
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Repise-se, outrossim: “O legislador procurou caracterizar a


evidência do direito postulado em juízo capaz de justificar a prestação de
“tutela provisória ” a partir das quatro situações arroladas no artigo 311, CPC.
O denominador comum capaz das de amalgamá-las é a noção de defesa
inconsistente . A tutela pode ser antecipada porque a defesa articulada pelo
réu é inconsistente ou provavelmente o será” 1 8 .

A inovação legal veio, pois, em boa hora, uma vez que


distribui o ônus do tempo do processo entre as partes , fazendo com que o
litigante que não tenha razão suporte o fardo da duração do processo .
Noutras palavras, o objetivo da tutela de evidência : “é distribuir o ônus que
advém do tempo necessário para transcurso de um processo e a concessão de
tutela definitiva. Isso é feito mediante a concessão de uma tutela imediata e
provisória para a parte que revela o elevado grau de reprovabilidade de suas
alegações (devidamente provadas), em detrimento da parte adversa e a
improbabilidade de êxito em sua resistência – mesmo após instrução
processual” 1 9 .

Eis o caso concreto. Esta petição inicial acha-se instruída com


substancial prova documental que revela a flagrante violação das normas
aludidas nos tópicos retro. Não existindo nenhuma contraposição hábil a ser
oposta pelos réus para se escusarem do descumprimento dos seus deveres-
poderes pertinentes ao resguardo do ser viço de saúde SUS e aos demais
direitos fundamentais envol vidos.

Destarte, consubstanciam técnicas processuais à disposição das


pretensões de direito material desta demanda aquelas instituídas pelo novo
Código de Processo Civil, artigo 311, inciso IV, integradas sistemicamente,
para defesa de direitos e interesses coletivos, difusos e individuais
homogêneos, à Lei federal nº 7.347/85, artigos 11, 12, caput , §§ 1º e 2º, 19 e
21, e à Lei federal nº 8.078/90, artigos 81, parágrafo único, incisos I, II e III,
82, inciso I, 84, caput , §§ 3º, 4º e 5º, e 90. Referidas técnicas processuais são

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L U I Z G U I L H E R M E M A R I N O N I , S É R G I O C R U Z A R E N H A R T, D A N I E L M I T I D I E R O . N o v o C ó d i g o d e
P r o c e s s o C i v i l C o m e n t a d o , E d i t o r a R e v i s t a d o s Tr i b u n a i s , 2 0 1 5 , p á g i n a 3 2 2 .

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F R E D I E D I D I E R J R , PA U L A S A R N O B R A G A , R A FA E L A L E X A N D R I A O L I V E I R A . C u r s o d e D i r e i t o
P r o c e s s u a l C i v i l , Vo l u m e 2 , E d i t o r a J u s P o d i v m , 1 0 ª E d i ç ã o , 2 0 1 5 , p á g i n a 6 1 8 .
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aptas a justificar, no caso específico, a antecipação da tutela jurisdicional, com


suporte na evidência.

7 – PEDIDOS

Posto isso, o MI NISTÉRIO PÚBLICO FEDER AL pede a V. Exa. o


que se segue

7.1 – Pedido de antecipação de tutela de evidência

7.1.1 – ordene ao Município de Goiânia que regularize


imediatamente os pagamentos às clínicas que prestam o serviço de
hemodiálise aos usuários SUS;

7.1.2 – ordene ao Município de Goiânia que observe a


regulamentação expedida pela União, especialmente a portaria do Ministério da
Saúde n° 2617/2013, quanto ao pagamento aos estabelecimentos de saúde que
prestam assistência de forma complementar ao SUS, no prazo de até o 5°
(quinto) dia útil após o Ministério da Saúde creditar na conta do fundo
municipal;

7.1.3 – ordene à União que empreenda todas as providências


formais e materiais, administrativas e judiciais, ao seu cargo, com o desiderato
de fiscalizar a prestação de serviço SUS executada pelo Município,
especialmente sobre a continuidade do serviço de hemodiálise;

7.1.4 – ordene à União que aplique as penalidade cabíveis ao


Município de Goiânia, acerca do descumprimento ao artigo 1° da Portaria do
Ministério da Saúde n° 2617/2013; e

7.1.5 – imponha multa pessoal diária de R$200.000,00 (duzentos


mil reais) aos agentes públicos dos réus que concorram, de qualquer forma,
para o descumprimento da decisão judicial concedida nos termos acima
postulados.

7.2 – Pedido de julgamento definiti vo

Ultrapassada a instrução processual, no mérito:

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7.2.1 – ordene ao Município de Goiânia que regularize os


pagamentos às clínicas que prestam o serviço de hemodiálise aos usuários
SUS;

7.2.2 – ordene ao Município de Goiânia que observe a


regulamentação expedida pela União, especialmente a portaria do Ministério da
Saúde n° 2617/2013, quanto ao pagamento aos estabelecimentos de saúde que
prestam assistência de forma complementar ao SUS, no prazo de até o 5°
(quinto) dia útil após o Ministério da Saúde creditar na conta do fundo
municipal;

7.2.3 – ordene à União que empreenda todas as providências


formais e materiais, administrativas e judiciais, ao seu cargo, com o desiderato
de fiscalizar a prestação de serviço SUS executada pelo Município,
especialmente sobre a continuidade do serviço de hemodiálise;

7.2.4 – ordene à União que aplique as penalidade cabíveis ao


Município de Goiânia, acerca do descumprimento ao artigo 1° da Portaria do
Ministério da Saúde n° 2617/2013;

7.2.5 – imponha multa pessoal diária de R$200.000,00 (duzentos


mil reais) aos agentes públicos dos réus que concorram, de qualquer forma,
para o descumprimento da decisão judicial concedida nos termos acima
postulados; e

7.2.6 – confirme os efeitos da decisão antecipatória concedida nos


termos do item 7.1., acima, tornando-os definitivos.

8 – REQUERI MENTOS

Afinal, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer:

8.1 – recebimento da presente petição inicial, instruída com os


autos do procedimento preparatório n° 1.18.000.003307/2016- 48, em anexo;

8.2 – citação dos réus para comparecerem à audiência de


conciliação, nos termos do artigo 334 do NCPC; e

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8.3 – condenação dos réus nas despesas sucumbenciais;

9 – PROVAS

Provar-se-á o alegado por todos os meios de provas em direito


admitidas.

10 – VALOR D A CAUS A

Dá- se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais), para fins


meramente fiscais.

Goiânia, 25 de novembro de 2016.

AI LTON BENEDI TO DE SOUZ A


Procurador da República

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