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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SERGIPE

PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM SERGIPE PROMOTORA DE JUSTIÇA DE ITABAIANA

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 6ª VARA


FEDERAL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SERGIPE

PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA –


INSUFICIÊNCIA DOS SERVIÇOS DE
TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA EM
ITABAIANA/SE – FILA DE ESPERA DE
PACIENTES PARA ADMISSÃO NO SERVIÇO
DE HEMODIÁLISE HABILITADO - PERIGO
DE DANO GRAVE E IRREVERSÍVEL À
SAÚDE E À VIDA

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, representado pela Procuradora da


República signatária, e o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SERGIPE, pela
Promotora de Justiça signatária, no regular exercício de suas atribuições legais e
constitucionais, e com fulcro no artigo 129, inciso III, da Constituição da República de 1988,
no artigo 6.º, VII, da Lei Complementar n.º 75/93, e nos artigos 1.º e seguintes da Lei n.º
7.347/1985, vem, à presença de Vossa Excelência, muito respeitosamente, ajuizar a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA


(com pedido de antecipação da tutela)

em desfavor de:

UNIÃO, pessoa jurídica de direito público interno (CNPJ: 26.994.558/0001-


23), representada judicialmente por sua Procuradoria, com endereço na
Avenida Beira Mar, n.º 53, Bairro 13 de julho, em Aracaju/SE ou no Setor

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Bancário Sul, Quadra 01, Bloco “H”, Lote 26/27, Brasília-DF, CEP: 70.070-
110, com e-mail: pu.se@agu.gov.br;

ESTADO DE SERGIPE, pessoa jurídica de direito público interno (CNPJ


13.128.798/0001-01), representado judicialmente pela Procuradoria-Geral do
Estado, com endereço na Praça Olímpio Campos, n,º 14, Centro, Aracaju-SE, com e-
mail gabin@pge.se.gov.br;

MUNICÍPIO DE ITABAIANA-SE, pessoa jurídica de direito público interno


(CNPJ: 13.104.740/0001-10), representado pelo Prefeito Municipal, com endereço
na Praça Fausto Cardoso, nº 12, Centro, Itabaiana-SE, CEP 49500-000, com e-
mail procuradoria@itabaiana.se.gov.br;
pelos fundamentos de fato e de direito a seguir aduzidos

I – DO OBJETO

A presente demanda tem como objetivo obter decisão judicial com a finalidade de
obrigar os demandados a adotarem as medidas necessárias para disponibilização imediata
de vagas para pacientes com doença renal crônica (DRC) dos 23 Municípios que integram
as Regiões de Saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória que se encontram
atualmente em fila de espera para admissão no serviço habilitado para realização de
Terapia Renal Substitutiva (TRS) em nível ambulatorial no Município de Itabaiana
(Centro de Nefrologia) e que: a.1) estejam internados em hospitais, já aptos para receber
alta; a.2) estejam em acompanhamento ambulatorial sem receber hemodiálise/diálise.

Além disso, objetiva-se, a fim de solucionar o problema da insuficiência dos


serviços de Terapia Renal Substitutiva (TRS) atualmente disponibilizados à população das
Regionais de Saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória, que os requeridos sejam obrigados
a adotar as providências necessárias, cada um em sua esfera de atribuições, para ampliar os

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serviços de Atenção Especializada em DRC (Doença Renal Crônica) com


hemodiálise/diálise peritoneal para atender a demanda excedente, estimada em 30% da
capacidade atual do serviço habilitado pelo Ministério da Saúde e contratado pelo Município de
Itabaiana (Centro de Nefrologia), que atende 130 pacientes/mês;

Visa-se, portanto, assegurar o direito fundamental à saúde e à vida dos


pacientes que necessitam de Terapia Renal Substitutiva (TRS) em nível ambulatorial no
estado de Sergipe, especialmente aqueles pacientes que dependem dos serviços
disponibilizados pelas três esferas de gestão do SUS e atualmente geridos pelo Município
de Itabaiana/SE, cidade de referência para os 23 Municípios que integram as Regiões de
Saúde de Itabaiana/SE e Nossa Senhora da Glória/SE, os quais atualmente se mostram
insuficientes para atender a toda a demanda, gerando filas e risco de vida aos pacientes
que aguardam início do tratamento clínico de hemodiálise.

II – DOS FATOS

Os Serviços de Atenção Especializada Ambulatorial em Doença Renal


Crônica (DRC), incluída a Terapia Renal Substitutiva (TRS), compreendem o conjunto de
tratamentos utilizados em pacientes cuja função renal esteja severamente reduzida e são
habilitados pelo Ministério da Saúde, a requerimento do Estado, o que viabiliza a realização
de repasses federais para custeio dos serviços disponibilizados à população (recursos do
fundo de ações estratégicas e compensação – FAEC, liberados por meio de autorização de
procedimentos ambulatoriais – APAC).

A Terapia Renal Substitutiva (TRS) nas modalidades hemodiálise (HD) e diálise


peritoneal (HD) no âmbito do SUS do Estado de Sergipe é disponibilizada à população por 03
(três) serviços habilitados pelo Ministério da Saúde em Atenção Especializada em Doença
Renal Crônica (DCR), localizados nos municípios de Aracaju, Itabaiana e Estância. Esses

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serviços são prestados por um total de cinco clínicas e com Hospitais de retaguarda pactuados
para as intercorrências dialíticas, bem como com fluxo de acesso regulado pela gestão
municipal, de acordo com pactuação na Programação Pactuada Integrada – PPI.
Os serviços habilitados no Município de Aracaju (Clinese Diaverum – Cirurgia,
Hospital do Rim e a Nefroclínica Diaverum – São José) atendem aos pacientes dos Municípios
que integram as Regiões de Saúde de Aracaju, Lagarto, Nossa Senhora do Socorro e Propriá; o
serviço habilitado no Município de Itabaiana (Centro de Nefrologia/ Clínica do Rim), por
sua vez, atende as Regiões de Saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória, enquanto o
serviço habilitado no Município de Estância (Nefroes) atende apenas os Municípios da Região
de Saúde de Estância. Vejamos:

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Portanto, atualmente, por conta das pactuações interfederativas realizadas entre


Estado de Sergipe e os Municípios Sergipanos, as contratações dos prestadores desses serviços
especializados de Terapia Renal Substitutiva (TRS) em nível ambulatorial e hospitalar vem
sendo realizados pelos municípios que coordenam determinadas Regiões de Saúde (Aracaju,
Itabaiana e Estância), que são responsáveis por regular as vagas para os pacientes dos
Municípios que as integram, segundo as diretrizes propostas deferidas quando do processo de
habilitação junto ao Ministério da Saúde, que fica responsável pelo custeio através da
realização de repasses federais.

O fluxo estadual de acesso ambulatorial e urgência para Terapia Renal Substitutiva


(TRS), nas modalidades hemodiálise (HD) e Diálise Peritoneal (DP) aos pacientes portadores
de Doença Renal Crônica (DRC) no SUS de Sergipe obedece, atualmente, à deliberação do
Colegiado Intefederativo Estadual (CIE) nº 115/2020, conforme detalhamento no Anexo I
(DOC. 1).

Especificamente sobre os serviços prestados à população das Regiões de Saúde de


Itabaiana (composta pelos municípios de Areia Branca, Campo do Brito, Carira, Frei Paulo,
Itabaiana, Macambira, Malhador, Moita Bonita, Pedra Mole, Pinhão, Ribeirópolis, São
Domingos, São Miguel do Aleixo e Nossa Senhora Aparecida) e de Nossa Senhora da Glória
(composta pelos municípios de Canindé de São Francisco, Feira Nova, Gararu, Gracho
Cardoso, Itabi, Monte Alegre de Sergipe, Nossa Senhora da Gloria, Poço Redondo e Porto da
Folha), os serviços de Terapia Renal Substitutiva (TRS) são prestados pela entidade privada
Centro de Nefrologia Ltda (Clínica do Rim), localizado em Itabaiana e contratada pela
Secretaria de Saúde deste Município.

A habilitação do Centro de Nefrologia ltda/Clínica


do Rim (CNES 3539105) pelo Ministério da Saúde ocorreu no ano de 2007, através da portaria
nº 543 de 10 de outubro de 2007. Desde então, de acordo com a programação pactuada

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integrada (PPI), o município de Itabaiana/SE é referência para os Municípios das Regiões de


Saúde de Itabaiana/SE e Nossa Senhora da Glória/SE. De acordo com o CNES da Clínica do
Rim, esta conta com 26 equipamentos para hemodiálise para atendimento dos pacientes renais
crônicos pelo SUS (DOC.2).

Nesse contexto, o Ministério Público Federal tomou conhecimento, a partir de


representação formalizada perante a Procuradoria da República em Sergipe, da atual
insuficiência dos Serviços de Atenção Especializada em Doenças Renais Crônicas (DRC)
disponibilizados pela União, Estado e Municípios à população dos 23 Municípios que
intregram as regiões de saúde de Itabaiana/SE e Nossa Senhora da Glória/SE.

De acordo com o apurado pelo MPF nos autos do Inquérito Civil n.º
1.35.000.001094.2021-04, essa insuficiência gera a preocupante situação de fila de pacientes
que aguardam vaga para iniciar o tratamento ambulatorial na unidade, sejam aqueles que
já estão em situação de alta hospitalar para iniciar a hemodiálise no atendimento clínico, mas
permanecem internados por falta de vaga, sejam aqueles que se encontram em casa, mas que
também deveriam iniciar, de imediato, o tratamento ambulatorial.

A apuração fora deflagrada após o recebimento de denúncia com o seguinte


conteúdo(DOC. 3):

“Olá, boa noite! Venho por meio desta solicitar uma atenção especial para o meu pai que
encontra-se internado no hospital regional de itabaina Sergipe. O meu pai deu entrada
em 23.08 com insuficiência renal e, devido a falta de vaga de leitos para a realização de
hemodialiseem itabaiana-se ( cidade vizinha há que até de O interior de Sergipe) 3
clínicas em Aracaju como: hospital do rim, hospital São José e hospital cirurgia
possuem vagas só que a regulação não permite o recebimento de paciente do interior do
estado. Peço encarecidamente a internediacao de vocês para que o estado providencie a
vaga. Segundo os médicos o meu pai já está de alta porém não podemos remove-lo
porque. As clínicas não
aceitam. Inclusive a medição em pílula meu pai está tomando a que trouxe de casa, pois o
hospital não dispõe deste medicamento.” (grifo nosso)

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No documento DOC. 4 a denunciante acrescenta:

“(…) em 01.09.2021 o hospital solicitou a transferência do mesmo para uma clínica


médica em Itabaiana a SENEDI, a qual a mesma se recusou a receber meu pai. Em
30.08.2021 a administração do hospital realizou outra tentativa de transferência para o
DISK DIALISE em Aracaju Sergipe e sem sucesso negaram a vaga, alegando falta de
leito. O meu pai encontra-se em condições precárias junto aos demais pacientes com
outros tipos de enfermidades, solicito que vocês me ajudem a providenciar essa abençoada
vaga para que ele seja transferido imediatamente e passe a realizar apenas 3x por semana
numa clínica especializada. (...)”

A fim de obter informações sobre a situação narrada, o MPF oficiou a Secretaria


Municipal de Saúde de Itabaiana/SE (SMS - Itabaiana), que apresentou resposta em setembro
de 2021, por meio do Ofício nº 586/2021 (DOC. 5). Nesse expediente, a SMS- Itabaiana/SE
informou que, para atender a população das regiões de saúde de Itabaiana e Glória, mantém
contrato com o prestador de serviços de Terapia Renal Substitutiva Centro de Nefrologia
(Clínica do Rim), no valor anual de R$ 5.400.000,00 (cinco milhões e quatrocentos mil reais),
através de pagamentos mensais feitos de acordo com o número de procedimentos e exames
realizados e aprovados de acordo com o Sistema de Informação Ambulatorial e da tabela do
SUS. Acrescentou que o custeio é realizado por meio de autorização de procedimentos
ambulatoriais - APAC, com recursos do fundo de ações estratégicas e compensação – FAEC,
repassados pelo Ministério da Saúde.

A SMS – Itabaiana também informou que, de acordo com o CNES, a Clínica do


Rim conta com 26 equipamentos para hemodiálise e atende em média 139 pacientes/mês pelo
SUS. Asseverou que, apesar disso, atualmente, o prestador do SUS possui apenas 24 (vinte e
quatro) máquinas em funcionamento, o que dificulta a admissão de novos pacientes que se
encontram internados em hospitais aguardando vaga. Na data do mencionado ofício, por
exemplo, o órgão municipal informou que a demanda da clínica era de 93 (noventa e três)
pacientes da regional de saúde de Itabaiana e 39 (trinta e nove) da regional de Nossa Senhora
da Glória, totalizando 132 (cento e trinta e dois) pacientes SUS.

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Ainda no mesmo ofício, a SMS - Itabaiana asseverou que, em reuniões, a Cínica do


Rim (Centro de Nefrologia Ltda) afirmou enfrentar dificuldades para fazer novas admissões de
pacientes em virtude não somente do número de máquinas quebradas, mas também em
decorrência do subfinanciamento do SUS, visto que o valor da tabela SUS repassado está
abaixo do necessário para admissão e manutenção dos novos pacientes, consoante documento
encaminhado ao órgão municipal pela Clínica (DOC. 6).

No aludido documento, datado de 13/09/2021, a Clínica do Rim informa à SMS-


Itabaiana que, do total de suas 26 máquinas, que atendem 132 pacientes/mês, 2 máquinas do
tipo NIPRO estão passando por processo de manutenção e substituição de peças, bem como
que “(...) algumas máquinas, por serem equipamentos eletrônicos que são utilizados em suas
capacidades máximas, quebram com certa frequência e sempre é necessário ter máquinas
reservas para assegurar o tratamento aos pacientes que já iniciaram a realização da
hemodiálise”.

Em adendo, no expediente em comento, o prestador contratado apresenta à SMS –


Itabaiana as razões para a negativa de uma vaga solicitada pelo gestor municipal do SUS, bem
como para a impossibilidade de expansão dos serviços (DOC. 7):

“(…)
Existe a demanda de 11 pacientes internados em hospitais aguardando vaga, no
dia 06 e 07 do corrente mês fizemos admissões de 02 pacientes restando 09, os
quais o Centro de Nefrologia possui uma lista por ordem de recebimento de
solicitação enviado ao e-mail da assistente social para começar a realizar
hemodiálise, conforme documento anexo.
Em que pese o Centro de Nefrologia receber recursos do SUS, a defasagem dos
recursos que não se adequam há mais de 4 (quatro) anos e comprometem a diálise
no Brasil, também é uma realidade enfrentada pelo Centro de Nefrologia,
principalmente no cenário pandêmico.
Destaca-se que já encaminhamos ofício circular sob o número 01/2021, conforme
documento anexo, solicitando auxílio às prefeituras dos municípios sergipanos

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beneficiários com a prestação do serviço fornecido pelo Centro de Nefrologia de


Itabaiana. Entretanto, até o presente momento, não obtivemos respostas.
Gostaríamos de poder ter condições de admitir todos os pacientes, principalmente
os de hospitais que se apresentam em situações de urgência, mas não temos como
expandir nossos serviços.
Em decorrência da falta de recursos financeiros, escassez de equipamentos e
espaço físico, destacando-se as despesas com salários da equipe médica, salários
dos funcionários, aluguel do prédio, manutenção das máquinas, compras de
insumos e medicamentos, sendo que a atual despesa advinda apenas do SUS e do
IPES não suprem tais demandas, ocasionam débitos com fornecedores e
pagamentos com juros e mora que condicionam por parte de alguns fornecedores a
venda com pagamento à vista.
Diante do exposto infelizmente não possuímos condições de admitir um novo
paciente para tratamento de hemodiálise de imediato, no presente momento, sob
pena de ferir o princípio da universalidade de acesso aos serviços de saúde, o
Centro de Nefrologia segue uma lista de espera com as solicitações, e os novos
pacientes admitidos segue essa lista de espera.
(...)”

Ainda no Ofício n. 586/2021 (DOC. 5) a Secretaria de Saúde do Município de


Itabaiana informou que “cobra constantemente da clínica o conserto das máquinas e tenta
viabilizar a admissão dos pacientes que aguardam na fila de espera, assim como solicitou o
agendamento de uma reunião com a Secretaria Estadual de Saúde (vide anexo)”. Por fim,
argumentou ser fundamental a necessidade de participação do Estado e dos Municípios
abrangidos pela regional de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória no que diz respeito ao aporte
financeiro, haja vista que, na data do ofício, 11 (onze) pacientes estavam internados em
hospitais e aguardavam admissão na Clínica do Rim para iniciar hemodiálise
ambulatorial. Além disso, afirmou ser imprescindível que o Estado assumisse a demanda
oriunda da Regional de Nossa Senhora da Glória/SE.

