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HISTÓRIA DE SERGIPE:

REPÚBLICA
(1889-2000)
Ibarê Dantas

HISTÓRIA DE SERGIPE:
REPÚBLICA
(1889-2000)

2ª EDIÇÃO

Aracaju, 2022
GOVERNADOR DO ESTADO DE SERGIPE Coordenador do Programa Editorial da SEDUC
Belivaldo Chagas Silva Sidiney Menezes Gerônimo

VICE-GOVERNADORA DO ESTADO DE SERGIPE Assessor Administrativo do Programa Editorial


Eliane Aquino Custódio da SEDUC
Jonas José de Matos Neto
SECRETÁRIO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, DO
ESPORTE E DA CULTURA Membros do Conselho Editorial
Josué Modesto dos Passos Subrinho Carlos Alexandre Andrade dos Santos, Carolina
Angélica Dantas Naturesa, Débora Evangelista
SUPERINTENDENTE EXECUTIVO DE EDUCAÇÃO Reis Oliveira, Eliana Midori Sussuchi, Josué
José Ricardo de Santana Modesto dos Passos Subrinho (Presidente),
Ronaldo Nunes Linhares, Rosemeire
SUPERINTENDENTE ESPECIAL DE ESPORTE Marcedo Costa, Sidiney Menezes Gerônimo
Mariana Dantas Mendonça Gois (Coordenador), Simone Paixão Rodrigues

História de Sergipe: República (1889-2000) - José Ibarê Costa Dantas

Capa: Adilma Menezes


Diagramação: Adilma Menezes
Revisão: Sílvia Dantas

Editora Seduc - 2022

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)

D192h Dantas, José Ibarê Costa, 1939


História de Sergipe : República 1889-2000 / José Ibarê Costa
Dantas. – 2. ed. – Aracaju : Editora SEDUC, 2022.
390 p. ; il.
Inclui Bibliografia
ISBN 978-65-5371-158-7

1. História econômica. 2. História – Sergipe (SE). 3. Brasil –


História – Revolução, 1930. I. Título.

CDU: 94(813.7)”1889/2000”

Ficha elaborada pela bibliotecária Ma. Melânia Lima Santos – CRB5-1916

Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura - SEDUC


Rua Gutemberg Chagas, 169, DIA Inácio Barbosa, Aracaju - SE | CEP: 49040-780
Bicentenário da Independência do Brasil

O ano de 2022 foi marcado por comemorações relativas aos dois


séculos de Independência do Brasil. Para além das celebrações,
esse momento do bicentenário leva-nos também a refletir sobre o
nosso passado, sobre a construção da nação e do nosso Estado, sem
perder de vista as tentativas de imaginar as perspectivas para os dias
futuros.
Quando se considera o setor educacional, as mudanças emergi-
ram a olhos vistos. O ambiente e cada um dos sujeitos envolvidos na
Educação, desde o aluno ao professor, passando por toda a corrente
que contribui com o processo de aprendizagem, materializam as
transformações de valores e de anseios correntes no século XXI, muito
voltado para a digitalização dos processos e dos modos de viver, aliada
à velocidade da informação, o que nos impacta a todos.
Nesse cenário, consciente de sua responsabilidade junto à socie-
dade sergipana, a Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e da
Cultura (SEDUC) imbuiu-se da missão de publicar, com o significa-
tivo Selo do Bicentenário, obras que revelam o estado de Sergipe e
contribuem sobremaneira para entender como chegamos até aqui.
Como seres históricos, precisamos partir de bases reais de nossas
realizações. Lembrar os caminhos percorridos e os experimentos
acertados. Avaliar como o Estado cumpriu suas funções básicas ou
deixou de fazê-lo. Ver como o setor produtivo atuou dispensando
ações do Poder Público e esteve atento às variações conjunturais do
quadro nacional e global. De que forma, houve o fortalecimento da
cidadania por meio da afirmação dos direitos civis, políticos e sociais?
Quais os avanços do processo político que devem prosseguir para
tornar nossas instituições fortes com normas impessoais resistentes a
manipulações? Qual o nosso legado cultural que serve de lastro para
discussão de nossas carências e nossos problemas seculares? Como
produções artísticas eruditas e populares se articulam com esse todo
multifacetado do ser sergipano?
Com esse pano de fundo e com o propósito de contribuir para as
discussões que se fazem necessárias no conjunto da sociedade, a fim
de fomentar a formação aprimorada de crianças, jovens e adultos, a
SEDUC desenvolveu um amplo programa de publicação dentro do
qual o Selo do Bicentenário selecionou 23 obras marcantes na biblio-
grafia local, abrangendo diferentes campos da produção intelectual
sergipana em distintos momentos da sua trajetória.
No terreno da literatura, temos cinco obras da escritora Alina Paim
(A sombra do patriarca, Sol do meio dia, Estrada da liberdade, A hora
próxima, A correnteza) e uma amostra bem representativa da produção
poética de Santo Souza, consagrado como um dos mais destacados
poetas sergipanos do século XX. Dele figuram seu livro de estreia,
Cidade Subterrânea, além de Ode Órfica e Pássaro de Pedra e Sono.
Fazendo contraponto a essas publicações de ficção, está sendo
reeditado o primeiro volume da História da Literatura Sergipana, obra
clássica de pesquisa de Jackson da Silva Lima, com primeira edição em
1971, que trata dos primórdios da produção literária no nosso Estado.
Também foram incluídas, nessa coleção, expressões culturais de
camadas populares lastreadas na oralidade, que se constituem em
vivências que atravessam os tempos e dialogam com a contempora-
neidade. Tratam-se das publicações derivadas das pesquisas da antro-
póloga Beatriz Góis Dantas: A Taieira de Sergipe: uma dança folclórica,
sua primeira obra lançada em 1972; Mensageiro do Lúdico, que trata
dos mestres de brincadeiras em Laranjeiras; e, por fim, a reedição
de Devotos Dançantes: estudos de etnografia e folclore, com pequenos
estudos sobre Dança de S. Gonçalo, Chegança e Taieira.
No campo da história, destaca-se a presença da professora Maria
Thetis Nunes com cinco obras que trouxeram um grande enrique-
cimento à historiografia sergipana: História da educação de Sergipe,
Sergipe Colonial I, Sergipe Colonial II, Sergipe Provincial I e Sergipe

6
Provincial II. São sínteses que cobrem o período colonial e o imperial,
sendo que a História da Educação trata também de parte do século XX
na fase republicana.
Esta fase, aliás, foi objeto de análise aprofundada nas obras do
historiador e cientista político José Ibarê Costa Dantas: O Tenentismo
em Sergipe (Da revolta de 1924 à revolução de 1930), seu livro inaugural,
lançado em 1974; Os partidos políticos em Sergipe (1889-1964); e, por fim,
uma síntese da História de Sergipe: República (1889-2000).
A série de caráter histórico foi enriquecida ainda com duas produ-
ções das mais relevantes para se entender determinados acontecimen-
tos que retardaram a independência de Sergipe em relação à Bahia.
A primeira é a narrativa testemunho de Carlos Cezar Burlamarqui,
intitulado Memória Histórica e Documentada dos Sucessos… Aconteci-
dos em Sergipe Del Rei (1821). Trata-se de um texto autobiográfico que
narra as desventuras do nomeado para ser o primeiro governador de
Sergipe, cuja emancipação política somente se efetiva após a guerra
de Independência do Brasil.
Dessa temática trata também o pesquisador Fernando Afonso
Ferreira Junior em Derrubando os mantos purpúreos e as negras sotainas
(Sergipe del Rey na crise do antigo sistema colonial 1763-1823).
Encerrando a série de obras de autores sergipanos editadas pela
SEDUC em celebração ao Bicentenário da Independência do Brasil,
há o trabalho de Terezinha Alves de Oliva, professora aposentada
da UFS, intitulado: Manoel Bonfim: um intérprete do Brasil. Estudo
derivado de sua tese de doutorado defendida em 1999 ganha agora
o formato de livro, ampliando sua divulgação e o espaço de reflexão
sobre a figura de um dos mais eminentes pensadores nascidos em
Sergipe.
Esse conjunto de obras agora posto à disposição do público leitor,
como se vê, inclui algumas que vêm a lume pela primeira vez e, prin-
cipalmente, obras reeditadas, algumas das quais fora de circulação
há muitas décadas, o que dificultava o acesso aos interessados. Elas
revelam sucessivas gerações de pesquisadores que se debruçaram
sobre Sergipe desde suas origens até os tempos atuais, enquanto

7
outras expressam criações artísticas de diferentes gêneros literários
e de saberes tradicionais marcados pela oralidade, apresentando um
panorama amplo e diverso da gente sergipana.
Publicados agora e distribuídos amplamente, esses livros estarão
também disponíveis em edições digitais para facilitar o acesso e o
conhecimento dessas publicações pelas novas gerações, a fim de que
possam conhecer melhor a história do seu Estado e suas expressões
literárias.
A leitura decerto suscitará muitas questões que devem ser dis-
cutidas com nossa juventude a fim de prepará-la para as mudanças
do novo tempo sem dissociar-se da nossa tradição humanística que
valoriza a convivência enriquecida com a diversidade, permitindo
ações conjugadas mais fecundas e duradouras.

__________________________________
Josué Modesto dos Passos Subrinho
Secretário de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura.

8
A
Ancelmo de Oliveira,
Antônio Carlos Santos e
Itamar Freitas de Oliveira,
companheiros solidários.

A Beatriz, minha esposa.


Ibarê Júnior e Sílvia, meus filhos.
Rodrigo, Juliana e Ana Beatriz, meus netos.
Milla, minha bisneta.

9
Nota prévia da segunda edição

E ste livro foi publicado pela primeira vez em 2004 com a proposta
de sintetizar a história republicana até o ano 2000. Nessa nova
edição, permanece com o mesmo propósito.
Apenas vou apontar aqui de forma muito breve três mudanças
ocorridas na esfera política nas duas primeiras décadas do novo
milênio.
A primeira foi a ascensão do Partido dos Trabalhadores à Presidên-
cia da República. Saiu Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e assumiu
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 1º de janeiro de 2003. O líder petista
encontrou o Estado reformado com moeda estável e baixa inflação.
Era um momento de valorização dos produtos de exportação e o go-
verno aproveitou para propor programas sociais que melhoraram a
condição das classes subalternas. O desemprego diminuiu, o consumo
aumentou, a inflação permaneceu dentro da meta e o país cresceu
nos oito anos do governo Lula a uma média de 4,13%.
Em Sergipe, o governador Albano Franco (PSDB) foi sucedido por
João Alves (PFL), que, em sua terceira gestão (2003-2006), combateu
a reforma tributária apresentada por Lula. Como efeito, sofreu re-
presália do governo federal, que bloqueou empréstimo, obrigando-o
a reduzir investimentos na infraestrutura do Estado para poder
inaugurar a ponte Aracaju-Barra dos Coqueiros.
João Alves Filho perdeu a eleição de 2006 para Marcelo Déda
(PT), que, como prefeito de Aracaju (2001-2006), deixou obras bem
recebidas pela população, entre as quais o programa habitacional
que administrou com recursos do governo federal.
No primeiro mandato de governador (2007-2010), o líder petista
conseguiu assegurar operações de crédito que lhe permitiram robus-
tos investimentos na infraestrutura, na saúde, educação, cultura, na

11
Ibarê Dantas

segurança e em programas que contribuíram para a inclusão social


de grupos de baixo poder aquisitivo.
Embora Lula não conseguisse realizar reformas estruturais e sua
administração fosse acusada de corrupção, tendo companheiros con-
denados no processo do Mensalão, terminou o governo muito bem
avaliado. Elegeu sua candidata Dilma Rousseff (PT) à Presidência, que
assumiu em 01.01.2011. A nova gestora encontrou uma pressão infla-
cionária e uma base aliada de difícil trato. Sem muita habilidade para
administrar os problemas herdados no quadro político e nas finanças
públicas, a presidente, assessorada pelo ministro da Fazenda Guido
Mantega, foi-se enredando em várias questões. Ao adotar desoneração
dos impostos, erodiu as finanças dos Estados e dificultou “o equilíbrio
fiscal que prevalecia desde 1999”.1 Essas medidas prejudicaram a
administração das finanças públicas do segundo mandato do gover-
nador Marcelo Déda. Em meio a essa desventura, em meados de 2012
o líder foi diagnosticado com câncer e viveu o último ano de forma
dramática, lutando para amenizar a crise financeira e restabelecer
sua saúde, cada vez mais debilitada. Faleceu em 02.12.2013, no mesmo
ano em que manifestações se acentuavam contra o governo federal.
Jackson Barreto de Lima, então vice-governador, o substituiu
em 03.12.2013. Eleito nas eleições de 2014, permaneceu no cargo até
06.04.2018, quando renunciou para se candidatar a senador. Subs-
tituído pelo vice Belivaldo Chagas, este foi eleito governador para o
período 2019-2022 e viveu momentos de grande tensão na crise aguda
da pandemia de Covid-19.
Apesar dos problemas administrativos, Dilma Rousseff foi ree-
leita em 2014, com o apoio dos governistas e da propaganda de seus
projetos econômicos e sociais insustentáveis. No seu novo mandato,
com a ampliação das dificuldades, ela tomou medidas equivocadas
que agravaram a crise econômica. O país, que vinha crescendo em
índices confortáveis, entrou em recessão. O Produto Interno Bruto

1
Luiz Carlos Bresser Pereira. Folha de S. Paulo, 27.12.2016.

12
História de sergipe: república

(PIB) recuou para -3,5% em 2015 e manteve-se em queda em 2016 com


o índice de -3,3%.2 Mais de vinte mil postos de trabalho desapareceram
no curso dos dois anos somente em Sergipe.
Como efeito, os descontentamentos se generalizaram. O pedido
de impeachment prosperou e foi aprovado na Câmara dos Deputados
e no Senado, seguindo o ritual constitucional, e a petista foi substi-
tuída em 31.08.2016 por Michel Temer (MDB). Era a segunda grande
mudança política.
O novo presidente governou num período de crise econômica e
social, e conseguiu realizar algumas reformas que ajudaram a con-
trolar os gastos públicos, mas alguns direitos sociais diminuíram. Em
2017, a economia começou a reagir lentamente e, em 2018, Jair Messias
Bolsonaro foi eleito presidente. Sua posse, em 01.01.2019, significou a
terceira grande mudança.
Bolsonaro inaugurou uma nova forma de governança pessoal,
operando uma inflexão na agenda presidencial. Suas manifestações
sobre o meio ambiente, a educação, a saúde, as instituições do Estado,
os grupos vulneráveis, as urnas eletrônicas, o Judiciário, os governa-
dores, a polícia, o controle das armas e as milícias revelaram uma
nova forma de pensamento e ação no sentido de reverter a tendência
de equalização social.
Essas mudanças ocorridas nas duas primeiras décadas do século
XXI, marcadas pela descontinuidade das políticas dos governantes,
reforçam a importância de maiores debates no processo de escolhas
eleitorais.

José Ibarê Costa Dantas

Julho de 2022.

2
Cf. Agência IBGE. Em 2016, PIB chega a R$ 6,3 trilhões e cai 3,3% em volume. Disponível em:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/
releases/22936-em-2016-pib-chega-a-r-6-3-trilhoes-e-cai-3-3-em-volume

13
SUMÁRIO

Bicentenário da Independência do Brasil................................................................. 5

Nota prévia da segunda edição ....................................................................................11

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 17

1 O ESTADO LIBERAL-OLIGÁRQUICO E O DOMÍNIO DOS SENHORES


DO AÇÚCAR (1889-1930)
1.1 Sergipe no início da República .............................................................................. 23
1.2 O Processo Político-Administrativo (1890-1930) ............................................. 33
1.3 O Processo Econômico-social ................................................................................ 59
1.4 Manifestações Culturais ......................................................................................... 71
1.5 Resumo (1890-1830) ....................................................................................................89

2 O ESTADO INTERVENCIONISTA SOB DOMÍNIO MILITAR (1930-1945)


2.1 A Revolução de 1930 e a Reestruturação Política...........................................93
2.1.1 A Interventoria de Maynard Gomes (1930-1935)................................... 95
2.1.2 O Governo Eronides de Carvalho e a Reação
Conservadora (1935-1937) ............................................................................103
2.2 As Interventorias no Estado Novo (1937-1945)..............................................107
2.3 O Processo Econômico-social ...............................................................................118
2.4 Manifestações Culturais ....................................................................................... 127
2.5 Resumo (1930-1945) ..................................................................................................140

3 O ESTADO POPULISTA E O DOMÍNIO DOS PECUARISTAS (1946-1964)


3.1 O Processo Político-administrativo ................................................................... 143
3.1.1 A queda de Vargas e os Governos Provisórios .................................... 143
3.1.2 O Domínio da Aliança PSD-PR: José R. Leite e
Arnaldo R. Garcez (1947-1955) ...................................................................146
3.1.3 O Domínio da UDN: Leandro Maciel e
Luiz Garcia (1955-1962) ................................................................................. 155
3.1.4 O Domínio da ASD: Seixas Dória e a Derrocada do
Estado Populista (1962-1964) .......................................................................166
3.2 O Processo Econômico-social .............................................................................176
3.3 Manifestações Culturais ........................................................................................ 187
3.4 Resumo (1946-1964) ..................................................................................................201

4 O ESTADO AUTORITÁRIO E A ASCENSÃO DOS EMPRESÁRIOS


URBANOS (1964-1982)
4.1 A Tutela Militar e o Processo Político-administrativo..............................203
4.1.1 A Reestruturação do Poder. Celso de Carvalho e
Lourival Batista (1964-1968) ........................................................................203
4.1.2 O AI-5 e o Novo Ciclo Repressivo. De Lourival Batista
a Paulo Barreto (1969-1973) ......................................................................... 214
4.1.3 A Distensão Insegura. De Paulo Barreto a José Rolemberg
Leite (1974-1978) .............................................................................................. 223
4.1.4 A Transição Política. Augusto Franco e
Djenal Queiroz (1979-1982) .........................................................................230
4.2 O Processo Econômico-social............................................................................. 236
4.3 Manifestações Culturais.......................................................................................248
4.4 Resumo (1964-1982)................................................................................................. 263

5 O ESTADO LIBERAL-DEMOCRÁTICO EM CONSTRUÇÃO (1983-2000)


5.1 A Transição Política e a Instauração da Nova República ....................... 265
5.1.1 Do PDS ao PFL: João Alves (1983-1986) ...................................................268
5.1.2 A Exceção do PFL: Valadares (1987-1990) ............................................. 273
5.1.3 A Continuidade do PFL: João Alves (1991-1994) ..................................282
5.1.4 O Domínio do PSDB: Albano Franco (1995-2000) .............................290
5.2 O Processo Econômico-social .............................................................................300
5.3 Manifestações culturais.........................................................................................321
5.4 Resumo (1983-2000) ................................................................................................ 342

CONCLUSÃO .................................................................................................................... 347

REFERÊNCIAS .................................................................................................................355

ANEXOS ............................................................................................................................ 369


INTRODUÇÃO

E ste livro expressa a tentativa de sintetizar a experiência de 110


anos de República, procurando mostrar como os sergipanos con-
viveram politicamente, trabalharam, produziram, distribuíram suas
riquezas, enriqueceram sua cultura e contribuíram para a construção
do Estado1 republicano e da sociedade democrática.
A história de um Estado da federação encontra sentido pela
capacidade que seus habitantes manifestam de inventar sua trajetó-
ria. Por mais que sejam condicionados pelas tendências do sistema
econômico mundial e dependentes do governo central, as decisões
políticas, econômico-sociais e culturais de âmbito nacional sempre
sofrem reinterpretações no âmbito local, tornando cada caso uma
vivência específica. Neste sentido, em Sergipe, seus habitantes foram
adaptando-se aos diversos momentos institucionais e às tendências
econômicas, assimilando as invenções científicas, construindo seus
movimentos sociais, suas artes e plasmando sua identidade. Não obs-
tante sua História ter sido marcada por vários períodos importantes,
foi na fase republicana que ocorreram as maiores transformações
na vida de seu povo. Sua população, que passou três séculos para
atingir a casa dos 310 mil, em pouco mais de cem anos de República,
multiplicou-se por cinco. Maior alteração ocorreu na capital, onde o
número de seus moradores duplicou numerosas vezes. O Estado, que
era predominante rural, urbanizou-se, estruturou-se e construiu sua
base industrial, um grande setor de serviços para atender às deman-
das cada vez mais amplas de seus cidadãos que atravessaram diversos

1
O termo Estado é grafado sempre com inicial maiúscula utilizado no sentido gramsciano
de sociedade política (momento de coerção), envolvendo governo, administração e órgãos
coercitivos públicos, e também na acepção jurídica institucional de unidade da federação,
incluindo população e território ou no sentido amplo de sociedade política mais sociedade
civil.

17
Ibarê Dantas

regimes políticos, repercutindo nas relações sociais. Enquanto isso,


os habitantes de Sergipe foram construindo um acervo de produções
diversificadas e valiosas.
Este estudo acompanha esse processo de mudanças variadas e
abrangentes, ocorridas entre 1890 e 2000. Em meio a um processo
competitivo, as transformações, de âmbito nacional ou especifi-
camente locais, foram se revelando, atingindo o modo de vida das
comunidades do fim do século XIX, convertendo-as numa sociedade
complexa. Algumas pelejas resultaram em frustração de sonhos, mas
outras proporcionaram avanços significativos em suas instituições.
É certo que a magnitude dessas mudanças seria melhor avaliada se
se partisse do período colonial. E, de fato, alguns historiadores já o
fizeram ao tornar públicas suas histórias de Sergipe. Na última década
do século XIX, surgiram as obras de Felisbelo Freire (1891) e Laude-
lino de Oliveira Freire (1898), que ainda hoje servem de referência.2
Posteriormente, Acrísio Torres (1966) e Pires Wynne (1972) deram sua
contribuição e chegaram a datas mais avançadas. Além dessas súmu-
las, apareceram numerosas monografias. Com a atuação do curso de
História, iniciado na Faculdade Católica de Filosofia (1951) e depois
incorporado à Universidade Federal de Sergipe (1968), foi despontando
nova geração de historiadores que muito concorreu para aprimorar
os métodos de escrever história. Muitas monografias, dissertações
e teses foram escritas e várias delas chegaram a ser publicadas em
livros, proporcionando renovação à historiografia local. A professora
Maria Thétis Nunes vem tratando da fase colonial e do início da Pro-
víncia (1978-2000), e Ariosvaldo Figueiredo divulgou alguns volumes
sobre a Província e principalmente sobre a República (1986-1996). Nas
últimas décadas, apareceram alguns compêndios com características
específicas. Os Textos para História de Sergipe (1991), elaborados por
professoras da UFS, sob a coordenação de Diana Maria de Faro Leal
Diniz, apresentaram abordagens temáticas sobre a história local. Por

2
O manual de L. C. Silva Lisboa (Chorographia do Estado de Sergipe, Aracaju: Imprensa Oficial,
1897) não chegou a cobrir o período colonial.

18
História de sergipe: república

esse tempo, surgiram também dois livros didáticos destinados ao


primeiro grau: o de Maria Gorete Santos, Sergipe História/Geografia
(1994) e o de Lenalda Santos e Terezinha Oliva, Para Conhecer a História
de Sergipe (1998).
Esta síntese está fundamentada em variado elenco de informa-
ções. Apesar de restrita ao período republicano, apresenta certa
abrangência na medida em que focaliza o processo histórico sob três
aspectos: político-administrativo, econômico-social e cultural. Den-
tro desses setores, o campo da cultura é o mais vasto, diversificado e
marcado por controvérsias. Abordá-lo é uma temeridade. Não é por
acaso que muitos historiadores evitam enfocá-lo. Diante, porém, de
sua grande importância, considerei necessária apresentar ao menos
alguma notícia, uma amostra ligeira da produção local. Para tanto
adotei um conceito amplo, vendo cultura como “sistema de significa-
dos, atitudes e valores partilhados e as formas simbólicas (apresen-
tações, objetos artesanais) em que são expressos ou encarnados”.3
Neste sentido, ao falar em manifestações culturais, estou envolvendo
ações públicas e privadas, instituições, padrões, artefatos, produtos
artísticos e científicos. Dessa forma, as manifestações culturais são
ao mesmo tempo expressões e, pelo menos potencialmente, fontes
de cultura. Dentro dessa concepção, tento ver como algumas delas
foram se realizando na ambiência do seu tempo, estimuladas pela
sociedade política e pela sociedade civil. Procuro também perceber
algum sentido político, visando entender melhor a complexidade do
processo histórico em Sergipe.
No que se refere às fontes, esta obra é tributária da bibliografia
acessível ao pesquisador comum. Na esfera política, especialmente
nos capítulos dois a quatro, servi-me basicamente das minhas obras,
frutos de trinta anos de pesquisas e análises dos acontecimentos do
século XX. Sobre economia, encontrei vários estudos que me ajuda-
ram, embora na fase pós-1930 muito esteja por ser feito. Quanto ao

3
Peter Burke. Cultura Popular na Idade Moderna. São Paulo: Companhia de Letras, 1989, p.15.

19
Ibarê Dantas

mundo do trabalho, incluindo os movimentos dos trabalhadores,


a carência é maior, especialmente no período de 1945-64. Na área
cultural, consultei artigos e ensaios informativos, mas me pareceu
escassa a produção sistemática. Há algumas obras de valor no terreno
da literatura e do folclore, mas percebi lacunas no que se refere aos
estudos sobre poesia, teatro, música, cinema e artes plásticas. Diante
das dificuldades, empenhei-me em fornecer informações elementa-
res baseadas na fragmentada bibliografia disponível, esperando que
motivem os especialistas à elaboração de estudos mais abalizados.
No conjunto, espero ter oferecido uma visão dos acontecimentos
com a objetividade que as circunstâncias me permitiram. É certo que
o tratamento dos fatos recentes, sem a devida depuração operada
pelo tempo, sempre deixa o historiador vulnerável. Consciente disso,
empenhei-me em distanciar-me das tendências ideológicas em voga,
em captar os acontecimentos mais duradouros e utilizar conceitos
reconhecidos. Nesse sentido, segui os mesmos princípios de meus
trabalhos anteriores, compatibilizando a contribuição gramsciana
com a vertente weberiana. Adotando a conhecida conceituação de
sociedade civil e sociedade política, dentro da teoria da hegemonia,
usada de forma discreta, no fundo a questão democrática ocupa papel
central, servindo de eixo para perceber o processo contraditório de
avanços e recuos, permitindo um balanço final inteligível.
A divisão do trabalho obedece aos momentos institucionais mais
ou menos consagrados pela historiografia local e nacional. Embora o
político sirva de eixo condutor, ao trabalhar com os aspectos econô-
mico, social e cultural, pude sentir como essa segmentação também a
eles se aplica com maior ou menor adequação. Apesar de, em trabalho
anterior, haver tratado o período autoritário como um conjunto até
1984, aqui, para facilitar o entendimento, considerei o biênio 1983-1984
dentro do processo específico de transição. Com a posse dos governos
eleitos pelo voto popular e a retomada da organização das centrais
sindicais, o momento foi se diferenciando da fase precedente. De
qualquer forma, a parte mais difícil de análise me pareceu a última
década do século, pelas controvérsias e paixões que as mudanças

20
História de sergipe: república

recentes provocaram, tornando as posições do autor, por certo, nem


sempre bem compreendidas. Mas o tempo tenderá a mostrar com
mais clareza a consistência ou não das interpretações.
Enquanto elaborava este trabalho, fui favorecido pela interlocução
com amigos e familiares que, em variadas proporções, me incentiva-
ram. Ao fim, Antônio Carlos Santos, Itamar Freitas, Josué Modesto
dos Passos Subrinho e o mano Francisco José Costa Dantas tiveram
a gentileza de ler a primeira versão e apresentar sugestões valiosas.
A todos expresso minha gratidão, extensiva à minha filha Sílvia pela
sua leitura parcial do texto e pelas recomendações inteligentes. Por
fim, destaco a contribuição de Beatriz Góis Dantas, esposa querida
que, em meio a suas leituras atentas, muito concorreu para evitar
maiores impropriedades. Devo ressaltar, no entanto, que todos esses
auxílios inestimáveis não me eximem da exclusiva responsabilidade
dos equívocos que ainda persistem, inclusive os decorrentes de minha
teimosia.

Aracaju/Se, dezembro/2003.

José Ibarê Costa Dantas

21
I
O ESTADO LIBERAL-OLIGÁRQUICO E O DOMÍNIO
DOS SENHORES DO AÇÚCAR (1889-1930)

1.1 Sergipe no início da República

Quando a República foi proclamada no Brasil, em 15.11.1889, em


meio à perplexidade dos monarquistas, os republicanos expressaram,
com entusiasmo, um sentimento de confiança nas transformações
que haveriam de acontecer. Além da nova forma de governo ser
portadora do ideário de tornar a coisa pública acima dos interesses
privados, seus defensores prometiam maior participação popular,
descentralização administrativa e moralização das atividades polí-
ticas. Em Sergipe, a pregação dos republicanos também falava em
muitas vantagens, entre as quais maior compatibilidade da República
com a democracia.1 Mas a materialização desses avanços tenderia a
encontrar fortes resistências diante da realidade subjacente.
Em termos de condições físicas, Sergipe não era dos piores, pois
dispunha de um território de 21.994 km2 regado por seis bacias hidro-
gráficas bem distribuídas do sul ao norte do Estado. Havia comprida
faixa litorânea da Mata Atlântica, de clima sub-úmido e solo fértil,
onde se destacava o vale do Cotinguiba com grandes plantações de
cana, então bastante valorizadas. Entretanto, mais de um terço de
suas terras estava situada no sertão, de clima semiárido e solo pouco
espesso, dominado por vegetação da caatinga e sujeito a estios que

1
Ver O Laranjeirense (1887) e O Republicano (1888-89), Laranjeiras (SE).

23
Ibarê Dantas

dificultavam o cultivo da agricultura. Entre essas duas regiões dife-


renciadas, ficava o agreste com clima e vegetação de transição e solo
variável, que permitiam boas condições para a lavoura.2
Espalhados nesses espaços, de conformidade com o Censo de 1890,
moravam 310.926 habitantes (1890),3 dos quais 48% eram considerados
mestiços, 30% brancos, 15% pretos e 7% caboclos, trabalhando em sua
grande parte no campo envolvidos em atividades de subsistência e/
ou em economia agroexportadora, na qual o açúcar era o produto
predominante, condicionando o viver social. Em linhas gerais, pode-
mos dizer que a sociedade era dividida entre senhores proprietários,
habituados a amplo mando, e trabalhadores despossuídos. É certo
que havia uma camada intermediária heterogênea e em crescimen-
to, mas carente de unidade, de autonomia e de ações conjugadas.
Estávamos bem longe de uma ordem que assegurasse igualdade de
oportunidades aos cidadãos.
Com a instauração da República, algumas alterações no arcabou-
ço institucional começaram a ser estabelecidas. Em primeiro lugar,
o Poder Executivo passava a ser ocupado pelos próprios políticos
da terra, com a perspectiva de serem eleitos pelo voto popular. Era
uma alteração que inaugurava um ritual bem diferente dos tem-
pos da Província, quando o imperador indicava os governantes,
geralmente gente de fora, vinculada à burocracia estatal. Ocorre
que para implementar o projeto de governo, correspondente aos
discursos da campanha, era preciso respaldo político e quadros com
alguma experiência e traquejo público, elementos de que os novos
administradores tinham carência.
Não obstante ter havido movimento republicano significativo em
Laranjeiras (SE), em combinação com Penedo (AL), as pregações care-
ceram de maior enraizamento e abrangência. Os clubes republicanos
chegaram a ser criados em apenas cinco municípios (Estância, Laran-

2
Josefina Leite Campos. Geografia de Sergipe. Aracaju: L. Regina, 1967; Adelci Figueiredo Santos
e José Augusto Andrade. Geografia de Sergipe. Aracaju: SEC, 1986.
3
Anuário Estatístico do Brasil. Rio de Janeiro: Fundação IBGE, 1967, p. 35-36.

24
História de sergipe: república

jeiras, Itaporanga, Aracaju e Vila Nova) dos 33.4 As ações proselitistas


encontraram fria receptividade entre as principais forças políticas
da Província. O Partido Republicano, fundado em novembro de 1888,
contou com a simpatia de parte do patronato escravocrata, ressentido
com a abolição da escravatura, mas nas eleições para o Parlamento
Nacional em 1889, ainda em tempos da Monarquia, o candidato da-
quela recém-criada agremiação não obteve sucesso. É verdade que,
uma vez proclamada a República, as adesões proliferaram, mas os
neorrepublicanos não revelavam grande identificação com a ideia
de tornar a coisa pública objeto de bem comum.
No âmbito econômico-social, o momento era bastante desfa-
vorável e complexo. Em 13.05.1888 havia ocorrido a abolição da
escravatura que jogou no mercado de trabalho uma grande massa
de ex-escravos. Um ano e meio depois, desorientados e desassistidos,
os libertos tentavam a duras penas adequar-se às novas formas de
ocupação e superar os preconceitos de que eram vítimas. Do outro
lado, estavam os proprietários de engenhos e fazendas, tentando
reanimar seus centros produtivos, mas com dificuldades em en-
contrar mão de obra assalariada mesmo com baixa qualificação.
Não devemos esquecer também dos indivíduos e das famílias de
pouca posse que tinham no seu escravo a base fundamental de
sobrevivência. Depois de séculos de escravidão, tanto os senhores
como os ex-escravos encontravam-se diante do desafio de assimilar
sua identidade de cidadãos, formalmente iguais em direito. Afinal,
tanto uns como outros precisavam compreender que ser livre não
era viver sem trabalhar, conforme concepção arraigada na cultura
escravocrata.
Ao lado desses aspectos socioculturais, havia problemas econômi-
cos decorrentes da Lei Áurea: a grande queda nas produções agrícolas.
A primeira safra de açúcar pós-abolição rendeu 29% da média anual

4
Felisbelo Freire. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Brasília:
EUnB, 1983 e Baltasar Góis. A República em Sergipe (Apontamentos para a história). Aracaju:
Tip. do Correio de Sergipe, 1891.

25
Ibarê Dantas

exportada no período 1871-88.5 Num Estado que dependia sobretudo


das exportações da produção rural, o impacto foi enorme. O patronato
em grande parte endividou-se ou faliu, os comerciantes entraram em
dificuldades, a arrecadação diminuiu, e o governo passou a atrasar o
pagamento dos funcionários públicos. A precária máquina pública
se deteriorava.6
Associados aos problemas conjunturais, havia toda uma estrutura
social perversa a ser considerada. Por exemplo, as condições de trabalho
em geral eram bastante penosas. Embora haja notícias de empresas
com preocupação social avançada, a carência de legislação trabalhista
deixava as jornadas de serviços ao arbítrio dos patrões, assim como a
assistência em acidentes de trabalho e na velhice. Em face desse quadro,
começavam a surgir as sociedades beneficentes, como a União Ope-
rária, custeada pelos próprios trabalhadores, mas ainda com alcance
bastante limitado. Neste ponto, os funcionários públicos gozavam de
vantagens quando dispunham dos benefícios do montepio.
Na área administrativa, parecia que tudo estava para se fazer,
pois eram grandes as necessidades da atuação do poder público.
Aracaju, não obstante ser a capital desde 1855, ainda era pequena
cidade de 16.336 habitantes segundo o Censo de 1890. Como centro
político-administrativo, ganhava atenção através das decisões de
suas autoridades e da importância decorrente do funcionamento das
repartições públicas. Em seu porto, cerca de 200 navios ancoravam
anualmente, trazendo passageiros e grande variedade de mercado-
rias que abasteciam o comércio.7 A indústria estava em expansão,
contando com uma grande unidade, a Sergipe Industrial, fábrica de
tecidos onde trabalhavam numerosos operários.

5
Ver Josué Modesto dos Passos Subrinho. Reordenamento do Trabalho: trabalho escravo e trabalho
livre no Nordeste açucareiro, Sergipe 1850/1930. Aracaju: Funcaju, 2000. p. 207.
6
Cf. Documento do Gabinete do Conselho de Estado de 02.10.1889, citando correspondência
do presidente de Sergipe de 15.07.1889, referindo-se a sérias dificuldades do tesouro da
Província, in Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, cedido gentilmente pela historiadora
Maria Thétis Nunes.
7
Cf. Mons. Olímpio de Souza Campos. Mensagem Apresentada à Assembleia Legislativa do Estado
de Sergipe em 07.09.1902, Aracaju: Empresa do “O Estado de Sergipe”, 1902, p. 22-24.

26
História de sergipe: república

A vida cultural era acanhada. Mas circulavam vários jornais


(pelo menos seis),8 e havia um pequeno teatro, o São José, onde se
apresentavam grupos artísticos, sobretudo de ambulantes, que saíam
pela região costeira do país mostrando suas artes. A capital dispunha
também de uma biblioteca pública com acervo rico, mas carente de
atenção, e possuía a maior estrutura educacional do Estado, composta
de 22 cadeiras de ensino, 14 do primeiro grau e seis do segundo grau.9
Um dos pontos mais críticos de Aracaju, em 1890, era a precarie-
dade de sua infraestrutura. Suas ruas não dispunham de calçamento,
nem de energia elétrica e as residências não contavam com água
encanada ou esgoto. A população se abastecia nas cacimbas, nos
tanques naturais ou artificiais, ingerindo o indispensável líquido
de qualidade suspeita. Situada na beira do rio Sergipe, suas casas,
em grande parte cobertas de palha de coqueiro, estavam limitadas
entre dunas, mangues ou pântanos, comportando alto potencial de
insalubridade. Com as artérias da cidade situadas em terrenos baixos,
o escoamento das águas se revelava problemático. Nos períodos de
chuva formavam-se grandes lagoas em ruas e praças que se tornavam
intransitáveis até para as carroças. Num momento em que “menos de
5% podiam gozar de assistência médica”, conforme estimou estudioso
do tema,10 as péssimas condições de salubridade agravavam mais o
quadro. Como se não bastassem as epidemias que periodicamente
grassavam o Estado, as febres palustres de Aracaju tornavam mais
arriscada a vida de seus habitantes, mesmo porque os próprios re-
cursos da medicina de então eram bastante precários.
No interior, pelos inícios de 1890, as condições de salubridade em
geral eram bem melhores. Dentro da organização administrativa de
Sergipe composta de 33 sedes de município, além da capital, apenas

8
Clodomir Souza e Silva. Álbum de Sergipe (1820-1920). Aracaju: Estado de Sergipe, 1920.
9
Cf. Laudelino de Oliveira Freire. Quadro Chorographico de Sergipe. Paris: H. Garnier, 2. ed.,
1902.
10
Antônio Samarone de Santana. As Febres do Aracaju (Dos Miasmas aos Micróbios). Dissertação
apresentada ao Núcleo de Ciências Sociais da UFS, Aracaju, 1997, p. 91.

27
Ibarê Dantas

nove povoações gozavam do estatuto de cidades.11 Com base em dados


apresentados pelos historiadores, especialmente Laudelino Freire, Silva
Lisboa, entre outros, podemos lembrar alguns traços dessas povoações.
Laranjeiras, por exemplo, era um dos centros urbanos mais impor-
tantes do Estado. Situada no vale do Cotinguiba, a 23 km da capital,
segundo cálculos da época, era a cidade mais próxima de Aracaju.
Com 11.350 habitantes, dispunha de uma economia sólida e receita
elevada, decorrente sobretudo da produção de seus 38 engenhos12 que
era exportada a partir de seu porto fluvial onde também chegavam
diversos produtos estrangeiros. O setor de serviços era bastante qua-
lificado. Seus profissionais, entre os quais advogados, professores e
médicos, eram famosos e muito procurados.13 No ensino, depois de
Aracaju era o município com maior número de cadeiras (17). Sua vida
cultural rivalizava com o ambiente da capital. Continuava o cultivo
da música, do teatro e da pintura, dentro de uma tradição respeitável.
O patrimônio cultural de suas 13 igrejas,14 inclusive uma evangélica,
rivalizava com o de São Cristóvão, o mais rico do Estado. Centro ir-
radiador das pregações republicanas e do movimento abolicionista,
foi nos seus salões e em suas ruas que se destacaram muitas das lide-
ranças que iriam governar a República.15 Mas tinha carência de água
potável. Grande parte de sua população se abastecia na Cacimba do
Mato, que não recebia tratamento.
São Cristóvão, com 8.993 habitantes, situada às margens do rio
Paramopama, pequeno afluente do Vaza Barris, tinha clima saudá-
vel e águas apreciadas, atraindo veranistas para temporadas. Como
ex-capital da Província, vivia em fase de decadência, mas em seu

11
Laudelino de Oliveira Freire, em obra citada, lista 12 cidades, mas inclui Riachuelo e Simão
Dias, que se tornaram cidades ao longo do ano de 1890, e Porto da Folha, que somente
deixou de ser vila em 1896. Cf. Clodomir Silva. Álbum de Sergipe (1820-1920). Aracaju: Estado
de Sergipe, 1920.
12
Laudelino de Oliveira Freire. Ob. cit., 1902.
13
Cf. Manoel Curvelo. Uma phase de Laranjeiras, in Almanak Sergipano para o ano de 1899.
Aracaju: Tipografia Comercial, 1899, apud Terezinha Oliva de Souza. Impasses do Federalismo
Brasileiro (Sergipe e a Revolta Fausto Cardoso). Rio de Janeiro: Paz e Terra, UFS, 1985, p. 54.
14
L. C. Silva Lisboa. Chorographia do Estado de Sergipe. Aracaju: Imprensa Oficial, 1897.
15
Ver Philadelplo Jônathas de Oliveira. História de Laranjeiras Católica. Aracaju: Casa Ávila, 1935.

28
História de sergipe: república

município ainda existiam 12 engenhos e continuava com razoável


movimento em seu porto. Na educação, oferecia 12 cadeiras de ensino,
número somente superado por Aracaju e Laranjeiras. Dispondo dos
monumentos históricos mais imponentes e significativos do Estado,
prosseguia com pequena vida cultural, preservando festas e tradições.
Maruim, em 1890, não era insalubre como Aracaju ou Laranjei-
ras, mas também não se constituía numa urbe das mais saudáveis.
Situado no vale do Cotinguiba, a 33 km da capital, era dos centros
econômicos mais importantes. Embora fosse um município peque-
no, com apenas 7.851 habitantes, no meio rural havia 14 engenhos e
na cidade a movimentação de seu porto superava a de Laranjeiras.
Seus estabelecimentos industriais e comerciais contribuíam para que
sua receita fosse das mais expressivas do Estado. Com ruas largas,
algumas calçadas, havia várias casas que mostravam a pujança de
seus proprietários. Embora não tivesse rede de serviços profissionais
igualável à de Laranjeiras, possuía uma vida cultural estimulante,
editando seus jornais e promovendo eventos. Seu Gabinete de Leitura,
que era o mais importante de Sergipe, neste momento, 1890, editava
o periódico Hora Literária.16
Cidade bem agradável era Estância, chamada por D. Pedro II de
“Jardim de Sergipe”. Seu clima era saudável e suas águas de boa qua-
lidade. Com 14.555 habitantes, seu centro urbano localizado às mar-
gens do rio Piauí e cortado pelo Piauitinga, tinha uma economia das
mais expressivas. No campo funcionavam 19 engenhos. Embora seu
comércio e suas indústrias tenham se ressentido bastante com a crise
provocada pela abolição, prosseguia como a praça mais importante
da região sul, possibilitando uma receita relativamente elevada. Sua
primeira fábrica de tecidos começava a ser organizada. Sua elite, em
parte originária de Portugal, demonstrava gosto refinado, conforme
se verificava pelos seus sobrados bem acabados. No ensino oferecia
11 cadeiras. Centro precursor da imprensa em Sergipe, a publicação

16
Joel Aguiar. Traços da História de Maruim. Aracaju: Unigráfica, 1987.

29
Ibarê Dantas

continuada de seus jornais foi estimulando as letras, as artes e a cons-


trução de uma opinião pública. Sua Lira Carlos Gomes vinha de 1877.
Em seu ambiente floresceram poetas e escritores, pintores e músicos,
tornando sua população certamente a mais ilustrada do Estado.
Nesse tempo, Lagarto, situada no agreste, era bem modesta. Em-
bora seu município fosse relativamente grande, nele habitava uma
população de apenas 10.473 pessoas. No âmbito rural, havia seis en-
genhos, mas sua gente vivia dispersa, dedicada à pequena lavoura,
numa estrutura de propriedade bastante repartida. Não obstante seu
comércio fosse pouco desenvolvido em relação a Maruim, Estância
e Laranjeiras, sua feira já era muito variada. Concorria para isso,
além de oferta de cereais e frutas, seu artesanato, dando margem à
tecelagem e muitos artigos de couro. No ensino oferecia apenas seis
cadeiras, e tinha uma vida cultural acanhada, salvo suas festas em
geral bem animadas.17
Capela, também localizada no agreste, tinha 11.034 habitantes e
em seu território havia o maior número engenhos (66). Seu comércio
era ativo, mas sua indústria era rudimentar. Oferecia 12 cadeiras na
área educacional e, embora não se tenha notícia de jornais, havia
gabinete de leitura e algum espaço para o teatro e a música.
Propriá, situado às margens do baixo São Francisco, que fora muni-
cípio com enorme extensão territorial, perdeu grande parte de sua área
com os desmembramentos que geraram novos municípios. Em 1859, o
imperador visitou a vila que já teria casas boas, sobrados e fábrica de
descascar arroz a vapor.18 Em 1890, o Censo registrou 19.267 habitantes.
Dessa época não há notícias de engenho em suas terras, mas sua receita
era significativa. Sua população cultivava algodão, arroz, criava gado,
dedicava-se à pesca, tinha comércio e atividades industriais relativa-
mente prósperos. Embora oferecesse apenas oito cadeiras no ensino,

17
Sobre Lagarto, além de Laudelino Freire em obra citada, ver L. C. Silva Lisboa. Chorographia do
Estado de Sergipe, Aracaju: Imprensa Oficial, 1897. Vide também Severiano Cardoso in Almanak
Sergipano para o ano de 1899. Aracaju: Tipografia Comercial, 1899.
18
Cf. Carlos Roberto Britto Aragão. Propriá 200 anos. Notas e fotos do bicentenário. Aracaju:
Soc. Semear, p. 20.

30
História de sergipe: república

tinha uma tradição de imprensa local. Em 1890, editava o jornal União


Republicana e havia um certo cultivo da vida intelectual.
Itabaiana, situado no agreste, estendia-se também pelo sertão.
Com 28.272 habitantes, era município de grande área e o mais popu-
loso. No campo, o itabaianense dedicava-se à agricultura e à criação.
Mas sua sede comportava cerca de 3.000 moradores, a grande parte
residindo em casas de taipa, registrando-se, no entanto, 21 sobrados,
compondo uma existência rústica.19 No entanto, sua feira já era bem
frequentada e mantinha um comércio muito ativo sobretudo com La-
ranjeiras, que lhe fornecia produtos importados e escoava seu algodão
e cereais. Apresentava vida cultural modesta, mas havia uma filar-
mônica, e as notícias sobre o número de cadeiras é controvertido.20
Além desses municípios, havia 24 vilas: Aquidabã, Arauá, Boquim,
Campos, Cristina, Cedro, Carmo, Divina Pastora, Espírito Santo, Ga-
raru, Itabaianinha, Itaporanga, Japaratuba, N. S. das Dores, Pacatuba,
Porto da Folha, Riachão, Rosário, Santa Luzia, Santo Amaro, São
Paulo, Siriri, Socorro e Vila Nova. Nos primeiros meses da República,
algumas delas deixaram de ser vilas, mesmo porque já dispunham de
nível de desenvolvimento semelhante ao de determinadas cidades.21
Os meios de transportes que ligavam as povoações entre si eram
precários. Nos municípios costeiros, os cidadãos dispunham dos
barcos. Mas para quem vivia mais distanciado do litoral ou dos rios
navegáveis, a opção era o carro de bois ou o lombo dos cavalos ou dos
burros, num momento em que nossos vizinhos, Bahia e Alagoas, já
dispunham de estrada de ferro.22

19
Cf. Vladimir Souza Carvalho. A República Velha em Itabaiana. Aracaju: Fundação Oviêdo
Teixeira, 2000, p. 32-39.
20
Laudelino de Oliveira Freire atribui oito cadeiras, mas Armindo Guaraná registra 18. Ver Vladimir
Souza Carvalho. A República Velha em Itabaiana. Aracaju: Fundação Oviêdo Teixeira, 2000, p. 37.
21
Cf. Laudelino de Oliveira Freire. Quadro Chorográgico de Sergipe. Paris: H. Garnier, 2. ed.,
1902. Lembramos que o autor incluiu Porto da Folha entre as cidades e não entre as vilas,
conforme apresentamos. Ver também Clodomir Souza e Silva. Álbum de Sergipe (1820-1920).
Aracaju: Estado de Sergipe, 1920.
22
No início da República apenas os Estados de Goiás, Mato Grosso, Amazonas, Maranhão,
Piauí e Sergipe não eram cortados por ferrovias. Cf. Douglas Aprato Tenório. Capitalismo e
Ferrovias no Brasil. Maceió: HD Livros, 1996, p. 52.

31
Ibarê Dantas

Na área educacional, somente as cidades dispunham de cursos do


segundo grau, mas há indicações de que a frequência era bastante
reduzida.23 Embora houvesse uma elite letrada, formada sobretudo
pelos bacharéis diplomados fora do Estado, o Censo de 1890 registrou
que 89% da população não sabiam ler e escrever.
Esse era o legado do Estado Monárquico. Aos sergipanos, cabia
transformá-lo. Mas a luta política tenderia a ser longa e difícil. Além
das resistências internas, havia os condicionantes externos. Apesar de
tudo, em meio aos embates entre forças com interesses e capacidade de
organização diferenciados, a História de Sergipe foi sendo construída.

SERGIPE
VEGETAÇÃO PRIMITIVA - CIDADES EM 1889

Fonte: Mapa adaptado pelo autor a partir das seguintes obras


a) Atlas Escolar de Sergipe: Nossa Terra e Nossa gente. Aracaju: UFS/SEEC, 1982.
b) Laudelino de Oliveira Freire. Quadro Chorographico de Sergipe. Paris: H. Garnier, 1902.
c) Clodomir Silva. Álbum de Sergipe (1820-1920). Aracaju: Estado de Sergipe, 1920.

23
Cf. Laudelino de Oliveira Freire. Ob. cit., 1902, p.72. Sobre o comparecimento ver Mensagens
de José Calazans.

32
História de sergipe: república

1.2 O Processo Político-Administrativo (1890-1930)

Se existiam grandes desafios para a sociedade sergipana, não eram


menores os que se apresentavam para a sociedade brasileira. O primei-
ro era a montagem de um novo sistema político sem a interferência do
imperador, que antes intermediava as contendas partidárias. Nascida
de um movimento que tinha o predomínio dos senhores do café, a
República foi instaurada com forte presença militar, situação que
permaneceu com os dois primeiros governantes. Ainda no governo
de Deodoro da Fonseca foi convocada a Assembleia Nacional Cons-
tituinte que legou ao país a Constituição promulgada em 1891. Não
obstante a influência dos positivistas na propaganda republicana, os
parlamentares formularam uma Carta de conteúdo liberal, ampliando
a tendência que provinha do Império. A abolição da escravidão per-
mitiu que a declaração de direitos fosse ampliada, e a separação da
Igreja Católica do Estado delimitou melhor a especificidade da esfera
pública de natureza laica. Adotou-se o presidencialismo e a livre esco-
lha dos ministros pelo presidente. Os poderes da República ficaram
divididos em três: Executivo, Legislativo e Judiciário, desaparecendo
assim o Moderador, que era desempenhado pelo imperador. Adotou-se
a federação com descentralização administrativa, autonomia para os
Estados, enquanto o governo central ficaria voltado sobretudo para
garantir a ordem constitucional. Implantou-se o voto universal para
os maiores de 21 anos, excluindo-se mendigos, analfabetos, praças de
pré e religiosos sujeitos a voto de obediência.24
Em Sergipe, o primeiro mês de República foi governado por juntas
provisórias efêmeras, quando seus membros passaram a encontrar
dificuldades na montagem de uma estrutura de poder diferenciada
da ordem provincial. Com pequena vivência política, os republicanos
estranharam o jogo de pressões e contrapressões naturais no exercício
do poder e foram se revezando até quando chegou o médico Felisbelo
Freire, o primeiro indicado para governar o Estado, tendo administrado

24
Ver Constituição de 1891, artigo 70.

33
Ibarê Dantas

de 13.12.1889 a 17.08.1890. Intelectual versátil e desenvolto como mú-


sico, estudioso de nossa história e jornalista dos mais envolvidos nas
campanhas abolicionista e republicana, Felisbelo Freire, ao assumir o
Executivo, encontrou as finanças com grande déficit, serviços públicos
precários e uma sociedade bastante desigual. Procurando minorar esse
quadro, o novo governante encomendou estudos visando à canalização
de água para Aracaju. Tentou também melhorar o serviço de navegação
com o Rio de Janeiro e chegou a firmar contrato para construir alguns
trechos de linha de ferro.25 Mas a obra não foi implementada. Reorgani-
zou a Biblioteca Pública, cujo acervo parecia descuidado, e anexou-lhe
um museu. Nos oito meses que durou sua administração, enfrentou
seca, surtos de varíola e de paludismo e sobretudo a reação dos seus
adversários diante de suas medidas, quer fossem democratizantes,
quer autoritárias. A tentativa de implantar um projeto de educação
de conteúdo mais popular despertou alguma oposição. Os desconten-
tamentos aumentaram quando diminuiu consideravelmente a força
policial e reduziu o corpo do funcionalismo com o fim de equilibrar
as contas públicas. Entretanto, maiores reações ocorreram ao tomar
medidas moralizantes, anulando concessões, privilégios fiscais e ex-
plorações monopolistas que beneficiavam empresários. A imprensa
desenvolveu contra seu governo campanha vigorosa. Como se isso não
bastasse, o fato de haver autorizado a deportação de supostos crimino-
sos contribuiu para ampliar seu desgaste. Sem grande respaldo junto ao
governo central, ao não incluir na chapa para senador o coronel Rosa
Júnior, um político prestigiado por Deodoro da Fonseca, foi demitido,
interrompendo-se assim a primeira administração inovadora do re-
gime republicano. Situação semelhante ocorreu pouco depois com o
coronel Mendes de Morais que, ao não atender ao pedido do marechal
presidente para interferir no pleito para eleger o republicano Vicente
Ribeiro, terminou renunciando.

25
Sobre a administração de Felisbelo Freire ver Bonifácio Fortes. Felisbelo Freire, o homem
público, o escritor e o constitucionalista in Revista da Faculdade de Direito de Sergipe, Ano
VI, n. 5, Aracaju: 1958.

34
História de sergipe: república

Não obstante a Constituição de 1891 haver prescrito a autonomia


administrativa dos Estados, as interferências do presidente da Repú-
blica foram se revelando frequentes, contribuindo para aumentar as
dificuldades de normalização da política estadual. As ações de Deodo-
ro da Fonseca na política interna, o golpe fechando o Congresso em
3.11.1891 e sua renúncia vinte dias depois, eram atos que provocavam
ascensões e quedas, tumultuando o quadro nacional e local. Sendo
uma experiência nova a construção de governos locais com a parti-
cipação dos quadros políticos da terra, o processo de aprendizagem
demandava tempo. Mesmo porque os republicanos não dispunham
de muitos nomes e os ex-monarquistas que aderiram à República
continuaram com maior prestígio eleitoral.
Após a mudança da forma de governo, boa parte dos ex-monar-
quistas aderiu à República e, no início, eram chamados de adesistas.
No pleito de 1891, políticos que haviam apoiado a Monarquia concor-
reram distribuídos em dois partidos políticos: o Nacional e o Católico,
que logo depois se fundiram. Do outro lado, apareceu o Democrata,
como órgão dos republicanos. Mas estes foram encontrando dificul-
dades em se afirmarem através das eleições, cedo começaram a brigar
entre si, dividiram-se e no primeiro pleito para a Constituinte foram
derrotados. Inconformados e sem muitas convicções democráticas,
os republicanos tentaram evitar pela força a ascensão dos políticos
mais antigos, resultando em mais um período de instabilidade insti-
tucional. Enquanto as juntas e os governos provisórios se sucediam
até meados de 1892, Sergipe vivera sob a vigência de três constitui-
ções. Depois da primeira, considerada provisória, os 24 deputados
da Assembleia elaboraram outra Carta que foi atropelada pelas di-
vergências grupais. Somente o terceiro documento, promulgado em
maio de 1892, teria vida mais duradoura, mesmo assim passou por
numerosas emendas ao longo do tempo.26

26
Ver Francisco Carneiro Nobre de Lacerda. A Década Republicana em Sergipe. Aracaju: Typ.
d’O Estado de Sergipe, 1906.

35
Ibarê Dantas

A situação parecia normalizar-se com a posse do capitão do cor-


po de engenheiros José Calazans, bacharel em matemática, ciências
físicas e naturais, que governaria de 1892 a 1894. Republicano aus-
tero, dotado de elevado espírito público, não se deixou abater pelas
dificuldades. Isentou de impostos empresas industriais. Enfrentou
epidemia de varíola, quando construiu Lazareto para abrigar os
doentes. Como primeiro presidente constitucional do novo regime,
imprimiu orientação moralizadora e organizadora27. Nesse sentido,
mandou edificar o prédio do Tribunal de Relação, proporcionando
aos magistrados uma sede digna, e tentou reformar o ensino. Em sua
gestão, vários órgãos públicos recebiam regulamentos, regimentos,
corrigindo costumes, racionalizando a máquina administrativa.28
Defensor intransigente da autonomia estadual, revelava-se por ve-
zes desabusado nas correspondências com as autoridades federais.
Quando desenvolvia seu governo com algum sucesso, passando a
arrecadar mais do que gastava, fato que antes não vinha ocorrendo,
foi deposto por não atender às pressões do presidente da República,
Floriano Peixoto, para ajudar o coronel Manuel Prisciliano de Oliveira
Valadão a eleger-se senador.29 Este militar, nascido em 1849 em Vila
Nova, hoje Neópolis (SE), participou da guerra contra o Paraguai, co-
mandou brigada policial por ocasião da proclamação da República e
ascendeu dentro da hierarquia do Exército. Ligado a Floriano Peixoto,
foi eleito deputado e inscreveu-se como postulante a senador por
Sergipe. Mas sua candidatura foi considerada ilegal e o coronel José
Calazans, zeloso nos deveres do cargo, resistiu aos apelos presiden-
ciais. A campanha tornou-se mais agitada com a presença de Sílvio
Romero, que viera do Rio de Janeiro para eleger Valadão. Diante da
derrota, aquele conceituado escritor protestou veementemente e foi

27
Sobre José Calazans e seu governo, ver José Bonifácio Fortes Neto. “General Calazans, 1º
Presidente Constitucional de Sergipe”, in Revista da Faculdade de Direito da UFS, ano XV, n.
15, Aracaju, 1971, p. 147-172 e Francisco Carneiro Nobre de Lacerda. Ob. cit., 1906.
28
Ver José Calazans. Mensagem lida perante a Assembleia Legislativa. Aracaju: Typ. d’ O
Republicano, 1892.
29
Sobre Valadão, ver João Menezes. Traços biographicos do General Oliveira Valladão. Rio de
Janeiro: Imprensa Nacional, 1920.

36
História de sergipe: república

um dos responsáveis pelo movimento que encurtou o mandato de


primeiro presidente constitucional do período republicano. Após uma
eleição marcada pela violência, o governo de Calazans passou a ser
atropelado pelo grupo valadonista. Inconformados com essa situação,
vários políticos, inclusive ex-monarquistas, tentaram resistir. A sede
da administração foi transferida para Rosário do Catete, gerando du-
alidade de poderes. A contenda entre os dois grupos acentuou-se. Os
que ficaram nas areias de Aracaju passaram a ser chamados de Pebas
e os que se reuniram na zona dos engenhos foram denominados de
Cabaús.30 Em Aracaju, o médico João Vieira Leite assumiu o governo no
auge da crise. Vinculado aos Pebas e carente de legitimidade, em sua
curta e tumultuada gestão (11.09.1894 a 24.10.1894), pouco fez além de
afastar e reprimir adversários, preparando o campo para seu sucessor.
A administração de Oliveira Valadão (1894-1896) foi marcada
por arbitrariedades e perseguições políticas, afastamento de ma-
gistrados, brigas prolongadas com o Judiciário, tudo contribuindo
para desorganizar a vida institucional que vinha sendo construída
com dificuldades. Para agravar a vida dos cidadãos, os surtos de va-
ríola no curso dos anos 1895 e 1896 dizimaram numerosas pessoas.
Nesse clima crítico, o coronel Valadão pouco realizou. Segundo um
historiador do seu tempo, suas obras mais notáveis foram: “alguns
regulamentos, reformando o ensino público, o montepio dos empre-
gados estaduais e outros institutos”; a criação da imprensa oficial,
além da “contribuição de dez contos de réis para a construção das
linhas telegráficas de Itabaiana e Vila Nova”.31 Ao deixar o governo,
alegando motivo de saúde, o quadro de incerteza continuou. Seu su-
cessor, o padre Leonardo Dantas, foi deposto por uma revolta, depois
foi reposto por ordem do presidente da República, e as crises políticas
pareciam uma constante. Ainda em 1896, foi eleito Martinho Garcez,

30
Sobre esse momento político, consulte-se José Ibarê Costa Dantas. Os Partidos Políticos em
Sergipe - 1889/1964. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989.
31
Francisco Carneiro Nobre de Lacerda. Ob. cit., 1906, p. 140. Ver também Coronel Manoel P.
de Oliveira Valladão. Mensagem dirigida à Assembleia Legislativa. Aracaju: Typ. do Diário
Oficial, 1895.

37
Ibarê Dantas

advogado de grande prestígio intelectual, ligado aos Pebas, que teve


a infeliz iniciativa de extinguir a Escola Normal.32 Governando num
quadro marcado por disputas internas, novas questões foram surgin-
do com seus afastamentos e as brigas com seus substitutos, situação
que persistiu até 1899, quando o próprio Garcez firmou acordo com
o monsenhor Olímpio de Souza Campos, do grupo oposto, o Cabaú,
entregou o cargo ao vice-presidente e retornou ao Rio de Janeiro
agastado com os seus críticos.33
Ao fim da primeira década, computavam-se cerca de vinte e dois
indivíduos que estiveram no cargo de Executivo, participando de
juntas provisórias ou governando isoladamente. Foi uma rotativida-
de elevada, permeada por várias questões desgastantes: renúncias,
revoltas, deposições, substituições controvertidas e até duplicidade
de Assembleias Legislativas. As tendências autoritárias de alguns
republicanos, a disputa destes com os ex-monarquistas, as questões
pessoais e as interferências externas contribuíram para tornar o
quadro bastante instável, marcado pela descontinuidade das admi-
nistrações que afetava as finanças públicas (ver a relação dos gover-
nantes no Anexo I).
Não obstante a hegemonia inabalável dos senhores do açúcar
como a grande força econômica do Estado, foi um tempo de adapta-
ções difíceis, quer para o exercício da administração estadual, quer
para a população em seu conjunto.
Contudo, não era apenas Sergipe que custava a construir um
pacto político que permitisse aos administradores concluírem seus
mandatos. Nos vários Estados também havia um saldo de grande

32
Sobre a Escola Normal, ver Anamaria Gonçalves Bruno de Freitas. “Vestidas de azul e branco”:
um estudo sobre as representações de ex-normalistas (1920-1950). São Cristóvão/SE: GEPHE/
NPGED, 2003.
33
Com o intuito de homenagear Martinho Garcez e ao mesmo tempo desagravá-lo, em face
das críticas dos opositores, Fausto Cardoso organizou livro laudatório, com depoimentos de
vários intelectuais, no qual se destacava sobretudo a figura do jurista. Ver O Vulto Político de
Martinho Garcez. Rio de Janeiro: Casa Mont’Alverne, 1900. Por esse tempo, Garcez recebeu
dos seus patrícios no Rio de Janeiro uma coroa de ouro, cravada de brilhantes e rubis com
a dedicatória de pacificador da família sergipana. Cf. Manuel Armindo Cordeiro Guaraná.
Dicionário Biobibliográfico Sergipano. Rio de Janeiro: Pongetti & Cia., 1925. p. 224-225.

38
História de sergipe: república

mutabilidade política. Recordemos que ainda no governo do marechal


Floriano Peixoto, que enfrentou com mão de ferro várias revoltas, foi
realizada a primeira eleição direta para presidente (1894). Não foi por
acaso que triunfou Prudente de Morais, um civil de São Paulo, onde
havia o grupo de republicanos mais organizado e identificado com
a expansão da economia capitalista exportadora, que tinha no café
o seu produto de maior importância nacional. Apesar do domínio
paulista no Executivo, sintonizado com a pujança de sua economia em
expansão, dentro do Congresso as bancadas vinham se apresentando
por demais dispersas, divididas em vários grupos em competição,
sem orientação definida, dificultando o encaminhamento dos proje-
tos. Quando o segundo paulista, Campos Sales, foi eleito presidente
em 1898, percebendo as dificuldades de governabilidade, em face da
carência de uma base política fiel, articulou-se com os administrado-
res dos Estados e, juntos, formaram um pacto que ficaria conhecido
como política dos governadores. Esse arranjo político consistiu numa
reciprocidade de apoios. Enquanto o presidente da República passava
a contar com o suporte irrestrito dos parlamentares, os governantes
estaduais, por sua vez, adquiriam respaldo que lhes permitiam do-
minar o quadro político interno, inclusive fazer seus sucessores. O
controle passaria a ser assegurado graças à determinada alteração na
Comissão de Verificação dos Poderes, que avaliava a lisura dos pleitos.
Para os governadores, essa mudança trouxe a vantagem de esti-
mular lealdades e garantir o domínio. Em contrapartida, engessava
o sistema político, impedindo renovações. No âmbito federal a influ-
ência dos paulistas, que já era grande, foi se consolidando e tornou-se
imbatível com a parceria com os mineiros, formando o grupo do café
com leite, que controlou o governo central até 1930. Enquanto isso, os
demais Estados formavam blocos auxiliares ou semi-independentes
sem jamais conseguirem quebrar a sua hegemonia. Não foi por acaso
que o Estado na Primeira República foi qualificado de Liberal-Oligár-
quico. Embora a Carta de 1891 estabelecesse o sufrágio universal e as
eleições passassem a ser periódicas, o número elevado de analfabetos
tornava o eleitorado muito reduzido. Por outro lado, a prática do

39
Ibarê Dantas

voto a descoberto e a inexistência de Justiça Eleitoral resultaram em


pleitos viciados, facilitando o esquema de dominação que articulava
os coronéis com oligarcas, assegurando grande domínio político e
inviabilizando a atuação dos oposicionistas. Sem oportunidade de
alternância de poder, os divergentes foram se afastando, o pluripar-
tidarismo foi cedendo lugar ao partido único e a vida política foi-se
reduzindo ao ritual situacionista de resultados previstos. Dessa forma,
nos vários Estados, depois da primeira década de grande instabilidade
institucional, o controle político acentuou-se, a participação política
declinou e a democracia não se desenvolveu.
Em Sergipe, depois da primeira década tumultuada, o acordo do
presidente Martinho Garcez com o monsenhor Olímpio Campos, um
político remanescente do quadro monarquista que sabia perseguir
com determinação seus objetivos, viabilizou seu domínio. A partir de
então, a política de Sergipe viveria um período de estabilidade. Mas
o forte predomínio de um grupo oligárquico não deixou de gerar
reações crescentes.
No governo, monsenhor Olímpio de Souza Campos administrou
o Estado de 1899 a 1902 com energia e algum empenho para a melho-
ria das condições de vida na capital e no interior. Promoveu aterros
em praças e começou o calçamento de ruas. Restaurou alguns pré-
dios públicos, inclusive a Escola Normal, que voltou a funcionar, e
empenhou-se em criar o Banco de Sergipe sem consumar seu intento.
Reformou o ensino e instituiu a vacinação nas escolas. Cuidou de
reforçar o montepio dos funcionários e organizou a administração
dos hospitais de caridade. No interior, tratou da abertura de canais
no rio Japaratuba e investiu em açudes em Aquidabã e Itabaiana.34
Articulado com o presidente Campos Sales e com lideranças no
Congresso, em plena vigência da política dos governadores, contro-
lando internamente o quadro partidário, Olímpio Campos, ao fim
do seu governo, pôde indicar para sucessor seu secretário-geral. Tal

34
Cf. Mons. Olímpio de Souza Campos. Mensagem Apresentada à Assembleia Legislativa do Estado
de Sergipe em 07.09.1902. Aracaju: Empresa de “O Estado de Sergipe”, 1902.

40
História de sergipe: república

opção contrariou fortes correligionários como Coelho e Campos e


Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel, que criaram o jornal O Momen-
to, estabeleceram dissidência, recorreram a instâncias federais e
tentaram formar outra Assembleia para referendar sua chapa. Mas
Olímpio Campos, fortalecido por eficiente estrutura que articulava
o nacional com o local, chefiando o Partido Republicano de Sergipe,
derrotou-os irremediavelmente.
Josino Menezes era um farmacêutico que fora ativista do movi-
mento republicano. Como auxiliar do governo do monsenhor, conhe-
cia a pequena burocracia e sabia como relacionar-se com os adversá-
rios e correligionários. Leal ao seu chefe, deu continuidade a obras
iniciadas na gestão anterior e desenvolveu novas ações. Prosseguiu as
iniciativas de saneamento e conseguiu implantar o Banco de Sergipe
(1905) que passaria a funcionar regularmente. Empenhou-se em equa-
cionar a questão dos limites com a Bahia, reivindicação recorrente
dos sergipanos, e promoveu estudos visando à construção da Estrada
de Ferro ligando Timbó a Propriá, passando por Aracaju. Construiu
ou continuou obras de açudes em Itabaiana, Porto da Folha, Gararu
e Riachão. Procurou incentivar o movimento literário, garantindo
publicação de obras julgadas importantes.35 A situação mais crítica
do seu governo revelou-se na saúde pública. Diante da precariedade
das condições sanitárias e dos recursos médicos, numa época em que
a medicina ainda engatinhava, ocorreram algumas epidemias. Por
esse tempo, era comum os administradores despenderem recursos e
energia sem grandes resultados. Durante a gestão de Josino Menezes
não foi diferente. Não obstante os esforços dos profissionais de saúde,
houve surto de peste bubônica e de varíola, provocando várias mortes,
enquanto a tuberculose e outras doenças continuavam ceifando vidas
num percentual significativo.36

35
Cf. Josino Menezes. Mensagem Apresentada à Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe em
07.09.1905. Aracaju: Empresa de “O Estado de Sergipe”, 1905.
36
Ver Antônio Samarone de Santana. As Febres do Aracaju (Dos Miasmas aos Micróbios).
Dissertação apresentada ao Núcleo de Ciências Sociais da UFS, Aracaju, 1997.

41
Ibarê Dantas

Ao fim do seu governo (1902-1905), Josino Menezes, em combina-


ção com o chefe político do partido situacionista, apresentou como
sucessor o nome do desembargador Guilherme de Souza Campos, ao
tempo em que elegia seus aliados para a Câmara dos Deputados e ia
para o Senado. A indicação do irmão do monsenhor Olímpio Campos
e a eleição dos correligionários evidenciavam o fechamento e a predo-
minância do grupo olimpista, mas ampliava a indisposição dos seus
adversários que também procuravam articular-se, configurando a
cisão da fração dominante. Foi sintomático que, ao tentar fazer Josino
Menezes senador, aquele líder político já não teve o reconhecimento
esperado. A comissão que julgava as eleições manifestou-se contra.
Como presidente, Guilherme Campos (1905-1908), mais discreto
e moderado do que o irmão, procurou dar continuidade às obras de
seus antecessores, sobretudo àquelas relacionadas à urbanização
de Aracaju. Construiu o cais beirando o rio Sergipe. Firmou alguns
contratos importantes, entre os quais um para os serviços de água
encanada e outro para a implantação dos carris urbanos, que come-
çariam a circular na administração seguinte (1909).37 A construção
da estrada de ferro foi iniciada. Organizou a Biblioteca Pública, que
estava um tanto relegada, e tomou providências para combater epi-
demias. Apesar das críticas dos adversários que visavam sobretudo a
figura do combativo Olímpio Campos, expressão maior do domínio
político oligárquico, parecia que chegaria ao fim do seu mandato sem
grande transtornos. Mas quando a chapa oposicionista, representada
por Coelho e Campos para o Senado e Fausto Cardoso para a Câmara
dos Deputados, facultada por um dispositivo da recente lei eleitoral,
foi vitoriosa em inícios de 1906, o movimento contra os governistas
cresceu enormemente. As folhas oposicionistas, especialmente o
Jornal de Sergipe, exercitaram o discurso antioligárquico, em campa-
nha apaixonada contra o domínio olimpista, conquistando muitas
adesões entre os sergipanos. Entusiasmado com esse movimento,

37
Ver Leis e Decretos, 1900-1908.

42
História de sergipe: república

Fausto Cardoso, que vivia na capital federal há 12 anos, decidiu voltar


a Sergipe sem esconder seus propósitos de pôr fim àquela domina-
ção. Em ambiente marcado por emoções, o líder oposicionista foi
recepcionado por seus admiradores. Nasceu o Partido Progressista,
congregando os divergentes e, pouco depois, o grupo que o apoiava
depôs o presidente do Estado e o vice (10.08.1906).
Desde então, tentou-se montar o novo governo e proporcionar-
-lhe legalidade. Conseguiram o termo de renúncia das autoridades
depostas, mas houve dificuldades para encontrar substituto até que
o desembargador Loureiro Tavares assumiu o governo de transição.
O movimento ampliou-se pelo interior do Estado e a popularidade de
Fausto Cardoso expandiu-se, assumindo as dimensões de grande ídolo.
Os revoltosos foram assegurando o controle da situação em vários
municípios, arrecadando recursos, através do “imposto de guerra”,
invadindo exatorias e hostilizando adversários. Batalhões populares
foram organizados para se juntar às chamadas legiões libertadoras
e, em Divina Pastora, chegaram a reunir 1.200 homens em armas,
preparando-se para grandes embates.38
Guilherme de Souza Campos e seu irmão senador Olímpio de
Souza Campos se homiziaram na casa do comandante da Capitania
dos Portos e comunicaram ao governo federal os fatos acontecidos.
A Câmara dos Deputados passou a discutir o assunto num momento
em que já havia um precedente recente com a deposição e a morte do
governante do Estado de Mato Grosso. O presidente da República, não
obstante ser considerado amigo do líder revoltoso de Sergipe, autori-
zou a intervenção federal e a Câmara dos Deputados, controlada pelo
Bloco, aprovou-a. Quando as tropas provenientes da Bahia chegaram
a Aracaju, Fausto Cardoso, não conseguindo persuadir o comandante
da legalidade de sua Revolta, foi a Palácio acompanhado de amigos
manifestar seu protesto, e o grupo foi dispersado a tiros. Ao fim, pelo
menos três deles foram atingidos, dois dos quais fatalmente, inclusive

38
Cf. Terezinha Oliva de Souza. Impasses do Federalismo Brasileiro (Sergipe e a Revolta Fausto
Cardoso). Rio de Janeiro: Paz e Terra, UFS, 1985, p.190-201.

43
Ibarê Dantas

Fausto Cardoso.39 As tropas do interior desmobilizaram-se em meio


à tristeza generalizada e o sepultamento ocorreu em ambiente de
grande comoção. Durara 17 dias o domínio dos revoltosos. Não obs-
tante a heterogeneidade de suas lideranças, não deixava de ser um
movimento com propósitos de renovação da política local.
Finda a Revolta, Guilherme Campos foi reempossado e surgiram
apelos ao presidente da República pelo esclarecimento do assassi-
nato do tribuno sergipano, mas, segundo historiadora que estudou
o tema, “nada foi feito de concreto para apurar-se a verdade”.40 Em
consequência, meses depois, parentes do parlamentar assassinado
apunhalaram o senador Olímpio Campos numa praça do Rio de
Janeiro. Seu corpo foi trazido para Sergipe e, também, sepultado em
ambiente de grande lamentação.
Terminava assim, de forma duplamente trágica, a tentativa de
mudar o quadro da dominação sergipana. Com sua derrota, o desa-
parecimento dos dois líderes adversários e o trauma que marcou a
sociedade sergipana, a militância política foi inibida.
Guilherme de Campos concluiu seu mandato e, não obstante
algumas mudanças na Presidência da República, articulado com Pi-
nheiro Machado, ainda teve condições de apoiar um correligionário
que foi eleito sem concorrente. Era a vez de José Rodrigues da Costa
Dória, prestigiado médico, nascido em Propriá (SE), que fora deputado
federal por quatro legislaturas (1898-1908). Professor conceituado da
Faculdade de Medicina da Bahia, foi o derradeiro representante do
grupo olimpista.
A gestão de Rodrigues Dória (1908-1911) foi abalada por uma ques-
tão com o vice-presidente Manoel Batista Itajahy, um lagartense que
fizera carreira política em Itabaiana e ganhara fama de violento.41

39
A segunda vítima fatal foi Nicolau dos Santos, um “industrial salineiro”. O farmacêutico
João Marsillac Mota foi ferido, mas sobreviveu. Cf. J. A. Pereira Barreto et alli. O Caso de
Sergipe. Exposição ao Sr. Presidente da República. Rio de Janeiro: Rodrigues & cia, 1906, p. 17.
Ver também Mário Cabral. Roteiro de Aracaju. Aracaju: L. Regina, 1955.
40
Cf. Terezinha Oliva de Souza. Ob. cit., 1985, p. 225.
41
Vladimir Souza Carvalho. A República Velha em Itabaiana. Aracaju: Fundação Oviêdo Teixeira,
2000, p. 300-302.

44
História de sergipe: república

Era um caso parecido com o que ocorrera com o presidente Martinho


Garcez em 1897. Dessa vez, quando o presidente adoeceu e viajou, dei-
xando carta de renúncia em mãos de um médico “para ser apresentada
caso os seus males piorassem e não pudesse voltar”,42 o documento foi
levado a público, gerando grande controvérsia. Instalado no governo,
o dr. Itajahy prometia resistência forte. A contenda judicial dividiu a
Assembleia e envolveu lideranças nacionais até que Rodrigues Dória
reassumiu, cerca de quatro meses depois, com o apoio do presidente
Nilo Peçanha, mas sem grande respaldo no quadro do seu partido, a
essa altura bastante dividido.
Apesar desses problemas, Rodrigues Dória deu prosseguimento
ao projeto de modernização do Estado. Pagou dívidas, promoveu
aterros, consertou prédios públicos, tomou as medidas mais efetivas
para abastecimento de água encanada, e procurou melhorar o ensino
que era foco de reclamações inclusive dos antecessores presidentes
do Estado.43 Neste sentido, o governo ampliou as instalações do Athe-
neu, construiu nova sede da Escola Normal e grupo escolar anexo,
uma inovação. Criou a Escola de Aprendizes Artífices, associada a
um projeto do governo federal de incentivar o ensino técnico44 e
contratou competente profissional de São Paulo para operar reforma
da instrução pública. Com essa orientação, promoveu levantamento
estatístico da população escolar e sinalizou para o ensino obrigatório.
Um tanto desintegrado do quadro político local, sobretudo depois da
questão com o vice, dissolveu o corpo policial e procurou reorganizá-lo
ao tempo em que pregava a reorganização da Justiça, considerando-a
muito envolvida na política. Em sua gestão, a construção da Estrada de
Ferro se intensificou, afetando a vida das comunidades onde os traba-
lhadores serviam. Ao fim do seu governo, enfrentou grande epidemia
de varíola, ao tempo em que terminava o ciclo de representantes do

42
João Rodrigues da Costa Dória. Vida e Trabalhos do Professor Dr. José Rodrigues da Costa Dória.
Aracaju: 1958, p.17.
43
Ver Mensagens Presidenciais de 1905, 1908 e 1911.
44
Cf. José Augusto Araújo. As Escolas de Aprendizes Artífices na Primeira República in Jornal
da Cidade, 24.09.2002.

45
Ibarê Dantas

grupo olimpista (1899-1911). Não se pode dizer que foi um período de


grandes realizações, mas de conformidade com os meios disponíveis
no tempo, houve iniciativas meritórias, sobretudo em Aracaju.
A essa altura, no início da gestão do presidente da República
marechal Hermes da Fonseca (1910-1914), o ambiente político estava
agitado com as intervenções militares que tinham a pretensão de
“salvar” o país das oligarquias. Caíam os Accioly no Ceará e os Malta
em Alagoas num processo tumultuado. Em Sergipe, não houve quebra
da legalidade, pois o presidente, em combinação com o líder nacional
Pinheiro Machado, indicou o marechal José Siqueira de Menezes. Os
faustistas, que desde 1906 se sentiam desprestigiados e/ou persegui-
dos, animaram-se, e o quadro político situacionista local adaptou-se
ao esquema dominante, um tanto impregnado de ranço militarista.45
O novo presidente estadual, eleito sem competidor para o perí-
odo 1911-1914, já havia integrado juntas governativas logo depois da
proclamação da República e participado de várias missões, inclusive
da campanha de Canudos, sendo, portanto, um militar dos mais con-
decorados. Sem muito entrosamento com o quadro político estadual,
empenhou-se em governar sem deixar envolver-se com as facções
locais, enquanto seu chefe de Polícia tratava com intolerância aqueles
que não se submetiam à disciplina imposta. De início, enfrentou um
surto de varíola violento que, em 1911-12, afetou sobretudo Laranjeiras,
Propriá, Itabaiana, Riachuelo e Aracaju, deixando nos vários municí-
pios 740 óbitos.46 Como engenheiro experiente em outras empresas,
apresentou-se com programa ambicioso: obras de saneamento (esgoto
e drenagem) de Aracaju, serviços d’água e de iluminação elétrica,
construção de prédios públicos e de pontes, açudes e represas.47 Para
realização desses projetos, contraiu dois empréstimos (de 6 mil e 4,5

45
Sobre a Política das Salvações no Estado, ver Josevanda Mendonça Franco. A Política das
Salvações: Um Estudo de Caso. UFS, História I, Trabalho apresentado no Curso de Bacharelado,
1982. (mimeografado).
46
Cf. Antônio Samarone de Santana. Ob. cit., 1997, p. 119.
47
Cf. General José Siqueira de Menezes. Mensagem Apresentada à Assembleia Legislativa do
Estado de Sergipe em 07.09.1912, Aracaju: Empresa de O Estado de Sergipe, 1912, p. 11.

46
História de sergipe: república

mil contos de réis) em momentos diferentes. Ao fim, não realizou


tudo o que planejou, mas inaugurou o trecho da Estrada de Ferro que
chegava a Aracaju, assim como a iluminação elétrica. Os serviços de
água passavam para o controle do Estado e a rede de esgoto recebeu o
impulso mais efetivo. Editou copiosa legislação dispondo sobre nova
organização da instrução pública e concedeu favores por dez anos
para exploração da rede telefônica.
No campo, uma de suas iniciativas mais lembradas foi o início
de demarcação de lotes, visando à construção de Centro Agrícola e a
reorganização do Serviço de Inspeção do Algodão. Empreendeu ainda
obras menores e, como seu mandato se revelou curto para fazer tudo
que planejara, deixou projetos que posteriormente seriam retomados
pelos sucessores, mesmo porque estes disporiam de mais tempo, já
que a reforma da Constituição estadual de 1913 ampliou o mandato
do presidente do Estado de três para quatro anos.48 Ao fim do seu
governo, não teve grande ingerência na escolha do seu sucessor. Por
isso, sua administração já foi chamada de interregno salvacionista.
Desde 1911, a vida partidária, que já era diminuta, cedeu lugar à
predominância exclusiva do Partido Republicano Conservador como
elemento formalizador das candidaturas situacionistas. Dentro desse
quadro, ascendeu o general Oliveira Valadão apoiado por Pinheiro
Machado, que continuava gozando de grande influência na política
nacional. Valadão, atuante na política sergipana desde a primeira
década, influindo em diversos acontecimentos com ou sem mandatos
de presidente do Estado (1894-1896), deputado federal (1903-1904 e
1906-1907) e senador (1907-1914), voltou a governar Sergipe (1914-1918).
Dessa vez, fez as pazes com alguns adversários e, numa quadra de
melhoria da arrecadação devido à elevação dos preços do açúcar e dos
tecidos, deu continuidade às obras de seus antecessores. Inaugurou
o segundo trecho da ferrovia, ligando Aracaju a Propriá, prosseguiu
ações de saneamento e aterro, construiu dois grupos escolares na ca-
pital e um em sua terra natal, Vila Nova. Reformou prédios públicos,

48
Cf. Leis 603 de 24.08.1912 a 627 de 30.10.1912.

47
Ibarê Dantas

inclusive o Palácio do Governo, investiu na Usina de Eletricidade e fez


algumas reformas do ensino, introduzindo inclusive cursos noturnos
destinados aos operários.49
Em 1915, assassinaram, no Rio de Janeiro, Pinheiro Machado, mui-
to atacado como responsável pela estrutura de poder vigente. Mas o
sistema oligárquico prosseguiu. Valadão, antes de deixar o governo,
combinou com o tenente-coronel Pereira Lobo para candidatar-se ao
Senado. Pouco tempo depois, fizeram a permuta. Lobo renunciou ao
mandato de senador e, dentro dos esquemas situacionistas, foi eleito
presidente do Estado. Nascido em São Cristóvão (SE), em 1864, o novo
governante de Sergipe, casado com uma enteada de Valadão, era seu
aliado leal desde as lutas da primeira década republicana. Como vice-
-presidente chegou a assumir a titularidade (11.10.1897 a 20.03.1898),
quando sofreu rumoroso processo de impeachment. Eleito para go-
vernar o Estado de 1918 a 1922, fora o último dos militares, durante a
Primeira República, a administrar com o respaldo do voto popular.
Ao todo foram quinze anos de presença de oficiais do Exército. Nessa
última safra, todos os três oficiais já estavam reformados e já tinham
ocupado o governo na primeira década, quase sempre por tempo
curto. Nessa última vez, mais experientes e amadurecidos, puderam
colher alguns frutos das iniciativas passadas e semear novas obras,
facilitadas pelo crescimento das arrecadações decorrentes sobretudo
da elevação dos preços do açúcar, no período 1915-1920.
Pereira Lobo, ainda nas festas da posse, em outubro de 1918,
deparou-se com um problema gravíssimo. Era o surto da gripe es-
panhola que se espalhava por praticamente todas as cidades e vilas
do Estado, sendo registrados 25.910 casos, resultando em 997 mortes
segundo os registros oficiais.50 Tratava-se de mais uma epidemia que
deixava patente a falta de estrutura de saúde para enfrentar tragédias
dessa natureza. Em 1920, quando Sergipe comemorava um século de

49
Cf. Manuel Priscilino de Oliveira Valadão. Mensagem Apresentada à Assembleia Legislativa
do Estado de Sergipe em 07.09.1918, Aracaju: Imprensa Oficial, 1918.
50
Cf. Antônio Samarone de Santana. Ob. cit., 1997, p. 124.

48
História de sergipe: república

autonomia política em relação à Bahia, em meio a vários eventos, o


presidente do Estado, em Mensagem à Assembleia Legislativa, lem-
brava que Aracaju ainda tinha “grandes pântanos”.
Desafiados pelas tragédias epidêmicas, os governantes vinham
cuidando do saneamento e do aperfeiçoamento dos métodos da saúde
pública. Mas era uma evolução lenta com pouca ou nenhuma ajuda
da esfera federal. Diante da mortandade de 1918, uma comissão da
Diretoria Geral de Saúde Pública veio a Sergipe no ano seguinte e
passou a fornecer orientação mais aprimorada de política sanitária.51
Enquanto isso, o governo estadual ia fazendo novos aterros, drenagens
e ampliando serviços de água, esgotos, luz, calçamentos, melhorando
principalmente a feição de Aracaju. Novos grupos escolares foram
construídos na capital e no interior, outros prédios públicos foram
reformados e a Biblioteca do Estado ganhava casa própria. Mas, ao
lado desses melhoramentos, novas demandas iam aparecendo. O
presidente, que já reclamava das dificuldades para manter 89 muares
que puxavam os bondes na capital, assumia o controle da primeira
rodovia, ligando Salgado a Estância, que fora construída por parti-
culares durante o governo de Valadão. Intermediou questões entre
capital e trabalho, e procurou atender outras demandas como foi o
caso da revisão e atualização dos velhos códigos de processo criminal,
civil e comercial do Estado. O fato é que aos poucos o aparato público
ia se modificando e a feição das cidades se transformando.
A essa altura, o quadro político foi-se revelando mais inquieto.
Recordemos que, de 1907 a 1921, internamente, o controle político foi
estabelecido sem a vigilância de partidos oposicionistas. Sobretudo
depois de 1911 a sociedade passou a viver entre os elogios fáceis e a
indiferença tácita. As campanhas civilistas lideradas por Rui Barbo-
sa em 1910 e 1919 criaram novas expectativas, mas não alcançaram
êxito eleitoral. Restaram as mensagens e as aspirações reprimidas.
Mas a situação foi-se modificando. Embora os partidos fossem esta-

51
Cf. Antônio Samarone de Santana. Ob. cit., 1997, p. 107.

49
Ibarê Dantas

duais, os movimentos políticos nacionais repercutiam em Sergipe.


O comportamento de alguns jornais foi-se revelando mais crítico,
e o governo Pereira Lobo passou a reagir com medidas truculentas
contra os divergentes.52
Por volta de 1922, desencadeou-se novo ciclo de inquietações com
a campanha da Reação Republicana que dividiu a imprensa local, re-
fletindo o clima de descontentamento. Ex-presidentes do Estado, como
o velho marechal Siqueira de Menezes e Rodrigues Dória, oficiais do
Exército e numerosos civis, chefes políticos do interior e líderes da
capital revelaram-se simpatizantes e até entusiastas do movimento
que, em Sergipe, apoiava o aristocrata senador Gonçalo Rolemberg
para presidente do Estado. A atuação combativa dos irmãos Nobre,
Manoel e Francisco à frente do Jornal do Povo, com linguagem por
vezes agressiva, resultou em invasão da folha, prisão de jornalistas
e ameaças de morte.
Após sucessivas eleições com postulante único, a disputa voltava
a agitar a campanha eleitoral em Sergipe.53 Ao fim, o situacionismo
venceu, mas deixou sequelas represadas num ano particularmente
marcado por eventos significativos como a Semana de Arte Moder-
na, a fundação do PCB e a criação do Centro D. Vital, que haveria de
desempenhar importante papel no movimento da Igreja Católica. Em
Sergipe, essa inquietação cultural e política de algum tempo vinha
se gestando com o surgimento do Centro Socialista Sergipano (1918)
e da Liga Sergipense contra o Analfabetismo, na qual expressões fe-
mininas, como a farmacêutica Cezartina Régis e a médica Ítala Silva
de Oliveira, se engajaram de forma decidida através da imprensa.54
Foi nesse novo momento que ascendeu Maurício Graccho Cardoso
(1922-1926). Filho do conceituado professor Brício Cardoso, o novo

52
Sobre denúncias contra o governo Lobo, ver Jornal do Povo, 1921 e 1922.
53
Sobre a campanha da Reação Republicana em Sergipe, ver Manoel Dantas. Um Político da
“Reação Republicana”. Salvador: Progresso, s/d.
54
Sobre a participação das mulheres sergipanas nos eventos políticos e sociais, ver Maria
Lígia Madureira Pina. A Mulher na História. Aracaju: s/d e Maria Thetis Nunes. História da
Educação em Sergipe. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.

