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Universidade de Fortaleza

Centro de Ciência Jurídicas


Direito Constitucional III

Ação Civil Pública

Professor: Martonio Mont'Alverne Barreto Lima

Estagiário Docente: Vagner de Farias


Direito Constitucional III

1. Evolução Histórica da Ação Civil Pública.

A consolidação do Direito Processual Coletivo, enquanto ramo


específico, é fenômeno contemporâneo.
“Acesso à Justiça”, de 1976, escrito por Mauro Cappelletti e Bryant Garth, é
uma referência na chamada “segunda onda renovatória de acesso à justiça”,
a partir de, principalmente, experiências nos Estados Unidos.

No Brasil, a história de ações coletivas passa, em um primeiro momento,


pela elaboração de casuísticos estatutos legais prevendo a legitimação de
associações e instituições para a defesa de associados ou interesses gerais de
profissão.
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1.1 Marcos legislativos no Brasil.

A primeira ação coletiva no Brasil foi inicialmente prevista na Constituição


de 1934 (Ação Popular), depois ampliada e regulamentada pela Lei 4.717/65.

Lei Federal 6.938/81 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente) – art. 14


§1º : autorizava o MP a ajuizar ação civil para reparação de danos quando
houvesse danos ambientais.

Lei Federal 7.347/85 - Lei da Ação Civil Pública.

Constituição Federal de 1988: Art. 129, III (Ministério Público).

Lei dos Deficientes – Lei Federal nº 7.853/89.


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Estatuto da Criança e do adolescente – Lei Federal 8.069/90 (art. 201, V do


ECA).

Lei Federal 10.257/2001 (Estatuto das Cidades): art. 54.

Lei Federal 10.741/03 (Estatuto do Idoso): art. 74, I.

O Código de Processo Civil de 1973 (Lei Federal 5.869/73), em seu artigo 6º,
não possuía previsão de ações coletivas. O Novo Código de Processo Civil
(NCPC - Lei Federal 13.105/15) também não tratou de processos coletivos.

Anteprojeto de Código BrasiLeiro de Processos Coletivos é apresentado em


dezembro de 2005 pelo Ministério da Justiça, com última versão de redação
. por Ada Pellegrini: PL 5.139/2009.
dada
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2. Definição.

“Instrumento processual adequado para reprimir ou impedir danos ao meio ambiente,


ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico, protegendo os interesses difusos da sociedade. Não se presta a amparar
direitos individuais, nem se destina à reparação de prejuízos causados por particulares
pela conduta, comissiva ou omissiva, do réu” (MEIRELLES, 1996, p. 152).

“Para a defesa na área cível dos interesses individuais homogêneos, coletivos e difusos,
bem como para a defesa do próprio interesse público, existem as chamadas ações civis
públicas ou ações coletivas” (MAZZILLI, 2004, p. 6).
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OBS – Código de Defesa do Consumidor.

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo
individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de
natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte
contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

Obs.: Não se confunde com Inquérito Civil Público, que é privativo do Ministério Público (Art. 129, III, da
CF/88. é procedimento investigatório tendente a colher elementos para a formação do convencimento para
propositura da ACP. É muito semelhante ao Inquérito Policial.
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Obs.: O Inquérito Civil Público é regulamentado pelo Art. 8º e 9º da Lei da Ação Civil Pública.
Como cada Estado tem legislação própria para disciplinar Inquérito Civil, o CNMP (Conselho
Nacional do Ministério Público) editou Resolução n 23, de 17.09.2007, dando uniformidade
nacional para o Inquérito Civil.

É procedimento administrativo, facultativo, público (permitindo o acesso a quem se interessar)


e privativo do MP (Defensoria Pública não possui).

3. Espécies.

Tutela Preventiva (inibitória ou de remoção do ilícito) e/ou Tutela Reparatória (danos


materiais e imateriais) de interesses metaindividuais especificados na legislação.

4. Finalidade (Art. 1º, 3º e 11 da Lei da ACP).

Defesa do Meio Ambiente, Consumidor, Patrimônio Histórico Cultural; Ordem Urbanística,


Ordem Econômica e outros direitos metaindividuais.
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Meio Ambiente: pode ser natural (Art. 14, I, Lei 6938/81 e art. 3º – 9605/98: terra, água,
mar, ar, fauna e flora), artificial (Art. 3º, I, Lei 6938/81 – interferido pelo homem) ou cultural
(patrimônio histórico-cultural).

Consumidor: A responsabilidade civil nessa matéria segue dois grandes regimes:


Responsabilidade por fato do produto ou serviço (art. 12 e 14 CDC - acidente de
consumo) e Responsabilidade por vício do produto ou serviço (art. 18 e 20 CDC -
qualidade e/ou quantidade).

Patrimônio Histórico Cultural: Consiste em bem imaterial, não tem valor econômico, são as
crenças, histórias, contos, representações simbólicas de dada comunidade.

Obs.: O bem tombado tem presunção legal desse valor.