Consta, ainda, dentre os documentos enviados pela Secretaria Municipal de Saúde


de Itabaiana ao MPF, cópia do Ofício 584/2021 (DOC. 8), enviado pelo órgão municipal à
Secretaria de Estado da Saúde de Sergipe, datado de 10/09/2021, do qual destacamos o seguinte
excerto:

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“Inobstante, houve aumento do número de pacientes necessitando de tratamento


nos últimos anos, causando uma fila de espera no atendimento. Atualmente
existem 17 usuários das duas regiões de saúde (Itabaiana e Glória) realizando
tratamento em outras clínicas de outras regiões de saúde e em outros estados. O
nosso único prestador habilitado alega não ter condições físicas e financeiras de
ampliar sua capacidade instalada. Diante da falta de oferta de vagas, temos nove
pacientes internados em leitos hospitalares aguardando admissão para
tratamento ambulatorial, conforme lista anexa.
Diante dos fatos já expostos, vimos requerer da SES uma reunião para buscar uma
melhor solução do caso. Na oportunidade da reunião, requerendo ao mesmo tempo
que sejam convocados representantes da SMS/Aracaju e SMS/Estância, pois se
tratam de municípios com oferta de hemodiálise no Estado”

Como visto, além da grave situação dos pacientes que permanecem internados
em hospitais, mesmo estando aptos para receber alta, aguardando vaga para hemodiálise/
diálise no âmbito clínico (semanal) para que possam ser desinternados, também é
preocupante a situação dos pacientes que, por falta de vaga no Centro de Nefrologia no
Município de Itabaiana, são realocados em outras regiões de saúde (e até em outros
Estados) para realizar o tratamento. Isso sem contar que, até que surja a vaga em outros
serviços habilitados, tais pacientes permanecem em suas residências sem dar início à
hemodiálise cuja necessidade é imediata.

A realocação dos pacientes renais crônicos para realizar TRS 1 em outras


regiões de saúde os submete a viagens longas e desgastantes várias vezes na semana para
ter acesso à hemodiálise, quando deveriam estar, ao menos, realizando o tratamento
dentro de sua regional de saúde, ainda que fora de seu Município, reduzindo, assim, as
distâncias a serem percorridas.

Também com o objetivo de colher informações sobre os fatos, o MPF oficiou a


Secretaria de Estado da Saúde de Sergipe (SES/SE), que encaminhou resposta através do Ofício

1 Terapia Renal Substitutiva na modalidade hemodiálise e diálise peritoneal

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Externo n° 2801/2021-SES (DOC. 9). Nesse expediente, a SES/SE informou que a atenção
especializada ambulatorial é atualmente contratualizada pela gestão municipal e que, no caso
do Centro de Nefrologia, localizado no município de Itabaiana, este possui 26 máquinas para
hemodiálise, “sendo que apenas 22 estão em pleno funcionamento, destas 01 é para reserva
técnica para situações de emergência, possibilitando assim o atendimento a 130 pacientes,
atualmente”. Quanto ao ponto, a SES argumentou que a responsabilidade pela manutenção e
conserto das máquinas é exclusiva da clínica contratualizada, que deve providenciar o repara
imediato ou substituição da máquina que apresente defeito.

Além disso, a Secretaria de Estado da Saúde afirmou que, em reunião realizada em


14 de julho de 2021 junto ao município de Itabaiana (gestor do contrato) e o Centro de
Nefrologia, com presença da responsável técnica da clínica, “foi relatado, claramente, que
não há condições para expandir seus serviços e, dessa forma, gerando uma lista de espera”.

Ainda no mencionado ofício, o Estado de Sergipe informou que a Associação


Hospitalar de Sergipe (Hospital Nossa Senhora da Conceição), entidade privada filantrópica,
situada no município de Lagarto/SE, aguardava habilitação em Atenção Especializada em DRC
(Doença Renal Crônica) com hemodiálise (código 15.04) junto ao Ministério da Saúde,
conforme proposta SAIPS nº 148795, já aprovada, com pendência de publicação da portaria
pelo Ministério da Saúde. Segundo a SES/SE, a efetivação da habilitação de tal unidade de
saúde, requerida pelo Estado junto ao Ministério da Saúde para fins de repasse das
verbas federais de custeio, proporcionará a ampliação do número de pacientes a serem
atendidos de forma significativa.

Por fim, a Secretaria Estadual esclareceu que a situação de pacientes em alta


hospitalar da Região de Itabaiana/SE e Glória/SE, que estavam em fila de espera por uma vaga
para tratamento ambulatorial de Terapia Renal Substitutiva (TRS), vinha sendo intermediado
pela SES/SE com a gestão do Município de Aracaju na tentativa de, “cordialmente”, viabilizar

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vagas para que estes pacientes tenham acesso ao serviço na modalidade de hemodiálise e
diálise peritoneal, provisoriamente.

Observa-se, entretanto, que, além de não esgotar a fila de espera e não eliminar os
atrasos nas admissões, a solução apontada pela Secretaria de Estado da Saúde depende da
“cordialidade” do Município que disponha de vaga na modalidade de TRS solicitada. Por isso,
se trata de medida emergencial e que vem sendo adotada em caráter provisório, ou seja, não
soluciona a situação da insuficiência dos serviços disponibilizados à população das regionais de
Itabaiana e Glória.

Diante das informações prestadas pelos gestores locais do SUS, o MPF oficiou o
Ministério da Saúde, que apresentou resposta através do OFÍCIO Nº 778/2021/SAES/NUJUR/
SAES/MS e Nota Técnica nº 607/2021-DAET/CGAE/DAET/SAES/MS (DOC. 10).

Em tal expediente, apesar de questionado pelo MPF acerca da insuficiência dos


serviços de Terapia Renal Substitutiva (TRS) atualmente ofertados à população das regionais
de saúde de Itabaiana/SE e Glória/SE, o Ministério da Saúde se limitou a descrever os serviços
já habilitados como Unidades de Atenção Especializada em Doença Renal Crônica e informar
suas respectivas produções no período de 2019 a abril de 2021.

Além disso, acerca do pedido de habilitação de uma nova Unidade de Atenção


Especializada em Doença Renal Crônica, requerida pelo Estado de Sergipe e a ser sediada no
Município de Lagarto/SE, o gestor federal do SUS afirmou:

“Além desses habilitados, tramita neste Ministério da Saúde habilitação do


HOSPITAL
NOSSA SENHORA DA CONCEICAO- ASSOCIACAO HOSPITALAR DE SERGIPE
como Atenção Especializada em DRC- Atenção Especializada em DRC com
Hemodiálise - cód 15.04; localizado no município LAGARTO/SE, CNES nº
2421518, CNPJ: 13.366.414/0001-80, sob gestão estadual. A solicitação de

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habilitação foi realizada por meio do Sistema de Apoio à Implementação de


Políticas em Saúde (SAIPS), proposta nº 148795 e já foi aprovada no âmbito
desta CGAE, encontrando-se atualmente sobrestado desde 13/09/2021
aguardando orçamento, na Coordenação-Geral de Controle de Serviços e
Sistemas – CGCSS/DRAC/SAES/MS”.

Diante do preocupante cenário, foi realizada reunião por videoconferência, no dia


19 de outubro de 2021, pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público do Estado de
Sergipe com participação de representantes da Secretaria de Estado de Saúde de Sergipe, da
Secretaria Municipal de Saúde de Itabaiana e do Centro de Nefrologia ltda (Clínica do Rim),
com o objetivo de buscar uma solução conciliatória para a insuficiência dos serviços de Terapia
Renal Substitutiva disponibilizados pelas três esferas de gestão do SUS à população das
Regionais de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória (DOC. 11).
Na ocasião, a Secretária Municipal de Saúde de Itabaiana/SE informou que foi
realizada reunião do colegiado interfederativo regional (CIR), formado pelos 23 municípios que
integram as regionais de saúde de Glória e Itabaiana e que fazem parte da pactuação para uso
dos serviços do Centro de Nefrologia, com o objetivo de discutir um possível co-financiamento
dos municípios usuários dos serviços contratados, como forma de compensar a defasagem entre
o efetivo custo destes e os valores repassados pelo Ministério da Saúde, de acordo com a
Tabela SUS. Todavia, segundo relatou a gestora municipal, a maioria dos Secretários
Municipais de Saúde não concordou com o co-financiamento proposto.

Segundo o relato apresentado pela Secretária Municipal de Saúde de Itabaiana na


referida reunião (DOC. 11), naquela data, havia 09 (nove) pacientes internados no Hospital
Regional de Itabaiana (HRI), prontos para alta hospitalar, aguardando admissão para
início do tratamento dialítico clínico (ambulatorial), sendo que 03 (três) deles conseguiram
vaga para a semana de 18 a 22 de outubro, de modo que restariam 06 (seis) pacientes
internados no HRI esperando admissão. Além disso, informou, na assentada, que havia uma
lista de espera de 19 (dezenove) pacientes oriundos das Regionais de Itabaiana e Glória

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aguardando admissão para tratamento ambulatorial no Município de Itabaiana, sendo


que alguns deles, pela urgência, haviam sido realocados para iniciar o tratamento em Aracaju
(nos serviços habilitados em tal Município), narrando que um deles estava em casa e
desenvolveu um edema no pulmão, sendo internado no Hospital Regional de Itabaiana,
enquanto outro estava internado em São Paulo, impossibilitado de retornar ao Município
de origem, o que somente é autorizado com a disponibilização de vaga.

Na mesma oportunidade, a Secretaria de Estado da Saúde de Sergipe, através da


Diretoria de Atenção Especializada e Urgência, informou que o órgão estadual “(…) estava
tentando ampliar o serviço junto ao Ministério da Saúde, tendo solicitado habilitação do
Hospital nossa Senhora da Conceição, em Lagarto, para hemodiálise apenas, que recebeu
parecer favorável do MS, pendente apenas de publicação da portaria. Que os serviços são
financiados com recursos MAC e FAEC. Que a habilitação do Hospital N. Sra. Da Conceição
é apenas para hemodiálise, que não disponibilizará tratamento peritoneal e nem para paciente
renal de estágio 3, 4 e 5 do estágio dialítico. Que temos 2 pacientes em residência que
precisam acessar o atendimento clínico/ambulatorial, 12 pacientes internados em hospital
aguardando admissão no ambulatorial e 18 pacientes que deveriam estar sendo atendidos na
Regional de Itabaiana e foram para outros serviços habilitados (outras regionais de saúde)
como por exemplo Aracaju, Estância, São Paulo e Paulo Afonso. Paciente em SP e Paulo
Afonso por exemplo não podem retornar ao Estado de origem por falta de vaga. Que a
justificativa apresentada pelo MS para não publicar a portaria de habilitação do novo
serviço solicitado pelo Estado em Lagarto foi falta de orçamento. Enquanto isso pacientes
renais crônicos são penalizados, sabemos que são doenças que não tem cura e a ausência de
hemodiálise representa risco de vida. Que o novo serviço pendente de habilitação deve
atender cerca de 100 pacientes clínicos ao mês. Que apesar de se tratar de habilitação
apenas para hemodiálise seria importante para desafogar o atendimento já que mais de 90%
da demanda é por hemodiálise e 100 pacientes poderão ficar vinculados a esse serviço.”
(DOC. 11)

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Ainda no que toca à tentativa de ampliação dos serviços de TRS no Estado de


Sergipe proposta pela SES/SE ao Ministério da Saúde, a Diretoria de Atenção Especializada e
Urgência, prestou os seguintes esclarecimentos em reunião: “Que a habilitação do Hospital
Nossa Sra. da Conceição foi requerida ao MS para atender à regional de Lagarto. Que
atualmente os pacientes da Regional de Lagarto são atendidos nos serviços habilitados em
Aracaju (3 serviços: Diaverum-Cirurgia, Hospital do Rim e Nefroclínica/Diaverum-São José)
juntamente com as Regionais de Lagarto, Nossa Sra. do Socorro e Propriá. Que com a
absorção desses pacientes pelo novo serviço a ser habilitado em Lagarto, a Regional de
Itabaiana pode buscar pactuar com a Regional de Aracaju o envio de seus pacientes ou ainda
a Regional de Glória, permanecendo os pacientes de Itabaiana em Itabaiana, por exemplo.”

Essas informações foram posteriormente reforçadas pela SES/SE através do Ofício


Externo n° 3132/2021-SES (DOC. 18), em 3 de novembro de 2021:

“A área técnica do Ministério da Saúde já aprovou, no dia 10 de setembro de


2021, a solicitação de habilitação do Hospital Nossa Senhora da Conceição,
conforme proposta SAIPS n° 148795, no município de Lagarto, em Atenção
Especializada em Doença Renal Crônica (DRC) para hemodiálise a nível
ambulatorial, porém até o presente momento não houve publicação de portaria
ministerial oficializando a habilitação.
Ademais, mister salientar que o Hospital Nossa Senhora da Conceição tem
capacidade instalada para atender inicialmente, em dois turnos, 100 pacientes,
por possuir 25 máquinas para hemodiálise. Esta habilitação permitirá que os
pacientes dos municípios da região de saúde de Lagarto que realizam
hemodiálise nas clínicas de Aracaju, possam ser transferidos para o citado
hospital. Dessa forma, as clínicas de Aracaju abrirão mais vagas, podendo assim
ocorrer novas admissões mediante repactuações entre os gestores.”

Vale mencionar, ainda, as informações prestadas pelo representante da Clínica do


Rim (Centro de Nefrologia ltda), também presente na reunião (DOC. 11), convocada pelo MPF
e MP-SE: “(…) sobre os 2 equipamentos que estão em conserto não há uma explicação
específica, são máquinas que estão funcionando 3 turnos ao dia, de segunda a sábado,

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inclusive feriados, só fecha no domingo. Que do ano passado para cá a situação financeira da
clínica piorou muito com a pandemia, por conta do aumento de alguns insumos da
hemodiálise, chegando a triplicar de valor, a única forma de conseguir alguma negociação é
comprando a vista. Que foi a partir daí que se fez a sugestão do co-financiamento dos
municípios das 2 regionais usuárias dos serviços. Que a clínica não tem condições de
expandir seus serviços, pois está no seu limite financeiro e físico de operação. Que o co-
financiamento serviria para fazer frente a esse aumento do custo, e a empresa necessita
regularizar sua situação até mesmo junto a fornecedores e das máquinas. Que a informação
que tenho de pacientes aguardando atendimento é a mesma dada pela SMS – Itabaiana, são
6 pacientes internados aguardando admissão (eram 9, mas 3 deles serão admitidos essa
semana, um hoje e 2 nos próximos dias). Que a preferência é para pacientes internados pois
estão sob maior risco. Que há uma fila de 19 pacientes em clínicas aguardando. Que a
capacidade instalada atualmente é de 24 máquinas funcionando e atendendo a um total de
135 pacientes. Que com as 2 máquinas que estão em conserto passa-se a 24 (sic)* máquinas
e 139 pacientes. Que atualmente temos 132 pacientes ativos, em tratamento”. (*erro de
digitação, leia-se: 26)

Consoante tabela anexa ao ofício n. 670/2021, encaminhado pela SMS – Itabaiana,


em 19/10/2021 (DOC. 12), verifica-se que a lista de pacientes à espera de vagas para admissão
e início do tratamento em nível ambulatorial no Centro de Nefrologia é a seguinte:

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Afere-se da análise desse documento que a insuficiência dos serviços


disponibilizados pelos entes públicos em conjunto (União, Estado e Município) à população
das regiões de saúde de Itabaiana/SE e N. Sra. da Glória/SE vem causando situações
extremamente danosas a esses pacientes com patologias renais crônicas. Observa-se que, em
tal oportunidade, 6 pacientes estavam internados no Hospital Regional de Itabaiana
(aptos para alta hospitalar), aguardando vaga para tratamento ambulatorial (em
realidade 9 pacientes, mas 3 haviam recebido autorização para admissão), 19 pacientes
haviam sido remanejados, em caráter provisório e em razão da urgência, para tratamento
em outras clínicas, enquanto 3 faziam acompanhamento ambulatorial (acompanhamento
com especialista sem realizar hemodiálise).

Como é sabido, a pessoa que é portadora de insuficiência renal crônica, que


significa perda da função dos 2 rins, sem o adequado tratamento, apresenta uma série de
problemas médicos, como "inchação", cansaço, vômitos, diarreia, anemia, falta de ar e outros,
que podem provocar complicações graves de saúde (edema pulmonar, doenças ósseas e
inchaço do coração) e, inclusive, a morte, caso não inicie o tratamento em tempo correto .
É que sem o procedimento, que substitui parte das funções renais, o sangue deixa de ser
filtrado, retirando-se toxinas e excesso de água.