50
História de sergipe: república

governante, depois de viver alguns anos no Ceará, como jornalista,


professor e político vinculado aos Accioly, diante da derrocada política
deste grupo, em momento de dificuldades foi para o Rio de Janeiro,
aproximou-se de figuras influentes, integrou-se no esquema Valadão/
Lobo e, em 1922, foi eleito presidente do Estado de Sergipe. Pragmáti-
co, adotado pela oligarquia local, manifestou-se sempre reverente ao
governo federal, mas isso não impediu de realizar a administração
mais modernizadora do século XX em Sergipe.
Em sua plataforma de administração, Graccho Cardoso já demons-
trava ideias bastante articuladas com relação a problemas cruciais,
entre os quais a regularização da propriedade fundiária e a saúde.
Com recursos públicos ampliados com o aumento da arrecadação
e graças à parceria com empresários, o governo promoveu diversas
obras importantes. Com o auxílio de técnicos competentes locais e de
fora, comandou empreendimentos que mudaram a face de Aracaju
e melhoraram o quadro de diversos municípios do interior. Provi-
denciou novos aterros e sobretudo calçamentos a paralelepípedos.55
Reconstruiu a rede de abastecimento de água, tornando-a eficiente
e abrangente. A parte dos esgotos, que fora iniciada na gestão de
Siqueira de Menezes, foi replanejada e executada em grande parte
da cidade. Na saúde pública, provocou enormes transformações. Es-
tabeleceu parceria com a Diretoria de Higiene e Saúde e montou os
serviços sanitários do Estado. Reestruturou as ações de saneamento
rural e editou Código Sanitário, regulando as políticas públicas dentro
dos padrões dos centros mais desenvolvidos do país. Criou o Instituto
Parreiras Horta, que facultou recursos laboratoriais à prática médica
e contribuiu decisivamente para a construção do Hospital de Cirurgia,
que superaria o modelo asilar dos hospitais de caridade, tornando-o
realmente local de cura.56 A esses centros, acrescentou-se o Instituto
de Química como mais um local de fecundas experiências científi-

55
Os calçamentos a paralelepípedos foram iniciados em 1919. Cf. Fernando de Figueiredo
Porto. Alguns nomes antigos de Aracaju. Aracaju: J. Andrade, 2003, p. 101.
56
Cf. Antônio Samarone de Santana. Ob. cit., 1997.

51
Ibarê Dantas

cas dos profissionais de Sergipe. Em combinação com o Ministério


da Agricultura, foram inauguradas as “primeiras pesquisas sobre a
possibilidade da existência de Petróleo em Sergipe”.57 Na educação,
encontrou o Estado com cinco grupos escolares e deixou com 14.58 O
ensino técnico, que até 1922 dispunha apenas da Escola de Aprendizes
e Artífices (1910), foi enriquecido com a Escola de Comércio Conse-
lheiro Orlando (1923), o Lyceu Profissional Coelho e Campos (1923)59
e o referido Instituto de Química Industrial (1926). No ensino supe-
rior, instituiu a Faculdade de Direito Tobias Barreto, que encontrou
dificuldades para funcionar, e a Faculdade de Farmácia, que legou ao
seu sucessor com 22 alunos matriculados.
Em convênio com empresário progressista, promoveu a constru-
ção de obras importantes como a imponente Penitenciária, o amplo
Mercado e o Matadouro, todos qualificados como modelos. Ademais,
criou o Banco Estadual de Sergipe, substituiu os bondes a tração
animal por carris elétricos e instituiu regulamento para inspetoria
de veículos.60
No interior, além da edificação de grupos escolares, instalou luz
elétrica em Estância, Lagarto e N. Sra. das Dores, dinamizou a cons-
trução de novas estradas. Contratou conceituado técnico americano
especialista no cultivo do algodão e promoveu várias iniciativas de
incentivo à sua produção. Preocupou-se também com experiências
industriais e com a classificação do gado. Instituiu o Centro Agrícola
e atraiu 22 famílias de origem alemã para enriquecer com sua experi-
ência nossa agricultura.61 Enfrentou o difícil problema da regulariza-

57
Maurício Graccho Cardoso. Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa, em 07.09.1926,
Aracaju: Typ. Instituto Coelho e Campos, 1926, p. 78.
58
Em 1922 havia três grupos na capital, um em Capela e outro em Vila Nova. Cf. Maurício
Graccho Cardoso. Mensagens apresentadas à Assembleia Legislativa, 1924-1925, Aracaju:
Imprensa Oficial.
59
O Instituto Coelho e Campos fora construído na administração de Pereira Lobo graças à
doação de 300 contos de réis do senador Coelho Campos para este fim. Inicialmente foi
oferecido um curso de mecânica prática. Ver Pereira Lobo. Mensagens presidenciais, 1920-
1922.
60
Cf. Maurício Graccho Cardoso. Mensagens presidenciais, 1923-26.
61
Ver Maurício Graccho Cardoso. Ibidem.

52
História de sergipe: república

ção da propriedade fundiária. Interessado na questão desde quando


deputado, criou a Inspetoria de Terras, Matas e Estradas, e promoveu
a demarcação, inclusive de áreas de comunidades indígenas, a fim de
registrar as propriedades e montar um cadastro territorial, ao tempo
em que tentava reaver aquelas áreas apossadas irregularmente e tri-
butar os terrenos baldios. Mas tais medidas descontentaram os pro-
prietários do campo e sua iniciativa não foi avante como se desejava.62
Apesar da consciência dos problemas, Graccho Cardoso foi per-
cebendo as dificuldades para efetivar seus projetos, fez concessões e
nem sempre conseguiu evitar descontentamentos. Embora tenha se
manifestado bastante reverente ao presidente da República, inclusive
atendendo o seu pedido de eleger senador, Lopes Gonçalves, cidadão
maranhense sem nenhuma vinculação com o Estado, perdeu apoio
dos quadros políticos dominantes locais. O presidente da Assembleia,
Manoel Dantas, mais identificado com a propriedade rural, passou
a examinar o mérito da proposição e alterou o conteúdo do projeto
de regularização fundiária. Por ocasião da eleição da mesa da As-
sembleia, o governo contrariou interesses de Pereira Lobo, que criou
uma dissidência, dividindo as lideranças locais.63 Como se isso não
bastasse, o movimento tenentista, que vinha crescendo desde 1922 no
plano nacional, repercutiu em Sergipe através de duas revoltas que
lhe trouxeram grandes dificuldades.
Dois anos depois que jovens militares se amotinaram no Forte de
Copacabana, quando os rebeldes estavam sendo processados, um gru-
po voltou a revoltar-se e tomou a cidade de São Paulo em 05.07.1924. O
governo federal solicitou do presidente do Estado de Sergipe o envio
de contingente armado para ajudar a enfrentar os revoltosos. Quando
o governante sergipano arregimentava forças para enviá-las para o

62
Cf. Maurício Graccho Cardoso. Mensagens apresentadas à Assembleia Legislativa, em 1925
e 1926 e Josué Modesto dos Passos Subrinho. Reordenamento do Trabalho: trabalho escravo e
trabalho livre no Nordeste açucareiro, Sergipe 1850/1930. Aracaju: Funcaju, 2000. p. 343-365.
63
Por ocasião da eleição da mesa da Assembleia (08/1924), Graccho Cardoso e Lobo, que já
vinham divergindo, não chegaram a um consenso. Decorrido o pleito, a chapa do primeiro
venceu a do ex-presidente por 16 X 7, configurando o rompimento entre as duas lideranças
e enfraquecendo o quadro situacionista.

53
Ibarê Dantas

Sudeste, militares do Amazonas, Mato Grosso e Sergipe se rebelaram


em solidariedade àquele levante.
Em Aracaju, quatro oficiais, entre os quais o tenente Augusto
Maynard Gomes, acompanhados de soldados, saíram da sede do 28o
BC na madrugada de 13.07.1924, investiram contra o Quartel da polí-
cia e o Palácio, mataram dois sentinelas, prenderam o presidente do
Estado, vários de seus auxiliares e formaram uma Junta Governativa.64
Lançaram proclamação ao povo sergipano e dominaram o Estado por
21 dias. Ao fim, tropas do 20º BC., 21º BC., 22º BC., comandadas pelo
general Marçal Nonato de Faria da 6ª Região Militar, vieram a Sergipe
e o movimento desfez-se sem enfrentamentos sangrentos. Graccho
Cardoso foi reempossado e, como representante da ordem vigente,
revelou-se adversário dos tenentes.
Os levantes do Amazonas e do Mato Grosso também foram su-
focados, mas o grupo de São Paulo deixou a capital e marchou em
direção ao Rio Grande do Sul até encontrar-se com tropas prove-
nientes deste Estado. Nasceu assim a Coluna Prestes, que percorreu
milhares de quilômetros resistindo ao cerco das forças governistas
de 1925 a 1927, até quando seus sobreviventes se internaram na Bo-
lívia. Quando essa Coluna, em 1926, passava pelo interior da Bahia,
os tenentes sergipanos, não obstante estarem presos, dominaram
as sentinelas e voltaram a revoltar-se. Maynard, gozando de grande
popularidade dentro e fora do quartel, com a conivência de militares
e civis, conseguiu sair da prisão e liderar grande contingente para
uma nova aventura de enfrentamento. Após longo tiroteio nas ruas
de Aracaju, deixando o saldo de 11 mortos e cerca de duas dezenas de
feridos, os rebeldes foram vencidos. Em consequência dessa revolta,
um mês depois cerca de 100 envolvidos, inclusive suas lideranças,
foram desterrados para Ilha da Trindade, onde viveram em condi-

64
A Junta Governativa era formada pelos seguintes oficiais: cap. Eurípedes Esteves de Lima; 1º
ten. Augusto Maynard Gomes; 1º ten. João Soarino de Melo e Manoel Messias de Mendonça, 2º
tenente. Sobre o assunto, ver José Ibarê Costa Dantas. O Tenentismo em Sergipe (Da Revolta de
1924 à Revolução de 1930). Petrópolis, RJ: Vozes, 1974. Há uma segunda edição da J. Andrade,
promovida pela Funcaju, de 1999.

54
História de sergipe: república

ções difíceis até início de dezembro de 1926, quando foram levados


para o Rio de Janeiro.
Graccho Cardoso pôde então terminar seu mandato em paz, mas
não conseguiu indicar seu sucessor nem foi para o Senado, como
quase sempre acontecia, conforme se observa pelo quadro I. A sua
presença naquela Casa limitou-se ao pequeno período no ano de
1922, dentro do esquema de guardar o lugar para Pereira Lobo, que
ainda era presidente do Estado. Num tempo em que o quadro político
estadual estava marcado pelo dissenso, o presidente da República
procurou uma pessoa distanciada da política local para sucedê-lo.
Nesse sentido, indicou Cyro Franklim de Azevedo, um velho e culto
diplomata sergipano que há muito tempo vivia afastado de sua terra.
O pleito referendou o seu nome e, em 06.11.1926, aquele intelectual
assumiu o governo criticando a gestão passada. Mas governou apenas
cerca de dois meses. Anulou algumas iniciativas do governo Graccho
Cardoso, inclusive a recém-criada Faculdade de Farmácia, alegando
medida de economia, e logo adoeceu. Viajou para o Rio de Janeiro,
onde faleceu em 17 de janeiro de 1927.
Percebendo a sua oportunidade, o deputado Manoel Corrêa
Dantas, que então ocupava a Presidência da Assembleia Legislativa,
foi à capital do país e voltou candidato indicado pelo poder central.
Nova eleição foi realizada, legitimando sua investidura para o período
1927-1930. Usineiro de família tradicional do município de Capela
(SE),65 lídimo representante dos interesses dos senhores do açúcar,
administrou o Estado numa conjuntura de dificuldades econômicas e
políticas. Manteve parte do secretariado nomeado por Cyro Azevedo e
recrutou alguns simpatizantes do movimento tenentista em Sergipe.
Não obstante preservar na Secretaria de Obras o jovem engenheiro
Leandro Maynard Maciel, que se foi revelando operoso gestor, seu go-
verno deixou um elenco de realizações aquém do ocorrido nas últimas
administrações. Indisposto com o ex-presidente Graccho Cardoso e

65
Ver Orlando Vieira Dantas. A Vida Patriarcal de Sergipe. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.

55
Ibarê Dantas

premido pelas circunstâncias, inclusive dívidas herdadas, empenhou-


-se em suprimir repartições, cargos e cortar despesas. Rescindiu
contrato com o Banco do Estado, criado em 1923, e com o Mercado
Modelo, cuja administração passou para o controle do município da
capital. Extinguiu a Inspetoria de Terras, Matas e Estradas, dispen-
sando o pessoal ligado ao setor, agradando a parcela dos proprietários
rurais desinteressados na regularização da propriedade territorial. O
Centro Agrícola, por sua vez, careceu de maior assistência, ao tempo
em que a natureza e a economia manifestavam-se adversas. As secas
de 1926 e 1928 afetaram a produção, a baixa dos preços do açúcar,
que vinha ocorrendo desde 1926, agravou a situação do tesouro do
Estado. A crise de 1929 atingiu o empresariado e as finanças internas,
embora em menor proporção do que em outros Estados.66 Como as
estradas e as obras de engenharia herdadas exigiam despesas elevadas
com consertos, a conservação nem sempre pôde ser realizada com a
presteza necessária. Mesmo assim, procurou-se levar avante o plano
rodoviário, construindo outras vias e providenciou-se a desobstrução
do rio Japaratuba, cuja navegação estava prejudicada.67 No interior,
o banditismo, representado pelo grupo de Lampião, já começava a
desafiar as autoridades e incomodar as populações sobretudo do
sertão, provocando grande insegurança e migrações.
Enquanto isso, a convivência do governo Manoel Dantas com
alguns setores influentes do Estado e da sociedade sergipana foi-se
tornando difícil. A agressão física cometida pelos filhos do governante
contra o presidente do Tribunal de Relação foi apenas uma das ques-
tões que marcaram sua administração. Governando nos tempos de
uma ordem cada vez mais questionada, quando as agitações políticas
se intensificavam, não exercitou a tolerância com seus adversários
políticos, incluindo aí alguns oradores da Aliança Liberal.

66
Cf. Antônio José Nascimento. O “Crash” de 29 e a Economia Sergipana in Newton Pedro da
Silva e Dean Lee Hansen (orgs.). Economia Regional e Outros Ensaios. Aracaju: UFS/Fundação
Oviêdo Teixeira, 2001.
67
Cf. Manoel Corrêa Dantas. Mensagens apresentadas à Assembleia Legislativa, 1927-1930.
Aracaju: Imprensa Oficial, 1927-1930.

56
História de sergipe: república

No processo de escolha do futuro chefe do Executivo, o quadro


político situacionista dividiu-se, mas Manoel Dantas conseguiu,
junto ao presidente da República, que fosse indicado o comerciante
Francisco de Souza Porto, que foi eleito pelo voto popular dentro
dos esquemas tradicionais. Contudo, a eclosão da Revolução de 1930
impediu sua posse.
Quanto aos revoltosos, depois que saíram da Ilha de Trindade,
em dezembro de 1926, os praças foram recambiados para Sergipe,
enquanto que os oficiais passaram um tempo no Rio de Janeiro.
Maynard esteve num quartel da capital federal, em prisão bastante
relaxada, podendo passear, receber amigos e articular-se. Pouco de-
pois, as lideranças, gozando de popularidade, foram julgadas, mas
receberam penas baixas. Numa ordem política em declínio, alguns
participantes do movimento tenentista passaram a integrar o gover-
no Manoel Dantas, ganhando influência na política estadual antes
mesmo da Revolução de 1930. Mas essa situação criou um certo em-
baraço para aqueles ex-revoltosos que já eram governistas e torciam
por transformações na política nacional. Afinal, o governo local se
encontrava bem afinado com a orientação situacionista sob a chefia
do presidente Washington Luiz, que continuava forte. O postulante
oficial, Júlio Prestes, derrotou Vargas e a situação parecia prosseguir
como antes. Mas, no âmbito nacional, os descontentamentos repre-
sados manifestaram-se com toda a força quando João Pessoa, o candi-
dato a vice-presidente na chapa perdedora, foi assassinado em Recife.
Os ânimos se exaltaram e desencadearam o movimento armado de
outubro de 1930, que tenderia a mudar a política nacional e local.
Em meio a contradições, pode-se dizer que as repercussões do
movimento tenentista em Sergipe foram bastante significativas.
Sendo o único Estado do Nordeste onde houve revoltas expressivas
lideradas por militares, os eventos tiveram vários desdobramentos
internos. Geraram um líder que permaneceu influente despertando
simpatias e esperanças. Como numerosas pessoas envolveram-se nos
episódios e foram processadas, surgiram formas de resistência, laços
de solidariedade interna e novas ações políticas, alimentando uma

57
Ibarê Dantas

cultura oposicionista mais abrangente. Com a vitória de outubro de


1930, esses precedentes tenderiam a favorecer as transformações que
viriam a ocorrer.
QUADRO I. Sucessão dos Governantes de Sergipe (1899-1930)
Concorrentes
Presidentes do Estado de Sergipe
da Oposição
Período Nome do Mandato
Profissão Votação Nome Votação
administrativo Presidente de Senador
Olímpio M. P. Oliveira
1899-1902 Padre 7.555 1903-1906 390
Campos Valadão
Josino Leandro R. S.
1902-1905 Farmacêutico 7.993* 996
Menezes Maciel
Guilherme de
1905-1908 Desembargador 6.154 1909-1917
S. Campos
J. Rodrigues
1908-1911 Médico 5.872
Dória
J. Siqueira de
1911-1914 Militar 7.199 1915-1923
Menezes
M. P. Oliveira 1907-1914;
1914-1918 Militar 8.164
Valadão 1919-1921
J. J. Pereira 1914-1918;
1918-1922 Militar 6.796
Lobo 1923-1930
M. Graccho Gonçalo
1922-1926 Advogado 8.693 1922 366
Cardoso Rolemberg
11.1926 a
Cyro Azevedo Diplomata 11.659
01.1927
Manoel C.
1927-1930 Usineiro 11.903
Dantas
Francisco S.
1930 Negociante 17.038
Porto**
*
Da votação de 1902, a fonte não dispunha do resultado de Santo Amaro.
**
Francisco Porto não chegou a tomar posse em face da Revolução de 1930.

58
História de sergipe: república

1.3 O Processo Econômico-social

Durante a Primeira República, a principal fonte de financiamento


da economia nacional era a exportação de produtos primários, espe-
cialmente o café e o açúcar.
Em Sergipe, o açúcar e, num segundo plano, o algodão eram os
elementos mais importantes da economia, integrados no modelo
agroexportador, sob a predominância do capitalismo mercantil.
Mas a pecuária juntamente com as culturas de subsistência também
ocupavam espaço relevante, principalmente no agreste e no sertão.
O açúcar era exportado através das barras dos rios, especialmente
do porto de Aracaju. No início do século, saíam de Sergipe cerca de 200
embarcações com destinos variados. A maioria dirigia-se para portos
nacionais, mas uma pequena parte saía para Nova York, Liverpool ou
Hamburgo.68 A dificuldade crescente de exportação para o mercado
externo, a partir da década de dez, contribuiu para que o comércio
se realizasse sobretudo com os Estados do Sudeste (Rio de Janeiro e
São Paulo) e do Sul (Paraná e Rio Grande do Sul).69
No início dos anos noventa, a questão da mão de obra e a carência
de lucratividade na produção açucareira resultaram em crise gene-
ralizada, afetando vários Estados. No caso específico de Sergipe, as
dificuldades em encontrar pessoas para trabalhar na fabricação de
açúcar e nas lavouras das fazendas não se limitaram à última década
do século XIX. Nos anos seguintes, o problema continuou com varia-
da intensidade, estimulado por alguns movimentos. As emigrações
para outras regiões e o recrutamento para construir a estrada de
ferro foram alguns dos fatos responsáveis pelo aumento da escassez

68
Cf. Mons. Olímpio de Souza Campos. Mensagem Apresentada à Assembleia Legislativa do Estado
de Sergipe em 07.09.1902. Aracaju: Empresa de “O Estado de Sergipe”, 1902. Se incluirmos
as embarcações pequenas, como canoas, saveiros, jangadas, barcadas, lanchas, patachos,
cluper, iates, vapores, balieiras, botes e logares, somente no porto de Aracaju em 1899 foram
matriculadas 661 unidades. Laudelino de Oliveira Freire. Quadro Chorographico de Sergipe.
Paris: H. Garnier, 2. ed., 1902. p. 67.
69
Ver Josué Modesto dos Passos Subrinho. Reordenamento do Trabalho: trabalho escravo e
trabalho livre no nordeste açucareiro, Sergipe 1850/1930. Aracaju: Funcaju, 2000. p. 209-210.

59
Ibarê Dantas

de mão de obra.70 Esses acontecimentos, associados com a elevação


dos preços dos produtos de exportação, estimularam os produtores
a modernizarem seus centros industriais. Essa tendência persistiu
até pelo menos 1930, alterando o perfil dos proprietários. Tornou-se
sinal de prosperidade e prestígio passar de senhor de engenho para
usineiro. Dentro dessa tendência, o número dos banguês decresceu
bruscamente e o de usinas aumentou, conforme pode ser observado
pelo quadro abaixo.

Quadro II. Centros de Produção de Açúcar (Sergipe –1903-1930)

ANOS ENGENHOS BANGUÊS USINAS


19031 643 14
19172 329 54
19273 220 86
19304 - 86
Fontes: (1) Josino Menezes. Mensagem à Assembleia Legislativa, em 07.09.1903. Aracaju: Typografia d’Oeste de
Sergipe, 1903, p. 44-5. (2) Manoel P. de Oliveira Valadão. Mensagem à Assembleia Legislativa em 7.9.1917. Aracaju:
Imprensa Oficial, 1917, p. 27. (3) Inspetoria Agrícola do 10o Distrito, Ministério da Agricultura e APES, Pacotilha
936, apud Josué Modesto dos Passos Subrinho. História Econômica de Sergipe (1850-1930). Aracaju: UFS, Programa
Editorial da UFS, 1987, p 72 e 75. (4) Armando Barreto (org.). Cadastro de Sergipe. Aracaju, 1933, p. 141-2.

Diante do grande declínio da quantidade dos engenhos banguês,


parecia que para os proprietários dessas unidades somente restavam
duas alternativas: modernizarem-se ou encerrarem suas atividades de
produtores e virarem fornecedores de cana para as grandes unidades
dotadas de maior produtividade. Embora a médio prazo essas opções
terminassem predominando, de imediato ainda havia possibilida-
de de resistência, mesmo porque a esmagadora maioria daquelas
empresas, que passaram a ser chamadas de usinas, sofreu pequena
transformação tecnológica, pois não tinha o porte das que existiam
em Pernambuco e Alagoas. Como seus proprietários investiam pouco,
passaram a ser qualificadas de “meia-usinas” e mais jocosamente
de “banguês enfeitados”. Daí Sergipe ser considerado a “república
das meias usinas”, pois as “completas”, em 1917, não passavam de

70
Josué Modesto dos Passos Subrinho. Ob. cit. cap. VII.

60
História de sergipe: república

quatro,71 entre as quais a Usina Central, conhecida como das mais


bem aparelhadas do país.
É certo que as reformas por que passaram, por menor que tenham
sido, contribuíam para ampliar a produtividade, mas os custos por vezes
se tornavam mais elevados do que os dos engenhos tradicionais. En-
tretanto, essa modernização72 não foi suficiente para elevar a produção
para os níveis do período 1881-1887. De 1891 a 1929, a média anual não
passou de 24.629 toneladas, aliás bem distanciada daquela fase anterior
que fora de 41.590 toneladas.73 Também não evitou que Sergipe fosse
perdendo posição diante das demais unidades da federação. Enquanto
no período 1890-1900, nossa produção correspondia a 8,6% do cômputo
nacional, de 1921 a 1930 ficamos com a média de 2,6%.74
De qualquer forma, continuavam os seus centros de produção
açucareira como a principal fonte de riqueza, em face dos lucros
proporcionados aos proprietários, dos impostos arrecadados aos co-
fres públicos e dos empregos que geravam. Pelos idos de 1916, dados
fornecidos por 32 usinas e 124 engenhos revelaram que nas primeiras
havia 1.441 operários e nos últimos 3.379 trabalhadores.75
Depois do açúcar, num segundo plano, vinha o algodão, que era
cultivado sobretudo no agreste e no sertão pelos pequenos proprie-
tários. Daí ser chamado de cultura de pobre que, no entanto, gerava
efeito econômico significativo, sobretudo nos municípios onde o
cultivo da cana era impróprio. Pelo menos até 1911, o valor da ex-
portação de algodão superava a dos tecidos, mas, a partir de 1913, a
situação inverteu-se.
A pecuária não parava de crescer apesar de grande parte das terras
ser ocupada com a plantação de cana e de algodão. Pelo menos de
1912 para 1920, o aumento registrado foi expressivo, mesmo numa

71
Josué Modesto dos Passos Subrinho. Ob.cit. p. 222.
72
O termo modernização aparece aí como melhoria técnica com consequências sociais.
73
Josué Modesto dos Passos Subrinho. Ob.cit. p. 207.
74
Josué Modesto dos Passos Subrinho. História Econômica de Sergipe (1850-1930). Aracaju: UFS,
Programa Editorial da UFS, 1987, p. 67.
75
Josué Modesto dos Passos Subrinho. Ob. cit., 1987, p. 75.

61
Ibarê Dantas

fase em que os preços do açúcar estavam bastante elevados. Sobre-


tudo a pecuária bovina expandia-se com alguma absorção de mão de
obra na formação e na manutenção das pastagens. Coexistindo com
a economia exportadora e a pecuária, havia a produção agrícola de
subsistência, ocupando vasta área do Estado, mantendo uma popu-
lação rural significativa que comercializava o excedente nas feiras
das cidades e das vilas.76 De qualquer forma, o setor rural absorvia
o grosso da força de trabalho da população sergipana, grande parte
da qual ex-escravos com nível de organização baixo e, portanto, sem
grande poder de reivindicação.
Não obstante a grande importância econômica das atividades ru-
rais, na área urbana progrediam vários ramos da indústria e dos servi-
ços. Entre as explorações industriais, aquela que mais ocupava mão de
obra era a fábrica de tecidos. A primeira foi instalada em Aracaju em
1882, depois outras foram aparecendo. Em 1918 o quadro era o seguinte.

Quadro III. Fábrica de Tecidos do Estado de Sergipe (1918)


Ano de Criação e Nome da No de No de
Firma Social Capital
Município Fábrica Teares operários
Cruz, Ferraz e
1882 - Aracaju Sergipe Industrial 1.000.000$ 320 702
Cia
Ribeiro Chaves
1918 - Aracaju Fábrica Confiança 600.000$ 230 425
& Cia
Cia Industrial de
1891 - Estância Santa Cruz 1.250.000$ 300 530
Estância
Silveira, Ribeiro
1914 -Estância Senhor do Bonfim 800.000$ 186 380
& Cia
Empresa Industrial Brittos, Menezes
1913 - Propriá 600.000$ 170 400
de Propriá & Cia
1915 - São Empresa Industrial Andrade Chaves
1.000.000$ 220 316
Cristóvão de S. Cristóvão & Cia
Fábrica de Fiação e Peixoto,
1906 - Vila Nova 1.000.000$ 250 580
Tecs. de Algodão Gonçalves & Cia
Vila Nova Empresa Têxtil A. Antunes & Cia 300.000$ 120 330
TOTAL 1.796 3.663
Fonte: Manuel P. de Oliveira Valadão. Mensagem dirigida à Assembleia Legislativa de Sergipe pelo Presidente do
Estado ao instalar-se a 2ª sessão ordinária da 13ª legislatura, em 15 de julho de 1918. Aracaju: Imprensa Oficial, 1918.

76
Ver Antônio José Nascimento. A Economia Sergipana e a Integração do Mercado Nacional
(1930-1980). Dissertação de Mestrado apresentada na UNICAMP, Campinas, 1994, p. 20.

62
História de sergipe: república

Distribuída em cinco municípios diferentes, a atividade têxtil


foi participando do mercado nacional e assumindo importância
crescente na economia do Estado. A maioria das fábricas utilizava a
lenha como combustível, apenas a Senhor do Bomfim e a Industrial
de Propriá usavam petróleo. Em todas elas, o contingente de operários
era bastante elevado, notando-se a predominância do sexo feminino,
exceto na de Vila Nova, onde a quantidade de homens superava a de
mulheres.
Além das têxteis, outras indústrias de transformação apareciam
conforme pode-se avaliar pelos dados abaixo.

Quadro IV. Estabelecimentos Industriais e Operários - Sergipe (1907-1930)

Empresas/Operários 1907 1 1920 2 1930 3


Unidades em Geral 41 237 -
- Operários 1.742 5.386 -

Fábricas Têxteis 04 07 11
- Operários 1.288 4.320 -
Fontes: (1) Censo de 1907. (2) Censo de 1920. (3) Armando Barreto (org). Cadastro de Sergipe. Aracaju, 1935.
p.101-07.

Como observou o historiador Josué Modesto dos Passos, a eco-


nomia estadual continuou com baixo dinamismo, perdeu posição
relativa nas exportações, mas houve uma recriação das atividades,
proporcionando diferenciação produtiva.77
Essa diferenciação era de certo modo facultada pela pequena
concorrência dos produtos de outras localidades, especialmente dos
demais Estados. Como o estágio de integração inter-regional ainda era
relativamente diminuto, as iniciativas econômicas locais passavam a
contar com uma demanda relativamente segura, diante do baixo nível
de concorrência. Na conjuntura da Primeira Guerra (1914-18), marca-
da por restrições das importações da Europa, essa tendência ainda
mais se acentuou, favorecendo não apenas as indústrias locais, mas
também as atividades comerciais internas. Como as exportações de

77
Josué Modesto dos Passos Subrinho. Ob. Cit., p. 72-92. Quanto aos estabelecimentos industriais
e aos operários, este autor, baseado em outras fontes, encontrou números diferentes.

63
Ibarê Dantas

nosso principal produto, o açúcar, eram destinadas a essa altura para


os Estados do Sudeste ou do Sul, o empresariado pouco se ressentiu
dos efeitos daquele conflito mundial. Talvez não seja mera coincidên-
cia que, nesse período, alguns grupos familiares estabeleceram-se na
capital, grande parte proveniente do interior com origem na pecuária
ou no próprio comércio.
Segundo informação de um memorialista, o comércio de Ara-
caju, por volta de 1920, era “o comércio da Rua da Aurora, da Banca
de Peixe, dos sobradões pesados e melancólicos” com a presença de
italianos e vários portugueses.78 Mas, por esse tempo, já se notava a
movimentação crescer, a Associação Comercial animar-se, construin-
do nova sede,79 consequências da elevação dos preços dos produtos de
exportação associada à dinâmica administração de Graccho Cardoso
(1922-1926). Não foi sem razão que vários empresários transferiram-
-se do interior para a capital, que se afirmava como principal núcleo
econômico. Se A. Fonseca chegou em 1902 e Ribeiro e Cia já estava
instalado desde pelo menos 1906, a maioria veio depois: Júlio Prado
Vasconcelos (1918), Aguiar e Irmão e Cia (1922), José Menezes Prudente
(1925), J. C. Barreto (1926), P. Franco e Cia (1928), entre outros. O fato
é que o faturamento crescia e dessa prosperidade beneficiava-se
sobretudo a capital em detrimento dos municípios do interior, es-
pecialmente daqueles mais próximos, como Laranjeiras e Maruim.
Não obstante os problemas que haveriam de deparar-se em face das
políticas econômico-financeiras do governo federal, estes estabeleci-
mentos foram demonstrando ao longo do tempo grande capacidade
de sobrevivência.
Quanto às instituições financeiras, vimos que o governo Josino Me-
nezes criou o Banco de Sergipe, em 1905, que funcionou com alguma
eficácia até 1918. Com a ascensão de Pereira Lobo e sua indisposição
com o coronel Francino de Andrade Melo, um dos seus principais

78
Mário Cabral. Espelho do Tempo: memórias e reflexões. Salvador: Artes Gráficas, 1973.
79
Ver Maria Nely Santos. Associação Comercial de Sergipe. Uma Instituição Centenária
(1873/1993). Aracaju: 1996, p. 22-29.

64
História de sergipe: república

acionistas, tudo indica que a crise que já afetava aquela instituição


acentuou-se e persistiu até 1934, quando o Banco foi liquidado judi-
cialmente.80 Onze anos depois dessa primeira iniciativa, foi instalada a
agência do Banco do Brasil, em 1916.81 Graccho Cardoso criou o Banco
Estadual de Sergipe, em 1923, em situação não muito sustentável e
no ano seguinte aparecia a primeira casa bancária sob controle de
particulares, o Banco Mercantil Sergipense, de Gonçalo Rolemberg
do Prado. Em 1925, foi fundado o Banco de Crédito Popular, em Ma-
ruim, de Aureliano Azevedo Barreto e Octávio de Mello Dantas. Há
notícias de que em 1928 o presidente Manuel Dantas e empresários
teriam tentado criar o Banco dos Lavradores, mas não chegou a fun-
cionar. Da mesma forma, houve também a pretensão de organizar
em Aracaju um Banco de Crédito Popular que não foi adiante. Além
dessas iniciativas, há informações da existência da Caixa Econômica,
sem falar da Phenix Econômica, uma sociedade de crédito popular,
que teria funcionado com apoio do padre Solano Dantas de Menezes,
voltada para a população de menor recurso.82
Não obstante as ações do Estado em vários campos administra-
tivos, a sociedade, através dos seus empresários, ocupou bastante
espaço nessa fase. A iluminação através do gás acetileno, a instalação
dos carris urbanos a tração animal, a encanação de água, a primeira
estrada de rodagem,83 tudo deveu-se às iniciativas dos grupos privados.
Nos anos vinte, Antônio do Prado Franco (1880-1939) foi certamente
quem mais participou. Depois de arrecadar a Usina Central no Rio
de Janeiro, através de leilão, e adquirir a parte dos sócios, progrediu
e tomou parte ativa nos empreendimentos do governo Graccho Car-

80
Cf. Josino Menezes. Mensagem Apresentada à Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe em
07.09.1905, Aracaju: Empresa de O Estado de Sergipe, 1905, p. 40. e Fábio Maza. As Origens
do Sindicato dos Bancários de Sergipe in Cadernos da UFS: História, São Cristóvão/SE: UFS/
EDUFS, 1996, p. 80 .
81
Cf. Alberto Carvalho. Dispersa Memória, Aracaju: Acê, 2001.
82
Cf. Armando Barreto. Cadastro de Sergipe. 1949/50, n. 3, Aracaju, 1950 e Mensagem apresentada
à Assembleia Legislativa, em 7 de setembro de 1925, ao instalar-se a 3ª sessão ordinária da
15ª Legislatura, pelo Dr. Maurício Graccho Cardoso, Presidente do Estado, Imprensa Oficial,
Aracaju: 1925, p. 124.
83
Ver Edilberto Campos. Crônicas da Passagem do Século, volumes 1/6, 1965-1970.

65
Ibarê Dantas

doso (1922-26). A construção do Mercado Municipal e do Matadouro


Modelo, a substituição dos bondes a burros por elétricos, tudo teve
a sua participação ativa, de forma associada a Francino de Andrade
Melo ou como sócio majoritário da empresa de Melhoramentos de
Aracaju,84 contribuindo assim para a modernização dos serviços
públicos de Sergipe.
O perfil de província monocultora, que marcou o período do
Império, foi sendo modificado com a diversificação de atividades
sem precedentes em Sergipe, alterando o quadro social que adquiria
maior densidade. Embora na primeira década republicana as opções
de trabalho estivessem concentradas no campo, nos engenhos ou
nas fazendas, paulatinamente as indústrias e os serviços, inclusive
as casas comerciais, foram proliferando85 no meio urbano e com elas
aumentando o contingente de empregados. Como a Constituição de
1891 estabeleceu a não intervenção do Estado no trabalho, as relações
entre o patronato e os obreiros dependiam da força de cada parceiro.
Percebendo suas fragilidades, os trabalhadores urbanos foram
criando suas sociedades. Inicialmente eram de caráter beneficente e
de socorros mútuos, como tentativas embrionárias de organização.
Mas o movimento foi crescendo com a edição de seus jornais peri-
ódicos: O Operário (1891, 1896, 1910-11, 1916) e Voz do Operário (1920-
25 e 1927-29), divulgando seus problemas, denunciando abusos do
patronato e expressando suas reivindicações, algumas inclusive de
inspiração socialista. Um grande avanço nesse processo organizativo
foi a criação do Centro Operário Sergipano em 1910, como uma ten-
tativa de aglutinar os trabalhadores. O referido Centro era também
frequentado por jovens estudantes, das camadas médias, que muitas
vezes faziam uso da sua tribuna com discursos de tendências variadas.
A discussão ampliou-se com a propagação do movimento socialista

84
Cf. Sílvio Leite Franco. Comentários sobre o artigo “A usina e o fornecedor”. Jornal da Cidade,
03/1993.
85
Cf. Josué Modesto dos Passos Subrinho. A Indústria Têxtil em Sergipe: Gênese, crescimento
e Limites de uma Indústria Periférica. In: Newton Pedro da Silva e Dean Lee Hanse (Orgs.)
Economia Regional & Outros Ensaios. Aracaju: UFS/Fundação Oviêdo Teixeira, 2001, p.199.

66
História de sergipe: república

em várias partes do mundo e a eclosão da revolução dos soviéticos


(1917), gerando muitas controvérsias, num momento em que era difícil
avaliar o significado da ação dos bolcheviques. Um exemplo disso foi a
criação do Centro Socialista Sergipano (1918), que alcançou os grupos
intelectualizados. Não obstante o entusiasmo de alguns, provocou
desconfianças, começou a demarcar posições e encontrar dificuldades
para sua expansão. Apesar disso, a questão social ganhava espaço e a
presença dos trabalhadores dentro da sociedade crescia. No período
1910-1913, os ajuntamentos dos trabalhadores da estrada de ferro
geraram alguns problemas policiais e judiciais de certa repercussão.
Com o fim das obras, houve a dispersão e as tensões desapareceram.
Em Aracaju e um pouco nas cidades onde havia fábricas de tecidos
absorvendo muitos operários, a questão social começou a merecer
mais atenção. Os conflitos entre capital e trabalho foram adquirindo
mais visibilidade e os movimentos reivindicatórios crescendo, embora
de forma um tanto descontínua.
Em Sergipe, há notícias de algumas tentativas de paralisação em
Maruim (1891) e sobretudo em Aracaju (1911, 1915, 1916, 1921, 1927),
mas somente as duas últimas tiveram algum sucesso, mesmo porque
as retaliações dos detentores do capital costumavam ser bastante
fortes. A de 1921, que reivindicava diminuição das horas de trabalho,
provocou reunião dos empresários do setor, enquanto o presidente
intermediava o litígio. A última (1927) dos ferroviários parou os trens
por 19 dias.86
A discussão sobre a necessidade de regulamentação do trabalho,
que vinha se travando desde o início do século, ganhou dimensão com
as manifestações de intelectuais sergipanos. Políticos como Graccho
Cardoso, Deodato Maia e Carvalho Neto empenhavam-se para norma-
tizar as relações de trabalho. Este último conseguiu que fosse aprovado
na Câmara dos Deputados (1926) seu projeto de emenda à Constituição
Federal, permitindo ao Estado legislar sobre as relações entre o capital

86
Sobre essas greves, ver José Ibarê Costa Dantas. Notícias de Greves em Sergipe (1915-30).
Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, Aracaju, n. 31, 1992.

67
Ibarê Dantas

e o trabalho. A ideia de que o Estado não deveria imiscuir-se na área


social chegou às vésperas dos anos trinta bastante desgastada.
No conjunto, nos quarenta anos da Primeira República, o Estado
sofreu sensíveis transformações. A urbanização cresceu. Sobretudo
em Aracaju as mudanças foram grandes. O número de habitantes,
que era de 16.336 (1890), ampliou-se para 50.564 (1930).87 A cidade inós-
pita do fim do século passado tornou-se atrativa. Os pântanos foram
substituídos por bonitas praças. As condições sanitárias evoluíam.
Na terceira década, a capital foi se impondo como opção de morada.
Prósperos proprietários do campo e da cidade, sobretudo depois de
1914, foram investindo, construindo seus palacetes em estilo predomi-
nantemente eclético. Nesse processo as reformas foram expulsando
os pobres para a periferia. O bairro Chica Chaves, que depois seria
denominado de Industrial, foi-se tornando mais populoso.
As formas de entretenimento, que no início do século XX eram tão
restritas, foram se diversificando. Além do teatro e do cinema, sobre
os quais falaremos adiante, paulatinamente passaram a ser cultivados
os esportes. Por volta de 1907 começaram as primeiras partidas de
futebol na praça da Cadeia, hoje general Valadão. Depois passaram
para outras praças (Fausto Cardoso e Pinheiro Machado). Os clubes
Cotinguiba e Sergipe (1909) surgiram voltados para as regatas e so-
mente depois se integram à prática do futebol. Com o tempo, outros
times foram se estruturando, começaram os campeonatos (1918),
fomentando espaços mais apropriados, fato que se concretizaria
com a construção em Aracaju do estádio Adolfo Rolemberg (1920).88
As fábricas de tecidos da capital e do interior, empenhadas em pre-
encher o lazer de seus empregados, foram também promovendo a
formação de times, como o Industrial (1917), e a prática dos esportes
foi se firmando no curso da Primeira República.

87
Quadros Estatísticos de Sergipe, IBGE-Departamento de Estatística Geral e Publicidade. Aracaju:
Imprensa Oficial, 1938, p. 8-10.
88
Cf. Fernando de Figueiredo Porto. Alguns nomes antigos de Aracaju. Aracaju: J. Andrade, 2003,
p. 123 e 183 e Francisco Viana Filho. Futebol Sergipano in Memórias de Sergipe, Correio de
Sergipe, 02.11.2003.

68
História de sergipe: república

Enquanto isso, a infraestrutura da capital foi melhorando e dando


oportunidade a outros hábitos num momento de transformações nos
meios de comunicação. Os primeiros telefones foram inaugurados em
1911. A chegada do trem em 1913 encurtava distâncias entre determina-
das cidades do Estado e entre Sergipe e Bahia. Por esse tempo chegou
também o primeiro automóvel, cujo uso como opção de transporte se
afirmaria a partir de 1918-1919,89 fomentando as primeiras estradas
de rodagem (1917-1918). As viagens, antes restritas ao carro de boi,
ao cavalo ou às barcas, encontravam nova alternativa, redefinindo
o tempo do homem.
Atrás do primeiro carro não demoraram a chegar outros. Contudo,
os veículos de pneus e motor de explosão exigiam reparos, rodovias,
demandando a partir de então novos serviços. Inicialmente apareciam
como demonstração de importância e riqueza, mas aos poucos foram
sendo encarados também como utilidade. Em 1929 já existiam no
Estado 152 automóveis e cinco caminhões. Era um momento em que
a importação se acelerava de forma que, em 1930, já se contavam 346
carros, 51 caminhões e 32 ônibus.90 Os calçamentos, que vinham sendo
feitos em pedra bruta, passaram a ser realizados com paralelepípedos.
Numa manhã de sol de 1922, “Aracaju amanheceu alvoroçada.
Muita gente na rua. Os colégios cerraram as portas. O comércio
cerrou as portas” e depois de ansiosa espera apareceu o primeiro
avião que sobrevoou Aracaju. “Depois, em julho de 1923, amerissou
no Rio Sergipe uma esquadrilha de hidroaviões. Espocaram foguetes.
Repicaram sinos. Silvaram os apitos das fábricas”. A tripulação foi
recebida com todas as honras com discursos e baile no Palácio.91 Era
um novo meio de transporte que começava a se firmar, modificando
costumes estabelecidos.
É verdade que os avanços traziam também custos. A chegada do
trem intensificava a devastação das matas. Primeiro com a extração

89
O primeiro carro foi uma fobica (Ford) de Arnon Coelho. Cf. Mário Cabral. Roteiro de Aracaju.
Aracaju: Livraria Regina Ltda., 1955, p.25 e Fernando de Figueiredo Porto. Ob. cit., 2003, p. 175.
90
Quadros Estatísticos de Sergipe, IBGE. Aracaju: Imprensa Oficial, 1938, p. 28.
91
Mário Cabral. Espelho do Tempo. Salvador: Artes Gráficas, 1973, p. 53-54.

69
Ibarê Dantas

de madeira para os dormentes, depois a necessidade de lenha para


alimentar as locomotivas incentivou a derrubada continuada das
árvores. Em seguida, os terrenos viravam roças, plantações de algo-
dão e, afinal, pastagens para a pecuária em ascensão. As estradas de
rodagem foram sendo abertas ano após ano a partir de 1917 e, desde
então, foram contabilizando novos encargos expressivos.92 O fato é
que a sociedade que se modernizava ia produzindo novas demandas
inclusive nas relações sociais.
A sociabilidade que se processava nos bondes entre as diversas
classes foi-se reduzindo com o transporte individual, segmentando
e diferenciando os grupos pela capacidade de consumo. Começava
a era do automóvel, aumentando a velocidade dos deslocamentos,
redefinindo o tempo, reorientando os investimentos, distanciando
as pessoas entre si e refazendo hábitos da população.
Nas atividades culturais, também se registraram grandes trans-
formações, afetando o ensino, as artes e a ciência.

92
Ver Edilberto Campos. Crônicas da Passagem do Século, volume 4, 1969, p. 71-75.

70
História de sergipe: república

1.4 Manifestações Culturais

Ao longo da Primeira República, não obstante as limitações do


meio, as ações culturais foram se sucedendo com a participação de
indivíduos e grupos, envolvendo instituições privadas e públicas,
num processo de realizações nem sempre marcado pela regularidade.
Os estabelecimentos de ensino aparecem como local de aprendiza-
do e também como fontes de cultura. Ao longo das quatro décadas do
período em análise, o número de cadeiras do curso fundamental ex-
pandiu-se em maior proporção do que o crescimento da população.93
A partir de 1910 começaram a ser construídos os grupos escolares,
separando os alunos por séries. No nível médio, além da construção
dos prédios novos para abrigar o Atheneu, tradicional colégio público,
criado nos anos setenta do século XIX, e a Escola Normal, destinada
às moças, houve ampliação de vagas. A demanda foi sendo atendida
com a abertura de novas instituições particulares em Aracaju: Nossa
Senhora de Lourdes (1903), Grêmio Escolar (1906), Tobias Barreto
(1909), Salesiano (1911) e Instituto América (1920).94 No interior, pelo
menos duas congregações de religiosas criaram colégios exclusivos
para meninas do curso primário: o Nossa Senhora das Graças em Pro-
priá (1915) e o Imaculada Conceição em Capela (1929).95 Na capital, foi
de grande importância o aparecimento de estabelecimentos voltados
para o ensino profissional, fornecendo alternativas para os jovens de
menor poder aquisitivo: Escola de Aprendizes Artífices (1911), Liceu
Profissional Coelho e Campos (1923), Instituto de Química (1923),
Escola de Comércio Conselheiro Orlando (1926).96

93
Enquanto a população passara de 310.926 habitantes (1900) para aproximadamente 527.000
(1930), compondo um índice de crescimento de 69%, o total de matrículas nas escolas públicas
primárias do Estado subiu de 5.146 para 16.864, aumentando 269%. Cf. Maria Thetis Nunes.
Ob. cit., 1984, p. 264.
94
O Grêmio Escolar foi transferido para Aracaju em 1909 e o Tobias Barreto em 1913. Cf. Ester Fraga
Vilas-Boas Carvalho do Nascimento. A Escola Americana de Aracaju in Revista de Aracaju, Ano
LIX, n. 9, 2002, p.63. Há discordâncias sobre a data de criação do Salesiano entre 1909 e 1911.
95
Cf. Maria Thétis Nunes. Ob. cit., 1984, p. 250.
96
Cf. Cristiane Vitório de Souza. A “República das Letras” em Sergipe (1989-1930). São Cristóvão,
UFS, 1998. Monografia apresentada no curso de História da UFS, p. 50.

71
Ibarê Dantas

Para quem dispunha de poucos recursos e aspirava ao curso supe-


rior, as opções continuavam restritas e localizadas fora do Estado. De
forma gratuita havia apenas as alternativas das escolas militares (do
Exército e da Marinha) e dos seminários. Raríssimos foram aqueles
que se beneficiaram do mecenato do governo. Os oficiais do Exército
recebiam formação técnica e humanística, razão por que quando
deixavam a corporação muitas vezes buscavam no ensino meios de
sobrevivência. O exemplo dos sergipanos que foram desligados da
Escola da Praia Vermelha, em face da Revolta de 1904, é emblemático.
José de Alencar Cardoso (1878-1964), Artur Fortes (1881-1944) e Abdias
Bezerra (1880-1944), ao regressarem para sua terra, afirmaram-se
como personalidades que proporcionaram grande contribuição à
educação e à cultura em Sergipe.
Para os estudantes de famílias de posse, as opções mais comuns
eram as Faculdades de Direito de Recife, do Rio de Janeiro e de São
Paulo ou a Faculdade de Medicina da Bahia, onde, ao lado das ins-
truções técnicas, também se cultivavam os estudos humanísticos.
Quem provinha de Pernambuco geralmente voltava influenciado
pelas ideias de Tobias Barreto (1839-1889) que, apesar de desaparecido,
deixara muitos discípulos, partícipes da chamada Escola de Recife. Em
Sergipe, os bacharéis reverenciavam sua memória, difundiam suas
ideias cientificistas, davam continuidade às suas reflexões filosóficas
e exaltavam suas atitudes de intelectual irreverente e desafiador dos
cânones vigentes. Aqueles que regressavam da Faculdade de Medicina
da Bahia também chegavam imbuídos das concepções evolucionis-
tas e cientificistas. As teses exigidas para formatura estimulavam os
estudantes a sintonizarem-se com o espírito científico da época. De
volta a Sergipe, muitas vezes integravam-se entre seus pares e contri-
buíam para elevar o nível do ambiente, inclusive ajudando a fundar
instituições como a Sociedade Médica de Sergipe (1910), a Sociedade
de Medicina e Cirurgia de Sergipe (1921), o Instituto Parreiras Horta
(1923), a Sociedade Odontológica de Sergipe (1928).97 Essas entidades,

97
Cristiane Vitório de Souza. Ob. cit., 1998. p. 86-92.

72
História de sergipe: república

além de manifestarem caráter científico, exerciam também o papel


de organização profissional. A partir de 1911, a Bahia, que de muito
tempo ofertava os estudos de Medicina, passou a oferecer também o
curso de Direito, ampliando as alternativas dos sergipanos. E a leva
de bacharéis continuou aumentando, marcando nossa cultura.
As experiências de ensino superior foram iniciadas em Sergipe
pela Igreja Católica.98 Após a criação da sua Diocese (1910), no ano
seguinte assumiu o primeiro bispo d. José Tomás Gomes da Silva que
instalou o Seminário (1913) com os estudos de filosofia e teologia. Aí
foram ordenados vários prelados que depois se tornaram importantes
nomes do episcopado nacional.99 Vimos que no governo Graccho Car-
doso (1922-26) foram criadas as Faculdades de Direito e a de Farmácia
e Odontologia, mas não vingaram.
Ligada ao Seminário, foi criada a Academia Santo Tomás de Aqui-
no, como centro de estudos e debates. Ao tempo em que incentivava a
boa formação do clero, d. José Tomás animou os meios católicos com
outras iniciativas. Instalou “conferências eclesiásticas”, realizou 43
visitas pastorais, percorrendo praticamente todo o Estado, pregando
diante de públicos numerosos.100 Fora do circuito da Igreja Católica,
havia a atuação da Maçonaria, dos protestantes, batistas e adven-
tistas do sétimo dia, mas sem oferecerem estudos de nível superior
e com influência ainda relativamente pequena.101 Os protestantes
ainda tiveram uma certa presença com a organização de uma Escola
Americana em Laranjeiras (1886), sob a orientação de presbiterianos,

98
Ver Maria Thétis Nunes. Ob. cit., 1984. Itamar Freitas. A Casa de Sergipe. Historiografia e
Identidade na Revista do Instituto Histórico Geográfico de Sergipe. Dissertação de Mestrado
na UFRJ, RJ, 2000.
99
Cf. Jackson da Silva Lima. Os Estudos Filosóficos em Sergipe. Aracaju: Sociedade Editorial de
Sergipe, 1995. p. 128-132. Ver também José Calazans. O desenvolvimento cultural de Sergipe na
primeira metade do século XIX. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Aracaju,
n. 26, 1965, p. 123-134.
100
Cf. Péricles Morais de Andrade Júnior. Sob o olhar diligente do pastor: a Igreja Católica em
Sergipe (1831-1926). Dissertação de Mestrado no NPPCS, São Cristóvão/SE, UFS, p. 92-99.
101
Enquanto os evangélicos passaram a atuar em Sergipe em 1884, os batistas chegaram em
1913 e adventistas do sétimo dia em 1923. Cf. Itamar Freitas. Projeto Aracaju que conheço,
Aracaju, 1998, p. 35. (mimeo)

73
Ibarê Dantas

que depois (1898) passaram a ensinar em Aracaju. Mas a experiência


foi-se enfraquecendo. Os missionários foram embora e, a partir de
1905, o Colégio reduziu-se à escola paroquial, oferecendo apenas curso
primário que provavelmente teria sobrevivido até 1913.102
Paralelamente às práticas de ensino, foram surgindo grupos e
instituições privadas ou públicas, institucionalizados ou não, volta-
dos para estimular o desenvolvimento cultural do meio. No interior
do Estado, nasceram alguns centros culturais, dos quais os mais
citados são o Gabinete de Leitura de Maruim, o Gabinete de Leitura
de Riachuelo, a Casa do Livro de Capela, Gabinete de Leitura Tobias
Barreto. Propriá, Boquim, Laranjeiras, Estância e Frei Paulo também
dispunham de entidades culturais.103
Na capital temos registros de: Clube Literário 24 de Julho (1898), a
Liga Sergipense contra o Analfabetismo (1916), Centro Pedagógico Ser-
gipano (1918), Grêmio Tomaz Cruz (1918), Hora Literária Santo Antônio
(1919), Sociedade Ensaios Literários e Horas Literárias Sílvio Romero,
Tobias Barreto, Fausto Cardoso e Gumercindo Bessa, o Clube Literário
Tobias Barreto e a Academia Sergipana de Letras (1929), que teria sido
um desdobramento da Hora Literária de Aracaju, nascida em 1919.104
Alguns desses grupos tiveram vida e atuação efêmeras, mas outros
foram congregando intelectuais, estimulando debates, produções e
contribuindo para o desenvolvimento cultural do Estado. Um dos
maiores exemplos foi a criação do Instituto Histórico e Geográfico de
Sergipe (1912). A exemplo do que havia já em várias regiões do país, o
Instituto local tomou o sentido de uma espécie de academia literária
e científica onde a elite intelectual passou a discutir os problemas
culturais do Estado. Nos primeiros anos, seus sócios reuniam-se
numa sala do prédio do Tribunal de Relação. Os encontros literários
e científicos, que se realizavam na casa do general Calazans e/ou no
sobrado do coronel Vicente Ribeiro, com a criação do Instituto pas-

102
Cf. Ester Fraga Vilas-Boas Carvalho do Nascimento. A Escola Americana de Aracaju in Revista
de Aracaju, Ano LIX, n. 9, 2002.
103
Cristiane Vitório de Souza. Ob. cit., 1998.
104
Cf. Cristiane Vitório de Souza. Ob. cit., 1998, p. 33-37.

74
História de sergipe: república

saram a assumir caráter mais formal e público. Com suas palestras,


debates e sobretudo com a edição de sua revista, o Instituto, embora
ainda sem sede definitiva, tornou-se o principal núcleo cultivador da
memória, das tradições e da identidade dos sergipanos. A instalação
da comissão para estudar a questão dos limites provocou profícuas
discussões, sobretudo em dois momentos (1904-1905 e 1918-1919) e
rendeu vários livros de mérito, contribuindo para o maior conheci-
mento de nosso espaço e de nossa história.105 A inauguração do salão
da Biblioteca Pública em 1913-1914 também representou um avanço,
pois além de ser local de estudo e reflexão, tornou-se também recinto
de falas, recitais, conferências para um público mais diversificado.
Ao lado dessas instituições, devemos lembrar os periódicos que
tiveram papel dos mais relevantes. Seguindo uma tradição que vinha
dos tempos da província, os jornais foram aparecendo, expressando
interesses diversificados. Nas três primeiras décadas da República, o
interior do Estado teve uma presença expressiva. Pelos registros que
sobreviveram podemos contar o número de títulos que circularam em
cada município: Capela (3), Estância (10), Lagarto (1), Laranjeiras (4),
Maruim (10), Propriá (10), Rosário (2), Santa Luzia (1), Vila Nova (3).106
Somando com os periódicos da capital, ao longo dos quarenta anos da
Primeira República cerca de 150 títulos apareceram.107 É verdade que
muitos não passavam de pequenas publicações de vida curta, mas,
em nenhum outro momento, encontramos notícias de tantos órgãos.
Paralelamente foram aparecendo também as revistas. Durante os
tempos da Província já se tem notícias de pelo menos uma, Belo Sexo,
que, em 1882, teria editado três números. Mas foi durante a República
que elas proliferaram (ver Anexo). Logo em 1890 começou a circular
a pequena Revista Literária, órgão do Gabinete de Leitura de Maruim,
saindo pelo menos 34 números. Depois surgem outras e, na segunda
década republicana, impressiona a permanência da Revista Agrícola,

105
Sobre o Instituto, ver Itamar Freitas. Ob. cit., 2000.
106
Clodomir Souza Silva. Ob. cit., 1920, p. 102-105.
107
Ver Cristiane Vitório de Souza. Ob. cit., 1998. p. 41.

75
Ibarê Dantas

com boa apresentação gráfica. Editou, no mínimo, 92 números volta-


dos especialmente para os problemas da lavoura, difundindo técnicas
e inovações de outros países, analisando os problemas setoriais da
economia, trazendo dados que ainda hoje servem de referências aos
historiadores. Merece destaque também a Forense, especializada na
área do Direito, da qual restaram 16 números. Por esse tempo, apare-
ceram modestas publicações, expressando discretamente objetivos
políticos. A Redenção era de simpatizantes de Fausto Cardoso e A Trom-
beta de gente do grupo olimpista. Embora os textos e as poesias não
explicitassem agressões, eram ainda frutos de uma rivalidade política
que o tempo haveria de diluir. Seguiram-se outras pequenas experi-
ências no campo da literatura, mas o periódico de melhor conteúdo
foi a Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Começou a
sair em 1913 e persistiu até 1929 com boa regularidade. Ao lado desta,
surgiram, em 1928, três publicações de certo porte, que sobreviveram
por alguns anos, indicando aumento da vitalidade do movimento
intelectual do Estado.108 Por trás desses órgãos estavam editores, al-
guns dos quais revelando vocação empreendedora, acreditando no
mercado editorial num momento em que a tecnologia engatinhava.
Figuras como Homero de Oliveira, um dos editores da Revista Agrícola,
e sobretudo Armando Barreto estão a merecer estudos específicos dos
pesquisadores. Este editou almanaques, o periódico semanal Mercúrio
por 119 números e depois publicaria o Cadastro de Sergipe.
Nas artes plásticas, pode-se dizer que, no limiar do século XX, os
pintores de Sergipe foram bastante influenciados pela figura de Ho-
rácio Hora (1853-1890).109 Este artista, natural de Laranjeiras, embora
tenha morado e falecido em Paris, onde estudou na Escola de Belas
Artes, retratou cenários e figuras locais e manteve ligações afetivas
com seus conterrâneos até a morte. Seus quadros Pery e Cecy, A Gruta

108
Sobre o tema, ver Jorge Carvalho do Nascimento e Itamar Freitas. A Revista em Sergipe. In:
Revista de Aracaju, Ano LIX, n. 9, 2002, p. 169-187.
109
Cf. Ana Conceição Sobral de Carvalho. Sergipe Artístico e Monumental. Aracaju: SEC,
Sebrae, Emsetur, BB, BN, 2000. p. 53-54 e Ana Conceição Sobral de Carvalho e Verônica
Maria Menezes Nunes, Horácio Hora. Aracaju: SEC, 1982.

76
História de sergipe: república

de Matriana do acervo do Museu Histórico de Sergipe, entre outros,


foram apreciados e estudados pelos seus contemporâneos e ficaram
como referências da pintura sergipana. Entre seus seguidores, alguns
foram esquecidos, mas continuou sendo lembrado Oséas Santos
(1865-1947),110 que viveu na Bahia, onde estudou na Escola de Belas
Artes e deixou vasta produção, alguns quadros inspirados na obra
do mestre. Por esse tempo, começou a destacar-se também Jordão
de Oliveira (1900-1980), que se vinculou à Escola de Belas Artes no
Rio de Janeiro, onde ministrou cursos por vários anos.111 Sem jamais
perder os vínculos com sua terra, permaneceu pintando retratos de
sergipanos ilustres e paisagens, dentro do melhor academicismo.
Um fato que provocou influxo inovador sobre os pintores locais
foi a contratação, nos anos vinte, de artistas italianos para reformar
o Palácio do Governo. Entre os escultores, uma figura que teve uma
presença significativa nesse período foi Corinto Mendonça, um
engenheiro de sensibilidade que também deixou memória sobre os
costumes de Aracaju de seu tempo.112
Quanto à música, em fins do século XIX era certamente a arte
mais cultivada em Sergipe, embora de forma diferenciada. Numa
análise um tanto simplificada e esquemática, podemos dizer que nas
igrejas tocavam-se as músicas sacras nos órgãos, nas ruas as bandas
apresentavam os hinos, dobrados e sinfonias e nos salões das casas
grandes ouviam-se polcas, valsas, marchas em pianos, violinos, flautas
e bandolins. Entre os grupos dominantes, as interpretações musicais
ocorriam sobretudo nos salões, na maioria das vezes com canções
de origem europeia. De outro lado, como dizia Sílvio Romero, o povo
laborioso cantava nos eitos lavrando a terra, nos engenhos moendo

110
Ver Oséas Santos. A vida de um pintor. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe,
n. 26A, v. 22, 1962-1965.
111
Ver Jordão de Oliveira. Caminhos Perdidos. Rio de Janeiro: Gráfica Ouvidor, 1975.
112
Ver Corinto Pinto de Mendonça. Tipos populares de Aracaju (sombras que passam). Aracaju:
Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico de Sergipe (DCPH), 1974. 77p.; Praça da
Matriz. Aracaju: 1955. 71p. e Contribuição ao centenário do Aracaju. Aracaju: Escola Industrial
de Aracaju, 1954. 78p.

77
Ibarê Dantas

cana,113 nos terreiros e nas ruas, ora com seus cantos melancólicos,
ora entoando chibas, sambas, lundu ou maxixe com seus batuques
e as gaitas, cantando suas modinhas. Nas comemorações das festas
religiosas, apresentavam-se com seus Reisados, Cacumbis, Cheganças,
Taieira, Lambe-Sujo, São Gonçalo, Guerreiro.
Da fusão das canções europeias com os ritmos africanos, foi-se
gestando, sobretudo no Rio de Janeiro, “a base de uma música po-
pular urbana nos moldes que hoje conhecemos”.114 Mas, em Sergipe,
não encontramos repercussões significativas, durante a Primeira
República, desse movimento em processo na capital federal. Isso
não significa que sergipanos não tenham participado dele, pois a
migração de talentos para o Rio de Janeiro também ocorreu entre os
artistas. Especificamente na música, um dos nomes mais citados é o
de Luís Americano Rego (1900- ?), que nasceu em Aracaju e no início
dos anos vinte foi para o Rio, onde participou da “maior experiência
revolucionária chorística da época”, compondo, integrando memo-
ráveis trios, convivendo com nomes como Pixinguinha e exercitando
suas criações enriquecedoras na música popular.115
Em Sergipe, as filarmônicas ocupavam papel relevante nas mani-
festações musicais. Toda cidade ou vila que se prezava dispunha de
seu conjunto, que era uma verdadeira escola dos artistas de então.
Não era raro existir, num mesmo centro urbano, mais de uma banda
competindo orgulhosamente com suas produções e interpretações.
Nessas povoações, vários nomes vocacionados davam continuidade
aos ensinamentos de mestres do passado. Em Aracaju, há notícias da
Orquestra do Mestre Cula, composta por 12 músicos, incluindo toca-
dores de flauta, violino e saxofone, e da Filarmônica Santa Cecília.116
O ensaísta Prado Sampaio, um dos poucos a tratar das manifestações
artísticas desse tempo, evoca alguns personagens que se destacaram
como compositores, vocalistas, instrumentalistas, flautistas, violo-

113
Cf. Sílvio Romero. Cantos Populares no Brasil. Rio de Janeiro: José Olímpio, 1954, tomo I, p. 58.
114
Cf. Henrique Cazes. Choro: Do Quintal ao Municipal. São Paulo: Editora 34, 1999, 2. ed., p.17.
115
Cf. Henrique Cazes. Ob. cit., 1999, p. 65-66.
116
Cf. Ariovaldo Figueiredo. História Política de Sergipe, 1955-62, v. 40, 1991, p. 114.

78
História de sergipe: república

nistas, pianistas e cantores, em que fica patente a existência de uma


tradição musical respeitável. De Laranjeiras, cita, por exemplo, Ma-
noel do Carmo, que improvisava sinfonias em seu antigo trombone;
Manoel Bahiense e seu discípulo Francisco Avelino; João Belizário
Junqueira, compositor, violinista e cantor emérito; Francisco Hora,
pianista e flautista, irmão do pintor Horácio Hora. De São Cristóvão,
são lembrados, entre outros, Pedro de Barros, compositor e instrumen-
tista; Antônio Emydio, inexcedível no violão; e Waldettre Mello, “com-
ponista e instrumentista exímia, laureada pelo Instituto Nacional
de Música”.117 Em Estância também são citados compositores, como
o poeta Severiano Cardoso, o religioso Vitorino Fontes e a cantora
violinista Ismênia Fontes, enaltecida pelos seus contemporâneos.118 A
prática musical, através de valsas, polcas e marchas nos salões, mesmo
num momento em que as mulheres tinham tratamento diferenciado,
revelou outros talentos femininos como Adalgisa Barreto, “improvi-
sadora no piano”; Natinha Andrade Cerrone, “concertista adorável”;
Maria Josefina de Mendonça, “exímia pianista”, entre outras.119 A
abordagem sumária de Prado Sampaio mostra como o tema está a
merecer resgate mais abrangente.
Não obstante a segmentação social, aos poucos as diferenças
foram diminuindo nos sincretismos dos ritos, na miscigenação dos
ritmos e das canções das três raças num longo processo de amálga-
ma. Uma das festas mais equalizadoras eram os carnavais, conforme
sugerem as evocações dessas comemorações.120 Os desfiles dos car-
ros ornamentados, a troca de papéis, as brincadeiras entre blocos
heterogêneos, tudo concorria para superar convenções, hierarquias,

117
Prado Sampaio. Sergipe Artístico, Litterário e Scientífico. Aracaju: Imprensa Oficial, 1928, p.
65-74.
118
Cf. Luiz Antônio Barreto. Da arte musical em Sergipe in Gazeta de Sergipe, 17-18.02 e
20.02.2003.
119
Prado Sampaio. Ob. cit., 1928, p. 65-74.
120
Sobre essas festas no início do século XX, ver Corinto Mendonça. Ob. cit., 1955, p. 46-54 e Paulo
Henrique Santos Araújo. Arranca e Filho Baccho. Aracajuanos na folia. São Cristóvão, 1995.
Monografia apresentada no Departamento de História/UFS. Fernando Lins de Carvalho.
Dos Cordovínicos ao Pré-Caju in Jornal da Cidade, 26-27.01.2003 a 2-5.03.2003.

79
Ibarê Dantas

ensaiando mistura social, sem deixar, no entanto, de revelar novas


diferenças.
No teatro, no fim do século XIX, já havia uma tradição respeitá-
vel. Embora as informações de que dispomos sobre as artes cênicas
121

durante a Primeira República sejam escassas, há notícias de apresen-


tações de companhias de fora em algumas cidades como Aracaju,
Laranjeiras e Estância. Quanto às produções locais, há indícios de
terem sido um tanto disseminadas, embora mais frequentes em al-
guns municípios. Laranjeiras, nesse sentido, destacou-se. Mesmo num
momento em que sua vida econômico-social declinava, a escola da
professora Zizinha Guimarães contribuía para estimular a produção
cultural da cidade, de tal forma que nos torneios entre grupos teatrais
de algumas comunidades (de Itaporanga, Lagarto, Barra dos Coqueiros
e Laranjeiras) os desta sempre ficavam em primeiro lugar.122 Nesse
clima, vários escritores locais dedicavam-se a escrever suas peças,
indicando a presença do teatro na vida cultural desse período. Mas, na
própria Laranjeiras, os antigos teatros, tão movimentados no século
XIX como o São Pedro e o Santo Antônio, foram-se transformando
em ruínas no curso da República. O Íris ainda serviu para exibição de
filmes e peças teatrais na primeira metade do século XX, mas também
sofreu decadência.123
Não obstante a importância também de Estância, Maruim e Pro-
priá, Aracaju foi-se impondo como o centro cultural mais expressivo.
A inauguração do Teatro Carlos Gomes, em 1904, que depois se trans-
formaria em Rio Branco, indicava um avanço em relação ao pequeno
teatro São José, localizado na Praça Olímpio Campos.124
Quanto ao cinema, há uma certa controvérsia sobre a primeira

121
Ver Geraldo Henrique dos Santos Prata. Teatro Aracajuano: “Um sonho civilizador” (1855-1910),
S. Cristóvão. 1998. Monografia apresentada no Curso de História da UFS.
122
Virgínia Lúcia Menezes. Levantamento das Manifestações teatrais em Laranjeiras-Sergipe,
Aracaju: Fundesc/Sercore, 1986, p.15. Ver também Gilberto Amado. História da minha infância.
Rio de Janeiro: José Olímpio, 1975.
123
Cf. Jornal da Cidade, 21.06.1996.
124
Corinto Mendonça. Ob. cit., 1955, p. 54. Ver também Ivan Valença. Cine-Teatro Rio Branco.
In Memórias de Sergipe, Correio de Sergipe, 29.06.2003.

80
História de sergipe: república

exibição. Mário Cabral afirma que ocorreu no Teatro São José em


Aracaju, em 1899, mas não teria despertado grande atenção.125 Outro
memorialista diz que “o primeiro espetáculo realizado teve assistência
estupenda! Não foi possível se fechar a porta do teatrinho; e, assim
se seguiram outros, porque, de todo o Estado, vinha gente para co-
nhecer o cinematógrafo”.126 Tudo indica que as primeiras exibições
com alguma regularidade começaram a acontecer em 1908 ou 1909,
descritas como “exposição de quadros do aparelho cinematógrafo”127
acompanhadas por um gramofone no Teatro Carlos Gomes, receben-
do, então o nome de Teatro Sergipe”.128 Eram iniciativas dos exibidores
ambulantes, introduzindo em Sergipe uma nova forma de arte, pela
qual “as imagens se sucedem mais rápidas do que o pensamento” na
expressão de Walter Benjamin.129 Depois de 1918, quando o Cine Teatro
Rio Branco passou para a propriedade do conhecido Juca Barreto, este
foi reformando sua casa e acompanhando a evolução dos espetáculos.
Ao lado do irmão, Paulo, formavam uma dupla dotada de “bom gosto
artístico”,130 incentivando as produções locais e recebendo grandes
nomes da música e da dramaturgia nacional. Ao mesmo tempo, foi
popularizando o interesse por filmes, a partir das crianças que acor-
riam a participar das novidades.131 Em 1927, uma grande mudança.
Era o filme com som, dispensando o gramofone. Nesse momento já
havia várias casas de espetáculo em Aracaju. “Em 1912 foi inaugurado
o Elite, denominado depois de Royal. Nasceu depois o Guarany no

125
Mário Cabral. Ob. cit., 1955, p. 196.
126
Corinto Mendonça. Ob. cit., 1955, p.55.
127
Fernando Figueiredo Porto. Anotações particulares. Arquivo pessoal no IHGSe.
128
Oito anos depois da primeira exibição em Paris, segundo Melvin L. De Fleur. Teorias de
Comunicação de Massa. Rio de Janeiro: Zahar, 1971, p. 62. Outra informação diz: “Realizou-se
ontem o espetáculo anunciado pelo nosso patrício Pedro Silvino Cortes, e com a exibição do
Cinematógrafo e gramofone”. Teatro São José, 07.09.1901. Anotações do arquivo de Fernando
Porto in Instituto Histórico Geográfico de Sergipe. O Cine-teatro Rio Branco foi a primeira
casa de cinema e teatro de Sergipe. Ver Mário Cabral. Ob. cit., 1955.
129
Cf. Aldaci de Souza, Jornal da Cidade, 24 e 25.06.1992 e Ivan Valença, Jornal da Cidade, 21-
22.11.1999. Sobre a citação de Walter Benjamin ver José Guilherme Merquior. Arte e Sociedade
em Marcuse, Adorno e Benjamin. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969, p. 129.
130
João Costa apud Sueli Carvalho. O Teatro Sergipano. Aracaju Magazine, n. 35, maio/1999.
131
Ver “Uma vida dedicada ao Cine Teatro Rio Branco”. Revista Alvorada, abril/1970, p. 5.

81
Ibarê Dantas

fundo do Hotel Internacional. Logo em seguida vieram o Eden na


travessa José de Faro, o Rio Negro na Avenida Simeão Sobral, e o São
Francisco na Praça Siqueira de Menezes no Bairro Santo Antônio.132
Além desses, ainda são lembrados o Universal (1918) da Fábrica Con-
fiança, o Arabutan (1923) da Fábrica de Tecidos Sergipe Industrial, o
Tobias Barreto na rua de Vitória que funcionou até 1934, o Popular
e o São João.133
No campo da produção, o único sergipano de que dispomos de
notícias é J. Soares, um propriaense que vivia em Pernambuco. Ao
participar do movimento chamado de Ciclo de Recife (1924-1930), fez
alguns filmes importantes, já como longa metragem, entre os quais
o de maior relevância foi Aitaré da Praia.134 O fato é que a grande
novidade artística da Primeira República foi o aparecimento do ci-
nema. Era um novo tipo de arte que privilegiava a imagem e atingia
as massas com efeitos difíceis de serem exagerados. Começando
como uma forma de diversão, paulatinamente as câmeras foram
desvelando os mistérios do mundo, mostrando seus cenários e suas
contradições, num tempo em que as opções de entretenimento eram
bastante restritas.
Na poesia, muitos nomes deixaram sua contribuição. Alguns se
despedindo como Severiano Cardoso (1840-1907), outros aparecendo
como José Barreto Filho (1908-?), todos merecedores de tratamento
mais apurado. Vários deles foram receptivos às novas tendências
estéticas que apareciam no Sudeste. Neste sentido, como observou
Jackson da Silva Lima, “há experiências simbolistas”, [...] “florescem
sementes do neoparsasianismo” e, nos anos vinte, “vão surgindo
timidamente reflexos da Semana de Arte Moderna com a fase pré-
-modernista”.135 No entanto, os que sobreviveram ao tempo e ficaram
como “grandes expressões da lírica” foram algumas personalidades
que produziam indiferentes aos modismos, seguindo os cânones tra-

132
Aldaci de Souza, Jornal da Cidade, 24 e 25.06.1992.
133
Cf. Aldaci de Souza, Jornal da Cidade, 24 e 25.06.1992.
134
Cf. Ivan Valença, informações ao autor, em 02.04.2003.
135
Jackson da Silva Lima. História da Literatura Sergipana. Aracaju: Regina, 1971, v. 1, p. 66.

82
História de sergipe: república

dicionais. O primeiro exemplo é Garcia Rosa (1877-1960). Recluso em


sua casa na colina do Santo Antônio, dali com serenidade irradiava
sua sabedoria de poeta e pensador, firmando-se como das maiores
referências intelectuais de nosso Estado. Outra figura inesquecível
foi o professor Artur Fortes (1881-1944), que, além de fascinar seus
discípulos com suas aulas bem representadas, foi exemplo de homem
participativo nas letras e na política, lutando sempre pelo aprimora-
mento das instituições de Sergipe. Um terceiro nome lembrado na
galeria dos mais expressivos foi João Pereira Barreto, autor de versos
admiráveis. No fim dos anos vinte, o movimento modernista começou
a reproduzir-se em Sergipe com as primeiras poesias de José Maria
Fontes (1908-1994)136 e Abelardo Romero (1907-1979).
Quanto aos prosadores, vários deles ganharam grande destaque
no Rio de Janeiro, levando Sergipe a ser chamado retoricamente de
“ninho de águias”, em face da exportação de talentos. Jamais em
outros tempos, tantos sergipanos pontificavam na capital federal.
No início da República, Sílvio Romero (1851-1914) já era renomado
escritor no Rio de Janeiro e exercia grande influência em Sergipe.
Além da divulgação de suas ideias através de livros, correspondia-se
com seus amigos e participava da política, conforme vimos, de forma
apaixonada, gerando controvérsias. Logo depois da Proclamação, ou-
tros sergipanos partiram e foram também se destacando na capital
da República: Fausto Cardoso (1864-1906) como pensador, deputado
e tribuno eloquente; Felisbelo Freire (1858-1916) como historiador e
político; Laudelino Freire (1873-1937) como dicionarista e historiador;
Gilberto Amado (1887-1969) como ensaísta e político; Hermes Fontes
(1888-1930) como poeta; o médico Maximino Maciel (1866-1914) como
gramático e crítico literário; João Ribeiro (1860-1934) como historia-
dor, folclorista e filólogo; o médico Manoel Bonfim (1868-1936) como
pedagogo e escritor. Esses foram os mais importantes.
Embora vivessem longe de sua terra, quase todos continuaram

136
Cf. Gilfrancisco. A poesia de José Maria Fontes. Jornal da Cidade, 03.01.2002.

83
Ibarê Dantas

mantendo vínculos com seu Estado e intervindo na sua vida cultural,


individualmente ou através da colônia sergipana do Rio de Janeiro
que agia como grupo de pressão junto aos governantes para alguns
pleitos. Gozando de fama e prestígio, alguns deles (Sílvio Romero,
Fausto Cardoso, Felisbelo Freire, Gilberto Amado, Manoel Bonfim)
tornaram-se parlamentares, honrando a representação de Sergipe.
A terra natal também era promovida quando deixaram páginas
ontológicas evocando o meio marcante e fecundo onde nasceram,
cresceram e receberam os fundamentos de sua formação moral e
intelectual.
Sílvio Romero, ao analisar as expressões literárias do século
XIX, teria dito que “a literatura sergipana era uma literatura de
emigrados”.137 Mas, no século XX, além dos intelectuais que viveram
no Rio de Janeiro, vários outros permaneceram em sua terra e, não
obstante as limitações do meio, produziram e proporcionaram ines-
timável contribuição à cultura do Estado. Para mencionar apenas
os mais importantes, lembramos os nomes de Gumercindo Bessa
(1859-1913) com seu grande saber jurídico, atuando na imprensa e no
foro, cuja produção foi publicada em obra póstuma (1916); o professor
Balthazar Góes com sua memória sobre A República em Sergipe; o juiz
Nobre de Lacerda que analisou a Primeira Década Republicana (1906);
o historiador Francisco Lima Júnior (1856-1929) autor de numerosas
obras de singular importância, como o estudo sobre a Revolta de Santo
Amaro e outra sobre o Poder Legislativo nos tempos da Província. Ivo
do Prado publicou uma das mais extensas pesquisas sobre limites,
A Capitania de Sergipe e suas Ouvidorias (1919), pela argumentação
apresentada no texto e pela copiosa documentação anexada. O en-
saísta Oliveira Teles (1859-1935), discípulo de Tobias Barreto e autor
de Sergipenses (1903), teve participação intelectual relevante. Outro
estudioso importante foi Clodomir Silva (1892-1932), que, além do Ál-
bum de Sergipe (1920), sua obra maior, dedicou-se também ao registro

137
Cf. Epifânio Dória in Revista da Academia Sergipana de Letras. Aracaju, n. 16, 1952, p. 191.

84
História de sergipe: república

de manifestações populares.138 Florentino Menezes (1886-1959), com


sua orientação positivista, publicou artigos, ensaios e livros dentro do
campo da sociologia, como Estudo Corográfico e Social do Brasil (1912) e
Escola Social Positiva (1917) e foi importante animador das atividades
culturais. O biógrafo Armindo Guaraná (1858-1924), com seu valioso
Dicionário Bibliográfico (1925), prestou uma das maiores contribuições
à memória de nossa elite intelectual. O ensaísta Prado Sampaio (1865-
1932), autor de Sergipe Artístico, Literário e Científico (1928), desenvolveu
estudos em diversos campos, inclusive na área de filosofia, e teve
atuação destacada. Epifânio Dória, (1884-1976), notabilizou-se como
pesquisador e principal zelador do acervo documental da Biblioteca
Pública e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.
Os governantes, por sua vez, contribuíam para a melhoria da parte
física da Biblioteca Pública e empenharam-se em ampliar seu acervo.
No campo das publicações, vimos como os governos Josino Menezes
(1902-1905), Pereira Lobo (1918-1922) e, especialmente, Graccho Car-
doso (1922-1926) financiaram edições de grande importância para
nossa cultura. Este último ainda oficializou a existência do Arquivo
Público e posteriormente andou regulamentando o envio de docu-
mentos àquela instituição. Enfim, não obstante o acanhamento do
ambiente, as manifestações culturais prosperavam com produções
marcantes. Segundo Cristiane Souza, que estudou o período de forma
mais aprofundada, os homens desse tempo “dedicaram-se à criação
de uma rede institucional vigorosa com o fito de retirar o Estado da
posição periférica que ocupava na vida intelectual do país”.139
Concorreram também para dinamizar o movimento intelectual as
pregações doutrinárias. Em 1896, o líder obreirista João Ferro, através de
seu jornal O Operário, desenvolveu trabalho proselitista, pregando um
socialismo até certo ponto compatível com a democracia. Mas, pouco
tempo depois, aquele ativista foi para Alagoas e posteriormente para

138
Ver Jackson da Silva Lima. Os Estudos Antropológicos, Etnográficos e Folclóricos em Sergipe.
Governo do Estado de Sergipe, Secretaria de Estado da Educação e Cultura, Subsecretaria
de Cultura e Arte, 1984.
139
Cristiane Vitório de Souza. Ob. cit., 1998, p. 169.

85
Ibarê Dantas

Recife. Em 1911-1912 e 1916, nas folhas de O Operário, alguns de seus re-


datores voltaram a mostrar simpatias pelas ideias dos socialistas. Mas
eram manifestações um tanto esporádicas. Foi a partir da Revolução
Russa (1917) que as pregações socialistas passaram a sensibilizar mais os
intelectuais. Entre os mais empolgados, destacou-se Florentino Mene-
zes, que esteve a discutir publicamente a nova corrente de pensamento
e lutou pela criação do Centro Socialista Sergipano (1918).
Este Centro provocou palestras, polêmicas pelos jornais, envol-
vendo intelectuais vinculados à imprensa dos trabalhadores urbanos
e membros da Igreja Católica que se manifestavam contrários à nova
doutrina. Tal movimento tenderia a acentuar-se com as matérias do
jornal Voz do Operário na década de 1920, em que já se notava algum
intercâmbio com ativistas do Sudeste e a influência da vertente le-
ninista. Com a ascensão de Stalin em 1924, o movimento socialista
foi se afirmando como uma proposta de tendência totalitária. Nesse
momento, os socialistas encontravam pequeno espaço na imprensa
de Sergipe, mas nem por isso aquele ideário deixava de fascinar os
grupos que defendiam uma ordem mais igualitária.
Antes, porém, que os materialismos dialético e histórico fossem
bem difundidos, a crença mais comum entre os intelectuais era a
do cientificismo, ao afirmar “a superioridade da ciência sobre todas
as outras formas de compreensão humana da realidade (religião,
filosofia metafísica etc.).”140 Dentro dessa corrente, predominavam
evolucionistas de várias conotações, inclusive os monistas adeptos
do pensamento de Ernesto Haeckel (1834-1919), filósofo alemão que
difundiu a ideia da evolução na ciência natural.141 Seus defensores
encontraram pela frente os católicos, sobretudo os padres, entre os
quais Solano Dantas Menezes, que, professando o espiritualismo
cristão em sua vertente tradicional, travou polêmicas pela imprensa,
no período de 1909 e 1919, condenando os cientificistas, incluindo os

140
Cf. Antônio Houaiss. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa.
141
Órris Soares. Dicionário de Filosofia. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1968, p. 212.

86
História de sergipe: república

socialistas, a maçonaria, os protestantes e os espíritas.142


A essa altura, quando a Europa começava a recuperar-se da catás-
trofe da Primeira Guerra (1914-1918), as ideias autoritárias passaram a
encontrar ressonância, em detrimento do liberalismo e da democra-
cia. No Brasil, a derrota das campanhas civilistas e o engessamento
do sistema político com o predomínio das oligarquias, associadas com
o coronelismo, contribuíram para o crescimento de uma vertente
de ideólogos que propunha a reforma do Estado, com parâmetros
autoritários, na linha do pensamento de Alberto Torres (1865-1917).
Retomando essa tendência, prosperou a reação dos católicos liderada
por Jackson de Figueiredo (1891-1928). Nascido em Aracaju, estudou em
Salvador e Alagoas, e estabeleceu-se Rio de Janeiro em 1914. Depois de
uma fase de agnóstico e leitor de Nietzsche (1844-1900), converteu-se
ao cristianismo e passou a desenvolver seu apostolado com grande
determinação e destemor, polemizando, desafiando os adversários
com agressividade e paixão. Investia contra o socialismo e o indi-
vidualismo liberal, pregava o renascimento do catolicismo através
dos princípios da autoridade, da ordem, da tradição e do moralismo.
Agitou o mundo das ideias com sua ação proselitista na imprensa e
nas instituições que ajudou a criar, como a revista A Ordem (1921) e o
Centro D. Vital (1922). Não obstante seu estilo arrebatado e suas pre-
gações reacionárias, como as qualificou seu discípulo maior, Alceu
Amoroso Lima, a força do seu entusiasmo e de sua fé contagiantes
ganharam repercussões enormes.
Em Sergipe, onde a presença do bispo d. José Tomás, com seu
Seminário e suas ações pastorais, já vinha conquistando seguidores
no meio intelectual, em 1918 começou a ser publicado A Cruzada. Sob
orientação da Igreja Católica, o jornal passou a difundir de forma mais
sistemática seus princípios e suas visualizações sobre as questões
conjunturais. Os religiosos, que antes travavam suas polêmicas pela
imprensa alheia, passavam a dispor de órgão próprio. Anos depois, na

142
Cf. Jackson da Silva Lima. Ob. cit., 1995. p. 122-25.

87
Ibarê Dantas

esteira da influência de Jackson de Figueiredo, um grupo de parentes e


amigos de Aracaju, criou, em outubro de 1928, a Revista de Sergipe, sob
o influxo das ideias jaquistas. Planejada para sair quinzenalmente com
a contribuição de escritores locais e de fora, entre os quais o próprio
Jackson, o periódico tinha como lema: “Deus, Pátria e Família”, justa-
mente o mesmo que adotaria o Integralismo alguns anos mais tarde.
Quando o segundo número estava prestes a sair, faleceu afoga-
do, no Rio de Janeiro, o líder católico, provocando grande comoção.
Apesar do impacto do infausto acontecimento, a Revista de Sergipe
continuou por algum tempo. Esteve a divulgar seu pensamento e seus
feitos e, em 20.04.1929, foi editado o último número. Apesar disso, a
influência de Jackson de Figueiredo persistiu por mais tempo, inspi-
rando novos movimentos.
O fato é que ao fim dos anos vinte, o triunfo do Fascismo na Itália
(1922) e a ascensão de Stalin na União Soviética (1924) estimulavam
as tendências autoritárias. Pela direita havia os católicos da revista
A Ordem, sob o influxo das ideias de Jackson de Figueiredo e, pela
esquerda, os simpatizantes do movimento comunista, bem como do
tenentismo.
Nessa conjuntura de ilusões pelos atalhos extra-legais foi impor-
tante o aparecimento em 1928 do periódico Sergipe Judiciário, dirigido
por Carvalho Neto, que circularia pregando a expansão do Estado de
Direito. Mas figuras como essas se revelavam impotentes para deter
a onda autoritária que avançava.

88
História de sergipe: república

1.5 Resumo (1890-1830)

Durante a Primeira República, a construção da democracia foi-se


revelando particularmente dificultosa. Depois da primeira década, em
si tumultuada, marcada por instabilidade política, formaram-se os
arranjos oligárquicos que asseguraram continuidade aos governos,
mas impediram que o liberalismo se conjugasse com a democracia, e
a sociedade se tornasse menos desigual. A vida partidária careceu de
competição e manifestou-se pouco fecunda. Na maioria dos pleitos
o candidato governista não teve concorrente e o nível de participa-
ção eleitoral continuou muito reduzido. O número de votantes para
presidente do Estado nunca chegou a 3,5% da população. As decisões
geralmente se processavam sem transparência. A estrutura de domi-
nação fechada, sob o signo do monopartidarismo, como um ritual
monótono, inibiu o debate político, a emergência de novos grupos
políticos, inviabilizando a alternância de poder através de líderes
oposicionistas. Mas, quando se olha a experiência de alguns Estados
mais próximos, verificamos que a dominação conservadora em Sergipe
não foi das mais exacerbadas. Quase todos os governantes do período
foram simpatizantes ou militantes do movimento republicano. No
governo, compuseram-se com os grupos conservadores, inclusive com
o patronato rural, participaram do seu ideário, mas nem todos fizeram
seus sucessores. Depois da Revolta de 1906, não tivemos mais figuras
personalistas dominando a política por largo tempo, a exemplo do que
acontecia em Pernambuco com Rosa e Silva (1896-1911), na Bahia com
J. J. Seabra (1922), e na Paraíba com Epitácio Pessoa (1915-1930).
É verdade que o domínio das famílias dos senhores do açúcar em
Sergipe também se revelava preponderante e, entre nós, o controle
político ampliou-se com alguma dose de intolerância na terceira
década republicana. Mas nem por isso deixamos de ter governantes
operosos e voltados para o interesse público. No conjunto, pode-se
dizer que o sistema político não favorecia a incorporação, por via
eleitoral, de novos atores, mas os oligarcas várias vezes apoiaram os
quadros mais ilustrados de nossa intelectualidade para o parlamento.