Outros direitos metaindividuais: Infância e Adolescência; Idosos; Deficientes; Moralidade;


Patrimônio Público.
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Obs.: Medida Provisória 2.180-35, de 24.01.2001: proibiu Ação Civil Pública para tratar de
tributos, contribuições previdenciárias, FGTS e outros fundos de natureza
institucional cujos beneficiários possam ser individualmente determinados. (Art. 1º § único).
Esse artigo é tido como constitucional pelo STJ e STF.

5. Legitimidade.

Art. 5º da ACP e art. 82 CDC

5.1 Ministério Público


“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: (...)
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio
público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; (...)
§ 1º - A legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não
impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na
Lei”.
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5.2 Defensoria Pública (art. 134 da CF/88).

Obs.: Lei Federal 11.448/07 inseriu a Defensoria Pública nesse rol – mas a jurisprudência já admitia
esta como legitimada.

Obs.: A ADIN 3943 foi ajuizada pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público
(Conamp) sob a alegação de que, tendo sido criada para atender, gratuitamente, cidadãos sem
condições de se defender judicialmente, seria impossível para a Defensoria Pública atuar na defesa
de interesses coletivos, por meio de ação civil pública.

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEGITIMIDADE


ATIVA DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA (ART.
5º, INC. II, DA LEI N. 7.347/1985, ALTERADO PELO ART. 2º DA LEI N.
11.448/2007). TUTELA DE INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS (COLETIVOS
STRITO SENSU E DIFUSOS) E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. DEFENSORIA
PÚBLICA: INSTITUIÇÃO ESSENCIAL À FUNÇÃO JURISDICIONAL. ACESSO À
JUSTIÇA. NECESSITADO: DEFINIÇÃO SEGUNDO PRINCÍPIOS
HERMENÊUTICOS GARANTIDORES DA FORÇA NORMATIVA DA
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5.3 Administração Direta e Indireta


OBS: Inclusive empresa pública e sociedade de economia mista podem propor Ação Civil
Pública.
OBS: O CDC amplia no art. 84, III, para que órgãos da Administração Pública, sem
personalidade jurídica, desde que tenham direito ou prerrogativas próprias a assegurar – ex.:
PROCON.

5.4 Associações
Entram aqui os sindicatos, entidades de classe.
Obs.: Condições para ser legitimado:
- ter constituição ânua – com funcionamento há mais de 1 ano – exceto quando houver
manifesto interesse social; ou pela dimensão ou característica do dano; ou relevância do bem
jurídico a ser protegido (art. 5º §4º);
- pertinência temática – associação só pode entrar com Ação Civil Pública em relação as suas
finalidades institucionais, não precisando ser sua finalidade principal.

Obs.: § 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos deste
artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.
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OBS: Art. 54, XIV da Lei Federal 8.906/94 – Legitimidade da OAB, sem necessidade de
pertinência temática.

Obs.: diferencia-se da ação popular, pois nesta apenas pode ser proposta por cidadão (Art. 5º LXXIII
da CF/88).

5.5 Natureza da legitimação ativa

1º Corrente – Hugo Mazilli: a legitimidade é de natureza extraordinária – art. 18 NCPC.

2º Corrente – predominante: se forem direitos difusos e coletivos (indivisíveis), a


legitimidade será autônoma para condução do processo (mista) – pois o legitimado age em
relação a direito próprio (pois ele faz parte da sociedade também) e age em relação a
direitos alheios também.

Mas se forem direitos individuais homogêneos, a legitimidade será extraordinária (direito é


só alheio).
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5.6 Legitimidade Passiva

Não há previsão legal dessa legitimidade.

1º Corrente – minoritária – Hugo Mazilli : determina que, como não há previsão legal, deve ser a
legislação do micro sistema (de proteção dos direitos difusos, coletivos e individuais
homogêneos) como subsidiária (pois o CDC não tem previsão também), aplicando o art. 6º
da Lei da Ação Popular.

“ Art. 6º A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no
art. 1º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado,
aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado
oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo.”

Estabelece que haverá litisconsórcio passivo entre pessoa jurídica, administradores/funcionários


envolvidos e beneficiários do suposto dano.

Esse litisconsórcio será simples.


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5.7 Intervenção de Terceiros na Ação Civil Pública

Em princípio, apenas uma modalidade de Intervenção de Terceiros é proibida na Ação Civil


Pública – Denunciação da Lide (art. 125 NCPC), para evitar a inclusão de discussão
diversa no processo – art. 88 e 101, II do CDC.

Chamamento ao Processo – art. 130 NCPC – o CDC substitui o cabimento da


Denunciação da Lide pelo Chamamento ao Processo, fazendo com que o segurador só
possa ser integrado a lide como corresponsável, obstando que se inaugure na Ação Civil
Pública uma nova relação jurídica com fundamentos paralelos.

Tal disposição se aplica a toda Ação Civil Pública (não só ao CDC) em virtude do micro sistema
processual.

Embora não se possa negar, dificilmente caberá Oposição.