Além da situação de pacientes que se encontram em suas residências e que não


encontram vaga (atraso do início do tratamento de que necessitam), outro ponto que merece

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atenção é que a ausência de vagas leva a situações em que pacientes permanecem internados,
mesmo já estando aptos para alta hospitalar e inicio do tratamento ambulatorial, mas não
podem ser desinternados por ausência de vaga. Chega-se à situação de pacientes que
permaneceram internados por longos períodos, longe de seu domicílio e família, correndo o
risco de infecções, em razão da ausência da vaga para tratamento clínico de terapia renal
substitutiva em Itabaiana,

Embora seja, em muitos casos, a única solução emergencial vislumbrada, não é


adequado que o paciente, que já sofre as consequências deletérias da doença, ainda seja privado
de sua liberdade e de sua vida normal para que possa realizar o tratamento de hemodiálise de
modo interventivo, pelo simples fato de não haver vagas no sistema de diálise semanal, que é o
mais indicado ao seu caso.

A internação prolongada e desnecessária para garantir o direito à terapia renal


substitutiva atinge o direito à saúde e à dignidade da pessoa humana em diversos aspectos,
especialmente quando pensamos na impossibilidade do indivíduo manter uma vida normal
dentro de todas as limitações que a doença renal crônica já causa aos seus enfermos.

Nem é preciso lembrar que a manutenção de um paciente em regime de internação,


sem que tal situação seja imprescindível, aumenta desnecessariamente o grau de exposição a
inúmeros agentes patológicos sabidamente existentes no ambiente hospitalar.

Logo, é inaceitável que tenhamos pessoas “vivendo” dentro do hospital pela falta
de vagas no procedimento de diálise semanal. Além de tolher direitos fundamentais desses
cidadãos, privados de retornar a sua rotina e convívio familiar, submetendo-os aos risco de
infecções e etc, há também gravames para a Administração Pública, já que mantém gastos com
a manutenção da internação, com alimentação, funcionários, leito, água luz, quando o caso era
de alta hospitalar. Mais que isso, é preciso lembrar que esses leitos hospitalares – ocupados por

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aqueles que não precisam estar internados, mas necessitam da hemodiálise – poderiam estar
sendo usados por outros pacientes que necessitem efetivamente de internação.

É o que vem ocorrendo com diversos pacientes das Regiões de Saúde de Itabaiana/
SE e Nossa Senhora da Glória/SE, reféns da insuficiência dos serviços de terapia renal
substitutiva disponibilizados pela União, Estado e Municípios, como demonstra, a título
meramente exemplificativo, o documento DOC. 13, remetido por um dos hospitais de
retaguarda (Hospital de Cirurgia), após requisição de informações do MPF. Acerca de um dos
pacientes que ali permaneceu internado, informa-se:

“Paciente Jacson Ribeiro Bonfim: Foi solicitada vaga no Centro de Nefrologia de


Itabaiana no dia 30/06/2021, no entanto foi informado via e-mail a
indisponibilidade de vaga nos dias 02/07/2021 e 12/072021. Diante disso, foi
solicitada vaga no Disk Diálise (ARACAJU), que disponibilizou vaga a partir do
dia 24/07/2921. O paciente passou 25 dias internado neste nosocômio
aguardando a disponibilização da vaga, que foi viabilizada por Aracaju”

Note-se que, mesmo tendo passado 25 dias internado (já estando de alta) enquanto
aguardava vaga para início da hemodiálise ambulatorial – única forma de continuar tendo
acesso ao tratamento dialítico quando não há vaga na Clínica contratada –, ainda assim o
paciente não obteve vaga em sua Regional de Saúde (Itabaiana/SE), e sim na Regional de
Aracaju.

Outro exemplo é o do paciente cuja denúncia deflagrou a instauração do


procedimento apuratório que respalda esta Ação Civil Pública. Como se verifica do relato
colhido de sua filha pelo MPF (DOC. 14), O paciente, idoso, permaneceu por cerca de 30 dias
internado para garantir a realização de hemodiálise, já que mesmo com alta hospitalar, não
podia se desinternar sem obter vaga para realização do tratamento em nível ambulatorial, sob
pena de risco de vida. Vejamos:

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“Dada a palavra a Mirian Campos Teixeira, já qualificada nos autos do procedimento PP


1.35.000.001094/2021-04, disse que:
“Que meu pai Antônio Teixeira, de 73 anos, residente em Ribeirópolis, tem um problema
renal crônico; que em agosto deste ano ele passou por alguns procedimentos médicos e foi
detectado que ele estava com um problema nos rins e a clínica de Itabaiana se recusou a
receber ele para tratamento por falta de vaga. Que encaminhamos meu pai para o HUSE
em Aracaju. Que no HUSE devolveram meu pai dizendo que no Hospital Regional de
Itabaiana ele poderia fazer hemodiálise estando internado. Que meu pai ficou 32 dias
internado no Hospital Regional de Itabaiana sem conseguir vaga para hemodiálise na
Clínica que fica no anexo da clínica Semedi, em Itabaiana, que é a única que atende
hemodiálise pelo SUS em Itabaiana;. Depois de muita porta na cara, conseguimos uma
vaga na Clínica DIAVERUM em Aracaju, na Rua Lagarto, mas só conseguimos essa vaga
para meu pai porque tivemos três audiências com o MP Estadual, com a Promotora de
Ribeirópolis, a Secretaria de Estado da Saúde, o Jurídico dessa Secretaria, o Juridico da
Clínica de Itabaiana e o Junior que é o Diretor do Hospital Regional de Itabaiana, onde
meu pai estava internado, além da Secretária de Saúde de Ribeirópolis. Meu pai se
internou em 23 de agosto desse ano em Itabaiana e dia 31 de agosto ele já estava de alta
mas não podia ser desinternado porque não tinha vaga para a hemodiálise e ele veio sair
do hospital no dia 26 de setembro, sendo que ficou um total de 32 dias internado. Eu
fiquei 24 dias integralmente com ele no hospital, tive que cuidar muito dele, só no quarto
que ele estava tinha 4 pacientes nessa situação de Municípios como Canindé,
Ribeirópolis, Capela. Que meu pai foi o último a entrar e o primeiro a sair porque eu
acionei o MP. Todo esse período fiquei com ele, no local com vários outros pacientes, eles
ficam 24 horas sequer uma televisão para passar o tempo. Que só no dia 27 de setembro
ele começou a hemodiálise na DIAVERUM, em Aracaju. Que como meu pai mora em
Ribeirópolis o certo é ele fazer a hemodiàlise em Itabaiana e não em aracaju. Que meu
pai fica viajando 3 vezes por semana de Ribeirópolis para Aracaju, onde passa o dia
inteiro praticamente. Que sai 09 da manha e só retorna 18:30 – 19:00 no carro da
Prefeitura. Que minha mãe tem que ir acompanhando, e também perde o dia. Que ela
despesa de alimentação. Que é um desgaste muito grande, além do desgaste do
tratamento em si. Que a DIAVERUM não permite a entrada do acompanhante e minha
mãe fica todo esse período lá fora, no calor, com trisco de assalto, esperando. Ela e todos
os acompanhantes dos demais pacientes. Que vão no carro da prefeitura com outras
pessoas e as vezes meu pai passa mal, vomita por causa do procedimento, sendo que tem
uma clínica do lado de casa, em Itabaiana, onde ele deveria ser atendido. Liguei para
clínica ontem e disseram que meu pai é o 18º da fila porque como ele conseguiu vaga em
Aracaju é como se fosse pro fim da fila. Que antes meu pai era o 3º ou 6º e agora o 18º.
Que essa lista é uma simples planilha de excel, que é desatualizada. Que meu pai passou
mal na quinta da semana passada, 28 de outubro durante a sessão de hemodiálise, ele
infartou. Que minha mãe sequer foi avisada pelos funcionários. Quando terminou o
horário que minha mãe procurou saber dele ainda assim os funcionários não avisaram,
quem lhe disse foi um paciente, que disse que ele tinha passado mal. Ele tinha sido
colocado numa sala reservada e ele deu entrada no HUSE por volta das 17:30, ou seja
sequer avisaram a minha mãe que ele tinha enfartado. Que atualmente meu pai está na

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UTI cardio do Hospital Cirurgia. Que quando ele for desinternar, está preocupada com a
vaga dele para hemodiálise em clínica porque terá que conseguir nova vaga”.

Também nesse relato é possível aferir as agruras enfrentadas pelo paciente renal
crônico (e familiar acompanhante) obrigado a deslocar-se três (quando não mais) vezes por
semana a municípios distantes de sua residência para realizar a necessária hemodiálise.

Trata-se de uma evidente quebra da regionalização da assistência, já que a


NOAS/SUS/01 determina que cabe às Secretarias Estaduais de Saúde elaborar o Plano Diretor
de Regionalização para garantir acesso ao cidadão, o mais próximo possível à residência de
um ‘conjunto mínimo de ações e serviços’, estabelecendo também o compromisso entre os
municípios para o atendimento de referências intermunicipais2. O Estado, através da Secretaria
Estadual de Saúde, é a instância de competência para operacionalização da regionalização, ou
seja, na medida em que esta deixe de funcionar adequadamente, cabe ao ente estadual
coordenar todas as mudanças, de forma a “garantir o acesso a todas as ações e serviços de
saúde necessários, otimizando os recursos disponíveis”3.

Ocorre que, conforme apurações realizadas, não houve


ampliação da oferta de serviços de TRS, tampouco houve repactuação permanente e estável da
regionalização da assistência operacionalizada no Estado de Sergipe, adontando-se apenas
medidas emergenciais de “encaixe” de alguns pacientes que dependem da “cordialidade” de
outros Municípios que porventura disponham de alguma vaga para ceder às regionais de saúde
de Itabaiana e Glória.

A análise de todo esse cenário torna evidente a necessidade de abrir mais vagas
para terapia renal substitutiva (TRS), em especial hemodiálise, em nível ambulatorial, para os

2 PREUSS, Lislei Teresinha. A gestão do Sistema Único de Saúde no Brasil e as regiões de fronteira em pauta.
Maio-ago 2018. .Disponível em: https://www.scielo.br/j/rk/a/Ffp5gVJpjhNKzXyHsSXkdXB/?lang=pt. Acesso em
11/11/2021.

3 Ministério da Saúde. NOAS-SUS n. 01/2002 (Portaria GM/737, de 27/2/2002)


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pacientes das Regionais de saúde de Itabaiana e Glória, uma vez que os serviços contratados e
disponibilizados já não se mostram suficientes para atender à demanda gerada pela população
dos 23 municípios que as integram.

Diante da urgência e a gravidade dessa situação, o MPF deliberou por enviar um


novo ofício ao Ministério da Saúde em 21/10/2021 (DOC. 15), no qual foram requisitadas
informações atualizadas sobre a publicação da portaria de habilitação em Atenção
Especializada em DRC (Doença Renal Crônica) com hemodiálise (código 15.04) requerida
pelo Estado de Sergipe para a Associação Hospitalar de Sergipe (Hospital Nossa Senhora
da Conceição), localizada no município de Lagarto. No expediente, o MPF cientificou o
Ministério da Saúde de toda a situação enfrentada pelos pacientes renais crônicos das regionais
de Itabaiana e Glória, e pontuou que, segundo os gestores locais do SUS, a habilitação do novo
serviço se mostra essencial para as diversas pessoas que aguardam na fila pelo início do
atendimento ambulatorial, o que implica a urgência da conclusão da habilitação.

De igual modo, questionou-se, para o caso de não ter sido ainda publicada a citada
portaria, quais seriam as medidas alternativas que estavam sendo tomadas pelo Ministério para
preservar a saúde e a vida dos pacientes que atualmente se encontram na fila
aguardando o início do tratamento dialítico essencial para sua condição. (DOC. 15).

Até o momento da propositura desta demanda, o Ministério da Saúde não


apresentou resposta ao mencionado expediente do MPF, tendo apresentado apenas, em
05/11/2021, requerimento de dilação de prazo de 10 dias (DOC. 17), o que se mostra
irrazoável diante da situação grave e urgente narrada nesta petição.

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Não há dúvidas de que todas as esferas de gestão do SUS vem falhando na


implementação de uma solução célere e eficiente acerca do deficit dos serviços de
hemodiálise disponibilizados à populaçõ das regionais de Itabaiana e Glória.

A União, principal financiadora desses serviços públicos de Alta Complexidade,


necessita aumentar o custeio de TRS em Sergipe, em especial para criar novas vagas destinadas
aos pacientes das Regiões de Saúde de Itabaiana e N. Sra. da Glória, a fim de evitar que os
pacientes permaneçam internados aguardado o surgimento de vaga, ou que, no caso daqueles
que não estão internados, que tenham o início de seu tratamento atrasado. Também é necessário
evitar que os pacientes que acabam conseguindo vaga em outras regionais de saúde (ou mesmo
em outros Estados) não sejam obrigados a percorrer (3 ou mais vezes por semana) longas
distâncias para ter acesso à hemodiálise.

O Estado por sua vez, sendo o coordenador da organização e planejamento dos


cuidados aos renais crônicos sergipanos, também está falhando ao não apresentar uma solução
satisfatória para o caso em exame, fornecendo apenas auxílio pontual, com soluções
provisórias, como o “encaixe” do paciente das regionais de saúde de Itabaiana e Glória em
serviços habilitados para outras regiões de saúde, como Aracaju e Estância. O Estado, através
da Secretaria Estadual de Saúde, é a instância de competência para operacionalização da
regionalização, ou seja, na medida em que esta deixe de funcionar adequadamente, cabe ao ente
estadual coordenar todas as mudanças, de forma a garantir o acesso a todas as ações e serviços
de saúde necessários, otimizando os recursos disponíveis. Com efeito, compete ao Estado
solicitar a habilitação de mais vagas para essa região (observância da assistência regionalizada)
ou prestar diretamente esses serviços, buscando financiamento federal.

O Município de Itabaiana por sua vez, tendo assumindo a obrigação de contratar e


gerir os serviços de Atenção Especializada em DRC (Doença Renal Crônica) para a população
dos 23 municípios que integram as regionais de saúde de Itabaiana e Glória (para as quais

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funciona como ‘município-sede’, de referência, que está apto a oferecer um elenco de serviços
de média e alta complexidade), não demonstrou ter exigido do prestador do SUS (Clínica do
Rim) o funcionamento completo das máquinas que deveriam estar disponíveis para
atendimento, já que 2 delas se encontram quebradas, reduzindo ainda mais a oferta de vagas e
dificultando a admissão de novos pacientes. Além disso, diante de eventual impossibilidade de
ampliação do serviço pelo prestador já contratado, cabe-lhe buscar a contratação de um novo
serviço ou a pactuação com outras regiões de saúde para atendimento de sua demanda
excedente, eliminando as filas, Em efetivo, é necessário criar um fluxo regular de atendimento
para esse excedente, mediante criação de novas vagas (habilitação de novo serviço) ou através
de pactuações interfederativas, com a coordenaçao, planejamento e co-financiamento do
Estado de Sergipe, assim como, especialmente, de financiamento federal.

É insustentável a disponibilização de um serviço de TRS à população que está


sempre saturado. Dada a sua imprescindibilidade para manutenção da própria vida daqueles
que necessitam desses tratamentos de forma imediata, esses serviços necessitam ter sempre
vagas abertas para novos pacientes que precisem iniciar o tratamento de diálise, ou seja,
precisam ser ofertados em quantidade compatível com a demanda, e de forma regionalizada.

Observa-se, portanto, a necessidade urgente da ampliação das vagas disponibilizadas


na Atenção Especializada em DRC pelo Sistema Único de Saúde em Sergipe à população das
regionais de saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória.

Por fim, considerando-se a impossibilidade de resolução da demanda por meio das vias
extrajudiciais, aliada à urgência de se conferir atendimento aos pacientes com doenças renais crônicas
que se encontram em fila de espera para o atendimento em TRS ambulatorial devido ao risco à vida e à
saúde, submete o Ministério Público Federal os fatos narrados à apreciação judicial.

III – DO DIREITO

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III.1 – DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DA LEGITIMIDADE PASSIVA


DA UNIÃO, DO ESTADO DE SERGIPE E DO MUNICÍPIO DE ITABAIANA

Nos termos do art. 109, I, da CF/88, compete a Justiça Federal processar e julgar as
causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na
condição de autoras, réus, assistentes ou oponentes. No caso em tela, a própria União Federal,
figura no polo passivo da ação, além do próprio MPF no polo ativo, cuja presença já indica a
presença de interesse federal a ser tutelado.

Como é sabido, é competência comum da União, dos Estados e do Distrito Federal


e dos Municípios cuidar da saúde e da assistência pública (art. 23, inciso II, da Constituição
Federal). A competência legislativa quanto à proteção da saúde também é concorrente (art. 24,
inciso XII, da Constituição Federal). Certo que, nos termos do artigo 198, “caput” e inciso I, as
ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e
constituem um sistema único, organizado de acordo com diretrizes de descentralização, com
direção única em cada esfera de governo, regulamentada através da Lei n. 8.080/90.