89
Ibarê Dantas

A democratização e a cidadania avançaram pouco, mas o tenentis-


mo, não obstante sua tendência autoritária e voluntarista, concorreu
para desgastar o domínio conservador e contribuir para tornar a
Revolução de 1930 mais consequente.
Não obstante o pequeno avanço político, Sergipe viveu um período
de modernização. A economia continuou muito dependente da pro-
dução açucareira, mas em certa medida se diversificou. As indústrias
têxteis se propagaram e prosperaram, gerando muitos empregos. Os
serviços urbanos melhoraram bastante, graças à parceria do Estado
com os empresários. A instalação de água encanada e da luz elétrica,
os bondes a tração animal e os carris elétricos, a primeira estrada de
rodagem, telefone, mercado, matadouro, tudo contou com a partici-
pação dos capitalistas, que construíam ou implantavam e exploravam
os seus serviços por algum tempo.
A vida social animou-se e a sociedade tornou-se mais plural,
embora ainda voltada para a manutenção dos privilégios dos grupos
dominantes e, em menor proporção, dos estratos médios. Os serviços
de higiene e saúde melhoraram consideravelmente. As classes subal-
ternas persistiam discriminadas, mas, especialmente os trabalhadores
urbanos fizeram greves, editaram seus jornais, criaram seu Centro,
procuraram organizar-se e reivindicar direitos. É certo que a domina-
ção liberal-oligárquica não proporcionou a devida prioridade ao setor
educacional. Houve algumas iniciativas governamentais meritórias,
a sociedade participou de campanha contra o analfabetismo, mas o
progresso foi pequeno. Basta comparar os números do Censo de 1890
como os de 1920. Enquanto o primeiro mostrou que 89% da população
não sabiam ler nem escrever, o segundo registrou que ainda havia
83% na mesma situação, continuando praticamente à margem do
processo civilizatório.
As produções culturais ocorreram num momento em que as in-
fluências externas eram relativamente pequenas. Mas não devemos
superestimar o nível de autonomia interna, pois além das informa-
ções veiculadas pelas publicações e pelos viajantes, a importação
de imagens através do cinema afetava valores e padrões sociais,

90
História de sergipe: república

embora não fosse suficiente para abalar a sociedade tradicional,


sob a hegemonia de grupos privados, reduzidos em número e ex-
pressivos em poder. Alguns governos atuaram de forma autoritária
coibindo as manifestações divergentes na imprensa. Apesar da
predominância do domínio oligárquico, o Estado não dispunha de
política cultural institucionalizada e definida. Quando muito, atuava,
esporadicamente, como mecenas, subsidiando artistas ou estudantes,
publicando obras, interferindo relativamente pouco nas produções
culturais. Não obstante as ações reduzidas do Estado, as iniciativas in-
dividuais multiplicaram-se, animando o ambiente, revelando talentos
e obras marcantes. Embora vários intelectuais e/ou artistas tenham
emigrado e ganhado projeção nacional, os que ficaram, enfrentando
as limitações do meio, tornaram-se os principais responsáveis pela
construção do patrimônio cultural de Sergipe.

91
II
O ESTADO INTERVENCIONISTA SOB
DOMÍNIO MILITAR (1930-1945)

2.1 A Revolução de 1930 e a Reestruturação Política

A Revolução de 1930 operou remodelação da política e do Estado


Nacional. Desde quando foi desencadeada em 3 de outubro, sob a
iniciativa dos tenentes com apoio dos civis, a partir de Recife e Porto
Alegre, o movimento foi-se ampliando pelos vários Estados. O presi-
dente Washington Luís foi deposto e a ordem constitucional rompida.
Assumiu o governo Getúlio Vargas num momento difícil para a po-
lítica e para a economia brasileira. A crise financeira que se abatera
no mundo a partir de 1929, deixou patente a inviabilidade do nosso
modelo agroexportador. Impunha-se a busca de novas alternativas
econômicas. A opção seguida pelo governo brasileiro foi estimular
aqueles setores que dispunham de melhor nível de acumulação de
capital através de um processo de industrialização, que implicava na
substituição paulatina das importações.
Nesse novo contexto, diversos grupos passaram a disputar espaço
político sem que nenhum deles assegurasse predomínio, configurando-
-se assim uma crise de hegemonia. Nesse jogo competitivo, o Estado
mediava os conflitos e assumia prática intervencionista voltada para a
modernização da máquina político-administrativa e para a industriali-
zação. Essa tendência foi-se consolidando na medida em que o governo
ia se legitimando, atendendo a demandas populares, especialmente os
reclamos dos trabalhadores urbanos. A orientação liberal-oligárquica

93
Ibarê Dantas

foi substituída pela dominação populista. O período 1889-1930 passava


a ser chamado de República Velha e o que lhe seguia denominado de
República Nova. Os derrotados eram identificados como decaídos e os
vencedores autodenominados de revolucionários.
Os líderes tenentistas, desde então, tentaram implantar no país um
projeto político intervencionista, reformista, nacionalista, voltado à
reestruturação administrativa, a partir do saneamento das finanças
públicas e, em certa medida, buscando aproximação com as classes
subalternas urbanas.
Em termos regionais, o Nordeste passou a ser tratado como
uma área específica, foco de atenção especial. Inicialmente o líder
tenentista Juarez Távora, que foi elevado a “general” e comandante
em chefe das tropas do Norte, esteve administrando os problemas da
região, tendo sido chamado vice-rei do Norte, mas com o tempo foi
perdendo poder.
Em Sergipe, os sinais mais concretos da Revolução começaram
a ser percebidos com o aparecimento de um avião jogando manifes-
tos na capital, na manhã do dia 16.10.30, dando conta do avanço das
forças revolucionárias, provenientes do Norte, em direção à capital.
O presidente do Estado fugiu e o tenente-médico Eronides de Carva-
lho assumiu como governador provisório. Depois de atravessarem
o Rio São Francisco, de Penedo para Neópolis, onde houve alguns
incidentes com mortes, as tropas partiram com destino a Aracaju,
aonde chegaram entre a noite do dia 18 e a madrugada do dia 19.10.30,
transformando a capital, por um curto período, num Quartel Gene-
ral das Forças em Operações no Norte do país. Na manhã do dia 20,
já Juarez Távora comparecia ao Palácio e empossava o general José
Calazans que fora o primeiro presidente constitucional de Sergipe,
em 1892, e continuava com a mesma imagem de homem sério e ho-
nesto, zeloso dos bens públicos. O novo governante encontrou dívida
correspondente à receita de quase dois anos1 e passou a preocupar-se

1
Diário Oficial, 17.10.31.

94
História de sergipe: república

com a contenção financeira. Mas quinze dias após sua posse, o Diário
Oficial noticiava sua renúncia e sua substituição pelo major Marcelino
José Jorge. Este era também militar reformado, identificado com os
movimentos liberais da campanha pró Rui Barbosa e com a Aliança
Liberal. O novo governante prosseguiu o plano de contenção finan-
ceira de seu antecessor. Expediu decretos de exoneração e dissolveu
a Assembleia Legislativa cinco dias antes do decreto presidencial de
11.11.1930, que institucionalizava o Governo Provisório da República
como uma forma de ditadura.2 Os intendentes foram cassados e
substituídos por outros nomeados para “exercer aí todas as funções
executivas e legislativas”. Ao interventor, nomeado pelo Governo
Provisório, caberia, entre outras coisas, exercer em toda plenitude
não só o Poder Executivo, como também o Legislativo. Quanto ao
Poder Judiciário, prescrevia-se que “continuaria a ser exercido de
conformidade com as leis em vigor, com as modificações que viessem
a ser adotadas”... e mantinha-se o habeas corpus “em favor dos réus ou
acusados em processos de crimes comuns, salvo os funcionários e os
de competência de tribunais especiais”.3 Pouco depois veio novamente
a Sergipe o general Juarez Távora e persuadiu o general José Calazans
a retornar ao governo, mas, seis dias depois, este entregou a direção
do Executivo ao tenente Augusto Maynard Gomes. A partir de então,
o Estado passaria a ter uma administração mais duradoura.4

2.1.1 A Interventoria de Maynard Gomes (1930-1935)

Com a deflagração do Movimento de Outubro, o sistema oligár-


quico, que havia predominado durante a República Velha, recebeu
impacto político considerável. Em 16.11.1930 o tenente Augusto May-
nard Gomes tomou posse do cargo de governador provisório e poste-
riormente (19.12.1930) tornou-se interventor do Estado, como o líder

2
Cf. Diário Oficial, 07.10.30.
3
Edgard Carone. A Segunda República. São Paulo: Difel, 1973, p. 18-19.
4
Para uma versão ampliada desse período, ver José Ibarê Costa Dantas. A Revolução de 1930
em Sergipe: dos tenentes aos coronéis. São Paulo, Aracaju: Cortez, UFS, 1983.

95
Ibarê Dantas

revolucionário de maior destaque em Sergipe. Tendo tomado parte


nas revoltas de 1904 (Rio de Janeiro), 1906, 1922, 1924 e 1926 (Sergipe),
acabava de participar da vitória de 1930, desempenhando missão
em Minas Gerais, coroando com sucesso seu passado de rebeldia.
Embora proviesse de família de senhor de engenho do município de
Rosário do Catete (Sergipe), tinha longa vivência e identificação com
a geração dos tenentes revoltosos, o que, aliás, era suficiente para
inspirar desconfiança às forças dominantes. Chegando ao Executivo
sem o beneplácito dos grupos econômico-financeiros locais, montou
seu governo com a predominância de elementos dos estratos médios:
militares egressos do movimento tenentista, intelectuais e/ou buro-
cratas civis sintonizados com os tenentes ou simplesmente aderentes
de última hora e de origem social mais diversificada. Quanto aos seto-
res dominantes, tais como comerciantes, fazendeiros e industriais, o
interventor procurou agradá-los indicando alguns de seus represen-
tantes para o Conselho Consultivo, órgão até certo ponto decorativo,
criado para amenizar o desaparecimento da Assembleia Legislativa.
Enquanto o Executivo se fortalecia, enfraquecia-se o Judiciário.
Decretos-leis foram emitidos diminuindo suas prerrogativas, ao
tempo em que se tentava depurá-lo. Um desembargador e um juiz
foram colocados em disponibilidade, outro juiz era aposentado por
incapacidade física, gerando prolongada questão nos meios judiciais
do Estado. Enquanto isso, a interventoria criava Comissão Legislativa,
composta por três membros, encarregada de elaborar os projetos
de reforma da legislação processual e de organização judiciária que
chegou a seu termo ainda em 1931.5
Nesses tempos de mudanças, seguindo orientações nacionais, o
ensino passou por transformações significativas, seguindo o ideário
da Escola Nova. Buscou-se também ampliar a eficiência da adminis-
tração, criando a Diretoria de Estatística de Sergipe e o Departamento
Estadual de Saúde Pública. O Estado era dividido em distritos sanitá-

5
Decreto-Lei SE n. 76 de 03.09.1931.

96
História de sergipe: república

rios e aumentava sua atuação. Adquiria os Serviços de Água e Esgoto


que, àquela altura, estava em mãos de sociedade comercial, e assumia
o controle acionário da Empresa de Energia Elétrica.6 A presença do
Poder Central se ampliava, assim como a ação do Estado na área de
serviços. Alguns atos como abatimento de aluguel, supressão de gra-
tificações e adicionais de funcionários do Estado, inclusive de juízes,
já indicavam a inserção na tendência populista em alta. Essas inova-
ções ocorreram sobretudo em 1931, apesar de viver-se num momento
de recessão. Como se isso não bastasse, o governo deparou-se com
a grande seca de 1932, que afetou a arrecadação e provocou débitos
sucessivos. Desde então, a administração passou a assumir um ritmo
mais rotineiro. Combatia o banditismo dos grupos de Lampião sem
sucesso e abria novas estradas. As obras de maior porte foram a ponte
de Pedra Branca e a abertura do canal Santa Maria com o respaldo do
governo federal. Em Aracaju realizava aterros e construía o Jardim de
Infância, sintonizado com a política nacional de assistência às crian-
ças. Por esse tempo, a velha disputa de limites com a Bahia voltou à
tona, mas, como sempre, sem êxito. A questão que mais embaraçou
a interventoria foi a partidária.
Recorde-se que as lideranças tenentistas assumiram o governo de-
clarando aversão à política partidária e aos políticos tradicionais. Mas,
como estavam preocupados em fortalecer-se, foram criando alguns
órgãos com o objetivo de aglutinar os grupos identificados com a Revo-
lução. Em Sergipe, Maynard Gomes, professando superioridade sobre
a política partidária que, no seu juízo, teria desaparecido em Sergipe,
estimulou ao máximo a formação da Legião de Outubro no Estado.7
Assinou manifestos, promoveu encontros, conclamou a adesão de to-
das as classes sociais e, realmente, numerosas figuras representativas
de vários segmentos do Estado inscreveram-se na referida entidade,
que não foi além dessa formalização do respaldo político ao governo.

6
Ver Armando Barreto (org). Cadastro Industrial e Comercial e Informativo de Sergipe. Aracaju:
Artes Gráficas da Escola de Aprendizes de Artífices, 1933, p. 84 e 146.
7
Cf. Diário Oficial, 30.04.1931 e Jornal de Notícias, 14.03.1931.

97
Ibarê Dantas

Mais tarde, em junho de 1932, a Legião foi transformada em Clube


3 de Outubro, apesar das hesitações do interventor.8 Criado como
órgão nacional em fevereiro de 1931, o Clube 3 de Outubro objetivava
agregar e selecionar lideranças simpatizantes do governo e influir no
projeto político transformador, pela via autoritária, com algumas
tendências socializantes. Dentro desse espírito, atuaria como centro
de pressão, organizado no sentido de contrabalançar as investidas
dos grupos conservadores sobre o governo federal. E, realmente, até
quando perdurou o regime de exceção, os tenentes organizados em
torno do Clube realizaram encontros nacionais, traçaram diretrizes
e influíram de forma patente nas orientações da política nacional.
Enquanto isso, os grupos políticos que exerceram grande influência
na Primeira República foram alimentando insatisfações com a ges-
tão da interventoria, explicitando descontentamentos e tentando
organizar-se.
Na esfera nacional, o debate principal girava em torno da con-
veniência ou não da constitucionalização do país. Os tenentes se
posicionaram contra, alegando que as eleições trariam a volta das
oligarquias. Mas, depois da Revolta promovida pelos paulistas, em
1932, o presidente Vargas comprometeu-se a convocar a Constituinte.
As eleições foram marcadas para maio de 1933 e, dois meses antes,
os grupos políticos criaram seus partidos com o fim de concorrerem
ao pleito.
O primeiro a ser fundado foi a União Republicana de Sergipe, repre-
sentante do grupo dos usineiros, o setor mais descontente com a nova
ordem. A solene fundação realizou-se na Usina Pedras, do afortunado
coronel Gonçalo Rolemberg do Prado, mais conhecido por Gonçalo
das Pedras, e contou com a presença de usineiros, figuras do patronato
rural e também alguns intelectuais vinculados à classe dominante.
A segunda agremiação criada foi o Partido Social Progressista,
que tinha no ex-presidente do Estado Graccho Cardoso sua maior ex-

8
Cf. Diário Oficial, 25.05.1932.

98
História de sergipe: república

pressão. Agregava também seguidores do ex-presidente Pereira Lobo


e membros da ex-Aliança Liberal que não se integraram no governo
de Maynard nem estavam afinados com a orientação dos usineiros.
Quanto ao grupo de apoio à interventoria, envolvendo aí forte con-
tingente das classes subalternas urbanas e parcelas significativas do
patronato rural, organizou-se através da legenda Liberdade e Civismo,
que tenderia a polarizar com União Republicana de Sergipe.
Durante a curtíssima campanha eleitoral, a Igreja Católica tam-
bém atuou através da Liga Eleitoral Católica (LEC), entidade criada
em 1932, tendo como objetivos principais alistar, organizar e instruir
o eleitorado católico. A sua principal peculiaridade, no entanto, era
o caráter suprapartidário. Agindo como grupo de pressão, sem se
atrelar diretamente a nenhum partido, a LEC procedia como força
aconselhadora, selecionando os candidatos mais identificados com
seu ideário.
Decorrido o pleito para a escolha dos quatro nomes para represen-
tar o Estado de Sergipe na Constituinte, três candidatos foram eleitos
pela legenda Liberdade e Civismo e apenas um pela União Republi-
cana de Sergipe. O Partido Social Progressista não elegeu ninguém.
A vitória do grupo situacionista pode ser explicada, de um lado, pela
composição do governo estadual com os governos municipais; de ou-
tro, merece menção o apoio de Leandro Maynard Maciel, secretário
de obras do ex-presidente Manoel Dantas, que vinha restabelecendo
suas bases formadas antes de 1930. Além desses dois fatores, deve
também ter contribuído para a vitória de três dos quatro candidatos
situacionistas a popularidade que a interventoria gozava, sobretudo
nos meios urbanos. O resultado foi um revés significativo para os
conservadores de Sergipe.
Os constituintes federais confirmaram as tendências dominantes,
legando ao país uma Carta de teor nacionalista e intervencionista.
Trazia também várias outras inovações significativas, entre as quais
a Justiça Eleitoral, pluralidade e autonomia dos sindicatos e o direito
do voto a todos os maiores de 18 anos independentemente do sexo,
facultando assim o sufrágio à mulher. Estabelecia o mandato do

99
Ibarê Dantas

chefe do Executivo até 1938, quando deveria haver eleição direta para
presidente. Levantou suspeições, no entanto, à inclusão de artigos
referentes à Segurança Nacional.
Enquanto os parlamentares elaboravam a nova Constituição, os
políticos em Sergipe preparavam-se para o próximo embate eleitoral,
a realizar-se ainda em 1934, quando seria eleita a bancada de deputa-
dos estaduais que haveria de escolher dois senadores e o governador,
revelando-se, assim, um momento dos mais importantes na defini-
ção do quadro dominante internamente. O período que medeia o
primeiro pleito (1933) do outro (1934) seria marcado pela polarização
crescente entre as duas principais forças políticas estaduais: o grupo
situacionista, organizado em torno da interventoria e os conserva-
dores aglutinados na União Republicana de Sergipe (URS). Durante
esse período, foram criadas mais quatro agremiações, o que mostra
a intensidade da rearticulação política em curso.
A primeira foi o Partido Social Democrático de Sergipe (PSD)
sob influência predominante do conhecido líder político Leandro
Maynard Maciel, que antes havia se aliado à interventoria, mas an-
dava insatisfeito. Pouco depois, as principais lideranças políticas que
apoiavam o interventor fundaram o Partido Republicano de Sergipe,
quando se pregou o “fortalecimento da ação do Estado como media-
dora dos interesses coletivos”: a defesa dos direitos dos trabalhado-
res, proteção à infância, assistência sanitária às populações pobres.9
Com a estruturação desse partido, sucedâneo da legenda Liberdade
e Civismo, o grupo situacionista partiria para a campanha, atraindo
outros setores, com vistas a enfrentar os conservadores. Estes, por
sua vez, buscavam também ampliar seu raio de ação envolvendo,
inclusive, os integralistas, que se organizavam em Sergipe. Se, em
fins dos anos vinte, já se tentava divulgar as ideias fascistas no Brasil,
foi nos anos trinta que se propagou o movimento integralista, sob a
liderança do escritor paulista Plínio Salgado. Numa conjuntura de

9
Programa e Estatuto do Partido Republicano de Sergipe. Aracaju: Imprensa Oficial, 1934.

100
História de sergipe: república

prestígio ascensional das ideias autoritárias, o Integralismo apa-


recia com o lema “Deus, Pátria, Família” dentro de uma concepção
patriarcal da sociedade e atuaria como movimento político capaz de
galvanizar ponderáveis setores da classe média e da classe dominante,
de alguma forma assustados com a expansão das ideias socialistas.
Daí a aceitação ou simpatia encontrada entre leigos e religiosos que
professavam a religião católica. Como uma reprodução cabocla do
fascismo europeu, o Integralismo, criado formalmente com o lança-
mento do seu manifesto, em outubro de 1932, difundiu-se rápido em
quase todo o país. Em 1933 alguns de seus líderes fizeram peregrinação
pelas capitais dos Estados, inclusive no Norte e Nordeste.
Em Sergipe, em inícios de dezembro de 1933, Gustavo Barroso,
Miguel Reale e Mário Brasil proferiram conferências no Teatro Rio
Branco, na Associação Sergipana de Imprensa e na Associação dos Em-
pregados do Comércio, com grande receptividade entre a intelectuali-
dade de Aracaju. Fundou-se, então, um núcleo de integralistas em Ser-
gipe, no qual em sessão pública, intelectuais como Omer Mont’Alegre,
Agnaldo Celestino e José Calazans apareciam como simpatizantes de
primeira hora.10 Durante o ano de 1934, o movimento propagou-se em
Sergipe, estendendo-se ao interior. Foi criado o semanário O Sigma,
dedicado à propagação do movimento, dando impulso ao seu credo,
dentro do sistema hierarquizado da organização.11
Outra agremiação organizada nesse tempo foi a dos trabalhadores
urbanos, denominada de Aliança Proletária de Sergipe, criada em
março de 1934, com programa em certa medida inspirado no ideário
socialista.
Com as várias tendências político-ideológicas da sociedade ser-
gipana organizadas em partidos, a campanha refletiu os interesses
e as paixões dos diversos grupos sociais, num nível de participação
inédito na História de Sergipe, de forma que as diversas correntes

10
Sergipe Jornal, 04-06.12.1933 e 03.01.1934.
11
Sobre o tema, ver Ademir da Costa Santos. O Integralismo em Sergipe: os intelectuais e a ação
da Igreja Católica (1933/1938). Monografia apresentada no bacharelado de Ciências Sociais,
Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão/SE, 1996.

101
Ibarê Dantas

políticas puderam, com entusiasmo e, muitas vezes, com excessos,


atacar seus adversários e divulgar suas promessas. Apesar dos seis
partidos existentes terem apresentado chapa própria, a campanha
se desenvolveu dividida em dois grandes blocos: o situacionista e o
grupo dos usineiros.
Entre as alianças ocorridas, a mais surpreendente foi a do PSD
com a URS pelas históricas incompatibilidades, inclusive familiares,
que permeavam os dois grupos. Quanto ao Partido Social Progressista
de Graccho Cardoso, que havia concorrido em faixa própria em 1933,
ligava-se à interventoria, assim como à Aliança Proletária de Sergipe.
Os dois blocos ficaram assim constituídos: de um lado, a URS, o PSD
e a Ação Integralista, com alguma simpatia de setores da Igreja. Do
outro lado, figuravam o PRS, o PSP e a ASP. Em termos ideológicos,
apesar da heterogeneidade do bloco que apoiava a chapa oficial, não
deixava de se diferenciar do outro grupo, de perfil tipicamente con-
servador. A primeira coalizão lançava como candidato a governador,
a ser eleito pela Constituinte, o capitão e médico Eronides Ferreira
de Carvalho. Do outro lado, concorria o capitão Augusto Maynard
Gomes, que pretendia continuar no Executivo como governador eleito
pela Assembleia Constituinte.
À medida que o pleito se aproximava, o clima da campanha torna-
va-se tenso e marcado por conflitos os mais diversos: lutas corporais,
tiroteios, prisões, arbitrariedades e violências várias. O interventor
afastou-se do governo, visando demonstrar distanciamento das
ocorrências, mas os conservadores, não conformados, lutaram pela
intervenção federal e conseguiram-na.
O resultado evidenciou a vitória dos conservadores, que elegeram
três dos quatro deputados da bancada federal12 e 16 dos 30 membros
da bancada para a Assembleia Constituinte do Estado. A vitória na
Assembleia Estadual, não obstante a exígua maioria, teria maiores
consequências. Diante do insucesso, o interventor relutou em en-

12
Foram eleitos Amando Fontes, Barreto Filho e Mesquisedeck Monte pela URS e apenas
Deodato Maria pelo PRS.

102
História de sergipe: república

tregar o governo a quem denominava de reacionário, passando a


articular a resistência, envolvendo seus grupos de apoio. Travou-se,
então, uma movimentada guerra de bastidores, inclusive na área do
governo central. Mas os conservadores não se deixaram envolver.
Sem respaldo legal e sem apoio externo significativo, Maynard ter-
minou renunciando, em 27.03.1935, para não transmitir o cargo aos
adversários.
Instalada a Assembleia Constituinte Estadual em 1o.04.1935, no
dia seguinte foram realizadas as eleições para governador e senador.
Com maioria, a coalizão URS+PSD elegeu todos os seus candidatos,
ou seja, Eronides Ferreira de Carvalho para governador e um senador
de cada um dos partidos: Augusto César Leite pela URS e Leandro
Maynard Maciel pelo PSD.

2.1.2 O Governo Eronides de Carvalho e a Reação Conservadora (1935-1937)

A ascensão do capitão Eronides Ferreira de Carvalho ao governo


de Sergipe, eleito pela Assembleia Legislativa, em 02.04.1935, signifi-
cou o triunfo de uma orientação conservadora em reação às políticas
operadas pela interventoria de Maynard. Num momento em que o
governo federal parecia interessado em golpear os esquerdistas, a sua
vitória tornou-se bastante conveniente a Vargas.
Proveniente de família de proprietário rural de Canhoba (SE),
Eronides de Carvalho nasceu em 1895, graduou-se em Medicina (1917)
e retornou a Sergipe, onde ocuparia vários cargos públicos. Crítico
do movimento tenentista, permaneceu fiel às forças legais durante
as revoltas de 1924 e 1926 e por toda a década de vinte. No entanto,
quando a Revolução de 1930 eclodiu, tornou-se o primeiro dos gover-
nantes provisórios. Durante a interventoria de Maynard (1930-35),
permaneceu prestando serviços profissionais no 28º BC, ao tempo
que manifestava sua discordância com a orientação política vigente,
aglutinando os descontentes e impondo-se como alternativa viável
em termos de liderança. Com sua posição privilegiada de membro do
Exército, num momento de prestígio dos militares, aproximou-se do

103
Ibarê Dantas

grupo dos usineiros e participou ativamente da fundação da União


Republicana de Sergipe. Uma vez empossado como governador, tratou
de desarticular o grupo maynardista e anular muitos dos seus feitos.
No interior, ao tempo em que eram exonerados prefeitos, membros
de Conselhos Consultivos, integrantes de comissões de ensino, dele-
gados, subdelegados e adjuntos de promotoria, eram logo divulgados
seus substitutos de conformidade com os termos do acordo prévio
firmado entre os dois grupos. Simultaneamente foi abolindo regula-
mentos, anulando decretos, suprimindo cargos e exonerando servi-
dores. Entretanto, cedo as divergências dentro da aliança partidária
governista emergiram. Os pessedistas alegaram que o governador
não estava honrando os acertos e cerca de três meses depois houve a
cisão, fortalecendo consideravelmente os oposicionistas. Os situacio-
nistas ainda conseguiram cooptar alguns deputados, mas a atuação
dos divergentes cresceu e passou a desgastar o governo nos planos
nacional e local.13
Os esquerdistas intensificaram sua mobilização criando enti-
dades. Após a formação da União Feminina do Brasil e da Frente
Única Antifascista e Antiguerreira de Sergipe, foi fundada a Aliança
Nacional Libertadora (ANL). Não obstante uma certa receptividade
entre alguns segmentos urbanos, segundo estudioso do tema, teria
duração legal de menos de uma semana, em face da extinção do ór-
gão no plano nacional.14 Os direitistas, por sua vez, ampliavam seus
núcleos integralistas, muitas vezes com o apoio velado ou explícito
da Igreja Católica que passou a atuar de forma mais vigorosa. Criou
a sucursal da Ação Católica Brasileira em 1935, que atingia os grupos
médios e superiores, bem como o Círculo Operário Sergipano, que
atuava entre os trabalhadores urbanos. Sintonizado com esses órgãos,
havia o jornal A Cruzada, dando cobertura e ajudando as iniciativas
proselitistas.

13
Ver José Ibarê Costa Dantas. Ob. cit., 1983.
14
Cf. Juarez Ferreira de Oliveira. Pão, Terra e liberdade: A Aliança Nacional Libertadora em
Sergipe. São Cristóvão, UFS, 1999. Monografia apresentada no curso de História da UFS,
p. 64.

104
História de sergipe: república

Com essa pluralidade de entidades disputando espaços ideológi-


cos, as lutas políticas, que já haviam sido bastante renhidas no pleito
de 1934, se exacerbaram. A polarização foi evoluindo para agressivida-
des mútuas, enquanto o governo federal ia aumentando seu aparato
repressivo, fazendo vista grossa diante das ações dos integralistas e
investindo contra os esquerdistas. Em abril de 1935, foi aprovada a Lei
de Segurança Nacional e, em junho do mesmo ano, Vargas mandava
fechar todos os núcleos da Aliança Nacional Libertadora, o que foi
feito no mês seguinte.15 Pouco depois vinha a ordem para impedir
o funcionamento da União Feminina do Brasil pelo período de seis
meses, considerando que vinha desenvolvendo “atividade subversiva
da ordem política e social”.16 Da mesma forma, era reprimida a Frente
Única Antifascista e Antiguerreira de Sergipe.
Quando os oposicionistas fustigavam o governador Eronides de
Carvalho, com base insuficiente para proporcionar-lhe segurança
no parlamento, os comunistas levantaram-se em novembro de 1935,
em Natal, Recife e Rio de Janeiro. O movimento, que ficou conhecido
como Intentona Comunista, levou o governo nacional e o estadual
a intensificarem a repressão. Em Sergipe dezenas de pessoas foram
presas e algumas bastante maltratadas. Enquanto isso, o interventor
mantinha relações amistosas com Virgulino Ferreira, dificultava a
repressão ao seu grupo de cangaceiros e fornecia-lhe munição. Não
foi por acaso que passou a ser considerado “como o mais importante
aliado e protetor de Lampião”.17 Como efeito da repressão, o movi-
mento dos trabalhadores urbanos, que vinha crescendo e já contando
inclusive com um deputado classista na Assembleia Legislativa, onde

15
“O pretexto para a promulgação da lei é o extremismo, porém a medida não se dirige contra a
Ação Integralista Brasileira e sim contra o movimento operário”. Edgard Carone. A República
Nova. São Paulo: Difel, 1974. p. 334.
16
Diário Oficial, 24.07.1935.
17
Luitgarde Oliveira Cavalcanti Barros. A Derradeira Gesta. Lampião e Nazarennos Guerreando
no Sertão. Rio de Janeiro: FAPERJ, Mauad, 2000, p. 68. Sobre essa cumplicidade de Eronides
de Carvalho com as ações de Lampião, ver ainda: Joaquim Góis. Lampião, o último cangaceiro.
Aracaju: Regina, 1966, p.156 e José Anderson Nascimento. Cangaceiros, Coiteiros e Volantes.
São Paulo: Ícone, 1998.

105
Ibarê Dantas

tinha atuação bastante participativa, passou a ser desarticulado. A


partir de 1936 ainda procurou recompor-se, elegendo vereadores,
promovendo encontros no Centro Operário, editando jornal, mas seus
membros eram bastante rechaçados pelos integralistas, que chega-
ram a invadir as oficinas e danificarem suas máquinas, enquanto a
polícia, comandada por simpatizantes dos camisas verdes, se omitia.
No período de 1936-1937, o governo Eronides de Carvalho passou a
divulgar propaganda de cunho ideológico e realizar ações repressivas,
censurando e fechando jornais, prendendo estudantes, jornalistas,
perseguindo adversários políticos no interior do Estado. Mas os oposi-
cionistas não se davam por vencidos. Continuavam criticando os atos
governamentais pelo Jornal da Tarde e pelo Correio de Aracaju, ataques
que eram respondidos pelo Estado de Sergipe e pelo Diário Oficial. A
partir de fins de outubro de 1937, o clima foi-se tornando mais tenso na
Assembleia Legislativa com o empenho dos deputados oposicionistas
de votar o impeachment do governador Eronides de Carvalho. A essa
altura, no plano nacional, acirrava-se também a campanha eleitoral
para presidente da República com a disputa entre dois candidatos. De
um lado, concorria o paraibano José Américo de Almeida, contando
com o apoio das forças de esquerda e a maior parte do eleitorado
nordestino. Do outro lado, disputava o paulista Armando Sales de
Oliveira, aglutinando os empresários e o grosso da população do
Sudeste. Quando a nação discutia suas opções político-eleitorais,
Vargas, com apoio dos militares e dos integralistas, anunciou o golpe
de Estado. Nascia o que foi denominado de Estado Novo.

106
História de sergipe: república

2.2 As Interventorias no Estado Novo (1937-1945)

O golpe de novembro de 1937 significava o triunfo das ideias


antiliberais e antidemocráticas que vinham prosperando de muito,
estimuladas inclusive pela ascensão dos regimes autoritários em
vários países do Ocidente. O experimento democrático, que começou
a ser vivenciado a partir de 1933, encontrava grandes dificuldades de
realização. Bombardeado pelos grupos de direita e de esquerda, e fra-
gilizado pela exacerbação das lutas político-ideológicas, teve pequena
duração. O governo outorgou uma Constituição autoritária inspirada
no exemplo polonês. O Congresso Nacional e todas as demais casas
legislativas foram fechados. O princípio federativo foi anulado. Em
1938, os integralistas insatisfeitos com as promessas não cumpridas
se rebelaram, Vargas reprimiu-os e aproveitou para completar a
obra do Estado Unitário. Extinguiu a Ação Integralista, bem como os
símbolos estaduais. Sem órgãos de representação, a relação entre o
povo e o líder (presidente) era teorizada como direta, sem necessidade
de intermediários. O líder tornava-se o único representante de todo
o povo. Dessa forma, não se admitiriam manifestações divergentes.
Em Sergipe, o período 1937-45 foi preenchido pela sucessão de três
interventores no governo do Estado. Eronides de Carvalho permane-
ceu até julho de 1941. O capitão Milton Azevedo o substituiu e esteve
dirigindo o Estado até março de 1942, quando se processou a volta
de Maynard, que ficou no Executivo até a queda do regime ditatorial.
Poder-se-ia dizer que esses três interventores corresponderam,
em linhas gerais, a momentos diferentes do período autoritário. O
primeiro viveu o fastígio do regime, com a exacerbação doutrinária
beirando as raias do totalitarismo. O segundo representou o inter-
regno que separa o fastígio do declínio mais ou menos evidente. Esta
fase de descenso foi vivida pela gestão de Maynard (1942-45).
Dentre as primeiras medidas da interventoria de Eronides de
Carvalho (1937-41), destacou-se o acerto de contas com os adversários.
Respaldado pela nova Constituição outorgada, deflagrou a derrubada
de todos os chefes de Executivo municipal, eleitos por outros partidos,

107
Ibarê Dantas

que não eram de sua confiança. Ao lado disso, aposentou civis, refor-
mou militares, considerando tais atos de interesse do serviço público
e foi substituindo-os em geral por seus clientes ou correligionários,
enquanto os grupos oposicionistas praticamente nada podiam fazer.
Entre os mais privilegiados dessa operação estavam os senhores do
açúcar. Alguns deles tornaram-se inclusive prefeitos municipais.
Facultada pelo crescimento, a partir de 1935, das rendas tribu-
tárias, a interventoria pôde realizar várias obras, entre as quais se
destacam as ligadas ao setor de saúde, como o Palácio Serigy, Hospital
Infantil, casa para psicopatas e um centro para menores abandonados
e delinquentes, denotando a preocupação social do momento.18 Ao
lado dessas realizações, ampliou a rede de estradas, construiu escolas
e a Biblioteca Pública foi sediada em prédio novo, para ficar apenas
nas realizações mais significativas.
Sem partidos, com o Legislativo interditado, o Judiciário debilitado
diante de uma legislação que armava o Executivo de poderes amplos,
o circuito do controle parecia fechado. O único setor que não se sub-
metia à interventoria era a guarnição do 28º BC, enquanto esteve sob
o comando de Maynard, que permaneceu no posto até setembro de
1939, incomodando o interventor.
Com os principais redutos oposicionistas extintos, apenas dois
jornais sobreviviam sem compactuar de todo com a situação vigente:
o Correio de Aracaju e o Sergipe Jornal. Apesar de submetidos à censu-
ra, foram mostrando as contradições da administração autoritária.
Cidadãos insatisfeitos também passaram a escrever para autoridades
ligadas ao governo federal, dando conta de mau uso do dinheiro
público. Depoimentos pessoais de Maynard, que continuava com
alguma influência, reforçavam a veracidade das notícias. Diante de
sucessivas acusações, Vargas designou comissão federal que veio a
Sergipe e confirmou várias irregularidades, entre as quais a falsidade
dos orçamentos, a falta de concorrência em obras públicas, o atraso

18
Cf. Diário Oficial, 04.04.1940, 12.11.1940 e 30.03.1941.

108
História de sergipe: república

a credores do Estado de até três anos, bem como o tratamento dife-


renciado com relação a eles.19 O regime autoritário, desprovido de
fiscalização efetiva, se tornava campo propício à corrupção e arbítrios.
Quando toda a crítica se tornava proibida, ficava a delação como único
canal de informação às autoridades do poder central.
Convencido de seu prestígio de governante identificado com a
ditadura varguista, Eronides de Carvalho, a princípio, parece não ter
dado grande importância às denúncias, mas, quando foi ao Rio de
Janeiro prestar contas ao presidente, foi obrigado a renunciar. No dia
30 de junho de 1941, a imprensa de Aracaju noticiava sua exoneração,
bem como a nomeação do capitão Milton Pereira de Azevedo.20
A indicação do capitão Milton Azevedo para interventor (1941-
1942) foi uma solução conciliatória. Vargas, não querendo contrariar
de todo seu servidor Eronides de Carvalho com a nomeação imediata
de seu grande adversário político, Maynard Gomes, criou o mandato
intermediário entre os dois militares que se rivalizavam na arena
política de Sergipe. Figura discreta, o novo governante era natural
de Aquidabã, pequena cidade de Sergipe e, depois de cursar a Escola
Militar, esteve lotado na corporação do 28º BC. Após a intentona
comunista em 1935, sem sintonia com o então interventor Eronides
de Carvalho, deixou Sergipe. Instrutor da Polícia do Distrito Federal
desde 1937, ao ser nomeado interventor do seu Estado, foi recebido
em Aracaju com grande festa promovida pelos adeptos de Maynard.
No governo, montou seu secretariado com os seguidores daquele
líder tenentista. No âmbito dos municípios, depois de exonerações
de praxe de prefeitos e delegados, voltavam os nomes vinculados ao
maynardismo. Contando com o apoio deste grupo, o novo interven-
tor organizou comissões para apurar denúncias da administração
passada e divulgou os relatórios, dando conta de crise financeira e
desordem administrativa. Os jornais, antes censurados, desforraram-

19
Cf. Relatório de Sálvio Oliveira de 24.02.1941, fotocópia com o autor, gentilmente cedida pelo
relator.
20
Correio de Aracaju, 30.06.1941.

109
Ibarê Dantas

-se, realizando autópsia da administração finda. Enquanto isso, o novo


governo revelava maior escrúpulo no trato com o erário público, e as
relações da interventoria com os setores mais ou menos organizados
tenderam para entendimentos. Os senhores do açúcar, que apoiavam
a administração anterior, procuraram aproximar-se do novo governo,
através do seu líder coronel Gonçalo Prado. O momento era de dirimir
contradições de interesses. Sendo vedadas as greves ou manifestações
reivindicatórias dos trabalhadores, o governo obedecia às instruções
dos órgãos de controle, promovendo e disciplinando as comemorações
oficiais, e servindo de intermediação nas questões mais sérias entre o
capital e o trabalho. No geral, não conseguia fugir dos condicionamen-
tos do sistema autoritário controlador e desorganizador das massas
populares, ao tempo em que contribuía fielmente para melhorar a
feição do regime e de seu presidente.
Passado um período de alguma permissão para que a imprensa cri-
ticasse a administração anterior, a integração do governo no espírito
do autoritarismo estadonovista foi sendo retomada. O Departamento
de Imprensa e Propaganda (DIP) foi recuperando o controle parcial-
mente perdido no período de transição e a administração adquirindo
segurança. Isso passou a incomodar a alguns adeptos de Maynard,
que torciam pela sua volta ao governo o quanto antes. Mas Vargas
sem pressa foi protelando até março de 1942, quando, certamente
acossado por compromissos assumidos, exonerava o capitão Milton
Pereira de Azevedo e proporcionava a volta de Maynard à interven-
toria do Estado de Sergipe.
Sete anos depois de sua renúncia da interventoria de Sergipe,
retornava Augusto Maynard Gomes a ocupar a direção político-
-administrativa de seu Estado até 1945. O tenente, que assumiu o
governo em 1930, saiu em 1935 como major. Em 1942 voltava como
coronel. Mas a mudança não se processava apenas na patente. Depois
que, derrotado e inconformado, deixou o governo, teve o cuidado
de sempre se manter solidário à orientação política do presidente
Vargas, acompanhando-o em todas as suas variadas transformações.
Pleiteou então, a partir de 1935, o comando do Quartel do 28º BC,

110
História de sergipe: república

sediado em Aracaju e, apesar da reação de Eronides de Carvalho, foi


enfim atendido, em outubro de 1937, com o constrangimento explí-
cito daquele governador. Para atenuar a situação, Vargas designou-o
para missão no sul da Bahia, onde demitiu e empossou prefeitos e
delegados em municípios daquela região. Regressando a Aracaju em
janeiro de 1938, permaneceu no comando do 28º BC até setembro de
1939, constituindo-se em incômoda presença para a interventoria de
Eronides de Carvalho. Em janeiro de 1940, foi nomeado ministro do
Tribunal de Segurança Nacional, órgão maior do sistema repressivo
nacional, quando apresentou parecer favorável à condenação de Luiz
Carlos Prestes, comprometendo irremediavelmente sua imagem junto
aos simpatizantes daquele líder comunista.
Empossado como interventor em 24 de março de 1942 no Rio de
Janeiro, Maynard chegou a Sergipe no dia 27, quando ocorreu a trans-
ferência de cargo.21 Recebido com grande festa e elevadas expectativas,
tendeu a governar de forma diferente, mesmo porque o contexto era
outro. No aparelho de Estado, embora mantivesse seus adeptos que
vinham ocupando cargos de confiança desde a interventoria de Mil-
ton Azevedo, incorporou alguns técnicos ou burocratas que haviam
participado da gestão de Eronides de Carvalho, mostrando já certa
atenuação do espírito partidário. Ao lado disso, colocou na Secretaria
Geral o jovem advogado Francisco Leite Neto, que iria imprimir ru-
mos próprios à administração, coordenando as políticas, adquirindo
autonomia de ação e formando seu próprio grupo entre a classe domi-
nante. Outro fator que iria pesar na segunda interventoria Maynard
seria a teia de relações familiares. O casamento de uma filha com um
Garcez, em 1937, iria contribuir para a aproximação entre o governo
e personalidades da ex-União Republicana de Sergipe.
Apesar desses condicionamentos de tendência conservadora,
no primeiro ano de governo registrou-se certo empenho no sentido

21
Ver Sergipe Jornal, 05 a 28.03.1942, Correio de Aracaju, 28.03.1942. O seu lugar no Tribunal de
Segurança seria ocupado por Eronides Ferreira de Carvalho que mais tarde seria beneficiado
com um Cartório.

111
Ibarê Dantas

de pautar a administração por maior racionalidade. Tentou-se, por


exemplo, uniformizar as posturas municipais, enquanto o pessoal do
Tesouro do Estado passava a exigir dos seus funcionários (exatores) a
prestação de contas mensais, em vez de após a aposentadoria, como
então ocorria.
Quanto ao relacionamento do governo Maynard com os traba-
lhadores urbanos, também apresentou diferenciação em face do
primeiro período (1930-35). Por ocasião de sua posse, as lideranças
empenharam-se em tributar-lhe as mais calorosas homenagens.
Ante tais manifestações, a interventoria empreendeu algumas ini-
ciativas no sentido de corresponder a um mínimo das expectativas
dos trabalhadores. Nesse sentido, empenhou-se junto ao Ministério
do Trabalho, pleiteando a construção de casas populares, mas do
plano de construir em torno de uma centena de casas chegaria a
inaugurar, se muito, uma dezena. Enquanto isso, a Prefeitura de
Aracaju construía em bairro popular de Aracaju (Siqueira Campos)
a Casa da Criança Operária, composta de escola, creche e parque de
diversões. Em 1942, autoridade da Delegacia Regional do Trabalho
falava do programa do ministro Marcondes Filho “de legislação social
trabalhista e associativa”, que compreendia reuniões quinzenais com
todos os presidentes de sindicatos, envolvendo empregados, autô-
nomos e empregadores, no sentido de colaboração entre as partes.
No ensejo, o jornal O Nordeste, depois de ouvir da citada autoridade
referências sobre a aceitação do seu trabalho no Estado, estampava
em manchete: “Há em Sergipe a mais perfeita harmonia entre o capital
e o trabalho”.22 Em 1943, com a Consolidação das Leis Trabalhistas,
enfim o país passava a ter ampla legislação social, não obstante seu
caráter corporativista. Vargas e seus aliados saíam prestigiados como
grandes protetores dos operários.
Diante da Segunda Guerra Mundial (1939-45), quando o presidente
da República hesitava se aderia às potências Aliadas ou às do Eixo, o

22
O Nordeste, 18.05.1942.

112
História de sergipe: república

torpedeamento de navios na costa entre Sergipe e Bahia, em agosto de


1942, acabou com as dúvidas de Vargas.23 A agressão resultou na morte
de várias centenas de pessoas que apareceram nas costas territoriais
do Estado, comovendo a população e afetando o governo de Maynard.
As massas indignadas saíram pelas ruas à cata de colaboradores, os
então denominados de “quinta colunas”, realizando depredações
e saques difíceis de serem evitados.24 Nos portos, o risco de novas
tragédias concorreu para a redução do fluxo do comércio interesta-
dual, comprometendo o escoamento dos produtos de exportação e
as finanças públicas. Enquanto isso, a lavoura também se ressentia
das pragas que atingiam suas plantações.
Não obstante a arrecadação elevar-se consideravelmente de 1942
a 1945, a dívida pública aumentou, apesar de o elenco de obras ter
sido relativamente modesto: construção e conservação de escolas
e estradas, apoio à agricultura e à pecuária etc. Empreendimentos
maiores, como a edificação de casas populares e aquisição de Usina
Elétrica, eram financiados pelo governo central.25 Ao fim do Estado
Novo, o aparato administrativo havia se ampliado e se tornado menos
pessoal. Os serviços de saúde estavam melhorados. As obras conti-
nuavam mudando a face da capital. Os alagados de Aracaju haviam
se reduzido consideravelmente. As ruas ganhavam calçamentos de
paralelepípedos para permitir o fluxo de automóveis e de ônibus que
aumentavam. A grande maioria das sedes municipais já dispunha
de seu motor para geração de energia elétrica. Em meio às práticas
autoritárias, a administração estadual modernizava-se.

23
Segundo estudioso do tema, de 15 para 16 de agosto de 1942 teriam sido bombardeados os
navios Baependi com 270 mortes, Aníbal Benévolo com 150 falecimentos e Araraquara com
131 baixas. Pouco depois, foram atingidos na costa da Bahia o Itagiba e o Arará com 36 e 20
mortes respectivamente. Em 31.07.43 foi abatido o Bagé em águas próximas a Sergipe e o
Itapagé, em 26.09.1943, no litoral de Alagoas. Cf. Luiz Antônio Pinto Cruz. Aracaju: Memória
de uma cidade sitiada (1942-1945). São Cristóvão, UFS, 1999. Monografia apresentada no curso
de História da UFS, p.28-29.
24
Alguns empresários foram presos pelo fato de serem italianos, como uma forma de aplacar
a revolta da população. Ver Osmário Santos. Frederico: lenda viva na construção. Jornal da
Cidade, 23 e 24.11.2003.
25
Diário Oficial, 22.03.1944.

113
Ibarê Dantas

Enquanto isso, à medida que a II Guerra Mundial transcorria, o


quadro ideológico justificador do autoritarismo foi sendo corroído
de forma progressiva. A expansão do nazifascismo e as hesitações
de Vargas preocupavam os setores democráticos. Aos poucos foram
sendo criadas entidades que, ao tempo em que se opunham à Guerra,
iam também atingindo a ordem autoritária. O reaparecimento da Liga
de Defesa Nacional, propondo o “congraçamento de todas as forças
em defesa da nacionalidade”, a Sociedade dos Amigos da América, a
União dos Estudantes foram encontrando repercussão até no seio da
sociedade civil e do aparato público desde pelo menos 1942.
Em Sergipe, esses movimentos foram se refletindo em variadas
proporções. Os estudantes, que de muito vinham participando dos
eventos políticos, fundaram associações, tais como a Liga Estudantil
de Defesa Nacional, que tentava realizar inclusive comícios contra os
“inimigos do Brasil”. Enquanto isso, jornais como O Nordeste se mostra-
vam empenhados em combater “o quinta coluna”.26 Tais movimentos,
em meio à demonstração de inflamados patriotismos, apresentavam
sentido mobilizador e iam investindo contra as tendências autoritá-
rias e totalitárias. O manifesto dos intelectuais sergipanos de julho
de 1942, endossando a declaração de princípios de personalidades do
sul do país, contou com adesões até dentro da sociedade política. Os
bombardeios dos navios na costa entre Sergipe e Bahia projetaram
o repúdio aos nazifascistas com toda a força e, em contrapartida, a
defesa dos aliados, representantes dos ideais democráticos.
Internamente, Vargas foi postergando o trânsito do autoritarismo
para a democracia. Editou em 28.02.1945 o Ato Adicional número 9,
que tratava da redemocratização, e concedeu a anistia em 18.04.1945
para crimes políticos. Os exilados retornaram, mas, diante de um
governo que se mantinha há quinze anos com manobras imprevistas,
a desconfiança era grande. Com o retorno dos pracinhas da Força
Expedicionária Brasileira, em meio a elevado clima emocional, as

26
O Nordeste, julho e agosto de 1942. Este órgão era dirigido por Francisco de Araújo Macedo.

114
História de sergipe: república

contradições se acentuaram. Os soldados que lutaram pela demo-


cracia encontravam seu país ainda sob o jugo do Estado autoritário.
Quando, em fevereiro de 1945, caiu a censura no sul do país e foram
anunciadas eleições gerais, o processo de mobilização da sociedade
pela liberalização ganhou maior vigor. Intensificam-se as campanhas
pela Anistia e contra o Fascismo. Passeatas e manifestos se tornam
frequentes, exigindo o fim da ditadura. O movimento pela reorgani-
zação partidária acelerou-se, explicitando a nova configuração das
relações de forças.27
No realinhamento partidário de Sergipe, destacaram-se três gru-
pos políticos. O primeiro era liderado por Leandro Maynard Maciel,
agregando representantes de famílias expressivas como os Franco, os
Diniz, os Rolemberg, jovens advogados dos estratos médios, fazendei-
ros de quase todos os municípios. Juntos criaram a União Democrática
Nacional (UDN). O segundo foi formado pelo quadro situacionista
da interventoria, envolvendo os novos aderentes das famílias Leite,
Garcez e Sobral, o pessoal mais identificado com o governo vigente,
inclusive funcionários e outras autoridades municipais, entre as quais
prestigiosos coronéis. De conformidade com a orientação nacional,
eles fundaram a sucursal do Partido Social Democrático (PSD). O ter-
ceiro setor representativo da classe dominante se reunia sob a sigla do
Partido Republicano, sob a direção de Júlio César Leite, aglutinando os
remanescentes da ex-União Republicana de Sergipe, agremiação dos
usineiros que a partir de 1937 foram se dispersando. Não foi por acaso
que alguns desses produtores de açúcar aderiram à UDN, parte con-
tinuou apoiando o esquema situacionista, incorporando-se ao PSD,
enquanto uma terceira parcela ingressava no Partido Republicano.
Os estratos médios, por sua vez, dispersos em todos os partidos
controlados pelas forças dominantes, encontravam dificuldades em
formar uma agremiação com identidade própria. Em situação seme-
lhante se encontravam os trabalhadores urbanos. Embora Vargas

27
Ver José Ibarê Costa Dantas. Ob. cit., 1983.

115
Ibarê Dantas

tenha recomendado aos governos a criação do PSD, agrupando a


elite governamental, e reservado o PTB para os trabalhadores, estes
careciam de unidade. Parte ficou solidária a Maynard, apoiando o
PSD, outra parcela foi sendo arrastada pela pregação populista do
Partido Trabalhista Brasileiro, que seria dirigido por Francisco Araújo
Macedo, congregando inclusive os “queremistas” (grupo que queria a
Constituição com Vargas), enquanto um setor mais ativo se articulava
em torno do Partido Comunista Brasileiro. Além desses, ainda havia
os associados do Círculo Operário, que tendiam a prestar apoio aos
candidatos mais conservadores. O Estado Novo, que consolidou a
legislação social, contribuiu para o fracionamento dos trabalhadores
urbanos.
Nesse momento de reorganização partidária, em seu trabalho
de proselitismo, a máquina governista contava com uma emissora
de rádio (Aperipê), dois jornais (Diário Oficial e Diário de Sergipe), os
aparelhos administrativos, incluindo os órgãos de arrecadação, e o
aparato coercitivo. Mesmo um governante considerado por muitos
de seus adeptos como bastante tolerante, não deixava de provocar
inúmeras denúncias contra seus atos repressivos. Em pleno processo
de liberalização, em março de 1945, cerca de quinze dias após célebre
entrevista de José Américo de Almeida ao Correio da Manhã, a inter-
ventoria ainda teimava em manter a censura prévia, motivando o
fechamento dos dois jornais que lhe faziam oposição. Ademais, a
prisão do jornalista Paulo Costa, proprietário do Sergipe Jornal, em fins
de agosto de 1945, e denúncias de violências no interior, no ensejo dos
comícios, foram ajudando a aumentar a polarização interna e a cor-
rosão do regime autoritário.28 Na área estudantil, o movimento pela
democratização espraiava-se, encontrando crescente entusiasmo dos
jovens. No Atheneu, o Grêmio Estudantil Clodomir Silva publicava seu
jornal Voz do Estudante cada vez mais animado com o novo amanhã
que estava para nascer. Nesse ambiente, estendiam sua participação

28
Ver José Ibarê Costa Dantas. Ob. cit., 1983.

116
História de sergipe: república

política ingressando no Partido Comunista, onde havia núcleo político


bastante ativo. Mas quando o PCB dividiu-se em duas correntes, uma
alinhada com a oposição ao governo ditatorial e outra que o apoiava,
provocou muita discussão, entrou em crise e arrefeceu o movimento.29
Na interventoria, Maynard, sempre solidário a Vargas, era aponta-
do como o candidato do PSD a governador, no pleito marcado para 2
de dezembro. O presidente, que administrava o processo de transição,
manobrava para eleger seus aliados e alimentava o movimento “quere-
mista”, que defendia a sua permanência. Mas os fatos se precipitaram.
Interpretando os reclamos do movimento oposicionista, o general
Cordeiro de Farias, em nome dos seus pares, foi a Palácio, no dia 29
de outubro de 1945, levar-lhe um ultimato para que renunciasse. O
Exército, que o entronizou, o depôs.
A queda do presidente surpreendeu Maynard em trânsito para
Sergipe. Foi preso em Salvador, como medida acautelatória, já que o
interventor permanecia fiel ao ditador até o fim. Terminava o Estado
Novo e, com ele, o primeiro governo Vargas, que perdurou por quinze
anos. Abria-se uma nova página da política nacional e estadual.

29
Cf. Fernando Barreto Nunes. Entrevista ao autor, em 31.05.1982.

117
Ibarê Dantas

2.3 O Processo Econômico-social

A crise de 1929 inviabilizou o modelo de financiamento da eco-


nomia vigente na Primeira República, firmado na exportação de
produtos primários. Diante desse desafio, o governo Vargas procurou
redefinir a forma de acumulação através da criação da infraestrutura
básica e de organizações estatais, estimulando as empresas privadas
e atraindo capital internacional. Num momento de retração dos
fluxos comerciais com o exterior, essa reorientação do crescimento
para dentro favoreceu São Paulo, que estava dotado de melhores
condições financeiras e logísticas. A partir de 1933 foi tomando corpo
um processo de industrialização chamada de “restringida”, que teria
bastantes consequências para o quadro econômico do país.30
Este modelo de acumulação de capital, o nacional-desenvolvi-
mentismo, teve bastante sucesso, mas foi sendo reformulado ao longo
do tempo. Enquanto isso, o Nordeste persistia com seus complexos
açucareiros e/ou algodoeiros e/ou pecuários como principais fontes
de riqueza e ocupação, inclusive na economia sergipana. Se antes par-
ticipava do quadro nacional dentro de uma relação de complementari-
dade, a partir dos anos trinta passou a sofrer crescente subordinação.
Em Sergipe, o açúcar continuou como principal produto de ex-
portação, apesar de persistir a redução dos engenhos, que passaram
de 201 (1934) para 53 unidades (1940).31 A novidade desse período foi o
começo da diminuição das usinas de 84 (1932) para 62 (1944), inclusive
de algumas tradicionais como a São Félix, dos Vieira; a Topo, dos Ro-
lemberg; e a Itaperoá, dos Bastos; que encerravam suas atividades na
primeira metade dos anos quarenta. Da safra de 1932 à de 1944, esses
centros produziram uma média anual de 673.858 sacos. Na década
de trinta, em face das decorrências da crise de 1929 e, logo depois, da
seca de 1932, houve ano em que o Estado registrou apenas 298.129

30
Ver Liana Maria Aureliano. No Limiar da Industrialização 1919-37. São Paulo: Brasiliense,
1981.
31
Luiz Rolemberg. In: Anuário açucareiro, transcrito pelo O Estado de Sergipe em 1934. p. 141-2
e Censo de 1940, Série Regional, Parte XI, IBGE, 1952, p. 318-19.

118
História de sergipe: república

sacos, mas em compensação houve moagem como a de 1943-1944 que


chegou a 978.334 sacos.32
Naquela altura, os dados não indicavam claramente quais as
opções que os senhores de engenho iam encontrando para auferir
rendimentos de suas terras. Sabe-se que, no conjunto, os produtos lo-
cais passaram a sofrer efeitos da concorrência dos centros produtivos
do Sudeste, mais modernos, de maior proximidade com os mercados
consumidores e mais competitivos. Como forma de atenuar a situa-
ção, o governo federal criou o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA)
em junho de 1933, que foi considerado por um usineiro como “uma
das grandes realizações do governo Getúlio Vargas”.33 Inegavelmente,
o sistema de cotas proporcionou maior segurança e estímulo para
proprietários e, em extensão, para empregados. Mas, para alguns
estudiosos, tal medida apenas retardava o declínio.34 De qualquer
forma, os incentivos fiscais tornavam-se regulares em Sergipe.
Ainda no setor rural, em segundo plano, continuaram com alguma
importância a produção de algodão e arroz e a criação de gado. O al-
godão, além de se constituir em matéria-prima para as fábricas têxteis
existentes no Estado, vinha sendo exportado tanto em forma de pluma
como através de subprodutos, como o farelo de caroço e o óleo. Como
produto de exportação e de consumo interno, foi duramente afetado
pela seca de 1932, mas já em 1934 retornava em patamar que permitia
alto nível de exportação, superando os encontrados na segunda me-
tade da década de 1920. Entretanto, a partir de 1934 passou a ser cada
vez menos plantado, conforme se pode ver pelo decréscimo da área
ocupada, que oscilou de 30.937 hectares (1931) para 12.393 ha (1945).
De queda em queda, chegou em 1945 com 1/3 do seu desempenho de
1933, considerado um ano normal.35

32
Manoel Correia de Andrade. A Agro Indústria Canavieira e a organização do Espaço -
Contribuição à História das Usinas de Açúcar de Sergipe. Natal: Cooperativa Cultura
Universitária do Rio Grande do Norte Ltda, 1990, p. 28-30.
33
Orlando Vieira Dantas. O Problema Açucareiro de Sergipe. Aracaju: Livraria Regina Ltda., 1944,
p. 28.
34
Francisco de Oliveira. Elegia para uma re(li)gião. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977, p. 61.
35
Sergipe Econômico e Financeiro. Aracaju: IBGE, 1953, p. 153.

119
Ibarê Dantas

Entre os demais produtos agrícolas, o arroz também apresen-


tava contribuição significativa na receita do Estado. Era cultivado
sobretudo às margens do rio São Francisco, provavelmente, grande
proporção em sistema de parceria. Além desses produtos agrícolas,
outros podem ser citados, tais como mandioca, milho e coco. Embora
não se destinassem ao mercado externo, desempenhavam destacado
papel na economia interna do Estado. A pecuária parecia expandir-se
como alternativa para os senhores que desativavam seus engenhos,
embora sobre esse momento, os dados ainda sejam um tanto contra-
ditórios. No sertão e no agreste, durante os anos trinta, as atividades
produtivas foram bastante afetadas pelas incursões de Lampião com
o seu bando, levando muitos proprietários a abandonarem suas terras
e migrarem para zonas mais seguras.
Ao passarmos ao mundo urbano, verificamos que do ponto de vista
populacional, o índice de urbanização permanecia reconhecidamente
baixo. Em 1940, o Censo registraria 69% da população estabelecida
no campo. O centro mais populoso do Estado continuava sendo de
longe a capital, que, de 1920 para 1940, passara de 37.440 para 59.031
habitantes, gerando novas exigências. Era um crescimento signifi-
cativo, sobretudo quando nos lembramos de seu porte no início da
República. No Estado, de 1920 para 1940, sua população crescera de
477.064 para 542.326 habitantes.36
O setor secundário prosseguiu em seu perfil do fim dos anos vinte. O
número de estabelecimentos industriais, excluídos usinas e engenhos,
continuou subindo, assim como o número de trabalhadores, que teria
duplicado. As indústrias mais significativas pela quantidade de pessoal
empregado continuavam sendo as têxteis. Dispersas através de sete mu-
nicípios, no período 1931-45 sua produção foi se ampliando e, em 1945,
Sergipe era o quinto Estado do país em número de empresas têxteis e
produção, perdendo, na região Nordeste, apenas para Pernambuco.37

36
Censo de 1940.
37
Proposta Orçamentária para 1948. Aracaju: Secretaria da Fazenda, Produção e Obras Públicas,
1947. p. 48. Ver quadro in José Ibarê Costa Dantas. Ob. cit., 1983.

120
História de sergipe: república

Não obstante o recuo do plantio de algodão no Estado, a produção de


tecidos representava a principal atividade econômica do setor urbano.
No comércio houve alguns avanços. Levantamento efetuado por
volta de 1932-1933 dava conta da existência de 987 estabelecimentos,
mas não há notícias da quantidade de empregados.38 O Censo de 1940
registrou 2.023 estabelecimentos comerciais, contando com pessoal
ocupado na ordem de 3.576 indivíduos. Apesar dessa larga diferen-
ciação, torna-se difícil estabelecer critérios de distinção quanto ao
tamanho dos estabelecimentos. Mas o crescimento do giro comercial
passou de 1,4 milhões (1936) para 10 milhões (1945),39 indicando grande
progresso.
Quanto ao movimento do porto, apesar da crise de escoamento
dos anos quarenta, o volume de negócios representado pelo comér-
cio interestadual, especialmente com as praças do Rio de Janeiro e
Salvador, para onde se destinava a grande parte das exportações do
Estado, continuou significativo, como mostra o quadro abaixo.

Quadro V. Fluxo de Embarcações no Porto de Aracaju (Média Anual –1927-1945)


Períodos Embarcações a vapor Embarcações a vela
1927-29 (1)
132 201
1930-35 (2) 155 224
1936-39 (3) 230 249
1940-45 (4) 125 165
Fontes: (1) Manoel Corrêa Dantas. Mensagem à Assembleia Legislativa em 07.09.28. Aracaju: Imprensa Oficial, 1928.
p. 11; id., ibid, 1929, p. 97; id., ibid., 1930, p. 11. (2), (3) e (4) Sergipe Econômico e Financeiro. Aracaju: IBGE, 1953. p. 193.

Em relação ao período anterior a 1930, registrou-se aumento até


1939. Mas, com a eclosão da Guerra, verificou-se violento declínio que
jamais seria recuperado, em face das transformações no sistema de
transportes no período pós-1945. Além do escoamento das mercado-
rias pela Barra do Rio Sergipe, correspondente ao porto de Aracaju,

38
Armando Barreto (org). Cadastro Industrial e Comercial e Informativo de Sergipe. Aracaju: Artes
Gráficas da Escola de Aprendizes Artífices de Sergipe, 1933, p. 456.
39
Proposta Orçamentária para 1948. Secretaria da Fazenda, Produção e Obras Públicas, Aracaju:
1947, v. III, p. 53 (dat).

121
Ibarê Dantas

havia também movimento através das barras dos rios Piauí e São Fran-
cisco, em menores proporções, sobre o qual não dispomos de dados.
Outro aspecto que ilustrava o crescimento comercial era o movi-
mento bancário. Enquanto o volume de depósitos ascendia de 22.170
(1931) para 199.522 (1945), os empréstimos passavam de 18.000 (1931)
para 283.551 (1945).40 Esse aumento pode ainda ser observado pelas
alterações no número de estabelecimentos, que teria evoluído de três
(Mercantil Sergipense, Banco de Crédito Popular e Banco do Brasil)
em 1930 para quatro empresas e sete agências em 1940,41 indicando a
diversificação dos investimentos. Portanto, embora o perfil da econo-
mia de exportação se mantivesse de uma década a outra, houve perda
relativa do setor exportador e variação dos investimentos no setor
comercial. No conjunto o quadro sofreu algumas alterações. O açúcar
continuou perdendo posição, o plantio de algodão caiu, a produção
de tecidos cresceu, assim como a pecuária, enquanto paulatinamente
a economia diversificava-se.
No Nordeste, incluindo Sergipe, o problema mais grave era, por-
tanto, a permanência do perfil agrário-exportador. Os municípios
aproximavam-se pelo desenvolvimento dos transportes, mas a eco-
nomia estadual tornava-se ainda mais distanciada e dependente do
Sudeste, que progredia com outro padrão tecnológico.
Durante essa fase, alguns empresários de maior projeção nos anos
vinte continuavam pontificando, como Antônio Franco e Gonçalo
Rolemberg do Prado, enquanto outros ascendiam, entre os quais os
quatro irmãos Franco (José, Walter, Augusto e Flávio). Estes criaram
em 1939 o Banco Comércio e Indústria de Sergipe, fundaram em 1941,
sob a proteção da interventoria, a Cia Industrial S. Gonçalo S/A, na
cidade S. Cristóvão, e ainda no início dos anos quarenta, Walter do

40
Até 1935 em contos de réis, de 1939 em diante em mil cruzeiros. Cf. Quadro Estatístico de
Sergipe. Aracaju, 1938, p. 30 e Sergipe Econômico e Financeiro. Aracaju: IBGE, 1953, p. 195-6.
41
Armando Barreto (org). Ob. cit. p. 181; Censo de 1940 e Proposta Orçamentária para 1948, p. 51.
Ernani Freire criou a Casa Bancária Dantas Freire (1933), vendeu-a em 1944 e fundou a Freire
Silveira. Cf. Manoel Cabral Machado. Brava Gente Sergipana e Outros Bravos. Aracaju: UFS/
BICEN, 1998, p.125-127.

122
História de sergipe: república

Prado Franco conseguiu a direção do Sindicato da Indústria do Açúcar


de Sergipe, o órgão de classe mais poderoso do Estado.
Na esfera social, as políticas do governo central tiveram enormes
repercussões internas. Num primeiro momento (1930-35), as relações
dos trabalhadores com a interventoria, não obstante alguns proble-
mas com os intermediários, foi proveitosa. Marginalizados do pro-
cesso político durante a Primeira República, com a Revolução de 1930
passaram a organizar-se em sindicatos respaldados pela interventoria,
que além de prestigiar suas cerimônias, estimulava a sindicalização
e pressionava o patronato para que a legislação fosse cumprida. Com
esse estímulo, o movimento tomou novo impulso, inclusive com a
realização de greves. De conformidade com a legislação em vigor, foi
indicado um delegado do Trabalho que estimulava e encaminhava o
processo de criação das associações. É verdade que surgiram queixas
sobre o comportamento ambíguo dessa autoridade, mas, apesar disso,
os trabalhadores urbanos, em 1934, já dispunham de 21 sindicatos,
uma federação, além do Centro Operário. Entre todos eles, o maior
contingente era o dos tecelões.
A partir de 1932, a imprensa ligada a esses grupos desenvolveu-se,
chegando, em 1934, a editar simultaneamente três folhas. É dentro des-
se movimento geral de organização da classe e de seu fortalecimento
que os trabalhadores urbanos decidiram ampliar sua participação na
política estadual, através da fundação de um partido político próprio.
A ideia foi concretizada na criação da Aliança Proletária de Sergipe
em março de 1934. Em abril do mesmo ano, o Diário Oficial publicava
seu programa com tendência moderadamente socializante. Aceitan-
do o sistema representativo, os trabalhadores pleiteavam a proteção
à infância desvalida e aos inválidos, a ampliação da educação aos
operários, a extinção lenta e progressiva dos latifúndios, a tributação
ao capital imobilizado, a fiscalização das leis sociais, e tudo isso sem
dispensar a ampla liberdade da imprensa e da palavra em público.42

42
Diário Oficial do Estado de Sergipe, 06.04.1934.

123
Ibarê Dantas

Não obstante esses traços revelarem um ideário mais próximo do


socialismo democrático, nem por isso o jornal A Luta, órgão especí-
fico do partido, deixava de ser influenciado pela corrente “leninista”
divulgada pelos adeptos do Partido Comunista do Brasil. Em Sergipe,
algumas das lideranças que militavam no movimento operário dessa
época já se encontravam vinculadas ao PCB43.
Enquanto isso, o poder central editava novas leis: instituiu a justiça
trabalhista, regulamentou as relações de trabalho, fixou a jornada di-
ária em oito horas. As mulheres e os menores passaram a ter direitos
específicos. Foi criada a carteira de trabalho (1932), elevando o estatuto
social do trabalhador. As Caixas, que remuneravam algumas poucas
categorias de inativos, cederam lugar aos Institutos de Aposentadoria
e Pensão, estipulando tempo limitado de trabalho. A Constituição de
1934 assegurou a regulação do trabalho pelo Estado.
Com a ascensão do novo governante em 1935, as relações tor-
naram-se difíceis. Como Eronides Carvalho estava mais afinado
com os integralistas e grande parte dos trabalhadores inclinava-se
para o socialismo, estes passaram a ser objeto de maior atenção. A
Igreja Católica tentou atraí-los, criando o Círculo Operário Católico
de Sergipe, propondo a harmonização entre o capital e o trabalho,
apresentando-se como alternativa de ação. Mas o governador procu-
rou dissuadi-los com a repressão. Diante da eclosão do movimento
comunista em Natal, Recife e Rio de Janeiro (11.1935), cerca de duas
dezenas de militantes das classes subalternas foram presos e maltra-
tados. Ao longo dos cinco anos subsequentes, o governador procurou
desarticular o movimento dos trabalhadores mediante força policial.
A partir do golpe de 1937 e da centralização política que se seguiu,
tentou cooptá-los como representante da política varguista. O fato
é que o movimento foi-se enfraquecendo e perdendo autonomia.
Desmobilizados, os trabalhadores foram internalizando o discurso
paternalista de Vargas, abdicando dos valores democráticos e se

43
Cf. José Nunes da Silva, entrevista ao autor, em 25.01.1978.

124
História de sergipe: república

conformando com a nova legislação no ambiente autoritário. Em


Sergipe, as disputas permaneciam personalizadas nas figuras dos
dois militares, de forma que a saída de Eronides Carvalho em 1941
foi bastante comemorada pelas classes subalternas que continuavam
reverenciando Maynard. Quando este retornou (1942), empenhou-se
em manifestar seu apreço com a causa dos trabalhadores urbanos,
mas, como representante de um sistema autoritário declinante, pouco
realizou. As grandes inovações vinham do governo central. Em 1940,
instituiu-se o salário mínimo e, em 1943, reunindo legislação elabora-
da ao longo do tempo, saiu a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
O Estado passava a intermediar as relações entre capital e trabalho,
ao tempo em que criava instrumentos, como o imposto sindical, que
facilitariam a sobrevivência das associações, mas também alimenta-
riam vícios da burocracia.
A CLT coroava a grande transformação social desse tempo. Fi-
cavam de fora os trabalhadores rurais e, no mundo urbano, os au-
tônomos e os empregados domésticos. Sobre os rurais, ainda houve
estudos, discussões, mas não tiveram prosseguimento efetivo. Como
afirma um estudioso da cidadania no Brasil, o período 1930 a 1945 foi
a era dos direitos sociais.44
No campo das comunicações, as mudanças maiores ocorreram na
radiofonia. A instalação da Rádio Aperipê (1939) atingiu o cotidiano
das pessoas. Se antes alguns já sintonizavam a Rádio Nacional, a
programação tomou sentido mais ligado à vida do Estado. Embora o
número de receptores fosse relativamente pequeno, um mesmo apa-
relho era escutado por grande número de pessoas, homogeneizando
informações e servindo desde cedo à manipulação dos governados.
Os cinemas continuaram disseminando-se, chegando em 1940
a 13 estabelecimentos. A prática do esporte, sobretudo do futebol,
generalizou-se mais do que antes. Cotinguiba, Vasco, Palestra, Ser-
gipe, Riachuelo e Atlético eram alguns dos clubes que disputavam a

44
José Murilo de Carvalho. Cidadania no Brasil: longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2001, p.123.

125
Ibarê Dantas

simpatia dos torcedores.45 Nos bares, tornaram-se comuns os bilhares,


onde sobretudo os moços exercitavam suas habilidades.
O movimento espacial das pessoas aumentou, aproximando
formas de comportamento e modos de viver. Com a construção de
novas estradas de rodagem em piçarra, quase todas as cidades do Es-
tado ficaram ligadas entre si, através dos automóveis, das marinetes
e dos caminhões. Nasciam as linhas de transporte coletivo, ligando
os municípios do interior à cidade de Aracaju, que foi se impondo
como grande centro comercial, administrativo, cultural e tornando-se
mais acessível para os moradores dos lugares mais distantes. Nume-
rosos domicílios passaram a contar com instalação elétrica e água
encanada. Somente no meio urbano, o Censo de 1940 registrava em
Sergipe 5.828 residências com instalação elétrica e 4.655 com água
encanada.46 Com essas inovações, a vida cotidiana dos sergipanos
incorporava novos hábitos.

45
Sobre os costumes desse tempo em Aracaju, ver Dilton Maynard. Em tempo de guerra:
Aspectos do cotidiano em Sergipe durante a II Guerra mundial (1939/45), Caderno do
Estudante, São Cristóvão, UFS/Cimpe, v. 2, 1999.
46
O Censo de 1940 registrou a existência em Sergipe de 1.398 domicílios com rádios, 308 com
telefones e 192 com automóveis.

126
História de sergipe: república

2.4 Manifestações Culturais

O período 1931-45 foi marcado pela presença exorbitante do Estado


sobre a sociedade. Essa situação afetou de forma variada as mani-
festações culturais. Num primeiro momento, que podemos estender
até 1937, os governos desenvolveram algumas ações culturais, mas a
política sistemática revelou-se a partir do golpe de novembro daquele
ano, quando se instaurou o Estado Novo.
Na área do ensino, a tendência renovadora, que vinha ocorrendo
antes de 1930, prosperou. Intelectuais de São Paulo e do Rio de Janeiro,
defensores da Escola Nova, desenvolveram movimento pregando a
nacionalização, a laicização e a universalização da educação no país,
empenhados em operar grandes reformulações no sistema de ensino
nacional. A Igreja Católica reagiu com pronunciamentos, artigos e
gestões de figuras mais eminentes do clero e do laicato, defendendo
o ensino religioso sem a interferência do Estado, mas o movimento
prosseguiu reformulando a organização educacional. Alguns pro-
fessores de Sergipe, que desde o governo de Rodrigues Dória vinham
tentando reformar a educação pública, incorporaram-se à iniciativa.
A interventoria de Maynard enviou três mestres47 ao Sudeste que
participaram da discussão no Rio de Janeiro e na capital paulista,
estudaram os novos métodos pedagógicos, visitaram instituições
culturais e, de volta, tentaram difundir as inovações nas escolas,
reformulando a estrutura do ensino e a sua pedagogia. Dentro dessa
nova filosofia, o governo promoveu a construção do Jardim de In-
fância Augusto Maynard (1932), que proporcionaria a oportunidade
de adotar “o modelo de educação infantil mais moderno da época”.48
As despesas da União com o ensino e a cultura em Sergipe mais que

47
Sobre a discussão da época, ver Helvécio Andrade. A Escola e a Nacionalidade. Aracaju: Typ.
D’O Lutador, 1931. Os professores que estiveram no Rio de Janeiro e São Paulo foram José
Augusto de Rocha Lima, Franco Freire e Penélope Magalhães. Cf. Jorge Carvalho. Cinform,
01.07.2002.
48
Jorge Carvalho do Nascimento, citando Ester Vilas-Boas, in Visões da Modernidade. Pedagogos
sergipanos em São Paulo. Informe UFS, 04.09.2001.

127
Ibarê Dantas

duplicaram de 1932 para 1935, e o número de escolas primárias passou


de 432 (1933) para 635 (1943).49
O Estado passava a assumir maiores responsabilidades sobre a
organização e a gestão do sistema educacional brasileiro. Essa ten-
dência foi consagrada pela Constituição de 1934 que atribuiu à “União
a competência privativa de traçar as diretrizes da educação nacional
e de fixar o plano nacional de educação. [...] Aos Estados competiriam
organizar e manter os seus sistemas educacionais, respeitadas as
diretrizes da União”.50
O ensino superior ganhou dimensão com a instalação da Uni-
versidade do Brasil em julho de 1937. Com o golpe, a campanha pela
renovação do ensino declinou, mas a constituição outorgada valorizou
mais o ensino técnico e aprofundou a orientação centralizadora, pro-
porcionando maiores obrigações do Estado na execução da política
educacional. Em 1942 saiu a Lei Orgânica do Ensino Secundário,
como parte da reforma Capanema, cujas diretrizes perdurariam por
décadas.51
Apesar desses esforços, a universalização não progrediu como se-
ria de esperar, pois, em 1940, o Censo revelou que o índice de pessoas
que não sabiam ler e escrever era de 72,6%, um tanto menor do que
em 1920, mas ainda escandalosamente elevado. As ações do Estado
autoritário na área educacional careceram de maior eficiência.
Enquanto isso, a orientação modernizadora ampliava sua abran-
gência. Quando, em 1934, Gustavo Capanema assumiu o Ministério
da Educação e Saúde Pública, cercou-se de intelectuais talentosos,
criativos52 e passou a tomar providências audaciosas, operando uma

49
Cf. Estatísticas do Século XX. Rio de Janeiro, IBGE, 2003, p. 294 e José Antonio Nunes Mendonça.
A Educação em Sergipe. Aracaju: Livraria Regina, 1958, p. 172.
50
Fernando de Azevedo. A Cultura Brasileira. São Paulo: Melhoramentos, 1964, p. 683.
51
A atenção ao ensino técnico materializou-se na criação do SENAI (1942) e na edição da Lei
Orgânica do Ensino Industrial (1942) e na Lei Orgânica do Ensino Comercial em 1943. Ver
Murilo Badaró. Gustavo Capanema. A Revolução na Cultura. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2000.
52
Entre os intelectuais que assessoravam o ministro Gustavo Capanema, são citados Rodrigo
Melo Franco, Mário de Andrade e Carlos Drummond de Andrade. Alceu Amoroso Lima
também era muito ouvido. Ver Murilo Badaró. Ob. cit., 2000.

128
História de sergipe: república

revolução cultural voltada para a afirmação da nacionalidade. Desde


1934, já atuava o Departamento de Propaganda e Difusão Cultural,
cuja denominação já expressava sua finalidade política intervencio-
nista. Pouco depois (1937), nasceram o Serviço Nacional do Teatro,
o Serviço de Radiodifusão Educativo, o Instituto Nacional do Livro
e o Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN),
um marco nas decisões administrativas, na medida em que o Estado
nacional assumia a tarefa de responsabilizar-se pelo destino dos mo-
numentos de valor histórico e artístico. Importantes museus foram
instalados e a Biblioteca Nacional foi remodelada.53 A valorização
da história do povo brasileiro era considerada fundamental para o
conhecimento da realidade nacional. Neste contexto, “o patrimônio
histórico e artístico é concebido como um documento de identidade
da nação brasileira”.54 Com a instauração do Estado Novo, a ideologia
nacionalista de cunho autoritário foi reforçada e o projeto interven-
cionista de formação das mentalidades adquiriu maior amplitude. A
ditadura de Vargas produziu o Departamento de Imprensa e Propa-
ganda (DIP), que tinha como objetivo difundir a mensagem do novo
regime e abafar os pensamentos contrários. Essa agência ideológica,
criada em 1939, foi dirigida, até 1942, pelo sergipano Lourival Fontes
(1898-1967), que acumulava também a direção do Conselho Nacional
da Imprensa, órgão destinado a fiscalizar as publicações em todo ter-
ritório nacional.55 Por esse tempo, a revista Cultura Política do Rio de
Janeiro passou a publicar artigos de mérito de intelectuais de várias
conotações ideológicas, difundindo para o país as novas concepções
da cultura brasileira.
Essas ações empreendidas pelo governo Vargas provocaram re-
percussões indeléveis nas manifestações culturais dos Estados. No

53
Foram instalados o Museu da Inconfidência, o Imperial de Petrópolis e o de Belas Artes no
Rio de Janeiro. Outra obra inovadora foi o prédio do Ministério da Educação. Ver Murilo
Badaró. Ob. cit., 2000.
54
José Reginaldo Santos Gonçalves. A Retórica da Perda. Rio de Janeiro: UFRJ/MINC-IPHAN,
1996, p. 45.
55
Cf. Ângela de Castro Gomes. História e historiadores. Rio de Janeiro: FGV, 1996, p. 126.

129
Ibarê Dantas

que se refere à imprensa, pode-se dizer que Sergipe vivenciou duas


fases diferenciadas. Vimos que, até 1934, não obstante viver-se num
período autoritário, não encontramos casos evidentes de atentados
contra jornais, censuras sistemáticas ou fechamentos de algum órgão
por iniciativa da interventoria. A sociedade estava bem demarcada
por divisões político-ideológicas, mas havia uma convivência mais
ou menos respeitosa entre os grupos sociais e políticos. Cada um foi
criando e/ou mantendo seu jornal, defendendo seu projeto, desde
os governistas até seus adversários. Entre os setores mais atuantes
estavam os militantes da Igreja Católica, pregando seus princípios
dentro de uma visão conservadora. Além da proliferação de pequenas
folhas catequéticas,56 o semanário A Cruzada, que esteve alguns anos
desativado, foi reaberto em 1935 como parte do esforço candente de
não perder espaço em face das transformações em marcha. Não foi por
acaso que o movimento integralista desenvolveu-se recrutando boa
parte dos seus quadros entre os católicos. Do outro lado, vinham os
jornais ligados aos trabalhadores urbanos, quase todos identificados
com o ideário socialista e empenhados em lutar pelas mudanças. O
entusiasmo desse segmento vinha inclusive dos estudantes do Athe-
neu Sergipense. Com a organização da Aliança Nacional Libertadora,
que se ligara ao Partido Comunista do Brasil, vários jovens passaram
a emprestar sua vitalidade a esse movimento.
A partir de 1935, o acirramento das disputas entre integralistas X
socialistas aumentou e o debate foi-se tornando tumultuado. Com a
eclosão do levante comunista em Natal, no Recife e no Rio de Janeiro,
o novo interventor, que já vinha se manifestando conivente com as
transgressões dos integralistas, intensificou suas coações sobre a
imprensa dos esquerdistas ligados aos trabalhadores urbanos. Essas
disputas ideológicas, pouco civilizadas, não se manifestaram profí-
cuas para o movimento cultural.

56
Entre os jornais catequéticos são registrados: Boletim Paroquial (1931), A Ordem (1931), Monitor
Cristão (1931), A Boa Nova (1931-1933), Lírio Mariano (1933), Boletim Vitalista (1933-1946). Ver
Jackson da Silva Lima. Os Estudos Filosóficos em Sergipe. Aracaju: Sociedade Editorial de
Sergipe, 1995, p. 131-133.

130
História de sergipe: república

No Estado Novo, as publicações passaram por grande controle


político com a fundação de uma sucursal do já referido DIP, no caso,
o Departamento de Imprensa e Propaganda Estadual (DIPE), que
patrocinava as atividades locais e as vigiava. A propaganda política
ganhou dimensão jamais vista. Diante das restrições, o número de
jornais diminuiu e a imprensa estadual ficou restrita a poucas folhas,
a maioria oficial ou oficiosa. O Correio de Aracaju e o Sergipe Jornal
foram os principais órgãos a resistir ao conjunto das coações próprias
dos regimes autoritários.
Essa política de controle político influenciou também o mer-
cado de revistas. Inicialmente, a publicação desses periódicos, em
relação aos últimos anos da década de vinte, sofreu certo refluxo.
O Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, que vinha editando
com regularidade seu periódico, não conseguiu lançar nenhum
número.57 As novidades do momento foram o surgimento do pe-
riódico da Academia Sergipana de Letras e a revista Renovação. A
dos acadêmicos passou a publicar trabalhos literários, procurando
distanciar-se das querelas político-ideológicas, embora sem artigos
de grande destaque. Quanto à Renovação, apareceu em 01.01.1931 e
esteve a circular quinzenalmente sob a direção da advogada com-
bativa Maria Rita Soares Andrade, como expressão das importantes
inovações daqueles anos. Defendendo a emancipação social da
mulher, aglutinando algumas moças intelectualizadas, explicando
o significado da campanha feminista, divulgando matérias de nível
no campo do ensino, pregando reformas educacionais, em meio a
poesias e artigos diversos, contribuiu para elevar o debate no Estado
sobretudo até 1932. A ocorrência da revolta constitucionalista em São
Paulo abalou sua trajetória. Os colaboradores diminuíram, enquanto a
direção revelava-se preocupada. Renovação mudou de formato, perdeu
a regularidade, reduziu a qualidade dos textos e, embora persistisse,
até 1934, adepta do governo Maynard, que provavelmente a financia-

57
Ver Itamar Freitas. A Casa de Sergipe. São Cristóvão/SE: Ed.UFS, F. Oviêdo Teixeira, 2003.

131
Ibarê Dantas

va, jamais alcançou a densidade dos 28 primeiros números. Depois


surgiu Renascença, sob a direção de Álvaro Passos, que circulou de
1934 a 1936, mas sem orientação definida.
Com a emergência do Estado Novo, o referido Departamento
Estadual de Imprensa e Propaganda possivelmente ajudou no reapa-
recimento da Revista do Instituto Histórico, que editou quatro números
entre 1939 a 1944. Nessa conjuntura, a Prefeitura da capital criou seu
periódico próprio, Revista de Aracaju, em 1943, trazendo ao lado de
matérias de prestação de contas de governo, ensaios de bom nível
analítico. O segundo número saiu no ano seguinte.
Contudo, no setor de imprensa, a grande inovação desse período
foi o aparecimento do rádio. Integrado nesse movimento nacional,
que criou o Serviço de Radiodifusão Educativo, o governo Eronides
de Carvalho inaugurou a Rádio Aperipê (1939). Dentro da orientação
oficial, o uso de imagens, de símbolos e a exploração do civismo no
imaginário social foram instrumentalizados para ampliar a legitimi-
dade do Estado autoritário.
Boletins oficiais foram expedidos, sobretudo a partir de fevereiro
de 1939, com a criação do Departamento de Propaganda e Divulgação
do Estado de Sergipe, que, em junho de 1941, era transformado em
Departamento de Imprensa e Propaganda, de conformidade com as
ordens nacionais. Ao lado das pregações doutrinárias, desenvolvia-se o
trabalho de cooptação no sentido de envolver elementos da sociedade
civil nos movimentos promovidos pelo Estado: passeatas cívicas com
trabalhadores em homenagem a Vargas e ao interventor, palestras,
geralmente em torno de temas ligados a figuras das Forças Armadas,
comemorações de datas históricas, considerando-as como atos de
civismo. Em fins de março e início de abril de 1939, foi realizada a
chamada “Semana Eronides de Carvalho”, quando cerca de quinze
oradores, representantes de vários setores da sociedade, apresentaram
seus discursos ao microfone da PYD-2, enaltecendo os governantes.
Houve inaugurações de obras e o encerramento ocorreu no Palácio
com o banquete para os simpatizantes. Enquanto isso, no empenho
de unificação cultural, sobretudo no Nordeste, inclusive em Sergipe, a

132
História de sergipe: república

política governamental assumia forma repressiva contra os terreiros


de cultos afro-brasileiros.58
Quando Maynard assumiu pela segunda vez (1942), este inter-
ventor prosseguiu valorizando os trabalhos da Aperipê com uso
político. As tendências apologéticas continuaram, sob os auspícios
do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda, incluindo
“palestras educativas”, irradiadas pela difusora, exaltando o patrio-
tismo, especialmente nas datas consideradas cívicas.59
A orientação nacional da política patrimonial também chegou
até Sergipe. O interventor Eronides Carvalho passou a desenvolver
iniciativas voltadas para a valorização do patrimônio histórico. Um
pequeno grupo de intelectuais cuidou da questão, elaborou relatório
sobre a situação dos prédios antigos, resultando no decreto-lei que ele-
vava a cidade de São Cristóvão à categoria de monumento histórico.60
A essa altura, algumas edificações na capital iam marcando sua
feição. A aprovação do novo Código de Posturas (1938), dividindo o mu-
nicípio em zonas, era uma indicação de que o poder público ampliava
seu raio de atuação, num momento de mudanças, entre as quais se
podia notar o estilo das construções. Conforme escreveu pesquisador do
assunto, “o Art Déco, aliado à utilização do concreto armado, permitiu
uma consequente transformação plástica da cidade” [...] favorecendo
“a adaptação da arquitetura aracajuana às novas formas.” A edificação
do Instituto Histórico Geográfico de Sergipe, da Biblioteca Pública do
Estado, do Corpo de Bombeiros, do Palácio Serigy, da Associação Atlé-
tica de Sergipe e de algumas casas espalhadas em diversas ruas, são
exemplos expressivos dessas inovações arquitetônicas.61

58
Ver Beatriz Góis Dantas. Vovó Nagô e Papai Branco: Usos e abusos da África no Brasil. Rio de
Janeiro: Graal, 1988 e “De Feiticeiros a Comunistas - Acusações sobre o Candomblé”. Comunicação
apresentada na XXXIV Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, SBPC,
UNICAMP, 1982.
59
Ver Dilton Cândido Santos Maynard. Microfones e Bastidores: aspectos da radiodifusão e da
propaganda política em Sergipe durante o Estado Novo. São Cristóvão, UFS, 2000. Monografia
apresentada no curso de História da UFS.
60
Cf. Diário Oficial do Estado de Sergipe, 23.06.1938.
61
Waldefrankly Rolim de Almeida Santos. “Fragmentos de uma Modernidade”: Art Déco na
Paisagem Urbana de Aracaju: 1930-1945. Monografia apresentada no Departamento de
História da UFS, São Cristóvão, Se, 2002, p. 40-44.

133
Ibarê Dantas

Entre 1941 e 1944, o governo Vargas tombou cerca de dez cons-


truções em Sergipe, considerando-as como obras de valor cultural.
Em 1945, Maynard Gomes, também por meio de decreto lei, recriou
o Arquivo Público do Estado e estabeleceu o seu regulamento.
Nas artes plásticas, o controle da política oficial parece ter sido
menor. Na pintura, não nos consta que os quadros de Oséas Santos
e Jordão de Oliveira tenham tido influência marcante dessa política
oficial. Remanescentes da fase anterior, continuaram figurando como
ícones distantes, morando em Salvador e Rio de Janeiro, respectiva-
mente, mas servindo de referência aos artistas locais. Nesse período,
apareceram J. Inácio, nascido em 1911, e os irmãos Florival Santos
(1911-1999) e Álvaro Santos (1920-1963) de Propriá. Este passou um pe-
ríodo na Escola de Belas Artes, no Rio de Janeiro, e teve uma presença
muito forte na vida cultural de Sergipe, colaborando em periódicos
e executando obras clássicas de nossa arte plástica, entre as quais O
Torpedeamento e Cena do Porto. Florival Santos, embora autodidata, foi
um mestre de várias gerações. Além de retratos expressivos, alguns dos
quais integrados à pinacoteca do IHGSE, deixou cenas dos trabalhado-
res do mar, dos mangues e retirantes. J. Inácio, após curta passagem pela
Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, começou a expor em Aracaju,
mas sua marca na história da pintura de Sergipe acentuou-se a partir
dos anos 50, quando passou a residir definitivamente em sua terra.
Enquanto isso, a ideia de que não havia necessidade de representar
objetos de forma regular ia ganhando força.62
Durante essa fase (1931-1945), é provável que tenha ocorrido maior
avanço da música popular do que no período precedente. É verdade
que os dobrados continuaram despertando o sentimento patriótico.
Composições de sergipanos como Os Quatro Tenentes, Sílvio Romero e
Antônio Franco adquiriram grande popularidade e “transpuseram a
nossa fronteira”.63 No interior do Estado, as filarmônicas continuaram

62
Ver José Inácio. Aracaju: Sec. de Turismo, J. Andrade, 2001.
63
Leozírio F. Guimarães. Panorama da Música em Sergipe. Arte de Jovens, Aracaju, Jovreu, Ano
4, n. 20, 1970, p. 16.