Assistência Litisconsorcial – art. 119 NCPC– ocorre em 2 situações:


- Art. 5º §2º e §5º da Lei da ACP – permite litisconsórcio ativo facultativo, mas não o
litisconsórcio ulterior. Desse modo, quem ingressar depois do ajuizamento, entrará como
Assistentes Litisconsorciais.
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5.8. Termo de Ajustamento de Conduta – TAC

Art. 5º § 6°: Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso
de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá
eficácia de título executivo extrajudicial.

Trata-se da submissão do causador dos danos aos direitos metaindividuais às exigências legais.
Na doutrina prevalece o entendimento de que tem natureza de transação.

Sociedade de Economia Mista, Empresa Pública (são regidas pelo direito privado) e
associações não podem realizar Compromisso de Ajustamento de Conduta.
Excepcionalmente essas 3 podem, nos atos de gestão, pois estes recebem reflexos do direito
público (ex.: TAC referente a concurso público ou licitação praticada).
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6. Liminar.

É possível - art. 12 da Lei 7347/85.

A Liminar na Ação Civil Pública contra o Poder Público, em regra é possível. Porém, este
cabimento fica sujeito a restrição – art. 2º da Lei 8.437/92 – necessitando de prévia ouvida
do representante judicial da pessoa jurídica de direito público (Procuradorias).
Desse modo, não cabe Liminar inaudita altera pars contra o Poder Público.

Art. 12 §1º da Lei 7347/85 e art. 4º §2º da Lei 8437/92 – Pedido de Suspensão da Liminar
– a pessoa jurídica de direito público e o MP pode pedir ao Presidente do Tribunal a
suspensão da liminar (não é recurso) quando houver perigo de grave lesão.
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7. Possibilidade de fixação de Multa a bem do cumprimento da Liminar.

Fixada para obrigações de fazer/não fazer/entrega, sob pena de multa por descumprimento –
art. 84 CDC e 497, 498 e 536 e do NCPC.

Art. 12 §2º da Lei 7347/85 – a multa cominada liminarmente é devida desde o


descumprimento, mas só será exigível após o trânsito em julgado da decisão final favorável
ao autor.

Se o réu for o Poder Público, este artigo tornará o cumprimento ainda mais ineficaz, pois
comumente só será executada a multa no próximo mandato. (Há pequena parcela da doutrina
que entende que esta multa poderia ser fixada contra o administrador público diretamente –
art. 536 §1º NCPC).
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8. procedimento Ordinário
A partir desse momento, é aplicado o procedimento comum do CPC, com os mesmos prazos
(inclusive os prazos em dobro) e recursos.
A única medida que não cabe na Ação Civil Pública é a reconvenção (art. 343 NCPC).

9. Sentença
Por forca do art. 83 CDC, a sentença na Ação Civil Pública pode ter qualquer natureza jurídica
(mandamental, condenatória), variável conforme o caso.

9.1 Sucumbência na Ação Civil Pública – art. 17 e 18 da Lei 7347/85:


- Se for procedente – os réus pagam na forma do art. 82, §2º do NCPC, em benefício do autor
da Ação Civil Pública.
Exceção – STJ decidiu que se o MP for autor, não há condenação em honorários advocatícios (os
demais legitimados recebem honorários ao vencerem);
- Se for improcedente – se for MP, Defensoria Pública e Associações a Lei e a doutrina
interpretam que estes serão isentos de sucumbência, salvo má-fé.
Os demais legitimados que perderem devem pagar na forma do art.82 e §§ do CPC,
independentemente de má-fé.
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10. Apelação.

Art. 14 da Lei 7347/85 – quem decide se terá ou não efeito suspensivo é o juiz de 1º grau.
Prazo: prazo de 15 dias, respeitados os arts. 180 e 229 NCPC
Não se aplica à Ação Civil Pública o prazo do art. 198, II do ECA – prevê que em todos os
recursos, exceto Agravo de Instrumento e Embargos Declaratórios, os prazos são de 10 dias.
Então, na Ação Civil Pública o prazo será sempre de 15 dias.

Reexame Necessário – segue a regra do art. 496 NCPC, aplicando-se em benefício do Poder
Público.

Exceção a esta regra – art. 4º §1º da Lei 7.853/99 – Estatuto do Deficiente – nesse caso, o
reexame necessário é invertido, somente se aplicando em favor do deficiente. Quando for
sentença procedente contra o Poder Público não haverá reexame necessário. Se improcedente,
haverá reexame necessário.
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11. Bibliografia

MAZZILLI, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo. 17 ed., rev., ampl. e atual.
Saraiva: São Paulo, 2004.

MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado
de injunção, habeas data. 17. Malheiros: São Paulo, 1996.

SOUZA, José Augusto Garcia e BRITTO, Adriana. A Defensoria Pública e os Processos


Coletivos : comemorando a Lei Federal 11.448, de 15 de janeiro de 2007. Lumen Juris: Rio de
Janeiro, 2008.
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FIM

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