Ademais, o sistema único de saúde é financiado com recursos do orçamento da


seguridade da União, nos moldes do art. 198, §1º, da Constituição Federal. Nesse sentido, de
acordo com o disposto pela Portaria n. 204, de 29 de janeiro de 2007, do Ministério da Saúde,
que regulamenta o financiamento e a transferência dos recursos federais para as ações e os
serviços de saúde, na forma de blocos de financiamento, assim discrimina em relação ao
bloco de financiamento para a Atenção de Média e Alta Complexidade Ambulatorial e
Hospitalar:

Art. 13. O bloco da Atenção de Média e Alta Complexidade Ambulatorial e


Hospitalar será constituído por dois componentes:
I - Componente Limite Financeiro da Média e Alta Complexidade
Ambulatorial e Hospitalar – MAC; e
II - Componente Fundo de Ações Estratégicas e Compensação – FAEC.

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Especificamente no que toca aos procedimentos relacionados à Terapia Renal


Substitutiva – TRS, cobrados por meio de Autorização de Procedimentos Ambulatoriais
(APAC), estes são financiados, em sua totalidade, por meio do Fundo de Ações
Estratégicas e Compensação-FAEC, sendo os recursos transferidos mensalmente aos
Estados, Distrito Federal e Municípios, após a apuração da produção registrada no Sistema de
Informações Ambulatoriais – SIA, consoante Portaria 3.603, de 22 de novembro de 2018 do
Ministério da Saúde.

Não obstante, é diretriz das ações e serviços públicos de saúde do SUS a


conjugação de recursos financeiros, materiais da União, dos Estados e dos Municípios
para a prestação de serviços de assistência à saúde da população, conforme art. 7º, inciso XI, da
Lei nº 8.080/90.

Assim sendo, cabe à União, aos Estados e aos Municípios financiar e executar as
políticas de saúde, com controle e fiscalização de aplicação de verbas e implementação de
políticas. Neste sentido também dispôs a Lei nº 8.080/90 (Lei do SUS) que a direção do
Sistema Único de Saúde (SUS) é única, sendo exercida no âmbito da União, pelo Ministério da
Saúde (art. 9, inciso I).

Na atual conjuntura de insuficiência de vagas para o tratamento ambulatorial


especializado para pacientes renais crônicos nas regionais de Itabaiana/SE e Nossa Senhora da
Glória/SE, seja na modalidade de hemodiálise ou de diálise peritoneal, não há nenhuma dúvida
de que a responsabilidade pela oferta do serviço a quem necessita deve ser atribuída
solidariamente aos entes federados, sendo que a União deve assumir maior proeminência
nesse contexto diante do fato de dispor de instrumentos jurídicos e materiais mais amplos
para garantir tal assistência, seja através da habilitação de novo prestador de serviços,

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seja através da ampliaçõ de serviços já habilitados, viabilizando o repasse dos recursos


federais necessários.

Patente, pois, a legitimidade passiva da UNIÃO para que seja compelida a cumprir
as obrigações pleiteadas nesta demanda, proporcionando o financiamento necessário para o
custeio da abertura de novas vagas em serviços de Atenção Especializada em DRC (Doença
Renal Crônica).

A legitimidade passiva do Estado, por sua vez, decorre da obrigação solidária, de


cunho constitucional e legal, de disponibilizar à população o tratamento ambulatorial para
atendimento de pacientes portadores de doença renal crônica, da qual não se isenta pela
descentralização do serviço aos municípios prestadores, uma vez que, nos termos do art. 17,
inciso III, da Lei n. 8.080/90, incumbe ao gestor estadual prestar apoio técnico e financeiro aos
municípios, além de ser responsável por executar supletivamente ações e serviços de saúde.

Além disso, a Portaria nº 1.675, de 7 de junho de 2018, que atualizou os critérios


para a organização, funcionamento e financiamento do cuidado da pessoa com Doença Renal
Crônica – DRC, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, estabelece que compete às
Secretarias Estaduais de Saúde a promoção do requerimento de habilitação de novos
estabelecimentos de saúde como Atenção Especializada em DRC, sendo responsáveis pelo
envio ao Ministério da Saúde das informações constantes no art. 75 da Portaria n. 1.675/2018
do MS, por meio do Sistema de Apoio à Implementação de Políticas de Saúde – SAIPS. .

Ademais, avulta a legitimidade do Estado de Sergipe para figurar no polo passivo


desta demanda, considerando que NOAS/SUS/01 (Portaria GM/737, de 27/2/2002) determina
que cabe às Secretarias Estaduais de Saúde elaborar o Plano Diretor de Regionalização para
garantir acesso ao cidadão, o mais próximo possível à residência de um ‘conjunto mínimo de
ações e serviços’. Assim, cabe ao Estado, através da Secretaria Estadual de Saúde,

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operacionalizar a regionalização, ou seja, na medida em que esta deixe de funcionar


adequadamente, compete-lhe coordenar todas as mudanças necessárias, de forma a “garantir
o acesso a todas as ações e serviços de saúde necessários, otimizando os recursos disponíveis”4.

Ocorre que, conforme apurações realizadas, não houve


ampliação da oferta de serviços de TRS nas Regionais de Saúde de Itabaiana/SE e Nossa
Senhora da Glória/SE, tampouco houve repactuação permanente e estável da regionalização da
assistência operacionalizada no Estado de Sergipe, adontando-se apenas medidas emergenciais
de “encaixe” de alguns pacientes que dependem da “cordialidade” de outros Municípios que
porventura disponham de alguma vaga para ceder às regionais de saúde de Itabaiana e Glória.

Ora diante do fato de que na presente demanda discute-se, como causa de pedir, a
insuficiência dos serviços habilitados no Município de Itabaiana em Atenção Especializada em
DRC para atender à população das regionais de Itabaiana e Glória, conforme pactuações em
CIB e no âmbito da PPI, evidente a legitimidade passiva do Estado de Sergipe, eis que lhe cabe,
como dito adotar as providências necessárias para organizar e implantar de forma suficiente e
adequada, as redes estaduais de assistência em nefrologia na alta complexidade. Uma vez
constatada a insuficiência dos serviços, tal como organizados, bem como o prejuízo direto aos
usuários do SUS, sobressai a responsabilidade do ente estadual pela não adoção de medidas que
supram essa carência.

Nesse passo, cabe ao Estado de Sergipe, através das pactuações na Comissão


Intergestores Bipartite (CIB) e Comissão Intergestores Tripartite (CIT), intermediar a
articulação da assistência a pacientes crônicos renais em todo o território sergipano,
objetivando o funcionamento da rede de ações e serviços de saúde, conforme estabelecido na
Lei n. 8.080/90, vejamos:

4 Ministério da Saúde. NOAS-SUS n. 01/2002 (Portaria GM/737, de 27/2/2002)

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Art. 14-A. As Comissões Intergestores Bipartite e Tripartite são reconhecidas como


foros de negociação e pactuação entre gestores, quanto aos aspectos operacionais
do Sistema Único de Saúde (SUS). (Incluído pela Lei nº 12.466, de 2011).

Parágrafo único. A atuação das Comissões Intergestores Bipartite e Tripartite terá


por objetivo: (Incluído pela Lei nº 12.466, de 2011).

I - decidir sobre os aspectos operacionais, financeiros e administrativos da gestão


compartilhada do SUS, em conformidade com a definição da política
consubstanciada em planos de saúde, aprovados pelos conselhos de saúde;
(Incluído pela Lei nº 12.466, de 2011).

II - definir diretrizes, de âmbito nacional, regional e intermunicipal, a respeito da


organização das redes de ações e serviços de saúde, principalmente no tocante à sua
governança institucional e à integração das ações e serviços dos entes federados;
(Incluído pela Lei nº 12.466, de 2011).

Além disso, compete à gestão estadual, através das Secretarias de Saúde dos
Estados, o acompanhamento, controle e avaliação das redes hierarquizadas do SUS no que
tange à assistência prestada a pessoas portadoras de doenças crônicas, consoante estabelecido
pela Portaria nº 483, de 1º de abril de 2014, do Ministério da Saúde:

Art. 8º Compete às Secretarias de Saúde dos Estados:

I - prestar apoio institucional às Secretarias de Saúde dos Municípios no processo


de qualificação e de consolidação das ações voltadas à atenção às pessoas com
doenças crônicas;

II - realizar a articulação interfederativa para pactuação de ações e de serviços em


âmbito regional ou inter-regional para garantia da equidade e da integralidade do
cuidado;

III - definir estratégias de articulação com as Secretarias Municipais de Saúde do


seu Estado com vistas ao desenvolvimento de planos de ação regionais para
elaboração das linhas de cuidado;
(…)

VI - garantir o acesso aos insumos e medicamentos necessários para o tratamento


das doenças crônicas de acordo com a RENAME e de acordo com o disposto em

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legislações específicas, no que couber; e

VII - apoiar e organizar a implantação de sistemas de informação vigentes,


disponibilizados pelo Ministério da Saúde, nos Municípios, e apoiar a utilização
dos sistemas.

Por fim, a legitimidade passiva do Município de Itabaiana também está presente,


tendo em vista que é o Município-sede de referência em Atenção Especializada em DRC
(Doença Renal Crônica) para os 23 Municípios das Regionais de saúde de Itabaiana e Nossa
Senhora da Glória, tendo a responsabilidade de disponibilizar o serviço à população e gerir o
fluxo de regulação dos pacientes, de acordo com pactuação na Programação Pactuada Integrada
– PPI. De fato, diante de eventual impossibilidade de ampliação do serviço pelo prestador já
contratado, cabe-lhe buscar a contratação de um novo serviço ou a pactuação com outras
regiões de saúde para atendimento de sua demanda excedente, eliminando as filas, Em efetivo,
é necessário criar um fluxo regular de atendimento para esse excedente, mediante criação de
novas vagas (habilitação de novo serviço) ou através de pactuações interfederativas, com a
coordenaçao, planejamento e co-financiamento do Estado de Sergipe, assim como,
especialmente, de financiamento federal.

Ademais, sendo o ente público gestor dos serviços de saúde em comento,


responsável pela contratação, não demonstrou ter exigido do prestador do SUS (Clínica do
Rim) o funcionamento completo das máquinas que deveriam estar disponíveis para
atendimento da população.

Ressalta-se, ainda, que o Sistema Único de Saúde é pautado, dentre outros


princípios, pelo princípio da descentralização e regionalização, motivo pelo qual o município é
igualmente responsável por falhas na prestação do serviço de saúde a que lhe compete gerir.

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De igual modo, compete à União, ao Estado e ao Município de Itabaiana, enquanto


gestores públicos de saúde, o monitoramento e avaliação dos estabelecimentos de saúde
habilitados, consoante disposição da Portaria n. 1.675, de 8 de junho de 2018, do Ministério da
Saúde, a saber:

Art. 86. Os estabelecimentos de saúde habilitados em Atenção Especializada em


DRC no âmbito do SUS serão submetidos à regulação, controle e avaliação dos
seus gestores públicos de saúde. " (NR)

"Art. 87. Os gestores públicos de saúde possuem as seguintes atribuições:

I - avaliar a estrutura e equipe dos estabelecimentos por eles autorizados para


prestar o cuidado;

II - avaliar a compatibilidade entre o número de casos esperados para a


população atendida, o número de atendimentos realizados e o número de
procedimentos faturados, observando também a distribuição numérica
esperada dos procedimentos - consultas e acompanhamentos/tratamentos;

III - avaliar a qualidade dos serviços prestados pelos estabelecimentos; e

IV - controlar a frequência de pacientes em tratamento dialítico, preferencialmente


por meio de sistema eletrônico, para fins de cobrança dos procedimentos da
Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses/Próteses e Materiais Especiais
do SUS. " (NR)

Assim, patente a legitimidade dos requeridos para figurar no polo passivo da


presente demanda.

III.2 – DO DIREITO CONSTITUCIONAL À SAÚDE

A garantia do direito à vida está inscrita na Constituição Federal, no caput do art. 5º, como
direito fundamental e cláusula pétrea. Muito além de assegurar a vida enquanto preservação da

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existência, quer a Constituição garantir que ela seja mantida com dignidade, devendo-se interpretar
sistematicamente o caput do art. 5º com o art. 1º, III, da Carta Maior.

Nesse contexto, o direito à saúde assume papel fundamental, como meio de promoção e de
manutenção de uma vida digna. Por tal razão, o Constituinte de 1988 inseriu o direito à saúde no rol dos
direitos fundamentais socais, reconhecendo-lhe formalmente a relevância.

Discorrendo sobre o assunto, José Cretella Júnior, na obra “Comentários à Constituição de


1988”, vol. III, pág. 4331, citando Zanobini, assevera que:

Nenhum bem da vida apresenta tão claramente unidos o interesse individual e o interesse social,
como o da saúde, ou seja, do bem-estar físico que provém da perfeita harmonia de todos os
elementos que constituem o seu organismo e de seu perfeito funcionamento. Para o indivíduo
saúde é pressuposto e condição indispensável de toda atividade econômica e especulativa, de
todo prazer material ou intelectual. O estado de doença não só constitui a negação de todos estes
bens, como também representa perigo, mais ou menos próximo, para a própria existência do
indivíduo e, nos casos mais graves, a causa determinante da morte. Para o corpo social a saúde de
seus componentes é condição indispensável de sua conservação, da defesa interna e externa, do
bem-estar geral, de todo progresso material, moral e político. [grifamos]

Por isso, visando garantir às pessoas uma vida com dignidade, a Constituição Federal de
1988 insere a saúde como um direito coletivo, dispondo, em seu artigo 196, que a saúde é direito de
todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação.

Desta forma, a garantia da saúde, enquanto direito público subjetivo e bem jurídico
constitucionalmente tutelado, é dever do Estado, em sentido lato. Diz o Constituinte Originário que a
forma de garantia desse direito subjetivo é a efetivação de políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços
para a promoção, proteção e recuperação da saúde. Em sendo assim, não obstante o caráter
programático da norma do art. 196, reconhece-se que esta possui força normativa, sendo este um dos
pilares do novo constitucionalismo. Aliás, o próprio Supremo Tribunal Federal assim reconhece desde o
ano 2000, quando da prolação do histórico voto do Min. Celso de Melo, no RE 271.286-AgR:

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“O direito à saúde – além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas
– representa consequência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público,
qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa
brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de
incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A
interpretação da norma programática não pode transformá-la em promessa constitucional
inconsequente. O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política – que tem
por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização
federativa do Estado brasileiro – não pode converter-se em promessa constitucional
inconsequente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela
coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um
gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental
do Estado.” - RE 271.286-AgR - RS, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 12-9-
2000, Segunda Turma, DJ de 24-11-2000. Destaques de nossa autoria.

Ademais, a Constituição incumbiu a União, os Estados e os Municípios o dever de dar


concretude a este direito fundamental:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
(...)
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
(…)
XII - previdência social, proteção e defesa da saúde; 

Art. 30. Compete aos Municípios:


(…)
VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à
saúde da população;

Cumpre ainda ressaltar que a Lei nº 8.080/90, que dispõe sobre as condições para a
promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes, além de outras providências, em consonância com os artigos 196 e 197 da
Constituição Federal, também dispõe, em seu artigo 2°, sobre o dever do Poder Público de garantir o
direito à saúde, e ainda dispõe como princípio do SUS a integralidade e assistência:

Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano devendo o Estado prover as condições
indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º. O dever do Estado de garantir a saúde consiste na reformulação e execução de políticas
econômicas e sociais que visem a redução de riscos de doenças e de outros agravos e no
estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos
serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. [grifamos]

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Ao disciplinar o Sistema Único de Saúde (SUS), a mencionada legislação universalizou o


acesso aos sistemas de saúde em todos os níveis, bem como garantiu a integralidade de cobertura aos
que dele necessitem, conforme disposto em seu art. 7º:

Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que
integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas
no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;
II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços
preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de
complexidade do sistema;

Certo que, nos termos do artigo 198, “caput” e inciso I, as


ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e
constituem um sistema único, organizado de acordo com diretrizes de descentralização,
com direção única em cada esfera de governo, regulamentada através da Lei n. 8.080/90.

Ademais, o sistema único de saúde é financiado com recursos do orçamento da


seguridade da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes ,
nos moldes do art. 198, §1º, da Constituição Federal.

Já o art. 197 da Constituição Federal normatiza que:

São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público


dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle,
devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por
pessoa física ou jurídica de direito privado.

Nesses termos, o Poder Público tem a obrigação não apenas de regulamentar as


ações e serviços de saúde como também a de concretizar – por execução direta ou através de
terceiros – o pleno exercício do direito fundamental à saúde. É dever do Estado criar e
implementar condições objetivas que viabilizem ao cidadão o efetivo acesso ao direito à saúde.

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III.3 – DA ORGANIZAÇÃO, FUNCIONAMENTO E FINANCIAMENTO DO


CUIDADO DA PESSOA COM DOENÇA RENAL CRÔNICA - DRC NO ÂMBITO DO
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS
ENTES FEDERADOS.

O art. 4º, caput e § 1º, da Lei nº 8.080/1990 define a


constituição do Sistema Único de Saúde (SUS):

Art. 4º O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições


públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das
fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde
(SUS).
§ 1º Estão incluídas no disposto neste artigo as instituições públicas federais,
estaduais e municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de insumos,
medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de equipamentos para
saúde.
§ 2º A iniciativa privada poderá participar do Sistema Único de Saúde (SUS), em
caráter complementar.