134
História de sergipe: república

ativas. Em Capela foi criada a Sociedade Lítero Musical com uma


banda, uma orquestra de salão e coral artístico, que funcionariam até
os anos cinquenta. Por outro lado, houve iniciativas visando propagar
os clássicos, dentro do movimento nacional liderado por Villa Lobos
no Sudeste. Em Sergipe, em 1936, foi instituído o ensino de canto
orfeônico sob a direção de Genaro Plech. Em 1945 foi inaugurado o
Instituto de Música e Canto Orfeônico, incorporando inclusive pro-
fessoras formadas pela Escola Nacional de Música da Universidade do
Brasil.64 Ações como essas contribuíam para estimular vocações sem
as dificuldades do autodidatismo, enquanto as canções populares iam
se generalizando. Nesse ponto, a instalação da Rádio Aperipê (1939)
representou um marco. Apesar de criada como veículo de propaganda
do Estado Novo, não deixava de preencher a sua programação com
atividades musicais, tocando discos de compositores nacionais e
cedendo espaço para as apresentações públicas dos cantores locais.
As músicas populares brasileiras expandiram-se com mais vigor do
que o gênero erudito. Os chorinhos tornam-se cada vez mais aceitos,
tocados nos gramofones e repetidos em interpretações várias. Nos idos
de 1939, num tempo de improvisações, foi importante a presença de
Sílvio Caldas por dois meses em Aracaju, convivendo com os amantes
da música, bebendo, jogando, cantando e revelando suas experiências
aos jovens artistas que começavam a usar os microfones.65 Embora o
rádio fosse pouco difundido ainda em Sergipe, a Aperipê tornou-se um
veículo estimulante para o comércio, com seus anúncios e sobretudo
para a expansão da música popular. Quanto aos carnavais de rua,
entre 1942-45, reduziram-se muito. Houve anos em que não houve
apresentação em face dos bombardeios dos navios que enlutaram
os sergipanos.
No âmbito das artes cênicas, tudo indica que a presença forte do
cinema contribuiu para inibir as suas manifestações. Mesmo assim,

64
Cf. Leozírio F. Guimarães. Ob. cit., 1970, p. 17.
65
Cf. João Mello, depoimento ao autor, em 02.10.2001. Dilton Cândido Santos Maynard. Ob. cit.,
2000.

135
Ibarê Dantas

há notícia da “prática de um teatro profissional com o aparecimento


de companhias dramáticas na cidade, destacando-se a Clodomir Sil-
va, surgida em 1940, que montou peças argumentadas inclusive, por
Tobias Barreto, além de preservar o modelo de teatro português”.66
Os cinemas continuaram com grande frequência. Durante esse
período, pelo menos duas importantes casas de projeção foram inau-
guradas, ambas na zona central da cidade: o Rex (1936) e o Vitória
(1944),67 a maior de todas. Os filmes mudos foram substituídos pelos
falados. No início, temeu-se pelo seu sucesso, vez que os principais
centros produtores de películas tinham língua diversa. Em face do
problema, houve algumas experiências de filmagens no Sudeste, mas
poucas tiveram sucesso. Mesmo porque o aparecimento das legendas
proporcionou novo impulso aos filmes estrangeiros, especialmente
os norte-americanos que, através de suas criações, difundiam sua
música, seus costumes, sua visão de mundo, imprimindo forte influ-
ência em nossa cultura.
Na poesia, José Maria Fontes (1908-1994) e Abelardo Romero (1907-
1979) continuaram divulgando seus poemas, adotando os cânones
modernistas, enquanto apareciam J. Passos Cabral e J. Freire Ribeiro
(1911-1975) publicando seus livros, virando referências. Todavia, quem
mais chamou atenção foi José Sampaio (1913-1956), explorando a te-
mática social, sensibilizando seus leitores com os dramas humanos.68
Quem também demonstrava grande vocação poética era Enoch San-
tiago Filho (1919-1945), morto prematuramente em Salvador, antes
da publicação de Poemas (1946), que continuou a merecer elogios.69
Na prosa, na área do romance, a maior expressão do período foi
Amando Fontes (1899-1967). Embora nascido em Santos, viveu a in-
fância e a mocidade em Aracaju, que serviu de experiência para suas
produções. A publicação no Sudeste de Os Corumbas (1933), romance

66
Virgínia Lúcia Menezes. Levantamento das Manifestações teatrais em Laranjeiras-Sergipe.
Aracaju: Fundesc/Sercore, 1986, p. 15.
67
Cf. Ivan Valença, declaração ao autor, em 26.09.2001.
68
Ver José Sampaio. Poesia & Prosa. Aracaju: Soc. Editorial de Sergipe, 1992.
69
Ver Gilfrancisco. O poeta Enoch Santiago Filho. Jornal da Cidade, 30 e 31.10.2001.

136
História de sergipe: república

inspirado na greve dos trabalhadores fabris de 1921 em Aracaju, al-


cançou grande repercussão local e nacional.70 O segundo livro, Rua de
Siriri, saiu em 1937, confirmando sua sensibilidade com os problemas
sociais e seu talento de romancista.
Enquanto isso, no meio intelectual, ia se registrando o desapare-
cimento da geração dos sergipanos mais destacados. Faleceram Clo-
domir Silva e Prado Sampaio em 1932, João Ribeiro em 1934, Oliveira
Teles em 1935, Manoel Bomfim em 1936 e Laudelino Freire no ano
seguinte. Dos mais famosos que residiam em Aracaju, continuavam
vivos o sociólogo Florentino Menezes, ensinando e publicando seu
Tratado de Sociologia (1931), os poetas Artur Fortes e Garcia Rosa, este
sempre recluso na colina do Santo Antônio. Entre os que moravam
fora, aquela galeria de nomes exponenciais diminuiu bastante, apesar
de numerosos outros continuarem com certo destaque em outros
Estados.71 De qualquer forma, no conjunto, a safra de produções do
período 1931-1937 foi menor do que seria de esperar. Deve ter contri-
buído para inibir as produções literárias as disputas político-ideoló-
gicas apaixonadas desse tempo. Uma exceção foi Omer Mont’alegre
(1913-1989) que, em 1937, foi para o Rio de Janeiro e publicou o seu
romance Vila de Santa Luzia, retratando o ambiente daquela povoação
espremida entre a influência de duas usinas, o Castelo e o São Félix.
Em Sergipe, depois da instauração do Estado Novo, passaram-se
cerca de dois anos com raras publicações, até que as produções pas-
saram a fluir, indicando um novo momento cultural. A maioria dos
intelectuais foi se afastando do ativismo político e passou a cuidar
de seus trabalhos específicos, de alguma forma influenciados pelo
espírito do tempo: maior preocupação com a realidade brasileira e
local. Em 1938, um grupo criou o Centro Cultural de Sergipe e per-
durou por cerca de dois anos estimulando produções. Deixando de

70
Amando Fontes nasceu em Santos (SP). Aos cinco anos, veio para Aracaju onde viveu até
1930, passando a ser considerado sergipano. Depois, passou a morar no Rio de Janeiro, onde
escreveu seus dois livros, frutos da vivência em Sergipe.
71
Sobre os intelectuais de Sergipe que emigraram, ver Luiz Antonio Barreto. Singularidades
Sergipanas (Final) in Gazeta de Sergipe, 12.07.2001.

137
Ibarê Dantas

lado as questões político-ideológicas, reuniam-se em casas alternadas


para discutir assuntos literários, filosóficos e afins. Foi-se gestando
então uma nova intelectualidade que se foi revelando com ensaios de
mérito: José Calazans (1915-2001) era um dos expoentes do momento.
Sua tese da cadeira de História do Brasil na Escola Normal tratando
de Aracaju (1942) foi muito bem recebida. Fernando Porto divulgou
A Cidade do Aracaju (1855-1865), em 1945, um marco nos ensaios sobre
a capital. Felte Bezerra (1908-1990), já participando de congressos
nacionais, passava a ser reconhecido como sério estudioso no campo
da geografia e antropologia; Orlando Dantas, um jornalista inquieto,
angariou prestígio com o livro O Problema Açucareiro de Sergipe (1944);
Garcia Moreno publicou saboroso livro de crônicas, Temas da Província
(1944), mostrando seu talento. Mário Cabral (1914-2009) afirmava-se
como poeta e crítico literário; Epifânio Dórea revelava sua acuidade
na pesquisa e sua dedicação em cuidar dos acervos documentais;
Joel Silveira (1918-2007) já mostrava sua grande habilidade com as
reportagens jornalísticas; João Carlos de Almeida divulgou obra muito
informativa, Sergipe e seus Municípios (1944), patrocinada pelo IBGE;
José Cruz produziu trabalhos ligados à economia e à estatística, cons-
truindo importante base empírica para os estudos sociais. Carvalho
Neto, desde a fase anterior, divulgava seus ensaios, sobretudo no
campo jurídico. Nessa nova conjuntura, escreveu seu romance Vidas
Perdidas. Além desses escritos, a obrigação das teses, para ingresso de
professores no Colégio Atheneu D. Pedro II, induzia os candidatos à
pesquisa e os obrigavam a elaborar trabalhos de bom nível. Era uma
nova geração que despontava, dando continuidade aos estudos locais,
enriquecendo a literatura e as ciências humanas.
Não obstante essa série de publicações nos tempos do Estado Novo,
desconhecemos estudos de valor que fizeram apologia explicitada do
regime autoritário. Há ensaios biográficos, discursos e outras peças
elogiosas, mas de pequena importância literária ou científica. Em
geral, os intelectuais conviviam com o sistema discricionário, vários
deles serviram-no, mas, à medida que a impopularidade do regime foi
aumentando, as pessoas foram se afastando, tornando-se reticentes.

138
História de sergipe: república

Quando o movimento em prol da democracia foi crescendo em outros


centros, vários literatos, jornalistas e estudantes se incorporaram
à corrente, participando de atos públicos e encontros. Em 1944 um
grupo de estudiosos fundou o Centro de Estudos Econômicos e Sociais
de Sergipe, promovendo conferências, pesquisando e publicando,
contribuindo para uma visualização mais amadurecida dos estudos
econômicos e sociais.72 Em meio a essa movimentação intelectual, foi
instalado no ano seguinte, em Aracaju, o Centro Democrático Artur
Fortes, enfatizando “a luta pela alfabetização das massas populares”.73
O I Congresso Brasileiro de Escritores, acontecido em janeiro de 1945
no Teatro Municipal de São Paulo, apresentou sentido político bem
evidente. Sergipe se fez representar com uma delegação, enquanto
internamente os gestos de contestação à ordem vigente também
cresciam. O declínio das forças nazifascistas no plano mundial e o
desgaste do governo autoritário no âmbito local concorriam para ex-
pandir o movimento pela democratização da sociedade e muitos dos
novos escritores animaram-se esperançosos diante das perspectivas
políticas e culturais.

72
Ver Jackson da Silva Lima. Os Estudos Filosóficos em Sergipe. Aracaju: Sociedade Editorial de
Sergipe, 1995, p. 139.
73
Luiz Antônio Barreto. Centro democrático Artur Fortes in Gazeta de Sergipe, 21.08.2003.

139
Ibarê Dantas

2.5 Resumo (1930-1945)

A Revolução de 1930 proporcionou o aparecimento de novas forças


no campo político e ampliou o papel do Estado, mas essa interferência
crescente foi se contrapondo à institucionalização da ordem demo-
crática. O presidente Vargas violentou o sistema representativo e,
sobretudo a partir de 1937, instaurou regime autoritário marcado pela
coerção. Durante esse tempo, os problemas do Nordeste ganharam
mais identidade como unidade regional.
Em Sergipe, viveram-se três momentos mais ou menos diferen-
ciados. Numa primeira fase (1930-35), o governo ampliou a máquina
administrativa e reformulou a estrutura de poder preexistente,
proporcionando desgaste às oligarquias e ao coronelismo coercitivo.
Simultaneamente ocorria a sindicalização de diversas categorias
profissionais com o respaldo da interventoria. A partir de 1933, vá-
rios grupos sociais participam da reorganização partidária, dentro
de um novo quadro institucional que comportava justiça eleitoral,
voto secreto e voto feminino, dando início (1933) ao processo de ins-
titucionalização de uma ordem democrática proporcionando grande
animação à sociedade. Mas a partir de 1935, os grupos conservadores
e/ou direitistas se fortaleceram, a polarização ideológica acentuou-
-se entre direitistas e esquerdistas e, com a deflagração da Intentona
Comunista em outros Estados, a repressão recrudesceu. Depois,
ainda surgiram surtos de mobilização em torno da campanha para
presidente da República, mas tudo terminou com o golpe de Estado
de 1937, tutelando a sociedade dentro de Estado unitário, poderoso,
intervencionista e pastoral. A partir de então, a desarticulação e a
desmobilização da sociedade civil se acentuaram, enquanto os inter-
ventores, que foram se sucedendo, atendendo orientação nacional,
promoviam propagandas apologéticas do Estado Novo autoritário,
com exploração do civismo.
Ao longo dos quinze anos, os governantes prosseguiram na moder-
nização dos serviços públicos e demonstravam maior preocupação
com o social, mas a participação dos empresários foi inibida pela

140
História de sergipe: república

política nacional intervencionista. É verdade que durante o período


da Segunda Guerra (1939-45) alguns agentes econômicos prospera-
ram, mas a quebra das barreiras interestaduais, ao tempo em que
contribuía para a integração econômica, erodia a relativa autono-
mia do mercado interno. Enquanto os Estados do Sudeste recebiam
grande estímulo para a industrialização, o governo nacional criava
cotas para o setor açucareiro do Nordeste, proporcionando sobrevida
ao modelo agroexportador que, protegido, passaria a descuidar do
aperfeiçoamento tecnológico.
Nesta situação, os trabalhadores, depois de uma fase de partici-
pação, criando sindicatos e outros órgãos de representação, foram
reprimidos em 1935 e desmobilizados durante o Estado Novo. Em
compensação, a CLT foi editada, consagrando direitos importantes.
Quando, no trânsito institucional, a reorganização partidária foi
desencadeada em 1945, não obstante o quadro político encontrar-
-se mais disperso, abriram-se novas perspectivas para a sociedade.
Apesar da predominância do autoritarismo no período, ficavam os
feitos modernizadores e as experiências a serem lembradas no novo
tempo de aprendizado de reconstrução da democracia.
Do ponto de vista das manifestações culturais, num primeiro mo-
mento o debate apaixonado entre socialistas e integralistas prejudicou
parcialmente a produtividade dos artistas. Num segundo momento,
sobretudo nas ciências humanas, as pesquisas e as reflexões avança-
ram com maior preocupação com a objetividade e com a fundamen-
tação empírica. Mas a principal característica de todo o período foi a
grande interferência do Estado, assumindo responsabilidades mais
decididas no setor educacional, revelando preocupações sociais ao
tempo em que inibia a ação do mercado. Os governos, inseridos numa
ideologia de construção do Estado Nacional, promoveram reorienta-
ção do ensino e estiveram a subsidiar periódicos. Numa segunda fase
mais explicitamente autoritária, passaram a implementar política
cultural voltada para a valorização da história, preservação do pa-
trimônio histórico e maior controle das informações no sentido de
justificar o Estado Novo, que, mesmo assim, foi perdendo legitimidade,

141
Ibarê Dantas

diante dos movimentos de resistência. No conjunto, não foi das fases


mais profícuas em criações e produções individuais. Mas despontava
nova geração de escritores demonstrando vocação e potencialidades
capazes de enriquecer a cultura sergipana.

142
III
O ESTADO POPULISTA E O DOMÍNIO DOS
PECUARISTAS (1946-1964)

3.1 O Processo Político-administrativo

3.1.1 A queda de Vargas e os Governos Provisórios

D esde quando Getúlio Vargas foi deposto da Presidência da Re-


pública (1945), o país passou por uma fase de transição até a
montagem de uma nova ordem institucional. O então presidente do
Supremo Tribunal Federal, José Linhares, assumiu o governo com a
missão de administrar o cumprimento do calendário eleitoral e trans-
mitir o cargo ao novo eleito. De início, o novo presidente tomou duas
medidas de grande repercussão: a extinção do Tribunal de Segurança
Nacional, órgão máximo da repressão do Estado Novo, e a revogação
da data da eleição de governadores que estava estabelecida para 02
de dezembro, simultaneamente ao pleito que elegeria o presidente da
República e os parlamentares da Constituinte. Com essa medida, os
oposicionistas de todo o país ganhavam mais tempo para articular-se.
A campanha foi relativamente curta. A UDN lançou um dos
principais líderes da revolta de 1922, o brigadeiro Eduardo Gomes,
enquanto o PSD concorria com o general Eurico Gaspar Dutra. O PCB,
como partido legalizado, lançou Luiz Carlos Prestes para o Senado e
Iêdo Fiúza, ex-prefeito de Petrópolis, para a Presidência da República.
Decorrido o pleito, o general Dutra, contando com o apoio de Vargas,
em carta divulgada na última hora, saiu vitorioso.

143
Ibarê Dantas

O novo presidente, embora eleito com o respaldo de Vargas,


pautou-se por uma política inibidora do processo de industrialização
e de contenção do movimento popular. Os constituintes elaboraram
uma Carta, em 1946, que avançava em alguns pontos, entre os quais
no capítulo sobre os direitos e garantias individuais, mas não cria-
va condições para a fundação de uma cidadania que se efetivasse
amplamente. Os direitos sociais praticamente restringiram-se à in-
corporação da legislação corporativa estabelecida durante o Estado
Novo, coexistindo, contraditoriamente, com a inspiração liberal. De
qualquer forma, era um aperfeiçoamento em relação às constituições
anteriores.
O maior problema político provinha do quadro internacional,
através da denominada Guerra Fria, a disputa entre o bloco capita-
lista e o comunista. Embora unificados na luta para derrotar o eixo,
depois da vitória dos aliados as divergências entre Estados Unidos e
União Soviética foram se explicitando, através de embates ideológicos
que tenderiam a repercutir na política interna de diversos países,
inclusive o Brasil.
Em Sergipe, a organização partidária que foi delineada nos últimos
meses do Estado Novo tenderia, em grande parte, a compor o perfil
do novo momento institucional. Para cumprimento do calendário
eleitoral, foram se sucedendo os governantes provisórios. Francisco
Leite Neto, que substituía Maynard, em 05.11.45 passou o cargo ao pre-
sidente do Tribunal de Justiça do Estado, Hunald Santaflor Cardoso,
que haveria de governar até o fim de março do ano seguinte. O novo
governante compôs um secretariado misto, incluindo oposicionistas
e governistas, entre os quais alguns componentes da administração
anterior.1
No processo eleitoral de 1945 em Sergipe, a UDN aliou-se com o
PR e elegeram os dois postulantes ao Senado. Para Câmara dos Depu-
tados, a UDN levaria dois; o PSD, dois; e o PR, um. Uma das surpresas

1
Para versão ampliada desse período, ver José Ibarê Costa Dantas. Os Partidos Políticos em
Sergipe -1889/1964. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1989.

144
História de sergipe: república

foi a votação do candidato a presidente do Partido Comunista. Venceu


em Aracaju, apesar de a esquerda não eleger nenhum nome.
Eleitos o presidente da República e os membros da Constituinte,
o passo seguinte para a transição seria a eleição para governador, a
complementação das vagas do Senado e a escolha dos constituintes
estaduais. Antes, no entanto, procedeu-se a substituição do inter-
ventor. Para o cargo foi indicado o coronel Antônio Freitas Brandão,
que foi empossado em 31.03.46, e tentou realizar uma gestão voltada
para a conciliação entre os grupos influentes. Formou um secreta-
riado similar ao do seu antecessor e esmerou-se em não contrariar
os interesses dominantes, preservando, inclusive, a máquina política
montada no Estado Novo pela interventoria de Maynard.
A essa altura, meados de 1946, iam-se esboçando as tendências
do novo quadro político. O regime autoritário era substituído pelo
liberal-democrático. O governo central diminuía o nível de ingerência
na política interna. O índice de votantes aumentava consideravel-
mente. As massas urbanas passavam a influir de forma mais decisiva
no processo eleitoral. Num momento em que o número de senhores
do açúcar já se achava bastante reduzido, os pecuaristas ascendiam
com muito ânimo ocupando o cenário, influindo na vida partidária.
O pluripartidarismo, que se ensaiou nos anos 1933-35, voltava com
mais vigor. A dominação interna, mais do que nunca, passava a ser
definida pela competição partidária local.
Diante do novo pleito marcado para 19.01.1947, as articulações
políticas confirmaram o eixo competitivo que havia se delineado nas
eleições anteriores, qual seja, a disputa entre PSD X UDN. O primeiro
tinha como liderança maior Francisco Leite Neto, com a experiência
adquirida como secretário geral da interventoria dos tempos de
Maynard. Na UDN, pontificava Leandro Maynard Maciel, homem já
vivido na política, desde quando fora secretário de obras na gestão
de Manoel Dantas, o último governante da República Velha.
A novidade da campanha de 1946-47 foi ver o PR, que antes havia
se aliado à UDN, coligado com o PSD, situação que tenderia a per-
sistir nos pleitos subsequentes. Outro acontecimento surpreendente

145
Ibarê Dantas

naquele momento foi a aliança do PCB com a UDN, tentando eleger


o advogado Luiz Garcia. Enquanto isso, a Esquerda Democrática,
com seu projeto de socialismo democrático, desligava-se da UDN
e concorria aos cargos eletivos com candidatos próprios, inclusive
para governador, através do usineiro Orlando Dantas. Além dessas
siglas, ainda surgiram o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), em fase
de estruturação, que ficaria sob o controle do líder populista Fran-
cisco de Araújo Macedo, e o pequeno Partido Trabalhista Nacional
(PTN). Na campanha bastante agitada como todas do período, a LEC
desenvolveu forte movimento contra a chapa aliada aos comunistas
e a coalizão PSD+PR elegeu José Rolemberg Leite governador, bem
como o senador e a grande maioria dos deputados.
Concluídos os trabalhos do pleito, o governante interino, coronel
Antônio Freitas Brandão, deu por encerrada a sua função e passou o
cargo ao industrial Joaquim Sabino Ribeiro em 30.01.1947. Dois meses
depois, este empresário transmitia-o ao novo governador eleito.

3.1.2 O Domínio da Aliança PSD-PR: José R. Leite e Arnaldo R. Garcez (1947-1955)

Quando o jovem engenheiro José Rolemberg Leite tomou posse


(1947-1951), as disputas entre direita e esquerda estavam bastante
acentuadas, como decorrência do quadro externo. Eleito por uma
coalizão conservadora, através de uma campanha radicalizada, com
o apoio da Igreja Católica em ostensiva propaganda anticomunista, o
novo governador escolheu secretariado dentro de sua base política,
tentando atender os interesses por vezes contraditórios entre pesse-
distas e perrepistas.
Além da natureza do seu secretariado, havia o peso da influência
familiar. Como membro de uma numerosa e tradicional família ser-
gipana, José Rolemberg Leite tinha, na máquina administrativa, uma
vasta parentela, que tornava seu governo, não apenas continuador de
uma estrutura de poder que se montara no Estado Novo, mas também
como a mais destacada estrela da constelação das famílias Leite e
Rolemberg. O controle sobre a máquina político-administrativa ficou

146
História de sergipe: república

mais transparente com a eleição municipal. Apesar de a UDN, como


partido isolado, apresentar-se, pelo conjunto de seus quadros, como
o de maior dimensão, o PSD mais o PR elegeram a grande maioria
dos prefeitos e vereadores no pleito de outubro de 1947.2
Apesar das pressões intensas dos correligionários no sentido
de subordinar as políticas públicas às práticas particularistas, nem
por isso a administração de José Rolemberg Leite deixou de ser, em
certos aspectos, criteriosa. Homem sóbrio, discreto no falar e no agir,
manifestou-se austero nos gastos, sem deixar de imprimir melhoria
em alguns serviços essenciais da capital e do interior. Atacou os
problemas de água e luz, que se encontravam em estado precário,
e, dentro de um programa do governo federal, ampliou considera-
velmente a rede escolar no setor rural, chegando a inaugurar 218
escolas, além de deixar vinte outras em construção, todas dentro de
um modelo padronizado e distribuídas em numerosos povoados dos
diversos municípios do Estado.3 Para suprir a demanda, procurou-se
preparar professores para atender as diversas comunidades. Além do
mais, criou as faculdades de Economia e Química que haveriam de
prosperar e permanecer atuando, ao contrário daquelas da década
de vinte, que não vingaram.
Ampliou a malha rodoviária em mais 206 km e manifestou-se
zeloso no equilíbrio das contas públicas, resistindo às pressões incô-
modas sobretudo do Judiciário.4 Apesar desses e de outros melhora-
mentos, seu governo revelou-se pouco tolerante com os movimentos
populares, sobretudo com o movimento comunista.
Desde 1946 o Partido Comunista do Brasil vinha ampliando sua
influência sobre a política sergipana, sobretudo no seio do operariado
de Aracaju, de São Cristóvão e, em menor proporção, de Propriá e Es-
tância. Com sede própria, após a vitória em Aracaju no pleito de 1945, o
partido foi superestimado, inclusive por seus adversários. Em janeiro

2
Ver Diário da Justiça, 19.03.1947.
3
Cf. José Rolemberg Leite. Mensagem que apresentou, por ocasião da abertura da sessão legislativa
de 1950, à Assembleia Legislativa Estadual. Aracaju: Imprensa Oficial, 1950.
4
Ver José Rolemberg Leite. Ob.cit., 1950.

147
Ibarê Dantas

de 1947, elegera um deputado estadual e, em outubro do mesmo ano,


um vereador para a Câmara de Aracaju. Com o desencadeamento da
campanha anticomunista de âmbito nacional, no segundo semestre
de 1946, as atividades do partido passaram a ser minuciosamente
investigadas e o Tribunal Superior Eleitoral terminou cancelando
seu registro (07.05.47). Seguiu-se a intervenção nos sindicatos e, em
janeiro de 1948, ocorreu a cassação dos parlamentares.5
Em Sergipe, onde o partido já contava com uma influência pon-
derável, as reações se desencadearam na Assembleia e nas ruas. Mas
a orientação do governo Dutra, pressionado pelos grupos de direita,
era de reprimir a qualquer custo as manifestações populares. Seguin-
do essa diretriz, o governo da coalizão PSD/PR proibiu em Aracaju,
inclusive, um comício pacífico. Quando os comunistas combativos
tentaram realizá-lo, o esquadrão de Cavalaria investiu contra a massa
no sentido de dispersá-la e um tiro atingiu um militante comunista,
Anísio Dário, que logo faleceu, enquanto vários dos seus correligio-
nários eram presos. Os numerosos filhos do militante morto per-
diam o pai, os comunistas ganhavam um mártir e o governo ficaria
marcado pela intolerância, apesar das tentativas de culpar terceiros
pela tragédia.6
Com o Partido Comunista jogado na ilegalidade, o movimento
popular tenderia a declinar, embora não desaparecesse. Sindicalistas,
militantes, comunistas ou não, persistiram adversamente cavando
espaços sociais e, por vezes, sendo vítimas de repressão. A legenda
estava proibida de concorrer, mas suas lideranças continuaram atu-
antes com reuniões periódicas, editando seus jornais (A Verdade, Folha
Popular) em momentos diferentes e, nos pleitos eleitorais, persistiram
influindo, votando em seus candidatos abrigados em outras siglas.
Dessa forma, a maioria dos seus simpatizantes migrava para o PTB
de Macedo, que se declarava principal representante do varguismo

5
Cf. Leôncio Basbaum. História Sincera da República (1930/60). São Paulo, Alfa ômega, 1976,
p. 188-192.
6
Cf. José Rosa de Oliveira. Depoimento ao autor em 19.08.1985 e Pires Wynne. História de Sergipe,
1930-1972. Rio de Janeiro: Pongetti, 1973, p. 172-3.

148
História de sergipe: república

no Estado, ou votava na UDN. O PSB, por sua vez, defendia o socia-


lismo com liberdade, através da Gazeta Socialista sob a liderança de
Orlando Dantas, mas não encontrava grande receptividade entre os
trabalhadores.
Dentro do quadro da elite dominante, a maior oposição ao go-
verno partia dos udenistas, atuantes na Assembleia e articulados
pelo interior do Estado, acompanhando de forma bastante crítica a
gestão da aliança PSD/PR através do Correio de Aracaju. Como se isso
não bastasse, havia as rivalidades internas da coalizão na indicação
dos delegados, nas demandas dos prefeitos, que se acentuavam por
ocasião da campanha sucessória. A escolha do candidato para a
eleição de 1950 deixou marcas internas indeléveis e gerou também
fatos surpreendentes, sobretudo a saída de Maynard do partido e sua
aliança com Eronides de Carvalho, seu mais ferrenho adversário de
1930-45. No plano nacional, o pleito marcou o retorno de Vargas, dessa
vez através do voto popular.
Em Sergipe, firmavam-se, então, três candidaturas ao governo do
Estado: Arnaldo Rolemberg Garcez (PSD-PR), Leandro Maciel (UDN)
e Francisco de Araújo Macedo (PTB). A campanha foi apaixonada, re-
nhida e o pleito marcado por fraudes. A apuração transcorreu difícil,
demorada, cheia de batalhas judiciais e até “explosão” de uma urna.
O resultado demorou tanto que no dia da posse do novo governador
a pendência continuava, tendo assumido o governo o presidente do
Tribunal de Justiça, João Dantas Martins dos Reis. Este, dias depois,
passaria o cargo ao candidato da aliança PSD/PR que terminou sen-
do considerado vitorioso por pequena margem de votos. Apesar da
derrota da UDN a partir de um resultado bastante questionado, os
udenistas mostraram mais do que antes a sua grande força eleitoral
e o prestígio dos seus quadros.
O segundo governo do PSD-PR, que abrange o quatriênio 1951-
1955, coincidiu com a ampliação da política populista de Vargas,
incorporando as massas urbanas, dentro de um projeto econômico
industrializante e nacionalista. Essa orientação encontrou reações da
burguesia comercial importadora e de grupos vinculados ao capital

149
Ibarê Dantas

estrangeiro, que se associaram com setores da cúpula das Forças


Armadas, exacerbando a luta política contra o governo.7
Embora esse debate fosse inibido pela orientação conservadora da
aliança PSD+PR e por sua disputa com a UDN, nem por isso o Estado
ficou alheio às repercussões das lutas ideológicas nacionais.
Quando Arnaldo Rolemberg Garcez assumiu o governo do Estado,
em 12.03.1951, já dispunha de experiência na vida pública.8 Foi um
dos fundadores do PSD e, em 1946, cotado para a interventoria do
Estado, apoiado por Maynard, que renunciou à presidência do PSD
em face de Dutra não haver atendido sua reivindicação. Em 1951 o
novo governante assumia com imagem um pouco desgastada por
uma campanha difícil, desde a escolha de seu nome até o resultado
eleitoral questionado nos tribunais. No começo tentou imprimir uma
orientação própria à sua administração, escolhendo um secretariado
mais agradável ao PR, provocando descontentamentos dentro do pró-
prio PSD. Apesar disso, mostrou uma certa sensibilidade na área da
educação, apoiando a criação da Escola de Serviço Social e indicando
pessoas criteriosas para dirigir instituições oficiais. Realizou obras de
dragagem na capital e fez açudes no interior. Atendendo ao anseio
dos agropecuaristas, construiu o Parque João Cleofas, um centro para
exposição de gado bovino. Voltado para a questão econômica, criou
por decreto, em 1952, a Comissão de Desenvolvimento Econômico do
Estado de Sergipe (CDE), órgão consultivo do governo e de assistência
às iniciativas de desenvolvimento.9 Na área social, levantou o primeiro
conjunto habitacional de cunho popular, atendendo a uma demanda
de residência para as classes subalternas. Entretanto, o nível de intole-

7
Ver Décio Saes. Classe Média e Sistema Político no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz, 1985.
8
Arnaldo Rolemberg Garcez nasceu em 1911 em Itaporanga d’Ajuda (SE). Proprietário rural
com trânsito na política, foi eleito deputado à constituinte estadual, atuou na Assembleia
até novembro de 1937, quando ocorreu o golpe. Posteriormente, como ex-membro da União
Republicana de Sergipe (URS), e ligado ao interventor Eronildes Ferreira de Carvalho, integrou,
em 1940, o Conselho Administrativo do Estado por cerca de um ano.
9
Cf. Dilson Menezes Barreto. A Construção do Desenvolvimento de Sergipe e o Papel do Condese
(1964-1982). Dissertação de mestrado apresentada ao DCS da UFS. São Cristóvão, 2003,
(digitada), p. 69.

150
História de sergipe: república

rância com relação às manifestações dos ativistas, comunistas ou não,


continuava semelhante ao de seu antecessor, evitando manifestações
dos sindicalistas. Já no dia 1º de maio de 1951, segundo denunciou
A Verdade, tentou impedir a programação organizada pela União
Geral dos Trabalhadores (UGTS) e outras organizações sindicais,
prendendo cidadãos, ao tempo em que cercava com a polícia a praça
general Valadão, onde seria realizada a concentração. Apesar desses
impedimentos, os militantes teimaram, a todo custo, em realizá-la
com comícios relâmpagos, pintando muros e distribuindo volantes.
Contudo, o maior complicador de sua administração foi a opera-
ção repressiva contra os comunistas, realizada pelo setor antivarguis-
ta do Exército. A vitória dos nacionalistas dentro do Clube Militar,
com sede no Rio de Janeiro, exacerbou os ânimos da corrente anti-
comunista, que passou a desenvolver ações em alguns Estados com o
fim de desmoralizar as bases militares nacionalistas de Vargas.10 Foi
dentro desse movimento que oficiais, com anuência do governador,
instalaram-se em Sergipe e realizaram a famosa sindicância de 1952.
Depois de inquirir oficiais do próprio 28º BC e da Polícia, investiram
contra a sociedade civil e prenderam mais de 50 pessoas, entre as
quais toda a direção estadual do Partido Comunista que, então, atuava
na clandestinidade. No curso do processo, os presos foram submeti-
dos a longos depoimentos, entremeados não raras vezes de tortura.
Além dos atos de violência e a imposição de constrangimentos aos
prisioneiros, oficiais do Exército encarregados da operação estende-
ram seus abusos até o comércio de Aracaju, realizando compras que
jamais seriam saldadas.11
Líderes anticomunistas vieram a Aracaju e pelo menos uma con-
ferência foi pronunciada, alardeando sobre o suposto perigo que a
sociedade sergipana havia passado com a existência desse movimento
comunista. Enquanto isso, políticos locais em geral manifestaram-se

10
Cf. Nelson Werneck Sodré. História Militar do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
1965, p. 304-326.
11
Ver Mauro do Carmo Alves. Na Mira do Exército. Monografia apresentada ao Departamento
de História da UFS. São Cristóvão (SE), (Digitada), 2002.

151
Ibarê Dantas

flexíveis, quando não submissos. Raros foram aqueles que se pronun-


ciaram na tribuna da Câmara dos Deputados e, posteriormente, em
comício em Aracaju.12 O vice-governador e o governador somente
intervieram quando as investigações começaram a ameaçar alguns
dos seus próprios auxiliares.
Depois de meses de prisão, os suspeitos foram liberados e o pro-
cesso permaneceu inconcluso. A partir de então, Vargas tenderia a
encontrar maiores dificuldades em implementar seu projeto político,
enquanto o governo Arnaldo Garcez, diminuído, assistia ao envolvi-
mento dos correligionários em práticas partidárias desabonadoras,
entre as quais sequestro de um deputado para evitar quórum na
Assembleia e a exacerbação da violência.
A prática da truculência no processo político de Sergipe, embora
tenha sido uma constante em sua história, variou de intensidade
durante a República. A partir de 1945, quando a competição entre
os próprios subgrupos da classe dominante se acentuou, dentro de
certa autonomia estadual, os embates se tornaram mais renhidos,
resultando muitas vezes em atos de arbitrariedade.
Desde a primeira eleição, em dezembro de 1945, que se registra-
ram queixas contra autoridades policiais, gerando animosidade com
os oposicionistas. Enquanto isso, os udenistas iam demonstrando
agressividade, acentuando as tensões grupais. Em todos ou quase
todos os municípios, foram-se formando grupos rivais, cada vez mais
irreconciliáveis. Os situacionistas, com o aparato coercitivo, empreen-
diam perseguições, enquanto os udenistas resistiam, fortalecendo-se
e também provocando e investindo.
Com a vitória de Arnaldo Garcez, depois de uma eleição plena de
violência e de um processo de apurações particularmente tumultuado,
ocorreram as vinditas em vários municípios com prisões e até mortes.
Nesse clima de animosidade, estimulado pela imprensa de ambos os
lados, as acusações se repetiam, chegando os udenistas a denunciarem

12
Cf. José Rosa de Oliveira Neto, declaração ao autor, em 19.08.1985. O deputado Orlando Dantas
pronunciou-se contra as prisões.

152
História de sergipe: república

os governistas em jornais e na Câmara dos Deputados. Caravanas de


parlamentares visitaram cidades do interior e apresentaram relatório
que foi explorado pelos oposicionistas.13
Esse quadro foi-se agravando pela parcialidade de juízes e desem-
bargadores que se deixavam envolver pelo partidarismo. Embora a
democracia fosse enraizando-se nos costumes, através da pluralidade
de partidos, das eleições periódicas e da liberdade de manifestação do
pensamento, faltava a impessoalidade, o distanciamento diante do
Judiciário e do Exército. As varas e os tribunais tornaram-se órgãos
meramente políticos. O partido que tivesse mais simpatizantes nos
tribunais tenderia a vencer os pleitos. Com o Judiciário partidário,
a sua autoridade e a sua legitimidade foram-se esgarçando, e os
grupos políticos apelaram cada vez mais para a força. Como solu-
ção ocasional, declarava-se intervenção e o Exército era convocado.
Mas os próprios militares também se deixavam envolver e por vezes
tornavam-se cúmplices de irregularidades.
Preocupado com a escalada da violência política, um grupo de
intelectuais, composto por pessoas de diferentes partidos, criou, em
Aracaju, o Centro de Ação Democrática, divulgando mensagem aos
sergipanos.14 Em meio a uma orientação doutrinária de teor naciona-
lista, com preocupação social, falando inclusive de reforma agrária,
inspirava-os a vontade de “criar um campo de entendimento entre
os partidos a fim de amortecer os crimes”.15
Enquanto isso, o quadro federal também se agravava. A derrota
da ala nacionalista do Exército, no ano de 1952, facilitou o desenvolvi-
mento das reações à política de Vargas. A nomeação de João Goulart
para o Ministério do Trabalho e o aumento do salário mínimo amplia-
ram os descontentamentos de variados setores urbanos. Fustigado
pelas campanhas da imprensa, em geral associadas aos udenistas, o
governo contra-atacou, assumindo posições nacionalistas. Em con-

13
Ver Correio de Aracaju, 27.06.1953.
14
Cf. Correio de Aracaju, 19.01.1954.
15
José Silvério Leite Fontes, entrevista ao autor, em 24.06.1985.

153
Ibarê Dantas

traposição, militares e civis anticomunistas se aglutinaram criando


organizações de direita, visceralmente antigetulistas, pregando o
impeachment do presidente, enquanto sua base partidária minguava.
O PSD e o PSP foram assumindo posturas de independência e o PCB,
na clandestinidade, considerava Vargas “agente do imperialismo”.16
O atentado contra Carlos Lacerda, principal líder udenista, fortaleceu
a corrente dos adversários que postulavam sua deposição. No meio
do embate, Vargas preferiu o sacrifício pessoal, através do suicídio,
provocando grandes manifestações populares.
Em Aracaju, a carta testamento de Vargas foi lida dramaticamente
na Rádio Difusora, acompanhada de comentários sensacionalistas,
apontando os udenistas como responsáveis pela tragédia. As massas
indignadas acorreram às ruas contra os supostos opositores de Vargas.
Um popular foi assassinado na Praça Fausto Cardoso. Casas de ude-
nistas e a sede do jornal Correio de Aracaju foram depredados. Forças
do Exército intervieram e evitaram a invasão da Rádio Liberdade,
veículo da UDN, e da residência de Leandro Maciel.
Estando os udenistas acusados de corresponsáveis pela morte de
Vargas, quando faltava pouco mais de um mês para as eleições, a vi-
tória do seu candidato Leandro Maciel parecia impossível. Mas como
o partido vinha, nos últimos anos, ampliando seu raio de influência
no Estado e na sociedade, desde o Judiciário até os setores populares,
com o desenrolar dos acordos e das pregações da campanha, as ani-
mosidades foram amenizadas e o candidato da UDN saiu vitorioso
com pequena margem de votos. Não obstante os questionamentos do
resultado, após outra batalha judicial, o representante do PSD, Edelzio
Vieira de Melo, ficou em segundo lugar e, por último, figurou Fran-
cisco de Araújo Macedo do PTB. A UDN também saiu favorecida nos
nomes que apoiou para o Senado, Câmara dos Deputados, Assembleia
Legislativa e Prefeituras.

16
Leôncio Basbaum. Ob. cit., p. 207.

154
História de sergipe: república

3.1.3 O Domínio da UDN: Leandro Maciel e Luiz Garcia (1955-1962)

Depois da morte de Vargas, o vice-presidente Café Filho assumiu,


mas não demorou o país a viver novo momento de instabilidade com
golpes, contragolpes e revoltas até no início do governo de Juscelino
Kubitschek, que tomou posse em 30.01.1956. Em Sergipe, a vitória
dos udenistas significava alternância de poder na política local que
passava a viver sob o signo do leandrismo. Personalidade forte, lide-
rança maior da UDN, Leandro Maynard Maciel ingressou na vida
pública durante a Primeira República e, conforme já vimos, teve
atuação destacada nos pleitos de 1933-1935. Embora o golpe de 1937
o tenha jogado no ostracismo, durante o Estado Novo ele alimentou
como pôde a continuidade do seu grupo político e, quando o proces-
so de liberalização foi desencadeado, incorporou-se ao movimento
democrático, participando da formação da UDN. Em 1945 compôs
com o PR, elegeu-se constituinte de 1946 e, em 1947, fez acordo com
os comunistas. Em meio às hostilidades da máquina política estatal
e às derrotas eleitorais da UDN em 1947 e em 1950, administrou o
crescimento do partido, demonstrando capacidade de decisão, agres-
sividade e astúcia. Pragmático, estivesse no Senado ou na Câmara dos
Deputados, defendia uma política de desenvolvimento para o Estado
através da industrialização e aproximava-se de políticos de diversos
partidos, a fim de obter o apoio para seus projetos e para pleitos de
verbas destinadas a instituições de Sergipe.17 Mas, internamente, era
sobretudo uma grande liderança partidária, “amigo dos amigos”, que
despertava ódio dos adversários e paixão dos correligionários pela
forma decisiva como lhes demonstrava solidariedade na paz e nas
lutas lícitas ou ilícitas.
No discurso da posse, ocorrida em 31.01.1955, prometeu governar
para todos, mas logo foi mudando o quadro dos funcionários de
confiança, vários dos quais provinham do Estado Novo, montando

17
Cf. Israel Beloch e Alzira Alves de Abreu (coords). Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro,
1930-1983. Rio de Janeiro: Forense Universitária: FGV/CPDOC; FINEP, 1984, v. 1, p. 415.

155
Ibarê Dantas

uma administração eminentemente partidária. A seguir, foi ao Rio


de Janeiro em busca de recursos e, em Sergipe, revelou-se executivo
dinâmico, operoso, através de realizações que na época eram consi-
deradas as mais fundamentais para o desenvolvimento do Estado.
Considerando que o crescimento estava estrangulado por três
fatores – porto, energia e aeroporto –, com determinação procurou
superar os problemas. Empenhou-se como ninguém para a conclusão
dos trabalhos do novo aeroporto, cujas obras haviam sido iniciadas
há 17 anos, e terminou inaugurando-o. A draga, vista então como
solução para o problema do porto, foi recebida em festa, e executou a
desobstrução da barra de Aracaju. Ampliou a rede elétrica na capital
e instalou em alguns municípios a energia gerada na Usina de Paulo
Afonso. Além disso, renovou boa parte da rede d’água, construiu pon-
tes, cerca de 300 km de estradas e pavimentou os primeiros 16 km,
conforme revelou em relatório. Incentivou a agricultura e a pecuária.
Promoveu a realização, em diversos municípios, de pequenos açudes.
Em Aracaju, demoliu o morro do Bonfim, facilitando a circulação na
área. Prédios públicos foram levantados. Enfim, proporcionou novo
impulso ao processo de modernização da capital.18 Na educação me-
lhorou os salários dos professores, construiu novas escolas e o Insti-
tuto de Educação Rui Barbosa, mas não provocou inovações como os
dois governos antecessores, especialmente José Leite.
Apesar desses e outros feitos, o governo Leandro Maciel embaraçou-
-se na questão da violência. Se, ao assumir a direção da sociedade
política, já pesava sobre o cidadão Leandro Maciel acusações de atos
truculentos,19 a imagem de violento e cruel foi-se firmando a partir
do momento em que operou a substituição da direção da máquina
burocrática pessedista para udenista. Com o fim de enfraquecer os
adversários, penalizava numerosos funcionários subalternos através
de sucessivas transferências, retomando os mesmos métodos aplicados

18
Ver Leandro Maciel. Mensagem apresentada por ocasião da abertura da sessão ordinária de
1958. s/d.; Prestação de Contas. Diário Oficial do Estado de Sergipe, 30.01.59; Correio de Aracaju,
1955-58.
19
Cf. Correio de Aracaju, 21.05.1955.

156
História de sergipe: república

pelos pessedistas, sobretudo no governo de Arnaldo Garcez. Quando


o acerto de contas era encetado, foi assassinado em Ribeirópolis o
prefeito Josué Modesto dos Passos. Para os udenistas, esse crime soou
como provocação brutal. Até então as vítimas fatais tinham sido figu-
ras de menor prestígio político-social, mas quando a UDN ascendia ao
governo do Estado, dez anos depois de sua fundação, era golpeada com
a morte de um ex-deputado estadual. Chefe político daquele município,
o governante estava no quarto mês de gestão. Era um desdobramento
de lutas locais entre duas famílias que se rivalizavam: a dos “Ceará” e
a dos Passos. A primeira, vinculada ao PSD, a segunda à UDN.
Diante da indignação geral dos udenistas, o governo desencadeou
a busca aos supostos criminosos numa perseguição desenfreada e,
por si, arbitrária. Sob ação de uma polícia despreparada, ocupou o
município de forma abusiva, estabelecendo insegurança entre os
pessedistas. Em contraposição, os adversários desenvolveram seus
esquemas de denúncias contra o governo Leandro Maciel, levando
Ribeirópolis a viver sob intervenção do Exército de março de 1957 até
o fim da gestão daquele governante.
A imagem de administração violenta acentuou-se na medida em
que chefes políticos de outros municípios também abusavam do res-
paldo do governador para penalizar adversários. Como a Justiça se ma-
nifestava em regra conivente ou impotente, a força continuava sendo
o recurso mais eficiente para a resolução de embates. A situação local
agravou-se com o assassinato, em Aracaju, do prestigioso médico Carlos
Firpo, vinculado à UDN. Não obstante as controvérsias sobre os motivos
do fato, o rumoroso processo de apuração não deixou de tumultuar
o ambiente. Falou-se muito em insegurança, mas não encontramos
registros de atos contra o pessoal da imprensa, apesar das denúncias
mais gritantes e das campanhas mais apaixonadas desenvolvidas pelos
órgãos de oposição, entre os quais o Diário de Sergipe, jornal do PSD,
e a Gazeta Socialista, órgão do PSB. Criada em 1948, a Gazeta Socialista
entrou em recesso em 1951 e somente reapareceu cinco anos depois, ou
seja, em janeiro de 1956, contando com uma plêiade de jovens intelec-
tuais, a maioria de tendência nacionalista e alguns simpatizantes do

157
Ibarê Dantas

socialismo. Na chefia, Orlando Dantas imprimiu orientação de análises


e denúncias contundentes, especialmente das práticas dos udenistas,
dos quais não aceitava nem divulgar suas versões.
Quanto à relação do primeiro governo Leandro Maciel com as
classes subalternas, há dois lados a considerar. Primeiro, não se pode
negar que, no processo de competição política conflituoso, os mais
penalizados foram realmente os setores populares, sobretudo aque-
les mais envolvidos na militância partidária da aliança PSD+PR. Por
outro lado, os trabalhadores urbanos, ao contrário do ocorrido nos
dois governos anteriores, não foram molestados em seus movimentos
sindicais, quaisquer que fossem suas tendências ideológicas. Exerceu
relacionamento amistoso com as lideranças dos diversos grupos de
culto afro-brasileiro e facilitou o acesso de homens do “povo” ao Palá-
cio, muitas vezes sem hora determinada nem protocolo para recebê-
-los. No que se refere aos trabalhadores urbanos, o governo manteve-os
como aliados, prestigiando o Centro Operário Sergipano, auxiliando
sindicatos, assegurando-lhes conquistas20 e proporcionando-lhes li-
berdade de atuação. Não foi por acaso que o Centro Operário tributou
a Leandro Maciel uma homenagem, considerando-o “credor do apoio
dos operários sergipanos”.21
Integrando os trabalhadores urbanos ao processo político, os
udenistas preparavam-se para a sucessão governamental. Para essa
empreitada, a UDN dispunha de vários quadros habilitados. A esco-
lha pessoal de Luiz Garcia deixou descontentamentos e sequelas nas
relações com alguns correligionários. Na seara do PSD, como nome de
consenso relançaram José Rolemberg Leite. Os dois principais partidos
se defrontavam com os mesmos candidatos que concorreram em 1947.
Enquanto isso, o PTB de Francisco de Araújo Macedo apresentava-o
pela segunda vez num momento de declínio. O PCB, embora ainda
na ilegalidade, a exemplo do que ocorrera em outras oportunidades,
apoiou o candidato udenista. Abertas as urnas, deu-se a desforra de

20
Cf. Seixas Dória. Eu, réu sem crime. Rio de Janeiro: Equador, s/d, p. 93.
21
Cf. Correio de Aracaju, 11.04.1959.

158
História de sergipe: república

1947. O controle do aparato administrativo estadual, envolvendo a


maior parte das Prefeituras e parcela do Judiciário, facilitava o re-
sultado favorável em quase todos os níveis. Nas Prefeituras, então, o
recuo dos pessedistas foi grande.
Quando Luiz Garcia assumiu o governo do Estado de Sergipe, para
o mandato de quase quatro anos (31.01.1959 a 06.06.1962), pelas mãos
do seu chefe político, Leandro Maciel, o pacto populista no âmbito
nacional, firmado na aliança PSD-PTB, começava a ingressar em
nova fase de dificuldades. Depois da crise de 1954, que levou Vargas
ao suicídio, a UDN, associada a oficiais da ESG, tentou implementar
um novo projeto político, que foi interrompido com o afastamento
definitivo de Café Filho da Presidência da República em novembro
de 1955. A eleição da chapa Juscelino-Jango e, sobretudo, a posse
assegurada pelo general Lott, em 31 de janeiro de 1956, recuperou o
domínio da aliança PSD-PTB. O projeto populista foi retomado, mas
sob a inspiração do modelo do nacional-desenvolvimentismo. Den-
tro dessa nova orientação, o governo JK promoveu um Programa de
Metas, que resultou no reforço do papel do Estado e na redefinição do
conceito de nacionalismo, enquanto passou a ser compreendido como
fortalecimento nacional, através de uma política de desenvolvimento
inclinada a uma maior integração com o sistema internacional.22 Os
êxitos do Programa de Metas foram inegáveis, como atestam os altos
índices de crescimento do PIB. O país ingressou na fase da industria-
lização pesada, quando se completaram as bases técnicas necessárias
à autodeterminação do capital.23 Mas esse progresso contribuiu tam-
bém para acentuar as contradições estruturais.
Quando começou o segundo governo da UDN em Sergipe, em
janeiro de 1959, o quadro político nacional estava agitado. O debate
ideológico intensificava-se, a aliança PSD-PTB perdia terreno, os par-
tidos, divididos em blocos suprapartidários, careciam de unidade de

22
Ver Míriam Limoeiro Cardoso. Ideologia do Desenvolvimento no Brasil: JK-JQ. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1977, p. 157-8.
23
Cf. João Manuel Cardoso de Melo e Luís Gonzaga de Melo Beluzzo. Reflexão sobre a crise
atual in Escrita Ensaio. SAFA LTDA, Ano I, n. 2, 1977, p. 19.

159
Ibarê Dantas

comando, enquanto, no Nordeste, os movimentos sociais avançavam


na mobilização. O governo Luiz Garcia,24 embora tendesse a seguir
a orientação do primeiro domínio udenista, apresentou algumas
diferenciações significativas, tanto pelo seu estilo pessoal quanto
pelas repercussões da conjuntura política nacional e regional. Tendo
participado do movimento pela fundação da UDN, foi seu primeiro
candidato a governador (1947), quando perdeu para José Rolemberg
Leite. Em 1950, elegeu-se deputado federal e foi reeleito em 1954.
Quatro anos depois, foi indicado por Leandro Maciel como seu su-
cessor e o partido homologou seu nome. Embora seus irmãos, Carlos
e Robério, se tornassem militantes comunistas; e Antônio, defensor
do socialismo com liberdade; Luiz Garcia amoldou-se ao capitalis-
mo, adotando um liberalismo moderado, distanciando-se tanto das
práticas entreguistas quanto do combate fanático ao comunismo. De
Leandro Maciel, seu mestre e companheiro, assimilou o pragmatismo,
a valorização do clientelismo e, em menor proporção, a subestimação
das questões ideológicas. Não dispunha da engenhosidade, da astúcia
e da capacidade de liderança do seu chefe, em contrapartida era uma
figura mais civilizada nos seus métodos políticos. Em sua longa carreira
política, manifestou-se pragmático, oscilando entre o conservadoris-
mo e a modernização social.25 Conveniente diante das forças políticas
dominantes, preferiu sempre a prudência em vez da audácia.
Já encontrando a máquina político-administrativa estruturada,
sob o predomínio de seus correligionários udenistas, manteve-a, mas
imprimiu a sua feição pessoal ao governo, a começar pela formação do
seu secretariado, com forte presença familiar, com alguma tendência

24
Nascido em 1910, filho de um tabelião do município de Rosário do Catete (SE), Luiz Garcia
vinha de uma família de classe média. Ascendeu auxiliado por Leandro Maciel e fez carreira
política como seu aliado leal. Em 1934, participou da fundação do PSD de Sergipe e, neste
mesmo ano, foi eleito deputado à constituinte estadual. Durante o Estado Novo esteve à
frente do Correio de Aracaju.
25
O termo modernização aparece aí como processo de transformação, compreendido por
mobilização social, diferenciação e laicização, afetando costumes e modificando valores. Cf.
Lia Pinheiro Machado. Alcance e limites das teorias da modernização in José Carlos Garcia
Durand e Lia Pinheiro Machado. Sociologia do Desenvolvimento II. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.

160
História de sergipe: república

ao nepotismo. Apesar disso, revelou-se modernizador e, preocupado


com uma política de desenvolvimento em debate na época, criou ór-
gãos de grande importância para superar o quadro vigente. Fundou
o Conselho de Desenvolvimento de Sergipe (Condese) em março de
1959, o Banco do Fomento Econômico de Sergipe, a Energipe e o Centro
de Reabilitação. A fim de proporcionar uma melhor infraestrutura
aos serviços da capital, promoveu a construção de hotel amplo e
moderno (Palace), assim como a Rodoviária, estruturou o Instituto
de Previdência do Estado de Sergipe (IPES), destinado aos servidores
estaduais, ampliou o aeroporto, apoiou decisivamente a criação da
Faculdade de Medicina, ajudou na ampliação da rede escolar, criou a
secretaria da Educação, Cultura e Saúde e incentivou escritores e artis-
tas, contribuindo para o enriquecimento do movimento cultural. Deu
continuidade à ampliação das rodovias, dos serviços hidráulicos e de
energia. O Condese, recém-criado, promoveu a formação de grupos de
trabalho, animando políticos e, sobretudo, empresários. Renovavam-se
as esperanças de exploração do sal-gema, anunciava-se a descoberta
de petróleo em Pacatuba e a chegada a Sergipe da fábrica de cimento.
Entretanto, de suas metas – “Petróleo, Cimento, Sal-Gema” – somente
a produção de cimento ocorreria durante a sua gestão.
De qualquer forma, o governo Luiz Garcia foi-se inclinando para
a orientação desenvolvimentista, ao tempo em que reafirmava o
relacionamento amistoso do seu antecessor com os trabalhadores
urbanos, configurado inclusive por apoio material aos órgãos de clas-
se. Em reconhecimento, o Centro Operário Sergipano atribuiu à sua
escola o nome de sua esposa, Emília Pinto Garcia, e posteriormente
tributou ao governador nova homenagem, indicando que os laços
dos udenistas com os trabalhadores se estreitavam num momento
de expansão do domínio populista.26

26
João Nunes da Silva afirmou: “O Centro Operário Sergipano sente-se honrado em homenagear
um governador democrático, humano e justo”. A seguir enumerou entre suas realizações: a)
liberdade de ação dos trabalhadores, b) criação de escolas de corte, costura e bordados. Por
fim, concluiu: “Os trabalhadores sergipanos reconhecem em Luiz Garcia um seu verdadeiro
amigo”. Correio de Aracaju, 02.05.1962.

161
Ibarê Dantas

Tais manifestações indicavam, por parte do governo, uma postura


pragmática que via, no relacionamento amistoso com os trabalhado-
res, uma forma mais adequada de convivência política, na medida
em que ajudava a construir sua legitimidade e facilitava alguma
forma de controle. Apesar disso, no transcurso do segundo governo
da UDN, o partido situacionista tendeu a perder popularidade na
capital. Embora o PSD tenha abdicado do seu órgão oficial, o Diário
de Sergipe, alienando-o, a Gazeta de Sergipe firmou-se como o jornal
mais combativo e corajoso, exercendo grande influência, concorrendo
para o desgaste do domínio da UDN. O partido situacionista tinha
a seu favor o Diário Oficial, o Correio de Aracaju e a Folha Popular,
sendo este de tendência comunista. Entretanto, os três juntos não
conseguiram superar a influência da Gazeta. Além disso, a coligação
PSD-PR dispunha da Rádio Jornal, que levava ao ar um programa
extremamente irreverente, denominado Risolândia, no qual criti-
cava e ridicularizava todo o grupo governista, inclusive autoridades
policiais. Em reação a essas críticas, ocorreu a agressão a jornalista,
trazendo mais problemas ao governo, já em dificuldades diante do
relacionamento crítico com o prefeito da capital. Líder populista
agressivo, José Conrado de Araújo, gozando de popularidade junto às
classes subalternas da periferia de Aracaju, em mais de uma ocasião,
tentou desafiar a autoridade do governador, criando-lhe situações
embaraçosas e desgastantes. Enquanto isso, formava-se na Assembleia
um Bloco de Ação Parlamentar adverso, constituído pelas bancadas
do PSD, do PR, e por um dissidente do PTB e outro da UDN.
Contudo, o eixo competitivo PSD x UDN, que até então balizava
o posicionamento das forças políticas locais, começou a embaralhar
na campanha para presidente da República, em 1960, quando Jânio
da Silva Quadros disputava com o marechal Henrique Teixeira Lott.
Este candidato se comunicava precariamente com as massas. Todavia,
pelo seu passado de nacionalista firme e enérgico, inclusive contra os
conservadores da UDN, despertou, em Sergipe, ponderável movimen-
to de apoio à sua candidatura. Formou-se então um leque de partidos
de respaldo ao seu nome, envolvendo PSD + PR + PSB + PTB + PRP +

162
História de sergipe: república

PCB, estimulado inclusive pela campanha da Gazeta de Sergipe, que


sempre enaltecia as iniciativas consideradas nacionalistas. O PSD
e o PR, embora marcados pelo conservadorismo, acompanharam o
candidato Lott, enquanto a UDN ficou praticamente isolada, pois os
minúsculos partidos que a acompanhavam tinham restrita significa-
ção eleitoral. Daí o resultado adverso para o candidato Jânio Quadros,
que perdeu em Aracaju e no Estado de Sergipe.
Jânio Quadros, que fora eleito com projeto moralizador, revelou-
-se incapaz de administrar os problemas nacionais. Suas medidas
contraditórias, oscilando em cortejar simultaneamente a esquerda
(com a política externa e a liberdade cambial) e o centro (com a mo-
ralização administrativa), agravaram as contradições. Encontrando
dificuldades em ampliar seus poderes para realizar um governo fran-
camente autoritário, renunciou nove meses após a posse, deixando o
eleitorado perplexo e a UDN frustrada.
A recusa dos militares em dar posse ao vice, João Goulart, resul-
tou na criação do movimento de resistência, formando-se a Cadeia
da Legalidade, por iniciativa do governador do Rio Grande do Sul,
Leonel Brizola, com o apoio do general Machado Lopes, comandante
do III Exército. Diante dessa divisão de forças nos vários Estados, os
diversos grupos político-sociais passaram a expressar suas posições.
Em Sergipe, formou-se amplo movimento pelo cumprimento
dos preceitos constitucionais, favorável, portanto, à posse do subs-
tituto legal. Mas esse posicionamento colidiu com as pretensões de
autoridades do Exército que serviam em Aracaju. A União Estadual
dos Estudantes de Sergipe (UEES), órgão dos estudantes do terceiro
grau, lançou manifesto condenando os que levaram o presidente à
renúncia e conclamando as entidades de classe a se pronunciarem
contra a violação da Constituição. Reuniões sucederam-se entre
vários órgãos, greves foram ensaiadas, chegando os estudantes
secundários a realizar manifestações públicas. Comércio, bancos e
escolas fecharam, enquanto a Assembleia Legislativa declarou-se em
sessão permanente, solidarizando-se com a Cadeia da Legalidade. As
principais autoridades constituídas do Estado (governador, arcebispo,

163
Ibarê Dantas

presidente da Assembleia, líderes de diversas correntes partidárias)


reuniram-se no Palácio do Governo e emitiram nota na qual mani-
festavam esperanças na obediência à Constituição.27
Enfim, as manifestações de vários setores da sociedade sergipana
pelo respeito à Constituição, se por um lado expressavam aspiração
por um projeto democratizante, por outro acentuaram o fosso com
oficiais do Exército. A superação do impasse político, através da emen-
da constitucional, instaurando a forma de governo parlamentarista,
aparentemente superou a crise, mas alimentou indisposições das
Forças Armadas, sobretudo com o movimento popular. Formalmente,
aceitaram o acordo, recolhendo-se aos quartéis, mas uma ala consi-
derável passou a preparar-se para uma ação mais efetiva. Com João
Goulart no governo, a polarização entre as forças sociais de direita e
esquerda, que vinha crescendo de há muito, acelerou-se, refletindo-se
inclusive na sucessão governamental.
O primeiro nome da UDN a ser aventado como candidato foi
o de Leandro Maciel, cujo prestígio continuava elevado no seio da
agremiação situacionista. Inquieto, astuto e bem articulado, ao dei-
xar o governo, continuou mantendo contatos com as lideranças do
partido, no âmbito nacional, participando de encontros e dos enten-
dimentos com vista à sucessão presidencial. Desses contatos nasceu
o chamado “Encontro de Aracaju”, reunindo lideranças expressivas
da UDN.28 Era uma tentativa de estabelecer um entendimento sobre
o candidato à sucessão presidencial. Justamente nessa reunião de
líderes, Leandro Maciel teve seu nome lançado como candidato a
vice-presidente e, na convenção nacional, concorreu com Fernando
Ferrari, homem dinâmico do Rio Grande do Sul, fundador do Partido
Trabalhista Renovador (PTR). Mas o político sergipano venceu-o por

27
Sobre esses episódios, ver José Lopes Bragança. Sergipe por um óculo. Belo Horizonte: Carneiro
e Cia, s/d.
28
Participaram das discussões: Leandro Maciel, presidente da UDN de Sergipe e os
governadores Luiz Garcia (SE), Cid Sampaio (PE), Dinarte Mariz (RN), Juracy Magalhães
(BA), Magalhães Pinto (MG), então presidente nacional da UDN, o presidente da UDN da
Bahia, Albérico Fraga e Jânio Quadros. Ver foto dos participantes na Revista da Associação
Sergipana de Imprensa, Aracaju, 31.12.60, n. 3, p. 92.

164
História de sergipe: república

um voto, enquanto Jânio Quadros derrotava Juraci Magalhães em


disputa acirrada.
Iniciada a campanha, num momento em que as divisões internas
no partido continuavam acentuadas, alguns correligionários pas-
saram a fazer restrições ao nome de Leandro Maciel. Entre os mais
insatisfeitos estava o próprio Jânio Quadros que, pressionado a iniciar
os comícios ao seu lado no Acre, renunciou subitamente à candidatu-
ra e desapareceu, provocando grande rebuliço nas hostes udenistas.
Uma vez localizado, Jânio foi persuadido a reconsiderar seu gesto e
Carlos Lacerda encarregou-se de bombardear a candidatura do polí-
tico sergipano. Carente de respaldo, Leandro Maciel renunciou (abril
de 1960) e foi substituído pelo conceituado político mineiro Milton
Campos. Em 1960, o governador Luiz Garcia nomeou-o presidente da
Energipe, mas logo depois o presidente Jânio Quadros indicou-o para
presidente do Instituto do Açúcar e do Álcool e aí permaneceu até
setembro de 1961. Com seu nome projetado, voltou a candidatar-se à
sucessão governamental naquele ano. Ocorre que, a essa altura, suas
decisões já não encontravam o acatamento de outrora. Entre aqueles
correligionários que consideravam inoportuna a sua postulação e
almejavam candidatar-se, estava o deputado João Seixas Dória, que
muito se destacara na Assembleia, no Congresso e na campanha de
Jânio Quadros à Presidência. Foi nesse momento que o grupo da Gazeta
de Sergipe mobilizou-se, articulou-se com lideranças do PSD, do PR e,
juntos, costuraram uma ampla coalizão partidária, então denominada
de “Esquema”, somando forças de oposição e da situação. PSD e UDN,
as duas maiores agremiações, que vinham se rivalizando desde 1945,
dividiram-se e formaram duas coalizões heterogêneas. De um lado, a
Aliança Nacional Trabalhista (ANT), envolvendo a UDN, o PTB, o PST,
parte do PSP e a dissidência do PSD. Do outro lado, a denominada
Aliança Social Democrata (ASD), formada pelo PSD, PR, PRT, PSB,
PDC, e, por fim, pela dissidência da UDN, liderada por Seixas Dória,
candidato a governador, que terminou vitorioso.
Em resumo, durante o domínio udenista em Sergipe (1955-63),
o Estado Populista transitou de uma crise (sucessão de Vargas) a

165
Ibarê Dantas

outra (sucessão de Jânio Quadros). Neste período, a cúpula da UDN


frustrou-se em dois momentos: quando tentou implementar um
projeto político alternativo liberalizante via Café Filho e Carlos Luz,
e depois, quando fez de Jânio Quadros seu presidente. Enquanto
isso, os governos estaduais foram enquadrando-se nos padrões de
dominação populista. Em Sergipe, a atuação da UDN, de certo modo,
correspondeu a uma atualização ou a uma tentativa de adequação
do projeto político da classe dominante local aos padrões nacionais,
na medida em que reproduziam as tendências populistas. De um
lado, na valorização do ideário desenvolvimentista e, de outro, na
aproximação com os trabalhadores urbanos. Durante esse tempo, a
violência acentuou-se num primeiro momento para depois diminuir.
O debate político ideologizou-se mais, o partidarismo contaminou
todas as instituições, firmado no clientelismo vigoroso, sobretudo no
interior, com a política de carta branca aos coronéis. Enfim, a UDN,
que atualizara o projeto político dentro dos parâmetros populistas,
não foi capaz de continuar adequando-se ao projeto reformista em
expansão em âmbito nacional. Mas um dissidente tentaria incorpo-
rar-se a esse ideário.

3.1.4 O Domínio da ASD: Seixas Dória e a Derrocada do Estado Populista (1962-1964)

A crise de hegemonia, que marcou o domínio populista no âm-


bito nacional, acentuou-se, no início dos anos sessenta, de forma
irremediável. Quando João Belchior Marques Goulart assumiu a
Presidência, com poderes restringidos pela alternativa parlamenta-
rista, recebia uma herança de difícil administração. Primeiramente,
tinha contra si as indisposições dos conservadores (militares e civis),
que abominavam sua atuação de líder populista controlador da
máquina previdenciária. Sua gestão no Ministério do Trabalho, de
onde saíra, aliás, sob pressões, figurava como referencial sempre
lembrado. Na esfera econômica, após o boom desenvolvimentista
do governo JK, restou a pressão inflacionária de difícil contenção.
No campo político, respaldava o governo uma base partidária pre-

166
História de sergipe: república

cária. Os partidos conservadores se enfraqueciam no Congresso. A


aliança PSD-PTB já não dispunha da consistência de outrora. Além
dos grupos suprapartidários que inibiam as orientações das lide-
ranças, a polarização ideológica se acentuava, aumentando o fosso
entre esquerda e direita, tornando as negociações mais difíceis e as
contradições mais visíveis.
Por esse tempo, a ideologia do nacionalismo, que já era antiga
entre nós, passou a ser retrabalhada e ganhou força e maior senti-
do com sua associação com desenvolvimento, através do processo
de industrialização, no qual as empresas estatais desempenhavam
papel fundamental. Em contraposição à ideia de nação, surgia à de
antinação, identificada com o imperialismo e seus aliados, fator da
dependência. Para superá-la, fazia-se necessária a atuação das classes
dentro de uma política que levasse o Estado a fortalecer o mercado
interno, substituir as importações e conquistar a emancipação. A
grosso modo, esse era o modelo nacional-desenvolvimentista que
apresentava variações conforme a corrente política e o momento.
Com a criação do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), no
Rio de Janeiro em 1955, um grupo de intelectuais passou a discutir
em conjunto os problemas nacionais e muitos livros foram editados
com as versões desse projeto, alcançando grande repercussão em todo
território nacional. Em Sergipe, muitas pessoas acompanhavam as
publicações e, de modo geral, passaram a repetir seus enunciados.
Os jornais, entre eles o Correio de Aracaju, e, mais especialmente a
Gazeta de Sergipe, estavam integrados nessa corrente de pensamento.
As maiores discordâncias radicavam na forma de romper com as
amarras do subdesenvolvimento. Alguns acreditavam na via pacífica,
outros na violenta. Em um ponto parecia haver acordo: a necessida-
de de educar o povo para a grande transformação. Esse processo de
instrução envolvia também a conscientização como superação do
estágio de alienação, termo muito usado nesse momento.
Diante desse quadro, João Goulart, ao assumir a Presidência em
setembro de 1961, passou a perseguir dois objetivos: realizar um
projeto político que respondesse às demandas sociais e restaurar os

167
Ibarê Dantas

plenos poderes do presidencialismo.29 O plebiscito de 01/1963 restituiu


o presidencialismo, mas o projeto reformista encontrou dificuldades
na sua implementação.
Em Sergipe, o governador João de Seixas Dória tentou integrar-se
nessa política reformista.30 Antes havia participado da Frente Parla-
mentar Nacionalista, onde atuou com audácia, tomando iniciativas
que encontravam repercussão, despertando a simpatia dos jornalistas
do Congresso. Incorporou-se à campanha para eleição de Jânio Qua-
dros, servindo para amenizar os ataques da esquerda nacionalista
engajada na campanha do marechal Lott, e ampliou seu prestígio.
Ao chegar ao governo, Seixas Dória encontrou o Estado em
situação financeira difícil.31 Após substituir o aparato administra-
tivo, que por oito anos estivera sob o controle da UDN, o governo
dedicou-se à melhoria da situação financeira. Inicialmente, dentro
de uma orientação de austeridade e moralização administrativa,
demitiu os funcionários contratados a partir de setembro de 1962,
nomeou comissões (de tombamento e de inquérito administrativo),
estabeleceu medidas contra o jogo e exigiu dos promotores e juízes a
fixação de residência nas comarcas.32 Apesar do escrúpulo no uso do
dinheiro público, associado às medidas de austeridade, as dificuldades
econômico-financeiras persistiam, agravadas pela seca que grassava
no Estado. Para minorar a situação, o chefe do Executivo sergipano
recorreu ao governo federal, ao tempo em que procurava demonstrar
sua identificação com o projeto reformista. Internamente, quando

29
Cf. Wanderley Guilherme dos Santos. Sessenta e quatro: Anatomia da Crise. São Paulo: Vértice,
1986, p. 62.
30
Nascido no município de Propriá, em 1917, Seixas Dória como estudante foi simpatizante
do integralismo. Formou-se em direito, ocupou a Secretaria da administração financeira
da Prefeitura durante a interventoria do coronel Freitas Brandão, logo após o Estado Novo.
Eleito deputado estadual por duas legislaturas consecutivas (1947-1951), foi líder da UDN na
Assembleia por um quatriênio e dirigiu o Correio de Aracaju durante oito anos. Destacando-
se como parlamentar e jornalista atuante, candidatou-se a deputado federal em 1954. Na
Câmara dos Deputados, prosseguiu em sua carreira ascensional, combinando o dinamismo
ao engajamento na campanha nacionalista em expansão.
31
Sobre essa questão, consultar Gazeta de Sergipe, 19.2.1963 e 30.3.1963.
32
Ver J. Pires Wynne. História de Sergipe (1930- 1972). Rio de Janeiro: Pongetti, 1973, p. 267.

168
História de sergipe: república

discursava, não perdia oportunidade de exercitar sua retórica, por


vezes permeada com frases de efeito sensacionalista. Na Assembleia
Legislativa, anunciou um governo revolucionário, capaz de sacudir
velhos métodos e preconceitos. Em outra oportunidade, advertiu
sobre o perigo das massas famintas. Posteriormente, no ensejo da
inauguração do Banco de Fomento do Estado de Sergipe, falou de
seus planos de “retalhamento do latifúndio estático”, obrigando “o
dinâmico a pagar salários justos”.33 Nos discursos proferidos fora do
Estado, sua retórica se apresentava mais incandescente, fosse em Belo
Horizonte, em Recife ou Salvador. Contudo, seu pronunciamento de
maior repercussão foi no famoso comício de 13 de março, no Rio de
Janeiro, quando anunciou bombasticamente que, ao retornar a Ser-
gipe, iria fazer a reforma agrária. Além das falas, algumas medidas
efetivas vinham sendo encetadas, inclusive por algumas secretarias,
entre as quais se destacava a de Educação e Cultura, que refletiu os
tempos excitantes do entusiasmo nas mudanças. Seu secretário de
Educação juntou-se ao movimento de mobilização, de forma a acelerar
o processo de alfabetização e educar as massas, sem perda de tempo.
Utilizando-se de verbas de convênios com a USAID e do governo
federal, incentivou e/ou incorporou-se às campanhas de educação
popular, desde as experiências preliminares do método Paulo Freire
até as atividades do Centro Popular de Cultura (CPC) que percorreu
vários municípios, encenando suas peças com a inflamada participa-
ção estudantil. Visando a uma maior frequência escolar das crianças
do meio rural, alterou o calendário escolar de forma que a oferta de
aulas coincidisse com as entressafras. Além disso, criou o Conselho
Estadual de Educação, bem como uma comissão objetivando a criação
da Universidade Federal de Sergipe.34
Em relação à pacificação do Estado, o governo Seixas Dória não foi
bem-sucedido. Depois de fazer sua campanha a partir do slogan “Paz e
Prosperidade”, começou o governo declarando “paz a qualquer preço”,

33
Gazeta de Sergipe, 02.03. 1963, 27.04.1963, 05.01.1964.
34
Cf. Luís Rabelo Leite, depoimento ao autor, em 26.06.1988.

169
Ibarê Dantas

mas, no mesmo dia da declaração, era assassinado o chefe político da


UDN do município de Malhada dos Bois.35 Embora a grande parte dos
udenistas não lhe criassem problemas na fase inicial, o chefe político
de Itabaiana resistia a seu modo. Arbitrário, continuou a ameaçar juí-
zes e a ignorar leis como fizera no governo findo. Perdendo o controle
da força policial do município, criou uma guarda municipal, gerando
naquela cidade dualidade de poder. A rivalidade entre as duas forças
policiais resultou em choque e na morte do comandante da força
policial que servia naquele município. A corporação ressentiu-se e
julgou-se mais agravada quando a Justiça concedeu habeas corpus aos
acusados da guarda municipal. Esta foi dissolvida, o contingente poli-
cial de Itabaiana foi reforçado e, por ocasião de uma passeata, a força
policial metralhou o poderoso chefe político de Itabaiana Euclides
Paes Mendonça, então deputado federal, e seu filho, deputado esta-
dual Antônio de Oliveira Mendonça, que tiveram morte instantânea.
O líder da UDN, deputado Gilton Garcia, responsabilizou o governa-
dor pelos acontecimentos trágicos.36 O Diário de Aracaju, jornal do
grupo udenista, insistiu na punição dos culpados. Uma comissão do
Congresso veio a Sergipe investigar o acontecimento. Foi instaurado
processo, mas ninguém foi condenado.37
A maior fonte de inquietação, porém, veio da mobilização nacio-
nal a partir do projeto das reformas de base, proposto pelo governo
federal. Entre essas reformas, a agrária era a que provocava maiores
discórdias, envolvendo a Igreja Católica e todos os grupos de esquerda,
PCB (Partido Comunista Brasileiro), PC do B (Partido Comunista do
Brasil), uma dissidência do PCB surgida em 1962 alinhada ao stali-
nismo, a Política Operária (POLOP) inspirada no trotskismo, a Ação
Popular (AP) buscando uma terceira via, dentro de um processo de
atualização histórica. A ação esquerdista ganhou maior autoconfiança
com a ação da Frente de Mobilização Popular (FMP), que nasceu em

35
Cf. Gazeta de Sergipe, 06.2.1963.
36
Cf. Gazeta de Sergipe, 13.8.1963.
37
Ver José Ibarê Costa Dantas. Coronelismo e Dominação. Aracaju: Diplomata/UFS, 1987.

170
História de sergipe: república

1962, aglutinando várias entidades de esquerda (CGT, PUA, UNE),


proporcionando mais força ao chamado bloco popular, acirrando
a luta de classes, cada um propondo a sua própria Revolução. No
conjunto, segundo Eduardo Viola, havia três propostas básicas de
transformação da sociedade brasileira, a partir das lideranças mais
expressivas: uma reformista limitada, encabeçada por Goulart, que
tendia a conciliar-se com o sistema de dominação estabelecido; outra,
reformista profunda, encabeçada por Arraes, que abarcava toda a
camada de esquerda e se propunha a uma longa guerra de posições
no caminho para uma sociedade socialista. A terceira era encabeçada
por Brizola, com forte peso do movimento estudantil, acreditando na
iminência de uma revolução radical do tipo da cubana.38
Em Sergipe, a partir de 1963, Seixas Dória era a principal lide-
rança que galvanizava as transformações do movimento popular.
Respaldado pela coalizão que o elegeu, tinha também o apoio crítico
do Partido Comunista Brasileiro (PCB).
Se, no entanto, antes eram vistos como perigosos vermelhos re-
volucionários, em 1963 e início de 1964 os adeptos do PCB passaram a
ser taxados de reformistas ultrapassados e “reboquistas” pelas novas
siglas que surgiam, entre as quais a AP, que, desde o ano de 1962, co-
meçou a irradiar-se, sobretudo entre o movimento estudantil, com
propostas radicais. Infiltrou-se no MEB e, junto a ele, atuou como
grupo de vanguarda, influenciando nos textos radiofônicos e atuando
nos sindicatos rurais criados com o apoio da Igreja. Apesar de inician-
te no movimento popular, o grupo da AP tornou-se o mais agressivo
de todos quantos atuaram em 1963 e início de 1964, contribuindo
muito para excitar os ânimos e alimentar a fé na vitória das forças
populares. Menor influência teve em Sergipe a POLOP. Nos últimos
meses de 1963, passou a atuar no movimento estudantil, difundindo
seu ideário através de seu jornal Política Operária. Foi também em fins
de 1963 que os primeiros militantes do PC do B começaram a atuar

38
Eduardo J. Viola, Formas de Estado e Formas de Regime no Capitalismo Periférico. Dissertação
de Mestrado. Campinas, S. Paulo, UNICAMP, 1978 (mimeografada), p. 244.

171
Ibarê Dantas

em Sergipe, propagando seu ideário, distribuindo jornais, discutindo


com certa agressividade e pregando a revolução, tida como iminente.
Em início de 1964, o acompanhamento dos acontecimentos nacio-
nais aumentou. Entre os programas de maior audiência, liderava o de
Brizola, em suas pregações desafiadoras pela Rádio Mayrink Veiga,
servindo de tema de conversa no dia seguinte. O Comando Geral dos
Trabalhadores (CGT) figurava entre as entidades de maior atenção,
pela sua capacidade de deflagrar as greves nacionais. Em Sergipe,
constituiu-se também seu Conselho Diretor Estadual, começando a
atuar nos movimentos grevistas que ocorriam no Estado, especial-
mente no setor terciário. Alguns de cunho nacional, como a greve
dos bancários, mas outros, embora estimulados pelo clima político
externo, tinham motivações locais. Destes, o de maior dimensão foi
a greve dos professores da rede pública do Estado, que teve o apoio
tanto de setores da Igreja Católica quanto de lideranças do Partido Co-
munista. A partir desse suporte, os professores dos estabelecimentos
particulares, os funcionários públicos e os ferroviários solidarizam-se,
paralisando suas atividades.39 Apesar das proporções que assumiu,
o movimento não chegou a perdurar mais de uma semana. Houve
acordo entre as partes e os serviços voltaram ao normal, com aten-
dimento de algumas reivindicações. Na verdade, a agitação do meio
urbano, especialmente entre os trabalhadores do setor de serviços,
geralmente se diluía com o atendimento de reivindicações na medida
em que persistia alguma margem de manobras a ser explorada.
A questão realmente explosiva, o ponto de discórdia, estava no
campo, e a terra era o objeto da principal luta política. Em Sergipe,
em meio aos discursos, o governador mandou projeto à Assembleia
Legislativa, sob o título de “Colonização”, que regulamentava indeni-
zações e manifestou-se tolerante com relação à invasão da fazenda
Bica.40 Por outro lado, havendo um movimento de conscientização

39
Cf. José Silvério Leite Fontes, depoimento ao autor, 01.06.1988.
40
Sobre o projeto de Colonização, ver Gazeta de Sergipe, 14.01.64. Quanto à questão da Fazenda
Bica, consultar: Seixas Dória. Eu, Réu sem Crime. Rio de Janeiro: Equador, s/d., p. 92-93 e Gazeta
de Sergipe, 10.1.1964 e 21.1.1964.

172
História de sergipe: república

precedente, sob o influxo do MEB, os sindicatos rurais em Sergipe,


entre fins de 1963 e início de 1964, emergiam com certo vigor, animan-
do a mobilização que avançava estimulada, sobretudo, pelos eventos
nacionais. O comício de 13 de março, no Rio de Janeiro, marcado pela
assinatura do decreto de desapropriação das terras às margens das
rodovias, bem como as promessas enfáticas do governador Seixas
Dória na imprensa e na tribuna, trouxeram grande animação às
forças reformistas e revolucionárias. “Ninguém segura esse proces-
so”, asseveravam as lideranças mais triunfalistas. Na esteira desses
acontecimentos, a opção pela invasão das propriedades, a exemplo do
que já vinha ocorrendo em outros Estados do Nordeste, fortaleceu-se.
Algumas tentativas foram realizadas, inclusive no Quissamã, uma fa-
zenda experimental da Escola Agrícola, vinculada ao governo federal,
mas o êxito do caso da Bica não se repetiu.41
Enquanto isso, os proprietários rurais, assustados com os dis-
cursos do governador e com suas expressões de tolerância com o
movimento popular que questionava a propriedade e fazia da reforma
agrária sua bandeira de luta, procuraram se organizar. A partir de
reunião na Federação de Associações Rurais de Sergipe, decidiram
criar o seu sindicato. Num encontro na sede da Associação Comercial,
houve grande comparecimento de fazendeiros, sobretudo da UDN e
do PSD, unidos, acima das diferenças partidárias, identificados pelos
interesses maiores: a propriedade da terra. O evento contou até com
o secretário da Agricultura do governo reformista da Aliança Social
Democrática (ASD), que fez críticas ao governador. Várias propostas
foram aventadas, entre as quais a criação de rádio e jornal em defesa
da propriedade. Finalmente, os proprietários decidiram enviar um
memorial ao governo do Estado, que seria examinado na próxima
reunião marcada para três dias depois. Cerca de duas semanas após,
realizou-se, na cidade de Lagarto, um comício, promovido pela so-
ciedade dos criadores, transmitido pelas rádios Liberdade (UDN) e
Jornal (PSD), e aberto pelo secretário da agricultura, considerando-se

41
Ver José Onias de Carvalho. Memórias de um Matuto Sertanejo. Recife: Inojosa, s/d, p. 57-58.

173
Ibarê Dantas

demissionário, onde a tônica dominante foi o ataque nominal às figu-


ras envolvidas com as reformas. O governador, o bispo D. José Távora,
entre vários líderes menores, eram todos acusados de comunistas,
subversivos, merecedores de reprimendas.42 A essa altura, o clima era
de movimentações tensas. Concentrações de trabalhadores, tentativas
de invasões de propriedades, conflitos dentro de usinas. Acreditava-se
numa situação pré-revolucionária. Enquanto isso, os proprietários
rurais preparavam-se, adquirindo armas. Até os jornais comentavam
sobre a compra “de metralhadoras portáteis e armas curtas”.43
Dos representantes de Sergipe na Câmara dos Deputados, Lourival
Batista era o mais identificado com o movimento de direita e o único
vinculado ao grupo suprapartidário Ação Democrática Parlamentar,
órgão que mantinha interconexão com o Instituto Brasileiro de Ação
Democrática (IBAD), entidade criada para combater o comunismo e
fechada em 1963, acusada de “exercer atividade ilícita e contrária à
segurança do Estado e da coletividade”.44
No Sudeste, as articulações golpistas aceleravam-se. Pelo menos
desde março de 1963, a estratégia política do governo Goulart vinha
revelando-se desastrosa. As reações da maioria dos congressistas,
impedindo a institucionalização das reformas, levou-o a buscar o
apoio de determinados grupos mobilizados da sociedade civil (CGT,
FMP, UNE), que, aliás, desconfiavam de suas ações, exigindo, inclu-
sive, definições prévias. Promovendo greves sucessivas, nem sempre
justificáveis, discursos triunfantes e/ou insolentes, as lideranças mais
açodadas proporcionavam pretextos para que as forças de direita
desenvolvessem a luta ideológica, falassem de guerra revolucionária
e acelerassem as conspirações. A ideia de comícios monstros ainda
mais atemorizou os conservadores (civis e militares), levando-os a

42
Gazeta de Sergipe, 17.03.1964.
43
Gazeta de Sergipe, 29.02.1964.
44
Israel Beloch e Alzira Alves de Abreu (coords). Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro, 1930-
1983. Rio de Janeiro: Forense Universitária, FGV/CPDOC, FINEP, 1984, v. 2, p. 1.604. Sobre a
Ação Democrática Parlamentar e seu representante em Sergipe, ver René Armand Dreifuss.
1964: A Conquista do Estado - Ação Política, Poder e Golpe de Classe. Petrópolis, RJ: Vozes, 1981,
p. 319-322.

174
História de sergipe: república

articulações cada dia mais amplas. Velhos políticos, com projetos


divergentes, como Ademar de Barros e Carlos Lacerda, juntaram-se
com o fim do que denominavam de combater o caos. As bases políticas
governistas tornaram-se mais precárias do que nunca com o afasta-
mento do PSD, tradicional fiador do projeto populista. Na sociedade
civil, classistas patronais, grupos femininos (CAMDE), parte da Igreja
Católica, imprensa, associações diversas, todos foram formando a
grande corrente de reação, sob a coordenação maior do Instituto de
Pesquisa e Estudos Sociais (IPES), soldando os setores militares e civis
e acoplando-se aos interesses do grande capital interno e externo.
As revoltas dos sargentos e dos marinheiros, de um lado, levavam
alguns ao devaneio de estabelecer analogia com a Revolução Russa
e, por outro, indispunham decisivamente as Forças Armadas com o
movimento popular, diante da quebra de hierarquia.
Confiante num sistema de informação e de segurança ineptos e
ineficazes, o governo, isolado e debilitado, não se dispôs a enfrentar as
forças de reação. Num último discurso provocante, Goulart apressou
a deflagração do movimento militar contrarrevolucionário, que con-
tou com o apoio expressivo de parte da sociedade civil, identificada
na defesa da ordem e da propriedade. Quando as tropas do Exército,
sediadas no Estado de Minas Gerais, começaram a descer para o Rio
de Janeiro, o governador de Sergipe, ainda entrou em contato com seu
correligionário, o governador Magalhães Pinto, o qual teria admitido
negociações, mas desde que houvesse proposta concreta por parte de
Jango. Contudo, o ainda presidente da República “recusou-se a tomar
iniciativa”.45
No dia 1º de abril, Seixas Dória retornou a Sergipe. À noite, leu
mensagem em rádio a favor da legalidade e, na madrugada seguinte,
foi preso e levado a Salvador. Um jornal local publicava em manchete:
“IV Exército controla o Nordeste”.46 Não era somente o Nordeste: as
Forças Armadas controlavam a sociedade política do Brasil.