A mesma Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8080/90) institui a distribuição de


competências dentro do Sistema Único de Saúde, nos termos dos seus artigos 15 a 18.

As incumbências comuns aos três entes estão previstas no art. 15 da Lei 8.080/90,
in verbis:
Art. 15. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão, em seu
âmbito administrativo, as seguintes atribuições:
I - definição das instâncias e mecanismos de controle, avaliação e de fiscalização
das ações e serviços de saúde;
II - administração dos recursos orçamentários e financeiros destinados, em cada
ano, à saúde;
III - acompanhamento, avaliação e divulgação do nível de saúde da população e das
condições ambientais;
(...)
XXI - fomentar, coordenar e executar programas e projetos estratégicos e de
atendimento emergencial.

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No art. 16 da Lei nº 8.080/1990, é estabelecida a competência da


direção nacional do Sistema Único de Saúde exercida, no âmbito da União, pelo Ministério da
Saúde (art. 9º, inciso I):

Art. 16. A direção nacional do Sistema Único da Saúde (SUS) compete:

(…)
III - definir e coordenar os sistemas:
a) de redes integradas de assistência de alta complexidade;
(...)
XII - controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para
a saúde;
XIII - prestar cooperação técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios para o aperfeiçoamento da sua atuação institucional;
XV - promover a descentralização para as Unidades Federadas e para os
Municípios, dos serviços e ações de saúde, respectivamente, de abrangência
estadual e municipal;
XVII - acompanhar, controlar e avaliar as ações e os serviços de saúde, respeitadas
as competências estaduais e municipais;

Por sua vez, em razão do art. 17 da referida lei, o gestor estadual tem diversas
incumbências, dentre as quais:
“(…)
II - acompanhar, controlar e avaliar as redes hierarquizadas do Sistema Único de
Saúde (SUS);
III - prestar apoio técnico e financeiro aos Municípios e executar supletivamente
ações e serviços de saúde;
IX - identificar estabelecimentos hospitalares de referência e gerir sistemas
públicos de alta complexidade, de referência estadual e regional;”

Já quanto as competências dos gestores municipais,


estas são atribuídas nos termos do art. 18 da mesma lei:

“I - planejar, organizar, controlar e avaliar as ações e os serviços de saúde e gerir e


executar os serviços públicos de saúde;
II - participar do planejamento, programação e organização da rede regionalizada e
hierarquizada do Sistema Único de Saúde (SUS), em articulação com sua direção
estadual;

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(...)
X - observado o disposto no art. 26 desta Lei, celebrar contratos e convênios com
entidades prestadoras de serviços privados de saúde, bem como controlar e avaliar
sua execução;
XI - controlar e fiscalizar os procedimentos dos serviços privados de saúde;
XII - normatizar complementarmente as ações e serviços públicos de saúde no seu
âmbito de atuação.”

A conjugação de responsabilidades em relação ao financiamento do SUS foi alçada à


condição de princípio, conforme inciso XI do art. 7º da Lei 8.080/90. Vejamos:

Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados


ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos
de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal,
obedecendo ainda aos seguintes princípios:
(...)
XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços
de assistência à saúde da população;

Ao dispor sobre a Política de Atenção de Alta Complexidade/Custo no SUS, a


NOAS-SUS n. 01/2002 (editada pela Portaria GM/737, de 27/2/2002), no item 23, fixa o elenco
de atribuições do Ministério da Saúde, dentre as quais se destaca o financiamento das ações:

I.5 DA POLÍTICA DE ATENÇÃO DE ALTA COMPLEXIDADE/CUSTO NO SUS


23. A responsabilidade do Ministério da Saúde sobre a política de alta complexidade/custo se traduz
nas seguintes atribuições:
a - definição de normas nacionais;
b - controle do cadastro nacional de prestadores de serviços;
c - vistoria de serviços, quando lhe couber, de acordo com as normas de cadastramento estabelecidas
pelo próprio Ministério da Saúde;
d - definição de incorporação dos procedimentos a serem ofertados à população pelo SUS;
e - definição do elenco de procedimentos de alta complexidade;
f - estabelecimento de estratégias que possibilitem o acesso mais equânime diminuindo as diferenças
regionais na alocação dos serviços;
g - definição de mecanismos de garantia de acesso para as referências interestaduais, através da Central
Nacional de Regulação para Procedimentos de Alta Complexidade;
h - formulação de mecanismos voltados à melhoria da qualidade dos serviços prestados;
i – financiamento das ações.

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No item 23.1 da NOAS-SUS n. 01/2002 (editada pela Portaria GM/737, de


27/2/2002), exsurge, de forma inequívoca, a responsabilidade solidária da União e dos
Estados-membros, por intermédio, respectivamente, do Ministério da Saúde e das
Secretarias Estaduais de Saúde, para a garantia de acesso da população aos procedimentos de
alta complexidade. Vejamos:

23.1. A garantia de acesso aos procedimentos de alta complexidade é de responsabilidade


solidária entre o Ministério da Saúde e as Secretarias de Saúde dos estados e do Distrito Federal.

Ademais, a responsabilidade do Estado-membro como gestor, coordenador e


planejador da política de saúde de alta complexidade está discriminada no item 24 da NOAS:

24. O gestor estadual é responsável pela gestão da política de alta complexidade/custo no âmbito do
estado, mantendo vinculação com a política nacional, sendo consideradas intransferíveis as funções
de definição de prioridades assistenciais e programação da alta complexidade, incluindo:
a - a macroalocação de recursos orçamentários do Limite Financeiro da Assistência do estado para
cada área de alta complexidade;
b - a definição de prioridades de investimentos para garantir o acesso da população a serviços de
boa qualidade, o que pode, dependendo das características do estado, requerer desconcentração
ou concentração para a otimização da oferta de serviços, tendo em vista a melhor utilização dos
recursos disponíveis, a garantia de economia de escala e melhor qualidade;
c - a delimitação da área de abrangência dos serviços de alta complexidade;
d - a coordenação do processo de garantia de acesso para a população de referência entre
municípios;
e- a definição de limites financeiros municipais para a alta complexidade, com explicitação da parcela
correspondente ao atendimento da população do município onde está localizado o serviço e da parcela
correspondente às referências de outros municípios;
f - a coordenação dos processos de remanejamentos necessários na programação da alta complexidade,
inclusive com mudanças nos limites financeiros municipais;
g - os processos de vistoria para inclusão de novos serviços no que lhe couber, em conformidade
com as normas de cadastramento do MS;
h - a coordenação da implementação de mecanismos de regulação da assistência em alta complexidade
(centrais de regulação, implementação de protocolos clínicos, entre outros);
i - o controle e a avaliação do sistema, quanto à sua resolubilidade e acessibilidade;
j - a otimização da oferta de serviços, tendo em vista a otimização dos recursos disponíveis, a garantia
de economia de escala e melhor qualidade."

Já quanto ao Município ora demandado, a NOAS-SUS n. 01/2002 (editada pela


Portaria GM/737, de 27/2/2002) prevê que os municípios que tiverem em seu território serviços
de alta complexidade/custo, quando habilitados em Gestão Plena do Sistema Municipal,
deverão desempenhar as funções referentes à organização dos serviços de alta complexidade

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em seu território, visando assegurar o comando único sobre os prestadores, destacando-se:

a - a programação das metas físicas e financeiras dos prestadores de serviços, garantindo a


possibilidade de acesso para a sua população e para a população referenciada conforme o
acordado na PPI e no Termo de Garantia de Acesso assinado com o estado;
b - realização de vistorias no que lhe couber, de acordo com as normas do Ministério da Saúde;
c - condução do processo de contratação;
d - autorização para realização dos procedimentos e a efetivação dos pagamentos (créditos bancários);
e - definição de fluxos e rotinas intramunicipais compatíveis com as estaduais;
f - controle, avaliação e auditoria de serviços.
25.1 A regulação dos serviços de alta complexidade será de responsabilidade do gestor municipal,
quando o município encontrar-se na condição de gestão plena do sistema municipal, e de
responsabilidade do gestor estadual, nas demais situações.

Em norma dirigente, de conteúdo programático,


os itens 26 e 27 da NOAS prescrevem que:

26. As ações de alta complexidade e as ações estratégicas serão financiadas de acordo com Portaria
do Ministério da Saúde.
27. O Ministério da Saúde, definirá os valores de recursos destinados ao custeio da assistência de alta
complexidade para cada estado.

O item 44.2 da NOAS admite expressamente a contratação de serviços na rede


privada sempre que não estiverem disponíveis na rede pública, ou mesmo quando, ainda que
existentes na rede pública, sejam insuficientes para o atendimento da população:

44.2. O interesse público e a identificação de necessidades assistenciais devem pautar o processo de


compra de serviços na rede privada, que deve seguir a legislação, as normas administrativas específicas
e os fluxos de aprovação definidos na Comissão Intergestores Bipartite, quando a disponibilidade da
rede pública for insuficiente para o atendimento da população.

Verifica-se, portanto, que com a atual Norma Operacional de Assistência à Saúde a


União, através do Ministério da Saúde, já não se limita a exercer uma posição de mero órgão de
supervisão e distribuição de recursos, passando à condição de responsável solidária nos
serviços de média e alta complexidade.

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Nesse contexto, a Portaria nº 483, de 1º de abril de 2014, do Ministério da Saúde,


redefiniu a Rede de Atenção à Saúde de Pessoas com Doenças Crônicas no âmbito do Sistema Único
de Saúde, estabelecendo como princípios basilares o acesso, o acolhimento e a humanização da
atenção aos usuários com doenças crônicas em todos os pontos de atenção, mas, também o
reconhecimento da articulação entre os diversos serviços e ações de saúde, de modo a serem
constituídas verdadeiras redes de saúde integradas e conectadas entre os diferentes pontos de
atenção.

A Portaria estabelece, ainda, a responsabilidade solidária dos diversos entes gestores


(União, Estados e Municípios) e uma regulação articulada, para melhor assistir os pacientes crônicos:

Art. 3º São princípios da Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas:
(…)
V - articulação entre os diversos serviços e ações de saúde, constituindo redes de saúde
com integração e conectividade entre os diferentes pontos de atenção;
(…)
VIII - articulação interfederativa entre os diversos gestores de saúde, mediante atuação
solidária, responsável e compartilhada;
(…)
XIII - regulação articulada entre todos os componentes da Rede de Atenção à Saúde das
Pessoas com Doenças Crônicas.

Além disso, a citada Portaria estabelece competir ao Ministério da Saúde e às


Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em seus respectivos
âmbitos de atuação (art. 6º):

“(...)
I - garantir que todos os estabelecimentos de saúde que prestam atendimento às
pessoas com doenças crônicas possuam infraestrutura e tecnologias adequadas,
recursos humanos capacitados e qualificados, recursos materiais,
equipamentos e insumos suficientes, de maneira a garantir o cuidado
necessário;
II - garantir o financiamento tripartite para o cuidado integral das pessoas
com doenças crônicas, de acordo com suas responsabilidades;
(...)”

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No que tange especificamente aos regramentos normativos correlacionados à atenção ao


portador de doenças renais, temos a Política Nacional de Atenção ao Portador de Doença Renal,
instituída pela Portaria 1.168, de 15 de junho de 2004, do Ministério da Saúde (estando os critérios
das linhas de cuidados regidos pela Portaria MS 389/2014, com requisitos e boas práticas alinhadosna
RDC Anvisa 11/2014), de cujo teor vale transcrever o excerto abaixo:

Art. 1°  Instituir a Política Nacional de Atenção ao Portador de Doença Renal a ser
implantada em todas as unidades federadas, respeitadas as competências das três esferas de
gestão.
Art. 2°  Estabelecer que a Política Nacional de Atenção ao Portador de Doença Renal
seja organizada de forma articulada entre o Ministério da Saúde, as Secretarias de
Estado da Saúde e as Secretarias Municipais de Saúde, permitindo:
I - desenvolver estratégias de promoção da qualidade de vida, educação, proteção e
recuperação da saúde e prevenção de danos, protegendo e desenvolvendo a autonomia e a
eqüidade de indivíduos e coletividades;
II - organizar uma linha de cuidados integrais (promoção, prevenção, tratamento e
recuperação) que perpasse todos os níveis de atenção, promovendo, dessa forma, a
inversão do modelo de atenção;
III - identificar os determinantes e condicionantes das principais patologias que levam à
doença renal e ao desenvolvimento de ações transetoriais de responsabilidade pública, sem
excluir as responsabilidades de toda a sociedade;
IV - definir critérios técnicos mínimos para o funcionamento e avaliação dos serviços
públicos e privados que realizam diálise, bem como os mecanismos de sua monitoração
com vistas a diminuir os riscos aos quais fica exposto o portador de doença renal;
V - ampliar cobertura no atendimento aos portadores de insuficiência renal crônica
no Brasil, garantindo a universalidade, a eqüidade, a integralidade, o controle social e
o acesso às diferentes modalidades de Terapia Renal Substitutiva (diálise peritoneal,
hemodiálise e transplante);
VI - ampliar cobertura aos portadores de hipertensão arterial e de diabetes mellitus,
principais causas da insuficiência renal crônica no Brasil;
VII - fomentar, coordenar e executar projetos estratégicos que visem ao estudo do custo-
efetividade, eficácia e qualidade, bem como a incorporação tecnológica do processo da
Terapia Renal Substitutiva no Brasil;
VIII - contribuir para o desenvolvimento de processos e métodos de coleta, análise e
organização dos resultados das ações decorrentes da Política Nacional de Atenção ao
Portador de Doença Renal, permitindo que a partir de seu desempenho seja possível um
aprimoramento da gestão, disseminação das informações e uma visão dinâmica do estado
de saúde das pessoas com doença renal e dos indivíduos transplantados;
IX - promover intercâmbio com outros subsistemas de informações setoriais,
implementando e aperfeiçoando permanentemente a produção de dados e garantindo a
democratização das informações; e

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X - qualificar a assistência e promover a educação permanente dos profissionais de saúde


envolvidos com a implantação e implementação da Política de Atenção ao Portador de
Doença Renal, em acordo com os princípios da integralidade e da humanização.

Além disso, a citada Portaria define que a Política Nacional de Atenção ao Portador
de Doença Renal deve ser instituída a partir dos seguintes componentes fundamentais:

Art. 3°  Definir que a Política Nacional de Atenção ao Portador de Doença Renal, de que
trata o artigo 1º desta Portaria, deve ser instituída a partir dos seguintes componentes
fundamentais:
(...)

III - alta complexidade: garantir o acesso e assegurar a qualidade do processo de


diálise visando alcançar impacto positivo na sobrevida, na morbidade e na qualidade
de vida e garantir eqüidade na entrada em lista de espera para transplante renal. A
assistência na alta complexidade se dará por meio dos Serviços de Nefrologia e dos
Centros de Referência em Nefrologia, cuja regulamentação será definida em portaria
da Secretaria de Atenção à Saúde;
IV - plano de Prevenção e Tratamento das Doenças Renais, que deve fazer parte integrante
dos Planos Municipais de Saúde e dos Planos de Desenvolvimento Regionais dos Estados e
do Distrito Federal;
V - regulamentação suplementar e complementar por parte dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, com o objetivo de regular a atenção ao portador de doença renal;
VI - a regulação, a fiscalização, o controle e a avaliação de ações de atenção ao
portador de doença renal serão de competência das três esferas de governo;
VII - sistema de informação que possa oferecer ao gestor subsídios para tomada de decisão
para o processo de planejamento, regulação, fiscalização, controle e avaliação e promover a
disseminação da informação;
VIII - protocolos de conduta em todos os níveis de atenção que permitam o aprimoramento
da atenção, regulação, fiscalização, controle e avaliação;
IX - capacitação e educação permanente das equipes de saúde de todos os âmbitos da
atenção, a partir de um enfoque estratégico promocional, envolvendo os profissionais de
nível superior e os de nível técnico, em acordo com as diretrizes do SUS e alicerçada nos
pólos de educação permanente em saúde;
X - acesso aos medicamentos da assistência farmacêutica básica e aos medicamentos
excepcionais, previstos em portaria do Ministério da Saúde, disponibilizados pelo SUS.

Observa-se, assim, que os demandados devem articular políticas, planos, ações, estratégias,
recursos humanos, materiais e logísticos voltados à assistência a pacientes renais.

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É certo que compete à Atenção Básica a atuação na prevenção dos fatores de risco e
proteção para a doença renal crônica. Os profissionais de saúde desse nível de atenção devem
estar preparados para identificar, por meio da anamnese e do exame clínico, os casos com
suspeita e referenciá-los para a Atenção Especializada para investigação diagnóstica definitiva
e tratamento5.

Já a Atenção Especializada, por sua vez, é composta por unidades hospitalares e


ambulatoriais, serviços de apoio diagnóstico e terapêutico responsáveis pelo acesso às consultas
e exames especializados6.

Logo, o acesso à Atenção Especializada é baseado em protocolos de regulação


gerenciados pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, as quais competem
organizar o atendimento dos pacientes na rede assistencial, definindo os estabelecimentos
para os quais os pacientes que precisam do cuidado deverão ser encaminhados7.

O Ministério da Saúde - por meio do Departamento de Atenção Especializada e


Temática, da Secretaria de Atenção à Saúde (CGAE/DAET/SAS) - é o gestor, a nível federal,
das ações na Atenção Especializada às pessoas com doenças renais crônicas. Compete à
pasta definir normas e diretrizes gerais para a organização do cuidado e efetuar a
homologação da habilitação dos estabelecimentos de saúde aptos a ofertarem o
tratamento aos doentes renais crônicos, de acordo com critérios técnicos estabelecidos
previamente8.

5 Ministério da Saúde. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/d/doencas-


renais

6 Ministério da Saúde. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/d/doencas-


renais

7 Ministério da Saúde. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/d/doencas-


renais

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Além disso, cabe ao Ministério da Saúde ofertar apoio institucional às


Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no processo de
qualificação e de consolidação da atenção em saúde, bem como promover mecanismos de
monitoramento, avaliação e auditoria, com vistas à melhoria da qualidade das ações e dos
serviços ofertados, considerando as especificidades dos serviços de saúde e suas
responsabilidades.

Como é sabido, um dos desfechos temidos da DRC (Doença Renal Crônica) é a


perda continuada da função renal, processo patológico conhecido como progressão, que pode
levar muitos desses pacientes para a DRC terminal (DRCT). Pacientes que evoluem para
DRCT necessitam de algum tipo de terapia renal substitutiva (TRS), ou seja, tratamentos que
substituem a função dos rins, sendo as modalidades disponíveis: a hemodiálise, a diálise
peritoneal e o transplante renal9. A hemodiálise é a terapia que que bombeia o sangue através
de uma máquina e um dialisador, para remover as toxinas do organismo. O tratamento acontece
em clínica especializada três vezes por semana. A diálise peritoneal, que é feita por meio da
inserção de um cateter flexível no abdome do paciente, é feita diariamente na casa do paciente,
normalmente no período noturno10.

Para os pacientes que se encontram no Estágio 5, a função renal encontra-se


criticamente comprometida, de modo que se faz primordial para a sobrevivência do paciente o
início do tratamento médico de terapia renal substitutiva (TRS), na modalidade hemodiálise ou
diálise, sob pena de agravamento da doença e evolução do quadro clínico para edemas

8 Ministério da Saúde. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/d/doencas-


renais

9 Ministério da Saúde. Diretrizes Clínicas para o Paciente com Doença Renal Crônica – DCR no Sistema Único
de Saúde (PCDT). Brasília, 2014. Disponível em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_clinicas_cuidado_paciente_renal.pdf.

10 Ministério da Saúde. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/d/doencas-


renais.

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pulmonares, insuficiência cardíaca, alterações mentais e, em último caso, para o óbito.11

Em nível ambulatorial, esses serviços de Terapia Renal Substitutiva são prestados


por meio de unidades de Atenção Especializada em Doenças Renais Crônicas, cujo
funcionamento segue a Portaria n. 1.675, de 7 de junho de 2018, do Ministério da Saúde,
que atualizou os critérios para a organização, funcionamento e financiamento do cuidado da
pessoa com Doença Renal Crônica - DRC no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS.

Essa Portaria estabelece como critérios para a organização e funcionamento do


cuidado da pessoa com doença renal crônica – DRC, a garantia da oferta de apoio
diagnóstico e terapêutico adequado para o tratamento da DRC, mediante o
desenvolvimento de medidas de promoção da saúde e que garantam a difusão das ações de
saúde à pessoa com DRC de forma compartilhada entre os entes federados.

É nesse sentido que dispõe:

Art. 61. A organização e o funcionamento do cuidado à pessoa com Doença Renal


Crônica na Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas observará
as seguintes diretrizes:
(…)
XII - garantia do acesso por meio da regulação de todas as modalidades de
tratamento dialítico." (NR)

Ao definir as atribuições no cuidado da pessoa com Doença Renal Crônica na Rede


de Atenção à Saúde, a citada Portaria n. 1.675/2018 do MS estabeleceu que, cabe ao
componente da Atenção Especializada (art. 63):
“Art. 63. São atribuições no cuidado da pessoa com Doença Renal Crônica na Rede
de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas:
(...)
II - do componente da Atenção Especializada:
a) realizar a atenção ambulatorial e hospitalar de forma multiprofissional e
intersetorial, de acordo com o documento das Diretrizes Clínicas para o

11 https://clinicaenne.com.br/estagios-da-insuficiencia-renal-cronica

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Cuidado ao paciente com DRC no SUS, incluindo a necessidade da Terapia


Renal Substitutiva - TRS, nas modalidades de hemodiálise e diálise peritoneal;
b) realizar o matriciamento pela equipe multiprofissional especializada em DRC a
partir da integração com as equipes da Atenção Básica;
c) disponibilizar carga horária adequada à realidade local para realizar o
matriciamento, mediante realização presencial ou à distância, ou por meio dos
Núcleos do Telessaúde, conforme definição e pactuação do gestor público de saúde;
d) diagnosticar, quando da necessidade de TRS-diálise, os casos com indicação
para procedimento cirúrgico da confecção de fístula arteriovenosa ou implante de
cateter para diálise peritoneal, conforme o documento das Diretrizes Clínicas para o
Cuidado à Pessoa com DRC no âmbito do SUS;
e) realizar a confecção da fístula artério venosa de acesso à hemodiálise ou o
implante de cateter para diálise peritoneal, conforme definição e pactuação do
gestor público de saúde;
f) garantir o encaminhamento ou transferência por meio da regulação de acesso de
urgência e emergência para hospital vinculado ao SUS de retaguarda para os casos
que necessitem de internação decorrente do tratamento dialítico;
g) manter comunicação com as equipes multiprofissionais dos demais componentes
da RAS;
h) manter o Sistema de Informação Ambulatorial - SIA/SUS - vigente atualizado e
com registro qualificado das informações pelos profissionais; e
i) prestar os primeiros atendimentos ao paciente nos casos de intercorrências
quando ocorrerem durante o processo dialítico, garantindo a estabilização do
paciente." (NR)”

Desse modo, tendo-se em vista a alta complexidade do serviço de saúde em exame,


a habilitação de seus prestadores compete ao Ministério da Saúde, que assim o fará conforme as
tipologias elencadas no art. 66 da Portaria n. 1.675/2018 do MS, quais sejam:
I - Atenção Ambulatorial Especializada em DRC nos estágios 3, 4 e 5 - Pré-
Dialítico - código 15.06;
II - Atenção Especializada em DRC com hemodiálise - código 15.04; e
III - Atenção Especializada em DRC com diálise peritoneal - código 15.05.

Esses serviços habilitados devem ofertar, dentre vários outros serviços


discriminados no art. 67 da Portaria em exame, atendimento ambulatorial aos pacientes que

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estão em processo de diálise, sob sua responsabilidade (inciso I) e ofertar uma ou mais das
modalidades de diálise (inciso II).

A referida portaria estabelece, ainda, que, para a habilitação dos estabelecimentos


de saúde como Atenção Especializada em Doença Renal Crônica, são as Secretarias
Estaduais de Saúde as responsáveis por encaminhar ao Ministério da Saúde, por meio do
Sistema de Apoio à Implementação de Políticas de Saúde – SAIPS (art. 75), o respectivos
requerimentos e informações. Prescreve, também, que o gestor público de saúde estadual
analisará a necessidade e os critérios estratégicos e técnicos dispostos e dará início ao
processo de habilitação. Vejamos:

Art. 75. Para a habilitação dos estabelecimentos de saúde como Atenção Especializada em
DRC, as Secretarias Estaduais de Saúde deverão encaminhar ao Ministério da Saúde,
por meio do Sistema de Apoio à Implementação de Políticas de Saúde - SAIPS, as
seguintes informações:
I - Resolução da Comissão Intergestores Bipartite - CIB - ou, no caso do Distrito Federal,
do Colegiado de Gestão da Secretaria de Saúde - CGSES/DF, ou da Comissão
Intergestores Regional - CIR, conforme deliberação em CIB, contendo:
a) tipo de habilitação com o respectivo código de habilitação, nome do estabelecimento de
saúde e CNES; e
b) valor do impacto financeiro mensal e anual segundo os valores dos procedimentos da
Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses/Próteses e Materiais Especiais do SUS,
anexando a memória de cálculo;
II - relatório de vistoria realizado pela vigilância sanitária local, onde conste a estrita
observância da RDC nº 11, de 13 de março de 2014, e cópia da licença de funcionamento; e
III - formulário para habilitação em Atenção Especializada em DRC, disponível via SAIPS.
§ 1º O processo de habilitação deverá ser formalizado pela Secretaria Estadual de
Saúde.
§ 2º O respectivo gestor público de saúde estadual analisará a necessidade e os
critérios estratégicos e técnicos dispostos e dará início ao processo de habilitação.
§ 3º A ausência da análise de que trata o § 2º impede a sequência do processo de
habilitação.
§ 4º Após a emissão do parecer favorável à habilitação pelo gestor público de saúde
estadual, o processo com a documentação comprobatória ficará na posse do gestor do SUS,
disponível ao Ministério da Saúde para fins de supervisão e auditoria. " (NR)

Cumpre mencionar, ainda, que, com a publicação da Portaria nº 3.603, de


22 de novembro de 2018, do Ministério da Saúde, os procedimentos relacionados à Terapia

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Renal Substitutiva -TRS cobrados por meio de autorização de procedimentos ambulatoriais -


APAC são
financiados, em sua totalidade, por meio do fundo de ações estratégicas e compensação –
FAEC, ou seja, Ministério da Saúde. Vejamos:

Art. 1º Fica estabelecido que os procedimentos relacionados à Terapia Renal


Substitutiva-TRS, cobrados por meio de Autorização de Procedimentos
Ambulatoriais - APAC, sejam financiados, em sua totalidade, por meio do Fundo
de Ações Estratégicas e Compensação - FAEC.
Art. 2º Fica definido que os recursos financeiros para o financiamento dos procedimentos
de que trata o art. 1º serão transferidos mensalmente aos Estados, Distrito Federal e
Municípios, após a apuração da produção registrada no Sistema de Informações
Ambulatoriais - SIA.

Em observância às Portarias citadas, neste Estado da Federação, compete à


Secretaria de Estado de Saúde adotar providências necessárias para organizar, planejar e
implantar a Rede Estadual de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Renais Crônicas e
promover o acompanhamento para execução do fluxo de atendimento e garantia de acesso às
ações e aos serviços de saúde em nível primário ao paciente portador de doença renal crônica,
nos níveis ambulatorial e hospitalar. Cabe-lhe, igualmente, formalizar o processo de habilitação
dos estabelecimentos de saúde como Atenção Especializada em Doença Renal Crônica,
encaminhando-o ao Ministério da Saúde, por meio do Sistema de Apoio à Implementação de
Políticas de Saúde – SAIPS.

Já o fluxo de acesso a essas unidades especializadas, no caso concreto em exame,


é regulado pela gestão municipal, conforme pactuação da Programação Pactuada Integrada –
PPI, sendo a responsável pelo contrato de prestação de serviços de Terapia Renal Substitutiva.

É relevante – tendo em vista as situações que vem sendo enfrentadas pelos


pacientes renais crônicos das Regiões de Saúde de Itabaiana e Glória apurados pelo MPF –
destacar que o referido fluxo de pacientes aos atendimentos ambulatoriais deve ocorrer de

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forma regionalizada, cabendo ao Estado prestar apoio institucional às Secretarias


Municipais de Saúde e realizar a articulação interfederativa voltada à garantia da
universalidade e da integralidade do cuidado, consoante disposto na Portaria nº 483, de 1º de
abril de 2014, do Ministério da Saúde.

A regionalização está prevista na NOAS-SUS n. 01/2002 (editada pela Portaria


GM/737, de 27/2/2002 e resultante de pactuação entre os gestores de saúde de todos os níveis
federativos, aprovada pela Comissão Intergestores Tripartite – CIT e pelo Conselho Nacional
de Saúde – CNS) como principal estratégia de hierarquização dos serviços de saúde, na busca
da maior equidade, mediante a elaboração de um Plano Diretor de Regionalização – PDR.

O item 3 da norma preconiza que:

“3. O PDR fundamenta-se na conformação de sistemas funcionais e resolutivos de


assistência à saúde, por meio da organização dos territórios estaduais em
regiões/microrregiões e módulos assistenciais; da conformação de redes hierarquizadas de
serviços; do estabelecimento de mecanismos e fluxos de referência e contra-referência
intermunicipais, objetivando garantir a integralidade da assistência e o acesso da
população aos serviços e ações de saúde de acordo com suas necessidades. ”

Prescreve, ainda, a NOAS-SUS n. 01/2002 (Portaria GM/737, de 27/2/2002), o


acesso dos cidadãos aos serviços de saúde, o mais próximo possível de sua residência, bem
como o acesso de todos os cidadãos aos serviços necessários à resolução de seus problemas
de saúde, em qualquer nível de atenção, diretamente oumediante o estabelecimento de
compromissos entre os gestores para o atendimento de refereências intermunicipais.

Após fornecer os conceitos-chaves a serem utilizados na implantação dos PDRs no


item 5, a NOAS estabelece, no item 6.1.1, alínea b, que o PDR deve contemplar a perspectiva
de redistribuição geográfica de recursos tecnológicos e humanos, explicitando o desenho
futuro e desejado da regionalização estadual, prevendo os investimentos necessários para a
conformação destas novas regiões/microrregiões e módulos assistenciais, observando assim a

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diretriz de possibilitar o acesso do cidadão a todas as ações e serviços necessários para a


resolução de seus problemas de saúde, o mais próximo possível de sua residência.

Assim, o Estado, através da Secretaria Estadual de Saúde, é a instância de


competência para operacionalização da regionalização, ou seja, na medida em que esta deixe
de funcionar adequadamente, cabe ao ente estadual coordenar todas as mudanças, de forma
a “garantir o acesso a todas as ações e serviços de saúde necessários, otimizando os recursos
disponíveis”12.

Ocorre que, conforme apurações realizadas, não houve


ampliação da oferta de serviços de TRS, tampouco houve repactuação permanente e estável da
regionalização da assistência operacionalizada no Estado de Sergipe, adontando-se apenas
medidas emergenciais de “encaixe” de alguns pacientes que dependem da “cordialidade” de
outros Municípios que porventura disponham de alguma vaga para ceder às regionais de saúde
de Itabaiana e Glória.

Conforme narrado, no caso específico das Regiões de Saúde de Itabaiana e Nossa


Senhora da Glória, o Centro de Nefrologia Ltda (Clínica do Rim) é o serviço habilitado pelo
Ministério da Saúde como Unidade de Atenção Especializada em Doença Renal Crônica para
atender à população dos 23 Municípios que as integram.

Conforme restou apurado no âmbito do Procedimento nº 1.35.000.001094/2021-04,


o referido serviço é habilitado para o tratamento ambulatorial em TRS nas modalidades de
hemodiálise (15.04) e diálise (15.05), e possui registrada no CNES 26 (vinte e seis) máquinas
para hemodiálise, das quais apenas 24 (vinte e quatro) estão em pleno funcionamento, de modo
que no momento a unidade tem capacidade de ofertar atendimento a 130 (cento e trinta)
pacientes. Além disso, como restou verificado após diligências apuratórias, o serviço se

12 Ministério da Saúde. NOAS-SUS n. 01/2002 (Portaria GM/737, de 27/2/2002)

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encontra saturado (sempre com as vagas preenchidas), não suportando a admissão de


novos pacientes (aumento da demanda), e tampouco possui capacidade de expansão, o
que vem acarretando filas de espera que podem significar, para aqueles que nelas
aguardam, uma sentença de morte.

Com efeito, constatou-se um cenário de demanda crescente por serviços de


saúde especializados em DRC no Município de Itabaiana (cidade de referência para TRS
para todos os Municípios que integram as regiões de Saúde de Itabaiana e Glória), a qual
não vem sendo suportada, de forma visível, pelos serviços habilitados pelo Ministério da
Saúde, a requerimento do Estado (e segundo sua coordenação e planejamento da Rede
Estadual) e geridos pelo Município.

Os elementos de prova coligidos evidenciam uma necessidade urgente de


ampliação da oferta de vagas para realização de hemodiálise/diálise peritoneal em nível
ambulatorial para os pacientes das duas Regiões de Saúde citadas, seja através da
ampliação do serviço já contratado pelo Município de Itabaiana (o que o prestador afirma
ser impossível), seja através da ampliação de outro serviço já habilitado para atender a
outra região de saúde de Sergipe, seja através da habilitação de novas unidades de saúde.