45
Seixas Dória. Ob. cit., p. 48.
46
Gazeta de Sergipe, 02.04.1964.

175
Ibarê Dantas

3.2 O Processo Econômico-social

No período 1946-1964, a defasagem entre o Sudeste e o Nordeste


acentuou-se consideravelmente. O processo de desenvolvimento
nacional desencadeado nos anos 30, através da substituição das im-
portações, foi-se ampliando e ingressou em outro patamar nos anos de
JK. Com o Plano de Metas, que rearticulou a empresa privada nacional
com a estrangeira e as estatais, implementou-se a industrialização
pesada que apresentou crescimento médio de 9,26% entre 1957 e 1961.
Fabricando produtos industrializados com superior nível de produ-
tividade, quando as barreiras comerciais entre os Estados já haviam
sido quebradas, as empresas do Sudeste foram inundando o mercado
nacional com seus artigos, conquistando supremacia econômica.
Enquanto isso, o Nordeste, especialmente Sergipe, ainda continuava
com seu perfil agroexportador retardado.
Na atividade açucareira, o número de usinas decrescia de 59 (1946)
para 18 (1963) e a produção permanecia estacionária em relação à fase
de 1932 a 1944.47 Basta lembrar que enquanto a média das safras do
período anterior fora de 673.858 sacos, de 1946 a 1964 foi exatamente
671.827 sacos.48
O fato de a diminuição do número das usinas não haver afetado
a produção pode ser indicação da tendência à concentração das
empresas. Os senhores do açúcar ao longo do tempo minguavam,
vivenciando declínio inexorável. Cada vez mais raros eram os que
sobreviviam. Um exemplo ilustrativo foi o crescimento da Usina São
José, que foi ocupando o espaço das decadentes e, a partir do fim dos
anos quarenta, ultrapassou o desempenho da Usina Central, antes a
maior unidade produtiva. No seu conjunto, a produção açucareira de
Sergipe estacionava, mas continuava perdendo posição não apenas

47
Cf. Antônio José Nascimento. A Economia Sergipana e a Integração do Mercado Nacional (1930/1980).
Dissertação de Mestrado apresentada na UNICAMP, Campinas, 1994, quadro 9.
48
Manoel Correia de Andrade. A Agro Indústria Canavieira e a organização do Espaço
- Contribuição à História das Usinas de açúcar de Sergipe. Natal: Cooperativa Cultura
Universitária do Rio Grande do Norte Ltda, 1990, p. 28-30.

176
História de sergipe: república

em relação aos demais Estados produtores do Nordeste, mas sobre-


tudo diante das unidades do Sudeste.
Em relação ao algodão, a situação foi ainda pior. A área de plantio
foi reduzida consideravelmente, levando a produção a diminuir, não
obstante a permanência, no início dos anos sessenta, de cerca de 20
fábricas de beneficiamento do produto.49
No campo, a grande atividade desse período foi a agropecuária
que, de 1950 a 1960, chegou a atingir um crescimento da ordem de
31,5%.50 Além da criação de gado, continuou com bastante sucesso, em
Sergipe, a engorda de boiadas adquiridas em Minas Gerais ou no sul
da Bahia que, posteriormente, eram exportadas para outros Estados
do Nordeste. Essa prosperidade dos agropecuaristas, que vinha cres-
cendo desde pelo menos os anos quarenta, contribuía para fazê-la a
fração dominante mais importante do Estado, pelas proporções do
grupo e pelas influências políticas. Na segunda fase do domínio po-
pulista (1946-64), aquele grupo pontificava com grande desenvoltura
na política e nos negócios.51
O Estado não tinha uma política planejada para os agropecua-
ristas, mas nem por isso deixou de beneficiá-los, estimulando-os por
meio de iniciativas como as exposições agropecuárias, que se cons-
tituíam em verdadeiras festas lucrativas. Por outro lado, os créditos
bancários e as dispensas dos empréstimos pelo governo federal, em
determinadas ocasiões, contribuíam para a capitalização da categoria.
Essa prosperidade certamente ajuda a entender o crescimento do setor
primário de 1950 para 1960, conforme quadro abaixo.

49
Cf. Antonio José Nascimento. Ob. cit., 1994, quadro 17.
50
Cf. Bonifácio Fortes. Democracia de Poucos. Aracaju: Regina, 1963, p. 20.
51
Por ocasião da XIV Exposição Agro-Pecuária, alguns nomes foram citados como pioneiros.
Além de Felisberto Freire, que vinha criando gado desde o século XIX e comemorava-se o seu
centenário, foram lembrados: Dr. Antonio Militão T. Bragança (Laranjeiras), José do Prado
Franco (Laranjeiras), Silvio Garcez (Itaporanga) e Bento Aguiar (Neópolis). Mas, por esse
tempo, outros também pontificavam como Acrísio d’ Ávila Garcez (Lagarto), Thomé Dantas
da Costa (Tobias Barreto), José Dória de Almeida (Simão Dias), Edmundo Freire (Riachão do
Dantas), Antônio Torres Neto (Canhoba), Martinho Almeida (Lagarto), Jacomildes Barreto
(Boquim), os Garcez e os Sobral (Itaporanga,) os Calumby Barreto e Murilo Dantas em outros
municípios.

177
Ibarê Dantas

Quadro VI. Participação da Renda Interna (1950-1960)


Anos Setor primário Setor secundário Setor terciário
1950 35,9% 18,6% 45,5%
1960 42,8% 10,8% 46,4%
Fonte: Governo do Estado de Sergipe. I Plano de Desenvolvimento Econômico e Social (1976/1979). Conselho do
Desenvolvimento de Sergipe - Condese.

Outro dado que chama atenção nesse quadro é a queda do setor


secundário. Enquanto o país vivia numa fase de grande crescimento,
atingindo índices extremamente elevados, especialmente durante o
Plano de Metas, em Sergipe o desempenho das indústrias decrescia.
A queda mais acentuada ocorria justamente no setor têxtil, conforme
quadro abaixo.

Quadro VII. Indústrias de Sergipe (1940-1960)


Número de estabelecimentos Pessoal ocupado
Censos
Industriais Gênero Gêneros Produtos Gênero Gêneros Produtos
Estado Estado
Têxtil Alimentares Têxtil Alimentares
1940 743 40 160 13.681 6.472 4.252
1950 1.377 61 355 16.608 8.189 3.524
1960 1.886 39 620 14.286 5.973 3.993
Fonte: Fundação IBGE, apud Aluízio Capdeville Duarte. Aracaju e Sua Região. Rio de Janeiro: IBGE, 1971 p. 20.

O conjunto das indústrias de transformação de Sergipe perdia


terreno dentro do Nordeste, sobretudo na década de 1950-60, bai-
xando sua participação de 5,1% (1949) para 3,2% (1959).52 A situação
agravou-se no setor têxtil, seu ramo mais significativo. Enquanto a
parte de alimentos recuperava-se um pouco, algumas fábricas de
tecidos fechavam, a produção caía 3,1%, ao tempo em que o pessoal
ocupado decrescia. Dispondo de matéria-prima de baixa qualidade e
tecnologia obsoleta, a indústria têxtil perdia competitividade e decli-
nava. Era um quadro de crise num tempo em que o fluxo portuário
de Aracaju diminuía radicalmente com o assoreamento de sua barra.
Diante desses problemas, a sociedade passou a discutir a questão a
partir da imprensa, e o Estado passou a intervir de forma mais efetiva.

52
Cf. Antônio José Nascimento. Ob. cit., 1994, p. 192.

178
História de sergipe: república

Vimos como os governos vinham dando passos, tentando estimular


o processo de desenvolvimento. Arnaldo Garcez criou o Conselho de
Desenvolvimento Econômico, Leandro Maciel tentou superar os pontos
considerados de estrangulamento do crescimento e Luiz Garcia ainda
mais ampliou os investimentos em obras na indústria e nos serviços,
dentro do ideário desenvolvimentista do governo JK, que se expandia
criando expectativas em torno da industrialização do Estado. Tudo isso
gerava um clima de otimismo, porém algumas dificuldades persistiam.
A SUDENE, criada em fevereiro de 1959, passou a liberar recursos
para modernizar as indústrias têxteis do Estado, mas os efeitos não
se revelariam animadores, uma vez que as necessidades eram maio-
res do que as mudanças operadas. O que animava era a expansão da
rede elétrica da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF)
que chegara a Sergipe por volta de 1954. Oito anos depois, apenas dez
municípios ainda não contavam com energia instalada. Somente
Aracaju, que começou com 3.200 Kw, já havia solicitado aumento
para 10.000 Kw. 53
Por esse tempo, a população do Estado que, em 1940, era da or-
dem de 542.236, vinte anos depois passara para 760.273 habitantes,
enquanto Aracaju chegara a 115.713 residentes, segundo o Censo de
1960. Ao longo das duas décadas, não obstante os problemas nas in-
dústrias, os serviços tiveram melhor desempenho. O número de casas
comerciais atingia 1.817 unidades,54 enquanto os estabelecimentos
bancários somavam 24, envolvendo 7 matrizes e 17 sucursais, filiais
e agências.55 Mas, em relação ao volume de capitais e de depósitos, o
movimento era bem inferior não apenas ao dos Estados de Bahia e
Pernambuco, mas também ao de Alagoas.
No setor das comunicações, vinham ocorrendo mudanças expres-
sivas. Em 1957 foi inaugurado o serviço automático da telefonia com
2.000 linhas e 1.500 aparelhos em funcionamento. A construção da

53
Em 1955 Sergipe dispunha apenas de um potencial instalado de 8.890 Kw. Problemas de Base
do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, Vol. II, p. 300-302.
54
Censo de 1960.
55
Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II. p. 300-302.

179
Ibarê Dantas

estrada Rio/Bahia operava grandes transformações na economia do


Nordeste. Em Sergipe, o fluxo comercial de produtos do Sudeste, es-
pecialmente paulistas, ampliou-se consideravelmente inviabilizando
muitas iniciativas locais. O transporte de mercadorias pela via ma-
rítima praticamente desaparecia, enquanto o ferroviário declinava.
Diagnóstico da situação das ferrovias no início dos anos sessenta falava
de trilhos desgastados, dormentes apodrecidos, traçados impróprios e
viagens demoradas, estimulando a opção pelo transporte rodoviário.
Pelos idos de 1964, Sergipe já contava com 3.733 km de rodovias, das
quais 256 km eram federais, 1.288 km estaduais e 2.189 municipais. Estas
últimas não dispunham nem de revestimentos primários. No todo havia
apenas 19 km pavimentados.56 A essa altura, já estavam registrados 2.221
automóveis, 500 ônibus e micro ônibus e 1.413 caminhões.57
Aracaju, que era vista com importante função portuária, afirmava-
-se então apenas como centro político-administrativo e comercial.58 A
expansão das estradas de rodagem permitia ampliar sua influência
nos serviços, ramificando-se não apenas pelos municípios do inte-
rior, mas também pelas comunidades circunvizinhas dos Estados
de Alagoas e Bahia.
Enfim, foi um tempo de mudanças, marcadas sobretudo pelo
crescimento da dependência do Sudeste. Como afirmou um estudio-
so da economia nordestina: “O conjunto de investimentos em bens
de capital e duráveis concentrados em São Paulo, ao tempo em que
bloquearia a possibilidade de industrializações autônomas nas re-
giões, induziria as estruturas produtivas regionais a assumirem um
papel complementar e dependente. A integração que daí decorreria
aprofundou as relações interregionais”.59

56
O percurso de Aracaju a Propriá era feito em cinco horas e trinta minutos. Para Pedra Azul
em Minas Gerais (1.300 km) chegava a levar 90 dias. Problemas de Base do Estado de Sergipe.
Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II, p.270.
57
Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II, p. 283.
58
Ver Neuza Maria Góis Ribeiro. Transformações do Espaço Urbano: o Caso de Aracaju. Recife:
FUNDAJ/Massangana, 1989 e Vera Lúcia Alves França. Aracaju: estado e metropolização. São
Cristóvão/SE: Editora da UFS/ Aracaju: Fundação Oviêdo Teixeira, 1999.
59
Ricardo Lacerda. Geração de Emprego e Renda. In: José Fernandes de Lima e Afonso
Nascimento (orgs). Pensar Sergipe, São Cristóvão/SE: UFS, 2000, v. II, p. 24.

180
História de sergipe: república

Dentro desse contexto, a produção de açúcar estava estagnada,


o algodão declinando e as indústrias têxteis em situação crítica. So-
mente nos serviços e na agropecuária houve melhoria e crescimento,
impedindo que a crise se tornasse generalizada. Apesar desse quadro,
a descoberta de petróleo em Riachuelo (1961) e, sobretudo, em Car-
mópolis (1963) abria novas perspectivas para o desenvolvimento de
Sergipe.
Quanto aos trabalhadores urbanos, que no período 1930-1945
haviam conseguido numerosos direitos, passaram a ampliar seu es-
paço na sociedade com o processo de democratização. Não obstante
saírem do Estado Novo relativamente desarticulados e divididos em
alguns grupos, cedo foram tentando organizar-se, formando e/ou
fortalecendo seus órgãos de classe. Uma das categorias mais reivindi-
cativas era a dos portuários, apesar de viverem momento de declínio
de suas atividades. Os funcionários públicos também manifestaram-
-se bastante ativos. Criaram em 1946 a Associação dos Servidores
Públicos em Sergipe (ASPES), voltada para a defesa dos interesses da
categoria. Suas lideranças envolveram-se nas atividades partidárias,
especialmente do Partido Comunista Brasileiro. Mas o cancelamento
do registro do PCB, a cassação dos parlamentares, a proibição de
atos públicos e a intervenção em sindicatos levaram a um refluxo do
movimento. Na ilegalidade, os comunistas procuraram manter viva a
chama de sua mensagem através da edição de seus sucessivos órgãos
partidários, especialmente A Verdade e Jornal do Povo. Pelos idos de
1949, o Partido Socialista também procurou interpretar os interesses
dos trabalhadores rurais e urbanos, denunciando através da Gazeta
Socialista as condições de trabalho e de vida dos empregados de usi-
nas e fábricas de tecidos, gerando mal estar entre seus proprietários.
Enquanto isso, os militantes partidários tentavam levar às massas a
discussão dos problemas conjunturais, nacionais e internacionais.
Mas as comemorações de 1o de maio, como os atos da União Geral dos
Trabalhadores de Sergipe, eram hostilizados pelas forças policiais. A
situação tornou-se bastante adversa com a intervenção do Exército
em Sergipe em 1952.

181
Ibarê Dantas

Conforme já observamos, a luta político-ideológica entre grupos


direitistas e nacionalistas, dentro do Clube Militar no Rio de Janeiro,
transbordou para o pequeno Estado, através de sindicância interna,
marcada por prisões e torturas de militares e civis, trazendo estrago
no seio da militância comunista. Com a vitória da UDN em Sergipe
(1954), os trabalhadores urbanos tiveram maior liberdade de manifes-
tação, entretanto as dificuldades das indústrias tornavam os empre-
gos difíceis. O fluxo migratório do campo para a cidade aumentava,
conforme se pode observar pela série dos Censos, concorrendo para
acelerar o êxodo para o Sudeste, sobretudo para São Paulo.
Em 1960 Sergipe ainda era um Estado predominantemente rural,
com um percentual de 61,8% dos seus habitantes vivendo no campo
ou em aglomerados considerados não urbanos. A partir de 1950, suas
cidades passaram a duplicar a população a cada vinte anos, enquanto
no âmbito nacional o processo de mobilização política crescia. Em
1956 tanto lideranças dos funcionários públicos quanto dos trabalha-
dores rurais de Sergipe participaram de encontros interestaduais. A
aceitação da legislação trabalhista se tornava prática comum, norte-
ando os direitos e deveres dos operários fabris e dos funcionários do
setor de serviços, mas havia sempre novos pleitos a conquistar. Para
tanto, as categorias foram criando suas associações e participando do
movimento de mobilização que haveria de acentuar-se. No início dos
anos sessenta, contavam-se em Sergipe três federações, sendo duas
de empregadores e uma de empregados, e 49 sindicatos, dos quais 18
eram de empregadores, 29 dos empregados e 2 de profissões liberais.60
No campo persistiam duas queixas. De um lado, reclamava-se
da concentração da propriedade. De outro, faltava legislação que es-
tendesse os direitos sociais ao trabalhador rural. No que se refere ao
primeiro problema, começou-se a buscar alternativas para minorá-lo.
“Entre 1945 e 1954 foram implantadas pelo governo estadual cinco
colônias agrícolas, com área total de 11.169 hectares e 1.706 pessoas

60
Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II, p. 510.

182
História de sergipe: república

assentadas, além de uma outra de iniciativa particular, chamada


Colônia em Riachão do Dantas, com 260 hectares, envolvendo 80
famílias”.61 Mas foram experiências que não prosperaram. Apesar
disso, houve alguma tendência distributiva, pois o número de pro-
priedades de 1950 para 1960 cresceu 53%, sendo parte desse aumento
devido à expansão da área ocupada (24,6%).62 Por outro lado, foram
surgindo experiências comunitárias com algum sucesso. O número
de associações rurais cresceu de forma que, em 1961, já existiam em
Sergipe 54 dessas instituições com 3.176 membros. O setor do coo-
perativismo vivia uma fase de animação, chegando a funcionar 40
entidades, das quais 10 eram de consumo e 30 de produção, números
bem superiores às existentes no vizinho Estado de Alagoas.63 É verdade
que parte dessas cooperativas estava situada no meio urbano, mas
as rurais gozavam de maior visibilidade pelo bom desempenho de
algumas, especialmente a Colônia 13 no município de Lagarto.
Não obstante as iniciativas buscando formas de convivência
alternativas à tradicional relação capital x trabalho, elas eram
consideradas insuficientes sobretudo para os grupos de esquerda.
Por volta de meados dos anos cinquenta, foi lançada a campanha
pela reforma agrária que alcançou maior densidade com a criação
do Movimento de Educação de Base-MEB (1961). As relações de do-
minação e dependência pessoal passaram a sofrer grande erosão.
Embora a maior parte dos trabalhadores continuasse subordinado
ao patronato, as pregações dos líderes populistas e/ou esquerdistas e
os programas radiofônicos do MEB abalavam a tradicional visão de
mundo dos assalariados que lidavam diuturnamente com a terra. O
exemplo das Ligas Camponesas, criadas em 1955 por Francisco Julião
em Pernambuco, despertava apreensões desencontradas. Inspirado

61
Rosemiro Magno da Silva e Eliano Sérgio Azevedo Lopes. Conflitos de Terra e Reforma Agrária
em Sergipe. Aracaju: UFS/EDUFS, Secretaria do Estado da Irrigação e Ação Fundiária, 1996,
p. 97.
62
O número de propriedades agrícolas passou de 42.769 (1950) para 65.491 (1960) unidades
agrícolas. Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II, p. 461.
63
Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II, p. 510.

183
Ibarê Dantas

no exemplo de Cuba, a aposta na alternativa socialista ganhou força


no início dos anos sessenta dentro do movimento popular nacional.
O governo federal tomou algumas medidas efetivas que encami-
nhavam o problema agrário, visando não perder o controle da situa-
ção. Regulamentou-se a legislação que permitia o reconhecimento dos
sindicatos rurais e foi criada a Superintendência da Política Agrícola
(SUPRA) em 1962, objetivando formular e executar uma política agrá-
ria para o país. Dentro desse processo, foram organizados em Sergipe
os sindicatos rurais com o apoio da SUPRA, da Igreja Católica e dos
partidos de esquerda, especialmente da Ação Popular (AP). Em grandes
concentrações, celebravam-se a fundação de suas entidades de classe,
passando os trabalhadores rurais a dispor de representação sindical
em alguns municípios, entre os quais Maroim, Riachuelo, Laranjei-
ras, Divina Pastora, Malhador. Ao final do ano de 1963, já havia em
Sergipe uma federação e nove sindicatos reconhecidos. Outros nove
aguardavam reconhecimento.64 “Após a fundação e reconhecimento
legal dos primeiros sindicatos, foi instalada, em 1963, a Federação dos
Trabalhadores da Agricultura de Sergipe – FETASE”.65 Nesse clima de
mobilização, no mesmo ano foi promulgado pelo governo federal o
Estatuto do Trabalhador Rural, levando ao campo a legislação social
e sindical para todo o Brasil.
Desencadeado o processo de transformação, alimentado pela
normatização dos direitos e pela organização dos trabalhadores, o
passo seguinte foi a reforma agrária, que significava transferir as
terras para os camponeses. Essa operação começou com a invasão
da Fazenda Bica, uma propriedade semiabandonada no município
de Itabaianinha. Apesar do êxito dessa iniciativa, outras tentativas,
inclusive na capital66 foram-se revelando mais problemáticas.

64
Cf. Gazeta de Sergipe, 20.02.1964 e Octávio Iani. O Colapso do Populismo no Brasil. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1968, p. 82.
65
Ver Gilvânia da Conceição Santos. Organização Sindical dos Trabalhadores Rurais em Sergipe
(1962/1964). Monografia apresentada no Departamento de História da UFS, Aracaju, 1997,
p. 32.
66
Gazeta de Sergipe, 25.02.1964.

184
História de sergipe: república

Nas cidades, intensificava-se o trabalho de organização e conscien-


tização. As articulações no campo sindical e partidário ampliavam-se
com a atuação do Partido Comunista Brasileiro, influente entre os
comerciários, ferroviários, estivadores e trabalhadores da construção
civil. Na ilegalidade desde 1947, nem por isso deixou de estar presente
nos principais movimentos populares do período populista. Em 1950,
seus membros participaram ativamente da greve dos ferroviários,
num tempo em que seu jornal, A Verdade, associava-se à apologia a
Stalin, considerando-o “o maior gênio dos dias atuais, [...] mestre, pai
e amigo de todos os oprimidos”.67 Sofrendo repressão até 1953, o PCB
continuou a atuar em diversas campanhas. Algumas eram orientadas
pela direção nacional, tais como a do “Petróleo é Nosso”, “contra a
participação do Brasil na guerra da Coreia”, “Pela Paz”, mas também
participava de movimentos sobre questões locais, entre os quais
aquele que reivindicava instalação da rede de água nos bairros. No
início dos anos sessenta, o partidão persistiu atuante, participando
das lutas políticas e sindicais, controlando a ASPES, associação dos
funcionários, a Sociedade União dos Operários Ferroviários (SUOF),
o Sindicato da Construção Civil e o Centro Operário Sergipano.68
Somando-se a essas entidades, foi organizada a seção estadual do
Comando Geral dos Trabalhadores em Sergipe (CGT-SE), que, sob
a hegemonia do PCB, passou a desempenhar papel importante na
coordenação da mobilização nacional. Neste momento, suas lide-
ranças desfrutavam de grande visibilidade,69 mas na luta política a
competição interna foi-se tornando cada vez mais forte entre facções
dos líderes trabalhistas.
Apesar dessa influência grande sobre os trabalhadores urbanos, o
PCB foi perdendo terreno. Embora participasse de movimentos grevis-

67
A Verdade, 23.12.1950.
68
Cf. Maria da Conceição Almeida Vasconcelos. Ação Político-sindical dos Petroleiros SE/AL nos
anos 80. Aracaju, Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais da UFS, 1999, p. 75-76.
69
Entre esses líderes, destacaram-se: Manoel Vicente do Nascimento, Manoel Francisco de
Oliveira, presidente do Sindicato dos Estivadores, Manoel Franco Freire, Manuel Messias dos
Santos, presidente do CGT em Sergipe, José Nunes da Silva, presidente do Centro Operário
Sergipano, Agonaldo Pacheco, presidente da ASPES.

185
Ibarê Dantas

tas, passeatas, seminários de politização e de todas as lutas, diante do


processo de radicalização do início dos anos sessenta, especialmente
no meio estudantil, o partido passou a ser confrontado com a presença
da Ação Popular (AP). Os militantes dessa nova entidade, originários
da Juventude Operária Católica (JOC) e da Juventude Universitária
Católica (JUC) infiltraram-se no Movimento de Educação de Base,
criado em 1961, e passaram a gozar de simpatia crescente, sobretudo
no meio rural. Em 1963, o PC do B e a POLOP começaram também
a atuar em Sergipe, falando em nome dos trabalhadores, quando já
havia sido criada no Rio de Janeiro, em 1962, a Frente de Mobilização
Popular, visando aglutinar várias entidades de esquerda e proporcio-
nar novo impulso ao movimento. A essa altura, o eixo das discussões
já havia deixado de ser a ampliação dos direitos dos trabalhadores. A
questão nesse momento era como fazer a revolução.
Apesar de um certo clima de tensão nos anos sessenta, as formas
de lazer cresciam, diversificavam-se e continuavam sendo vivencia-
das. As praias se popularizaram. A Atalaia ganhou acesso fácil e fluxo
crescente. A vida urbana de Aracaju transformava-se. Em meados
dos anos cinquenta, os bondes deixaram de circular, cedendo lugar
às kombis e marinetes, que expandiram suas redes pelos diversos
bairros da capital. O futebol começou a profissionalizar-se (1960).
Novos estádios foram construídos na capital e no interior do Estado.
As fábricas de tecidos, tais como a Confiança e sobretudo a Passagem,
investiram em campos modernos. Os clubes ganharam vida e maior
importância com seus grupos de associados específicos, de certa forma
recriando a segmentação social. Se antes havia a Associação Atlética
de Sergipe, o Cotinguiba, o Vasco, o Sergipe e o Confiança, a estes veio
acrescentar-se o Iate Clube, agregando elite local mais sofisticada. Em
1960 estavam registradas nada menos de 52 associações desportivo-
-recreativas, das quais 21 eram sediadas em Aracaju.70

70
Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II, p. 512.

186
História de sergipe: república

3.3 Manifestações Culturais

As manifestações culturais do período 1945-64 revelaram-se muito


mais variadas e ricas do que na fase anterior. A contribuição do poder
público em vários setores foi grande e, em algumas áreas, crescente.
Por outro lado, a sociedade adquiria maior autonomia de ação.
Na área educacional, durante a gestão do presidente Dutra, houve
o programa meritório das escolas rurais no governo de José Rolemberg
Leite (1947-51), quando também começaram a aparecer efetivamente as
faculdades, pois o curso de filosofia do Seminário, criado em 1913, seria
extinto por ordem da Santa Sé (1934).71 Vimos também nos anos vinte a
fundação das faculdades: de Direito, Farmácia e Odontologia, que não
vingaram. Foi a partir de 1948 que as faculdades estaduais chegaram
para permanecer sob os auspícios do governo estadual. Primeiro foi a
de Economia,72 seguida pouco depois pela de Química.73 Esta incorpo-
rou em seus quadros mestres de grande competência que aqui viviam
expatriados, e o curso tornou-se referência nacional. Em 1951 a Igreja
Católica fundou a Faculdade de Filosofia, enquanto uma sociedade
mantenedora criava a de Direito com juristas ligados sobretudo ao Par-
tido Social Democrático. Eram obras da sociedade civil, mas ajudadas
com recursos públicos, sobretudo no que se refere à escola dos bacha-
réis. É verdade que os subsídios estatais eram insuficientes, motivo
pelo qual essas entidades passaram a sobreviver devido à abnegação
dos professores que recebiam salários simbólicos. Não obstante as
dificuldades, em 1954 apareceu a Faculdade de Serviço Social, também
ligada à Igreja Católica. Fechando o ciclo, em 1961 nascia a Faculdade
de Ciências Médicas com aporte significativo do Estado. O fato é que no
início dos anos sessenta já eram computados 12 cursos de graduação

71
Jackson da Silva Lima. Os Estudos Filosóficos em Sergipe. Aracaju: Sociedade Editorial de
Sergipe, 1995, p. 95.
72
A Faculdade de Ciências Econômicas foi criada pela Lei 73 de 12.11.48 e começou a ensinar
em 1950. Cf. José Rolemberg Leite. Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa. Aracaju,
1949, p. XV.
73
A Escola Superior de Química foi criada pela Lei 26 de 25.11.48. Cf. José Rolemberg Leite.
Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa. Aracaju, 1949, p. XV.

187
Ibarê Dantas

com 156 professores e 336 alunos.74 Era uma mudança qualitativa na


vida cultural sergipana. Primeiro formava-se um corpo de profissionais
cada vez mais amplo e capacitado. Segundo, fazer curso superior foi
deixando de ser privilégio das famílias abastadas. A mobilidade social
ampliou-se. Numerosos jovens de origem das classes subalternas pu-
deram receber seus diplomas, realizar-se como profissional, ascender
socialmente e influir politicamente. Uma massa crítica se formava com
efeitos multiplicadores no destino da sociedade e do Estado.
Tempos depois de o governo José Rolemberg Leite se destacar por
suas obras no terreno da educação, a administração de Luiz Garcia
(1959-1962), além de promover a organização da Faculdade de Medi-
cina e desenvolver outras iniciativas na área do ensino, revelou-se
mais inovadora no terreno cultural propriamente dito. Agregou o
termo Cultura à Secretaria de Educação e Saúde e, contando com a
colaboração de intelectuais com sensibilidade artística, promoveu
várias obras voltadas para a cultura, como a instalação do Museu
Histórico de São Cristóvão no antigo Palácio Provincial, reunindo
peças representativas do patrimônio do Estado. Criou o Núcleo de
Artes Plásticas em Aracaju e instituiu os Cadernos de Cultura sob o
patrocínio da Secretaria de Educação, Cultura e Saúde. Estimulou
escritores, publicando obras, e incentivou artistas, financiando a
pintura de painéis bem como adquirindo quadros para o Palácio
Olímpio Campos, atuando como mecenas.75
É verdade que, a essa altura, o movimento cultural já vinha apre-
sentando maior maturidade. As publicações das revistas já apresen-
tavam melhoria de qualidade. Além da continuação do periódico do
Instituto Histórico e da Academia Sergipana de Letras, apareceram
outras de bom nível, como a da Associação Sergipana de Imprensa,
da Faculdade de Direito, bem como Economia e Finanças, vinculada à

74
Por esse tempo 2/3 das matrículas do ensino fundamental estavam localizadas nos colégios
particulares, num total de 7.037, enquanto as federais eram de 507 e as estaduais de 3.138
alunos. As Municipais cobriam apenas 208. Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju:
FIES/Condese, 1965, v. II. p. 410-411.
75
Ver Luiz Garcia. Mensagem à Assembleia Legislativa. Aracaju: Imprensa Oficial, 1962.

188
História de sergipe: república

Secretaria da Fazenda, contando com a contribuição dos professores


da Faculdade de Ciências Econômicas. Eram veículos que revelavam
interesse pela pesquisa e ajudavam a refletir mais seriamente sobre
os problemas do Estado e da sociedade de modo geral.
A produção de livros expressava maior diversidade das temáticas
de estudo, dentro de um pluralismo em que a preocupação com o
social ampliava-se, formando como que um projeto que se contra-
punha à forma de dominação vigente. A tradição bacharelesca que
valorizava o saber ornamental e tratava as questões geralmente de
forma genérica, foi cedendo lugar à especialização. É verdade que
alguns escritores ainda se manifestam polivalentes, como Bonifácio
Fortes, que escrevia sobre geografia, história, direito, política eleitoral
e cinema. Outros, desde a década de dez, já se dedicavam a determina-
da área, como era o caso de Florentino Menezes, que vinha de muito
publicando suas reflexões na área de sociologia. Também José Cruz,
desde fins dos anos trinta, vinha divulgando estatísticas, permitindo
avançar no conhecimento do quadro social. Mas, foi depois de 1945,
que a questão do desenvolvimento entrou na pauta das discussões e
Aloísio de Campos, junto com outros economistas, passaram a estudar
de forma mais científica as questões econômico-financeiras. Felte
Bezerra enveredou para a área da Antropologia com estudo marcante
sobre as Etnias Sergipanas (1950), Nunes Mendonça publicou livro
sobre A Educação em Sergipe (1958), aproveitando pesquisa promovida
pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP). D. Luciano
Duarte defendeu tese de doutorado na Sorbone sobre a Filosofia de
Santo Tomás e Hume, José Silvério Leite Fontes (1924-2005), desde o
estudo sobre Jackson Figueiredo: sentido de sua obra (1952), revelou-se
também um cultor da filosofia. Jorge de Oliveira Neto (1914-1980) pu-
blicou Sergipe e o Problema da Seca (1955). No campo da História, não
tivemos nomes do porte de Felisbello Freire (1858-1916) nem de Lima
Júnior (1856-1929), mas Sebrão Sobrinho publicou Laudas da História
de Aracaju (1955), entre outras obras, mostrando bastante conheci-
mento das fontes primárias. No campo do Direito, destacaram-se
vários juristas, entre os quais Gonçalo Rolemberg Leite e Manuel

189
Ibarê Dantas

Cabral Machado, embora com produção pequenina. Desde a década


de vinte, foi Carvalho Neto o maior nome do Direito pelo conjunto
da obra, além da atuação na política e no foro. Na crônica, Garcia
Moreno (1910-1976), com Cajueiro dos Papagaios, entre outros, deixou
páginas saborosas sobre nossos costumes. No conto, Renato Mazze
Lucas (1919-1985) estreou com Anum Branco e outros contos (1961). Os
estudos de Folclore tiveram continuidade com várias contribuições,
entre as quais a de Mário Cabral (1914- 2009), que continuou explo-
rando também a crítica literária e versejando. Aliás, na poesia, não
obstante a influência dos modernistas vir manifestando-se desde o fim
dos anos vinte, foi a partir de 1945 que essa forma se tornou predomi-
nante. Além dos poetas já conhecidos, como Freire Ribeiro (1911-1975),
apareceram Alberto Carvalho (1932-2003), Núbia Marques (1927-1999),
Carmelita Fontes (1933-2020), Giselda Morais (1939-2015), revelando
suas experimentações. A atuação desses intelectuais, indicava certa
efervescência que motivou a criação do Clube de Poesia (1955) e a
publicação da importante obra de Austragésilo Santana Porto, O
Realismo Social na Poesia em Sergipe (1960),76 analisando as produções
recentes dentro da referida temática. Mas foram José Sampaio (1913-
1956), Santo Souza (1917-2014) e José Maria Fontes (1908-1994) que se
firmaram como nomes mais expressivos. O primeiro continuou a ex-
plorar os motivos sociais e o segundo exercitou linguagem simbolista
de caráter universal. O terceiro, pela edição dos seus poemas densos,
operou repercussões significativas nos meios artísticos.
Afora os que se dedicavam à prosa e à poesia, deve ser lembrado
José Augusto Garcez (1918-1992) como animador das letras e da ciência,
na medida em que se preocupou em reunir artefatos arqueológicos e
históricos e promoveu diversas publicações, através do denominado
Movimento Cultural de Sergipe (1953).77 Merecem registro ainda os

76
Austragésilo Santana Porto. O Realismo Social na Poesia em Sergipe. Aracaju: Livraria Regina,
1960.
77
Segundo autora que estudou o tema, o movimento chegou a publicar 43 obras. Cf. Verônica
dos Reis Mariano Souza. O Movimento Cultural de Sergipe. In: Cinform, Cultura & Variedades,
19 a 25.08.2002, p. 7.

190
História de sergipe: república

comerciantes livreiros José Apóstolo e Antônio Monteiro. Ambos


foram sensíveis, generosos e dispensavam atenção aos artistas da
terra. O primeiro, dono da Editora e Livraria Regina, publicou vários
trabalhos de escritores locais, ao tempo em que adquiria as produ-
ções recentes, atraindo leitores de vários gostos e especialidades.
Ambos fizeram de suas casas comerciais espaços acolhedores, onde
intelectuais se encontravam, trocavam ideias e se atualizavam com
as novidades editoriais provenientes sobretudo do Sudeste. Mas as
bibliotecas careciam de maior expansão. Levantamento do IBGE, em
1956, constatou que apenas treze municípios dispunham de algum tipo
de biblioteca. Além disso, iam se registrando perdas. Enquanto uns
empenhavam-se internamente pelo progresso das letras em Sergipe,
numerosos outros intelectuais mudavam-se para outras plagas na
busca de ascensão profissional.78 Dos jovens colaboradores da revista
Época, que surgiu em 1948, vários deles transferiram-se para outros
Estados. Mais tarde, alguns já conceituados escritores, como José
Calazans, Felte Bezerra, Mário Cabral, também se foram. Entretanto,
longe dos amigos, sem aura de que gozavam em sua terra, nem todos
se revelaram satisfeitos em haver deixado Sergipe. Apesar desses des-
falques, pode-se dizer então que, a partir de 1950, as manifestações
culturais foram aflorando em várias áreas.
Na fase de 1945-64, as artes plásticas de Sergipe foram bastante
enriquecidas com as presenças de J. Inácio (1911-2007)79 e dos irmãos
Álvaro Santos (1920-1963) e Florival Santos (1911-1999)80 que haviam
despontado na fase anterior. Enquanto isso, outros talentos foram
aparecendo, como José de Dome (1921-1982), Jenner Augusto (1924-
2003), Antônio Maia (1940-) e Celso Oliva (1914-1963).81 José de Dome,
de origem humilde, iniciou suas experiências em Estância, pintando
santos, corujas, marinhas e foi descoberto por artistas e empresários
do Sudeste, tendo deixado Sergipe, em 1965, para morrer reconhecido

78
Ver Luiz Antonio Barreto. Singularidades Sergipanas (Final). Gazeta de Sergipe, 12.07.2001.
79
Ver José Inácio. Aracaju: SECT/J. Andrade, 2001.
80
Florival Santos. Texto de Alberto Carvalho. Aracaju: Habitacional Construções, 1995.
81
Ver Clara Angélica Porto e Paulo Lobo (orgs). Pintores Sergipanos, Aracaju: Funcaju, s/d.

191
Ibarê Dantas

em Nova Iguaçu. Jenner Augusto estudou Belas Artes e depois de nos


legar bonitas aquarelas foi para a Bahia, em 1949, onde continuou
bastante produtivo, ganhando grande e merecida projeção. Apesar
de passar a morar no Estado vizinho, não se desvinculou de sua
terra. Além do ambiente de sua infância permanecer como fonte de
inspiração, continuou visitando Aracaju, expondo seus trabalhos,
decorando ambientes, pintando painéis, retratando sua cultura e
derramando sua influência sobre os artistas locais. Para estudiosa
da história das artes plásticas em Sergipe, Jenner Augusto foi a figura
mais renovadora da pintura sergipana do século XX.82
Outro personagem importante foi Antônio Maia. Natural de
Carmópolis, dedicou-se inicialmente à cerâmica, interessou-se pela
pintura e ganhou o mundo com seu talento excepcional. J. Inácio
pintou bananeiras, casebres e homens do campo com colorido forte.83
Não obstante sua inquietude, chegou ao início do século XXI firme,
preservando seu estilo caracterizado de tropicalista e ecológico.84 Cel-
so Oliva pintava natureza morta, retratos e paisagens inspiradas nos
clássicos. Mas, quando animava o meio cultural com seu entusiasmo
contagiante, adoeceu e repentinamente faleceu.
A fotografia passou a ser cultivada com feições artísticas, em-
polgando muita gente. Em 1950 um grupo de cultores de fotos criou
a Sociedade Sergipana de Fotografia. Alguns deles expuseram seus
trabalhos fora do Estado e foram premiados. Entretanto, as dificulda-
des de manutenção da sociedade foram inibindo seus participantes
e o entusiasmo dos primeiros tempos foi esmorecendo, pelo menos
para alguns amadores.
Na música erudita, ao tempo em que o funcionamento do Instituto
de Música e Canto Orfeônico despertava para estudos sistemáticos, a
criação da Sociedade de Cultura Artística de Sergipe (SCAS), em 1951,
por um grupo de intelectuais de Aracaju, concorreu para despertar

82
Cf. Verônica Nunes, declarações ao autor, em 18.09.2001.
83
Cf. Clara Angélica Porto e Paulo Lobo (orgs). Pintores Sergipanos. Aracaju: Funcaju, s/d.
84
Cf. Luiz Antônio Barreto in Brasil/Arte do Nordeste/Art of the Northeast. Rio de Janeiro: Impinta/
Spala/CNI, s/d.

192
História de sergipe: república

ainda mais o gosto pela boa música.85 A SCAS firmou convênio com
entidade da Bahia e, desde então, os conjuntos que lá chegavam passa-
ram a estender sua turnê pela capital de Sergipe.86 Famosos pianistas,
violinistas e violoncelistas, corais e quartetos, grandes orquestras,
cantores líricos e grupos de teatro, de dança e de canto de vários países
do mundo encantaram o público de Aracaju, graças à iniciativa de
intelectuais e ao apoio de políticos e do MEC. Nos primeiros tempos,
as exibições aconteciam ou no Rio Branco, um ambiente pequeno, ou
no salão do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, sem a acústica
adequada. Diante dessa carência, o governo do Estado promoveu a
construção do auditório do Colégio Atheneu, inaugurado em 1954,
que haveria de figurar como a principal casa de espetáculos do Es-
tado até depois do ano 2000. Além de trazer para Sergipe nomes de
expressividade mundial e grupos artísticos nacionais consagrados, a
SCAS mantinha intercâmbio com vários Estados e estimulava outras
artes, entre as quais o teatro, que ganhou vida nova nos anos 50. Ao
grupo intitulado Teatro Universal, seguiu-se o Teatro de Amadores
de Sergipe (TAS), criado em 1956, que, por sua vez, foi sucedido pelo
Teatro Universitário de Sergipe (TUS), ambos representando várias
peças.87 A SCAS contribuiu também para a formação e manutenção
do Teatro Cultura Artística (TECA), que encenou alguns textos, tais
como Chuva, Dias Felizes e Natal na Praça, revelando o nível elevado
das apresentações e o talento dos artistas sergipanos.88
Ao lado desse grande incentivo à música e ao teatro, a Sociedade
de Cultura Artística promovia publicações de livros e contribuía
para ampliar a educação artística da elite. Dentro desse movimento
sem precedentes em Sergipe, essa associação chegou a possuir cerca

85
Participavam desse grupo: Felte Bezerra, Alberto Carvalho, Bonifácio Fortes, José Carlos
Teixeira, João Costa, entre outros.
86
Sobre a atuação da SCAS, ver João Costa. A Sociedade de Cultura Artística de Sergipe (SCAS),
Revista de Aracaju. Aracaju: Sercore/ Prefeitura de Aracaju, ano 43, n. 8, 1985, p. 25-27.
87
Ver João Costa. O Teatro em Sergipe. Sergipe Artístico e Monumental. Aracaju: SEC, Sebrae,
Emsetur, Banco do Brasil, Banco do Nordeste do Brasil, 2000, p. 48 e Sueli Carvalho. O Teatro
Sergipano. Aracaju Magazine, n. 35, maio/1999.
88
Cf. José Melchíades. José Carlos Teixeira e a SCAS. Revista de Aracaju, Aracaju: Sercore/
Prefeitura de Aracaju, ano 43, n. 8, 1985, p.131-132.

193
Ibarê Dantas

de 1.200 sócios,89 apresentando espetáculos refinados, despertando


vocações e criando novas demandas.
Por esse tempo, o rádio ampliava seu prestígio. Embora já existisse
a Rádio Aperipê (1939), que passou a se chamar Difusora, seu estatuto
de rede oficial sempre limitou seu raio de ação. Mas o aparecimento
da Rádio Liberdade (1953), dotada de maior potência, inicialmente
como órgão da oposição ao governo, empenhada em ganhar ouvintes,
representou um marco para os meios de comunicação de Sergipe,
afetando os hábitos do sergipano. Às 12h30 começava o Informativo
Cinzano da Liberdade, sob a direção de Silva Lima, com seu jeito
peculiar de narrar os fatos. Às 20 horas entrava no ar o programa
Calendário, apresentado por Santos Mendonça, que, com competência
jornalística e uma certa inclinação pelo sensacionalismo, conquistava
grande audiência. Em contrapartida, em 1958, um grupo do PSD-PR,
então na oposição, criou a Rádio Jornal e seu programa Risolândia
fez sucesso, especialmente nas críticas ao governo de Luiz Garcia.
Enquanto isso, os programas de auditório, sobretudo da Difusora,
revelavam artistas locais, embora raros chegassem a lançar disco.90
Em 1959 surgia outra rádio, a Cultura, que embora ligada à Diocese,
tinha uma orientação bastante secularizada.
Através das rádios, as músicas se propagam. Os programas de
calouro e as ofertas de brindes musicais aos aniversariantes amplia-
vam o público ouvinte, familiarizando-o com letras e ritmos de choro,
samba, bolero, baião, entre outros. Cantores locais como Guaracy
Leite França, Neuza Paes, Bissextino, João Melo, Dão e João Ribeiro
são lembrados como os mais expressivos desse tempo.91 Não obstante
todos esses fatores contribuíssem para o avanço da música popular,
os apreciadores da música erudita foram bastante favorecidos pelo
aparecimento do LP, substituindo os discos pesados de 78 rotações,
permitindo assim maior acesso aos clássicos.

89
Cf. José Carlos Teixeira, Jornal da Cidade, 16.06.2001.
90
Um dos poucos que conseguiu gravar foi João Melo, facilitado por sua estada no Rio de Janeiro.
91
Cf. Murilo Melins. Aracaju romântica que vi e vivi. Aracaju: UNIT, 2000, p. 92.

194
História de sergipe: república

Nos clubes, nas boates, nos bares, nas ruas, intérpretes da música
popular animavam as noites de Sergipe. Em Aracaju, dois conjun-
tos se destacavam. O Regional de Carnera92 e a Rádio Orquestra de
Pinduca. Esta, composta de cerca de uma dúzia de artistas trajados
a caráter, tocava tanto canções brasileiras quanto estrangeiras,
inclusive americanas (swings, blues e jazz), que iam se tornando
populares no país em face da influência dos filmes produzidos em
Hollywood (EUA).93
O Conservatório de Música de Sergipe, que fora inaugurado em
28.11.1945,94 formando gerações sucessivas, ficaria necessitando de
sede mais ampla, o que seria alcançado nos anos setenta.
No cinema, neste período houve algumas tentativas no terreno
da produção. É verdade que eram experiências de iniciantes ama-
dores, mas foi uma novidade. As primeiras notícias de filmagens em
Sergipe remetem a Estância. Nesse município, Clemente de Freitas
(1899-1974) teria documentado “festas populares, festas cívicas, as-
pectos paisagísticos” e “enchentes do Rio Piauitinga”. Outro nome
lembrado é Evaldo Costa, que registrou cenas do cotidiano.95 Mas
ninguém conseguiu tanto como o maruinense Wilson Silva, que foi
para o Rio de Janeiro e produziu películas memoráveis sem perder
contato com sua terra. Neste período, produziu Eles não Voltaram e
Nordeste Sangrento, este último filmado em Sergipe.96 Por esse tempo,
destacava-se como ator no Rio de Janeiro o sergipano Carlos Aqui-
no. Enquanto isso, em Aracaju, o interesse pelo estudo do cinema
crescia. Foi criado o Clube de Cinema de Aracaju (Cicla), que teria
perdurado de 1952 a 1956, incentivado pela SCAS. Esta sociedade
criou um departamento dedicado à sétima arte e “lançava prati-
camente a cada semana um novo título em exibição no Cinema de

92
O Regional de Carnera era composto de dois violões, um cavaquinho, um clarinete e um
pandeirista. Cf. João Mello, depoimento ao autor, em 02.10.2001.
93
Cf. Murilo Melins. Aracaju romântica que vi e vivi. Aracaju: UNIT, 2000, p. 96.
94
Cf. Correio de Sergipe, 22.07.2001.
95
Djaldino Mota Moreno. Cinema Sergipano Catálogo de Filmes. Aracaju: Banese, 1988, p. 19.
96
Cf. Ivan Valença. Informações ao autor, em 02.04.2003.

195
Ibarê Dantas

Arte”.97 Após as projeções, geralmente aconteciam debates, por vezes


acalorados e sempre instrutivos. Concorreu também para motivar
os jovens estudantes uma série de palestras do professor Bonifácio
Fortes (1953), posteriormente resumidas em opúsculo. Por ocasião do
centenário da mudança da capital, cinegrafista sergipano radicado
em São Paulo realizou filmagem, sob os auspícios da Prefeitura,
sobre a Procissão dos Navegantes. Ainda na década de cinquenta,
durante o governo de Leandro Maciel (1955-1958), Walmir Almeida
(1930-) começou a filmar eventos oficiais em 16 mm.98 Nos anos ses-
senta, seus documentários prosseguiram e passaram a ser exibidos
nos cinemas antes da película principal. No conjunto, acumulou
acervo rico para a memória do período.
Quanto aos prédios dos cinemas, algumas casas iam acompanhan-
do os progressos. O Rio Branco introduzia o cinemascope (1955) e, no
ano seguinte, Aracaju ganhava novo espaço, o Palace, distinguindo-se
dos demais pelas instalações confortáveis e modernas. Mas outros,
situados em bairros, como o Guarany, no Cirurgia, e o Tupi, localizado
no bairro Santo Antônio, foram fechando suas portas. Por esse tempo,
funcionava também o Vera Cruz no bairro Siqueira Campos, como
cinema ligado à Igreja Católica.99 Ao todo, chegamos aos anos sessenta
com 45 casas de exibição de filmes, a maioria das quais situadas no
interior do Estado.100 Era um número bem inferior ao dos templos
religiosos e dos terreiros.
Os cultos afro-brasileiros, depois de serem fichados na polícia
e bastante perseguidos até 1954, passaram a gozar de liberdade de
manifestação e foram valorizados pelos udenistas, atentos ao seu
potencial eleitoral. Assim, em 1960, havia nada menos do que 60

97
Ilma Fontes. Memória do cinema sergipano. Aracaju Magazine, n. 54, dezembro/2000. Os
maiores entusiastas da sétima arte, segundo a autora, eram José Carlos Teixeira, Ivan Valença
e José Carlos Monteiro.
98
Cf. Walmir Almeida, informações ao autor, em 27.11.2001.
99
Sueli Bispo da Silva. “O fim do sonho”: A morte do cine Vera Cruz e a crise do cinema de
bairro em Aracaju (dos anos 45 aos 90). São Cristóvão, Monografia orientada por Antônio
Fernando de A. Sá, apresentada ao Departamento de História, UFS, 2000.
100
Cf. Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, v. II, 1965.

196
História de sergipe: república

terreiros registrados na Secretaria de Segurança Pública em Aracaju.


No interior, não obstante a presença reconhecida notadamente em
Laranjeiras, Japaratuba e São Cristóvão, funcionavam registrados
apenas os de Maruim e Itabaiana.101
Quanto aos demais grupos religiosos, pode-se dizer que os ca-
tólicos persistiram hegemônicos, mas os protestantes avançavam
bastante. Enquanto em 1960 havia 98 igrejas católicas (excluídas as
capelas), os protestantes já dispunham de 46 templos. Os espíritas, por
sua vez, já contavam com 13 centros pelos idos de 1961.102 No interior
as rivalidades entre protestantes e católicos continuavam, mas em
termos menos agressivos do que as de outrora.
Na verdade, a essa altura os movimentos culturais imbricavam-
-se cada vez mais com as questões sociais e políticas. Essa tendência
acelerou-se com o nascimento, em 1961, do Movimento de Educação
de Base (MEB), tendo em D. José Vicente Távora seu grande criador
e principal dirigente. Recorde-se que depois do longo bispado de D.
José Tomás (1911-1948), quando os católicos se envolveram bastante
em política, a atuação de D. Fernando Gomes (1948-1957) orientou-
-se no sentido de distanciar seu rebanho das querelas partidárias.
Essa postura não significava alheamento ao social, como mostram
suas obras voltadas para os necessitados, entre as quais o Serviço de
Assistência a Mendicância (SAME), criado em 1949 para atender os
grupos mais carentes no mundo urbano, especialmente os velhos
desamparados e/ou os mendigos de Aracaju, envolvendo governo e
sociedade numa ação engenhosa.
Por esse tempo, as atividades da Ação Católica estavam em fran-
co progresso integrando leigos nas iniciativas de caráter religioso.
Atuando em núcleos específicos, como a Juventude Universitária
Católica (JUC) e a Juventude Operária Católica (JOC), a preocupação
com o social foi ocupando o espaço do espiritual, gerando tensões
internas crescentes. Quando esse processo começava a acentuar-se, D.

101
Cf. Revista da Associação Sergipana de Imprensa, n. 3, Aracaju, 31.12.1960, p. 116.
102
Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, v. II, 1965, p. 511.

197
Ibarê Dantas

Fernando Gomes foi transferido para Goiânia (GO), sendo substituído


por D. Távora em 1958. Este procurou conviver bem com as diversas
correntes políticas, mas passou a engajar-se na luta social pela pro-
moção do homem, sobretudo dos grupos mais carentes. Concorreu
decisivamente para a criação do MEB, que contou com o apoio dos
governos federal e estadual, e incorporou numerosas pessoas em
atividades particularmente criativas, inclusive jovens universitários
sequiosos de mudanças, e permaneceu como sua principal autorida-
de.103 Atingindo milhares de pessoas, nenhum movimento, até então
em Sergipe, teve tanta influência, no sentido de proporcionar uma
nova consciência aos trabalhadores rurais.
Além do MEB, nasceu a Campanha Nacional de Educandários Gra-
tuitos. Em Sergipe a CNEG contou com o apoio do governo estadual,
através de convênios,104 e a dedicação de professores e jovens intelec-
tuais, todos empenhados na expansão educacional. No fundo, estava
em curso a construção de um novo bloco hegemônico, voltado para
os interesses das classes subalternas, dentro de um projeto que tinha
por horizonte o socialismo. É verdade que havia discrepâncias sobre a
natureza do modelo, mas isso não impedia que vários setores da socie-
dade participassem, entre os quais os estudantes. Era um momento de
atividades febris, parecendo viver-se em clima pré-revolução entre o
entusiasmo triunfalista e a ansiosa preparação para a grande ruptura.
Concorreu para tanto o Movimento de Cultura Popular (MCP) criado
no Rio de Janeiro, que se expandiu por vários Estados, difundindo um
modelo alternativo de política cultural denominada nacional-popular.
A orientação tanto do Partido Comunista Brasileiro (PCB) quanto da
Ação Popular (AP) era conscientizar a população com discursos e
práticas, inclusive representações públicas. A cultura popular virou

103
Calcula-se que o MEB atingiu “cerca de 12.000 pessoas, em perto de 460 localidades e 57
municípios” e contou “com quase 550 monitores orientados por 19 supervisores”. FIES/
Condese. Problemas de Educação de Base, p. 409. Ver também Maria Aparecida Farias.
Movimento de educação da base em Sergipe – MEB – 1964/1970. São Cristóvão, 1996. Monografia
(Licenciatura em História) – Departamento de História, Universidade Federal de Sergipe.
104
Ver Luiz Garcia. Mensagem à Assembleia Legislativa. Aracaju: Imprensa Oficial, 1962.

198
História de sergipe: república

mote para as ações engajadas. “Intelectuais e artistas”, imbuídos


do “espírito de catequese, se colocam na qualidade de missionários
que devem ‘converter’ o povo e a nação à sua verdade oculta”. Neste
sentido, “a tarefa política é construir o Estado Nacional por meio de
uma aliança ou cooperação de classes” para a “tomada de poder”. 105
Em Sergipe atuaram os grupos da União Nacional dos Estu-
dantes (UNE), da União Estadual dos Estudantes de Sergipe (UEES)
e do Centro Acadêmico Sílvio Romero (CASR). Dentro da política de
intercâmbio, representações de outros Estados, como Bahia e Per-
nambuco, estiveram também em Sergipe animando os espaços.106 Na
Rádio Cultura, era apresentado o Teatro Gato de Botas sob a direção
de Aglaé Fontes. Esta, junto com outros atores locais, encenaram
com sucesso a peça Eles não usam black-tie, dirigida por Wilson Maux,
demonstrando de forma eloquente a boa qualidade dos atores da
terra.107 A própria Secretaria de Educação e Cultura, respaldada pelo
MEC, incorporou-se ao movimento pela educação popular e passou
a estimular suas iniciativas que se estendiam pelo interior do Estado.
Entre seus patrocínios, um dos mais significativos foi a vinda a Ser-
gipe do educador Paulo Freire, que ministrou curso, explicando seu
famoso método de alfabetização de adultos, visando à preparação de
coordenadores. A secretaria ainda selecionou 440 candidatos, entre
700 inscritos, a fim de atuarem no programa de alfabetização, mas
este não chegou a iniciar-se antes da intervenção militar de 01.04.1964.
Nesse contexto, ocorreram também os seminários eminentemente
políticos de conscientização como parte da preparação para um novo
tempo. Tanto em Aracaju como no interior do Estado, inclusive em
Lagarto, pregações, debates intermináveis agitavam os ambientes. Não
obstante a excessiva politização, jamais havia ocorrido experiência
educacional tão rica no país e em Sergipe.

105
Marilena Chauí. Seminários. São Paulo, Brasiliense, 1983, p. 95-96.
106
Sobre o assunto, ver José Vieira da Cruz, O engajamento político-cultural dos estudantes
sergipanos no início dos anos 60, Caderno do Estudante. São Cristóvão, UFS/Cimpe, v. 2, 1999.
107
Ver João Costa. Aspectos do Teatro em Sergipe. Palestra patrocinado pelo FUNDESC no Centro
de Criatividade, em 24.08.1992. Cópia datilografada.

199
Ibarê Dantas

Ao tempo em que os sergipanos iam participando de iniciativas


locais, acompanhavam a produção de ideias provenientes sobretudo
do Sudeste. As publicações do ISEB e da Editora Civilização Brasileira,
do Rio de Janeiro, enfocando questões políticas de modo simplificado
como os Cadernos do Povo, uma série de livros pequenos com grandes
tiragens, influíam principalmente no ideário da mocidade estudantil.
Com menos intensidade, repercutiam em Sergipe as iniciativas da
direita como a revista do Instituto Brasileiro de Ação Democrática
(IBAD) e as publicações do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais
(IPES), órgão criado em 1962, aglutinando homens de negócios e inte-
lectuais de vários Estados, como uma reação ao movimento popular.
Eram indicativos do clima da época, marcado pelas disputas polí-
tico-ideológicas que geravam intensos debates e dividiam a população
de modo simplista entre revolucionários e reacionários, deixando a
questão democrática na sombra.

200
História de sergipe: república

3.4 Resumo (1946-1964)

Na segunda fase do domínio populista, o país viveu, até então, a


maior experiência democratizante. A vida política adquiriu maior di-
namismo com crescente margem de atuação das forças internas. O jogo
partidário ganhou autonomia e funcionalidade; o grau de competição
se ampliou. É certo que a cassação do registro do Partido Comunista
comprometeu a ampla liberdade de atuação política. Apesar disso,
grande parte dos proscritos continuou atuando politicamente em
outras siglas e, geralmente, apoiando a UDN, que não se engajou na
campanha anticomunista como ocorreu em outros Estados (RJ, PB e AL).
A alternância de poder foi exercitada com boa regularidade. PSD
e UDN se revezaram no governo após dois mandatos consecutivos. Os
governos foram se manifestando paulatinamente mais sensíveis às de-
mandas sociais. Os setores mais representativos do conservadorismo
desgastaram-se diante das tendências voltadas para a democratização
da sociedade. No processo sucessório de 1962, aquelas agremiações
cindiram-se, indicando crise de hegemonia.
As intervenções das forças armadas, especialmente do Exército, e o
exacerbamento do partidarismo que passou a instrumentalizar várias
instituições públicas, dentro de orientação clientelista, concorreram
para dificultar o processo de democratização. Essa partidarização im-
pregnou o aparelho policial e o Judiciário, que, sem o distanciamento
constitucional esperado, comprometia a sua legitimidade e a própria
natureza do processo democrático. Como efeito, em determinados
momentos, a impunidade aumentou e com ela a violência política.
Na economia, a defasagem entre o Sudeste e o Nordeste cresceu
consideravelmente e as dificuldades aumentaram. O modelo agro-
exportador revelou-se vulnerável diante da ampliação do padrão de
acumulação industrial. As empresas têxteis de Sergipe mostraram-
-se incapazes de enfrentar a competição e declinaram. O comércio
expandiu-se, mas os ramos tradicionais se ressentiram da competição
de novos grupos ligados ao setor monopolista do Sudeste. Da mesma
forma, os serviços ampliaram-se em grande parte sob a mesma in-

201
Ibarê Dantas

fluência da dependência regional. Apenas a agropecuária vivia seu


grande momento. Apesar disso, o Estado passou a investir na cons-
trução da infraestrutura básica e na montagem de estratégia para o
desenvolvimento estadual.
Apesar disso, a sociedade civil expandiu sua área de atuação e
manifestou-se dinâmica. O sindicalismo fortaleceu-se e acompanhou
a mobilização política, empunhando bandeiras reformistas. As mani-
festações culturais, permeadas de iniciativas profícuas por parte dos
grupos privados, revelaram-se muito mais variadas e ricas do que na
fase precedente. Isso acontecia sem que o Estado deixasse de assumir
papel importante. Sem as orientações autoritárias do período anterior,
atuou no ensino fundamental, criou instituições de ensino superior e
entidades culturais, além de subsidiar artistas e escritores, ao tempo
em que crescia a preocupação com a questão social.
De conformidade com as influências nacionais, foi-se fortalecendo
o projeto nacional-popular, envolvendo intelectuais e artistas imbu-
ídos da tarefa de construir o Estado Nacional com vista à tomada
do poder. À medida que as tendências populistas se acentuavam, o
movimento foi contando com o apoio dos aparelhos estatais, tanto
do governo federal quanto do estadual. Mas a incorporação do poder
público a esse projeto não foi suficiente para sua realização efetiva.
Num momento de inflação ascendente, o Estado foi-se revelando
incapaz de atender as demandas populares. Diante das pressões de
vários grupos sociais, a economia passou a apresentar problemas
que exigiam medidas corretivas, inclusive contenção de gastos. Mas
as tendências populistas não admitiam sacrifícios sociais e o projeto
nacional-desenvolvimentista foi sendo atropelado pela mobiliza-
ção política nacional. A politização exacerbou-se e as propostas de
mudanças se radicalizaram, questionando a propriedade privada
dos meios de produção, apontando para o socialismo. Sem bases de
sustentação amplas e consistentes, o governo foi perdendo a luta
político-ideológica e o projeto nacional-popular foi atropelado por
uma coalizão civil-militar que interveio, levando ao seu termo o do-
mínio populista, interrompendo o processo democrático.

202
IV
O ESTADO AUTORITÁRIO E A ASCENSÃO DOS
EMPRESÁRIOS URBANOS (1964-1982)

4.1 A Tutela Militar e o Processo Político-administrativo

4.1.1 A Reestruturação do Poder. Celso de Carvalho e Lourival Batista (1964-1968)

Quando o presidente da República João Goulart foi deposto pelos


militares, o país passou a ser governado, de fato, pelos titulares das
três Armas: Exército, Marinha e Aeronáutica. Este triunvirato formou
o “Comando Supremo da Revolução”, que lançou um Ato Institucional
apresentando as primeiras diretrizes da nova ordem. Por esse tempo,
foi escolhido o novo chefe do Executivo, o marechal Humberto de
Alencar Castelo Branco, que tomou posse no dia 15.04.1964.
Nos diversos Estados, os comandantes da corporação do Exército
passavam a atuar como poderosas autoridades, sobrepondo-se muitas
vezes aos próprios governadores. Começava o período da tutela militar
com o objetivo de combater a subversão e reorientar a política nacio-
nal. Neste sentido, a primeira preocupação dos oficiais que mandavam
era de desmontar a estrutura de poder vigente, reprimindo os grupos
envolvidos com o governo deposto.1

1
Para uma versão ampliada deste capítulo, ver José Ibarê Costa Dantas. A Tutela Militar em
Sergipe - 1964/1984. (Partidos e Eleições num Estado Autoritário). Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1997.

203
Ibarê Dantas

Em Sergipe, o governador João Seixas Dória, que estava afinado


com o projeto reformista do presidente Goulart, foi preso, levado para
o quartel da 6a Região Militar, sediada em Salvador. O vice, Sebastião
Celso de Carvalho (PSD), foi empossado sem protocolo e poucos dias
depois o governante deposto era cassado e transferido para a ilha de
Fernando de Noronha, onde passaria 117 dias ao lado do ex-governador
de Pernambuco, Miguel Arraes.2 A Assembleia Legislativa, pressionada
por militares, cassava o mandato do seu governante, então prisioneiro,
e de quatro deputados.3 A essa altura, o movimento repressivo estava
em plena atividade, prendendo e cassando prefeitos, enquanto sin-
dicalistas, estudantes, intelectuais, trabalhadores rurais e urbanos
eram levados para o quartel do 28o BC sem mandato judicial, sem
culpa formada, todos sob o arbítrio das autoridades castrenses, cuja
responsabilidade se tornava difícil estabelecer. Como a corporação
militar em Sergipe estava subordinada à 6a Região Militar, sediada
em Salvador/BA, geralmente não se sabia quem autorizara a prisão.
Em situação de incerteza, cerca de uma centena de cidadãos perma-
neceram por três meses prisioneiros no quartel do Exército, situado
no alto da Colina, enquanto na cidade os meios de comunicações
ficavam sob controle dos militares. Os que tiveram um mínimo de
participação política e não eram presos passavam a viver na inse-
gurança, sujeitos, a qualquer momento, a serem alvos da sanha dos
delatores que proliferaram em todos os setores.
Na área da política partidária, embora o momento fosse de
certa retração, a competição continuava renhida nos bastidores.
Lembremo-nos de que, em Sergipe, embora o PSD ocupasse os cargos
do Executivo, não dispunha de maioria no Legislativo. A Assembleia
Legislativa eleita em 1962 era composta de 32 deputados, sendo 13 da
UDN, cinco do PSD, sete do PR, dois do PTB, quatro do PRT e um do
PST. Durante o governo de Seixas Dória, o bloco partidário que lhe

2
Ver Seixas Dória. Eu, Réu Sem Crime. Rio de Janeiro: Equador, s/d.
3
Os deputados cassados foram Cleto Maia (PRT), Viana de Assis (PR), Nivaldo Santos (PR) e
Balthazar Santos (PSD).

204
História de sergipe: república

deu sustentação era composto da coalizão PR + PSD + PRT, formada


de 16 deputados. Como geralmente os governistas conseguiam a
adesão de algum nome de outros partidos, dependendo das circuns-
tâncias, a precária maioria ia sendo alcançada. Após as cassações
dos quatro parlamentares (dois do PR, um do PSD e um do PRT), a
superioridade dos leandristas ficou patente. Sendo o presidente da
República e alguns dos seus assessores bastante identificados com a
UDN, Leandro Maciel, com o apoio do chefe do Estado Maior da 6ª
Região Militar, andou tramando a substituição de Celso de Carvalho,
mas a operação não se concretizou em face da resistência do comando
daquela Região.4
Na esfera nacional, essa primeira fase do Estado Autoritário trans-
corria marcada de tensões pelas disputas entre duas alas que dividiam
o Exército: os “sorbonistas” e os “duros”. Enquanto o primeiro grupo
controlava o Executivo federal, através da tecnocracia civil-militar e
tentava implementar as reformas, o dos “duros”, vinculado ao Minis-
tério da Guerra, pressionava por ações mais radicais, com processos
de intimidação e métodos violentos.5 Quando, em 1965, os candidatos
apoiados pelos militares foram derrotados nas eleições de governa-
dor em alguns Estados, os “duros” insatisfeitos ameaçaram impedir
a posse dos vencedores e a continuidade do mandato do marechal
presidente. Diante dessas reações, a solução encontrada pelo gover-
no foi editar o Ato Institucional número dois (AI-2) em outubro de
1965, extinguindo o sistema partidário no sentido de adquirir maior
controle sobre o quadro político.
A edição do Ato Institucional nº 2 indicava uma grande intervenção
nas instituições políticas nacionais. Além da extinção do pluripartida-
rismo, o governo impunha a eleição indireta para presidente e vice-pre-
sidente. Seguia-se uma enxurrada de leis, regulamentando a formação
dos partidos e disciplinando a realização das eleições sem qualquer

4
Cf. Sebastião Celso de Carvalho. O Destino Acontece. Aracaju: Livraria Regina, s/d.
5
General Gustavo Moraes Rego. Depoimento in Maria Celina D’Araujo- et ali... (Introdução e
Organização). Visões do Golpe. A memória militar sobre 1964. Rio de Janeiro: Relume-Dumará,
1994, p.54.

205
Ibarê Dantas

participação efetiva do Congresso. Posteriormente, em 1967, foi editado


o Ato Complementar nº 4 que exigia um mínimo de 120 deputados e 20
senadores para formação de cada partido a ser devidamente registrado.
Números elevados, especialmente para os cidadãos que desejavam
continuar participando do processo político na oposição, sujeitos a
todos os tipos de adversidades. Dentro dessas perspectivas, enquanto
na Aliança Renovadora Nacional (ARENA), a agremiação governista,
o problema maior era acomodar a diversidade dos pretendentes, no
Movimento Democrático Brasileiro (MDB), desde o início uma espécie
de frente oposicionista, a grande dificuldade era encontrar quadros
para atender às mínimas exigências da nova legislação.
Em Sergipe, a opção pelo situacionismo foi ainda mais acentuada.
Na Assembleia Legislativa, todos optaram pela ARENA, fato raro,
senão único, na federação. Apenas entre os deputados federais, o
bloco que inicialmente optou pelo MDB foi relativamente elevado.
Dos sete parlamentares da representação de Sergipe na Câmara dos
Deputados, quatro aderiram à ARENA e três ao MDB.6
A exemplo do que ocorria no âmbito nacional, a obrigação da
convivência de tradicionais políticos rivais, dentro de uma mesma
agremiação, se tornava plena de dificuldades. No interior, a situação
parecia caminhar para o impasse, pois todos queriam ir para a ARENA.
Em vários municípios, os líderes que buscavam a agremiação gover-
nista eram inimigos irreconciliáveis. Apesar disso, raríssimos foram
os que optaram pelo partido oposicionista, pois a maioria esmagadora,
dotada de maior praticismo mercantil, entre o distanciamento do
poder longe dos desafetos e as benesses com os adversários, escolheu
a segunda alternativa. No dia 20 de janeiro de 1966, altas lideranças
dos principais partidos, recentemente extintos, tiveram uma primeira
discussão, mas não houve entendimento.7 Somente em outro encontro
chegaram a um acordo sobre a formação do Diretório da ARENA.

6
Ver Diário da Justiça Eleitoral, 26.05.1966.
7
Participaram da discussão: Leandro Maynard Maciel, Heribaldo Dantas Vieira e Lourival
Batista (ex-UDN), Júlio Cézar Leite e Godofredo Gonçalves Diniz (ex-PR), José Rollemberg
Leite e Sebastião Celso de Carvalho (ex-PSD).

206
História de sergipe: república

Enquanto o partido situacionista se instalava aglutinando a esma-


gadora maioria dos quadros de representação da classe dominante
de Sergipe, os organizadores do MDB continuavam encontrando
dificuldades, especialmente pela carência de nomes.8 Apesar das
resistências, um grupo de cidadãos, de origem social diversificada,
concordou em participar do diretório. Inicialmente formou-se uma
Comissão Diretora Regional e a partir desses nomes estabeleceu-se
a primeira Diretoria do MDB.9
Criados os dois partidos, restava estruturar as comissões inter-
ventoras municipais que haveriam de transformar-se em diretórios.
Enquanto o MDB conseguia organizá-las apenas em 33 municípios,
a ARENA com facilidade estruturava-se em todos os 73 que compu-
nham o Estado, sinal evidente da desproporcionalidade entre as duas
agremiações. Mas, antes da realização do pleito de 15 de novembro
de 1966, que haveria de eleger os novos deputados e senadores, uma
questão maior absorveu as atenções dos diversos grupos políticos do
Estado, a escolha do novo governador de Sergipe. Seguindo o calendário
eleitoral, 11 governadores foram eleitos em 1965, restando outros 11 a
serem escolhidos em 1966. Mas em fevereiro deste ano, foi editado o
AI-3 determinando que a eleição para governador e vice-governador
seria feita pela maioria absoluta da Assembleia Legislativa, em sessão
pública e votação nominal.10 O processo de escolha deveria passar por
dois momentos: num primeiro, a Assembleia Legislativa apresentaria
uma lista tríplice; num segundo momento, o presidente da República
escolheria um dos nomes. Na votação realizada em fins de maio, 45
convencionais indicaram Leandro Maynard Maciel em primeiro lugar.11

8
Empenharam-se em organizar o MDB: José Carlos Teixeira, Walter Batista, Ariosto Amado,
Otávio Penalva, entre outros.
9
A Diretoria incluiu José Carlos Teixeira como presidente, Walter Batista como vice, na 1ª
vice-presidência Ariosto Mesquita Amado e na 2ª vice-presidência Eraldo Machado Lemos.
Antônio Tavares ficou na Secretaria geral e Umberto Mandarino como tesoureiro. Cf. Diário
da Justiça Eleitoral, 26.05.1966.
10
O AI-3 prescrevia que os prefeitos das capitais seriam indicados pelo governador.
11
Na votação, Leandro Maciel saiu em primeiro lugar com 26 votos, seguido de Augusto do Prado
Franco com 22 votos e, por fim, no terceiro lugar, Arnaldo Rolemberg Garcez com 19 votos.

207
Ibarê Dantas

Mas o governador Celso de Carvalho, que já havia tratado do assunto


com o presidente Castello Branco antes da votação, ao levar-lhe a lista
tríplice o persuadiu da inconveniência da escolha de Leandro Maciel.
Em meio à guerra de bastidores, o deputado federal Lourival Batista,
médico baiano de nascimento, cercava com agrados o marechal Castello
Branco, e Luís Viana Filho, então chefe da Casa Civil da Presidência da
República, terminou sendo indicado para governar o Estado.12
Ao fim, Arnaldo Rolemberg Garcez abdicou de suas pretensões,
a Leandro Maynard Maciel foi-lhe concedida a candidatura para
o Senado, enquanto Augusto do Prado Franco concorreria para a
Câmara dos Deputados nas eleições marcadas para 15.11.1966. Nem
as regras que o marechal Castello Branco traçara para a escolha dos
candidatos situacionistas eram respeitadas pelo próprio presidente.
Dessa forma, em junho de 1966 a indicação foi divulgada e, no
mês seguinte, a convenção da ARENA homologou a chapa, tendo
como candidatos Lourival Batista para governador e Manuel Cabral
Machado para vice-governador. Em início de setembro, a Assembleia
Legislativa ratificou-a por unanimidade de seus membros: 31 votos.
Decidido o nome do governador, a ARENA tratou de escolher
seus candidatos para o pleito de 15 de novembro de 1966. Enquanto
no partido governista havia abundância de candidatos, no MDB o
problema era a escassez de quadros.
Disputando o voto de um eleitorado de 148.617 pessoas, 8,8% acima
do de 1962, a campanha foi relativamente curta, mas tensa, dentro de
um quadro nacional de exacerbação do conflito entre o Executivo e o
Legislativo. Além da decretação sucessiva de normas casuísticas, ou
seja, dispositivos voltados sobretudo para atender a casos particulares
do momento, o marechal Castello Branco, que havia prometido às
lideranças do Congresso não mais cassar, voltou a fazê-lo pressionado
pela linha dura do Exército. Diante das reações do Congresso, mandou
as tropas fechá-lo a menos de um mês do pleito.

12
Versão muito corrente na época e confirmada pelo ex-governador Celso de Carvalho. Cf.
Depoimento ao autor em 12.12.1990.

208
História de sergipe: república

Entre os membros da ARENA, a tônica da campanha foi a com-


petição exacerbada dos candidatos entre si, marcada pela compra
de votos e outros procedimentos nada abonadores. Decorrida a elei-
ção, notou-se a continuidade da competição partidária entre UDN x
PSD+PR dentro da ARENA, com vantagem para os candidatos que
antes pertenceram à primeira agremiação. No conjunto, o partido
oficial elegia o senador, seis deputados federais e 26 estaduais, en-
quanto o MDB obtinha a vitória de um deputado federal e apenas
cinco estaduais.13
Com maioria nas duas casas legislativas, o presidente Castello
Branco levou adiante seu projeto de completar a institucionalização
do novo regime com uma Carta Constitucional mais condizente com
as concepções do grupo “sorbonista”. Em 7 de dezembro, o governo
baixou o AI-4, convocando o Legislativo Federal para discussão, vo-
tação e promulgação de um projeto constitucional encomendado a
uma comissão de juristas. Trabalhando sob a limitação de prazos
reduzidos, o Congresso promulgou a nova Constituição em 24.01.1967,
ou seja, pouco mais de um mês após a convocação. Apesar da manu-
tenção dos direitos individuais, dentro da tradição liberal, a nova
Carta no fundo legalizava medidas excepcionais enquanto ampliava
as atribuições do Executivo federal, retirava do Congresso o direito
de legislar sobre segurança e finanças públicas e coibia poderes do
Judiciário. Aliás, o destaque dado à questão da segurança nacional
foi expressivo. Ampliava-a para o âmbito interno e estendia a sua res-
ponsabilidade para todos (art. 89). Além de tudo, mantinha as eleições
indiretas para presidente da República e governadores.
A essa altura, o governo de Celso de Carvalho ultimava os pre-
parativos para passar o cargo ao seu sucessor. Depois de assumir a
titularidade do Executivo Estadual, em abril de 1964, com a situação
econômico-financeira do Estado difícil, com ajuda do governo central
e de recursos da USAID, num tempo de baixa das medidas populistas

13
Bonifácio Fortes. Democracia de Raros in Revista Brasileira de Estudos Políticos. Belo Horizonte/
MG, UFMG, 1968.

209
Ibarê Dantas

e de queda da inflação, o saneamento financeiro foi se tornando possí-


vel. A arrecadação passou de 7,7 bilhões em 1965 para 12,2 bilhões em
1966, permitindo assim algum saldo para investimento. Neste contex-
to, foram criadas algumas instituições como a Companhia Agrícola
de Sergipe (COMASE) e a Companhia de Habitação Popular (COHAB),
que construiu cem casas populares. Apoiou ampla reestruturação do
CONDESE e reformas no DESO e na ENERGIPE.14
Enfim, a situação do Estado parecia encaminhar-se para um está-
gio de estabilidade sem grandes turbulências à vista. Com a economia
em recuperação, as finanças públicas sendo saneadas, os grupos políti-
cos representantes dos interesses dominantes em fase de acomodação
dentro do partido oficial, a ARENA, e os descontentes enfraquecidos
no MDB, tudo isso ajudava a reestruturação de um pacto de domina-
ção, sob a tutela militar, com perspectiva de continuidade. Contudo,
no âmbito federal as contradições político-militares alimentavam um
processo de polarização crescente, apontando para o enfrentamento.
Dentro do novo quadro partidário, marcado pelo bipartidarismo,
novos governadores tomavam posse, um marechal substituía outro
na Presidência da República e parecia que o sistema político se enca-
minhava para algum tipo de institucionalização. Mas os problemas
político-sociais legados pelo governo anterior, o fortalecimento dos
“duros” e a impotência dos partidos legalizados para intermediar as
questões emergentes iriam estimular a reorganização das agremia-
ções ilegais e a radicalização.
Em Sergipe, em inícios de 1967, podia-se dizer que a estrutura do
autoritarismo encontrava-se implantada. As instituições viviam sob
o acompanhamento dos órgãos de informação, as relações pessoais
predominando de modo mais acentuado, as formas de participação
sendo substituídas pelos métodos de cooptação, as forças inter-
mediárias enfraquecidas. Enfim, a sociedade civil revelava-se mais
debilitada diante da tutela militar que também manietava a socie-

14
Cf. Sebastião Celso de Carvalho. O Destino Acontece. Aracaju: Livraria Regina, s/d.

210
História de sergipe: república

dade política. Embora o quadro partidário estivesse agora marcado


por uma nova divisão (ARENA X MDB), na agremiação governista a
coexistência de antigos adversários numa mesma sigla resultava em
tensões continuadas. Do outro lado, apesar da extrema limitação dos
espaços de atuação para os oposicionistas ao regime, alguns grupos
se movimentavam.
Nesse contexto, Lourival Batista tomou posse em 31.01.1967. Depois
de vinte anos com governadores eleitos pelo povo, Sergipe voltava a
ser administrado por figuras indicadas pelo presidente da República
como nos tempos do Estado Novo. Naquela época, os representantes
dos ditadores eram chamados de interventores, mas, dessa vez, o dis-
curso da “Revolução” não admitia tal denominação. Nessa nova fase
de autoritarismo, diziam-se governadores, considerando, inclusive,
o funcionamento do sistema representativo, embora Lourival Batista
tenha tomado posse e governado quase metade do seu mandato com
a Assembleia fechada. Sinais indicativos da nova ordem política.
O novo governante do Estado, nascido e criado na Bahia, fez
carreira política em Sergipe. Contemporâneo de Augusto do Prado
Franco na Faculdade de Medicina (BA), foi convidado a atuar como
médico nas fábricas de tecidos, em São Cristóvão (SE), e aí começou
a preparar sua base política, tendo sido prefeito daquela cidade, de-
putado estadual e deputado federal.
Na política interna, sua posição não era das mais confortáveis. Es-
colheu secretariado abrangente, contemplando várias forças políticas
do momento, mas havia tanto as inconformidades do senador Lean-
dro Maciel e do deputado Augusto Franco, que se sentiam preteridos
por suas espertezas, quanto as desconfianças das facções do ex-PR e
do ex-PSD, que ainda o identificavam como udenista pouco confiável.
Não obstante esse clima um tanto adverso, o novo governador, desde
cedo, começou a sinalizar para suas pretensões de controlar o quadro
político. Antes mesmo de tomar posse, recorreu a casuísmos jurídicos
e nas eleições municipais de 1967 contribuiu para que a ARENA ele-
gesse 68 prefeitos. O MDB conseguia vencer apenas em Estância, um
dos maiores centros urbanos do interior, e no inexpressivo município

211
Ibarê Dantas

de Pedra Mole. Em Aracaju, onde houve eleição apenas para a Câmara


Municipal, a ARENA elegeu 11 vereadores e o MDB conseguiu sete.
“Em 32 municípios a ARENA disputou sem adversários”.15
Três dias depois daquele pleito, ou seja, em 15.03.1967, assumiu a
Presidência da República o marechal Artur da Costa e Silva, porta-voz
da ala dos “duros”. Todavia, a sua ascensão não foi suficiente para
aplacar as ambições dos militares da linha dura. Antes facilitou as
suas investidas. É verdade que a mudança de governo inicialmente
trouxe uma renovação do discurso oficial. Falou-se recorrentemente
em humanismo, em desenvolvimento com participação e promoção
social e, na política externa, voltou-se para uma orientação mais sinto-
nizada com os países do Terceiro Mundo, substituindo o alinhamento
incondicional com os Estados Unidos. Envolvida por essa retórica,
a Nação, depois de três anos de crescente polarização, parecia que
caminhava para uma fase de contemporização e desarmamento dos
espíritos. Contudo, além dos problemas herdados do governo ante-
rior, o novo presidente, cercado de elementos da linha dura, inclusive
em ministérios, e pressionado por radicais nos quartéis, tenderia a
encontrar crescentes dificuldades para concretizar suas anunciadas
intenções de abertura.
O contencioso dos militares com o movimento estudantil acen-
tuou-se, alimentado por outras questões, tais como a dos vestibulan-
dos excedentes, a renovação do acordo MEC-USAID e a nova invasão
da Universidade de Brasília (abril de 1967), aumentando a indisposição
entre as partes. O governo proibiu a UNE de efetuar seus congressos,
mas, em 1967, os estudantes realizaram-no com a colaboração de
setores da Igreja Católica, que terminaram hostilizados pelas forças
da repressão. Promoveu-se uma reforma universitária, mas o clima
de animosidade tornou-a mal recebida, apesar de atender a algumas
reivindicações passadas do mundo acadêmico.16 Em meio a tensões

15
Bonifácio Fortes. Ob.cit., 1968, p.114.
16
Ver José Willington Germano. Estado Militar e Educação no Brasil (1964/1985). São Paulo:
Cortez/UNICAMP, 1992, p.106-156.

212
História de sergipe: república

continuadas, a morte do estudante Edson Luís, em confronto com


os policiais do Rio de Janeiro, acendeu as paixões, alimentando o
processo de mobilização estudantil que cresceu ao longo dos meses,
tornando a situação bastante conflituosa.
Por outro lado, se as relações dos militares com os políticos opo-
sicionistas já eram difíceis, pioraram a partir da morte do marechal
Castelo Branco (julho de 67) e da formação da “Frente Ampla”, lide-
rada por Carlos Lacerda, buscando o apoio de Jango e Kubitschek. O
anúncio do Pacto de Montevidéu (setembro de 1967), unindo os três
principais líderes partidários nacionais, antes adversários, numa
proposta alternativa ao domínio militar, galvanizou as atenções dos
políticos de todos os partidos e de todas as facções. A maioria esmaga-
dora dos parlamentares do MDB optou pelo apoio ao novo movimento.
Em Sergipe, a “Frente Ampla” foi usada em vários sentidos. Alguns
deputados estaduais da ARENA utilizaram-na como uma espécie de
chantagem diante do governador, para conseguir maior atenção. Em
04.04.1968, o governo federal proibiu a referida “Frente”, e as forças
que apoiavam seus líderes não se manifestaram. O pretensioso mo-
vimento caiu como um castelo de cartas. Com os partidos legais sem
capacidade de intermediar as grandes questões nacionais, os ilegais
se apresentaram como alternativa. Alguns segmentos sociais acredi-
taram em suas propostas, e a ideia de luta armada ganhou adesão de
expressiva parte da esquerda. Em Sergipe, o movimento estudantil,
sob a hegemonia do PCB, desenvolvia ações mais moderadas do que
em outros Estados. O “partidão” ameaçava a legalidade, apenas,
quando promovia treinamentos de algumas lideranças voltados para
a luta armada.
Do lado do governo, o problema maior vinha da atuação dos seto-
res da linha dura. Divididos em vários subgrupos, ganhavam terreno,
impacientes, pressionando as autoridades com manifestos, ameaças
e até ações de rebeldes nas ruas e nos quartéis. A situação começou
a ficar ameaçadora depois que o deputado Márcio Moreira Alves
fez um discurso ofensivo às Forças Armadas e os militares pediram
sua cassação. O processo evoluiu até que na noite de 12.12.1968, o

213
Ibarê Dantas

Congresso, por 216 x 141 votos, negou a licença para cassá-lo. No dia
seguinte o marechal Costa e Silva, após a reunião com o Conselho de
Segurança Nacional, sob a pressão das Forças Armadas, especialmente
da sua linha dura, editou o AI-5, marcando o início de nova fase do
Estado Autoritário.

4.1.2 O AI-5 e o Novo Ciclo Repressivo. De Lourival Batista a Paulo Barreto (1969-1973)

O quinto Ato Institucional significava a vitória da linha dura so-


bre os moderados, proporcionando nova fase do Estado Autoritário.
Com esse instrumento normativo, o Executivo tornou-se autorizado
a fechar as diversas casas legislativas, intervir nos Estados e municí-
pios, cassar mandatos eletivos e suspender direitos políticos, remo-
ver e aposentar ou reformar funcionários, decretar estado de sítio e
confisco de bens, suspender garantias constitucionais e estabelecer
censura à imprensa. As garantias dos magistrados foram suspensas
assim como o habeas corpus para variados casos. Era a legalização mais
explicitada do arbítrio do governo da República. Sob a predominân-
cia dos “duros”, a tutela militar acentuava-se com a ampliação das
operações coercitivas tanto sobre o Legislativo e o Judiciário quanto
sobre a sociedade civil.
Em Sergipe, no dia seguinte à edição do quinto Ato Institucional,
recomeçaram as prisões dos estudantes que haviam participado do
congresso da UNE em Ibiúna (SP), acrescidos de mais sete ou oito
pessoas. Vários outros cidadãos que haviam sido presos nos primei-
ros meses do movimento voltaram a ser convocados para depor. Três
conceituados professores foram intimados a comparecer ao 28º BC,
onde também foram inquiridos. Quanto aos estudantes, após trinta
dias foram liberados e, já indiciados, passaram a responder processo
junto à Justiça Militar da 6a Região Militar na capital da Bahia.
A recém-criada Universidade Federal de Sergipe, que já sofria
pressão, a partir de então passou a viver sob fogo cruzado dos órgãos
repressivos: da 6ª Região Militar, do Departamento de Polícia Federal,
da Diretoria da Divisão de Segurança e Informações do MEC e do 28º

214
História de sergipe: república

BC. A situação agravou-se quando o reitor João Cardoso do Nasci-


mento Júnior recebeu ofício da 6ª Região Militar, trazendo anexa a
relação de 32 alunos da UFS para serem desligados dessa instituição.
Depois chegou outra lista com o nome de mais cinco estudantes. Mas
o reitor afastou-os da representação política, protelou a decisão e não
os expulsou, passando a ser mal visto pelas autoridades militares.
Enquanto isso, em outros Estados, entre maio de 1969 a março de
1970, pelo menos 192 estudantes ficavam impedidos de estudar com
base no decreto lei n. 477.17
Por esse tempo, alguns processos, iniciados em 1964, foram re-
ativados e julgados pela Justiça Militar em Salvador, abrangendo
estudantes, sindicalistas e políticos. Em Aracaju, as investigações
prosseguiam atingindo as diversas esferas da sociedade política. No
Judiciário, vários dos seus membros, inclusive juízes e promotores,
foram convidados a depor, em meio a uma luta interna bastante
pronunciada. Afinal, três juízes foram colocados em disponibilidade
pelo próprio Tribunal de Justiça e um foi incluído em lista de cassação
de âmbito nacional. Quanto aos desembargadores, os militares for-
maram alguns processos, mas encontraram dificuldades em levá-los
ao seu termo. Enquanto as operações no Judiciário constituíam-se
sobretudo numa guerra de bastidores que a imprensa não desvelava,
entre os políticos a operação repressiva era noticiada amplamente,
envolvendo sobretudo o Legislativo. Quatro deputados foram presos
no 28º BC, depois cassados e pelo menos outros três foram convidados
a depor.
Em fins de janeiro, o governador Lourival Batista, cumprindo
determinação do Ministério da Justiça, instituiu a Comissão Geral
de Investigação (CGI) para apurar corrupção em todo o Estado. Era
uma forma de obter informações mais seguras para respaldar os
atos punitivos que prosseguiam. Poucos dias após, em 08.02.1969, o

17
Sobre a relação dos punidos e para mais informações, ver José Ibarê Costa Dantas. A Tutela
Militar em Sergipe - 1964/1984 (Partidos e Eleições num Estado Autoritário). Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1997, p. 100-103.

215
Ibarê Dantas

governo federal decretava o recesso, por tempo indeterminado, das


Assembleias Legislativas dos seguintes Estados: Guanabara, Rio de
Janeiro, São Paulo, Pernambuco e Sergipe. A inclusão da casa legisla-
tiva do pequeno Estado foi recebida com manifestações de aprovação
pela imprensa, crente na operação de limpeza. Os ex-deputados Chico
de Miguel e Durval Militão depois de cassados foram enviados para
a Penitenciária. Mas o primeiro continuou controlando a política
de Itabaiana, indicando candidatos e contribuindo para torná-los
vitoriosos. A última lista de cassações atingiu mais dois deputados
estaduais e um federal.18
No decorrer do ano de 1969, os trabalhos da Comissão Geral de
Investigação (CGI), que funcionava na Capitania dos Portos, prosse-
guiram, apurando denúncias recebidas, notificando várias personali-
dades a apresentar sua defesa por escrito em poucos dias e montando
peças visando evidenciar atos ilícitos. Nessa época, um ex-prefeito de
Estância foi condenado na capital da Bahia, por processo iniciado
em 1964 e cumpriu pena na Casa de Detenção Santo Antônio, em
Salvador, por cerca de oito meses, até que foi absolvido.19 Situação
semelhante ocorreu com um grupo de operários vinculados à Leste
Brasileiro. Por esse tempo (agosto de 1970), saiu também a sentença
final dos réus arrolados em outro processo, onde foram indiciados 34
pessoas. Ao fim, quase todos foram absolvidos. Três líderes receberam
sentença de dois anos de reclusão, entretanto por razões diversas
ninguém cumpriu a pena.20 Os estudantes também terminaram não
sendo incriminados. Os que deixaram o Estado para cumprir missões
clandestinas dos seus partidos tiveram destino mais cruel. Entre os
ligados ao PCB, alguns foram para a URSS. Os que retornaram, ainda
na primeira metade da década de setenta, foram presos, torturados e
alguns sofreram sérios riscos de morte. Os vinculados a AP viveram

18
Os novos cassados, por razões diversas, foram os deputados estaduais Rozendo Ribeiro Filho
e Jayme Araújo de Andrade, bem como o deputado federal João Machado Rolemberg.
19
Cf. Manoel Pascoal Nabuco D’Ávila. Entrevista a Osmário Santos, Jornal da Cidade, 07.10.1991.
20
Ver Processo 59/67 da Auditoria da 6a Circunscrição Judiciária Militar. Arquivo do DOPS,
dossiê 747 in Arquivo Público do Estado de Sergipe (APES).