Por isso é possível afirmar que todas as esferas de gestão do SUS


vem falhando em proporcionar uma solução para a insuficiência dos serviços disponibilizados à
população das Regiões de Saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória, sendo uma
incumbência solidária da União, do Estado e do Município de Itabaiana, enquanto gestores
públicos de saúde, o monitoramento e avaliação dos estabelecimentos de saúde habilitados,
consoante disposição da Portaria n. 1.675, de 8 de junho de 2018, do Ministério da Saúde, a
saber:

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Art. 86. Os estabelecimentos de saúde habilitados em Atenção Especializada em


DRC no âmbito do SUS serão submetidos à regulação, controle e avaliação dos
seus gestores públicos de saúde. " (NR)

"Art. 87. Os gestores públicos de saúde possuem as seguintes atribuições:

I - avaliar a estrutura e equipe dos estabelecimentos por eles autorizados para


prestar o cuidado;

II - avaliar a compatibilidade entre o número de casos esperados para a


população atendida, o número de atendimentos realizados e o número de
procedimentos faturados, observando também a distribuição numérica
esperada dos procedimentos - consultas e acompanhamentos/tratamentos;

III - avaliar a qualidade dos serviços prestados pelos estabelecimentos; e


(...)”

Cumpre reiterar que a ampliação da cobertura ao atendimento às Terapias Renais


Substitutivas, de responsabilidade solidária entre os entes federados, é estabelecida pela
Política Nacional de Atenção ao Portador de Doença Renal, instituída pela Portaria n. 1.168, de
15 de junho de 2004 pelo Ministério da Saúde, vejamos:

Art. 2° Estabelecer que a Política Nacional de Atenção ao Portador de Doença


Renal seja organizada de forma articulada entre o Ministério da Saúde, as
Secretarias de Estado da Saúde e as Secretarias Municipais de Saúde,
permitindo:
(…)
V - ampliar cobertura no atendimento aos portadores de insuficiência renal
crônica no Brasil, garantindo a universalidade, a equidade, a integralidade, o
controle social e o acesso às diferentes modalidades de Terapia Renal
Substitutiva (diálise peritoneal, hemodiálise e transplante);

Ademais, consoante previsto no art. 3º, inciso VI, da citada Portaria, a regulação, a
fiscalização e o controle das ações de atenção ao portador de doença renal são de
competência das três esferas de governo.

Nesse aspecto, há que se destacar, mais uma vez, que tramita no Ministério da

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Saúde (MS) proposta de habilitação do Hospital Nossa Senhora da Conceição como Atenção
Especializada em DRC com Hemodiálise (15.04), localizado no município de Lagarto/SE e sob
gestão estadual, e que já foi, inclusive, aprovada no âmbito da Coordenação-Geral de
Assistência Especializada do Ministério da Saúde. Todavia, conforme informado pelo
próprio MS, a solicitação encontra-se sobrestada desde 13/09/2021 na Coordenação-Geral de
Controle de Serviços e Sistemas aguardando orçamento.

Conforme pontuado pelo Estado de Sergipe nos documentos acostados aos autos do
Inquérito Civil, a habilitação do referido Hospital como Serviço de Atenção Especializada em
DRC, ainda que apenas para a modalidade hemodiálise e voltada ao atendimento dos pacientes
da Regional de Saúde de Lagarto, seria de grande importância para liberar vagas nos serviços
habilitados no Município de Aracaju (que atualmente é a responsável pelo atendimento dos
pacientes dos Municípios que integram a Regional de Saúde de Lagarto). Com isso, a
Secretaria de Estado da Saúde sustenta que haveria um impacto positivo no que toca à
saturação do atendimento dos pacientes renais crônicos pelo Centro de Nefrologia (Clínica do
Rim), já que, havendo disponibilidade de vagas nos serviços habilitados em Aracaju, seria
possível uma repactuação, no âmbito da PPI, entre os entes federativos, de modo a direcionar as
demandas excedentes das Regionais de Itabaiana e/ou Glória à capital sergipana. Isso porque,
conforme afirmando pela própria Secretaria de Estado da Saúde, mais de 90% da demanda dos
pacientes na fila de espera é para a modalidade hemodiálise e o serviço, uma vez habilitado,
atenderá cerca de 100 pacientes clínicos por mês, extinguindo as atuais filas de espera.

Vale a menção, dentro do contexto da matéria trazida à apreciação judicial, que de


acordo com os gestores locais do SUS, bem como com o relatado no Ofício 044/2021, oriundo
do Centro de Nefrologia de Itabaiana (único serviço habilitado para atender aos 23 Municípios
das regionais de Itabaiana e Glória), há uma defasagem dos recursos federais repassados no
âmbito do Sistema Único de Saúde, que não são atualizados desde 2017, e comprometem a
prestação do serviço de diálise no país, quadro esse agravado pela pandemia do coronavírus,

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devido ao significativo aumento de preço dos insumos hospitalares.

Com efeito, o tema do histórico subfinanciamento da saúde é amplamente debatido


no país e, aliado à grave crise financeira gerada pela falta de reajuste nos valores dos
procedimentos pagos pelo SUS, projetam um cenário de desalento para os pacientes renais
crônicos cuja vida depende do tratamento fornecido pelas clínicas contratadas.

A defasagem dos valores constantes na tabela do SUS para a sessão de hemodiálise


é, inclusive, destacado na imprensa13 14, bem como o seu agravamento em razão da pandemia 15,
e configura um dos fatores contributivos para o cenário de instabilidade no serviço prestado,
não só no estado de Sergipe, mas como em todo o Brasil.

Nesse sentido, a Portaria nº 98, de 6 de janeiro de 2017, do Ministério da Saúde que


estabeleceu a última alteração dos valores de procedimentos de Terapia Renal Substitutiva no
Sistema Único de Saúde, elencou para uma sessão de hemodiálise o valor de R$ 194,20 (cento
e noventa e quatro reais e vinte centavos). De acordo com a Associação Brasileira dos Centros
de Diálise e Transplante (ABCDT)16, faz-se necessário um reajuste para que seja possível
garantir um reequilíbrio financeiro das clínicas conveniadas aos SUS e o seu devido
funcionamento.

Na esteira do raciocínio aqui delineado, depreende-se que, além do problema


delimitado nesta petição, de insuficiência dos serviços disponibilizados pela União, Estado

13 https://www.camara.leg.br/noticias/556048-debatedores-reclamam-de-defasagem-nos-valores-da-
tabela-do-sus/
14 https://www.anahp.com.br/noticias/noticias-do-mercado/ministerio-da-saude-congela-tabela-do-sus-
para-dialise/
15 https://oglobo.globo.com/epoca/brasil/covid-19-acentua-crise-do-setor-de-hemodialise-140-mil-brasileiros-
correm-risco-sem-tratamento-24934888

16 https://portalhospitaisbrasil.com.br/dia-d-da-dialise-2021-reivindica-reajuste-de-46-na-tabela-sus-2/

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e Municípios à população das Regionais de Saúde de Itabaiana e Glória há, também, uma
verdadeira deficiência sistêmica na prestação do serviço de saúde ao paciente portador de
doença renal crônica no âmbito do Sistema Único de Saúde, seja em razão da insuficiência dos
serviços habilitados, contratados e pactuados pelos gestores do SUS para atendimento da
demanda, seja em razão da falha na promoção da saúde através da coordenação e planejamento
da Rede Estadual de Cuidados aos pacientes com doenças crônicas, assim como na regulação
dos pacientes que se encontram em fila de espera, seja em função do subfinanciamento do SUS,
decorrente da defasagem dos recursos repassados pelo Ministério da Saúde para o custeio da
TRS.

Assim, não há dúvida quanto ao dever das três esferas de gestão do SUS
(Federal, Estadual e Municipal) de fornecer os serviços de Terapia Renal Substitutiva, em
especial hemodiálise, para todos aqueles que necessitam semanalmente sem que, para isso,
– por exemplo – tenham que permanecer internados em hospitais a fim de garantir o seu lugar,
em constante e desnecessário contato com o ambiente contaminado e utilizando um leito que
poderia ser utilizado por outro paciente, que realmente dele necessite naquele momento.

De outro giro, há muito os Tribunais Superiores possuem firme posicionamento


quanto à solidariedade dos entes federativos no que concerne ao direito à saúde, de maneira
que, para assegurá-lo, quaisquer deles podem ser demandados judicialmente, isolada ou
conjuntamente, nos termos dos seguintes precedentes:

STF - Tema de Repercussão Geral nº 793


Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são
solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e
diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização,
compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras
de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou
o ônus financeiro.
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PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.


FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. SÚMULA 7/STJ AFASTADA.
OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA. LEGITIMIDADE DO ESTADO-MEMBRO.
ORIENTAÇÃO RATIFICADA PELO STF. TEMA 793/STF. RECURSO NÃO
PROVIDO. 1. No caso, não houve controvérsia nos autos sobre o fato de o
recorrente efetivamente necessitar do uso da medicação que lhe foi prescrita. A
recusa apresentada pelo ente público em fornecê-la fundamentou-se nos critérios de
repartição das responsabilidades administrativas entre os entes federativos que
integram o SUS. Em tal contexto, a discussão travada no apelo especial possui
natureza eminentemente de direito, devendo-se afastar o óbice da Súmula 7/STJ. 2.
É pacífico na jurisprudência o entendimento segundo o qual a União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios possuem responsabilidade solidária
nas demandas prestacionais na área de saúde, o que autoriza que sejam
demandados isolada ou conjuntamente pela parte interessada. 3. A ressalva
contida na tese firmada no julgamento do Tema 793 pelo Supremo Tribunal
Federal, quando estabelece a necessidade de se identificar o ente responsável a
partir dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização do
SUS, relaciona-se ao cumprimento de sentença e às regras de ressarcimento
aplicáveis ao ente público que suportou o ônus financeiro decorrente do
provimento jurisdicional que assegurou o direito à saúde. Entender de maneira
diversa seria afastar o caráter solidário da obrigação, o qual foi ratificado no
precedente qualificado exarado pela Suprema Corte. 4. Agravo interno a que se
nega provimento. (AgInt no REsp 1043168/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES,
SEGUNDA TURMA, julgado em 05/03/2020, DJe 17/03/2020). [grifamos]

Diante de toda a argumentação trazida, resta claro que o Sistema Público de Saúde
brasileiro foi criado para oferecer um atendimento adequado à população, devendo
proporcionar os tratamentos de saúde indicados para atender a demanda da coletividade.

No caso em epígrafe, essa garantia se traduz no direito de todos os pacientes


com doença renal crônica (DRC) receberem tratamento adequado (universal, integral e
com regionalização), com suporte médico que lhes ampliem as chances de vida digna,
mediante vaga para tratamento ambulatorial nas modalidades de hemodiálise ou diálise
pelo Sistema Único de Saúde.

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Ora, a partir do arcabouço constitucional e infraconstitucional aqui delineado, resta


clara a total inadmissibilidade da permanência do quadro fático narrado na exordial, urgindo a
necessidade de que os demandados, cada um em sua esfera de atribuições, garantam o
acesso dos pacientes portadores de doença renal crônica dos Municípios que integram as
Regiões de Saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória vagas para o tratamento
especializado em DRC em nível ambulatorial, seja através da ampliação dos serviços de
saúde já habilitados, seja através da habilitação de novos serviços, seja através da repactuação e
regulação dos pacientes que se encontram em fila de espera para outras Regionais de Saúde do
estado, observada a necessária regionalização da assistência..

Nessa esteira, ressalta-se que o princípio da proporcionalidade, na sua vertente de


vedação à proteção deficiente, exige que sejam tomadas as medidas adequadas, necessárias e
eficientes para resguardar os direitos fundamentais em risco (à vida e à saúde), com a adequada
disponibilização de vagas para Terapia Renal Substitutiva (TRS) em nível ambulatorial para
pacientes renais crônicos no estado de Sergipe. A vinculação principiológica limita a liberdade
de atuação do gestor, demandando-se o controle pelo Poder Judiciário, que no caso mostra-se
inafastável tendo-se em vista o risco à vida dos pacientes que aguardam atendimento em filas de
espera.

IV. DO PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA

Dispõe o artigo 12 da Lei da Ação Civil Pública que o juiz pode conceder mandado
liminar, antecipando os efeitos da tutela pretendida, nos termos do artigo 300 do Código de
Processo Civil, observado o artigo 19 da Lei n.º 7.347/85, com ou sem justificação prévia,
desde que exista prova inequívoca dos fatos, diante da verossimilhança das alegações e fundado
receio de dano irreparável.

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Os artigos 11 e 12 da Lei n. 7.347/85, preveem de forma taxativa a possibilidade de


requerimento de tutela de natureza cautelar ou antecipada, in verbis:

Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o
juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade
nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente
ou compatível, independentemente de requerimento do autor.

Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão
sujeita a agravo.

A tutela antecipada nada mais é que um instrumento processual que objetiva


conferir ao autor, de maneira imediata e desde que se encontrem presentes os requisitos de
natureza objetiva, parte ou totalmente a prestação jurisdicional que lhe seria conferida apenas
por ocasião da sentença.

Já o Código de Processo Civil no seu art. 300 e 303 dispõe que:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que
evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil
do processo.
§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução
real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer,
podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder
oferecê-la.
§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo
de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Assim, observa-se que os requisitos para concessão da antecipação dos efeitos da


tutela sõ: a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil.

No presente caso, resta evidente a atuação deficiente dos réus em garantir aos
pacientes com doença renal crônica o direito fundamental à saúde, consubstanciado no acesso
aos serviços de atenção especializada, em especial as terapias renais substitutivas (TRS),
consisentes em hemodiálise e diálise peritoneal, em nível ambulatorial, aos pacientes dos 23

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Municípios que compõe as Regionais de Saúde de Itabaiana/SE e Nossa Senhora da Glória/SE.


Com efeito, as evidências reunidas nesta petição e no procedimento apuratório que a
acompanha demonstram que os serviços de TRS disponibilizados pela União, Estado e pelo
Município de Itabaiana, através da Clínica do Rim (Centro de Nefrologia Ltda) são
insuficientes para atender à atual demanda, encontrando-se permanentemente saturado e
tornando muito difícil a admissão de novos pacientes. Diante disso, forma-se uma fila de
pacientes que aguardam admissão no único serviço habilitado pelo Ministério da Saúde
no Município de referência (Itabaiana/SE), causando graves prejuízos à saúde e colocando
em risco a vida dessas pessoas.

Isso porque, como detalhado nos itens anteriores, a inexistência de vagas no único
serviço habilitado para atender a essas 2 regionais de saúde faz com que diversos pacientes
que se encontravam internados em hospitais, mas que já estão com alta médica, sejam
mantidos internados por diversos dias (em alguns casos, mais de mês) apenas para que lhe
possa ser garantido o acesso à hemodiálise. Com isso, dezenas de pacientes ao longo dos
meses permaneceram e permanecem internados por longos e desnecessários períodos, longe de
seu domicílio e família. Nem é preciso lembrar que a manutenção de um paciente em regime de
internação, sem que tal situação seja imprescindível, aumenta desnecessariamente o grau de
exposição a inúmeros agentes patológicos sabidamente existentes no ambiente hospitalar
(risco de infecções).

Logo, é inaceitável que tenhamos pessoas “vivendo” dentro do hospital pela falta
de vagas no procedimento de diálise semanal. Além de tolher direitos fundamentais desses
cidadãos, privados de retornar a sua rotina e convívio familiar, submetendo-o ao risco de
infecções e etc, há também gravames para a Administração Pública, já que mantém gastos com
a manutenção da internação, com alimentação, funcionários, leito, água luz, quando o caso era
de alta médica. É de bom alvitre lembrar, ainda, que esses leitos hospitalares – ocupados por

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aqueles que não precisam estar internados, mas necessitam da hemodiálise – poderiam estar
sendo usados por outros pacientes que necessitem efetivamente de internação.

Há, também, a situação dos pacientes renais crônicos que não estão internados mas
recebem prescrição médica de início imediato da hemodiálise semanal. Quanto a estes, o
tratamento vem sendo simplesmente adiado até que ocorra o surgimento de vaga.

Além disso, a atual insufiência dos serviços gera a preocupante a situação dos
pacientes que, por falta de vaga no Município de Itabaiana (seu Município de Referência, de
acordo com as pactuações interfedereativas na PPI), são realocados em outras regiões de saúde
(e até em outros Estados) para realizar o tratamento de que necessitam de forma imediata. Essa
situação leva esses pacientes a realizar viagens longas e desgastantes várias vezes na semana
para ter acesso à hemodiálise, quando deveriam estar ao menos realizando o tratamento dentro
de sua regional de saúde, ainda que fora de seu Município, reduzindo, assim, as distâncias a
serem percorridas.

Há, portanto, substancial demonstração não apenas do fumus


boni iuris, mas também do periculum in mora, já que a eventual concessão da tutela
jurisdicional pretendida apenas ao final do processo enseja risco de elevada monta e gravidade,
pois os pacientes que precisam do serviço de hemodiálise semanal correm risco de vida
iminente caso não realizam a terapia renal substitutiva nos moldes prescritos pela autoridade
médica como necessários para sua condição. Além disso, há o risco a que estão submetidos os
pacientes que permanecem internados em hospitais, mesmo estando de alta, para garantir a
realização da hemodiálise, já que não há vagas no serviço ambulatorial, sujeitos a contrair
infecções e outras patologias, comumemnte existentes no ambiente hospitalar, bem como de
eventuais danos psicológicos pela privação prolongada de suas atividades habituais e cículo
social/familiar. Como apontado, tais vagas deveriam estar sendo ocupadas por aqueles que,

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naquele momento, efetivamente necessitam de internação hospitalar, tratando-se de situação


multidanosa.

Nesses termos, deve-se ponderar que, a despeito do teor do art. 300 do CPC, as
circunstâncias acima narradas são demasiados gravosas para que se impute integralmente aos
pacientes renais crônicos o ônus do tempo do processo. Assim, a irreversibilidade da tutela de
urgência debe ser ponderada, nesse caso, sob pena de tornar permanentes danos gravíssimos e
também irreversíveis à vida e à saúde dessas pessoas.

Não podemos deixar de chamar atenção para o fato de que, no último expediente
(DOC. 12), encaminhado pela SMS – Itabaiana ao MPF, em 19/10/2021, contendo em anexo
tabela discriminando a fila de pacientes à espera de vagas, contava-se 31 (trinta e um)
pacientes aguardando admissão para tratamento em nível ambulatorial no Centro de
Nefrologia, no município de Itabaiana, sendo que 9 estavam internados em Hospitais
(mesmo estando aptos para alta hospitalar), 3 em acompanhamento ambulatorial (sem
realizar hemodiálise) (ou seja, aguardavam em casa) e 19 pacientes haviam sido
remanejados para tratamento ambulatorial em outras regionais de saúde, como a de
Aracaju, e até em outros Estados, como São Paulo e Pernambuco.

Tudo em desconformidade com a legislação e as normativas do SUS e com a


Constituição Federal.

Não é demais lembrar que o fluxo de pacientes para acesso aos serviços de alta
complexidade, como é a atenção especializada em DRC por meio das Terapias Renais
Substitutivas (TRS), deve ocorrer de forma regionalizada, conforme previsto na NOAS-SUS
n. 01/2002 (editada pela Portaria GM/737, de 27/2/2002 quando prescreve, inclusive, o acesso
dos cidadãos aos serviços de saúde o mais próximo possível de sua residência, bem como o
acesso de todos os cidadãos aos serviços necessários à resolução de seus problemas de

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saúde, em qualquer nível de atenção, diretamente ou mediante o estabelecimento de


compromissos entre os gestores para o atendimento de refereências intermunicipais.

A análise de todo esse cenário torna evidente a necessidade de abrir mais vagas
para terapia renal substitutiva (TRS), em especial hemodiálise, em nível ambulatorial,
para os pacientes das Regionais de saúde de Itabaiana e Glória, uma vez que os serviços
contratados e disponibilizados já não se mostram suficientes para atender à demanda gerada
pela população dos 23 municípios que as integram. É evidente que mesmo nos casos daqueles
que conseguem “encaixes” para realizar hemodiálise/diálise em outras regionais de Saúde,
como Aracaju, estão ocupando a vaga de pacientes renais crônicos de outras regionais (que
possuem Aracaju como referência), cuja criação, mediante habilitação dos respectivos serviços
de atenção especializada em DRC, deu-se com base em determinados critérios demográficos e
de saúde pública. Assim, o simples direcionamento dessa demanda a outras regionais, de
forma emergencial e provisória, não soluciona o problema ora exposto. Ademais,
conforme demonstrado, não elimina a fila de espera, nem a situação dos pacientes
internados apenas para receber hemodiálise.

Acrescente-se que as tratativas extrajudiciais se mostraram insuficientes ao


equacionamento do problema, bastando frisar, pelos números da fila de espera de pacientes
renais crônicos das regionais de Itabaiana e Glória acima discriminada (DOC. 12), que a rede
de saúde regional, e também a rede estadual como um todo, não possui capacidade imediata e
resolutiva de absorção da demanda excedente para tratamento de TRS.

Por tais razões, em sede liminar, é preciso alocar e criar vagas, ainda que
emergenciais, aos pacientes que compõe a demanda excedente das Regionais de Saúde de
Itabaiana e Nossa Senhora da Glória. Tal demanda excedente, de acordo com o último
expediente ( (DOC. 12), encaminhado pela SMS – Itabaiana ao MPF, em 19/10/2021, pode ser
estimada em 30% da capacidade atual do serviço habilitado pelo Ministério da Saúde e

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contratado pelo Município de Itabaiana (que atende 130 pacientes/mês), já que a tabela anexa
discriminando a fila de pacientes à espera de vagas, contava-se 31 (trinta e um) pacientes
aguardando admissão para tratamento em nível ambulatorial no Centro de Nefrologia,
no município de Itabaiana.

Não há dúvidas de que todas as esferas de gestão do SUS vem falhando na


implementação de uma solução célere e eficiente acerca do deficit dos serviços de hemodiálise/
diálise nas regionais de Itabaiana e Glória.

A União, principal financiadora desses serviços públicos de Alta Complexidade,


necessita aumentar o custeio de TRS em Sergipe, de modo a viabilizar a criação de novas vagas
que possam absorver a demanda excedente das Regiões de Saúde de Itabaiana e N. Sra. da
Glória, ou seja, aquela que já não é absorvida pelo único serviço habilitado e contratado para
tanto (Clínica do Rim/Centro de Nefrologia).

O Estado por sua vez, sendo o coordenador da organização e planejamento dos


cuidados aos renais crônicos sergipanos, também está falhando ao não apresentar uma solução
satisfatória para o caso em exame, fornecendo apenas auxílio pontual, com soluções
provisórias, como o “encaixe” do paciente das regionais de Itabaiana e Glória em serviços
habilitados para outras regiões de saúde como Aracaju e Estância. Com efeito, compete ao
Estado solicitar a habilitação de mais vagas para essa região ou prestar diretamente esses
serviços, buscando financiamento federal.

O Município de Itabaiana por sua vez, tendo assumido a obrigação de contratar e


gerir os serviços de TRS para a população das regionais de Itabaiana e Glória, para as quais é
referência no âmbito do SUS, não demonstrou ter exigido do prestador do SUS (Clínica do
Rim) o funcionamento completo das máquinas que deveriam estar disponíveis para
atendimento, já que 2 delas se encontram quebradas, reduzindo ainda mais a oferta de vagas e

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dificultando ainda mais a admissão de novos pacientes. Além disso, diante de eventual
impossibilidade de ampliação do serviço de TRS pelo prestador contratado, cabe-lhe buscar,
junto ao Estado, que viabilize junto ao Ministério da Saúde a habilitação de um novo serviço ou
buscar, sob coordenação estadual, a pactuação estável com outras regiões de saúde para
atendimento de sua demanda excedente, eliminando as filas,

É insustentável a disponibilização de um serviço de TRS à população que está


sempre saturado. Dada a sua imprescindibilidade para manutenção da própria vida daqueles
que necessitam desses tratamentos de forma imediata, esses serviços necessitam ter sempre
vagas abertas para novos pacientes que precisem iniciar imediatamente o tratamento. Afinal,
como é sabido, pacientes com a função renal criticamente comprometida necessitam, para sua
sobrevivência, dar início urgente à hemodiálise ou diálise, sob pena de agravamento da doença
e evolução do quadro clínico para edemas pulmonares, problemas cardíacos, alterações mentais
e, em último caso, para o óbito.

Observa-se, portanto, a necessidade urgente da ampliação das vagas disponibilizadas


na Atenção Especializada em DRC pelo Sistema Único de Saúde em Sergipe à população das
regionais de saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória, a ser materializada na forma do
requerimento de tutela de urgência formulado no item seguinte.

V. DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer:

V.1. Que seja deferida a TUTELA ANTECIPADA DE URGÊNCIA EM


CARÁTER LIMINAR para determinar aos réus que sejam compelidos a cumprir as seguintes
obrigações:

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a) adotar providências necessárias, cada um em sua esfera de atribuições, para que


sejam imediatamente disponibilizadas vagas para todos os pacientes das Regionais de Saúde
de Itabaiana/SE e Glória/SE que se encontram atualmente em fila de espera para admissão no
serviço habilitado em Atenção Especializada em Doenças Renais Crônicas no Município de
Itabaiana (Centro de Nefrologia) para fins de realização de Terapia Renal Substitutiva em nível
ambulatorial e que: a.1) estejam internados em hospitais, já aptos para receber alta; a.2)
estejam em acompanhamento ambulatorial sem receber hemodiálise/diálise; devendo
comprovar nos autos, no prazo de 10 dias, a demonstração da efetiva operacionalização do
acesso ao serviço, demonstrando o fluxo de absorção da demanda, a lista de pacientes
regulados e referenciados, rol de todos os procedimentos realizados e prova da execução dos
serviços;

b) Caso a vaga disponibilizada nos termos do item “a” esteja localizada em Município
diverso daquele em que resida ou esteja internado o paciente, que seja fornecido transporte, caso
necessário (sem prejuízo de posterior compensação entre os entes federativos e o Município de
residência do paciente);

c) Que adotem as providências necessárias, cada um em sua esfera de atribuições


(financiamento, coordenação, acompanhamento, habilitação, contratação, regulação etc), no prazo
de 30 dias, para a ampliação dos serviços de atenção especializada em doenças renais crônicas,
em especial a disponibilização de terapias renais substitutivas (hemodiálise/diálise peritoneal)
para atender a demanda excedente das Regiões de Saúde de Itabaiana/SE e Nossa Senhora da
Glória/SE, que já não é absorvida pelo Centro de Nefrologia, estimada a necessidade de ampliação
(conforme detalhado no item IV da inicial) em 30% da capacidade atual do serviço habilitado pelo
Ministério da Saúde e contratado pelo Município de Itabaiana (que atende 130 pacientes/mês);

d) Alternativamente ao item “c”, que seja a União obrigada a concluir o processo de


habilitação da Associação Hospitalar de Sergipe (Hospital Nossa Senhora da Conceição),
entidade privada filantrópica, situada no município de Lagarto, em Atenção Especializada em DRC

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(Doença Renal Crônica) com hemodiálise (código 15.04), CNES nº 2421518, CNPJ:
13.366.414/0001-80, requerida pelo Estado de Sergipe (SAIPS proposta n. 148795), já aprovada
no âmbito da Coordenação Geral de Atenção Especializada, do Ministério da Saúde, de modo a
viabilizar o surgimento de vagas nos serviços de TRS habilitados no Município de Aracaju e,
assim, a pactuação para absorção da demanda excedente das Regionais de Saude de Itabaiana e
Nossa Senhora da Glória/SE;

e) que seja determinado à União que efetue o aporte de recursos federais necessários
ao custeio da disponibilização de vagas requerida no item “a”, bem como à ampliação requerida no
item “c”, nos mesmos prazos requeridos em cada um dos itens citados, através do aumento do
repasse dos recursos do FAEC (Fundo de Ações Estratégicas e Compensação) em prol do ente
público que realize a correspondente contratação/ prestação dos serviços;

f) que seja determinado ao Município de Itabaiana, contratante dos serviços de Terapia


Renal Substitutiva (TRS) prestados aos pacientes das Regionais de Saúde de Itabaiana e Nossa
Senhora da Glória pelo Centro de Nefrologia ltda (Clinica
do Rim), que adote todas as providências no sentido de exigir do contratado o integral
cumprimento do pactuado, com o funcionamento completo das máquinas que deveriam estar
disponíveis para atendimento de acordo com o CNES (de acordo com o CNES, a Clínica do Rim
conta com 26 equipamentos e atende em média 139 pacientes/mês pelo SUS), como forma de
amenizar a escassez de vagas para admissão de novos pacientes que necessitam de TRS, em
especial hemodiálise, comprovando documentalmente nos autos, no prazo de 10 dias, as medidas
adotadas;

g) que seja ordenada, para cumprimento da decisão, a critério desse Juízo, a intimação
pessoal/por telefone/correio eletrônico, mediante certidão, dos demandados, tendo em vista a
extrema urgência da matéria;

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h) caso não sejam cumpridas as determinações acima, que seja arbitrada multa diária
por descumprimento para cada ente público, a ser revertida ao Fundo Federal de Proteção aos
Direitos Difusos ou aplicada a outra destinação social para resolução de demanda de saúde pública,

i) caso não ocorra o cumprimento espontâneo da obrigação de fazer em tela, requer-se,


desde logo, que seja determinado o bloqueio via BACENJUD nas contas dos demandados, do valor
necessário para o cumprimento das obrigações em exame, estimado (conforme detalhado no item
IV desta petição) em 30% dos serviços atualmente prestados pelo prestador do SUS contratado pelo
Município de Itabaiana (Centro de Nefrologia), cujo valor anual do contrato é de R$ 5.400.000,00
(cinco milhões e quatrocentos mil reais);

V.2. Requer a citação dos réus para contestar, querendo, a presente ação, no prazo
legal, sob pena de revelia;

V.3. Ao final, requer-se como TUTELA DEFINITIVA, que sejam julgados


procedentes os pedidos, para:

a) confirmar os pedidos de tutela antecipada de urgência (item V.1), tornando-os


definitivos para o cumprimento das obrigações descritas nas alíneas anteriores por parte dos
réus;

b) condenar os requeridos a, no prazo de 30 dias, cumprir obrigação de fazer, de forma


solidária, consistente em ampliar os serviços de Terapia Renal Substitutiva, em nível ambulatorial,
disponibilizados aos usuários do SUS das Regiões de Saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da
Glória, de forma absorver a totalidade da demanda, extinguindo as filas de espera para admissão;

c) determinar à União que, no prazo de 10 dias, efetue o aporte de recursos necessários


à ampliação referida no item anterior (“b), através do aumento do repasse dos recursos do FAEC
(Fundo de Ações Estratégicas e Compensação) em prol do ente público que realize a

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correspondente contratação/ prestação dos serviços.

d) determinar que os requeridos apresentem, no prazo de 30 dias, um plano conjunto de


gestão que demonstre a sistemática e o fluxo de efetiva e contínua absorção da demanda de
pacientes das Regionais de Saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória por serviços de terapia
renal substitutiva, bem assim o escalonamento das responsabilidades de cada ente;

e) determinar aos réus que apresentem, no prazo de 10 dias após o decurso do lapso
mencionado no item anterior, a demonstração da efetiva operacionalização do referido plano de
gestão através da indicação precisa da sistemática, fluxo de absorção da demanda, lista de pacientes
das Regionais de Saúde de Itabaiana e Nossa Senhora da Glória regulados e referenciados, rol de
todos os procedimentos realizados, prova da execução dos serviços e da existência de capacidade
instalada resolutiva;

f) em caso de descumprimento das obrigações acima discriminadas, requer que seja


arbitrada multa diária por descumprimento para cada ente público, a ser revertida ao Fundo Federal
de Proteção aos Direitos Difusos ou aplicada a outra destinação social para resolução de demanda
de saúde pública.

V.4. Para fins de atendimento do art. 319, VI, do CPC, o Ministério Público Federal
manifesta o propósito de produzir todos os meios de prova admitidos em nosso ordenamento
jurídico e que vierem a se fazer necessários no curso do processo, notadamente a juntada de
documentos novos, realização de perícias, inspeções, oitivas de testemunhas, apresentando, desde
logo, todos os elementos de prova coligidos nos autos do Inquérito Civil nº
1..35.000.001094.2021-04;

V.5. para fins de atendimento do art. 319, VII, do Código de Processo Civil, informa a
parte autora que, embora já tenha tentado a resolução extrajudicial da lide, possui interesse na
realização de audiência de conciliação visando à composição, caso manifestem interesse todas ou

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SERGIPE
PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM SERGIPE PROMOTORA DE JUSTIÇA DE ITABAIANA

alguma das requeridas;

V.6. Requer a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos,


conforme o artigo 18 da Lei 7.347/85;

V.7. Requer a condenação das rés ao pagamento de custas e despesas processuais,


inclusive as decorrentes de eventuais perícias;

Desde já, requer a juntada dos autos do Procedimento Preparatório de nº


1.35.000.001094/2021-04, bem como dos demais documentos anexados a essa petição inicial;

Dá-se a causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), apenas para efeitos fiscais.

Nestes termos, pedem deferimento.

Itabaiana/SE, data da assinatura eletrônica.

MARTHA CARVALHO DIAS DE MARIA RITA MACHADO FIGUEIREDO


FIGUEIREDO Promotora de Justiça
Procuradora da República

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Processo: 0800589-53.2021.4.05.8501
Assinado eletronicamente por:
MARTHA CARVALHO DIAS DE FIGUEIREDO - Gestor 21111117425606200000005405081
Data e hora da assinatura: 11/11/2021 18:07:51
Identificador: 4058501.5390663
Para conferência da autenticidade do documento: https://pje.jfse.jus.br/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam 70/70

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