216
História de sergipe: república

situação similar. Enquanto isso os políticos da ARENA e do MDB per-


maneciam obedecendo às regras estabelecidas pelo sistema militar,
alimentando esperanças de mudança no quadro institucional.
Mas as pressões dos generais em postos-chave se acentuaram
depois que o marechal Costa e Silva encomendou ao vice-presidente
Pedro Aleixo projeto constitucional para “restituir a normalida-
de democrática”, segundo a expressão da época. Quando o velho
presidente teimava em legar ao país uma Constituição reformada e
extirpada dos dispositivos coercitivos do AI-5, adoeceu em 28.08.1969,
perdeu o controle da administração e faleceu, em 17.12.1969, sem
conseguir realizar seu intento. Morria também a primeira tentativa
de abertura política.
O vice-presidente, Pedro Aleixo, foi impedido de assumir. Em
31.08.1969 formou-se o Triunvirato, composto pelos comandantes
das três armas, quatro dias depois realizou-se o sequestro do embai-
xador norte-americano, o primeiro de iniciativa dos movimentos
guerrilheiros, ação conjunta da ALN e MR-8. Pouco depois, em 18 de
setembro, era aprovada nova Lei de Segurança Nacional ainda mais
rigorosa. As divergências entre os grupos dentro das Forças Armadas,
que vinham se acentuando no curso de 1969, transbordaram dos
quartéis, pondo em risco a unidade sobretudo do Exército. Premido
pelas circunstâncias, a cúpula militar chegou a um acordo, escolhen-
do o general Médici, ex-ministro do SNI, figura de pouco destaque,
semidistanciada das grandes querelas internas.21 O Alto Comando o
indicou e o Congresso, em recesso desde 13.12.68, foi convocado para
referendar o nome do escolhido, tomando posse cinco dias depois,
ou seja, em 30.10.69.
O governo do general Emílio Garrastazu Médici significava a con-
cretização da aliança contraditória entre os “castelistas” e os “duros”,
expressando mais do que nunca a predominância do sistema, como
entidade impessoal, onipotente, onipresente e irresponsável perante

21
Sobre as ações dos militares, ver Elio Gaspari. A ditadura envergonhada. São Paulo: Companhia
de Letras, 2002.

217
Ibarê Dantas

os direitos civis mais elementares. No topo da hierarquia, o general


Médici representava a chefia do todo poderoso Executivo, delegando
a Delfim Neto o comando da economia, a Orlando Geisel o Exército e
a Leitão de Abreu a coordenação política. Enquanto isso, algumas ins-
tituições liberais persistem na forma. Os partidos lançam candidatos,
as eleições continuam sendo realizadas segundo calendários prees-
tabelecidos e o Congresso funciona sem solução de continuidade.22
Foi dentro desse padrão autoritário que transcorreu o processo
de sucessão governamental em Sergipe. Em meados de fevereiro de
1970, o presidente nacional da ARENA, Rondon Pacheco, veio a Ara-
caju, como delegado do sistema, para ouvir os pretendentes e viajou
com a lista composta de oito nomes.23 O governador Lourival Batista
foi recebido pelo presidente da República, manteve contatos junto a
generais e terminou o engenheiro Paulo Barreto de Menezes sendo
indicado. Diretor do Departamento de Estrada de Rodagem, recém-
-filiado ao partido do governo, era o único da lista dos oito sem prévia
militância política. Anunciada a escolha em 08.05.70, divulgou-se
que o general Médici teria dito: “quero um técnico no governo”. A
Executiva da ARENA aprovou-o por unanimidade24 e, posteriormente
(03.10.1970), a Assembleia, através de seus 19 deputados da ARENA,
elegeu Paulo Barreto de Menezes como governador e Adalberto Moura,
ex-funcionário do Banco do Brasil, como vice-governador. Fechada
desde 09.02.69, a Assembleia Legislativa de Sergipe, após 404 dias
de recesso forçado, foi reaberta no início de maio de 1970, a partir
da necessidade de cumprir seu papel institucional na formalização
do ritual sucessório. Elegeu nova Mesa e passou a desenvolver seus
trabalhos desfalcada dos ex-deputados cassados.

22
Ver Fernando Henrique Cardoso. Os Impasses do Regime Autoritário: o caso brasileiro. Petrópolis,
RJ: Vozes, 1980, Estudos Cebrap, n. 26. Thomas Skidmore. Brasil: de Castelo a Tancredo, 1964/1985.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.
23
Os nomes eram os seguintes: Paulo Barreto de Menezes, senador Júlio César Leite, Manoel
Conde Sobral, Augusto do Prado Franco, José Passos Porto, Raimundo Menezes Diniz, Murilo
Dantas e Djenal Tavares de Queiroz. Leandro Maciel declarou que abdicou de concorrer em
face de compromissos com Manoel Conde Sobral. Cf. Diário de Aracaju, 15-16.02.1970.
24
Diário de Aracaju, 12.05.1970.

218
História de sergipe: república

Na esfera do Executivo, o então governador Lourival Batista


renunciou (14.05.1970) a fim de poder concorrer a uma cadeira no
Senado na eleição de 15.11.1970. Terminava assim seu mandato como
um administrador operoso e conciliador, embora não tanto quanto
esteve a propagar no seu slogan “Pacificação e Desenvolvimento”.
É certo que, atuando como “soldado da Revolução” e tentando
ampliar o leque de forças de sustentação fora dos quadros da ex-UDN,
concorreu para desgastar a influência de Leandro Maciel e Augusto
Franco e inibir a competição tradicional entre UDN e PSD. Embora
as rivalidades entre os partidos extintos tendessem a ser diluídas
pela vigência do bipartidarismo, Lourival Batista passou a propagar
a imagem de pacificador da política sergipana, desconsiderando que
a diminuição da violência já vinha se processando desde o governo de
Luiz Garcia. Se a redução das mortes prosseguiu no governo Lourival
Batista deveu-se também às práticas coercitivas dos militares, embora
não tenham evitado que no primeiro ano de sua administração fossem
assassinados dois influentes líderes políticos.25
Quanto à sua política econômica, esteve sempre marcada pelo signo
da ostentação, estimulada pelo aumento vertiginoso da receita, decor-
rente sobretudo da mudança da legislação tributária. Favorecido por
tantos recursos, o governo estadual realizou numerosas construções:
estádio de futebol, edifício de 28 andares numa cidade de construções
baixas, grupos escolares, colégios, postos de saúde, rodovias e conjun-
to habitacional. Além do mais, houve investimentos em saneamento,
ampliou-se a rede elétrica pelo interior em cerca de 32%, implantou o
Distrito Industrial e empenhou-se pela criação da Universidade Federal
de Sergipe (UFS). Governando grande parte do tempo com a Assembleia
fechada e sem órgão fiscalizador efetivo, diversas construções foram
realizadas sem abertura de concorrência e, aparentemente, sem a
devida adequação com a definição de prioridades, subestimando a es-
tratégia de planejamento do CONDESE. Isso, porém, não era suficiente

25
Foram assassinados o líder do ex-PSD de Itabaiana, Manoel Teles de Mendonça (08.1967), e
o deputado estadual da ex-UDN, então na ARENA, Antônio Tôrres Júnior (12.1967).

219
Ibarê Dantas

para abalar seu prestígio solidificado numa era de intransparência,


facilidade de recursos e fortalecimento da máquina pública. Dentro
desse quadro, antes de deixar o governo criou o Tribunal de Contas
do Estado e nomeou como conselheiros boa parte de seus auxiliares,
prolongando sua influência sobre a política sergipana.
Quando Lourival Batista renunciou, em 14.05.1970, seis meses
antes das eleições para candidatar-se ao Senado, criou um problema
institucional para o governo federal resolver. Como o vice-governador,
Manuel Cabral Machado, preferiu o Tribunal de Contas ao governo de
nove meses e a posse de Paulo Barreto de Menezes estava estabelecida
para 15.03.71, tornou-se necessário escolher um novo sucessor. Neste
interstício, inicialmente assumiu interinamente a chefia do Executivo
o então presidente da Assembleia Legislativa Wolney Leal de Melo,
de 14.05.1970 a 04.6.1970, quando foi substituído por João Andrade
Garcez para cumprir o mandato “tampão” que haveria de prolongar-
-se até meado de março do ano seguinte.
A indicação do novo governante sergipano seguiu o mesmo ritual
da política do regime autoritário. Em meio a muita divergência inter-
na entre os principais chefes políticos locais, a Presidência arbitrou,
concedendo o prazo de 72 horas para a executiva arenista apresentar
a lista tríplice. Desta relação, o general Médici escolheu João Andrade
Garcez, tendo como vice Manoel Prado Vasconcelos. Dois dias depois,
a Assembleia homologou-os e, após mais dois dias, empossou-os.26
O novo chefe do Poder Executivo sergipano era um cirurgião den-
tista voltado sobretudo para o exercício da profissão, atuando inclu-
sive junto ao Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários
(IAPC). Homem sóbrio e discreto, inscreveu-se na ARENA em face da
informação de que todo servidor federal era obrigado a filiar-se no
partido do governo sob pena de não receber os proventos.27 Apesar da

26
Cf. João Andrade Garcez, depoimento ao autor em 30.11.1995. Sobre a lista tríplice, ver Diário
de Aracaju, 30.05.1970, 02.06.1970, 05.06.1970.
27
Cf. João Andrade Garcez, depoimento ao autor em 30.11.1995. Sobre seu currículo, ver Gazeta
de Sergipe, 30.05.1970. Seu vice Manoel do Prado Vasconcelos era comerciante de Riachuelo,
mais conhecido por Reizinho e também sem militância político-partidária.

220
História de sergipe: república

pequena duração de seu mandato, João Andrade Garcez fez questão


de escolher seu próprio secretariado com experiência, o que o ajudou
a vencer as dificuldades, entre as quais as maiores foram as pressões
do general de brigada Abdon Sena para punir vários políticos, o reitor
e desembargadores.
Em meio a esses problemas, João Andrade Garcez iniciou reforma
administrativa, construção de adutoras para o sertão, mas consi-
derava como grandes feitos de seu governo as obras de preparação
para o Porto, a liberação da TV e sobretudo ter conseguido que a
unidade da Petrobras não fosse transferida para Salvador como
queria o então presidente da referida estatal, general Geisel. Em
todos esses três empreendimentos, julgava decisiva a interferência do
presidente Médici a quem atribuía grandes benefícios proporcionados
a Sergipe.28 Além disso, em seu governo tentou-se renovar o setor
educacional e desenvolveu ação cultural, voltada sobretudo para
preservação da documentação do Arquivo Público e dos monumentos
tombados pelo Patrimônio Histórico, tudo sob a liderança dinâmica
do seu secretário de Educação.
A influência no processo eleitoral, que marcaria o último trimestre
de 1970, ficou a cargo de Paulo Barreto de Menezes, que, como candi-
dato indicado, tornara-se delegado da “Revolução” para empenhar-
-se pela eleição dos seus correligionários da ARENA, dirimindo os
problemas que eventualmente emergiam. A campanha foi marcada
pela desproporcionalidade de condições na competição eleitoral.
Tratando-se de eleições gerais para o Senado, Câmara dos Deputados,
Assembleia Legislativa, Câmaras Municipais e Prefeituras das capitais,
o seu resultado tornou-se importante para ambos os lados. Enquanto
a ARENA estava presente em todos os municípios, o MDB conseguira
organizar-se em apenas 17.29 Mesmo assim, lançou manifesto onde
postulava “pronto restabelecimento das instituições democráticas,

28
Cf. João Andrade Garcez, depoimento ao autor em 30.11.1995.
29
Cf. José Carlos Teixeira, depoimento ao autor em 13.12. 1977.

221
Ibarê Dantas

garantia da pessoa humana”.30 Por esse momento nascia a Ala Jovem


do MDB, que decidiu marcar sua presença com seu primeiro comício
na Praça Camerino em Aracaju. Mas a imprensa escrita procurou
reduzir a importância do ato público.
O Departamento de Polícia Federal gravava os discursos, enquanto
agentes de segurança, ligados inclusive ao SNI, acompanhavam os
passos dos candidatos da oposição. O governador indicado, Paulo
Barreto de Menezes, convocou todos os sergipanos a votar nos can-
didatos da “Revolução”.31 O resultado foi o triunfo do situacionismo.
A ARENA elegeu os dois senadores, os cinco deputados federais e 12
dos 16 estaduais. Mas o número de votos brancos e nulos foi o mais
elevado do período. Sob o signo do autoritarismo e da repressão, o
partido situacionista pontificava, tutelado pelos militares.
Em Sergipe, com a ascensão de Paulo Barreto de Menezes em 15 de
março de 1971, o Estado viveu o ápice do ideário autoritário. O novo
governador cercou-se de um secretariado visto como basicamente
de técnicos, embora quase todos com suas vinculações com grupos
políticos, que ainda lembravam a influência da ex-UDN e do ex-PSD.
Sem vivência político-partidária, o engenheiro civil Paulo Barreto
de Menezes tentou governar muito empenhado em fazer obras e cor-
responder à confiança do presidente Médici. Convencido da capacita-
ção de seus auxiliares, proporcionou-lhes espaço, especialmente aos
técnicos do Conselho de Desenvolvimento de Sergipe (CONDESE), que
estiveram a elaborar planos e realizá-los. Dentro desse clima favorável
às novas iniciativas, o governo promoveu a primeira grande reforma
administrativa do Estado. Começou a implantar o Distrito Industrial
de Aracaju. Os investimentos provenientes do Banco Nacional de Ha-
bitação prosseguiam. A energia pelo interior expandiu-se ao tempo
em que estádios de futebol eram construídos. Foi criada a Telergipe,
implantando novo sistema de telefones. No campo, o FUNRURAL
ampliava o sistema de aposentadoria, favorecendo o homem do

30
Diário de Aracaju, 18.08.1970.
31
Idem, 10.11. 1970.

222
História de sergipe: república

campo e as práticas clientelistas.32 Num tempo em que a produção de


petróleo estava em pleno crescimento, foram reveladas importantes
descobertas dos recursos minerais do Estado com ampla repercussão
na imprensa do país. Era um tempo de otimismo e muita confiança
no desenvolvimento do Estado.
Mas as opções dos técnicos nem sempre se revelaram as mais
acertadas. Na discussão sobre a exploração dos minérios, o projeto
que mais fascinava era o da montagem de um complexo industrial
de base abrangente.33 A entrada do Grupo Lume, representado pela
Kalium Mineração, logo se revelou sem capacidade técnica e finan-
ceira, retardando os trabalhos de exploração.
No campo político, predominava a intolerância, mas, a partir de
1974, os discursos do presidente da República passaram a alimentar
as esperanças de abertura.

4.1.3 A Distensão Insegura. De Paulo Barreto a José Rolemberg Leite (1974-1978)

Quando o general Ernesto Geisel tomou posse na Presidência da


República (15.03.1974) tentou realizar a distensão de forma “lenta,
gradual e segura”, cujo ritmo seria definido pelo jogo político e militar
das pressões e contrapressões, inclusive da “linha dura” que cedo se
revelou o maior obstáculo para o seu prosseguimento. Mas, apesar das
dificuldades, paulatinamente foi se verificando lenta descompressão
do clima político, favorecida pelos discursos oficiais, apontando para
o afrouxamento da legislação mais voltada para repressão política.34
Diante de tais pronunciamentos, o ambiente dos Estados foi também
sendo afetado por esse processo de liberalização.

32
Idem, 08 a 10.12. 1973.
33
Compartilhavam dessa ideia vários técnicos da esfera federal e local, bem como
economistas de projeção nacional. Ver Rômulo de Almeida. Perspectiva de um Complexo
de Indústria de Base em Sergipe. In: Governo do Estado de Sergipe, Condese, Palestra no 1o
Ciclo de Estudos sobre o Aproveitamento dos Recursos Minerais de Sergipe, Aracaju: J.
Andrade, 1972.
34
Sobre o processo de abertura, ver Suzeley Kalil Mathias. Distensão no Brasil: O Projeto Militar
(1973-1979). Campinas/SP: Papirus, 1995, p. 39.

223
Ibarê Dantas

Em Sergipe, os temas políticos foram ganhando mais espaço, as


referências aos partidos foram se tornando menos negativistas. A
Gazeta de Sergipe voltou a publicar a seção “Panorama Político” que
havia sido suprimida no período de maior fechamento. Os editoriais
foram se tornando mais receptivos à ideia da abertura. O Jornal da
Cidade, um tabloide inaugurado em 1971, criou também coluna es-
pecífica, intitulada “Confidencial”, e começou a levantar questões
mais delicadas, como o controle oligárquico do partido governista,
denúncia de utilização do SESI e da Federação das Indústrias para
armar certos esquemas políticos.35 Em abril de 1974 a Revolução dos
Cravos em Portugal animou os espíritos e despertou comemorações
pelo fim do salazarismo, embalando esperanças.
Particularmente em Sergipe, concorreu para alentar a política in-
terna a escolha do novo governador. O senador Petrônio Portella, um
dos principais negociadores da abertura, esteve em Aracaju, ouviu os
pretendentes e saiu com uma lista de 11 candidatos. Mas o escolhido
foi José Rolemberg Leite, que não constava da relação. O indicado para
vice-governador foi o também engenheiro Antônio Ribeiro Soutello.
A escolha daquele velho político do ex-PSD indicava que os ventos
da abertura política tenderiam a ser estimulados em Sergipe. Homem
experiente, discreto e conciliador, avesso a polêmicas, constituiu-se
em alternativa de conciliação.
Os indicados foram referendados pela Assembleia Legislativa em
03.10.1974. Cerca de um mês depois, ocorreriam as eleições para o
Legislativo estadual e federal. Num ambiente de maior liberdade de
manifestação, o MDB colhia melhor resultado. O médico e professor
universitário Gilvan Rocha vencia na eleição para o Senado o velho
senador Leandro Maciel. Em todo o país, o MDB preencheu 16 das 22
vagas, enquanto na Câmara dos Deputados, o partido oposicionista
aumentava sua bancada de 28% para 44%. Desde então, “o gover-
no ficou impossibilitado de aprovar emendas constitucionais no

35
Jornal da Cidade, 24 e 25.03.1974.

224
História de sergipe: república

Congresso sem o apoio do MDB”.36 Em Sergipe, além do senador, os


oposicionistas elegeram um dos cinco deputados federais, enquanto
que na Assembleia Legislativa a ARENA contava 11 representantes
numa bancada de 15 membros.
Para os setores mais identificados com o sistema autoritário,
especialmente para a linha dura, foi um resultado traumático, difícil
de ser assimilado, sobretudo porque a eleição do voto majoritário (Se-
nado) tomou feição plebiscitária, como se expressasse o julgamento
do regime militar. Houve temores de retrocesso, mas o general Geisel
declarou que a distensão continuaria.
Em Sergipe, José Rolemberg Leite tomou posse em 15 de março de
1975 e passou a governar com uma equipe predominante de técnicos,
mas contemplando de alguma forma certos grupos dominantes. Com
visão de conjunto sobre a administração estadual, esteve a coordenar
sua equipe, procurando atender os objetivos técnicos voltados para
o desenvolvimento do Estado, sem desprezar as demandas políticas.
Arejou a Secretaria da Justiça, substituiu da direção do Banco do Es-
tado um pecuarista que há anos controlava essa agência de crédito
de forma patrimonialista. Diante dos órgãos de segurança, em vários
momentos resistiu às suas imposições. Mais de uma vez venceu re-
sistências do SNI para fazer indicações. Nomeou nomes vetados e
desconsiderou ordens para demitir funcionários tidos como subversi-
vos.37 A Assembleia Legislativa voltou a ser palco de debates acalorados
com a participação ativa dos parlamentares oposicionistas. O MDB
procurou ampliar sua atuação com a criação do Instituto de Estudos
Políticos e Econômicos Sociais D. José Vicente Távora, promovendo
palestras de eminentes personalidades da política nacional. Nesse
clima de esperança, a tenra sociedade civil começou a manifestar-
-se. Os jornais passavam a conceder mais espaço aos parlamentares
da oposição. Na Universidade, sob controle rígido desde dezembro

36
David Fleischer in Gláucio Ary Dillon Soares e Maria Celina D’Araujo (orgs); [et al.]. 21 Anos de
Regime militar: Balanços e Perspectivas. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1994, p. 175.
37
Cf. José Rolemberg Leite, depoimentos ao autor em 02.03.94. Everaldo Aragão Prado,
depoimentos ao autor em 13.08.96.

225
Ibarê Dantas

de 1968, os diretórios acadêmicos dos diversos Centros voltaram a


funcionar, culminando com a reabertura do Diretório Central dos
Estudantes (DCE).
Mas havia uma certa insegurança, pois os instrumentos coer-
citivos continuavam em vigor e sem data estabelecida para serem
revogados. Dentro de ação de âmbito nacional, voltada para debilitar
o Partido Comunista Brasileiro, realizou-se em Sergipe a chamada
Operação Cajueiro.38 Forças da Polícia Federal, do DOPS e do DOI-
-CODI, em fevereiro de 1976, desencadearam a prisão de cerca de 30
de seus militantes, inquiriram-nos sob intensas torturas, chegando
a cegar um deles. Cinco dias depois soltaram uma parte, enquanto
outros 19 permaneciam por cerca de dois meses sendo processados e,
depois, julgados. Era o exemplo mais candente do clima de ameaças
e incertezas.
Por esse tempo, tanto no âmbito nacional quanto no local, o proje-
to de distensão perdia muito de sua confiabilidade inicial, sobretudo
pela permanência do estado de insegurança. Jornais continuavam
discutindo a abertura, mas o governo voltava a cassar parlamentares.
Em junho de 1976 foi aprovada lei eleitoral (Lei Falcão) restringindo
a propaganda no rádio e na televisão.39 Era uma tentativa de evitar
que o resultado de 1974 se repetisse. Mas a estratégia do MDB era de
continuar batalhando pela democratização sem se deixar esmorecer
pelas adversidades. Dentro dessa orientação, realizou-se em Sergipe
simpósio sobre “O Homem e o Problema Social”, contando com a
presença dos mais expressivos nomes do partido. Poucos dias depois,
a ARENA realizava também seu seminário tratando do aproveita-
mento dos recursos minerais, mas sem a repercussão das palestras
dos oposicionistas.
Às vésperas de mais uma campanha para prefeitos do interior
e vereadores de todo o Estado, o uso da máquina pública para fins

38
Sobre a Operação Cajueiro, ver José Ibarê Costa Dantas. A Tutela Militar em Sergipe - 1964/1984.
(Partidos e Eleições num Estado Autoritário). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, p. 181-186.
39
Os candidatos podiam apenas mencionar seu nome, o número e um condensado currículo.
Na TV podiam ainda apresentar sua foto.

226
História de sergipe: república

eleitorais parece que se acentuava. Conforme denunciava o deputado


Leopoldo Souza, políticos da ARENA vinham fornecendo guias de
internamento em hospitais privativos do FUNRURAL.40 Decorrido
o pleito municipal de 1976, o MDB em Sergipe pouco avançou em
relação ao ano de 1972, ano da última eleição municipal. A exemplo
do que ocorrera em 1972, a ARENA elegera 65 prefeitos e o MDB, oito.
Na esfera nacional, órgãos de segurança continuavam cometen-
do arbitrariedades. Determinados grupos de direita engajados nas
ações anticomunistas desafiavam todos ao lançar bombas contra
instituições e bancas de jornais e revistas.41 A caça aos comunistas
prosseguia, como ocorreu contra o PC do B na Lapa (SP), quando po-
liciais cercaram casa, simularam combate, mataram três militantes,
prenderam os demais e submeteram-nos a torturas.42
Em 1977 o governo decretou recesso do Congresso e, após cerca
de quinze dias, anunciava reforma do Judiciário e o estabelecimento
da eleição indireta para uma vaga no Senado (“biônico”). O governo
Geisel alterou também o quórum para matérias constitucionais no
Congresso, a duração do mandato presidencial para seis anos e a
composição do Colégio Eleitoral. O acesso do MDB aos governos dos
Estados ficava mais difícil. Por esse tempo, a movimentação do general
Sílvio Frota para suceder Geisel tornou-se centro de tensão interna.
A oposição começou a levantar a bandeira da Assembleia Nacional
Constituinte. Os estudantes intensificaram os debates públicos pela
revogação da legislação coercitiva, especialmente o Decreto 477. Em
Sergipe, a discussão de problemas sociais localizados, inclusive no
baixo São Francisco, passou a receber cobertura da imprensa. Em
São Paulo, reivindicações trabalhistas agitavam os centros indus-
triais, indicando a emergência de um sindicalismo mais combativo,
ensejando novas lideranças, entre as quais se destacava Luís Inácio
da Silva (Lula), que em 1978 esteve à frente de dois movimentos de

40
Cf. Leopoldo Souza in Gazeta de Sergipe, 11.09. 1976.
41
Ver José Amaral Argolo et alii... A Direita Explosiva no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad, 1996.
42
Ver Jornal do Brasil, 17.12.1976.

227
Ibarê Dantas

grande repercussão nacional, inclusive a primeira grande greve ope-


rária depois de 1968, a despeito das proibições da legislação vigente.43
Na sucessão presidencial, o general Geisel formalizou a indicação
do general Figueiredo para cumprir o mandato de seis anos e, por volta
de abril de 1978, indicou os governadores dos Estados, inclusive o de
Sergipe, Augusto do Prado Franco, tendo por vice o general Djenal Ta-
vares de Queiroz.44 Meses depois, o MDB nacional, como que buscando
atalhos, lançou a candidatura do general Euler Bentes a presidente,
complicando o processo em emaranhada guerra de bastidores.
Em Sergipe, na eleição para o Legislativo federal e estadual, em
1978, Augusto Franco assumiu a direção da campanha eleitoral,
investiu forte nos candidatos situacionistas e debilitou a tendência
em alta do MDB. A ARENA, além do senador “biônico”, elegia através
do voto popular o candidato ao Senado, quatro dos seis deputados
federais e 12 dos 18 estaduais.
Enquanto isso, o governo José Rolemberg Leite apoiava os postu-
lantes de sua agremiação e procurava completar o elenco de obras
que procedeu, entre as quais novos órgãos como a Empresa de Assis-
tência Técnica e Extensão Rural do Estado de Sergipe (EMATER-SE),
a Companhia de Processamento de Dados de Sergipe (PRODASE), a
Administração Estadual do Meio Ambiente (ADEMA), assim como a
Companhia de Desenvolvimento Industrial e de Recursos Minerais
de Sergipe (CODISE), revelando a preocupação com uma política
industrial pelo menos a médio prazo. Ampliou consideravelmente a
rede do ensino público de forma ordenada e sem grandes ingerências
político-partidárias, iniciou as obras da adutora do São Francisco e
tomou decisões marcantes sobre a localização do porto. Empreendeu
a construção do Palácio da Justiça e da Estação Rodoviária, enfim
tentou melhorar a infraestrutura básica dos serviços essenciais
(água, luz, educação, transporte e habitação) dentro do processo de

43
Ver Margaret E. Keek. O “novo sindicalismo” na transição Brasileira. In: Alfredo Stepan (org).
Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.
44
Sobre a guerra de bastidores nesse momento, ver Elio Gaspari. A ditadura derrotada. São
Paulo: Companhia de Letras, 2003.

228
História de sergipe: república

modernização do setor público. Dirigiu a coisa pública, temperando


os pleitos dos técnicos com as pressões dos correligionários, sem a
ilusão da tecnocracia e a instrumentalização das secretarias pelos
políticos. No processo de distensão em Sergipe, tudo indica que se
manifestou tímido diante da Operação Cajueiro, mas, com pertinácia
e determinação, conseguiu limitar as ações dos órgãos de segurança
de forma significativa.
Em face sobretudo das mudanças nacionais, respirava-se um ar
menos poluído de tensões. A imprensa discutia ampla gama de pro-
blemas com a prevalência dos temas políticos. Os sindicatos voltaram
a adquirir representatividade e alguma eficiência. Exemplo eloquente
disso foi o crescimento vertiginoso do número dos associados que
passou de 9.407 (1974) para 72.326 (1978).45 Os ativistas políticos já não
viviam tão sujeitos a prisões arbitrárias. A Comissão Geral de Inves-
tigações foi perdendo sentido. Os cursos da ADESG deixavam de ser
tão procurados e caminhavam para sua desativação. Nas escolas, as
discussões corriam mais soltas. Os temas sociais ganhavam espaço. A
questão dos índios Xocó começou a ser divulgada, assim como o pro-
blema dos posseiros, especialmente em Santana dos Frades, próximo
ao baixo São Francisco. Enfim, a sociedade começava a acreditar no
declínio da ordem autoritária.
Chegava-se, assim, ao termo da primeira fase da transição,
marcada por um processo basicamente liberalizante, constituído de
um lado pelo afrouxamento de normas repressivas e, de outro, pela
restauração de alguns direitos individuais e coletivos. Em 1977 a UNE
começou a ser reorganizada. A OAB, a ABI e a CNBB, além de promo-
verem campanhas pela restauração do habeas corpus, pela revogação
do AI-5 e pela Anistia, tornaram-se interlocutores nas negociações
com o governo pelo fim dos atos coercitivos e pela normalização
institucional. Em Sergipe, em 1978, a campanha da “Anistia Geral,
Ampla e Irrestrita” começou a ser defendida publicamente por seg-

45
Governo do Estado de Sergipe. Secretaria do Planejamento, Instituto de Economia e Pesquisas
(INEP). Indicadores Sociais de Sergipe. Aracaju, v. 3, 1981, p.181.

229
Ibarê Dantas

mentos organizados da sociedade civil, envolvendo a Igreja, a OAB e


representações estudantis.46
O general Geisel não chegou a editar a lei da Anistia, mas, ao apagar
das luzes do seu mandato, promoveu emenda constitucional limitando
o poder do Executivo em autorizar medidas coercitivas através do AI-5.
Afinal, poder-se-ia dizer que havia maior liberdade de manifestação
de pensamento, a vida partidária desfrutava de maior influência e os
órgãos de segurança dispunham de menor espaço de atuação.

4.1.4 A Transição Política. Augusto Franco e Djenal Queiroz (1979-1982)

A posse do general João Batista Figueiredo em 15.03.79, reafirman-


do seus propósitos de dar continuidade à abertura política, marcou o
início da segunda fase do processo de transição do regime autoritário
para o liberal-democrático. Se, no primeiro momento, a distensão im-
plementada pelo general Geisel tinha sentido liberalizante e foi sendo
graduada, levando em conta sobretudo as reações dos “duros”, neste
segundo período, a estratégia do governo consistia em ampliar sua
base política, enfrentar os problemas econômicos que se agravavam e
liberalizar o regime, preservando o controle do processo político.47 Os
grupos oposicionistas, em meio às suas diferenças, tentariam romper
com esse controle, desalojando nichos de poder remanescentes da
ordem autoritária e ampliando espaços de atuação. Além desses dois
setores contrapostos, ainda subsistiam os chamados bolsões radicais
de direita com variadas disposições de bombardear o projeto de
transição. No fundo, estava em causa o processo de democratização
do Estado. Como o aparato estatal persistia bastante militarizado
e com poder de resistência às demandas das forças democráticas,
restava saber qual a capacidade dos grupos a favor da transição de
se fazerem presentes para formularem propostas, aglutinar forças,

46
Cf. Jornal da Cidade, 02.03.1978.
47
Fernando Henrique Cardoso. Os Impasses do Regime Autoritário: o caso brasileiro. In: Estudos
Cebrap, n. 26. São Paulo, Brasiliense, 1980, p. 186.

230
História de sergipe: república

tanto da sociedade política quanto da sociedade civil, com o fim de


estabelecer regras com maior sentido de equidade.
Em Sergipe, persistiam diferenças sobre as formas de ação entre a
arquidiocese de Aracaju e a diocese de Propriá, sob a direção de D. José
Brandão de Castro, no trato do problema político-social. Os estudan-
tes participaram do XXXI Congresso pela reconstrução da UNE, em
Salvador, nos últimos dias de maio de 1979 e voltaram confiantes no
processo de liberalização. A promulgação da Lei da Anistia em agosto
de 1979 fortaleceu consideravelmente o clima de distensão vivido até
então, indicando o ingresso em novo momento político. Os militantes
de esquerda, em sua maioria esmagadora, retornavam dispostos a de-
fender suas bandeiras dentro do processo democrático. A opção pela
luta armada tornara-se alternativa descartada.48 Na sede do Instituto
Histórico e Geográfico de Sergipe, fundou-se a Sociedade Sergipana
dos Direitos Humanos com a presença de vários representantes da
sociedade civil.49 A confiabilidade no processo de democratização se
fortalecia, ensejando o aparecimento de novas tendências políticas.
O fim do bipartidarismo foi consumado em dezembro de 1979, mas
desde janeiro as confabulações com vista ao novo perfil do sistema
partidário passou a ser tema dos grupos políticos de todas as colora-
ções ideológicas. Em 1980 a movimentação ainda mais cresceu com
a definição das opções e a formalização das propostas.
Em Sergipe foram os situacionistas que madrugaram. De con-
formidade com a orientação nacional, o Partido Democrático Social
(PDS) substituía a estigmatizada ARENA. Enquanto isso, a frente
oposicionista até então aglutinada no MDB se fracionava. Parte foi
para o Partido Popular, sob a liderança do empresário João Alves Fi-
lho, a maioria organizou-se no PMDB, enquanto outros foram para
o Partido Democrático Trabalhista (PDT), controlado nacionalmente
por Leonel Brizola. Apareceu ainda o Partido dos Trabalhadores (PT)

48
Sobre a conversão da esquerda à democracia e à campanha pela defesa dos direitos humanos,
ver Luciano Oliveira. Imagens da Democracia: Os Direitos Humanos e O pensamento Político
de Esquerda no Brasil. Recife: Pindorama, 1995, p. 77-90.
49
Cf. Gazeta de Sergipe, 02 e 03. 09.1979.

231
Ibarê Dantas

visto como a maior novidade da reforma partidária no país. No Es-


tado, sua organização foi-se processando com algumas dificuldades.
Na área dos partidos ilegais restava apenas o PCB, envolvido em
grande questão de âmbito nacional, resultante de antigas divergências
internas que se acentuaram após a decretação da anistia. Formaram-
-se duas alas: uma favorável a Luiz Carlos Prestes e outra liderada por
Giocondo Dias, que se elegia secretário geral. Enquanto isso, o PCB
encolhia e perdia influência para o PC do B. Em Aracaju, no meio
estudantil, o PC do B foi aparecendo como alternativa, ao tempo em
que se organizava, tendo como reduto inicial a UFS.
Com o espectro partidário formado, em 21.11.1980 foi editado
projeto restabelecendo as eleições diretas para governador a partir
de 1982. Era mais um passo significativo no processo da transição
política, embora na esfera nacional continuassem havendo problemas
com ações terroristas de grupos direitistas, alguns ligados ao SNI, que
fizeram explodir bombas em várias entidades, gerando problemas
políticos preocupantes.
Em Sergipe, Augusto do Prado Franco tomou posse em 15.03.79,
como sexto mandatário do período autoritário, tendo por vice o general
Djenal Tavares de Queiroz, ativo militante nas lides políticas desde os
tempos de ex-PSD. Desde pelo menos 1965, aquele empresário empenha-
va-se em tornar-se governador enquanto seu patrimônio se ampliava
ramificado no setor açucareiro, no têxtil e nas comunicações. Esse pode-
rio, se por um lado despertava má vontade por parte de alguns generais,
de outro facilitaria o controle do quadro interno e o fortalecimento do
seu lobby em Brasília. Para governar, anunciou secretariado mesclado
por algumas figuras experientes de respeitabilidade social, a maioria
composta de ex-udenistas e de políticos que tiveram na ARENA sua
escola partidária. No período pós-1964 nenhum governante assumira
tal cargo em meio a tantos prognósticos otimistas, anunciando nova
era desenvolvimentista.50 Entre os primeiros atos do novo governo

50
Ver Gazeta de Sergipe, 01 a 03.1979.

232
História de sergipe: república

estava a transformação do CONDESE em Secretaria de Planejamento,


reduzindo drasticamente as atribuições daquele órgão.51 As tendências
centralizadoras acentuaram-se dentro da estratégia de evitar que as
bases políticas municipais migrassem para os demais partidos em
época de declínio do regime autoritário. A política clientelista foi então
cultivada como em nenhum governo depois de 1964. O funcionalismo
estadual expandiu-se, admissões ocorreram sem concurso,52 tendo por
principal condição o pertencimento ao grupo político dominante e/ou
à conivência com suas políticas. Exemplo dessas práticas foi a aprova-
ção pela Assembleia da emenda constitucional 14/81, autorizando o
governo a promover contratações. Enquanto isso, o espaço de crítica
encolhia com o grande controle governamental dos meios de comu-
nicação. Com apoio das principais lideranças do PDS, do Legislativo,
do Judiciário e contando com a generosa compreensão dos procura-
dores, o governador foi administrando com rédeas curtas o processo
de transição e realizando diversas obras significativas. Os serviços de
telefonia que existiam em 20 municípios expandiram-se para todos os
demais. Os centros de saúde passaram de 14 para 82. Cerca de 550 salas
de aula foram construídas, permitindo grande ampliação do número
de matrículas,53 mas a Secretaria de Educação, que nos últimos dez
anos vinha sendo gerida sem grandes interferências políticas, a partir
de 1979 voltou a ser instrumento de barganha eleitoral, comportando
favoritismo, alterando a estrutura preexistente, afetando bastante o
seu funcionamento.54
Na área habitacional, alguns novos conjuntos foram criados com
a construção, na capital e no interior, de cerca de 15 mil unidades
residenciais, distribuídas sob controle do governador, exceto as cotas

51
Newton Pedro da Silva. Estado e Região: Contribuição ao Estudo da “Modernização
Autoritária” do Nordeste Brasileiro. Aracaju, 1994 - Tese de Doutoramento em Economia,
UNICAMP, p. 18-20.
52
Ressalve-se que houve concurso realizado pela Secretaria de Educação.
53
Segundo dados da propaganda do governo, as matrículas teriam se ampliado de 116.756 (1979)
para condições de oferta de 202.000 (1982). Ver Três Anos que Mudaram o Curso da História.
Aracaju, 1982.
54
Cf. Everaldo Aragão Prado, depoimento ao autor em 13.08.1996 e Gazeta de Sergipe, 27.05.1982.

233
Ibarê Dantas

destinadas aos deputados.55 Gastou-se bastante em rodovias. Mas os


grandes investimentos foram realizados pela Petrobras com o início
da construção das fábricas da Nitrofértil e da Petromisa, além de 40%
(18 milhões de dólares) na Adutora do São Francisco. Por esse tempo,
o governador reivindicou também a construção do Porto, que seria
realizada posteriormente. No campo, resolveu litígios de maneira
pacífica, embora, em algumas situações, de forma lesiva ao tesouro
do Estado.56 Depois de receber a máquina pública organizada e com
bom funcionamento, a legaria ao seu sucessor bastante ampliada e
um tanto modificada. De qualquer forma, transferia para seu subs-
tituto acervo de obras das mais importantes para o desenvolvimento
do Estado.
Na esfera política, Augusto Franco empenhou-se decididamente
em enfraquecer a oposição partidária. O empresário João Alves Filho,
que integrava os quadros do PP e criticava o governo, não suportou
as pressões e transferiu-se para o PDS. Subordinando-se ao coman-
do de Augusto Franco, João Alves foi então lançado candidato à sua
sucessão governamental pela agremiação situacionista. Em 14.05.82,
o poderoso governador passava o cargo ao seu vice, general Djenal
Tavares de Queiroz, para disputar uma cadeira de deputado federal,
enquanto o filho Albano do Prado Franco concorreria ao Senado e o
outro, Walter Franco, à Assembleia Legislativa.
No pleito geral de 1982, os situacionistas conseguiriam bom de-
sempenho, especialmente os representantes da família Franco, eleitos
para o Legislativo estadual e federal. Mas, ao entregar o Executivo
estadual para um ex-adversário, o controle do governo estadual
ficava inseguro. De qualquer forma, os problemas ficariam para
serem dirimidos dentro do partido oficial, pois nas eleições de 1982,
os oposicionistas foram fragorosamente derrotados. O PMDB elegeu
dois deputados federais numa bancada de oito. Fez cinco estaduais

55
Ver Gazeta de Sergipe, 01.12.1981.
56
Cf. Manuela Carneiro da Cunha in Beatriz Góis Dantas e Dalmo Dallari. Terra dos Índios
Xocó. São Paulo: Comissão Pró-Índio, 1980.

234
História de sergipe: república

numa Assembleia de 24 e apenas quatro prefeitos entre 73. Os demais


partidos não tiveram nenhuma vitória.57
No plano nacional, Sergipe figurou como o Estado onde o candi-
dato ao Executivo tivera a maior vitória proporcional. Mas os oposi-
cionistas elegeram ao todo dez governadores, envolvendo os Estados
de maior peso político.
Nos dez meses de gestão do general Djenal Tavares de Queiroz, o
governador mostrou-se sobretudo homem de partido. Mudou alguns
auxiliares, exigiu disciplina de horários, deu continuidade às obras
em andamento e administrou o Estado como solidário membro do
PDS, ajudando os seus correligionários.

57
Ver José Ibarê Costa Dantas. Ob. cit., 1997.

235
Ibarê Dantas

4.2 O Processo Econômico-social

A contrarrevolução de 1964 reorientou o Estado nacional-de-


senvolvimentista, quebrando a tendência populista e reformando
o padrão de financiamento. Nos três primeiros anos de gestão, esse
modelo de Estado foi alterado com a implementação do Plano de
Ação Econômica do Governo (PAEG), provocando recessão. Mas a
inflação foi contida e o ajuste fiscal melhorou consideravelmente a
situação das contas públicas. Posteriormente, as políticas econômicas
encaminharam-se no sentido de reduzir os desequilíbrios entre o
Sudeste e as demais regiões, inclusive o Nordeste.
Em Sergipe, os primeiros anos do novo regime foram particular-
mente difíceis. Ao assumir a titularidade do Executivo estadual, em
abril de 1964, com a situação econômico-financeira problemática, o
governador enviou alarmante memorial à Presidência da República,
traçando um quadro particularmente pessimista. Considerando
“dramática a situação estrutural e a conjuntural desesperadora”, o
documento depois de aludir que Sergipe entre 1950 e 1960 apresentou
a menor taxa de crescimento anual, informa que em 1962 o Estado
revelou o menor giro comercial do Nordeste. A renda per capita, den-
tre os Estados de área nordestina abrangida pela SUDENE, passou
do segundo para o quarto lugar. A situação financeira era de “déficit
crônico”. No quatriênio 1959-62, a receita de Sergipe apresentava,
entre os Estados do Nordeste, “o maior crescimento negativo da sua
posição relativa: -24%.”58 Considerava a máquina administrativa ob-
soleta e informava que Sergipe pagava “os vencimentos mais baixos
do país”. Apesar disso, confessava-se impotente para “sequer pagar
um aumento já autorizado por Lei.” Diante desse quadro de penúria,
o governador solicitava auxílio de emergência da ordem de doze
bilhões, duzentos e quarenta milhões de cruzeiros.59 Entretanto, o
governo federal liberou apenas um bilhão de cruzeiros.

58
Diário Oficial do Estado de Sergipe, 06.08.1964.
59
Idem, 06.08.1964.

236
História de sergipe: república

Enquanto isso, o quadro foi-se transformando. As finanças públi-


cas eram saneadas, o setor de serviços começava a ser beneficiado
pela presença da Petrobras. A exploração do grande campo de petróleo
no município de Carmópolis (SE), descoberto em 1963, passava a dar
bons resultados. Em fevereiro de 1965 saiu o primeiro carregamento
do óleo negro para a Bahia e os efeitos da presença da empresa estatal
em Sergipe começavam a ser sentidos na economia interna. Com a
promulgação da Constituição de 1967 e as mudanças da legislação
tributária, entre as quais a que alterava o Fundo de Participação dos
Estados, Sergipe saiu beneficiado. Desde então, raros foram os anos
em que o montante de tais transferências não ultrapassava 60% do
total da receita.60 Durante o governo de Lourival Batista (1967-70) já
se observava grande disponibilidade de recursos, como atesta o con-
junto de obras construídas, entre as quais estádio, edifícios, estradas,
pontes, viadutos etc.
O saneamento das finanças públicas, durante a gestão do ma-
rechal Castello Branco, e a reorientação do padrão de investimento
nacional, com a fundação de instituições financeiras de estímulo à
poupança e ao mercado de capitais, contribuíram para melhorar o
quadro econômico. A partir dos anos setenta, o país passou a viver
um elevado ciclo expansivo e tornou-se possível implementar várias
políticas, envolvendo subsídios, incentivos fiscais e investimentos
em diversos setores, especialmente na infraestrutura, dentro de uma
conjuntura extremamente favorável pela ampla disponibilidade de
petrodólares. Neste contexto, apostou-se nos capitais financeiros e,
de 1970 a 1974, o PIB cresceu a uma média anual de 11,36%, a inflação
beirou a média de 21%, enquanto a dívida externa aumentava de 5,3
para 17,2 bilhões de dólares. Mas essa expansão revelou-se com fôlego
curto. A partir de 1974 a inflação, antes reprimida, passou a elevar-se
e novos problemas começaram a preocupar. O governo Geisel (1974-

60
Ver Ildácio Viana Guimarães e Neide Santana. Evolução das Finanças Públicas do Estado de
Sergipe, 1977-1981 in Governo do Estado de Sergipe - Secretaria do Planejamento, Instituto
de Economia e Pesquisas (INEP). Indicadores da Conjuntura Sergipana. Aracaju, v. 6, 1982, p.
183-201.

237
Ibarê Dantas

79) apresentou o II PND, tentando fortalecer o parque produtivo


nacional diante da dinâmica do capitalismo internacional, mas o
preço do petróleo disparou no mercado internacional, os problemas
se acentuaram e nos tempos do general Figueiredo, a economia viveu
grandes dificuldades.
Apesar dessas oscilações, nos 21 anos de Estado autoritário, em
Sergipe houve avanços inéditos em certas atividades produtivas. A
lavoura mecanizou-se consideravelmente. Somente em cinco anos
(1975-80) o número de tratores cresceu 67%.61 Os investimentos em
insumos modernos ampliaram-se. A produção das lavouras temporá-
rias básicas também se desenvolveu bastante entre 1970-82. As usinas
de açúcar persistiram no processo de concentração, resultando em
melhoria da tecnologia e em grande aumento da produção. As 18
unidades que produziram 668.012 sacos, por ocasião da safra 1963-64,
haviam se reduzido a três na safra de 1981-82, mas, em compensação,
fabricaram 1.922.085 sacos de açúcar. No período de 1965-82, a média
anual foi de 1.071.437 sacos.62 Enquanto isso, parte das grandes fortu-
nas dos usineiros ia se reduzindo no longo processo de incorporações.
Nesse período, fechou a imponente Usina Pedras dos herdeiros de
Gonçalo Rolemberg, que foi incorporada pela Oiteirinhos. Depois, a
própria Oiteirinhos foi absorvida pela São José do Pinheiro, que passou
também a controlar outras, inclusive a Central dos parentes Franco.
A laranja, antes cultivada sobretudo nos municípios do sul do
Estado, passou por um surto de crescimento expressivo, estimulado
pela boa lucratividade, beneficiando pequenos e médios produtores
dos municípios de Boquim, Arauá, Pedrinhas, Riachão do Dantas,
Itabaianinha e Umbaúba.63 O algodão não apresentou bom desempe-
nho. Mas nem por isso impediu que a indústria têxtil passasse por um

61
Sinopse preliminar do Censo Agropecuário. Fundação do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística. Rio de Janeiro: IBGE, 1982, p. 68.
62
IAA Apud Manoel Correia de Andrade. A Agro Indústria Canavieira e a organização do
Espaço - Contribuição à História das Usinas de açúcar de Sergipe. Natal: Cooperativa Cultura
Universitária do Rio Grande do Norte Ltda, 1990, p. 28-30.
63
Ver Ana Maria dos Santos. Indústria e Agricultura de Cítricos no Brasil. O Caso de Sergipe
1960-1989. Aracaju: Fundação Augusto Franco, 1990.

238
História de sergipe: república

processo de modernização mais profundo do que aquele vivido nos


anos sessenta. Embora, no conjunto, a produção não tenha sofrido
grande alteração, sua participação diante dos Estados nordestinos
indicou grande melhora na década de 1970-80. No campo, a energia
foi chegando, eletrificando propriedades rurais e aumentando sua
produtividade. A pecuária ampliou seu rebanho enquanto a área de
pastagens artificiais crescia bastante em detrimento das naturais. Os
trabalhadores com mais de 60 anos passaram a receber aposentado-
ria através da criação do FUNRURAL, favorecendo o comércio local.
No setor terciário houve também melhoras consideráveis a partir
de 1967. A implantação da Universidade Federal de Sergipe (1968)
ampliou o setor de serviços e passou a injetar boa soma de salários
no mercado interno, aumentando o contingente da classe média. No
início dos anos setenta, foi realizada reforma administrativa no setor
público, reestruturando todas as secretarias do Estado, adotando
métodos modernos de gestão. Reformaram-se as empresas estatais
encarregadas dos serviços básicos: água, energia, transporte e tele-
comunicações. Nestas, a expansão nacional atingiu o menor Estado
da federação que inaugurava a TV Sergipe em novembro de 1971,
integrando a população de Aracaju e do interior do Estado nesse
sistema de comunicação, operando uma revolução nos costumes
provincianos. Em 1972 foi criada a Telergipe, do sistema Telebrás, e, no
ano seguinte, o governo assinava com a NEC contrato para instalação
de novo equipamento telefônico em Aracaju. Somente no período
de 1976-84 os terminais telefônicos passaram de 8.988 para 30.868.64
No setor secundário, foi implantado o Distrito Industrial de Araca-
ju que atraiu novos empreendimentos, enquanto o setor da construção
civil viveu grande expansão. Em Sergipe, 87% de todas as aplicações
no setor habitacional, em certo período, provieram do Banco Nacional
de Habitação.65 Aracaju, a capital, era o centro privilegiado com esses

64
Wanderley Guilherme dos Santos (coord.). Que Brasil é Este? Manual de Indicadores Políticos
e Sociais. Rio de Janeiro, IUPERJ/Vértice, 1990 p. 126-128.
65
Governo do Estado de Sergipe. I Plano de Desenvolvimento Econômico e Social: 1976-79. Salvador:
Condese /Bureau Gráfica Editora, s/d, p. 311.

239
Ibarê Dantas

investimentos, que se tornaram responsáveis por acentuado proces-


so de seu crescimento. Enquanto as casas bancárias fechavam suas
portas em decorrência das mudanças concentracionistas no sistema
financeiro, várias empresas de construção civil (Atenco, Norcon,
Celi, Cosil, Habitacional, entre outras) nasciam e/ou prosperavam
trazendo consequências significativas não apenas para a economia,
mas também para a política, inclusive pela influência crescente nos
pleitos eleitorais. A Norcon dos irmãos Teixeira e a Celi de Luciano
Barreto aparentemente eram as que mais cresciam. Entre os grupos
empresariais do passado, alguns continuaram influentes como Cons-
tâncio Vieira, H. Dantas, Calumby Barreto, os Leite de Estância, entre
outros, mas nenhum deles prosperou como o grupo comandado por
Augusto do Prado Franco.
Quanto à indústria extrativa, novos poços de petróleo foram
sendo descobertos, projetando Sergipe nacionalmente. As pesqui-
sas sobre minerais revelavam a existência no subsolo sergipano de
milhões de toneladas de várias substâncias de grande importância
(potássio, salgema, enxofre, carnalita, halita, taquidrita, magnésio,
entre outras).66 Diante da magnitude das reservas do pequeno Es-
tado, a Petrobras transferiu seu escritório de Alagoas para Sergipe,
construiu o terminal petrolífero de Tecarmo em Aracaju, realizando
investimentos que tiveram grande impacto na economia local. Em
face desse potencial, o governo Geisel, dentro da filosofia do II PND,
autorizou a implantação de duas grandes plantas industriais em Ser-
gipe: a Petrobras Mineração S/A (Petromisa) em 1976 e a Fertilizantes
Nitrogenados do Nordeste (Nitrofértil) em 1978. Nesta, que depois
seria denominada de FAFEN, a Petrobras teria investido nas décadas
de setenta e oitenta cerca de US$ 250 milhões e na construção da
Mina de Potássio um bilhão e duzentos milhões de dólares.67 Foi um
impacto extraordinário na pequena economia sergipana. Milhares

66
Ver Aloísio de Campos. Jornal de Sergipe, 10 e 11.10.1982. Ver também Jornal da Cidade,
19.12.1973.
67
Cf. Paulo Manoel Mendes Mendonça. Contribuição da Petrobras para o Desenvolvimento do
Estado de Sergipe. Palestra no ciclo de conferências Pensar Sergipe III, UFS, novembro/2001.

240
História de sergipe: república

de empregos foram gerados (envolvendo os diretos e indiretos) com


amplas consequências econômicas e sociais.
Especialmente a partir dos anos setenta, o Estado passou por um
grande surto de crescimento, superando o desempenho nacional e o
do Nordeste, conforme mostra o quadro seguinte:

Quadro VIII. Variação Anual do Produto Interno Bruto (Sergipe, Nordeste e Brasil - 1971-1982)
ANO PIB SERGIPE1 PIB NORDESTE1 PIB BRASIL2
1971 19,3% 25,4% 11,3%
1972 10,9% 5,9% 12,1%
1973 21,6% 11,3% 14,0%
1974 0,5% 1,6% 9,0%
1975 8,5% 8,5% 5,2%
1976 9,0% 7,0% 9,8%
1977 13,1% 8,9% 4,6%
1978 6,6% 10,5% 4,8%
1979 10,7% 7,2% 7,2%
1980 3,6% 2,9% 9,1%
1981 3,2% -0,7% -3,1%
1982 11,9% 10,5% 1,1%
Média 9,90% 7,5% 7,09%
Fontes: (1) Boletim Conjuntural do Nordeste do Brasil, n. 2, Recife: SUDENE; FUNDAJ, 1994, p. 242. (2) Marcelo
de Paiva Abreu (org). A Ordem do Progresso: Cem Anos de Política Econômica Republicana, 1889/1989. Rio de
Janeiro: Campus, 1992, p. 408.

Não deixou de contribuir para a fase de prosperidade a forma


de administrar essa disponibilidade de recursos. A preexistência do
CONDESE com sua burocracia selecionada, apesar da soberba e das
ilusões da tecnoburocracia, promoveu estudos prévios fundamentais
e tornou as orientações econômicas governamentais mais racionais e
continuadas. O fato é que a economia estadual deixava de ser predo-
minantemente agroexportadora. Em 1985, a participação de Sergipe
no PIB do Nordeste ocupava o quarto lugar, abaixo apenas da Bahia,
Pernambuco e Ceará.68

68
Cf. Dados elaborados para a pesquisa “Desenvolvimento Capitalista no Nordeste Brasileiro.
Estudo Comparativo das Trajetórias Estaduais” por Ricardo Oliveira Lacerda de Melo, com
base em dados do DPG/SUDENE.

241
Ibarê Dantas

Por esse tempo, as condições de vida da população se modificavam


com a ampliação do uso da eletricidade e de outros indicadores de
bem-estar. Os domicílios particulares permanentes com luz elétrica
aumentaram de 19,20% (1960) para 51,44% (1980), o segundo índice
mais elevado entre os Estados do Nordeste. Da mesma forma, o nú-
mero de residências com abastecimento de água cresceu de 6,60%
(1960) para 40,89% (1980), tornando Sergipe, proporcionalmente, o
Estado com maior índice da Região.69 Enquanto isso, a classe média
ia modificando suas formas de comportamento com a expansão do
consumo, resultando em maior convivência com os bens duráveis.
Somente na década de 1970 para 1980 o número de automóveis foi
multiplicado por 4,6, e o de geladeiras por 3,8.70 Transformações
enormes aconteciam também na área de comunicações. Além dos
telefones, os aparelhos de TV multiplicavam-se ano a ano, formando
opiniões, alterando atitudes, influenciando as pessoas em suas cren-
ças e valores. Novas exigências de consumo foram se incorporando
ao cotidiano das classes média e alta. Era o processo de modernização
que se ampliava na sociedade sergipana, decorrente do referido ciclo
expansivo. A economia prosperava, mas seus frutos não se dissemi-
naram com a abrangência que seria de esperar. A concentração de
riqueza cresceu. A renda dos 10% mais ricos acentuou-se numa pro-
porção superior à tendência nacional. Em contrapartida, os 60% mais
pobres de Sergipe, que em 1970 detinham 24,9% da renda, tiveram sua
situação proporcionalmente reduzida mais ainda do que a nacional.71
O modelo de desenvolvimento pelo alto, ou seja, através do Estado,
revelou-se incapaz de distribuir melhor os seus benefícios. Numa
sociedade sob controle político mais acentuado, coincidentemente
ou não, o fenômeno se manifestava com maior nitidez.

69
Wanderley Guilherme dos Santos (coord.). Que Brasil é este: Manual de Indicadores Políticos
e Sociais. São Paulo: Vértice/ Rev. Tribunais, 1990, p. 106-128.
70
Governo do Estado de Sergipe. Secretaria do Planejamento, Instituto de Economia e Pesquisas
(INEP). Indicadores Sociais de Sergipe. Aracaju, v. 3, 1981, p. 152.
71
Cf. J. Ricardo de Santana. Crescimento Econômico e Distribuição de Renda em Sergipe: 1970-88.
Aracaju, UFS. Dados dos Censos Demográficos 1970, 1980 e PNAD de 1988.

242
História de sergipe: república

Outro indicador bastante expressivo dos limites sociais do ciclo ex-


pansivo foi a permanência do analfabetismo. O índice de analfabetos
entre as pessoas de cinco anos ou mais, que em 1970 era de 58%, em
1980 continuava ainda na ordem de 52,88%, ou seja, excessivamente
elevado.72 A campanha de alfabetização do MOBRAL, tudo indica
que teve eficácia reduzida. A expansão do ensino do terceiro grau
não foi acompanhada pelo primeiro. Além disso, grande parcela da
população vivia com o salário mínimo, o nível de produtividade das
propriedades rurais e as relações de trabalho deixavam muito a dese-
jar. Nas cidades, inclusive na capital, Aracaju, as condições sanitárias
estavam a merecer melhor atenção. O percentual de casas com esgoto
e fossa séptica continuava bem pequeno, abaixo de vários Estados da
Região. Eram indicações de que o desenvolvimento não se estendia
como seria de esperar.
No plano nacional, as reformas na economia não foram suficientes
para resistir às oscilações da economia internacional. A expansão
interna firmada no sistema financeiro e no endividamento externo
ampliou sua vulnerabilidade. Em fins de 1973, quando surgiu o pri-
meiro choque do Petróleo, quadruplicando seus preços, o governo
Médici, imbuído de ufanismo, ignorou seus efeitos, considerando o
Brasil como uma ilha de prosperidade. O presidente Geisel continuou
na mesma tendência, aprofundando a orientação estatista, mas, com
os choques externos, o país entrou em crise e passou a vivenciar
sucessivas dificuldades no tempo do general Figueiredo, que deixou
para os civis um legado problemático.
Quanto ao movimento sindical, a vitória dos militares, através da
contrarrevolução de 1964, resultou na sua imediata desarticulação.
A ideia de que as centrais sindicais, especialmente o Comando Geral
dos Trabalhadores (CGT), seriam capazes de parar o país e impedir
qualquer ação contra seus interesses não se concretizou.

72
Cf. Censos de 1970 e 1980.

243
Ibarê Dantas

Como nos demais Estados, em Sergipe a maioria dos líderes foi


presa. Aqueles que conseguiram fugir ingressaram em esquemas de
clandestinidade. Mas vários deles terminaram sendo alcançados e
responderam a processo. O CGT foi extinto e os sindicatos deixaram
de atuar politicamente. Nos idos de 1964-65 pelo menos quatro enti-
dades passaram a sofrer intervenção. A intensa mobilização política
foi estancada. Era tempo de resistência, quando os sindicalistas pro-
curavam conviver com as adversidades. Internamente o movimento
arrefeceu. Como a vida associativa tornou-se suspeita, muitos sócios
afastaram-se de sua instituição e as atividades sindicais decaíram.
Mas, a partir de meados de 1966, estimulados pelo quadro político
nacional de expressão de descontentamentos, foi-se retomando
alguma tímida animação. Em meio ao crescimento do movimento
estudantil, à atuação de membros da Igreja Católica e dos partidos
de esquerda, os protestos foram se generalizando contra as políticas
governamentais, envolvendo cada vez maiores parcelas das classes
subalternas. A situação atingiu o clímax em 1968 com novas agita-
ções políticas. As greves de Contagem (MG) e Osasco (SP) apesar de
reprimidas, mostraram inovações no movimento sindical, repercu-
tindo no Estado através de inquietações tanto nas cidades como no
campo. Mas logo a edição do AI-5 instaurou novo ciclo repressivo. Em
Sergipe, pelo menos três sindicatos voltaram a sofrer intervenções e
novas prisões foram encetadas, inclusive de trabalhadores. Além do
mais, os processos iniciados em 1964 contra as lideranças sindicais
foram agilizados e prolatadas as sentenças. A maioria dos indiciados
permaneceu em liberdade, mas seis deles cumpriram cinco meses de
detenção em presídio de Salvador (BA).
A partir de 1974, com o desencadeamento do processo de disten-
são, entre avanços e recuos, o clima político começou a mudar. Mas
a repressão ainda demonstrava vigor. Em Sergipe novas prisões de
militantes de PCB, acompanhadas de torturas, voltaram a aconte-
cer no primeiro semestre de 1976, frutos da denominada Operação
Cajueiro. Apesar do ambiente de certa insegurança, no campo e na
cidade, a movimentação foi crescendo.

244
História de sergipe: república

Por esse tempo, o índice de urbanização aumentava. Recorde-se


que, no curso das duas décadas, a população de Sergipe não chegou
a dobrar, mas aumentou em cerca de 75%. Ocorreu grande desloca-
mento do setor rural para o urbano de tal forma que os habitantes das
cidades passaram a ser maioria, conforme mostram os dados abaixo.

Quadro IX. Sergipe - População Residente (1960 e 1980)


Ano Rural Urbana Total
No % No % No
1960 462.327 61% 289.929 39% 752.256
1980 522.325 46% 617.796 54% 1.140.121
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil. Rio de Janeiro: Fundação IBGE, 1984, p. 80.

Em 1960, Sergipe era um Estado de predominância agrária não


apenas porque 61% dos seus habitantes viviam no meio rural, mas
também porque nada menos de 68,53% dos cidadãos economicamente
ativos estavam ocupadas no setor primário, enquanto o secundário
absorvia apenas 8,70%. Vinte anos depois, esta estrutura produtiva,
típica de região subdesenvolvida, havia se modificado considera-
velmente. Os que estavam no setor primário haviam baixado para
42,35% e os do secundário simplesmente duplicaram, chegando a
17,34%.73 Apesar dessa diminuição de importância do setor rural, os
descontentamentos persistiam, mesmo porque sobretudo nos anos
setenta verificou-se uma certa concentração da propriedade, pois o
aumento do número de estabelecimentos foi bem menor do que a
expansão da área ocupada.74
Embora o regime autoritário tenha abafado o movimento pela
reforma agrária do início dos anos sessenta, aqui e acolá apareciam
sinais de descontentamentos. Pelos idos de 1968 alguns incidentes
sociais levaram setores da Igreja Católica, sob a liderança do seu
arcebispo D. Luciano Duarte, a implantar a Promoção do Homem

73
Wanderley Guilherme dos Santos (coord.). Que Brasil é este: Manual de Indicadores Políticos
e Sociais. São Paulo: Vértice/ Revista dos Tribunais, 1990, p. 32 e 34.
74
Ver Censos, 1970 e 1980.

245
Ibarê Dantas

do Campo de Sergipe (PRHOCASE), que, no curso de dez anos (1967-


1977), adquiriu fazendas nos municípios de Maruim, Santa Rosa de
Lima, General Maynard, Santo Amaro das Brotas e Divina Pastora
que foram entregues a trabalhadores sem terra.75 Pelos idos de 1978,
começaram a eclodir conflitos em municípios às margens do São
Francisco sob a jurisdição do bispado de Propriá, onde a Comissão
Pastoral da Terra (CPT) agia atuante. Tanto a fazenda de Santana dos
Frades, reivindicada pelos posseiros, quanto as terras da Ilha de São
Pedro, pleiteadas pelo grupo indígena Xocó, terminaram em desapro-
priação.76 Essas lutas vitoriosas estimularam novas iniciativas que
haveriam de prolongar-se por bastante tempo. A essa altura o próprio
crescimento do número de sindicatos indicava a intensificação da
organização dos trabalhadores rurais como nenhuma outra categoria.

Quadro X. Número de Sindicatos - Sergipe


Ano Profissionais Liberais Autônomos Rurais Total
1974 23 01 04 39 67
1981 23 01 04 65 93
Fonte: ISTOÉ, 26.08.1981, p 71.

Enquanto no campo os trabalhadores se organizavam em sindica-


tos, sob a orientação da FETASE, passando de 48.311 (1975) para 81.332
sindicalizados (1980), no meio urbano através dos setores secundários
e terciários, os registrados em sindicatos cresciam de 10.280 (1975)
para 20.102 (1980).77 Era um indício salutar do nível de participação
que se ampliava. Nas grandes cidades os grupos políticos mais ativos
mobilizavam-se e criavam núcleos de ação, a exemplo do que ocorria
em outras regiões. Dessa forma, nasceu o Movimento Feminino pela

75
Cf. Maria Luisa Souza. Movimentos Sociais em Sergipe nas Décadas de 60, 70 e 80. In:
Movimentos. Aracaju, ano 1, n. 1, julho/1995, p. 10; Rosemiro Magno da Silva e Eliano Sérgio
Azevedo Lopes. Ob. Cit., 1996, p. 98; Alexandre Diniz. A Condição Camponesa em Sergipe.
Desigualdade e Persistência da Agricultura Familiar. Aracaju: NPGEO/UFS, 1996, p. 55.
76
Ver Beatriz Góis Dantas e Dalmo Dallari. Terra dos Índios Xocó. São Paulo: Comissão Pró-Índio,
1980.
77
Cf. Governo de Sergipe. Seplan/INEP. Indicadores Sociais de Sergipe. 1981. Aracaju, v. 3, 1981,
p. 180.

246
História de sergipe: república

Anistia no final de 1978 e, no ano seguinte, a Sociedade Sergipana


pelos Direitos Humanos. Era um momento de retomada das ativida-
des político-sociais. Tendo sido anunciado o fim do bipartidarismo,
as articulações para formação de novas siglas se intensificaram,
agitando o mundo político. Os estudantes de Sergipe participaram
do histórico congresso da UNE em Salvador (1979), reorganizando a
entidade proscrita pelos militares. Não obstante o clima de tensão,
as atividades foram retomadas em ambiente de muita animação. Na
própria UFS, ainda em 1979, surgia a primeira greve.
No campo sindical, o movimento foi adquirindo maior densidade
com as ações dos trabalhadores da indústria extrativa. O Sindipetro
SE/AL desencadeou campanhas salariais orientadas pelo perfil do
novo sindicalismo, nascido em São Paulo, valorizando o trabalho
de base. Ao lado da associação dos petroleiros, o funcionamento da
Fábrica da NITROFÉRTIL (Nitrogenados Fertilizantes do Nordeste
Ltda.) a partir de 1982 ensejava a organização de novo sindicato forte
e combativo que haveria de se manifestar nos anos subsequentes. É
verdade que as atividades sindicais continuavam restritas à situação
profissional, condições de trabalho e salários, mas o Congresso Na-
cional da Classe Trabalhadora (CONCLAT), realizado em São Paulo
em 1981, agrupando diversas tendências de 17 Estados, foi um grande
prenúncio de que as centrais sindicais estavam renascendo após lon-
gos anos proscritas. Como decorrência, nos vários Estados os grupos
sindicais ampliaram as discussões e tenderam a dividir-se, conforme
se verá na parte V.

247
Ibarê Dantas

4.3 Manifestações Culturais

O período 1964-1982 foi marcado pela predominância do Estado,


em meio a uma contínua tensão com a sociedade, inclusive com
alguns setores artísticos.
Ao tempo em que os militares tentavam reorientar a política e a
economia, empenhavam-se também em estabelecer novos padrões
para o setor cultural. Mas esse processo ocorreu dentro de relaciona-
mento difícil entre Estado e sociedade, sobretudo pelas desconfianças
de setores intelectualizados em relação às decisões que provinham
do governo central. Diante da repressão, os grupos organizados da
sociedade ligados à esquerda passaram a reagir.
Na área educacional, como o movimento estudantil permaneceu
insubmisso, o MEC passou a implementar uma série de normas, visan-
do coibir as atividades promovidas pelos estudantes. Basta lembrar a
intervenção na União Estadual dos Estudantes de Sergipe (UEES), a
extinção da UNE e a famosa “Lei Suplicy”, nascida com a pretensão de
despolitizar o movimento estudantil. Foi nesse clima de tensão que se
desenvolveu a discussão sobre a criação da Universidade em Sergipe.
Como as pessoas mais ligadas à administração do Estado propunham o
modelo de Fundação, segundo a orientação do MEC, em contraposição,
alguns setores de esquerda advogavam a forma autárquica, gerando
debates por vezes acirrados, até quando foi criada em 28.02.1967, se-
guindo a orientação oficial. A instalação festiva ocorreu em 15.05.1968,
quando a representação estudantil não teve direito ao uso da palavra.78
Apesar desses problemas iniciais, a chegada da UFS indicava um
novo momento no ensino superior de Sergipe. As faculdades até então
existentes foram agrupadas dentro de uma orientação geral, com estru-
tura de apoio e disponibilidade de recursos. Acabou-se a fase heroica.
Os professores que lecionavam com proventos simbólicos passaram
a receber salários condizentes com a profissão. As possibilidades de
reciclagem ampliaram-se. Os Centros passaram a organizar seminários

78
Ver Gazeta de Sergipe, 16.05.1968.

248
História de sergipe: república

e cursos com especialistas de fora. A UFS integrou-se no Programa


Nacional de Incentivo à Capacitação Docente (PICD) em convênio
com a CAPES. A partir dos anos setenta, vários professores e alunos
recém-formados começaram a deslocar-se para centros maiores a fim
de cursarem mestrado ou doutorado, gerando dissertações e teses nos
vários campos de saber, ampliando o conhecimento teórico e empírico.
Novos cursos foram criados dentro da filosofia de conjugar o ensino,
a pesquisa e a extensão. Buscou-se a promoção de determinadas
comunidades consideradas carentes, incentivando o aprendizado de
artes e ofícios. Os professores, com o apoio do Estado, intervieram
nos arquivos e procuraram retirá-los do abandono, recuperando um
patrimônio cultural dos mais expressivos. Em 1981 a Universidade
Federal transferiu-se para seu campus amplo e moderno. As matrículas
em cursos superiores que eram 336 (1962), vinte anos depois a maior
parte delas estava concentrada na UFS, que inscrevia 5.035 alunos
(1982).79 De 1967 a 1982 a referida instituição graduou 5.860 estudantes
de diversos cursos. Enfim, não obstante o clima nebuloso em que o país
vivia com a tutela militar, a iniciativa era importante. Por esse tempo,
começam a funcionar também os cursos superiores da rede particular.
Em fevereiro de 1972, apareceu a Faculdade Pio X com o curso de Peda-
gogia e em julho do mesmo ano despontavam as Faculdades Integradas
Tiradentes para ofertar Administração e Direito.
No ensino médio, grandes colégios foram construídos em diferentes
bairros da capital e em alguns municípios, atendendo à demanda da
mocidade que pretendia prosseguir nos estudos. Para diminuir o anal-
fabetismo dos adultos foi criado o MOBRAL, com êxito menor do que se
esperava. Apesar disso, se tomarmos os anos de 1962 e 1982 como refe-
rências, verificamos que a soma das matrículas dos dois primeiros graus
cresceu de 91.148 para 293.829 alunos, ou seja, multiplicou-se por 3,6.80

79
Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II. p. 407-411 e Dados
fornecidos pela UFS.
80
Problemas de Base do Estado de Sergipe. Aracaju: FIES/Condese, 1965, v. II. p. 407-411 e
Indicadores Sociais de Sergipe. Aracaju, v. 7, INEP, 1985, p. 21-23. Observe-se, no entanto, que
o contingente do segundo grau não chegava a 9% do primeiro grau, indicando como era
restrita a formação dos jovens ainda na década de 1980.

249
Ibarê Dantas

Na esfera nacional, apesar de submetidos à repressão, os grupos


de esquerda continuaram mantendo uma certa hegemonia cultural
até 1968, quando o divórcio entre Estado e a sociedade acentuou-se e
a radicalização das partes levou à edição do AI-5.81 Foi nesse contexto
que nasceram dois projetos do regime autoritário. O primeiro era
patrocinado pela Escola Superior de Guerra e o segundo via Conselho
Federal de Cultura.
Estando os partidos em suspeição, sob a vigência do AI-5, a solução
encontrada foi selecionar quadros e aprimorá-los, através de uma orien-
tação considerada sadia, dentro dos preceitos da Doutrina da Segurança
Nacional. Em várias unidades federativas, foram criadas Delegacias
da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG),
que atuavam nos Estados como agências de recrutamento e formação
de pessoal, sob inspiração e influência da Escola Superior de Guerra,
de conformidade com os padrões do Estado Autoritário, centralizado,
controlado pelas Forças Armadas e administrado pela tecnocracia.
Em Sergipe, a ADESG foi estruturada e contou com participação
da grande parte das autoridades do Estado, passando, a partir de
1971, a promover seus cursos que, nos primeiros anos, foram muito
procurados. Funcionários públicos, profissionais liberais, empresários
de níveis culturais heterogêneos empenharam-se para serem indi-
cados. Após triagem efetuada pelo 28o BC, era exigido dos inscritos
frequência às palestras, visitas a campo e apresentação de trabalho
final. Com esses cursos os militares esperavam preparar seus quadros
para preencher os cargos político-administrativos ao tempo em que
esvaziavam o sistema representativo no qual a seleção dos políticos
se processava pelos partidos e pelo eleitorado. Foi desses estudos
da Associação dos diplomados da Escola Superior de Guerra (ESG),
como agência ideológica da sociedade política, que nasceu a ideia da
introdução de Moral e Cívica como disciplina obrigatória no segundo
grau e Estudos de Problemas Brasileiros no terceiro grau.

81
Cf. Roberto Schwarz. O Pai de Família e outros Estudos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

250
História de sergipe: república

O segundo projeto militar voltou-se para oferecer uma política


cultural para o país no sentido de integrar a nação no novo processo
de desenvolvimento em curso. Desde a instalação do Conselho Fede-
ral de Cultura (CFC), em 1966, composto por intelectuais de prestígio
nacional, começaram as sugestões para a elaboração de um projeto
cultural. Alguns conselhos estaduais de cultura foram formalmente
criados, inclusive o de Sergipe em 1970.82 A exemplo do que ocorrera
durante o Estado Novo (1937-45), a preocupação com o patrimônio
histórico nacional entrou na pauta, associada ao incentivo às cria-
ções artísticas, inclusive às tradições populares, ligadas ao folclore,
de forma a favorecer o turismo.83
Entretanto, o quadro das instituições ligadas à cultura era pre-
cário, especialmente no interior do Estado. Levantamento de 1970
registrou que apenas 16 dos 74 municípios dispunham de bibliotecas.
A maioria pertencia a colégios e apenas quatro eram municipais.
Museu somente havia em São Cristóvão. Jornal somente em Capela.
Nenhum deles dispunha de revista.84 Na verdade, desde os anos trinta
as cidades do interior vinham se esvaziando culturalmente enquanto
cresciam as atividades da capital, onde, segundo levantamento efetu-
ado pelo Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico, em 1970,
havia nove entidades culturais:
1. Academia Sergipana de Letras (ASL)
2. Academia Sergipana de Poesia (ASP)
3. Associação de Teatro Amador de Sergipe (ATAS)
4. Associação Sergipana de Cultura (ASC)
5. Clube do Cinema de Sergipe (CCS)
6. Clube Estudantil de Geologia Amadorista de Sergipe (CEGAS)
7. Clube Sergipano de Poesia (CSP)
8. Editora Jovens Reunidos (JOVREU)
9. Grupo de Teatro e Arte (CULTURART)

82
Ver Governo de Sergipe. Plano Estadual de Educação e Cultura (1971-1974). Aracaju: SEC, 1970.
83
Ver Sérgio Miceli (org). Estado e Cultura no Brasil. São Paulo: Difel, 1984.
84
Cf. levantamento promovido pelo Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico de
Sergipe, 1970.

251
Ibarê Dantas

A orientação da política cultural nacional começou a repercutir de


forma efetiva em Sergipe na gestão de João Andrade Garcez (06.1970 a
15.03.71), quando o Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico
(DCPH)85 e o Conselho de Cultura passaram a funcionar subordinados
à Secretária de Educação. Com esse aparato institucional, algumas
providências importantes foram encetadas. O acervo do Arquivo
Público do Estado de Sergipe (APES), que estava amontoado no pré-
dio da velha Escola Normal em condições por demais precárias, foi
transferido para uma sede condigna, passando a ser classificado com
orientação de técnico do Arquivo Nacional e a cooperação de profes-
sores e alunos da UFS. Por esse tempo, os monumentos históricos
do Estado foram vistoriados e fotografados, servindo de bases aos
relatórios enviados ao Instituto do Patrimônio Histórico Nacional
com vista à sua restauração.
A cidade de Laranjeiras foi elevada à condição de Cidade Monu-
mento (1971). Começou-se a planejar a sua restauração e utilização
com fins turísticos, ideia reforçada pelo então ministro da Educação
que, em visita à velha cidade, chamou-a de “Museu a Céu Aberto”.
Depois de tombada, foi incluída no Programa Integrado de Recons-
trução de Cidades Históricas do Nordeste (1973) e teve vários de seus
prédios recuperados, ao lado de algumas Igrejas de outras localidades.
No período de 1970-1982, é de ressaltar que 23 bens culturais foram
tombados pelo Estado.86 Na década de 1970 a Biblioteca Pública esta-
dual ganhou nova sede, com várias salas para atividades auxiliares,
mas espaço pequeno para o acervo bibliográfico.
Essa preocupação com o patrimônio avançou para o campo dos
museus. Até então existiam apenas o Museu Histórico de São Cris-
tóvão, um pequeno acervo no Instituto Histórico e Geográfico de

85
O Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico (DCPH) foi criado pelo Decreto-Lei
número 405 de 08.04.1970. Cf. Diário Oficial do Estado de Sergipe, 10.04.1970.
86
Cf. Verônica Maria Meneses Nunes. Laranjeiras: de cidade histórica a encontro cultural. Busca
de elementos para integração da ação cultural. Dissertação de Mestrado em Administração
de Centros Culturais da Universidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1993, anexo 9A, p.
118-122.

252
História de sergipe: república

Sergipe e as coleções particulares. Convênio firmado entre o governo


do Estado, a Arquidiocese e a UFS criou o Museu de Arte Sacra de
São Cristóvão (1973), reunindo peças de grande valor, passando a
ser liberado à visitação pública. Nesse mesmo ano, em Laranjeiras,
foi inaugurada a Casa João Ribeiro em homenagem ao grande histo-
riador filho da terra. Nesta cidade, em 1976 foi criado oficialmente
o Museu Afro-brasileiro, abrigando mobiliário, instrumentos de
trabalho e de castigos aplicados aos escravos e uma variedade de
outras peças relacionadas com a presença negra. Em 1978 Laranjei-
ras ganhou também seu próprio Museu de Arte Sacra enquanto o
Departamento de Antropologia da UFS organizava seu acervo que
funcionou provisoriamente como Sala de Cultura Popular. Embora
com espaço exíguo, os professores da área estiveram a promover di-
versas exposições educativas com variadas temáticas. Em inícios da
década de 1970, o Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico
(DCPH) promoveu levantamento dos grupos folclóricos no Estado.87
Pouco depois, professores do Departamento de História da UFS, com
apoio de magistrados, começaram a recolher documentos cartoriais
em vários municípios de Sergipe, possibilitando mais tarde (1984) a
criação do Arquivo do Judiciário. Essa sequência de atos buscando
salvar e organizar o acervo documental, preservar imóveis represen-
tativos de nossa arquitetura do passado, bem como a reunião de peças
raras em museus e o levantamento de manifestações culturais e das
tradições orais, foi possível pela existência de uma intelectualidade
com sensibilidade para aproveitar os recursos públicos, mesmo numa
época de obscurantismo político.
A disponibilidade de incentivos serviu também para dinamizar
outros setores culturais. Diante da programação do sesquicente-
nário da independência do Brasil (1972), foi organizado, pela UFS,
um Festival de Arte em São Cristóvão, sob os auspícios do mecenato
da administração federal, incentivando vasto espectro de grupos

87
Ver Terezinha Alves de Oliva (Coord). Manifestações da Lúdica Folclórica em Sergipe. Aracaju:
SEC/DCPH, 1975.

253
Ibarê Dantas

artísticos: orquestras, corais, jograis, ballet, teatro, folclóricos e toda


espécie de apresentação.88 Não obstante a atuação da censura bastante
ativa, cerceando produções, o empreendimento provocou também
estímulos apreciáveis. Em face dessa iniciativa revestida de êxito,
que passou a repetir-se anualmente por cerca de duas décadas, a
partir de 1976 a Secretaria de Educação, com apoio do Departamento
Cultural do Ministério de Educação, esteve a promover regularmente
o Encontro Cultural de Laranjeiras com a presença de estudiosos da
cultura popular de vários Estados.
Enfim, os diversos segmentos ligados à cultura, tanto na esfera
nacional como na local, se inseriram na nova orientação cultural,
aproveitando os recursos federais. Era um momento em que a econo-
mia encontrava-se em franco crescimento e o Estado beneficiava-se
das políticas oficiais como nunca havia ocorrido em outro período da
República. Enquanto isso, os militantes de esquerda, cada vez mais
debilitados, em face da repressão, perdiam espaço. Os divergentes iam
diminuindo. Uma das instituições que, de alguma forma, mais resistiu
foi a Igreja Católica, mesmo assim marcada pela divisão. Enquanto
o arcebispo d. José Távora teimava em implementar seus trabalhos
voltados para o social, o bispo auxiliar de Aracaju, d. Luciano Cabral
Duarte, cada vez mais integrado no staff do governo federal, inclusive
como membro do Conselho Federal de Educação, buscava harmoni-
zar a Igreja com a orientação militar. Mas, após muitas divergências
internas, o arcebispo faleceu, em abril de 1972, caindo mais uma
resistência à orientação conservadora. Seus auxiliares estrangeiros
que trabalhavam em várias paróquias foram-se embora, restando de
divergente apenas o bispo de Propriá, d. José Brandão de Castro, um
tanto afinado com a doutrina da Teologia da Libertação.
De qualquer forma, tanto o aporte de recursos federais quanto a
ajuda de órgãos locais, como o BANESE, o governo do Estado, através
do DCPH, da EMSETUR e da SEC, e a Prefeitura da capital incenti-

88
Ver Antônio Fernando de Araujo Sá. O I FASC e a Política Cultural do Estado Autoritário.
Cadernos da UFS. História 1. Aracaju, UFS, Dep. de História/EDUFS, 1995.

254
História de sergipe: república

varam as iniciativas culturais e artísticas sem precedentes em nossa


história. O Executivo estadual em 1975, através da lei 1962, instituiu o
Fundo de Promoção Cultural, mas ficou carecendo de regulamentação
e, portanto, sem eficácia jurídica. Os benefícios da administração esta-
dual viabilizaram-se através de obras específicas a partir de demandas
circunstanciais, entre as quais a publicação de livros.
A música instrumental e a de câmara ganharam uma nova sede
de sua escola em 1970 com 32 salas, auditório, biblioteca e discoteca.89
O número de alunos, que geralmente era pequeno, cresceu muito,
atingindo cerca de 400.90 Organizou-se orquestra própria, tudo con-
tribuindo para os estudos de música prosperarem. É verdade que
a maioria das bandas do interior a essa altura havia fenecido. Em
Aracaju, entre dificuldades, continuavam ensaiando e tocando a do
28o BC, do Corpo de Bombeiros, da Escola Normal e da Assembleia de
Deus.91 Por esse tempo a UFS organizou seu próprio coral e a Escola
Técnica de Sergipe sediou o I Encontro de Corais de Escolas Técnicas.
Vários pianistas, violonistas, sopranos ganharam projeção e propor-
cionaram aos seus ouvintes embevecimento e emoção.
Quanto à música popular, prosperou ainda mais. Diante do po-
tencial preexistente, a realização dos festivais da Música Popular
Brasileira, na TV Record, alcançou repercussão extraordinária em
todo o país.92 Num momento de mobilização política, certas letras
tornaram-se uma forma de expressão das mais eficientes na luta
contra o regime autoritário. Movidos ou não por motivos políticos,
os jovens voltavam-se para música como grande atração. Em Sergipe,
uma das mais eloquentes reproduções desse movimento nacional

89
Cf. Maria de Andrade Gonçalves. O Processo de Formação e as Manifestações Culturais.
In: Diana Maria de Faro Leal Diniz (coord). Textos para a História de Sergipe. Aracaju: UFS/
Banese, 1991, p. 282.
90
Cf. Leozírio F. Guimarães. Panorama da Música em Sergipe. Arte de Jovens, Aracaju, Jovreu,
Ano IV, n. 20, 1970, p. 19.
91
Cf. Leozírio F. Guimarães. Ob. cit., 1970, p. 19.
92
A repercussão assumiu maiores dimensões a partir do festival de 1966, quando duas músicas
de protesto Disparada e Para Não Dizer Que Não Falei das Flores ganharam a simpatia do
público, mas não venceram, gerando debate generalizado.

255
Ibarê Dantas

foi a realização do I Festival da Canção no Colégio Atheneu em 1969,


despertando vocações e interesses sobretudo por parte dos jovens.
Dentro desse clima propício, os grupos artísticos foram proliferando,
em meio à vontade de apresentar-se com o fim de revelarem seus
talentos. Nesse sentido, os festivais ou mostras que se sucediam, pro-
movidos por colégios particulares, escolas públicas e outras entidades,
representavam oportunidades favoráveis. Numerosas bandas foram
despontando, a maioria das quais com nomes agressivos: Comanches,
Apaches, Águias, Samurais, Vikings, Los Guaranis, The Thop’s, Brasa
10, realizando intercâmbio,93 criando ambiente excitante e fecundo.
Como os festivais ocorriam periodicamente, os músicos partiram para
as apresentações de seus próprios shows, galvanizando um público
crescente. Alguns começaram a criar suas próprias letras e melodias,
enquanto várias interpretações foram-se afirmando como referências
estaduais e regionais. Alguns discos, LP ou compacto duplo, come-
çaram a ser gravados, entre os quais Retrato de Aracaju com letra de
Hugo Costa e algumas músicas de Maria Olívia, interpretadas por
Agildo Alves. Roberto Alves, líder do Conjunto R Som 7, também lançou
seu disco. Dois outros compactos duplos apareceram gravados pelos
grupos Bolo de Feira e Meu Papagaio.94 O forró também se expandiu
com o maior reconhecimento da música de Luiz Gonzaga.
Na dança, algumas casas, dedicadas ao ballet, abriram-se em
Aracaju voltadas sobretudo para jovens, ensinando coreografias
ritmadas com técnicas cada vez mais aprimoradas. No período 1965-
1969, funcionou a primeira Escola Sergipana de Ballet, cultivando
especificamente o estilo clássico.95 Nos anos setenta, foram fundados

93
Cf. Antônio Alves do Amaral e Wellington dos Santos (irmão). Alguns Aspectos Sobre a
Música Popular Sergipana. Sergipe Artístico e Monumental. Aracaju: SEC, Sebrae, Emsetur,
Banco do Brasil, Banco do Nordeste do Brasil, 2000. p. 43-46.
94
Cf. Antônio Alves do Amaral e Wellington dos Santos (irmão). Ob. cit., p. 43-46.
95
Antes de 1965, a iniciativa registrada no ensino da dança foi o Curso de Desenvolvimento
Artístico, criado por Neyde de Albuquerque Mesquita, que também ministrava aulas de
teatro, poesia e música. Cf. Dorinha Teixeira Machado. Dança em Sergipe. Sergipe Artístico
e Monumental. Aracaju: SEC, Sebrae, Emsetur, Banco do Brasil, Banco do Nordeste do Brasil,
2000, p. 49.

256
História de sergipe: república

o Studium Danças e a Escola Moema Maynard. Trazendo inovações,


afirmaram-se pela continuidade e pelo profissionalismo.96
O teatro teve uma presença marcante. Nos anos sessenta, um
grupo de intelectuais sergipanos esteve inquieto, acompanhando os
movimentos nacionais e encenando peças com atores do Sudeste com
sentido contestatório, entre as quais Recital sem Opus (1967), mostrada
no Cine-teatro Rio Branco. Em outras ocasiões, artistas foram chama-
dos a depor. Mas a censura97 e a repressão foram servindo de desafio e
acicate para esses personagens que prosseguiram resistindo, levando
arte ao povo “centrado na temática liberdade e justiça”.98
Na década de setenta, fizeram-se presentes nos festivais de Arte
de S. Cristóvão, que se iniciaram em 1972 e foram-se repetindo anu-
almente. Os ventos da abertura política, a partir de 1974, ensejaram
a organização de novos grupos. Aos elencos do Expressionista da
Universidade, dirigido pela professora Aglaé Fontes e Clodoaldo
Alencar, e o Experimental, criado em 1975 e dirigido por Carlos Mur-
tinho, vieram somar-se outros. Primeiro, Opinião de Vieira Neto,
depois Raízes (1974), idealizado por Jorge Lins, que nasceu voltado
para o teatro infantil, atuando na periferia da capital, em cidades
do interior do Estado, associando-se ao ensino da educação artística
e mantendo-se dentro do Projeto Escola. Em 1977 nasceu Imbuaça,
influenciado pelo Teatro Livre da Bahia, inspirando-se na literatura
de cordel, especializado em teatro de rua com garra e embasamen-
to técnico, fatores que haveriam de fundamentar sua trajetória de
sucesso e reconhecimento.99 Por esse tempo, outros foram surgindo
como Mamulengo do Cheiroso (1978) de Aglaé Fontes de Alencar e o
Mambembe (1982) sob a orientação de Virgínia Lúcia Fonseca de Me-
nezes. O fato é que no período de abertura política, o teatro retomou
o vigor manifestado no período 1965-68 e viveu grande momento de
expansão em Sergipe. Em 1982 os atores fundaram a Federação do

96
Dorinha Teixeira Machado. Ob. cit., p. 49.
97
Ver Arquivos do FASC in Cultart. UFS.
98
Ver Sueli Carvalho. O Teatro Sergipano. Aracaju Magazine, n. 35, maio/1999.
99
Sueli Carvalho. O Teatro Sergipano. Aracaju Magazine, n. 36, junho/1999.

257
Ibarê Dantas

Teatro Amador, indicando suas preocupações em superar o amado-


rismo e estabelecer estrutura mais profissional.
Quanto ao cinema, o período em análise foi o mais ativo em es-
tudos e experiências de filmagens. Enquanto na Primeira República
houve a exibição das primeiras películas e a proliferação de salas de
projeção, no período autoritário (1964-1982) as iniciativas de divulga-
ção do período anterior reproduziram-se. Recorde-se que no início da
década de sessenta, o movimento em prol do Cinema Novo estava em
ebulição, inclusive na Bahia com as produções de Glauber Rocha. Foi
dentro desse clima nacional que, em Sergipe, foi criado o Clube de
Cinema em 1966, estimulando filmagens, envolvendo inclusive jovens
estudantes do curso secundário que fizeram suas experiências.100 Al-
guns profissionais partiram para “tomar de cena” paisagens e eventos
pelo interior do Estado, buscando registros significativos. A realiza-
ção do Festival Nacional de Cinema Amador em Sergipe, em 1972,
distribuindo prêmios, representou novo incentivo. Foi-se formando
um público interessado e o pequeno curso promovido pela Escola
Técnica Federal de Sergipe foi bastante concorrido. Os estudantes
do Colégio Atheneu fundaram seu Cineclube. Através dos FASCs,
promovidos pela UFS, aconteciam anualmente encontros nacionais
de cinema, incentivando cursos e distribuindo prêmios. Pouco depois,
Sergipe participava da I Bienal Internacional de Cinema Amador,
onde algumas fitas de sergipanos foram bem classificadas. A própria
UFS passou a promover anualmente Festival de Cinema e concursos
de Roteiro Cinematográfico e Festivais Nacionais de Cinema Amador
(FENACA).101 Jovens estudantes com as facilidades da Câmara Super 8
dedicaram-se a filmar. Alguns mais politizados empenharam-se em
registrar ações de resistências das classes subalternas. Muitos docu-
mentários foram rodados e assim foi-se formando uma memória das
ideias e dos acontecimentos desse tempo no montante próximo de

100
Cf. Djaldino Mota Moreno. Cinema Sergipano Catálogo de Filmes. Aracaju: Banese, 1988 e Ilma
Fontes. Memória do cinema sergipano. Aracaju Magazine, n. 54, dezembro/2000.
101
Cf. Djaldino Mota Moreno. Ob. Cit., 1988 e Ilma Fontes. Ob. cit., dezembro/2000.

258
História de sergipe: república

setenta filmes (Ver anexo VI), enquanto alguns atores destacaram-se


nacionalmente em papéis de grande projeção.
No período de 1964-82, cresceu bastante o número de pintores. O
potencial e a motivação dos artistas encontraram vários incentivos
para progredir. Os festivais anuais de São Cristóvão a partir de 1972,
os Encontros Culturais de Laranjeiras desde 1976, a mostra Estadual
para a seleção da Bienal de 74, o Movimento das Artes,102 a disponi-
bilidade da Galeria Álvaro Santos, inaugurada em 1966 e seguida
por outras, como espaço permanente para exposições, o mecenato
público e particular, tudo foi contribuindo para proporcionar apoio
e visibilidade às manifestações da pintura em Sergipe. Por outro lado,
com a expansão da capacidade de consumo de alguns grupos sociais,
não apenas os ricos, mas também famílias de classe média, passaram
a investir mais em arte.
Além dos artistas de gerações anteriores, foram se afirmando
e formando galeria honrosa: Adauto Machado (1950- ) nos legou
expressivos quadros de cavalos, de casarios e de marinhas; Anete
Sobral (1925- ) mostrou sua versatilidade variando a temática desde a
arquitetura colonial, passando por folguedos até procissões; François
Hoald (1949-1974) projetou-se mostrando seus painéis; Félix Mendes
(1944- ) criou paisagens e folguedos com colorido alegre e marcante;
Gervásio Teixeira (1952-1972) deixou marinhas, alagados, paisagens e
figuras humanas; Hortência Barreto (1954- ) explorou motivos regio-
nais, incluindo o lúdico; Jorge Luiz (1954- ) representou marcas sutis
da realidade humana; Joubert Morais (1952- ) concebeu sugestivas
figuras abstratas, demonstrando bastante sensibilidade mística;
Leonardo Alencar (1940-2016) mostrou grande habilidade com sua
produção variada, pintando faces humanas, cavalos, paisagens e cenas
eróticas; Melcíades (1957- ) dedicou-se a traçar painéis e a representar
o homem nordestino, inclusive cangaceiros; Pithiu (1946- ) elaborou

102
Cf. Ana Conceição Sobral de Carvalho. Artes Plásticas em Sergipe. Sergipe Artístico e
Monumental. Aracaju: SEC, Sebrae, Emsetur, Banco do Brasil, Banco do Nordeste do Brasil,
2000, p. 53-54.

259
Ibarê Dantas

figuras humanas com tom surrealista. Como seria de esperar, alguns


artistas tornaram-se mais reconhecidos do que outros, assim como
variados foram os estilos. Alguns marcaram sua presença com traços
mais estáveis, outros foram variando, utilizando novos recursos téc-
nicos, apresentando novas linguagens. A grande maioria procurou
distanciar-se do academicismo, optando pelo impressionismo ou pelo
expressionismo, alguns cultivando em maior ou menor proporção o
abstracionismo.
Entre os escritores, a produção foi promissora já com a partici-
pação de trabalhos de professores da UFS. Alguns intelectuais, que
não pertenciam aos seus quadros, também marcaram presença,
como o grande pesquisador Jackson da Silva Lima com a História da
Literatura Sergipana (1971) e O folclore em Sergipe I: Romanceiro (1977),
Acrísio Torres (1966) e Pires Wynne (1970 e 1973) com suas História de
Sergipe. Orlando Dantas editou A Vida Patriarcal em Sergipe (1980) e
Carvalho Déda divulgou Brefáias e burundangas do folclore sergipano
(s/d). Por esse tempo, começaram a aparecer ensaios e monografias
de professores da UFS revelando novas investigações. Sem incluir as
obras de ciências exatas, nem da área da saúde, merecem ser lembra-
dos Alexandre Diniz, que além de estudar a geografia urbana e rural,
liderou um grupo de estudiosos que elaborou grande Atlas de Sergipe.
Beatriz Góis Dantas analisou algumas danças folclóricas (1972-1975)
(Taieira, Chegança e São Gonçalo), depois se dedicou à pesquisa das
aldeias indígenas, desde a de Água Azeda até a dos Xocó (1980). Maria
Thetis Nunes enfocou o início da fase provincial divulgando a Histó-
ria de Sergipe a partir de 1820 (1978). Ariosvaldo Figueiredo escreveu
sobre O Negro e a Violência do Branco (1977) e Enforcados (1981). Por
esse tempo, foi relevante a iniciativa de alguns departamentos da
UFS em lançar cadernos de pequenas monografias mimeografados.
Nessa área de publicações de livros, somente a Livraria Editora
Regina Ltda editou 95 títulos entre 1966-1970.103 É verdade que vários

103
Cf. relação fornecida pela Livraria Regina ao Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico
(DCPH).

260
História de sergipe: república

deles eram folhetos ou opúsculos de poucas páginas, mas era indica-


tivo do movimento editorial local. De 1979 a 1982, a Subsecretaria de
Cultura e Arte do Estado editou 24 títulos, 14 dos quais de crônicas
e poesias, sendo este último gênero muito cultivado em Sergipe.104
Na literatura, alguns autores demonstraram bom domínio na
construção de contos: Ezequiel Monteiro trazendo Contos de Jornal
(1973), Paulo F. T. Morais com seu Emparedados (1980), Antônio Car-
los Viana, professor da UFS, com Brincar de Manja (1974) e Em Pleno
Castigo (1981), enquanto Petrônio Gomes destacava-se com seus livros
de Crônicas (1970, 1971 e 1980). Houve também casos de mestres que
contribuíram para a literatura, extrapolando sua área de ensino,
como Núbia Marques que publicou os romances Berço de Angústia
(1967) e O Passo de Stefânia (1980). Nesse período, o poeta de maior
reconhecimento foi Santos Souza. Num segundo plano, apareceram
contribuições de Hunald Alencar (1942-2016), Mário Jorge Vieira
(1946-1973), entre outros.
Além dos livros, durante o período em análise o número de peri-
ódicos superou o da fase anterior, o que demonstra que os constran-
gimentos da censura não foram suficientes para deter a dinâmica e
as potencialidades do meio intelectual em expansão. Aquelas revistas
vinculadas a instituições, como Instituto Histórico, Academia Ser-
gipana de Letras, Universidade Federal de Sergipe e a Prefeitura de
Aracaju saíram com grande irregularidade. No conjunto faltava ainda
maior continuidade e profissionalismo.
Quanto à imprensa, teve um comportamento um tanto diferencia-
do. Apesar da presença da censura em vários momentos, não se pode
dizer que o desempenho das emissoras radiofônicas e sobretudo dos
jornais deveu-se exclusivamente à orientação dos censores. O Diário
de Aracaju, criado em dezembro de 1964, órgão da cadeia dos Diários
Associados, pela própria orientação nacional trouxe consigo a marca
registrada da sua tendência governista. O Sergipe Jornal, que apareceu

104
Cf. Em Tela. Galeria José Inácio, Aracaju, s/d.

261
Ibarê Dantas

em 1965, evitava emitir juízos sobre os fatos políticos, mesmo assim


teve vida curta. A Gazeta de Sergipe, inicialmente tornou-se o órgão de
imprensa mais visado pela censura e durante algum tempo resistiu.
Mas depois seu proprietário foi-se integrando à nova ordem e houve
um certo alinhamento com o sistema militar durante o seu fastígio.
O Jornal da Cidade, criado em 1972, preservou alguma distância, até
que foi adquirido por Augusto Franco. O Jornal de Sergipe reapareceu
em 1978 e serviu aos oposicionistas. Mas, terminado o pleito, foi ven-
dido a um grupo pragmático que procurou conviver com a vigilância
oficial, sem perder a credibilidade.
Durante esse tempo chegou a TV. Em 1967 foi lançada a pedra
inicial para construção do prédio e, em 1971, sob o controle de um
grupo de empresários do Estado, começaram as programações em
caráter experimental através do canal 4. Era o início de uma nova
fase nos meios de comunicação com a apresentação de imagens nos
noticiários, nas novelas e numerosos programas, homogeneizando in-
formações para todas as classes, unificando o mercado, aumentando a
influência do Sudeste. Em 1975 surgiu o canal 8, denominado Atalaia,
de Augusto Franco, que, poucos anos depois, compraria também o 4,
monopolizando o novo meio de comunicação em Sergipe. Juntando
com um jornal e uma rádio, ampliava-se a influência desse importante
grupo político-empresarial sobre a sociedade sergipana.
Durante o auge do regime militar, a mídia ajudou a alimentar a
ideologia dominante, divulgando seus projetos de impacto e os slo-
gans de “Brasil potência”, “Ninguém segura esse país”, mas quando
as dificuldades econômicas se pronunciaram e a inflação voltou a
subir junto com a dívida externa, tornou-se mais difícil fabricar ilu-
sões. Quando surgiu a campanha pelas Eleições Diretas, os rádios, os
jornais e as TVs também contribuíram para a mobilização política e
para o término do Estado autoritário.

262
História de sergipe: república

4.4 Resumo (1964-1982)

O autoritarismo foi a grande marca do período 1964-82. A tutela


militar destroçou o domínio populista, facilitando o saneamento
financeiro, mas sacrificou a participação popular. A mudança de re-
gras, adotando a eleição indireta para governador, contribuiu para o
enfraquecimento da porfia interna entre PSD X UDN e inibiu paixões
personalistas, mas introduziu a prática nociva das indicações pesso-
ais que engendrou orientações tecnocráticas. Embora proferissem o
discurso da racionalidade, os militares reforçaram o assistencialismo,
valorizaram lideranças decadentes, incidiram na distribuição de be-
nesses partidarizadas, incentivaram o individualismo e, no âmbito
municipal, o clientelismo.
De maior gravidade, porém, foi a marca da repressão sobre os cida-
dãos, degradando o Direito e a Justiça, violando os direitos civis e políti-
cos, configurando um dos maiores retrocessos político-institucionais de
nossa História. Ao dissolver o sistema pluripartidário que se enraizava
na sociedade, os militares desorganizaram a vida política, estimularam
a polarização política, fomentaram a cultura da subalternidade e con-
correram para o afastamento de quadros expressivos.
Apesar dessa situação, o processo de modernização recebeu gran-
de impulso. O modelo agroexportador perdeu a sua predominância
diante da presença da Petrobras que contribuiu decisivamente para a
mudança da estrutura industrial de Sergipe. Por outro lado, algumas
reorientações das políticas nacionais favoreceram também a expan-
são da economia capitalista interna que ganhou maior dinamismo
e funcionalidade. Cresceu a importância dos empresários urbanos,
especialmente da construção civil, que passaram a gozar de maior
poder de pressão sob os pleitos eleitorais e junto aos projetos governa-
mentais. A burocracia pública ampliou-se, e o papel do Estado como
instância estratégica de desenvolvimento alcançou maior magnitude.
Diminuiu a influência das classes subalternas e até do patronato
rural, embora os chefes políticos municipais continuassem com
grande peso na eleição da representação estadual. A modernização

263
Ibarê Dantas

socioeconômica acelerou-se. Mas o modelo de desenvolvimento


pelo alto não democratizou seus benefícios como seria de esperar. A
permanência do elevado número de analfabetos, o índice de concen-
tração de renda em nível superior ao patamar nacional, entre outros
indicadores sociais, são exemplos ilustrativos do legado desse tempo.
A sociedade, em seu conjunto, urbanizou-se, diversificou-se,
secularizou-se e passou a assimilar costumes decorrentes dos novos
padrões tecnológicos. As relações de produção capitalistas ampliaram-
-se nas cidades e no campo, contribuindo para desgastar o caráter
pessoal das dominações. Em Aracaju, o meio universitário cresceu
consideravelmente, trazendo repercussões ao ambiente sociocultural.
Os sindicatos foram cerceados e demoraram a recuperar-se. No início
dos anos oitenta, grupos da sociedade civil passaram a mobilizar-se
e animaram-se no sentido de ampliar sua área de influência diante
das perspectivas do regime democrático.
No campo cultural, o Estado voltou a predominar num ambiente de
tensão contínua. Num primeiro momento, sua política cultural gerou
reações conflituosas com diversos segmentos ligados ao ensino e às
artes. A partir de 1969, quando a sociedade foi subjugada e as produções
artísticas submetidas à censura, o Estado, na busca de legitimidade,
implementou política mais ampla do que no Estado Novo. Ao tempo
em que promovia a modernização do desenvolvimento capitalista,
adotando padrões tecnológicos mais atualizados, o Estado procurou
implementar seu projeto cultural burocrático e autoritário em sintonia
com a lógica do mercado. Neste sentido, a cultura ganhou significativos
investimentos e foi adquirindo mais visibilidade, contribuindo inclusi-
ve para legitimar a nova ordem. Enquanto no plano nacional uma série
de agências, tais como o SNI, a ESG, a Embratel e o MEC, regulavam
ou orientavam mensagens e práticas, a criação de novos órgãos locais
(escolas, museus, secretarias) gerava uma rede de agentes voltada
para a programação, realização e divulgação de eventos culturais sem
precedentes. A UFS, os festivais de artes e cultura, as recuperações de
monumentos históricos e os incentivos às produções artísticas forma-
ram o legado mais expressivo desse período.

264
V
O ESTADO LIBERAL-DEMOCRÁTICO EM
CONSTRUÇÃO (1983-2000)

5.1 A Transição Política e a Instauração da Nova República

O processo de transição do regime autoritário para o democrático,


que vinha se gestando, ganhou novo alento com as eleições de
1982. Sendo o primeiro pleito com voto popular para governador
depois de 1962,1 despertou muita animação na sociedade. A vitória
dos candidatos da oposição em dez Estados de grande importância
política e econômica fortaleceu os grupos mudancistas e enfraqueceu
o domínio militar. As bases políticas do presidente Figueiredo foram
se restringindo às unidades federativas menores, dominadas pelo
situacionismo. As bancadas parlamentares foram se tornando in-
quietas e arredias, como que se precavendo para mudanças. Foi neste
clima que, em março de 1983, o deputado de Mato Grosso Dante de
Oliveira (PMDB) apresentou emenda à Constituição propondo eleições
diretas para presidente da República. Era uma forma de quebrar o
nó da sucessão presidencial, até então amarrada pelas regras do Co-
légio Eleitoral que favoreciam o partido governista. Nessa situação,
a transição continuaria lenta e insegura, pela possibilidade de ascen-
são de seus inimigos. Diante desse quadro, a iniciativa do deputado
oposicionista encontrou receptividade extraordinária na sociedade.
Contando com o respaldo dos governadores e da sociedade civil, as

1
O pleito de 1965 reduziu-se a poucos Estados.

265
Ibarê Dantas

aglomerações foram se sucedendo em crescimento progressivo, em-


polgando multidões, que acorriam às praças, em eventos memoráveis
entre novembro de 1983 e abril de 1984.
Em Aracaju, em 21.01.84, foi lançado no prédio da Assembleia
Legislativa o Comitê Pró-Diretas com a presença de cerca de 500 pes-
soas, reunindo nomes de todos os partidos oposicionistas do Estado.
O comício de Aracaju ocorreu em 26.02.84 na Praça Fausto Cardoso e
cerca de 30 mil pessoas ouviram por quatro horas 21 oradores, entre os
quais as grandes estrelas nacionais da campanha das Diretas.2 Desde
o início dos anos sessenta, não se via em terras de Sergipe comício
naquelas proporções. Mas no Congresso a emenda foi derrotada,
passando os oposicionistas a defenderem a candidatura de Tancre-
do Neves no colégio eleitoral. Enquanto isso, o PDS entrou em crise.
Sarney renunciou à sua Presidência em meados de junho de 1984 e
foi substituído pelo deputado Augusto do Prado Franco, que assumiu
a sua direção declarando pretender “unir o partido”.3 Mas uma parte
do PDS deixou a agremiação situacionista, criou a Frente Liberal e
passou a apoiar a candidatura oposicionista, formando a coalizão da
Aliança Democrática, enquanto Augusto Franco deixava a direção
do PDS, configurando o fracasso de sua missão. Enormes multidões
voltaram a encher as praças de várias cidades, superando em alguns
casos as manifestações das Diretas. Em Aracaju, um público estimado
entre 50 e 60 mil pessoas participou do acontecimento apoteótico,
quando as expectativas de mudança se exacerbavam.
Em 15 de janeiro de 1985, o Colégio Eleitoral elegeu Tancredo
Neves a presidente da República por 480 votos contra 180 para Paulo
Maluf. A maioria dos representantes de Sergipe votou no candidato
da oposição. Mesmo assim, o apoio ao ex-governador de São Paulo foi,
proporcionalmente, o quinto maior do país. Apesar da avalanche de
adesões à Aliança Democrática, o placar de 8 a 7 demonstrava que,
no quadro político estadual, persistia expressiva fidelidade ao situa-

2
Ver Jornal de Sergipe, 29.02.1984.
3
Ver Jornal do Brasil, 24.06.1984.

266
História de sergipe: república

cionismo.4 Dois meses depois, concretizou-se, enfim, a alternância de


poder que encerrou o ciclo dos governos autoritários, abrindo uma
nova fase da longa transição para a democracia.
O retorno de um político civil à Presidência da República, ocorri-
da em 15 de março de 1985, indicava um novo momento da história
nacional. É verdade que o processo de mudança foi amortecido pela
presença dos ex-arenistas no novo governo e pela influência de sete
militares no ministério do novo presidente. Causou frustração maior
a doença de Tancredo Neves na véspera da posse e sua morte após
41 dias de sofrimento. Para administrar a Nova República, como foi
denominada a nova ordem, assumiu, em meio a desconfianças, o
vice-presidente José Sarney, ex-presidente do PDS, reverente servidor
do regime militar.
Apesar das limitações, o novo governo tomou várias iniciativas
liberalizantes durante os primeiros meses, removendo parte do que
se chamava “entulho autoritário”. Empreendeu também algumas
medidas democratizantes no sentido de completar o ciclo da transi-
ção política: reforma partidária, facilitando o registro dos partidos,
inclusive dos considerados clandestinos; extinção das sublegendas;
convocação da Constituinte; reconhecimento das centrais sindi-
cais, da autonomia e liberdade sindicais, concessão da anistia aos
dirigentes sindicais cassados; eleições diretas para todos os níveis,
inclusive para presidente da República; legalização da União Nacional
dos Estudantes (UNE); criação do Conselho Nacional de Defesa dos
Direitos da Mulher; projeto de reforma agrária. Na área partidária, a
emenda constitucional nº 25 de 30.05.85, que a originou, prescrevia
para a formação de partido provisório 101 assinaturas, colhidas em
cinco Estados e a publicação de manifestos, estatutos e programas.
Com essa liberalização, em agosto de 1985, o novo sistema partidário
já estava composto de trinta partidos.

4
Cf. Jornal de Sergipe, 16.01. 1985.

267
Ibarê Dantas

5.1.1 Do PDS ao PFL: João Alves (1983-1986)

Em Sergipe o vitorioso pelo voto direto para governador nas


eleições de 1982 foi o engenheiro e ex-prefeito de Aracaju João Alves
Filho5 (PDS). Ao assumir o governo, em 15.03.83, foi demonstrando
autonomia de ação, afastando-se do grupo Franco, mas resistia a abrir
a sociedade política à participação de novos atores sociais. Alheios às
demandas do processo democrático, os situacionistas provenientes
da ARENA continuavam fechados e predominantes.
Diante dos movimentos nacionais, visando à reconstrução da
democracia, o novo governante resistiu o quanto pôde para formar
a Aliança Democrática. Permaneceu no PDS, não se engajou na
campanha das Diretas e estimulou seus aliados a votarem contra.
Com o fortalecimento do movimento da Frente Liberal, tornar-se-ia
o último governador a assinar o seu manifesto, assim como fora o
derradeiro a aderir à candidatura de Tancredo Neves, concorrente
ao Colégio Eleitoral. Somente em dezembro de 1984 anunciou que
iria deixar o PDS e passou a organizar o PFL em março de 1985, já
nos tempos da Nova República. Essas opções demoradas em parte são
explicadas pela força que gozava o ex-governador e deputado federal
Augusto do Prado Franco,6 influente chefe do partido situacionista e
responsável pela sua vitória.
Ao compor seu secretariado,7 incluiu seis pessoas que lhe haviam
servido quando fora prefeito e concedeu ao grupo Franco duas pas-
tas: Fazenda e Educação. A partir daí as divergências com o chefe
do PDS estadual foram se sucedendo no correr de 1983 e 1984. Com
o movimento crescendo em torno de Tancredo Neves, João Alves
recepcionou-o e participou do grande comício de 15 de dezembro.
Parecia que o rompimento com Augusto Franco estava na iminência

5
Sobre João Alves Filho ver José Ibarê Costa Dantas. A Tutela Militar em Sergipe – 1964/1984
(Partidos e Eleições num Estado Autoritário). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, p. 266.
6
Sobre a administração de Augusto do Prado Franco, ver José Ibarê Costa Dantas, ob. cit., 1997,
p. 232-264.
7
Sobre o secretariado do governo João Alves Filho, ver Jornal de Sergipe, 12.03.1983.

268
História de sergipe: república

de concretizar-se, mas o chefe do Executivo dissimulava: avançava,


recuava e assim ia coexistindo numa ambiguidade exasperante para
os peemedebistas que de muito esperavam pela sua saída do PDS.
Faltando uma semana da data marcada para a posse de Tancredo
Neves, dizia-se que o PMDB de Sergipe havia reivindicado 21 dos 57
cargos então existentes na área federal.8 Por esse tempo, João Alves
começou a formalizar a criação do PFL em Sergipe e a reivindicar
os mesmos postos que os peemedebistas queriam. Com a morte do
ex-governador de Minas Gerais, coube a José Sarney a tarefa de ge-
renciar a partilha.
Enfim, no dia 19.05.1985, João Alves reuniu-se com o líder do PMDB,
José Carlos Teixeira, em Brasília, e acertaram uma aliança do PFL +
PMDB com vistas ao pleito de 1985 que se aproximava. Em face do
acordo, Teixeira assumiu a Prefeitura, em 30.05.85, para governar
durante os sete meses que separavam da posse do novo administra-
dor. Esquerdistas, comunistas, proscritos da política, que estiveram
militando na oposição, integraram o seu secretariado.9
Era uma mudança significativa na política sergipana como não
se via desde o início do regime militar, mas de amplitude e profundi-
dade limitadas. Basta observar como a grande maioria dos cargos da
máquina estatal era ocupada pelos pefelistas procedentes do situa-
cionismo do regime autoritário que respaldaram com desenvoltura.
De qualquer forma, era um avanço com perspectiva de as mudanças
ampliarem-se com a eleição da capital, cuja campanha se acelerava.
No pleito de 1985, para prefeito de Aracaju, concorreram Jack-
son Barreto pela Aliança Democrática, envolvendo PMDB + PFL +
PC do B, o ex-deputado Gilton Garcia pela Frente Democrática PDS
+ PTB, apoiado pelo grupo Franco, Marcelo Déda Chagas pelo PT e
Nelson Araújo pelo PL, vencendo o primeiro com a maior votação
proporcional do país. Mas a Aliança Democrática cindiu-se em 1986.

8
Ver Jornal de Sergipe, 09.03.1985.
9
Ver Jornal de Sergipe, 04.06.1985. Adversários do prefeito davam conta que em inícios de
agosto de 1985 cerca de dez comunistas já haviam tomado posse em cargos da Prefeitura.
Cf. Jornal da Cidade, 09 e 10.08.1985.

269
Ibarê Dantas

José Carlos Teixeira lançou-se candidato e o governador apresentou


Antônio Carlos Valadares (PFL), que também foi apoiado pelo prefeito
Jackson Barreto. O líder do PMDB fez aliança com o grupo Franco e
o PT apresentou a professora Tânia Magno da Silva.10
Decorrido o pleito, no plano nacional ocorreu a extraordinária
vitória do PMDB que elegeu quase todos os governadores, a maioria
dos deputados federais e dos senadores. Obtinha assim o controle da
Assembleia Nacional Constituinte. Essa predominância não impediu,
contudo, que o PFL também crescesse, pois na Câmara dos Deputados
sua bancada ascendeu de 70 para 118, enquanto no Senado passava
de 12 para 16 membros. Quem mais perdeu foi o PDS. Aquele que
foi cantado como o maior partido do Ocidente e, ainda em 1984, era
formado por 235 parlamentares da Câmara, baixou para 165 com a
defecção dos que foram fundar o PFL. Em 1986, a nova representação
vitoriosa reduziu-se a 33. No Senado conseguia apenas cinco cadeiras.
A vitória do PMDB, na esteira da exploração do plano Cruzado,
revelou-se avassaladora sobretudo nos pleitos estaduais, na medida
em que elegeu 22 dos 23 governadores. Sergipe foi a única exceção
nacional do PFL, graças principalmente ao empenho de João Alves
Filho, que deixou de concorrer ao Senado, usou a máquina pública
de forma generosa, investiu mais nos prefeitos, sobretudo no sertão,
fez deles ponta de lança junto às bases municipais, e evitou a alter-
nância de poder.
Com a eleição de seu sucessor, ia chegando ao seu termo o man-
dato de João Alves Filho (1983-87), que dirigiu o Estado entre o fim
do domínio militar e o início da Nova República, numa conjuntura
agitada e marcada por pressões políticas continuadas. De um lado teve
que administrar as demandas do seu partido, o PDS, especialmente
do poderio de Augusto Franco, reclamando maior espaço. De outro,
a influência crescente dos oposicionistas, especialmente do PMDB,
respaldado pelas lideranças nacionais. Apesar dos problemas, foi uma

10
Mais informações sobre este pleito, ver José Ibarê Costa Dantas. Eleições em Sergipe –
1985/2000. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002.

270
História de sergipe: república

gestão de sucesso tanto pelas vitórias políticas, quanto pelas realiza-


ções materiais. Segundo dados da propaganda oficial, que devem ser
vistos com reservas, tentou superar grandes carências da população.
Nesse sentido, ampliou a rede de esgoto da capital de 14 para 140 km.
Mais que duplicou a quantidade de leitos da rede hoteleira e cons-
truiu mais de 11 mil casas populares. Duplicou a quilometragem de
rodovias pavimentadas, o efetivo militar e mais do que duplicou a
extensão das adutoras.
No interior, empenhou-se em proporcionar condições para o ser-
tanejo conviver com os períodos de seca. Construiu dez mil cisternas,
cerca de mil poços artesianos e promoveu a irrigação pública de qua-
tro mil hectares de terra.11 Entretanto, a falta de avaliações abalizadas
de seus projetos limitou o sucesso. Numerosos poços artesianos e
cisternas inviabilizaram-se.
No setor educacional, o saldo foi modesto, senão negativo. Nego-
ciou a Secretaria com o grupo Franco e, durante os primeiros dois
anos, cerca de oito titulares se sucederam, alguns dos quais sem qual-
quer identificação com a área, degradando a máquina burocrática
e sobretudo o ensino. Somente a partir de março de 1985, um novo
secretário conseguiu proporcionar um mínimo de racionalidade ao
seu funcionamento.12 Enquanto isso a parte pedagógica permanecia
caótica e sem controle.
Na Saúde foi o contrário da Educação. Começou com alguma ten-
tativa de melhoria dos serviços, teria aumentado o número de leitos
na rede hospitalar de 288 para 863 e adquirido 70 ambulâncias, mas
seu empenho terminou um pouco comprometido pelas concessões
feitas a grupos de pressão ligados à área.
Na área da administração pública, optou pela contratação de
assessorias de outros Estados para realizar trabalhos pontuais sem

11
Por que João Alves (Livreto de propaganda do governo João Alves, distribuído por ocasião das
eleições de 1990).
12
Cf. João Gomes Cardoso Barreto, depoimento ao autor, em 02.02.1999. Entre os críticos, ver
Gazeta de Sergipe, 11 e 12.05.1986.

271
Ibarê Dantas

grande preocupação com os seus efeitos nem com os custos,13 su-


bestimando o corpo de quadros técnicos locais. Ao tempo em que
se descuidava da formação dos servidores, promoveu duas grandes
contratações em massa de forma explícita e sem critério,14 propor-
cionando um péssimo exemplo aos prefeitos que também passaram
a admitir com fins eleitoreiros sem precedentes. Preocupou-se em
melhorar a infraestrutura visando incentivar o turismo. Ampliou
consideravelmente a rede hoteleira de forma altamente subsidiada,
mas não obteve os resultados esperados. A divulgação do potencial
de Sergipe, através de intensa propaganda, muitas vezes confundia
as atrações do Estado com a imagem do governante.
Para cobrir as despesas com as obras, além das dotações orçamen-
tárias, o governo contou com ajuda do ministro do Interior Mário
Andreaza, com dinheiro a fundo perdido e com financiamentos do
Polo Nordeste. Para aprovar seus projetos, teria usado de expedien-
tes ilícitos junto a parlamentares.15 Lançou títulos no mercado e
recorreu a empréstimos junto ao Banco Mundial, que teria liberado
31 milhões de dólares. Governando numa conjuntura marcada por
permissividade nos gastos, endividou o Estado de forma exorbitante,
deixando pesado ônus para seus sucessores.16 No conjunto, João Alves
Filho revelou-se um administrador desenvolvimentista, um tocador
de obras. Algumas realizações revelaram-se meritórias, mas outras,

13
Segundo um economista que estudou o período, Sergipe tornou-se o reino encantado das
empresas de consultorias. Nilton Pedro da Silva. Estado e Região, Contribuição ao Estudo da
“Modernização Autoritária” do Nordeste Brasileiro. Tese de Doutorado em Economia, Aracaju,
1994, p.199.
14
O governo João Alves Filho proporcionou dois “trens da alegria”. Ambos em tempos de
campanha eleitoral. O primeiro em julho de 1985 e o outro em julho 1986. Estima-se que
ao todo foram contratados cerca de 8.000 funcionários. No Estado de Alagoas teriam
sido 10.000 os admitidos pelo governador Suruagy. Cf. Jornal do Brasil, 19.08.1986.
15
Segundo noticiário da imprensa, somente para aprovação de um projeto de suplementação
de recursos, o governo teria pago ao deputado José Vieira dois milhões de cruzados e para
o deputado José Ribeiro três milhões de cruzados. Cf. Jornal da Cidade, 20.08.85 e Jornal de
Sergipe, 10.08.1986.
16
Deixou o Estado em situação financeira com dívidas de difícil rolagem em face dos contratos
de escalamento até o ano 2017. Cf. Jornal de Sergipe, 24-25.06.1987. O parecer de conselheiro
do Tribunal de Contas, Gilson Cajueiro de Holanda, de 07.05.1987, manifestou-se pela rejeição
das contas do governo do exercício financeiro de 1986.

272
História de sergipe: república

marcadas pela improvisação, careceram de estudos criteriosos,


manifestaram-se onerosas e de escassa utilidade.
Afinal, pode-se dizer que contribuiu para modernizar o campo e a
capital e desgastar o grupo Franco, embora não tenha se manifestado
aberto a novas forças tendentes a renovar os métodos de operar a
política. Antes pelo contrário, usou abertamente a máquina pública
como instrumento eleitoral, estimulando práticas contrapostas aos
princípios republicanos de zelo pelos recursos públicos. Apesar disso,
deixou o governo com popularidade em alta, preparado para novas
investidas.

5.1.2 A Exceção do PFL: Valadares (1987-1990)

Antônio Carlos Valadares17 tomou posse, em 15.03.1987, quando o


país vivenciava nova crise econômica, com o fim do Plano Cruzado e a
retomada da inflação. Apesar da precariedade das finanças públicas,
nomeou secretariado recorde composto de 25 nomes, 12 dos quais par-
ticipantes da administração anterior. Assumindo a direção do Estado
sobrecarregado de dívidas e promessas de campanha, o novo gover-
nador tenderia a encontrar bastantes dificuldades administrativas.
Na Assembleia Legislativa, o quadro exigia atenções especiais.
Compôs com o PT,18 mas a lealdade da maioria da bancada governis-
ta revelou-se duvidosa, especialmente o grupo alvista. Nas finanças,
desde pelo menos 1983, o serviço da dívida vinha crescendo, redu-
zindo a capacidade de endividamento do Estado19 e a arrecadação
se manifestava insuficiente para cobrir os gastos. Se no governo de
João Alves o funcionalismo já se queixava da contração do seu poder
aquisitivo, com Valadares logo no primeiro mês os servidores públicos

17
Sobre a trajetória política de Antônio Carlos Valadares, ver José Ibarê Costa Dantas. Eleições
em Sergipe – 1985/2000. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 2002.
18
Sobre as relações políticas do governo Valadares com o PT, ver Marcelo da Silva Ribeiro. PT
saudações (um depoimento para petistas e não petistas). Aracaju: Sercore, 2003.
19
Ver Gazeta de Sergipe, 21.05.1987.

273
Ibarê Dantas

reivindicaram reposição salarial da ordem de 240,12%,20 mas longe


estiveram de ser atendidos. Como a inflação continuava aumentan-
do21 e os salários ficavam cada vez mais contraídos, essa situação
favorecia o caixa do governo, mas as pressões de várias categorias
se intensificavam. Manifestações na Assembleia e nas ruas, críticas
acerbas, movimentos do Sem Teto e dos Sem Terra, greves dos pro-
fessores, tudo passou a fazer parte do dia a dia do chefe do Executivo
estadual, enquanto a polícia nem sempre exercitava a tolerância. Para
garantir a rotina da máquina administrativa, através do empenho
das chefias, o governador concedeu aumentos seletivos, favorecendo
comissionados, distanciando-os ainda mais da massa de servidores. O
treinamento de pessoal diminuiu, enquanto se desarrumava a estru-
tura organizacional de órgãos vitais para o acompanhamento da vida
econômica e funcional do Estado, chegando a desativar alguns deles.22
Como único governador eleito do PFL, empenhou-se para que o
presidente José Sarney nomeasse João Alves para algum ministério
como uma forma de transferir verbas para Sergipe. Seu pleito foi
atendido em inícios de agosto de 1987, quando aquele ex-governador
foi indicado para o Ministério do Interior. Com efeito, embora a
situação do Estado não melhorasse logo, ao fim do primeiro ano de
gestão, os convênios com o Ministério de Habitação, Urbanismo e
Meio Ambiente estabelecidos para a construção de 6.423 casas po-
pulares ajudariam a dinamizar a economia local. Posteriormente os
projetos Campo Verde, Padre Cícero, como primeiros de uma série
patrocinada pelo Ministério do Interior, tenderiam a favorecer a
situação financeira do governo estadual.
Por esse tempo, a área política agitou-se com as denúncias de
irregularidades na Prefeitura de Aracaju, veiculadas pela impren-

20
Folha de São Paulo, 17.04.1987, p. A-6.
21
O índice de inflação nacional passou de 124,3% em 1986 para 415,8% em 1987. Cf. Conjuntura
dos trabalhadores, Jornal do Brasil, 27.06.1992.
22
O IESAP, que era encarregado da coleta de dados e da política de planejamento, reduziu
drasticamente suas funções básicas. A Revista Ecos deixou de circular e até o Anuário
Estatístico do Estado, editado por 17 anos consecutivos, foi desativado de 1987 a 1992.

274
História de sergipe: república

sa e por políticos. Não obstante realizar uma administração com


grande aceitação popular,23 Jackson Barreto passou a ser acusado de
malversação do dinheiro público. Visando amortecer as críticas, o
prefeito fez algumas demissões, mas o Tribunal de Contas persistiu
com a apuração e pediu intervenção. O governador Antônio Carlos
Valadares acompanhou o processo sem demonstrar interferências e
a Assembleia aprovou-a por 13 x 11, sob o empenho dos deputados do
PT e do PL, contando também com votos do PMDB e talvez do PFL,
não obstante a presença da multidão levada por Jackson Barreto para
a frente da Assembleia.
Enquanto transcorria a questão da Prefeitura, o governador costu-
rava ampla aliança entre o PFL e PMDB. Em meados de julho era enfim
anunciado o “acordão” unificando as principais lideranças do Estado,
envolvendo toda a bancada federal, representada por três senadores e
oito deputados, além dos deputados estaduais dos partidos coligados.
Nascia assim mais uma coligação denominada Aliança Democrática,
agora composta pelas seguintes siglas: PFL + PMDB + PL + PJ.
Os grupos Franco e Teixeira juntavam-se aos governistas e,
unidos, lançaram a candidatura do suplente de deputado federal
médico Lauro Maia para prefeito. Quando Jackson Barreto renunciou,
declarou que iria recomeçar tudo de novo, inclusive candidatando-se
a vereador. Execrado pelos adversários, acossado por processos, ame-
açado de expulsão pela executiva municipal do PMDB, transferiu-se
com seu grupo para o PSB e, por essa sigla, lançou o advogado Welling-
ton Paixão para concorrer à Prefeitura. Não obstante o favoritismo
inicial do deputado Marcelo Déda Chagas (PT), o candidato do PSB
terminou vencendo.
No interior do Estado, predominou o PFL ao eleger 40 dos 73
prefeitos. Era a vitória insofismável sobretudo do ex-governador João
Alves Filho, que ocupava o Ministério do Interior e continuava como
principal chefe do Partido da Frente Liberal.

23
Ver anúncio que informava tratar-se do prefeito com maior índice de aceitação do país in
Jornal da Cidade, 14.08.1988.

275
Ibarê Dantas

Por esse tempo, o país já dispunha de nova Constituição, que con-


tou com ampla participação popular. Promulgada em 1988, assegurava
novos direitos individuais, políticos e sociais, consagrando grandes
conquistas, inclusive na definição da cidadania de minorias. Entre as
inovações figuraram o habeas data, proporcionando acesso a infor-
mações e o mandado de injunção, permitindo “recorrer a Justiça para
exigir o cumprimento de dispositivos constitucionais”.24 Os ganhos
sociais foram numerosos, mas sobrecarregava o Estado de monopólios
e obrigações, algumas das quais sem prescrever os meios adequados
para atendê-las. Apesar de excessivamente detalhista, deixou várias
ambiguidades nas relações entre a União, os Estados e os municípios.
Por fim, as disposições transitórias incorporaram várias medidas
de cunho corporativo, inspirado num regionalismo retrógrado. Foi
marcado para 1992 o plebiscito para definir a forma de governo e
para 1993 a revisão constitucional. Promulgada em 05.10.1988, nascia
assim a nova Constituição sob o signo da temporalidade. A partir de
então, caberia aos Estados elaborarem suas Cartas, subordinadas aos
preceitos constitucionais do país.
Em Sergipe, a Constituinte foi instaurada em 18.10.1988 e contou
com a participação popular como nunca acontecera.25 Após intensos
debates, instigados sobretudo pelo desempenho de alguns deputados
da oposição, a Carta foi promulgada em 05.10.1989 como a mais lon-
ga das constituições da história do Estado. Além de ser composta de
280 artigos do texto central, foram-lhe acrescentados 65 outros das
Disposições Transitórias, propondo a criação de 15 novos municípios
no Estado com a mesma tendência de criar encargos.
Quando ainda se discutia a constituição estadual e os novos prefei-
tos ainda não haviam tomado posse, começaram as movimentações
políticas visando ao primeiro pleito direto para presidente da República
desde 1960. Depois de campanha acirrada com a participação de 32

24
José Murilo de Carvalho. Cidadania no Brasil: longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2001, p.123.
25
Ver Marcelo da Silva Ribeiro. PT saudações (um depoimento para petistas e não petistas). Aracaju:
Sercore, 2003.

276
História de sergipe: república

candidatos, Fernando Collor de Melo e Luiz Inácio da Silva ficaram para


o segundo turno e o primeiro terminou vitorioso. Em Sergipe, Collor
venceu nos dois turnos, fortalecendo o grupo Franco, especialmente
o senador Albano do Prado Franco, que o apoiou de forma decisiva.
Em contrapartida, um dos maiores perdedores do pleito de 1989 foi o
ministro João Alves Filho. Depois de afastar-se de seu candidato do PFL
e encampar candidatura de Sílvio Santos, quando esta foi impugnada
ficou sem opções, deixando seus seguidores desnorteados. A vitória de
Lula em Aracaju no segundo turno reiterava a tendência oposicionista
do eleitorado da capital, reforçando candidatos de esquerda. Mas, se
de um lado, a votação do petista sinalizava para um potencial oposi-
cionista significativo, por outro indicava as dificuldades de coalizões
dos grupos de esquerda em face das rivalidades internas persistentes.
Com a eleição para presidente da República, completava-se o pro-
cesso de transição. Fora uma travessia longa e difícil, inclusive durante
o período da Nova República. O governo Sarney, depois da fase áurea
do Plano Cruzado, foi marcado por crise endêmica. Divulgou novos
planos, mas longe estiveram de alcançar o sucesso do primeiro. Pode-
-se dizer que a administração do presidente maranhense decorreu
cheia de dificuldades e chegou ao fim melancolicamente.
Fernando Collor de Melo tomou posse na Presidência em 15 de
março de 1990, carregando um passado político bastante controver-
tido e encontrando o modelo do Estado nacional desenvolvimentista
praticamente exaurido.26 Tentou derrubar a inflação, que era superior
a 80% ao mês, equacionar a dívida externa e retomar o desenvolvi-
mento, dentro de um projeto liberalizante ambicioso. Adotou con-
gelamento de preços e salários e a drástica retenção de cerca de 70%
dos ativos financeiros no bojo da reforma monetária que substituía
o cruzado pelo cruzeiro. Como efeito, a dívida interna reduziu-se,
a inflação inicialmente caiu vertiginosamente,27 mas pouco depois

26
Aloísio Mercandante. Revista Teoria e Debate. São Paulo, n. 10, abril a junho de 1990.
27
Para o BTNF a inflação de março teria sido da ordem de 84,32% e a de abril 3,29%. O IBGE
calculou a de março em 84,32%, a de abril em 44,80% e a de maio em 7,87%. A Fipe divulgou
a inflação de maio em 3,29%.

277
Ibarê Dantas

retornou. O governo tomou medidas recessivas, no início do ano


seguinte editou novo pacote, mas não obteve grande sucesso.
Como em todo o país, as repercussões do Plano Collor em Ser-
gipe foram de perplexidade e susto sobretudo para a elite política e
o empresariado. Um fato particular que chamou muita atenção foi
o tráfico de influência para liberação dos recursos retidos. Várias
Prefeituras ficaram com dificuldades de sacar as verbas, porque os
seus prefeitos aplicavam os recursos da Prefeitura no overnight em
suas contas pessoais que foram trancadas.28 A imprensa noticiou o
ocorrido, a promotoria andou investigando, a Assembleia Legislativa
aprovou requerimento convocando o presidente do Tribunal de Con-
tas a prestar esclarecimentos, mas aquela autoridade não comparecia.
Houve cobranças na Assembleia, mas a maioria dos parlamentares
se omitia. Como o delito envolvia várias figuras influentes do mundo
político, seguiu-se o silêncio e a consumação da impunidade.
Na esfera nacional, foram crescendo os indícios de corrupção
muito forte em torno da Presidência.29 O seu próprio irmão, Pedro
Collor, divulgou dossiê, o movimento “Fora Collor” ganhou as ruas e
o Congresso Nacional empenhou-se pelo seu afastamento.
Em Sergipe, enquanto órgãos governamentais tentavam favorecer
parlamentares do PFL, visando assegurar a lealdade ao presidente,30
a OAB, a Associação Sergipana de Imprensa e o DCE da UFS, entre
outros órgãos, promoviam passeatas, incorporando-se assim ao mo-
vimento nacional que propugnava a saída do governante. O mote dos
oradores era o impeachment de Collor e o fim da corrupção.31 Pesquisa
realizada pelo Dataform detectou que 87,5% dos aracajuanos defen-
diam o imediato afastamento de Fernando Collor da Presidência.32 Às
vésperas da votação no Congresso, Albano Franco e João Alves, que

28
Ver Jornal de Sergipe, 16.05.1990 e Gazeta de Sergipe, 16.05.1990.
29
Ver O Estado de São Paulo em 22.03.1992.
30
Noticiou-se que o presidente do Banco do Brasil, Lafayete Coutinho, teria liberado recursos
para determinados municípios, onde deputados do PFL mantinham influência, visando
assegurar o voto contra possível pedido de impeachment. Cinform, 17-23.08.1992.
31
Ver Gazeta de Sergipe, 27.08.1992.
32
Cinform, 31.08 a 06.09.1992.

278
História de sergipe: república

até então professavam lealdade, negaram-lhe apoio. A Câmara dos


Deputados conseguiu comprovar um ilícito penal para respaldar o
impeachment e aprovou-o em 29.09.1992, resultando no afastamento
do presidente da República no início do mês seguinte (02.10.1992). Em
meio à batalha judicial que se seguiu, quando o Senado preparava-se
para cassar-lhe os direitos políticos, o chefe do Executivo apresentou
sua carta de renúncia. Era 29.12.92, a sorte de Fernando Collor estava
consumada, mas as controvérsias continuavam.
O governador Antônio Carlos Valadares, exercitando sua habilida-
de de articulador, cedo começou a montar uma chapa consensual com
vistas ao pleito de 1990. O grande problema inicial era a existência de
dois postulantes fortes, Albano Franco (PRN) e João Alves Filho (PFL).
Mas o primeiro desistiu, e a campanha tornou-se mais fácil, sobretudo
porque os oposicionistas participaram desunidos em duas frentes: a
“União Contra o Acordão” formada pelo PDT + PCB e a “Frente Sergipe
Popular”, envolvendo PT + PC do B + PSB + PV.33 Concorreu também
uma fraca candidatura do PTR. Decorrido o pleito, João Alves voltou
a ser eleito governador apoiado por uma enorme aliança (PFL + PDS
+ PMDB + PDC + PL + PCM + PMN + PRN + PRP e PSDB) enquanto
Albano Franco retornava ao Senado.
O resultado satisfazia também Valadares, responsável pela monta-
gem do “acordão”. Rejubilou-se com sua vitória, elegeu um sobrinho
para a Câmara dos Deputados e outro parente para a Assembleia
Legislativa, após uma administração de políticas miúdas, sem projeto
de desenvolvimento para o Estado, a não ser a defesa do Polo Cloro-
químico. De certo modo, ganharam ainda os Teixeira que, mais do que
nunca, viram-se integrados na política situacionista. Enfim, venceram
o patronato urbano e rural e todos os grupos conservadores da classe
dominante, associados numa das maiores coalizões políticas da his-
tória de Sergipe. Do outro lado, perderam os setores de esquerda que
permaneceram fracionados e mais uma vez assistiram, sem grandes

33
Ver Jornal de Sergipe, 22.06.1990. Ver Jornal da Cidade, 03.02.1988 e Jornal de Sergipe, 03.02.1988.

279
Ibarê Dantas

avanços, ao triunfo dos adversários. No conjunto, foi um resultado


de mudanças inexpressivas.
Realizadas as eleições de 1990, foi chegando ao fim a gestão de
Antônio Carlos Valadares. Depois de passar o primeiro ano premido
por dificuldades financeiras, desfrutou de alguma folga por alguns
meses subsequentes, mas os problemas voltaram a acentuar-se até
que o governador, em janeiro de 1989, promoveu reforma no sentido
de diminuir despesas com a máquina administrativa e ampliar seu
controle político sobre o setor público. Extinguiu dez das 25 secreta-
rias de Estado, duas autarquias, duas empresas e uma fundação.34 A
expectativa do governo era de economizar um bilhão de cruzados por
mês com esse corte. Dos antigos secretários, 11 deles foram mantidos
e três foram transferidos para o segundo escalão.35 Ao tentar adquirir
mais autonomia, estreitou seu círculo de influência e não conseguiu
sustentar a independência esperada. É certo que, a curto prazo, tanto
o setor do PFL controlado por João Alves Filho, quanto os peemede-
bistas, nos quais duas facções disputavam poder,36 perdiam terreno,
provocando insatisfações na sua base de sustentação. Fortalecido,
João Alves Filho tratava seu aliado como um subalterno e continuou
demonstrando insatisfação em face das atenções dispensadas aos
seus amigos. Desconfortável no PFL37 e carente de apoio partidário,
Valadares foi-se contentando com pequenas realizações nos povoados
e municípios, tentando consolidar sua base política. Deu prioridade
às obras voltadas para o lazer: ginásios de esportes, incentivos à casa
de espetáculos artísticos. Em Aracaju, o Augustu’s, o forródromo
Gonzagão e o Parque dos Cajueiros são frutos dessa época. No último
ano de sua administração, conseguiu recuperar estradas, pavimentar

34
O Instituto de Estatística Social e Pesquisa de Sergipe, IESAP, teria sido transformado na
Fundação Estadual de Estatística e Geografia. Cf. Jornal de Sergipe, 08 e 09.01.1989.
35
Além das secretarias, a máquina do Estado persistiu com “10 autarquias, 10 sociedades de
economia mista, sete fundações e três empresas públicas ligadas à administração estadual.”
Jornal de Sergipe, 01.06.1990.
36
As facções que disputavam a hegemonia do PMDB eram comandadas por Antônio Carlos
Franco e José Carlos Teixeira.
37
Comentou-se que o governador teria pensado em sair do PFL. Ver Gazeta de Sergipe, 19.03.91.

280
História de sergipe: república

rodovias e recompor parte das perdas salariais dos servidores esta-


duais. Mas seu maior feito foi a construção de aproximadamente
25 mil casas populares. No meio rural, atuou respaldado no Projeto
Campo Verde empreendendo pequenas obras.38 Expandiu a eletrifi-
cação rural e levantou 20 estações rodoviárias, quase todas em sedes
municipais.39 O Polo Cloroquímico, pensado e projetado por governos
anteriores, teve inauguração simbólica pelo presidente Sarney, mas
pouco avançou e foi sendo considerado projeto inviável.
Na área da cultura, reformou o prédio da Academia Sergipana de
Letras, levantou barracões destinados a práticas culturais e promoveu
a publicação das obras completas de Tobias Barreto.40 Na educação,
em meio à degradação do ensino, inclusive com greves sucessivas,
informou haver construído 400 novas salas e recuperado outras
2.400. Apesar disso, a demanda reprimida era enorme, sobretudo no
segundo grau, num momento em que a arrecadação ampliava-se de
quatro para sete milhões de dólares.41
Na saúde, Valadares nomeou profissional que administrou mal os
recursos e tomou várias medidas nefastas ao sistema e à população
mais necessitada dos serviços hospitalares. Não obstante os alertas
de parlamentares, os protestos dos médicos e de outros profissionais
do setor e as diversas denúncias da imprensa, o chefe do Executivo
demorou demais em afastá-lo e ainda o transferiu para outra secre-
taria.42 Apesar disso, o governo apoiou a organização do Ministério
Público, de conformidade com as normas da Constituição de 1988. Mas
na área da segurança pública, a OAB, seção de Sergipe, revelou que, de
janeiro a novembro de 1990, cerca de 140 menores, incluindo crian-
ças e adolescentes, foram assassinados em Aracaju.43 Não obstante

38
Jornal da Cidade, 15.03.1991.
39
Cf. Jornal da Cidade, 15.03.1991.
40
Cf. Jornal da Cidade, 15.03.1991.
41
Cf. Jornal da Cidade, 15.03.1991.
42
Sobre a questão da saúde, ver Gazeta de Sergipe, 04.10.1989 e Jornal de Sergipe, 04.10.1989 e
Cinform, 18-24.03.1991. Marcelo da Silva Ribeiro. PT saudações (um depoimento para petistas
e não petistas). Aracaju: Sercore, 2003.
43
Jornal de Sergipe, 20 e 21.11.1990. Ver também Jornal do Brasil, 02.10.1990.

281
Ibarê Dantas

as denúncias por parte de políticos, de órgãos da sociedade civil e da


pressão da Anistia Internacional, ninguém foi responsabilizado e a
impunidade mais uma vez predominou.44
Governando num novo momento de crise, Valadares fez poucos
investimentos e transferiu para o seu sucessor a máquina pública
bastante desgastada.45 Contudo, apesar dos óbices e do pequeno relevo
de sua administração, legou ao seu substituto um Estado em melhores
condições do que encontrara. Diminuiu a dependência financeira
em relação ao governo federal46 e deixou a dívida externa na casa
dos dez milhões de dólares, com receita mensal de dezoito milhões,
consumindo cerca de 50% com a folha de pessoal.47 Ao fim, deixou o
caixa do Tesouro zerado e com saque a descoberto de cerca de 500
milhões de cruzeiros.48 Era uma despedida desgastante.

5.1.3 A Continuidade do PFL: João Alves filho (1991-1994)

O engenheiro João Alves Filho retornou ao governo legitimado


por votação consagradora e com experiências acumuladas. Formou
seu secretariado predominantemente com nomes de fiéis servidores
de administrações anteriores, incorporando pouca gente dos aliados.
Em seus propósitos anunciava o combate ao desemprego como a prio-
ridade número um. Nomeava a educação e a saúde como elementos
fundamentais, mas daria mais atenção à agricultura irrigada, ao
turismo e à habitação.49 Ou seja, projetos que apresentavam maior
visibilidade material.

44
Ver Jornal de Sergipe, 07.06.1990, 08.06.1990, 21.11.1990, 06.12.1990 e Jornal do Brasil, 02.12.1990.
45
Cf. diagnóstico de assessores de João Alves Filho. Governo do Estado de Sergipe, Plano
Plurianual, 1992-1995, v. I, administração João Alves Filho, p.23.
46
Cf. Governo do Estado de Sergipe. Plano Plurianual, 1992/1995, v. I, Administração João Alves
Filho, p. 12.
47
Cf. informações do governador Valadares ao Jornal do Brasil, 17.02.1991. O Censo promovido
pelo governo do Estado em 1989 revelou que o funcionalismo estadual era constituído de 45.099
servidores, dos quais 30.838 (66,26%) situados na capital e 16.411 (34,73%) no interior. Constatou-
se também que havia 4.387 funcionários de forma irregular. Cf. Jornal da Cidade, 14.07.1989.
48
Cf. Antônio Manuel de Carvalho Dantas, secretário da Fazenda de João Alves, in Jornal da
Manhã, 16-17.03.1991 e Cinform, 18-24.03.1991. Cf. João Alves Filho, Jornal da Manhã, 09.04.1991.
49
Ver João Alves Filho, Folha da Praia, 15-23.03.1991.

282
História de sergipe: república

Ao tomar posse em 15.03.1991, embora se revelasse sempre cheio de


planos, dessa vez esteve falando em austeridade, chegando a anunciar
que iria reduzir a máquina administrativa em quase 30%, extinguindo
710 cargos de confiança.50 Ao receber o Estado com o “cofre zerado”,
seu secretário da Fazenda deu grande publicidade ao fato, gerando
ressentimentos de Antônio Carlos Valadares que certamente esperava
mais discrição do novo governo. Em face desse episódio, os dois líde-
res políticos se afastavam politicamente. O ex-governante declarou
que João Alves traíra “sua confiança e o acordão”51 e, em outubro de
1991, deixou o PFL para ingressar no minúsculo PST (Partido Social
Trabalhista). Era o desfecho da herança transmitida ao sucessor.
Apesar de dificuldades do início, ao fim do ano a situação já era
bem diferente. “Além das transferências compulsórias de recursos
feitos a Sergipe – como aquelas do Fundo de Participação dos Estados
e Municípios – o governo federal alocou ao Estado, adicionalmente,
recursos da ordem de Cr$ 7,1 bilhões, no período entre janeiro e setem-
bro de 1991”. Investimentos esses que foram “destinados a melhorar a
infraestrutura e as condições sociais do âmbito do governo estadual
e dos municípios”.52
Do ponto de vista político, a situação do governador era relativa-
mente confortável. Dispunha de maioria nas bancadas do Senado, da
Câmara dos Deputados e da Assembleia Legislativa, mas, nesta última
Casa, não contava com apoio irrestrito para aprovar seus projetos.
Quando, em inícios de setembro de 1991, o Executivo encaminhou
emenda à Constituição ampliando as prerrogativas dos secretários de
governo, sua proposta foi rejeitada por 14 a 7 votos, constituindo-se
numa derrota expressiva.53
A essa altura, a questão eleitoral transcorria numa conjuntura
de dupla crise de caráter nacional. Na área econômica, vivíamos
atribulados por elevada inflação que fechava o ano com 1.157% den-

50
Jornal de Sergipe, 17-18.03.1991.
51
Gazeta de Sergipe, 11.09.1991.
52
Jornal de Sergipe, 25-26.12.1991.
53
Jornal de Sergipe, 05.09.1991.

283
Ibarê Dantas

tro de um quadro recessivo com PIB negativo (-0,80), resultando em


altos níveis de desemprego. Na área política, havia a campanha pelo
afastamento do presidente Collor.
Em Sergipe, depois da derrota fragorosa sofrida no pleito de
1990, os partidos de esquerda, além de tentarem ampliar o número
de diretórios municipais,54 buscaram estabelecer coalizões com o fim
de melhorar o desempenho eleitoral nos pleitos subsequentes. Nesse
sentido, acontecimento de alguma significação foi o pacto estabele-
cido entre o PDT de Jackson Barreto e uma ala do PT. O governador
lançou o nome do experimentado deputado estadual Reinaldo Moura
numa ampla coalizão intitulada “Aracaju o Futuro é Agora” (PFL +
PSDB + PMN + PL + PDS + PRP + PSD + PRN + PDC), envolvendo os
governistas de todas as faces, inclusive os Franco e seus seguidores. A
campanha transcorreu polarizada entre o governador e o candidato
Jackson Barreto, que terminou impondo forte revés ao postulante
governista e a todos seus aderentes.55
No plano nacional, o vice-presidente Itamar Franco assumiu a
titularidade do governo (02.10.1992) com o apoio cooperativo de várias
agremiações: PSDB + PFL + PMDB + PTB + PSB. Ampliou o número
de ministros de 11 para 18 e compôs o Ministério com membros de
vários partidos, mas se cercou de alguns assessores amigos de sua Juiz
de Fora. Apesar disso, o novo presidente inclinou-se um tanto para a
esquerda, mas ampliou a influência militar na sua administração, e
governou apoiando-se na caserna.56
No Congresso Nacional, a ação dos partidos passou a ser orien-
tada pelas perspectivas eleitorais de 1994, apesar de faltarem ainda
dois anos para a nova eleição presidencial. Um exemplo ilustrativo
ocorreu com o plebiscito sobre a forma de governo que levou alguns

54
Em novembro de 1991, o PT contava com 30, o PC do B com 20, o PSB com 30 e o PDT já tinha
55 e alimentava pretensões de fechar os 75 em julho de 1992. Cf. O Que, 23-29.11.1991.
55
Ver José Ibarê Costa Dantas. Eleições em Sergipe –1985/2000. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,
2002.
56
Itamar chegou a ter nove ministros militares, superando os sete dos tempos do governo
Sarney. Ver Jorge Zaverucha. Frágil Democracia. Collor, Itamar, FHC e os Militares 1990-98.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000, p. 305.

284
História de sergipe: república

chefes partidários a mudarem de posição diante da perspectiva de


serem eleitos. Por outro lado, a revisão constitucional que deveria
corrigir os excessos populistas dos constituintes de 1988 e adequar
as leis à nova realidade mundial, foi inviabilizada pelos partidos de
esquerda com o estímulo de setores organizados da sociedade civil,
inclusive OAB, UNE e CNBB. O único ponto aprovado foi a redução
do mandato do presidente da República de cinco para quatro anos. O
processo de modernização das instituições encontrava dificuldades
para ampliar-se.
Por esse tempo, o Congresso ainda mais se debilitava com denún-
cias de corrupção, especialmente contra o grupo responsável pelo
orçamento. Foi instaurada CPI mista e, ao fim, foi proposta a punição
de 18 dos seus integrantes, mas apenas cinco parlamentares foram
cassados. Enquanto isso, o governo Itamar Franco transcorria insegu-
ro, mudando de ministros com frequência e relacionando-se mal com
deputados e governadores sobretudo do PMDB, contribuindo para
agravar o quadro. A inflação atingiu o patamar de 1.157% em 1992 e
continuava aumentando. As contas públicas pioravam. Como fórmula
de ir aliviando os compromissos do Estado intervencionista, o governo
fez importantes privatizações, inclusive da Companhia Siderúrgica
Nacional, em meio à comoção dos nacionalistas estatistas e/ou sin-
dicalistas. Mas eram passos insuficientes para resolver a questão dos
gastos públicos que estendia seus efeitos em vários campos, inclusive
na política monetária em descontrole, com as autoridades se restrin-
gindo praticamente a arbitrar taxas de juros. A administração como
um todo também carecia de controle, na medida em que o governo
se revelava incapaz de combater a corrupção, conforme parecer do
Tribunal de Contas de União.57
Em Sergipe, João Alves Filho movimentava-se num quadro mais
diversificado e favorável. Apesar dos constrangimentos por ocasião do
afastamento de Collor (outubro de 1992), no Nordeste mantinha boa

57
Cf. O Estado de São Paulo, 18.04.1993.

285
Ibarê Dantas

convivência com vários correligionários governistas. Internamente


também as condições eram bem melhores. Nenhum dos principais
grupos políticos do Estado lhe fazia oposição. Os Franco, que antes
passaram de aliados a adversários, desta vez evitaram hostilizá-lo.
Na Assembleia poucos deputados questionavam seus projetos e suas
realizações.58 Gozando de maioria, o papel fiscalizador do Legislativo
sergipano foi bastante reduzido. No Ministério Público, embora os
promotores de modo geral viessem atuando com certa vigilância, a
relação do procurador-geral com o governo e de boa parte dos demais
procuradores amorteceu a atuação do órgão, sobretudo quando,
atendendo pleitos políticos, deixava de recorrer ao Superior Tribunal
de Justiça. No que concerne ao Tribunal de Contas, o controle que o
governador exercia ainda era maior. Quando um ou outro membro
se manifestava contra a aprovação de suas contas, como ocorreu em
1993, logo o problema seria contornado pela maioria esmagadora.59
Quanto ao Tribunal de Justiça, quase sempre atuou como aliado do
Executivo, parecendo até um órgão governista, de caráter político. O
fato é que o governador pôde administrar com tranquilidade, trans-
pondo obstáculos sem grandes dificuldades. Sua situação não era
mais confortável porque em Aracaju o eleitorado não vinha sendo-lhe
muito favorável. Concorreram também para turvar sua imagem as
denúncias incômodas sobre corrupção, fato que o levou a depor em
CPI no Congresso Nacional.
No campo administrativo, dedicou-se a preparar a infraestrutura
da capital para o turismo e apostou na irrigação como uma alternativa
de desenvolvimento. Empenhou-se notadamente na modernização
do Aeroporto, inclusive ampliando a pista de pouso e decolagem e
reconstruiu a Orla da praia da Atalaia, tornando-a bela e grandiosa.
Encaminhou as obras do oneroso Centro de Convenções, adquiriu
catamarãs, lançou o trem turístico, “um moderno comboio com ar

58
O mais combativo foi o deputado Bosco Mendonça.
59
Em 1993 o conselheiro Tertuliano Azevedo emitiu parecer contrário à aprovação das contas
do governo João Alves Filho relativas ao ano de 1992, alegando várias irregularidades. Mas
a maioria aprovou-as. Ver O Estado de Sergipe, 16 a 22.08.1993.

286
História de sergipe: república

condicionado”, e implantou a Rua 24 horas, inspirado no exemplo


de Curitiba. Entre as pequenas obras, foi atento à ampliação do for-
necimento de energia, reformou vários centros de cultura (Arquivo
Público, Academia Sergipana de Letras, Instituto Histórico e Geográ-
fico de Sergipe, Conservatório de Música) e estimulou manifestações
culturais.
Essas iniciativas foram, em geral, bem recebidas. Mas outras
foram criticadas, entre as quais a forma de encaminhar o projeto de
irrigação do Platô de Neópolis. Situado a uma altura superior a 100
metros do leito do Rio São Francisco, envolvendo uma área de 7.200
hectares, voltado para a produção de fruticultura de exportação e
agroindústria, o empreendimento foi-se revelando controvertido. O
clima, o custo energético da irrigação e a escolha dos parceiros foram
algumas das questões levantadas pelos seus opositores. Muito mais
problemática foi a aposta no Polo Cloroquímico onde investiu cerca
de 20 milhões na infraestrutura do projeto60 quando as perspectivas
de viabilização se tornavam remotas.
Na questão da água, cuidou do abastecimento de algumas cidades
do interior do Estado e assegurou que “Aracaju, a partir de 1994, era
a capital brasileira melhor abastecida de água”. Dois anos depois, a
capital voltou a sofrer sérias restrições do precioso líquido. Realizou
ações eficazes de desfavelamento na capital e, na área da saúde, refor-
mou vários centros, ampliou o número de leitos, mas, a exemplo da
primeira administração, fez da secretaria instrumento de clientelismo
eleitoral. Situação semelhante ocorreria com a educação. Reformou
prédios, aumentou o conjunto das matrículas, mas entregou a direção
da pasta a políticos ou a técnicos pouco credenciados para a área.
A exemplo da gestão anterior, afirmou-se como tocador de obras
materiais, preocupado com a estrutura física, mas faltaram ações
institucionais que indicassem crença na importância da educação
como afirmação da cidadania. Na área administrativa, deixou de fazer

60
Cf. Projeto Capital, Principais ações do Governo de Sergipe na Capital. Aracaju, 1994.

287
Ibarê Dantas

a reforma prometida no seu Plano Plurianual de Governo, contribuiu


para acentuar a desarticulação entre as pastas e legou ao seu sucessor
um quadro aquém do esperado.61 Na segurança, os índices não foram
animadores. Em pesquisa sobre a média de mortes violentas entre
1990 e 1993, Sergipe figurou no 11º lugar62 no conjunto dos Estados
da federação, ao tempo em que medrava “A Missão”, grupo criado
dentro da Polícia Militar para exterminar o roubo de gado, mas que
teria cometido “bárbaros crimes”, segundo denúncia da imprensa.63
A exemplo do primeiro mandato, João Alves Filho deixou o Estado
bastante endividado e com alguns órgãos em crise. O Instituto de
Previdência (IPES) estava em situação financeira insustentável após
sofrer abusos e redução da contribuição pública. O Banco do Estado
de Sergipe (BANESE) encontrava-se desestruturado e com enormes
dificuldades após sua administração mais desastrosa. O chefe do
Executivo emitiu letras financeiras para serem honradas pelo futuro
governador e entregou o tesouro estadual comprometido com alto
percentual da receita para pagamento de pessoal.64
Apesar dessas deficiências e de suas apostas voluntariosas em
custosas obras, algumas das quais aparentemente de escassa utilidade,
persistiu como um administrador interessado em abrir perspectivas
para o crescimento do Estado, num momento em que a produção
extrativa de petróleo diminuía e os setores produtivos declinavam,
como indica a queda sucessiva do PIB estadual nos três primeiros
anos do seu governo.
No plano nacional, o presidente Itamar Franco prosseguiu crian-
do insegurança, com rompantes populistas, falando em renunciar

61
Ver declarações do então secretário de Educação in Cinform, 7 a 13.08.1995, p.7.
62
Sergipe ficou com 22,32 mortes violentas por cada 10 mil habitantes, segundo pesquisa do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgada pela Folha de S. Paulo, 19.02.1997
e Jornal da Cidade 22.02.1997, p.B-15.
63
Cinform, 12 a 18.06.2000.
64
Segundo revelação do deputado Augusto Bezerra, líder do PMDB, na tribuna da Assembleia,
a administração João Alves Filho, entre 1990 e 1994, contraiu empréstimos em valores
correspondentes a R$ 283.542.000,00. Gazeta de Sergipe, 23.02.2000. O total dos empréstimos
dos dois mandatos (1983-87 e 1991-95) teria sido de R$ 589.100.000,00. Cf. Jornal da Cidade,
23.02.2000, p.A-3.

288
História de sergipe: república

para antecipar eleições e demonstrando limitada compreensão do


funcionamento da economia.65 Em menos de nove meses, três mi-
nistros foram substituídos na Fazenda. O quarto titular foi Fernando
Henrique Cardoso, que atraiu um grupo de técnicos competentes e
passou a buscar alternativas. Renegociou a dívida externa, conseguiu
a aprovação do Fundo Social de Emergência mediante a promessa de
renegociação da dívida de alguns bancos estaduais e, em dezembro
de 1993, anunciou a existência de novo plano de combate à inflação.
Apesar das incertezas, a implementação do Real foi obtendo sucesso e,
ao final de 1994, o desempenho da economia já dava sinais de alento.
Por esse tempo, a dívida externa continuava elevada, a inflação de-
clinava, o PIB crescia e até o desemprego aberto diminuía um pouco.
Diante desse quadro, a candidatura de Cardoso tornou-se irreversí-
vel, levando ao seu afastamento do Ministério em julho de 1994. Era
substituído por Rubens Recúpero que, em setembro de 1994, deixava
o cargo para ser ocupado por Ciro Gomes. Ao final de seu governo,
Itamar Franco elegia seu sucessor e terminava o mandato como um
presidente bem-sucedido.
Em Sergipe, a eleição para governador ameaçou quebrar o con-
trole dos grupos que, de muito, vinham dominando o Estado. Jackson
Barreto, ainda na Prefeitura, passou a liderar um bloco oposicionista:
através do estabelecimento de alianças com fortes lideranças do
interior do Estado, formou uma frente partidária PDT + PT + PMN
+ PP + PC do B, e concorreu contra Albano Franco apoiado pela co-
alizão PPR + PMDB + PFL + PSDB sob o slogan Sergipe tem Futuro.
No primeiro turno Jackson Barreto venceu, mas, diante da operação
avassaladora dos grupos dominantes, envolvendo a participação de
instituições públicas, foi derrotado no segundo escrutínio. No plano
nacional Fernando Henrique Cardoso era eleito no primeiro turno
com a contribuição inclusive do eleitorado de Sergipe, que lhe deu a
maioria dos votos, apesar da derrota na capital.

65
Seu pedido para que o fusquinha voltasse a ser fabricado e suas reações contra a alta de
juros são ilustrativos de sua postura bisonha.

289
Ibarê Dantas

Não obstante a vitória de Albano Franco para governador, os


oposicionistas ganharam as duas vagas no Senado e elegeram três
dos oito representantes na Câmara dos Deputados. Foi um feito sem
precedente depois de 1964. Apenas na Assembleia a presença dos
oposicionistas continuou pequena.

5.1.4 O Domínio do PSDB: Albano Franco (1995-2000)

Albano Pimentel do Prado Franco tomou posse como governador


do Estado de Sergipe no dia 1º de janeiro de 1995, respaldado pelo voto
popular, após vitória particularmente difícil. Não obstante haver
explorado, durante a campanha, seu rico currículo de empresário
atuante e sua vivência de político situacionista, perdeu no primeiro
escrutínio. Ameaçado da derrota final, apegou-se a todas as forças
governistas e saiu vitorioso no segundo turno amarrado por nume-
rosos compromissos.
Sua gestão ocorreu no mesmo período da Presidência de Fernando
Henrique Cardoso, que retomou as reformas liberalizantes, inicia-
das por Fernando Collor, e assumiu o governo com duas propostas
explícitas: consolidar a estabilidade monetária e mudar o padrão de
acumulação proveniente da era Vargas,66 ou seja, reduzir o papel do
Estado no processo de industrialização e no controle dos meios de
produção.67
Num momento de expansão do processo de globalização, sob
a predominância do capital financeiro fomentando o aumento da
competitividade, Cardoso seguiu uma orientação liberalizante, pro-
pondo reformas voltadas para o mercado, sob o influxo de ideias do
Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Numa
economia de baixa poupança interna, o governo empenhou-se em

66
Ver Brasilio Sallum Jr. O Brasil sob Cardoso: neoliberalismo e desenvolvimentismo in Tempo
Social Revista de Sociologia da USP, v. 11, n. 2, 1999, ed. 02-2000, p.41.
67
Sobre a administração do presidente Fernando Henrique Cardoso, ver Bolívar Lamounier,
Rubens Figueiredo (orgs.). FHC: A Era FHC, um balanço. São Paulo: Cultura Editores
Associados, 2002.

290
História de sergipe: república

atrair capital externo e o equilíbrio das contas públicas. Mas a aber-


tura comercial e a valorização do real, consideradas necessárias para
o controle inflacionário, trouxeram dificuldades ao setor produtivo
e déficits recorrentes nas contas públicas, além de outros custos.
Alguns bancos entraram em crise e sofreram intervenções custosas.
Tentando completar sua obra modernizadora, o presidente conse-
guiu aprovar a emenda da reeleição que lhe facultou novo mandato.
Entretanto, maiores dificuldades se estabeleceram. Diante das crises
externas “Tigres Asiáticos” (2º semestre de 1997), Japão e Rússia (2o
semestre de 1998), os capitais migraram, a especulação acentuou-se
e o governo mudou o regime cambial, recorreu ao FMI (1999 e 2002)
e elevou enormemente os juros, aumentando a dívida pública. Tais
medidas comprometeram o desempenho do PIB que persistiu baixo.
As restrições nos investimentos afetaram a expansão da geração
de energia e dificultou o atendimento às demandas sociais. Apesar
disso, o governo ampliou muito o número de assentamentos através
do INCRA e implementou algumas políticas compensatórias, mas os
salários dos trabalhadores de empresas públicas careceram de rea-
justes, o desemprego aumentou, a distribuição de renda continuou
ruim. Milhões de pessoas continuaram morando mal e a insegurança
agravou-se. Diante da estabilidade monetária, surgiram precatórios
jamais honrados, correções de planos passados, dívidas nunca pagas,
pendências judiciais, todos esperando compensações do Estado por
erros em geral antigos.
Apesar desses óbices, houve significativo impulso modernizador.
A agricultura e a indústria se tornaram mais competitivas, as priva-
tizações, embora nem sempre lícitas, enfraqueceram as corporações,
amenizaram o peso da máquina pública e tornaram mais eficientes
várias empresas. Na telefonia acabou com a demanda reprimida,
mas a carência de energia complicou o quadro. A extinção de órgãos
assistencialistas, como a Legião Brasileira de Assistência, e novas
exigências para liberação de verbas atingiram quistos clientelistas
bastante arraigados. A eliminação de subsídios em determinadas áre-
as desgostaram grupos privados habituados a privilégios. A abertura

291
Ibarê Dantas

comercial barateou os alimentos e diminuiu o preço das propriedades


rurais. Seguindo essa tendência, o governo construiu portos e abateu
custos operacionais. Reduziu o papel do Estado, quebrando monopó-
lios e criou as agências reguladoras, visando ao controle de empresas
concessionárias do serviço público. Na educação, deslocou a ênfase
do nível universitário para o ensino básico e tentou tornar os gastos
mais eficientes criando o Fundo Escola68 e o FUNDEF.69 O sistema de
saúde sofreu grande aperfeiçoamento. A Lei de Responsabilidade
Fiscal estabeleceu compromissos das autoridades em todos os níveis
e poderes, disciplinando o uso do dinheiro público. Na ação diplomá-
tica, elevou o prestígio do país no concerto das nações.
Enfim, manteve a estabilidade monetária, empenhou-se pelo
ajuste fiscal e imprimiu maior racionalidade ao funcionamento da
máquina pública. Quase todos os indicadores sociais melhoraram
(diminuição da mortalidade infantil e do analfabetismo, aumento
da longevidade, dentre outros), mas penalizou os setores mais or-
ganizados que se beneficiavam do modelo varguista do nacional-
-desenvolvimentismo e prejudicou os contribuintes com a elevação
da carga tributária. O descontentamento desses grupos, o grande
crescimento da dívida interna e a campanha oposicionista contra as
reformas contribuíram para que o eleitorado optasse pela eleição de
Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, em meio a elevadas esperanças de
grandes mudanças do modelo vigente, considerado neoliberal.
Em Sergipe, transcorria a gestão de Albano Franco (1995-2002).
Confiante no seu estilo de homem afável, conciliador, flexível, atu-
ando sempre na defensiva, montou seu secretariado70 atendendo, na

68
Fundo Escola consiste na remessa de recursos diretamente para conselhos das escolas, sem
a intermediação dos governadores e/ou prefeitos.
69
“A distribuição dos recursos estaduais e municipais é feita tomando como critério o aluno.
Obriga governadores e prefeitos a aplicar 25% de suas receitas em educação: 15% para o
ensino fundamental, 60% para salários e o restante para investimentos e manutenção. Por
enquanto, são destinados R$ 315,00 por aluno/ano. Quando não atinge esse teto, a União
completa”. Paulo Renato Souza, O Fundef e a fiscalização dos recursos do ensino. Folha de
S. Paulo, 20.06.1999.
70
Sobre o secretariado de Albano Franco indicado em 1995, ver Jornal da Cidade, 31.12.1994 e
06.07.1995.

292
História de sergipe: república

medida do possível, às demandas de seus aliados. Como o número de


pastas revelou-se pequeno para honrar todas as promessas eleitorais,
foi contemporizando, criando novas secretarias de forma improvi-
sada, além de admitir centenas de pessoas na Casa Civil, através do
uso de cargos em comissão, como sinecuras, próprias da estrutura
clientelista.71
Ao começar seu mandato, o novo governo deparou-se com um
quadro financeiro preocupante. Em janeiro de 1995, com o aumento
de 45% prometido ao funcionalismo durante a campanha eleitoral,
o Estado ficou com 94% da receita líquida destinados às despesas
de pessoal e ao pagamento da dívida, ficando os insuficientes 6%
restantes para o “custeio da máquina administrativa e [demais]
compromissos”.72 Diante desse quadro, o governo passou os primeiros
três anos semiparalisado, administrando cobranças dos correligioná-
rios e dos grupos organizados, exercitando a leniência e o escapismo.
Na busca de alternativas, ofereceu o Plano de Demissões Voluntárias
(PDV), financiado pela Caixa Econômica e terceirizou alguns serviços.
A situação melhorou muito quando a dívida total de R$ 389 milhões
foi renegociada com a União que refinanciou, “para 30 anos a juros
de 6% ao ano, o montante de R$ 355 milhões”.73
Quando o Estado se encontrava no limite do seu endividamento,
com o Banese ameaçado de intervenção pelo Banco Central, e com os
recursos fiscais limitados por normas de âmbito federal, o governo Al-
bano Franco, contrariando suas promessas eleitorais, decidiu vender
a Energipe, fato que se concretizou em início de dezembro de 1997, à

71
Levantamento efetuado pelo Tribunal de Contas teria constatado que somente na
Governadoria existiam 728 (setecentos e vinte oito) cargos em comissão, segundo o
conselheiro Tertuliano Azevedo. Cf. Jornal da Cidade, 05.05.1996 e Cinform, 13 a 19.05.1996.
72
Albano Franco. Um Projeto para Sergipe. In: José Fernandes de Lima e Afonso Nascimento (orgs.)
Fórum Pensar Sergipe. São Cristóvão/SE: UFS, 1999, p. 118 e Gazeta de Sergipe, 27.05.1999.
73
“A diferença de R$ 34 milhões foi ganha pelo Estado, a título de subsídio, em razão do
Protocolo de Acordo assinado com a União em setembro de 1996 que previa a correção
da dívida mobiliária pelo IGP-DI em substituição a atualização que estava sendo feita
praticamente a juros de mercado”. Albano Franco, palestra citada, proferida em 28.05.1999,
Aracaju, 1999, p. 6.

293
Ibarê Dantas

Cataguazes-Leopoldina por R$ 577.101.775,00, com ágio de 96,05%.74


Com os recursos, liquidou o débito com o BNDES, proveniente do
saneamento daquela empresa, e dispôs de amplo raio de ação para
investir e/ou distribuir entre prefeitos no ano da campanha eleitoral.
Até então, nenhum governador de Sergipe havia desfrutado de tantos
recursos para investimentos. Apesar disso, algumas dificuldades per-
sistiram. A promessa da campanha (1994) de “criação anual de cerca
de 30 mil empregos”,75 não se confirmou. Os incentivos concedidos
a várias empresas não tiveram o retorno esperado na absorção de
mão de obra. O PIB estadual (1995-2000) subiu em relação ao tempo
do governo anterior, mas ainda se mostrava acanhado. Todavia, com
recursos do Prodetur melhorou as condições sanitárias da Atalaia e
duplicou a rodovia dos Náufragos. Concluiu a Linha Verde, ampliou
adutoras e realizou outras obras em parceria com a Prefeitura da
capital, entre as quais a construção de um novo mercado e restaura-
ção do velho.
Na educação, reduziu o número de diretores e secretários das
escolas e expandiu o segundo grau, abrangendo todos os municípios.
Implementou o Programa de Qualificação Docente (PQD) em parceria
com a UFS, elevando o nível dos professores do interior. Aumentou as
matrículas, construiu novas escolas76 e diminuiu o índice de reprova-
ção.77 Mas, diante das denúncias contra seu secretário da educação,
sobre a forma como gastava os recursos públicos e ampliava o Partido
Popular Socialista (PPS), ex-PCB, incomodando os correligionários do
chefe do Executivo, este o substituiu.78

74
Gilvan Manoel in Jornal da Cidade, 04.12.1997. Sobre o valor liberado para cada município às
vésperas do período eleitoral, ou seja, em julho de 1998, ver Jornal da Manhã, 26 e 27.07.1998.
75
Sergipe Tem Futuro. Programa de Governo Albano Franco, Ética e Desenvolvimento, p. 9.
76
“A matrícula nas escolas públicas teria passado de 233 mil (1994) para 292 mil alunos (1998), a
quantidade de salas de aula teria aumentado 12% e o número de escolas disponíveis em 17%.”
Albano Franco. Um Projeto para Sergipe in José Fernandes de Lima e Afonso Nascimento
(orgs.) Fórum Pensar Sergipe. São Cristóvão/SE: UFS, 1999, p. 122.
77
Segundo censo realizado pelo MEC, o Estado deixou de apresentar a maior taxa de reprovação
do país, de 29,9%. Cf. Jornal da Cidade, 14.07.1997. Mas o fez reduzindo a média mínima de
aprovação de 5,0 para 4,1.
78
O governo Albano Franco, na época (09.1999), substituiu três secretários: Segurança, Fazenda
e Educação.

294
História de sergipe: república

Na área de saúde, diante da demanda crescente, ampliou hospitais


na capital, mas não evitou o fechamento de casas de saúde no inte-
rior.79 A situação foi sendo minorada pelas ações do governo federal.
No setor rural, a citricultura na região sul do Estado declinou
com as secas, as pragas e os baixos preços do suco de laranja. Mas o
governo atuou no Platô de Neópolis, afastando desinteressados e/ou
especuladores, expandiu a eletrificação rural e concluiu as obras do
Jacarecica II em Itabaiana. Exercitou a tolerância com o Movimento
Sem Terra (MST) em face de invasões e saques, e destinou-lhe área
irrigável (Jacaré-Curituba) estimada em 3.200 hectares.80 Pelos diver-
sos municípios, dados oficiais falavam da construção de cerca de 10
mil casas populares e investimentos para melhorar o fornecimento
de água, sobretudo na capital.
Na esfera política, gozou de maioria na Assembleia Legislativa e
conseguiu aprovar suas proposições. Mas, na Câmara dos Deputados,
dos oito parlamentares de Sergipe, raros eram aqueles que lhe de-
monstravam lealdade, apoiando as reformas de iniciativa da Presidên-
cia da República. Enquanto membros do PFL nacional revelavam-se
leais e aprovavam as proposições do Executivo federal, em Sergipe
João Alves Filho (PFL) manifestava-se contra as mudanças, ao tempo
em que criava dificuldades para o governador com suas exigências. As
pressões amenizaram-se após o pleito de 1996 quando o grupo Alves
afastou-se de Albano Franco queixoso pela falta de empenho gover-
nista à candidata Maria do Carmo Alves na campanha para Prefeitura
da capital. Liberto dessa aliança, o governador negociou com seu mais
tradicional adversário, Jackson Barreto, que se candidatou a senador.81
Com esse apoio, Albano Franco concorreu à reeleição no pleito de 1998

79
O número de hospitais públicos reduziu-se de 46 (1990) para nove em 1997. Enquanto isso, os
particulares cresciam de 34 para 42, conforme informações do deputado Bosco Mendonça,
reproduzindo dados do Anuário Estatístico da Fundação Nacional de Saúde. Jornal da Cidade
07-08.12.1997, p. A-3.
80
Albano Franco. Um Projeto para Sergipe. In: José Fernandes de Lima e Afonso Nascimento
(orgs.) Fórum Pensar Sergipe. São Cristóvão/SE: UFS, 1999, p. 122.
81
Sobre a negociação para o acordo dos Franco com Jackson Barreto, ver Kátia Santana. Ecos
da Política. Aracaju: Instituto Desenvolver, 2001, p. 44-60.

295
Ibarê Dantas

e enfrentou dois ex-governadores e ex-correligionários (João Alves


e Valadares), entre outros postulantes. Ao fim, foi para o segundo
turno com Alves e derrotou-o. Ademais, fez maioria na Assembleia,
elegeu o maior número de prefeitos e prosseguiu gozando de ampla
influência junto aos tribunais estaduais e à cúpula do Ministério
Público. Enquanto assistia à derrota de Jackson Barreto para Maria
do Carmo Alves na eleição para o Senado, testemunhava a vitória de
dois jovens sobrinhos, um para a Câmara dos Deputados e outro para
a Assembleia Legislativa. Era a influência política da família Franco
que prosseguia através de uma nova geração, proporcionando-lhe
continuidade rara na História de Sergipe.
Ocorrência negativa para Sergipe foi a transferência, a partir de
1995, de alguns órgãos de empresas estatais de Aracaju para Salvador:
Superintendência do Patrimônio da União (SPU), do Almoxarifado
da Petrobras, do Cesec do Banco do Brasil e da Superintendência do
INSS. Com a extinção da Telergipe, que foi incorporada à Telemar,
esta empresa passou a administrar os serviços de telefonia fixa fora
do Estado, gerando problemas e irritação por parte dos sergipanos.
Essas medidas da política modernizante do governo federal, além de
prejudicarem a economia do Sergipe, afetavam a autoestima dos seus
habitantes que viam renovar a dependência em relação à Bahia. En-
fim, o governo Albano Franco dispôs de muitos recursos, melhorou as
finanças do Estado, mas, carente de autoridade, exerceu uma política
patrimonialista, marcada de ajeitamentos nem sempre compatíveis
como o bem público.82
Entretanto, no plano nacional houve avanços políticos signifi-
cativos no período 1983-2000. O exercício do voto generalizou-se,
incorporando os analfabetos e os maiores de 16 anos. O eleitorado
aumentou em proporção maior do que o crescimento da população e
realizaram-se dez eleições sem solução de continuidade em ambiente

82
No governo de Albano Franco, houve várias denúncias por parte da imprensa local e nacional,
OAB, setores da Igreja Católica, Procuradoria Federal, decorrentes de suas práticas eleitorais,
inclusive compras superfaturadas, obras inacabadas, pagamento controvertido à Construtura
Celi. Ver Gazeta de Sergipe, 01.12.98; Jornal da Cidade, 16.09.1999; Cinform, 3 a 9.05.1999.

296
História de sergipe: república

de ampla liberdade de manifestação de pensamento e organização. O


jogo político em quase todos os setores tornou-se aberto e competitivo.
O quadro partidário, apesar de fracionado, foi adquirindo perfil mais
definido, com a predominância de determinadas siglas, acatando
as mudanças e legitimando o processo político. Diversas correntes
ideológicas travaram suas pugnas em ambiente de liberdade sem os
constrangimentos de outrora. Esses acontecimentos estenderam-se
por Sergipe. A sociedade civil apresentou-se mais plural e atuante.
O quadro dos eleitos para diversos cargos públicos se revelou mais
diversificado. No Senado e na Câmara, representantes de Sergipe
dignificaram seus mandatos com elevado brilhantismo e persistente
combatividade, proporcionando júbilo aos sergipanos.
Mas, em outros campos, as mudanças se tornaram mais difíceis.
Os oposicionistas demonstraram incapacidade em juntar-se e montar
um bloco alternativo para conquistar hegemonia. Apenas consegui-
ram dois feitos: o controle da Prefeitura de Aracaju a partir de 1985
e a construção de uma coalizão em 1994 que provocou renovação no
quadro de nossa representação federal. O Executivo estadual con-
tinuou controlado por grupos conservadores, boa parte dos quais
originários da ARENA, não havendo, portanto, alternância de poder.
Depois de uma pequena fase do PDS, dois partidos se revezaram: o PFL,
que governou de 1985-94, e o PSDB, que assumiu em 1995 e chegou ao
fim do século com mais dois anos de mandato pela frente. O PFL foi
o partido predominante: além de governar o Estado por mais tempo,
elegeu maior número de senadores, deputados federais, deputados
estaduais, prefeitos e vereadores.83 Dentro desse domínio, a estrutura
clientelista pouco foi afetada. Apesar de professarem o liberalismo,
ampliaram o corpo do funcionalismo de forma exagerada, sem pre-
ocupação com o mérito dos indivíduos, gerando ociosidade e baixa
produtividade. Com máquina enorme, os recursos para investimento
se tornaram exíguos, mesmo depois da estabilidade monetária.

83
Mais dados sobre o processo eleitoral do período, ver José Ibarê Costa Dantas. Eleições em
Sergipe – 1985/2000. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002.

297
Ibarê Dantas

O sistema coercitivo cresceu e ganhou maior importância, mas


sua eficácia não acompanhou a elevação dos seus custos. O Tribunal
de Contas, criado para coibir abusos dos administradores públicos,
tornou-se muito dispendioso e sua atuação técnica teria sido desviada
para ações políticas, gerando insatisfações. Não foi por acaso que sua
extinção vinha sendo defendida até por parlamentares situacionistas.
O Judiciário criou os Juizados Especiais, a grande inovação do
século, facilitando o acesso dos grupos de menor recurso. Mas os
elementos influentes na política e/ou na economia, envolvidos em
grandes causas, em geral continuaram com tratamento diferenciado.
Em Sergipe, o referido setor melhorou bastante sua infraestrutura.
Construiu palácios e fóruns em comarcas acima dos padrões da so-
ciedade e informatizou-se. Os magistrados ganharam prerrogativas
com a Constituição de 1988, maior autonomia e os seus salários ocu-
param o topo dos servidores públicos, mas o desempenho continuou
alvo de reclamações. Sem controle externo, o nepotismo ampliou-se
como nunca84 e a lentidão persistiu. Carente de impessoalidade em
várias decisões, sua contribuição para o avanço da democracia ficou
aquém do esperado.85
O Ministério Público, redefinido pela Constituição de 1988 como
um poder específico, estruturou-se e contribuiu muito para as con-
quistas da cidadania. Mas além da crise interna nos anos noventa,
que o desgastou, a atuação de determinados procuradores da capital
nem sempre foi exemplar. Alguns se revelaram pouco empenhados
em debilitar o clima de impunidade quando envolviam interesses de
setores influentes. Houve casos em que chegavam “a advogar contra
os interesses do próprio Estado”.86 Enquanto isso, as denúncias da
Procuradoria Federal contra autoridades constituídas geralmente
eram arquivadas pelos tribunais superiores. Por coincidência, os

84
Cf. Cinform, 29.11 a 05.12.1999, 12 a 18.04. 1999, 14 a 20.06.1999.
85
Sobre os procedimentos dos magistrados, ver Diógenes Brayner in Gazeta de Sergipe,
02.08.2003 e Cinform, 10 a 16.05.1999.
86
Sobre o assunto, ver Fausto Leite na coluna Data Vênia in Jornal da Cidade, 05.12.2003 e
Cinform, 22 a 28.12.2003.

298
História de sergipe: república

processos contra os ex-governadores Albano Franco e João Alves87


tiveram o mesmo destino, o arquivamento pelo Superior Tribunal de
Justiça. O Estado de Direito careceu de maior abrangência.
Com os órgãos superiores tolerantes com os setores dominantes
e o Executivo com excesso de atribuições, o Estado tornou-se mais
impotente diante das demandas sociais. A criminalidade aumentou e
a força policial, embora crescida e mais aparelhada,88 tornou-se mais
problemática. A impunidade cresceu alimentada pelo rito processual
cada vez mais complexo e tolerante com os profissionais do crime.
Como se isso não bastasse, as prisões se deterioraram e as fugas dos
presos atingiram índices alarmantes no período 1995-2000.89 Acom-
panhando o quadro nacional, a segurança dos cidadãos degradou-se
consideravelmente.
Contudo, o processo político democrático costuma trazer mu-
danças e suscitar esperanças. A vitória do PT no pleito municipal no
primeiro turno em Aracaju, no ano 2000, significou a ascensão de um
novo grupo político a assumir responsabilidades administrativas com
tendências de renovação das práticas políticas. Mas o triunfo de João
Alves Filho, em 2002 para governador, estabeleceu um contraponto
com possibilidades de muitos desdobramentos.

87
Cf. Cinform, 07 a 13. 08.2000, Gazeta de Sergipe, 08.08.2000 e Folha de S. Paulo, 08.08.2000.
88
Segundo reportagem de semanário local, toda a complexa estrutura da Segurança Pública,
composta pela Polícia Civil, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Hospital da Polícia Militar,
Instituto de Criminalística, Instituto de Identificação e Instituto Médico Legal recebia
mensalmente pouco mais de R$ 4,9 milhões. Desse montante, R$ 4,5 milhões eram destinados
a pessoal e os R$ 400 mil restantes para custeio e investimento de toda a SSP. A Polícia Militar,
que tinha mais de 4.600 homens, recebia mensalmente R$ 120 mil. Enquanto isso, a Casa
Civil recebia para custeio R$ 800 mil. Aliás, enquanto a Secretaria de Segurança Pública
recebia 4,7% do orçamento do Estado, a Casa Civil consumia 16% desse bolo, cf. Cinform
14-20.04.1997.
89
Durante a gestão do secretário de Segurança Jugurta Barreto teriam havido 573 fugas. Cf.
Diógenes Brayner in Gazeta de Sergipe, 18.11.2003.

299
Ibarê Dantas

5.2 O Processo Econômico-social

As políticas econômicas dos governos militares contribuíram para


diminuir os desequilíbrios inter-regionais, mas legaram aos civis o
Estado nacional-desenvolvimentista com fortes sinais de exaustão. O
modelo nacionalista, industrializante, corporativista e relativamente
autárquico terminou em crise. O crescimento da dívida externa pas-
sou a exigir a geração de altos superávits comerciais, alimentando
a dívida interna, resultando em déficit público e pressionando a
inflação.
Recorde-se que, ainda na gestão do presidente Figueiredo, as
dificuldades da União ampliaram-se com a emenda Passos Porto, de
dezembro de 1983. A proposta do senador sergipano aumentava o
nível de gastos, especialmente com o Fundo de Participação dos Mu-
nicípios que passava de 9% (1980) para 17% (1986), enquanto o Fundo
de Participação dos Estados subiu de 9% (1980) para 14% (1986).90 Em
face desses acréscimos de encargos, as possibilidades de investimentos
do governo federal ficavam ainda mais reduzidas.91
Quando os governos civis assumiram a Presidência, recebendo
pesada herança, a crise fiscal acentuou-se e a inflação disparou, con-
forme pode ser avaliada pelo quadro seguinte.

Quadro XI. Indicadores Econômicos (Brasil –1983-2000)

Inflação IPC PIB Real(1) % Taxa Média


Ano PIB Percapita Dívida Externa
(Fipe)(1) ao Variação Deesemprego
(Us$)(1) Total* Dezembro(2)
Ano % Anual Aberto (1)
1983 135,57 -2,92 1.497 93.556 6,7
1984 172,36 5,39 1.468 102.040 7,1
1985 201,75 7,91 1.599 105.171 5,3
1986 129,93 7,50 1.915 101.759 3,6
1987 220,94 3,61 2.057 121.188 3,7
1988 586,36 -0,05 2.186 113.511 3,8

90
Cf. Fernando Luiz Abrucio. Os Barões da Federação. São Paulo: Hucitec, 1998, p. 97.
91
Rui de Britto Álvares Affonso. Federalismo no Brasil, Reforma Tributária e Federação. São Paulo:
FUNDAP/UNESP, 1995, p. 58.

300
História de sergipe: república

Continuação
Inflação IPC PIB Real(1) % Taxa Média
Ano PIB Percapita Dívida Externa
(Fipe)(1) ao Variação Deesemprego
(Us$)(1) Total* Dezembro(2)
Ano % Anual Aberto (1)
1989 1.201,00 3,20 2.923 112.506 3,3
1990 2.900,84 -5,05 3.343 123.439 4,3
1991 410,59 1,25 2.771 123.910 4,8
1992 965,20 -0,30 2.605 135.949 5,7
1993 1.920,41 4,43 2.847 145.726 5,3
1994 2.149,26 5,85 3.546 148.295 5,1
1995 67,34 4,22 4.542 159.256 4,6
1996 16,48 2,66 4.924 179.935 5,4
1997 6,44 3,27 5.060 199.998 5,7
1998 1,43 0,22 4.867 241.644 7,6
1999 8,64 0,79 3.324 241.468 7,6
2000 4,38 4,46 3.584 236.151 7,1
* Em bilhões de dólares.
Fontes: (1) Conjuntura Econômica, v. 54, n. 6, jun. 2000, p. XIV. (2) Conjuntura Econômica, v. 55, n. 7, jul. 2001,
p. XXVII.

Observe-se que, de 1985 a 1994, a média anual do índice inflacio-


nário foi superior a 1.000% enquanto o PIB tinha pouco crescimento
quando não se apresentava negativo e a dívida externa permanecia
elevada. Com a inflação incontrolável, tudo foi contribuindo para
enfraquecer a coordenação do poder central. Diante da imobiliza-
ção do Estado para políticas a médio prazo, começaram a surgir os
planos econômicos como tentativas de debelar a inflação e readqui-
rir o comando do processo político-econômico. Ao todo foram seis
experimentos, Cruzado (02/1986), Bresser (06/1987), Verão (01/1989),
Collor I (03/1990), Collor II (01/1991) e Real (1994), que quase sempre
acarretaram esperanças e desilusões em face dos grandes transtor-
nos aos agentes econômicos e aos cidadãos. Com a falência dos três
primeiros e a exaustão dos instrumentos heterodoxos para conter a
alta de preços, procurou-se atacar as causas estruturais. O presidente
Collor começou a enfrentar o processo de desregulamentação do Es-
tado com reforma administrativa, abertura comercial e financeira e
privatização. Apesar dos sucessos efêmeros, os dois governos que lhe
seguiram deram continuidade à liberalização da economia. O último

301
Ibarê Dantas

plano de estabilização foi o que obteve mais sucesso e durabilidade.


Implementado no governo de Itamar Franco, sob a orientação do
seu ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, passou por
uma fase de transição (02/1994 a 06/1994) até entrar em vigor o Real.
Em Sergipe, como seria de esperar, a instabilidade econômica do
país de 1983-2000 teve grandes repercussões. Bastante dependente
dos investimentos públicos e sem grande capacidade de competição,
sua economia declinou. Sobretudo o setor primário, que foi castigado
pelas sucessivas secas, viveu tempos difíceis. No primeiro quatriênio,
o PIB estadual ainda apresentou bom desempenho, mas a partir daí
passou a ressentir-se da nova orientação econômica e perdeu terreno
em relação aos demais Estados da federação. Enquanto em 1985 Sergi-
pe participava com 0,92% da formação do PIB nacional, em 1999 esse
percentual havia caído para 0,56%, passando do 16º para o 21º lugar
no ranking do país.92 Essa queda, proporcionalmente a maior entre
os Estados, em grande parte foi provocada pela retração dos investi-
mentos da Petrobras. Lembremo-nos que somente na construção da
Petromisa até 1985 havia sido aplicado cerca de um bilhão de dólares.
Os momentos mais críticos da economia ocorreram em 1987 e na fase
de 1990-94, conforme se observa pelo quadro seguinte.

Quadro XII. Sergipe - Variações Anuais do PIB Segundo os Setores Econômicos


(Ano Base 1980=100)
Agropecuária Indústria Serviços TOTAL
Anos Variação Variação Variação Variação
Anual (%) Anual (%) Anual (%) Anual (%)
1983 -62,0 7,3 1,8 5,4
1984 153,8 4,5 -3,3 5,4
1985 21,4 8,4 14,4 13,0
1986 22,8 9,8 21,3 17,1
1987 -37,0 4,8 -5,1 -5,5
1988 21,0 8,5 -5,9 2,5
1989 15,7 3,9 6,1 6,4
1990 -13,5 -0,6 -6,9 -5,6
1991 13,1 -10,0 4,7 -0,5

92
Folha de S. Paulo, 14.12.2001. Ver também Conjuntura Econômica, v. 54, n. 6, junho/2000, p. 30-31.

302
História de sergipe: república

Continuação
Agropecuária Indústria Serviços TOTAL
Anos Variação Variação Variação Variação
Anual (%) Anual (%) Anual (%) Anual (%)
1993 -39,0 3,1 3,3 -2,9
1994 30,6 -0,3 5,0 4,8
1995 2,7 2,2 5,2 3,6
1996 -0,4 5,2 5,2 4,6
1997 1,6 10,5 3,2 6,3
1998 -12,7 4,8 1,1 0,8
1999 6,9 6,2 4,2 5,2
2000 3,7
Fontes: (1) Dados Preliminares. (2) Página Eletrônica- SUDENE.

Por este quadro, pode-se ver como, a partir de 1994, os serviços


melhoraram, mas a recuperação da indústria somente ocorreria a
partir do ano seguinte. De qualquer forma, no último quinquênio, os
dois últimos setores reagiram, ainda que com taxas nem sempre altas.
O setor primário, que já tinha participação pequena na formação
do PIB estadual,93 encontrou mais problemas. A agropecuária e a
agricultura pouco produtiva ressentiram-se das estiagens, da con-
corrência interestadual, compondo um período ruim para o homem
do campo. Em meio às adversidades, o poder público interferiu com
projetos como Chapéu de Couro, Sertanejo, Nordeste, Jacaré-Curituba
sem falar da Codevasf. Cada qual à sua maneira procurou minorar a
situação do trabalhador rural. A área de lavoura ampliou-se de 31%
para 37% entre 1985 e 1995, enquanto o espaço de pastagens persistia
inalterado, ocupando 36%.94 Apesar da ponderável continuidade de
formas tradicionais de cultivo, aumentou a preocupação com a produ-
tividade, que já vinha sendo observada no cultivo da cana-de-açúcar
e foi estendida aos novos projetos irrigáveis (Califórnia e o Platô de
Neópolis) e à citricultura, não obstante o desânimo dos produtores cas-

93
Em 1999 a agropecuária participou em 6,9% do PIB do Estado de Sergipe, enquanto a
indústria entrava com 48,5% e os serviços com 44,6%. Cf. Carta de Conjuntura Nordeste do
Brasil, SUDENE, Contas Regionais, 2000, n. 1, p. 18.
94
IBGE. Censo Agropecuário – Sergipe. 1995/1996, apud Governo de Sergipe. Sergipe em Síntese,
Aracaju: SEPLAN, 1998, p. 15.

303
Ibarê Dantas

tigados pelas estiagens e pelos baixos preços da laranja. No conjunto


houve melhorias na infraestrutura, inclusive no acesso à água. Várias
barragens foram construídas, visando seu maior armazenamento. A
energia elétrica passou a cobrir todos os municípios, quase a totali-
dade dos povoados e numerosas fazendas. Dessa forma, a estrutura
da propriedade fundiária sofria mudanças.
No setor secundário, a Nitrofértil, que se transformou em FAFEN,
e a Petromisa entraram em franca produção, embora os projetos do
Polo Cloroquímico e da Zona de Processamento para Exportação
(ZPE) tenham sido arquivados diante da conjuntura adversa. O nível
de investimento pelo poder público diminuiu consideravelmente em
relação ao período anterior. Entretanto, a Petrobras continuou como
principal empresa de investimento no Estado. Além dos gastos com
a planta da FAFEN e na construção da Mina de Potássio, empreendi-
mentos que provinham do final dos anos setenta, aplicou nas obras
do Porto de Sergipe 130 milhões de dólares. Somente no ano 2000
pagou R$ 68,4 milhões em salários e R$ 9 milhões de ICMS. De royal-
ties, naquele ano entregou R$ 29 milhões ao Estado e R$ 21 milhões
aos municípios. Com duas unidades de processamento de gás, 21
estações de tratamento de óleo, 26 plataformas de produção no mar
e sete sondas de perfuração, criando milhares de empregos diretos e
indiretos, ocupava um porte inigualável no Estado.95 A partir do fim
dos anos oitenta, a produção de óleo declinou, mas no ano 2000 já
dava sinal de ascensão.96 As produções de amônia, ureia, cloreto de
potássio, açúcar e cimento continuavam aumentando. A fabricação
de tecidos de algodão, calçados e móveis permanecia com alguma
importância no mercado interno.97
A indústria da construção civil, não obstante algumas crises,

95
No fim do milênio, a Petrobras tinha 1.671 empregados próprios, 2.772 contratados e 26.658
empregos indiretos. Cf. Paulo Manoel Mendes Mendonça. Contribuição da Petrobras para o
Desenvolvimento do Estado de Sergipe. Palestra no ciclo de conferências Pensar Sergipe III,
UFS, novembro/2001.
96
Cf. Paulo Manoel Mendes Mendonça. Ob. Cit., novembro/2001.
97
Ricardo Lacerda. Geração de Emprego e Renda in José Fernandes de Lima e Afonso
Nascimento (orgs). Pensar Sergipe, São Cristóvão/SE: UFS, 2000, v. II, p. 34.

304
História de sergipe: república

permaneceu forte e consolidou-se como grande absorvedora de mão


de obra e fomentadora de outras formas de produção. Alguns grupos
(Norcon e Celi), que despontaram na fase anterior, permaneceram for-
tes, embora outros (Cosil e Andrade Mendonça) tenham se afirmado.
Os resultados das privatizações, num primeiro momento,
manifestaram-se controvertidos. Embora tenham trazido recursos
apreciáveis para o Estado e eficiência a algumas empresas, como a
Energipe e a ex-Petromisa, atual unidade da Companhia do Vale do
Rio Doce, o regime de trabalho intensificou-se e houve redução do
quadro de pessoal.98
Enfim, embora o setor secundário tenha atravessado um período
com redução do nível de investimentos e com volume de empregos
relativamente baixo, ao final do século persistia contribuindo de modo
significativo para o PIB estadual, como certamente em nenhuma
outra unidade federativa. Por outro lado, a inauguração do Terminal
Portuário (1995) concretizou velho sonho dos sergipanos, enquanto
outras obras de infraestrutura habilitavam o Estado para atração de
novos projetos industriais.
O setor terciário também se ressentiu das baixas do quadro na-
cional, mas se modernizou e se diversificou. Passou a predominar
na formação do PIB e afirmou-se como a área de maior absorção de
mão de obra, além de contribuir para o aumento da classe média.
É verdade que no comércio a centralização aumentou. Os centros
polares de Itabaiana, Nossa Senhora da Glória, Lagarto e sobretudo
Aracaju sugaram os demais municípios, inibindo seu movimento
comercial. A modernização dos transportes contribuía também para
esvaziar sua vida social, inclusive as atividades recreativas, apesar das
apresentações dos shows principalmente a partir dos anos noventa.
O aparecimento dos shoppings Riomar e, posteriormente, Jar-
dins, reforçou tendências concentracionistas do capital. As redes (G.
Barbosa, Bom Preço) ganharam grande predomínio, inviabilizando

98
Ver Ricardo de Oliveira Lacerda. Perspectivas da economia sergipana no contexto da globalização.
Aracaju, 04.1999.

305
Ibarê Dantas

os pequenos comerciantes que a elas não se subordinassem. Dentre


as grandes fortunas desse período, raras foram aquelas que tinham
longa tradição de experiência empresarial destacada.
As usinas de Sergipe, que no início do século XX eram 14 e depois
chegaram a 86, na década de 1930 passaram a diminuir sucessiva-
mente. Ao fim do milênio havia apenas uma sobrevivente, S. José do
Pinheiro, produzindo mais do que nos períodos precedentes, enquanto
que os descendentes de Albano Pimentel do Prado Franco, que a criou,
ocupavam cargos de destaque na política e na economia sergipana,
entre os quais seu neto homônimo como governador.
Fora do ramo açucareiro, poucos grupos empresariais que emer-
giram durante a Primeira República sobreviviam através dos seus
herdeiros. Conseguimos identificar com alguma importância os
descendentes dos Leite de Estância, de Constâncio Vieira, de Calumby
Barreto, dos Ribeiro Chaves e de H. Dantas, em Aracaju. O fato é que
a elite senhorial sergipana murchou. Novos grupos emergiram, mas
no todo o setor empresarial privado perdeu terreno para o Estado,
que avançou como fonte de investimentos e detentor de meios de
produção através de grandes empresas públicas, como as indústrias
extrativas.
Quanto aos serviços, especialmente educação e saúde continua-
ram com participação bastante elevadas do poder público. Pode-se
dizer, então, que a crise sofrida pela economia sergipana não alcançou
maiores proporções em face de sua grande dependência das indústrias
extrativas. Mesmo assim, nos anos noventa, o aumento do número de
empregados com e sem carteira assinada esteve longe de acompanhar
o crescimento da população economicamente ativa.99
Em meio a esses problemas, no período 1983-2000, o crescimento
do PIB foi superior à média nacional e ligeiramente inferior à da
Região Nordeste, conforme se observa pelo quadro abaixo.

99
Sobre a estrutura ocupacional nos anos oitenta e noventa em Sergipe, ver Ricardo Lacerda.
Geração de Emprego e Renda. In: José Fernandes de Lima e Afonso Nascimento (orgs). Pensar
Sergipe, v. II. São Cristóvão/SE: UFS, 2000, p. 35-41.

306
História de sergipe: república

Quadro XIII. Produto Interno Bruto (Crescimento Anual)

SERGIPE (1) NORDESTE (1) BRASIL (2)


Anos Variação Variação Anual (%) Variação
Anual (%) Base 1996=100 Anual (%)
1983 -2,3 -3,8 -2,92
1984 5,4 8,6 5,39
1985 13,0 8,0 7,91
1986 17,1 14,5 7,50
1987 -5,5 -1,0 3,61
1988 2,5 1,1 -0,05
1989 6,4 3,2 3,20
1990 -5,6 -5,9 -5,05
1991 -0,5 2,4 1,25
1992 -1,5 -1,5 -0,30
1993 -2,9 -1,8 4,43
1994 4,8 9,7 5,85
1995 3,6 4,4 4,22
1996 4,6 4,1 2,66
1997 6,3 5,8 3,27
1998 0,8 1,5 0,22
1999 5,2 3,3 0,79
2000 3,7 4,8 4,46
Média 3,06 3,19 2,58
Fontes: (1) Nordeste e Sergipe: SUDENE – Boletim Conjuntural. (2) Brasil: Conjuntura Econômica, v. 55, n. 7,
julho. 2001. p XXVII.

No campo social houve mudanças significativas. A população cres-


ceu consideravelmente e mudou o perfil na pirâmide etária. Enquanto
as faixas de 0 a 9 anos, em 1996, apresentavam decréscimos relativos,
em relação ao ano de 1980, o percentual de pessoas com 70 anos ou
mais ampliava-se. Eram indicações de diminuição da natalidade e de
aumento da longevidade. No fundo o contingente de jovens diminuía.
Em termos de urbanização, o crescimento prosseguiu.

307
Ibarê Dantas

Quadro XIV. População Urbana e Rural (Sergipe)

Censo Urbana % Rural % Total


1980 617.796 54,2 522.325 45,8 1.140.148
1991 1.002.298 67,2 490.102 32,8 1.492.400
2000 1.270.429 71,4 509.093 28,6 1.779.522
Fontes: Censos de 1980, 1991 e 2000.

O fato de a população urbana duplicar a cada vinte anos provocou


muitas demandas nos diversos serviços públicos.
Quanto ao movimento dos trabalhadores, pode-se dizer que foi
marcado por duas fases diferenciadas. A primeira aconteceu nos
anos oitenta e ficou na memória como um período de mobilização
crescente e conquistas. A segunda transcorreu nos anos noventa
quando uma série de fatos inibiu a movimentação e houve perdas.
A primeira fase começou com aceleração do declínio do regime
autoritário e, em contrapartida, com a presença cada vez mais for-
te dos grupos assalariados no cenário político e social. O exemplo
mais eloquente desse quadro foi a criação, em 1983, de duas grandes
centrais sindicais: a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Co-
ordenação Nacional da Classe Trabalhadora (CONCLAT), que depois
se transformaria em CGT. Não obstante a divisão em duas tendências
um tanto distintas, a organização das duas instituições indicava a
volta dos trabalhadores à cena política, após quase duas décadas sem
órgãos de representação que falassem pelo seu conjunto.
Em Sergipe, no bojo da campanha pelas diretas (1983-1984), os mo-
vimentos sociais, que já vinham se ensaiando, ganharam grande vigor.
Com a alternância de poder dos militares para os civis na Presidência
da República, a mobilização intensificou-se. Se no meio rural os pos-
seiros já vinham despertando atenção da mídia através dos conflitos
com os proprietários, em Aracaju houve uma febre de organização
dos grupos populares. A necessidade de cadastramento para o rece-
bimento de certos benefícios, especialmente o leite, provocou a pro-
liferação de associações de bairros. Os grupos políticos entraram em
campo e passaram a orientar e/ou manipular lideranças da periferia
de Aracaju e de outras cidades. De maio para julho de 1985, o número

308
História de sergipe: república

de entidades passou de nove para 75, além dos 28 centros sociais.100


Nessa onda de mobilização, outros movimentos sociais emergiram: os
sem teto, os negros, os meninos de rua, todos tentando organizar-se
e reivindicando direitos.101 Em geral com o apoio de terceiros, cada
grupo passou a apresentar seus pleitos, enriquecendo as iniciativas
da sociedade civil com passeatas e atos públicos. A campanha pelos
Direitos Humanos adquiriu maior abrangência com a abertura de
núcleo em Propriá (1985). Foi também neste ano que se realizou o I
Congresso dos Trabalhadores Sem Terra (Curitiba), lançando as bases
do MST. Representação de Sergipe participou do encontro e, de volta,
passou a estruturar seu núcleo no Estado.
Enquanto isso, o quadro sindical se robustecia com o crescimen-
to de três sindicatos modernos e combativos, o dos petroleiros e os
dois dos operários da indústria química (Nitrofértil e Petromisa). Os
empregados da Petrobras, que nos anos 60 e 70 tiveram suas ações
cerceadas, criaram o Sindipetro AL/SE e, a partir de 1981, as reivindi-
cações foram sendo explicitadas com maior visibilidade. A articulação
com os petroleiros de outros Estados acentuou-se. A realização de
eleições, a participação em congressos, a divulgação do seu jornal Ouro
Negro, a integração nos movimentos nacionais, tudo foi compondo a
mobilização crescente com realização de várias greves locais ou gerais
e de campanhas da categoria, entre as quais a defesa do monopólio
da pesquisa, lavra, refinação, importação, exportação e transporte de
petróleo por parte da União que foi incluída na Constituição de 1988.102
Quanto ao Sindiquímica, começou a estruturar-se em 1982 com
o funcionamento da unidade da fábrica Nitrofértil. Esta empresa,
que já dispunha de uma planta em Camaçari (BA), passou a dispor
de outra, situada no município de Laranjeiras (SE). Em 1985, os 470
trabalhadores da empresa conseguiram sua carta sindical e, dis-

100
Cf. Maria Luíza Souza. Movimentos Sociais em Sergipe nas Décadas de 60, 70 e 80. In:
Movimentos. Aracaju, ano 1, n. 1, julho/1995, p. 19.
101
Ver Maria Luiza Souza. Ob. cit., julho de 1995.
102
Cf. Maria da Conceição Almeida Vasconcelos. Ação Político-sindical dos Petroleiros SE/AL nos
anos 80. Aracaju, Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais da UFS.

309
Ibarê Dantas

pondo de seu jornal Zaga, empreenderam sucessivas campanhas


reivindicativas e ganharam vários pleitos, inclusive a equiparação
dos direitos aos petroleiros. Entre movimentos internos e greves,
uma das quais com certo teor de violência, os associados foram
adquirindo autonomia, ditando normas e tornando suas ações cada
vez mais ousadas.103
Situação semelhante ocorria com os trabalhadores da Petromisa,
que começou a ser instalada em 1979 no município de Rosário do Ca-
tete (SE) e entrou em funcionamento em 1984. Cedo seus empregados
começaram a mobilizar-se cobrando Plano de Carreira. Formaram
uma Associação, que, em 1985, transformou-se em sindicado, o Sindi-
mina, que haveria de caracterizar-se como um dos mais combativos de
Sergipe, participando de vários movimentos. Inicialmente o pessoal
da Petromisa atuou em conjunto com os operários da Nitrofértil,
mas, no encontro de 1988, as diferenças, que já vinham da criação da
CUT, se acentuaram e as duas entidades separaram-se. O Sindimina
manteve-se cada vez mais identificado com a tendência Articulação
do PT, enquanto que o Sindiquímica, controlado pelas facções mais
à esquerda (O Trabalho, Convergência Socialista), esteve assumindo
posições mais críticas e independentes.
De qualquer forma, esses três sindicatos de grandes empresas
industriais, ligados à CUT e articulados nacionalmente, numa época
de liberalização das instituições e inflação descontrolada, proporcio-
naram uma combatividade sem precedente no movimento sindical
de Sergipe. Concorreram para isso também as associações da área de
serviços. Aí, as lideranças mais participantes eram as vinculadas ao
Sindicato dos Bancários, atuando em todas as iniciativas em prol da
democratização. Em 1986, fizeram greve de grande repercussão. Com

103
Segundo estudioso do tema, “o nível de organização e de ousadia era tamanho que, no
ano de 1993, no auge do processo de privatização, os trabalhadores puxados pelo sindicato
impediram que a empresa Price Westinghouse entrasse na Fafen para avaliá-la”. Frederico
Lisboa Romão. A Globalização e seus Reflexos sobre os Trabalhadores “Estáveis”: Petroleiros da
Fafen/Petrobras. Trabalho apresentado no XXIV Encontro Anual da ANPOCS, Petrópolis,
Outubro/2000, p.6.

310
História de sergipe: república

elevado número de filiados, em torno de 85% da categoria, e dispondo


de bastantes recursos, os bancários promoverem numerosas ações
organizativas e anualmente empreendiam campanhas salariais atu-
antes, realizando paralisações até 1988.104
Os anos oitenta foram assinalados também pela atuação dos
funcionários públicos, que se organizaram em associações, depois
em sindicatos e revelaram-se dos mais reivindicativos. Aí numerosas
categorias se destacaram, entre as quais os docentes da UFS, através
da ADUFS, que se filiou à CUT. Os professores do Estado passaram
algum tempo divididos em dois grupos com associações próprias,
mas terminaram se compondo, através da APMESE, depois trans-
formada no Sindicato dos Trabalhadores em Educação Básica do
Estado de Sergipe (SINTESE). Em todos os momentos, participaram
de várias campanhas e de diversos movimentos. Outra categoria dos
funcionários públicos que se revelou combativa foi a dos profissionais
de Saúde através de sua entidade (SINTASE). Enfim, mobilizados,
os funcionários públicos tiveram direito de greve reconhecido na
Constituição de 1988 e, embora não fosse regulamentado até o fim do
século, promoveram numerosas paralisações. Sobretudo na primeira
fase, 1983-1990, nunca houve tanta greve em Sergipe.
Já em 1983, ainda no regime autoritário, aconteceu uma greve
geral. Mas as interrupções dos serviços tomaram proporções jamais
vistas na Presidência de José Sarney (1985-89). Em 1984 os professores
do ensino estadual pararam. Categorias que nunca haviam feito gre-
ve em Sergipe, como os profissionais da saúde, cruzaram os braços
em abril de 1985. Meses depois foi a vez dos bancários. Motoristas
e cobradores de ônibus também deixaram de circular, provocando
transtornos e tumultos em 1985 e 1986. Em 1988 os petroleiros che-
garam a cruzar os braços seis vezes.105

104
Cf. Augusto Santos. Depoimento ao autor em 23.11.2001.
105
As greves foram as seguintes: dois dias em fevereiro, dois dias em março, quatro dias em maio,
um dia em agosto, um dia em outubro e 11 dias em novembro. Cf. Maria da Conceição Almeida
Vasconcelos. Ação Político-sindical dos Petroleiros SE/AL nos anos 80. Aracaju, Dissertação de
Mestrado em Ciências Sociais da UFS, p.187.

311
Ibarê Dantas

No conjunto, o país liderava o ranking mundial com surto grevista


sem precedentes. Lembremo-nos que enquanto de 1945 a 1977 a quan-
tidade de paralisações anuais oscilou entre uma e 159,106 a partir de
1985 os movimentos proliferam. No ano de 1987, houve 2.139 greves,107
depois de uma baixa no ano seguinte com 970, em 1989 bateu recorde
com 2.193.108 Eram resultados de acordos coletivos não cumpridos,
perdas salariais causadas pela inflação e dificuldades de negociações,
especialmente com os funcionários públicos, enfim a crise do Estado,
em tempos de mobilização. Vivendo-se num momento de inflação
elevada e liberalização política, no qual a repressão se tornou recurso
raro, sobretudo os funcionários públicos, que nada tinham a perder
com as paralisações, exercitaram bastante a prática grevista.109 O
fato é que nos anos oitenta, o movimento dos trabalhadores cresceu,
resultando em muitas conquistas. Praticamente todas as categorias
organizaram-se em sindicatos. As Organizações Não Governamentais
(ONGs) multiplicaram-se em Sergipe, muitas das quais contribuindo
para promoção social das classes subalternas.110
A Carta Magna de 1988, chamada de Constituição cidadã, consa-
grou não apenas os direitos civis e políticos, mas sobretudo sociais. A
saúde e a educação tornaram-se direitos de todos e dever do Estado.
A assistência social dos necessitados passou a direito independente
de contribuição. A seguridade social virou direito universal. Surgiu
a licença maternidade, pensão de salário mínimo para deficientes e
maiores de 65 anos. De todas as categorias, os funcionários públicos

106
Número de Greves no país no período de 1945 a 1977: 1945- 28; 1946- 98; 1947- 16; 1948- 39;
1949- 17; 1950- 09; 1951- 20; 1952- 14; 1953- 19; 1954- 09; 1955- 15; 1956- 14; 1957- 35; 1958- 29;
1959- 88; 1960- 67; 1961- 110; 1962- 141; 1963- 159; 1964- ; 1965- 25; 1966- 15; 1967- 1; 1968- 25;
1969- 17; 1970- 12; 1971- 1; 1972- 12; 1973-1977- 3 - (média anual). Fonte: Retrato do Brasil. São
Paulo: Política Editora, 1984, p. 211.
107
Leôncio Martins Rodrigues, A década dos trabalhadores. Jornal do Brasil, 27.06.1992.
108
Jornal da Cidade, 02.02.91, Aracaju, apud Diese.
109
Leôncio Martins Rodrigues. A década dos trabalhadores. Jornal do Brasil, 27.06.1992.
110
Em 1998, o pesquisador Rodorval Ramalho identificou 725 entidades apenas em Aracaju.
Eram 116 associações de classe (incluindo trabalhadores e patronais), 183 grupos filantrópicos,
180 agremiações religiosas, 86 associações de moradores, 86 entidades de apoio à cultura
e à educação e 64 instituições de lazer e/ou esporte. Cf. Andréa Cardoso. Jornal da Cidade,
14.09.1998, p. 9.

312
História de sergipe: república

civis foram os que saíram com maiores ganhos. Granjearam estabili-


dade com apenas dois anos de serviço. Os apadrinhados que entraram
sem concurso viraram estáveis com cinco anos. Alguns setores, como
os professores, passaram a gozar de aposentadoria com tempo mais
reduzido, 25 anos para as mulheres e 30 para os homens, num momento
em que outros países aumentavam o tempo de jubilamento. Apesar de
muitos dispositivos ficarem a depender da capacidade de cada grupo
fazer valer os seus direitos, foi um grande avanço. Era decorrência do
fortalecimento do movimento sindical brasileiro, embora retardatário.
Pois a essa altura já vinha ocorrendo refluxo em outras paragens.
Recordemos que a década de oitenta vinha sendo marcada pelo
declínio dos sindicatos em vários países do mundo, tais como EUA,
Japão, Reino Unido, França, Holanda, entre outros, expresso em
sensível diminuição do número de associados.111 No caso do Brasil,
depois do retrocesso do período autoritário, os sindicalistas tenta-
ram recuperar o tempo perdido, e a Constituição de 1988 incorporou
numerosos direitos e prerrogativas, mas sobrecarregou o Estado de
compromissos, justamente numa fase de grande crise estrutural.
Em 1989 a inflação ultrapassou 1000%. No início do ano seguinte,
chegava a 80% ao mês. Foi nesse momento que o presidente Collor
assumiu a Presidência da República e procurou mudar o modelo de
desenvolvimento no sentido de equacionar a crise que afetava as
finanças públicas. Seguindo orientação liberalizante, o novo governo
promoveu abertura comercial, reforma administrativa, privatizações
e tomou medidas visando ao maior controle das estatais. Num quadro
de desgaste das ideias estatistas, reforçado pela falência do modelo
soviético de gestão, os princípios liberais alcançaram prestígio. Mer-
cado, produtividade e competitividade ganharam importância dentro
da nova estratégia de desenvolvimento que passou a ser chamada de
neoliberal. Um de seus efeitos foi o refluxo do movimento sindical,
que haveria de marcar os anos 90.

111
Cf. Leôncio Martins Rodrigues. Destino do Sindicalismo. São Paulo: Edusp/Fapesp, 1999, p. 26.

313
Ibarê Dantas

Para os bancários de Sergipe, o golpe já havia começado em


1989 com a introdução da automação. Primeiro foram os bancos
particulares que adotaram novas máquinas, resultando, em poucos
anos, na redução de cerca de 50% do quadro existente em 1982. Na
segunda metade dos anos noventa, seria a vez dos estabelecimentos
de economia mista optarem pela nova tecnologia, acentuando a dimi-
nuição dos funcionários. Fragilizados com as dispensas de bancários,
inclusive através dos planos de demissão voluntária, o movimento
sindical decaiu, enfraquecendo as campanhas salariais, inviabilizan-
do as paralisações unificadas.112 Como se isso não bastasse, houve o
processo de privatização que afetou também outros setores. A Rede
Ferroviária seria uma das atingidas. Vendida para grupos privados,
279 empregados ficaram inativos.113 Outro ramo atingido foi o da
química, inclusive as indústrias de fertilizantes controladas pela Pe-
trofértil. Mas a Nitrofértil foi preservada e, em 1993, “foi incorporada
à Petrobras, passando a chamar-se FAFEN”.114
Consequências maiores teve o processo de adequação dos traba-
lhadores às novas orientações administrativas, voltadas para diminuir
custos. Desde meados dos anos 80, começaram as medidas de Balanço
Social e Controle de Qualidade que procuravam subordinar os ope-
rários às novas práticas de trabalho e relacionamento. As inovações
voltadas para a melhoria da produtividade atingiram o Sindiquímica,
levando-o a aceitar tendências controladoras que se acentuaram nos
anos noventa. A terceirização aumentou, algumas conquistas foram
sendo perdidas, surgiram as demissões, enquanto o sindicato e os
seus movimentos perdiam força.115
Os trabalhadores da Petromisa também passaram por maus mo-
mentos. Cerca de um mês depois da sua posse, o presidente Collor

112
Cf. Augusto Santos, depoimento ao autor em 23.11.2001.
113
Jornal da Cidade, 24.04.1996.
114
Frederico Lisboa Romão. A Globalização e seus Reflexos sobre os Trabalhadores “Estáveis”:
Petroleiros da Fafen/Petrobras. Trabalho apresentado no XXIV Encontro Anual da ANPOCS,
Petrópolis, Outubro/2000, p. 5.
115
Frederico Lisboa Romão. Ob. cit. 2000, p. 5.

314
História de sergipe: república

extinguiu a empresa. Foi indicado um interventor para fechá-la, mas


o sindicato encetou luta inteligente contra a extinção, que durou
anos. Aceitou melhorar o desempenho e passou a discutir metas de
produção. Quando a Companhia Vale do Rio Doce assumiu o controle
da fábrica (1991) exigiu demissão dos dirigentes sindicais para incor-
porar quadros dela, introduziu nova política gerencial e desgastou a
força do sindicato, fomentando inclusive desfiliação. Os sindicalistas
reagiram e, por algum tempo, ganharam fôlego. Mas, a partir de 1994,
quando uma de suas principais lideranças, José Eduardo Dutra, foi
eleito senador, por motivos vários, o movimento diminuiu e o Sindi-
mina perdeu espaço.116
O processo de reforma do Estado continuou no governo Itamar
Franco, mas adquiriu mais vigor e determinação na Presidência de
Cardoso. Quando a nova administração tentava proporcionar estabi-
lidade à moeda, inclusive eliminando a correção monetária, em maio
de 1995 rebentou a greve na Petrobras, gerando transtornos para a
população e uma queda de braço com o governo que perdurou por
31 dias. Segundo avaliação de dois analistas:

O confronto simbolizou o choque entre duas concepções políti-


cas para o País. De um lado, fincou-se a CUT, o PT e o PSTU, com
suas ideias estatizantes. De outro o governo que pretende abrir
os monopólios e modificar estruturas que atingem o coração da
CUT, como as gigantescas estatais e o funcionalismo público.117

Após grande impasse, o Tribunal Superior do Trabalho julgou a


greve ilegal. Mas os trabalhadores não acataram a decisão e ocuparam
as refinarias. O governo convocou o Exército, interveio e impôs aos
petroleiros a sua mais séria derrota. Várias lideranças foram demi-
tidas, e os sindicatos ficaram a pagar elevadas multas, inclusive o de
Sergipe. As ações de outras categorias como servidores e professores

116
Cf. Marcelo Barreto. Depoimento ao autor em 19.11.2001.
117
Patrícia de Andrade e Raymundo Costa, ISTOÉ, 07.06.1995.

315
Ibarê Dantas

universitários, ferroviários, setores da saúde e da previdência, que já


pediam de 12 a 189% de aumento, foram inibidas.118 O projeto de priva-
tização continuou, assim como as reformas constitucionais, inclusive
a que extinguia o monopólio estatal do petróleo, velho dogma dos
nacionalistas desde pelo menos os anos cinquenta do século XX. Como
efeito, a mobilização sindical decaiu consideravelmente, em menor
escala entre os servidores e professores da UFS, que haviam feito greve
em 1987, 1988, 1989, 1991 e 1993. Após uma pequena trégua, em abril
de 1996 voltaram a parar, dessa vez por 67 dias, mas sem sucesso. De
qualquer forma, o movimento popular ficava mais concentrado nos
funcionários públicos e no MST. Na greve geral programada pela CUT
em junho de 1996, várias categorias tais como bancários, comerciá-
rios, industriários e tantas outras decidiram não participar, mas os
funcionários das estatais tanto estaduais quanto federais aderiram.119
Enquanto isso, outras categorias também estiveram a protestar, entre
as quais as ligadas aos transportes alternativos. Mas o grosso das
manifestações provinha dos empregados do setor público, mestres,
policiais, agentes penitenciários e alguns mais.
Em 1998, ano eleitoral, professores e servidores da UFS retoma-
ram as paralisações, dessa vez por cem dias. Como o governo conti-
nuou sem uma política salarial que amenizasse as perdas por parte
do funcionalismo federal, os descontentamentos com o presidente
avolumaram-se no segundo mandato.
Seguindo as orientações nacionais, os movimentos contra as po-
líticas governamentais aumentaram em Aracaju. Em março de 1999,
grupos da sociedade civil promoveram o Acorda Sergipe tendo como
palavras de ordem: Fora FHC, Fora FMI, Moratória Já. O 1o de maio de
1999 foi marcado por manifestações populares em repúdio ao valor
do salário mínimo e ao desemprego. No segundo semestre, colheram
assinaturas pedindo o impeachment do presidente, depois vários deles

118
ISTOÉ, 24.05.1995.
119
Cf. Jornal da Cidade, 21.06.1996.

316
História de sergipe: república

participaram da marcha de protesto em Brasília.120 Além dos slogans


costumeiros, ganhou força a campanha pelo não pagamento da dívida
externa. No ano seguinte, essa ideia se transformaria em recomen-
dação da Igreja Católica, que promoveu plebiscito, secundada pelas
siglas partidárias tais como PT, PSTU, PC do B, entre outras.
Entre todas as categorias, os que mais permaneceram aguerridos
e tiveram maiores ganhos nesse período foram os trabalhadores ru-
rais. A criação do Plano Nacional de Reforma Agrária pelo governo
Sarney, em plena fase de redemocratização, animou o homem do
campo e deu ânimo ao movimento popular. A Diocese de Propriá, que
atuava em 26 municípios do Estado, e os sindicatos rurais passaram a
incentivar e respaldar as ações dos trabalhadores. A partir de 1985 os
conflitos de terra proliferaram, chegando a duas dezenas e, em meio
a ameaças do patronato e ações repressoras da polícia, o movimento
cresceu, ocupando fazendas com o apoio da Comissão Pastoral da
Terra (CPC) e de militantes de partidos políticos. Era o processo de
reforma agrária desencadeado em Sergipe. Numa primeira fase,
correspondente ao período 1985-89, foram desapropriados 14.825
hectares, beneficiando 823 famílias em 13 projetos de assenta-
mentos.121 Enquanto isso, o Movimento Sem Terra, como parte da
instituição nacional, organizava-se no Estado, e assumia a direção
do processo com autonomia própria, dispensando a presença de
entidades que divergissem de sua orientação. Uma vez estruturado,
promoveu encontros dos assentados, cursos, desenvolveu passeatas,
invasões de terras, de bancos e de prédios públicos, interrupção de
estradas, saques de variadas naturezas e foi atingindo seus intentos.
A partir de 1989 os Sem Terra foram conseguindo desapropriação
de fazendas e, em 1999, já dispunham de propriedades no total de
61.187 hectares, distribuídos em 25 municípios, beneficiando 4.020

120
O Movimento “Fora FHC”, de agosto de 1999, recebeu o nome de Fórum Sergipano por Terra
Trabalho e Cidadania. Participaram partidos de esquerda (PT, PC do B, PDT, PSTU, PCB, PSB),
OAB, CUT e FETASE. O abaixo-assinado em prol do impeachment teria alcançado cerca de
40 mil adesões. Cf. Jornal da Cidade, 17.08.1999.
121
Rosemiro Magno da Silva e Eliano Sérgio Azevedo Lopes. Ob. Cit. 1996, p. 99.

317
Ibarê Dantas

famílias.122 Afinal, os trabalhadores permaneceram nos municípios


do interior do Estado, enquanto o poder público passou a arcar com
novo grupo de clientes, ávido por recursos subsidiados, mas ainda
com modesta contribuição à produção agrícola do Estado.
No mundo urbano, nesse período difícil de 1983-2000, muitas
mudanças modernizadoras foram implementadas. A introdução de
novas tecnologias e de novos padrões de gestão afetaram as relações
entre capital e trabalho. No curso desse processo, como observamos,
algumas categorias foram bastante penalizadas, mas houve também
significativos avanços sociais. Somente no período 1991 a 2000, a
esperança de vida aumentou de 59,8 para 64,1 anos, a mortalidade
infantil até um ano de idade diminuiu de 65,8 por mil para 48,5 por
mil, o índice de fecundidade baixou de 3,6 para 2,7 e o percentual
de jovens de 7 a 14 anos frequentando a escola ascendeu de 73,3%,
para 93,3%.123 A taxa de alfabetização passou de 64% para 74,84%, os
serviços básicos na cidade estenderam-se a ampla margem da popu-
lação. Em face do Nordeste, Sergipe chegou ao ano 2000 ocupando o
quarto lugar no rendimento, o terceiro na alfabetização, o segundo
no abastecimento de água e com a menor concentração de renda.124
Se considerarmos os dados fornecidos pelas Nações Unidas, sua
renda per capita em reais subiu de 127,5 (1991) para 163,5 (2000), mas
na própria região Nordeste perdia para Pernambuco e Rio Grande
do Norte. Afinal, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) da
população de Sergipe evoluiu de 0,597 (1991) para 0,682 (2000), mas
ocupava a 23a posição entre os 27 Estados da federação, superando
apenas Paraíba, Piauí, Alagoas e Maranhão. Enfim, sua situação me-
lhorava, mas ainda deixava muito a desejar.125

122
Cf. Eliano Sérgio A. Lopes. Um Balanço da Ocupação de Terras em Sergipe, Aracaju, 2000; Adelci
Figueiredo Santos. A Ação do MST em Sergipe na década de 1990. Geonordeste, Aracaju,
Projeto Nordeste/Capes, v. 9, n. 2. dez. /2000.
123
Cf. Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento, 2000.
124
Cf. análise comparativa dos Censos de 1980, 1991 e 2000.
125
Cf. Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento, 2000.

318
História de sergipe: república

Deve-se observar também que os dados expostos não dão conta


de toda a realidade. Apesar do crescimento significativo dos grupos
médios e de estar situado entre os Estados de menor concentração de
renda na Região, um grupo relativamente pequeno gozava de grande
predominância na economia e na política. Na educação, a qualidade
de ensino permanecia bastante crítica, pelo menos na maioria dos
estabelecimentos. Mas cresceu muito a preocupação com a educação
fundamental. Os professores do Estado no interior passaram por um
processo de reciclagem jamais visto.
Contudo, três grandes pragas se agravaram nas últimas décadas
do século. O desemprego, a violência e as drogas. Não eram problemas
novos, mas atingiram dimensão preocupante. A falta de emprego
acentuou-se, afetando a autoestima das pessoas e não se descortina-
vam possibilidades de alterar radicalmente o quadro. A segurança
degradou-se. A impunidade estimulou o crescimento das redes de
delinquentes, quase sempre associadas com o tráfico de drogas. O
perigo passou a rondar os indivíduos na cidade e no campo, mas não
pareciam problemas insolúveis.
Enquanto a segurança piorava, a saúde melhorava. Não obstante
a concentração dos serviços em Aracaju, gerando superlotação no
atendimento de urgência dos hospitais públicos, houve avanços. O
atendimento tornou-se universal, o sistema foi melhor organizado.
Todos os municípios foram cobertos pelos agentes comunitários e
o processo de municipalização foi iniciado. Para os que não usam
os serviços de SUS, estruturaram-se os planos de saúde cada vez
mais vigiados pelo Governo Federal. Contribuíram para a melhoria
a presença maior do poder público com recursos amplos, serviços
preventivos como a vacinação para crianças, o tratamento da água
e o saneamento básico. É certo que, ao fim do século, persistiam ca-
rências neste último setor, mas passaram a ser atacadas pelo poder
público como nunca o fora. Por outro lado, não se deve esquecer dos
progressos da indústria química, fabricando drogas mais eficientes
e do aperfeiçoamento das informações dos profissionais da saúde.
Enquanto isso, o culto do corpo aumentava consideravelmente. Ao

319
Ibarê Dantas

lado dos centros de dança, proliferaram as academias de ginásticas.


As caminhadas matinais prescritas pelos médicos tornaram-se cada
vez mais generalizadas.
A consciência sobre o meio ambiente aumentou. A cidadania
ampliou-se. O acesso à Justiça tomou grande impulso com a criação
dos Juizados Especiais. As promotorias expandiram-se a serviço da
sociedade, ouvindo suas queixas e encaminhando providências. As
discriminações contra as minorias reduziram-se. Jamais em tempo
algum, tantos dispuseram dos serviços de educação e saúde e de
possibilidades de influir nos meios de comunicação. A liberdade de
manifestação de pensamento e fé, de escolher seus representantes e
acompanhar com transparência os atos dos eleitos, tornou-se práticas
usuais. As formas de lazer multiplicaram-se, compondo um leque de
opções jamais imaginado e incorporaram-se aos hábitos da popu-
lação. Os direitos civis e políticos ampliaram-se como em nenhum
outro período. Enfim, alguns problemas da modernidade agravaram
a vida da população, mas os progressos foram mais numerosos e de
grande abrangência.

320
História de sergipe: república

5.3 Manifestações culturais

Nos derradeiros anos do milênio, as manifestações culturais au-


mentaram e diversificaram-se em ritmo sem precedentes na história
republicana. Essa expansão deveu-se às iniciativas individuais e aos
mecenatos público e privado num ambiente de democratização da
sociedade. Não obstante viver-se num período de políticas de auste-
ridade, na tentativa de superar a crise fiscal, procurou-se estabelecer
mecanismos institucionais voltados para a captação de recursos
financeiros visando sustentar de forma duradoura as produções
dos artistas. No plano nacional esse objetivo foi iniciado com a Lei
Sarney (1986) que, pela primeira vez, regulamentou a participação
dos investimentos dos empresários em projetos culturais. O governo
Collor tentou mudar a estrutura dos órgãos oficiais voltados para a
área. Mas, sem projeto alternativo, a desmontagem açodada das ins-
tituições culturais trouxe grandes perdas para o setor. Restou a Lei
Rouanet (1991) que melhorou a norma anterior, exigindo aprovação
pública dos projetos, reduzindo os abusos e racionalizando melhor
o uso dos recursos provenientes da renúncia fiscal. A partir de 1995,
novos aperfeiçoamentos passaram a ser feitos na Lei Rouanet, resul-
tando em crescimento dos projetos aprovados, beneficiando várias
áreas, desde o cinema à documentação de arquivos.
Em Sergipe, no plano estadual, não houve lei específica que es-
timulasse a parceria dos empresários nas atividades culturais, nem
continuidade das ações entre os governadores.126 Até o estatuto das
entidades públicas gestoras voltadas para cultura variou bastante.
O governo João Alves atribuiu-lhe o perfil de fundação, criando a
FUNDESC.127 A administração de Valadares transformou-a em Se-

126
O deputado Ismael Silva apresentou projeto de incentivo à Cultura, mas não conseguiu a
regulamentação.
127
A FUNDESC foi criada em 1985. Antes havia a Subsecretaria de Cultura e Arte (SUCA),
instituída em 1979. Cf. Luiz Fernando Ribeiro Soutelo. Os Serviços Públicos de Cultura (A
questão patrimonial). Intervenção no I Fórum Estadual de Secretários Municipais de Cultura.
Aracaju, 06.11.2001.

321
Ibarê Dantas

cretaria de Cultura, mas depois a juntou com a de Meio Ambiente.


Na segunda gestão, João Alves converteu-a em Secretaria Especial, e
o governo Albano Franco, a partir de 1995, voltou a considerá-la ex-
clusivamente como Secretaria de Cultura, subdividida formalmente
em quatro institutos: a) Memória e Documentação, b) Patrimônio, c)
Arte e Educação e d) Difusão Artística e Cultura.
Contudo, mais importante do que a estrutura formal, foi a atenção
demonstrada em atos. Neste sentido, quem mais contribuiu para a
infraestrutura de apoio foi João Alves Filho (1983-86) com a constru-
ção do Centro de Criatividade, a criação da Orquestra Sinfônica de
Sergipe, reformas no Teatro Atheneu Sergipense e no Conservatório
de Música. Houve também o Projeto de Interiorização da cultura,
concretizado através de cursos, oficinas, apresentações, envolvendo
um Ônibus Cultural incentivando a leitura nos bairros periféricos
de Aracaju e no interior do Estado. Mas, a falta de continuidade por
parte de seus sucessores sepultou a louvável iniciativa. No governo de
Valadares, após uma primeira fase sem grandes feitos, houve projetos
de incentivos a corais, à música erudita, oficinas, fomento a grupos
de teatro e dança, dentro dos objetivos do Centro de Criatividade de
despertar e reforçar vocações. Construíram-se Barracões Culturais
com o objetivo de difundir a cultura em bairros de Aracaju e em alguns
municípios. Além disso, promoveu-se edições de vários trabalhos, en-
contros culturais e ampliou-se o número de monumentos tombados.128
Em sua segunda gestão, o governador João Alves Filho realizou
reformas de vários prédios de instituições culturais, especialmente
o Conservatório de Música, o Arquivo Público, a Academia Sergipana
de Letras, a Sociedade de Cultura Artística, o Instituto Histórico e Ge-
ográfico de Sergipe e o Centro de Criatividade. Iniciou a construção
de grandioso teatro com a opção de funcionar como grande Centro
de Convenções,129 o qual seria concluído no ano 2000. Nas gestões de

128
Cf. Governo do Estado de Sergipe. Plano Plurianual (1992/1995). Administração João Alves.
Volume I.
129
Cf. Governo do Estado de Sergipe. Projeto Capital. Aracaju, 1994.

322
História de sergipe: república

Albano Franco, houve um período (1995-97) em que se registraram


algumas iniciativas louváveis: organização de parte do acervo da
Biblioteca Epifânio Dória, produção de coleção de CDs, com docu-
mentação do século XIX e XX. Além disso, cuidou-se de reformas
físicas no Centro de Criatividade, Conservatório de Música, Museu
Histórico de Sergipe e Museu de Arte Sacra.130 No último quatriênio
do século, o poder público, apesar de haver concluído o grande Teatro,
subestimou o setor cultural. O Conselho de Cultura deixou de se reunir
por falta de nomeação de novos conselheiros, vários prédios públicos,
tombados ou não, estiveram a carecer de manutenção e consertos, o
Arquivo Público viveu grande crise com carência de recursos, pessoal
e da infraestrutura mínima para seu funcionamento, a Biblioteca
Pública se ressentia de condições básicas, a Orquestra Sinfônica foi
desativada, e a Escola de Música, criada em 1945, e possuidora de
respeitável tradição, por um ano esteve sem atividades.131 Conforme
denunciou uma artista em depoimento na Assembleia Legislativa, o
Teatro Escola Centro Popular de Cultura Mariano Antônio foi fecha-
do, o cine Rio Branco foi tombado e destombado, alguns barracões
culturais foram abandonados. Com 0,25% do orçamento do Estado,
a Secretaria de Cultura ficava com recursos irrisórios.132
Entre as associações privadas, os artistas e o público amante das
artes sentiram falta de maior atuação da Sociedade de Cultura Artísti-
ca, que passou por forte crise interna e praticamente deixou de atuar.
Na capital, na curta administração de José Carlos Teixeira (31.05 a
31.12.1985), o Departamento de Cultura foi transformado em Secretaria
e procurou-se dar melhores condições ao setor. Mais tarde, a Câmara
de Vereadores aprovou duas leis de incentivo à cultura.133 Como a

130
Cf. Luiz Antônio Barreto. Algumas Informações (Institucionais) sobre a Cultura. Documento
fornecido pelo ex-secretário da Educação e da Cultura ao autor em 23.08.2001.
131
Antes do fim do seu mandato, Albano Franco promoveu melhoria dos prédios da Biblioteca
Pública Epifânio Dórea e do Arquivo Público.
132
Cf. Virgínia Lúcia Fonseca de Menezes. Pronunciamento na Assembleia Legislativa em
25.11.1999.
133
A primeira lei foi proposta por Bosco Mendonça (1987) e a segunda deveu-se à iniciativa de
Edvaldo Nogueira (1991).

323
Ibarê Dantas

aplicação da segunda lei gerou muitos abusos e virou escândalo, a


partir de 1997 os procedimentos mudaram. A direção da Fundação
Cultural de Aracaju (FUNCAJU) passou a controlar a captação de
recursos que, desde então, constaram do orçamento do município.134
Com a prática desses critérios, a FUNCAJU saiu das manchetes dos
jornais e prosseguiu cumprindo com mais eficácia suas finalidades,
realizando promoções, inclusive no campo editorial, indicando um
novo momento administrativo.
No ensino, houve grande expansão e a presença do setor público
continuou muito forte do infantil ao nível médio, conforme se pode
observar pelo quadro abaixo.

Quadro XV. Matrículas no Ensino em 2000 (Sergipe)


Estabelecimentos Infantil Fundamental Médio Superior
/nível Número % Número % Número % Número %
Federais 257 0,06 1.639 2,43 9.617 49,21
Estaduais 404 9,70 188.208 43,57 52.750 78,29
Municipais 2.463 59,14 206.750 47,86 3.229 4,79
Privados 1.298 31,16 36.737 8,51 9.758 14,49 9.925 50,79
Total 4.165 100,00 431.952 100,00 67.376 100,00 19.542 100,00
Fontes: MEC/INEP/SEEC

Observe-se que, ao fim do milênio, as matrículas da rede privada


no nível superior já superavam as da rede pública. Apesar disso, no
ensino do terceiro grau, a Universidade Federal de Sergipe (UFS) foi
a instituição que apresentou maior saldo de realizações. Durante o
período 1983-2000, graduou 11.911 estudantes distribuídos em varia-
dos cursos, liderados por Direito, Medicina e Pedagogia. Concorreu
decisivamente para a melhoria do nível dos professores. Como o
deslocamento para outros Estados implicava em dificuldades, a UFS
criou cursos de especialização, mestrado e doutorado no âmbito local,
acelerando o processo de qualificação de profissionais. No conjunto
do período estudado, estima-se que mais de 400 mestres passaram

134
Segundo Ivan Valença, antes de sua gestão na FUNCAJU, o interessado fazia a captação de
recursos e não prestava contas. Cf. declarações ao autor em 27.09.2001.

324
História de sergipe: república

por tais cursos. Durante o ano 2000, a UFS ofereceu 1.745 vagas no
vestibular, mas o número de inscritos (16.506) indicava uma demanda
reprimida elevada. No conjunto, 9.612 alunos frequentavam cerca de
50 cursos de graduação.135
Embora a UFS tenha vivido muito fechada em si, nos últimos anos
do século abriu-se um pouco para as demandas sociais. Exemplo disso
foi o convênio com a Secretaria Estadual da Educação, participando
do Projeto de Qualificação Docente, das redes estadual e municipal.
Nas atividades de extensão, atuou em comunidades pobres prestando
serviços de saúde, alfabetizando e preparando sua população para o
mercado de trabalho, se bem que de forma ainda tímida. Promoveu o
“Pensar Sergipe”, aglutinando parte da intelectualidade de dentro e de
fora da UFS para discutir, em várias seções específicas, os problemas
e alternativas de desenvolvimento local.
Nas artes, a Universidade Federal de Sergipe tem se revelado pouco
cuidadosa com seu acervo de quadros, mas reservou espaço específico
para o setor, o Centro de Cultura e Artes (CULTART), dentro do qual
disponibilizou o Teatro Juca Barreto. Aí, manteve oficinas com cursos
de teatro, dança, música, artes plásticas, literatura, ao tempo em que
promoveu exposições, encontros e financiou festivais. Mas não ficou
somente na capital. Dentro do projeto Arte/Interior atuou em vários
municípios, levando para pequenas cidades espetáculos de teatro,
dança e música erudita. Como efeito, surgiram grupos de teatro e de
música, graças ao seu estímulo e suporte. Manteve regularmente de-
zenas e dezenas de projetos de pesquisa nas diversas áreas da ciência
e das artes. Embora uma parcela de seus professores tenha produzido
pouco, nos últimos anos o nível de produtividade cresceu, inclusive
entre os alunos instigados pela obrigação de monografias.
No conjunto, há um acervo de milhares de trabalhos, alguns dos
quais serviram de base aos artigos publicados em periódicos que
praticamente duplicaram em relação à fase anterior (Ver Anexo IV). É

135
Ver Relatório de Gestão da UFS 1996-2000. São Cristóvão/SE: Fundação Oviêdo Teixeira, 2000
e Notícias UFS, n. 5 de maio de 2003.

325
Ibarê Dantas

importante observar que cerca de metade dos títulos foi gerada dentro
da UFS, embora o índice de continuidade seja ainda baixo. Mas essa
é apenas uma parte visível da produção. Houve também centenas de
teses ou dissertações defendidas e jamais publicadas, construindo um
verdadeiro manancial de informações sobre a vida da população de
Sergipe.136 O fato é que nunca se produziu no Estado como a partir dos
anos oitenta. Em educação, a produção da segunda metade dos anos
noventa foi maior do que a dos cem anos precedentes.137 A partir de
1998, a administração da UFS formou seu Conselho Editorial e, em
convênio com a Fundação Oviêdo Teixeira, passou a publicar livros
como nunca ocorreu em sua existência. Além disso, houve iniciativas
departamentais, através de projetos específicos, como acontecia no
setor de Geografia.
Na área de museologia, a UFS inaugurou e passou a manter em
Aracaju o Museu do Homem Sergipano e criou o Museu Arqueológico
de Xingó, em Canindé de São Francisco, em parceria com a Petrobras
e a CHESF, destinado a estudar e expor o material colhido nos sítios
arqueológicos. Foi firmado convênio com a Prefeitura local e o espaço
museológico passou a despertar interesse de pesquisadores e turistas,
gerando cursos e publicações, entre as quais Cadernos de Arqueologia.
Na esfera privada, as Faculdades Integradas Tiradentes, que
vinham atuando desde 1972, transformaram-se, em 1994, em Uni-
versidade Tiradentes (UNIT), passando a enriquecer o elenco de
manifestações culturais. Possuidora de três campi, graduou mais de
mil alunos, distribuídos em diversos cursos. Promoveu seminários,
produziu revistas, implantou o Memorial de Sergipe e editou alguns
livros.138 Embora os projetos de pesquisas e o conjunto da produção

136
Para ser ter uma ideia, somente as monografias do Departamento de História no período 1995-
2000 chegaram a 86, os alunos de Economia entre 1988-2000 geraram 118, os de Geografia
também produziram número semelhante.
137
Cf. Jorge Carvalho do Nascimento. Palestra no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe em
14.08.2001. Ver também Jorge Carvalho do Nascimento. Historiografia Educacional Sergipana.
Uma Crítica aos Estudos de História da Educação. São Cristóvão/SE: Grupo de Estudos e
Pesquisas e História da Educação/NPGED, 2003.
138
A UNIT promoveu a edição de três livros no ano de 2000.

326
História de sergipe: república

acadêmica tenham se revelado ainda relativamente diminutos em


relação à magnitude do seu alunado, a orientação empresarial de seu
reitor tem se mostrado mais sensível às tendências do mercado do que
a UFS, onde o peso do corporativismo, sobretudo no movimento do-
cente, vinha inibindo a preocupação com as demandas da sociedade.
Por esse tempo a Faculdade Pio Décimo ampliou também seu
raio de atuação enquanto outras unidades do ensino superior des-
pontavam, como a Faculdade São Luís (1997), oferecendo cursos de
Administração de Empresas e Pedagogia, e a Faculdade de Adminis-
tração e Negócios de Sergipe (Fanese) (1998), todas explorando, com
alguma tendência à mercantilização, a demanda que se mostrava de
grande potencialidade.
A Igreja Católica, que teve presença no ensino superior na Primei-
ra República e sobretudo nas décadas de 50 e 60, perdeu terreno como
nunca, assim como no seu trabalho proselistista. Não obstante alguns
esforços, voltando-se mais para as causas sociais e trabalhando o indi-
vidual através do movimento Renovação Carismática, não conseguiu
evitar o avanço estupendo dos evangélicos e principalmente da Igreja
Universal do Reino de Deus, portadora de maior agressividade. No
trabalho de catequese, os métodos dessas igrejas tornaram-se os mais
variados e as posturas éticas quase sempre relegadas ou esquecidas.
Enquanto isso, os cultos afro-brasileiros continuavam se expandindo,
assim como os centros do espiritismo kardecista.139
Uma novidade desse último período estudado foi o aparecimento
de entidades privadas voltadas a incentivar as atividades artísticas.
Aproveitando as vantagens das leis federais Sarney e a Rouanet, al-
guns grupos empresariais formaram suas fundações. Inicialmente
surgiu a Fundação Augusto Franco, criada em setembro de 1987, que
num primeiro momento manifestou-se atuante. Ajudou apresenta-

139
Ver Beatriz Góis Dantas. Nanã de Aracaju: trajetória de uma mãe plural. In: Vagner Gonçalves
da Silva (org). Caminhos da Alma. Memória afro-brasileira. São Paulo: Summus, 2002; Maria
Lúcia Leite de Carvalho (coord). Abaças e Centros de Umbanda. Aracaju: Funcaju, 1991 e Eufrázia
Cristina Menezes Santos. Visão do mundo no espiritismo: uma análise sócio antropológica.
Aracaju, monografia de graduação de Serviço Social, 1994.

327
Ibarê Dantas

ções em diversos campos das artes, distribuiu prêmios de concurso e


publicou livros. Mas, a partir da segunda metade dos anos noventa,
retraiu-se bastante, enquanto a Fundação Oviêdo Teixeira, criada
em 1990, passava a mostrar feitos. O Banese, o Banco do Brasil e o
Banco do Nordeste também emprestaram seu tributo às artes e às
letras em Sergipe.140
A imprensa deu boa cobertura às apresentações de grupos de
teatro, de música, às exposições de pintura e ao lançamento de li-
vros de autores sergipanos e de fora. Ademais, animou as artes com
suplementos literários. A Gazeta de Sergipe a partir de 1981 manteve
“Arte e Literatura” por vários anos. O Jornal da Manhã começou em
1991 a publicar o Suplemento “Arte e Palavra”, que figurou como uma
referência para escritores e outros geradores de cultura.
Na literatura aconteceram fatos auspiciosos. A poesia continuou
fértil. Velhos ícones continuaram publicando, como Santos Souza, que
lançou Âncoras de Argo (1994), enquanto novos nomes revelaram-se,
entre os quais Maria Lúcia dal Farra com Livro de Auras (1994), Ronal-
dson com Questão de Íris (1997), Josailto Lima com Plenespanto (1996),
Maria Cristina Gama com A Próxima Índia (1998), além de Wagner Ri-
beiro, Marcelo Ribeiro e vários outros. Na prosa, houve publicação de
teses e dissertações acadêmicas, tais como a de Francisco J. C. Dantas
sobre A Mulher no Romance de Eça de Queiroz (1999) e a de Maria Ivonete
S. Silva sobre a obra de Amando Fontes (1992). Vários autores editaram
livros de contos ou de novelas: Antônio Carlos Mangueira com O Meio
do Mundo e Outros Contos (1999), Jeová Santana com Dentro da Casca
(1993) e Juraci Costa com Contos de Província (1999), alguns dos quais
com boa qualidade. A safra de romances nunca havia se revelado tão
fecunda não apenas pela quantidade, mas sobretudo pela qualidade
de alguns deles. Gizelda Morais publicou Preparem os Agogôs (1996),
Ibiradiô (1999), Absolvo e Condeno (2000); Hunald Alencar apareceu com
Morte no Estuário (1995); José de Sacramento estreou com O Encontro

140
De instituições de outros Estados, merece registro a contribuição da Fundação Bradesco
que mantém colégio de segundo grau em Propriá com bom nível de assistência.

328
História de sergipe: república

com o Outro (1983); Núbia Marques (1927-1999) editou O Sonho e a


Sina (1992). Francisco J. C. Dantas lançou Coivara da Memória (1991),
Os Desvalidos (1993) e Cartilha do Silêncio (1997) que foram bastante
enaltecidos pelos críticos de várias regiões do país e rendeu Prêmio
Internacional de Literaturas Românticas da União Latina na Itália.
Na área de ciências humanas, a publicação de trabalhos atingiu
proporções sem precedentes. Não obstante a irregularidade do nível
de produção, no conjunto a sistematização apresentou-se, do ponto
de vista de método, mais criteriosa. A maior parte dos estudos foi
gestada no meio acadêmico, mas continuou relevante a contribuição
de profissionais liberais que permaneceram dedicados à pesquisa fora
dos quadros das universidades. Como o tratamento de cada obra alon-
garia demasiadamente nossa síntese, que já se encontra por demais
crescida, limitamo-nos a lembrar, por área temática, alguns autores
que publicaram livros entre 1983-2000.
A história foi muito enriquecida através de análises específicas
e de trabalhos generalizantes, desde o período colonial até a fase
republicana, enfatizando os aspectos político-administrativo, social,
econômico e o cultural. Acrísio Torres (1993 e 1999), Maria Thetis
Nunes (1984, 1989, 1996 e 2000), Josué Passos (1987 e 2000), Maria da
Glória Almeida (1984 e 1993), Terezinha Oliva (1985 e 1998), Ariosvaldo
Figueiredo (1986-1996), Wladimir Carvalho (2000), Tereza Cristina
da Graça (1996 e 2000), Diana Maria Diniz (org. 1991), José Anderson
Nascimento (1991), Kátia Loureiro (1999), Murilo Melins (2000) são
autores que nos legaram obras importantes. Por esse tempo, surgiram
também várias monografias tratando dos municípios como objeto
específico. Apesar de sua importância como fonte de informação, em
geral foram textos carentes de melhor elaboração.
A geografia ampliou suas investigações acompanhando as trans-
formações do mundo urbano e do setor rural. Alexandre Diniz (1987
e 1996), Adelci Figueiredo (1986), José Augusto Andrade (1986), Neuza
Maria Góis Ribeiro (1989), Vera Lúcia França (1999), Ana Virgínia Me-
nezes (1986) e Maria Mundim Vargas (1999) deixaram contribuições
sem precedentes. Além desses nomes do Departamento de Geografia

329
Ibarê Dantas

da UFS, merece registro a produção de João Alves Filho (1989, 1994 e


1997) referente ao desenvolvimento regional.
Os estudos antropológicos receberam grande impulso com o apa-
recimento de trabalhos enfocando as relações interétnicas, grupos de
culto afro-brasileiro. Beatriz Dantas (1988 e 1993) e Luiz Mott (1986)
foram as principais expressões deste período. Ao lado desses livros,
houve vários ensaios de espectro variado, tomando a cultura como
elemento central. Dentro deste campo, devem ser lembrados: Jackson
da Silva Lima (1984, 1986, 1989, 1995), Luiz Antonio Barreto (1990, 1994,
1998), Jorge Carvalho (1999), Betisabel Santos e Josefa Eliana (1996),
Aglaé Alencar (1980), Núbia Marques (1987 e 1996), entre outros.
Na sociologia, a produção não foi vasta, mas nos últimos anos do
século XX foram editados alguns trabalhos acadêmicos enfocando
os movimentos sociais do campo e a organização dos trabalhadores
urbanos. Lúcia Aranha (1999), Frederico Romão (2000), Rosemiro
Silva (1996), Eliano Lopes (2000) foram os principais autores desse
período. Na arqueologia, o único livro de que tivemos notícias foi o
de Fernando Lins (2000).
Na filosofia, Silvério Fontes (2000) e Edmilson Menezes (2000)
deixaram trabalhos significativos. O primeiro como exemplo raro de
formação autodidata sólida com ampla visão de conjunto. O segundo
como associado ao curso de Filosofia, que foi reanimado na última
década do século XX.
Houve também numerosos ensaios biográficos, entre os quais
devem ser mencionados os de Maria Nely dos Santos (1997 e 1999),
Francisco Rolemberg (1987), Luiz Antonio Barreto (1994), Núbia Mar-
ques (1996) e Pe. Aurélio Vasconcelos (obra póstuma) (2000).
No direito, os profissionais são numerosos, mas a lavra dos anos
oitenta e noventa tudo indica que foi pequena. Os autores que se
tornaram mais conhecidos com sua produção teórica foram Artur
Oscar de Oliveira Déda (1992 e 2000), Carlos Ayres de Britto (1997) e
Vladimir de Souza Carvalho (1990).
Quanto às belas artes, os feitos também foram grandes e hetero-
gêneos.

330
História de sergipe: república

Nas artes plásticas, aquelas tendências que se manifestaram no perí-


odo anterior acentuaram-se. Houve uma maior inserção dos artistas ao
mercado, que se ampliou a partir dos anos oitenta, ao tempo em que a
concorrência entre os profissionais aumentava, levando ao fomento de
novos incentivos. Amparadas em lei estadual, as repartições passaram
a comprar e mostrar obras de autores locais. À Galeria Álvaro Santos,
inaugurada no período anterior, acrescentaram-se outros espaços de
exposições, tais como a Galeria J. Inácio da Biblioteca Pública Epifânio
Dória (1988), o hall da Assembleia Legislativa e do Teatro Atheneu, do
Cultart (UFS). Instituições privadas, como a escola de idiomas Yázigi e a
Universidade Tiradentes, também se incorporaram a essas iniciativas.
A Escola Técnica de Sergipe promoveu festivais que se propagaram
pelo interior, servindo para mostrar o talento dos artistas sergipanos.
Conforme observou um estudioso do tema, “as empresas descobriram o
marketing cultural vindo investir em espaços”. A Associação Sergipana
dos Artistas Plásticos (ASAP), criada no início da década, “foi reativada
em 1996”. Não foi por acaso que “em Aracaju houve de fato significativo
crescimento das artes plásticas na década de noventa do século XX”.141
A divulgação dos pintores e de seus trabalhos ampliou-se atra-
vés de publicações. Como exemplos, basta lembrar não apenas as
ricamente produzidas, como os álbuns referentes a Adauto (1990) e
Florival Santos (1995)142 sob o patrocínio da Habitacional Construções,
mas também devemos lembrar as edições mais modestas de catálogos
coletivos e os individuais promovidos pelas secretarias Estadual e
Municipal de Cultura, pela UNIT e pela UFS.143 Por outro lado, a revista

141
Antônio da Cruz. Artes Plásticas em Sergipe: A História que precisa ser contada. In Memórias
de Sergipe, Correio de Sergipe, 13.07.2003.
142
Adauto. Texto de Alberto Carvalho. Aracaju: J. Andrade/ Habitacional Construções, 1990;
Alberto Carvalho. Florival Santos, Aracaju: J. Andrade/ Habitacional Construções, 1995. Há
informações também sobre a produção artística em Sergipe em Arte no Nordeste. Rio de
Janeiro: Spala/CNI, 1986.
143
Paulo Lobo. Pintores Sergipanos. Aracaju: A Nacional/Fundação Cultural Cidade de Aracaju,
s/d.; Leonardo Alencar, Aracaju: CEAV, 1996, Agenda de Aracaju. Aracaju: Secretaria Municipal
de Cultura, 1991; J. Inácio. Aracaju: Faculdades Integradas Tiradentes, 1988; Ilma Fontes.
Silveira, Arte e Vida. Funcaju, 1999. Geminiano II. Aracaju: Sercore, 1999; Rumos, Artes
Plásticas, Sergipe 2000. Aracaju: J. Andrade/Banese, 2000.

331
Ibarê Dantas

Aracaju Magazine, com fotografia de excelente qualidade, passou a


divulgar a obra de artistas sergipanos, entre os quais os dedicados às
artes plásticas. Os pintores circularam mais dentro e fora do Estado,
visitando galerias e museus, expondo em várias praças, participando
de bienais, ganhando prêmios, ampliando os horizontes e adquirindo
maior visibilidade.
Sem a pretensão de fazer inventário exaustivo, observamos que,
além dos nomes surgidos em períodos anteriores que continuavam
produzindo vigorosamente, apareceram: Abelardo (1966- ) pintando
paisagens e representações da mulher; Bené (1966- ) apresentando
natureza morta e figuras humanas; Bosco Rolemberg (1947- ) expondo
cenas de vida carcerária; Cláudio (1962- ) mostrando quadros figurativos
e abstratos; Daniel (1948- ) indicando cenas do cotidiano e paisagens;
Elias (1964- ) retratando o caos urbano; Ewerton (1947- ) forjando formas
distorcidas; João de Barros (1949-2000) enfocando madonas, santos e
casarios; José Fernandes (1959- ) dedicando-se a murais e painéis, envol-
vendo animais e figuras humanas; Luiz Mangueira (1950- ) desenhando
também perfis humanos, entretanto marcados por maior abstracionis-
mo; Silveira (1962- ) revelando paisagens e objetos nordestinos.
Além dos sergipanos, não se pode esquecer dos artistas que,
nascidos em outras plagas, aqui se radicaram e, participando de
sua ambiência, estiveram a retratá-la enriquecendo o patrimônio
cultural do Estado. Entre esses, lembramos os nomes de Caã, filho de
J. Inácio, natural de Nova Iguaçu, ainda criança veio para Aracaju,
onde se projetou produzindo paisagens e tipos do sertão; Dioneia
Peterson (1938) da Bahia, famosa pelos seus girassóis; José Lima (1922)
de Altamira que retratou igrejas, átrios, interiores de sacristias, luz,
sombras; José Carrera, natural da Espanha, desenhando suas mari-
nhas e seus casarios; Geminiano de Fortaleza, também Pedro da Silva
de Timbaúba (PE), que legou marinhas, monumentos e paisagens
históricas; Eurico Luiz (1936-2004) de Araçatuba, que se afirmou em
Sergipe pintando elementos variados: casarios, retratos, natureza
morta, igrejas, paisagens, marinha, imagens sacras e outros objetos
locais, representativos de nossos costumes.

332
História de sergipe: república

No conjunto, observou-se que a maioria dos pintores desse período


provém das classes subalternas e não cursou Escola de Belas Artes.
Autodidatas, confiantes na força inspiradora, foram realizando expe-
riências e revelando sua inventividade. Boa parte deles foi mudando
a temática, tentando adaptar-se à demanda de um mercado cada vez
mais massificado e voltado para motivos preferenciais. Outros deixa-
ram Sergipe, como Marinho Neto (1949), Anselmo Rodrigues (1958).
Ao lado dos pintores, vários outros artistas destacaram-se entre
nós. Entre os escultores, merecem ser lembrados o propriaense Pinto,
cultivando o barroco em suas imagens sacras; Zeus (1959); Mestre To-
nho e Véio, que talharam na madeira figuras de santos, assim como o
chileno Willy. Na xilogravura, entre os que fizeram tapeçaria, torna-
ram-se referências Luiz Adelmo (1942), Antônio Queiroz (1949-1990) e
Alfredinho. Dos numerosos ceramistas, ganharam fama Beto Pezão,
Wilson, Judith, João Freitas, Maria Feliciana, entre vários outros.
Apesar das ajudas de numerosas instituições, alguns grupos artís-
ticos ressentiram-se da carência de regularidade dos incentivos. Essa
situação atingiu sobretudo os atores e os profissionais ligados à mú-
sica clássica. Mesmo assim, contribuíram para que as produções dos
grandes compositores se difundissem para um público mais amplo.
Também concorreu para a educação musical de Sergipe a persistên-
cia da Sociedade Filarmônica de Sergipe (SOFISE), entidade privada
criada em 1972, na medida em que promoveu palestras, entrevistas e
sobretudo espetáculos com refinado bom gosto.
Quanto à música popular, prosseguiu no ritmo expansionista do
período anterior, mas com maior diversificação de tendências. Os
festivais se amiudaram promovidos pelos órgãos culturais da capital
ou do interior. A FUNDESC e a Secretaria de Cultura, em diferentes
momentos, inventaram vários programas de estímulo à música, como
Sexta no Parque, Quendera, Cinco e Meia, Clave de Sol, Pano de Boca,
Rodoviante Bandas e Canto Novo. Fomentou-se o Festival Estudantil
de Música Popular, revelando novos valores. A TV Sergipe passou a
promover anualmente o Festival de Música Popular Brasileira, depois
o Canta Nordeste. A FUNDESC, com o projeto Pé na Estrada contri-

333
Ibarê Dantas

buiu para proporcionar aos cantores sergipanos maior visibilidade


externa. A Fundação SESC criou o Sescanção, que se foi repetindo
anualmente. Depois apareceu Prata da Casa sob a iniciativa de Samira
e Produções com apoio da Secretaria de Cultura. Os shows se tornaram
frequentes pelo interior, ajudando a formação ou continuidade de
grupos como Bandauê, Cata Luzes, Centelhas, Crove, Fome Africana,
H2O, Horrorishows, Karne, Quorum, Repente, assim como diversas
bandas: Sulanka, Java, Lacertay, Policultura, Sibéria, Anti-corpus,
Grove, Funk e Soul, Almas Band, Sluster, Orlord.144 Associados e esses
conjuntos, numerosos nomes se notabilizaram como expoentes da
música popular sergipana, tais como Amorosa, Antônio Carlos du
Aracaju, Chico Queiroga, Joésia Ramos, Irineu Fontes, Lula Ribeiro,
Irmão, Paulo Lobo, Patrícia Polayne, Tonho Baixinho, entre outros.
Alguns foram se firmando cantando em restaurantes e casas de espe-
táculos a preço baixo e conquistaram reconhecimento, virando ídolos
populares festejados, exercitando uma pluralidade de ritmos. Além
desses, disseminavam-se sobretudo entre os jovens da periferia de
Aracaju os grupos de raps, hip-hop, sintonizados com as influências
de artistas do Sudeste.145 Não obstante essa variedade, certos tipos de
música predominaram como o caso do forró. Determinados cantores
fizeram grande sucesso, como Josa, Lucival Reis, entre outros, mas
ninguém como Clemilda, que manteve programa matinal na Rádio
Aperipê denominado “Forró no Asfalto”, desde os anos sessenta, e
tornou-se uma campeã de vendagem, gravando até 1998, mais de 30
discos.146 Com as festas de São João cada vez mais grandiosas e difun-
didas ufanisticamente no âmbito nacional como as maiores do país,
a propagação do forró tornou-se insuperável. O empenho de grande
parte dos compositores do Estado, ou aqui radicados, em pesquisar as

144
Cf. Antônio Alves do Amaral e Wellington dos Santos (irmão). Alguns Aspectos Sobre a
Música Popular Sergipana. Sergipe Artístico e Monumental. Aracaju: SEC, Sebrae, Emsetur,
Banco do Brasil, Banco do Nordeste do Brasil, 2000, p. 43-46.
145
Segundo Francisco Santos, ao fim do século XX já havia cerca de 25 grupos de raps.
Informações ao autor, em dezembro de 2000.
146
Cf. Aracaju Magazine, n. 24, junho de 1998.

334
História de sergipe: república

raízes nordestinas e explorar os motivos locais, foi importante para


a construção da autoestima e da identidade do sergipano.
Concorreu para a riqueza das manifestações culturais a sobrevi-
vência das tradições folclóricas que persistiam atuando: Bacamartei-
ro, Batalhão, Cacumbi, Chegança, Pisa Pólvora, Parafuso, Caboclinho,
Reisado, Taieira, Lambe-Sujo, São Gonçalo, Samba de Coco, Samba
de Aboio, Guerreiro, Pastoril, Cavalhada, Batucada, distribuídos em
vários municípios, entre os quais Laranjeiras e Japaratuba, que con-
tinuavam como principais centros do rico folclore sergipano.147
Não obstante a tendência das classes alta e média em diferencia-
rem-se dos estratos inferiores, houve inegável democratização no
terreno musical. O mercado de discos ampliou-se muito e o consumo
passou por algum nível de homogeneização. A música, ao tempo em
que atingia a capital e o interior, incorporava-se à vida das pessoas
de todas as classes. Especialmente entre os jovens, os cantores locais
e nacionais ganharam popularidade enorme. Como foram inúmeros,
a maioria deles viveu momentos de apogeu e de semiesquecimento,
sempre influenciados pela mídia.
Um problema que incomodou a muitos cantores locais nesse pe-
ríodo foi a invasão das músicas de fora, especificamente as baianas,
como o Axé Music, algumas das quais de baixa qualidade, fascinando
os jovens, a partir dos grandes conjuntos que, respaldados pelo poder
público, invadiram o Estado, incluindo Aracaju na rota das micare-
tas e/ou prévias carnavalescas, como Festas do Mole e nos Pré-cajus
drenadores de recursos dos sergipanos.148
Na verdade, observou-se, nas duas últimas décadas do século, um
fenômeno paradoxal. De um lado, uma padronização acentuada de
modas e costumes. De outro, uma diversidade de tendências desnor-
teadoras. Algumas contribuindo para rebaixar o gosto de parte do
público, outras marcadas por experimentações e refinamentos de

147
Cf. Governo do Estado de Sergipe, Plano Plurianual, 1992/1995, v. I, Administração João Alves
Filho, p. 55-56.
148
Sobre as transformações das festas de rua, ver Fernando Lins de Carvalho. Dos Cordovínicos
ao Pré-Caju in Jornal da Cidade, 26-27.01.2003 a 2-5.03.2003.

335
Ibarê Dantas

sensibilidade artísticas de amplas faixas dos cidadãos. Para os pro-


fissionais, o avanço da tecnologia também trouxe vantagens. Embora
as grandes produtoras de discos ainda predominassem na distribui-
ção, o aparecimento do CD, substituindo o vinil, resultou em grande
mudança para o mundo dos cantores e do público consumidor.149 O
sonho de editar seu CD e escutá-lo nas rádios e nos diversos ambientes
tornou-se muito mais acessível do que antes. A relação de sergipanos
que gravaram disco nos últimos dezoito anos (vide Anexo V) serve
apenas de amostragem, pois a produção dos anos 1999-2000 já se
tornou bastante difícil de ser computada. Entre o público, generalizou-
-se o uso de aparelhos de som, enquanto produtos de todos os gostos
passaram a ser acessíveis à grande parte da população.
No cinema, houve um certo refluxo. No período 1983-2000, dos
numerosos cinemas tradicionais, restou apenas o Rio Branco, utili-
zado para apresentação de filmes eróticos. Como a frequência passou
a diminuir, ao longo do tempo as casas de projeção foram fechando.
O Vitória virou loja, o Plaza foi transformado em Igreja Evangélica,
o Bonfim em colégio, o Aracaju em estacionamento.150 Um dos últi-
mos a encerrar suas projeções foi o imponente Palace, que a partir
de 1996 tornou-se casa de bingo. Afora o Rio Branco, funcionaram
duas salas de projeção no Shopping Rio Mar. Esses fatos pareciam
indicar que o ciclo do cinema estava acabando em Sergipe. Mas,
com a inauguração do Shopping Jardins (1998), abrindo nove salas
da rede Cinemark, houve certa receptividade por parte do público.
A programação, centrada em filmes comerciais de grande público,
atraiu sobretudo a população jovem, de forma que, no primeiro ano,
cerca de 700 mil ingressos foram vendidos.151 Enquanto isso, as duas
salas do Rio Mar, sem condições de concorrer, fecharam e assim se
encontravam até o ano 2000.

149
No âmbito nacional, em 1987, quando ainda não havia CD, foram produzidos 50 milhões de
discos em vinil. Mas em 1993 o número de CDs passou o de vinil. Em 1997, enquanto a produção
de disco vinil desaparecia, a de CD chegava a 100 milhões. Cf. VEJA, 24.05.2000, p. 92.
150
Cf. Virgínia Lúcia Fonseca de Menezes. Pronunciamento na Assembleia Legislativa em 25.11.1999.
151
Cf. Ivan Valença, declarações ao autor em 26.09.2001.

336
História de sergipe: república

Na área da produção cinematográfica, o grupo que no período


anterior andou tão motivado dispersou-se. Os festivais nacionais de
cinema que ocorreram entre 1972-81, como parte da programação
do FASC, deixaram de acontecer em Sergipe. Poucos foram os que
continuaram elaborando roteiros e executando-os. Com a atuação
diária das TVs e as facilidades de adquirir máquinas, as filmagens
difundiram-se muito. Deixando de lado os registros de festas fa-
miliares, que se generalizaram enormemente, numerosos eventos
públicos significativos resultaram em vídeos, formando vasto acervo
documental espalhado, quando deveria ser reunido num centro de
memória. Por esse tempo, alguns longas-metragens foram rodados
em Sergipe com a participação de atores locais, mas a produção
de grandes trabalhos profissionais realizados por sergipanos ficou
aquém do esperado.
No caso do teatro, passado o período autoritário, na década de
oitenta, o processo de democratização passou a exigir uma redefini-
ção da linguagem dos anos da resistência e, pelo menos, alguns deles
demoraram a atualizar-se. A adaptação aos processos burocráticos da
Federação e do Sindicato, bem como a falta de uma estrutura regular
de manutenção também foram apontados como causas de um certo
refluxo.152 Em meio a dificuldades, ao longo do período 1983-2000,
pelo menos dez grupos estiveram em atividade: Imbuaça, Raízes, Ma-
mulengo do Cheiroso, Mambembe, Opinião de Espetáculos, Imagem,
Argamassa, Mombassa, Checkup, Corpo e Cenário. Todos foram orga-
nizados em Aracaju, exceto o Mombassa que nasceu em Maruim.153
Vale salientar que pelo menos o grupo Raízes surgiu voltado para
o público infantil. Mamulengo do Cheiroso atuou como Teatro de
Bonecos. Quanto aos grupos Imbuaça, Mambembe e Mombassa nasce-
ram como expressão contra o regime autoritário e desenvolveram-se
veiculando seus espetáculos associando a arte com a política.

152
Sueli Carvalho. O Teatro Sergipano. Aracaju Magazine, n. 37, julho de 1999.
153
Governo do Estado de Sergipe. Plano Plurianual (1992/1995). Administração João Alves, v. I,
p. 51.

337
Ibarê Dantas

Na década de noventa, apesar de as formas de financiamento


ainda permanecerem oscilantes, houve avanço em relação à déca-
da anterior.154 Os atores buscaram novas definições, alguns nomes
qualificados se radicaram em Aracaju, trazendo sua experiência e
seu saber. O intercâmbio com artistas de outros Estados ampliou-se.
Na busca de aprimoramento, várias pessoas estiveram estudando os
clássicos da dramaturgia e progredindo. De 1997 a 1998 montaram
Samuel Becket, Garcia Lorca, experimentaram Brecht e Moliére e
leram Camus e Shakespeare.155 Com elevado nível técnico, grupos
como Imbuaça consolidaram reconhecimento externo e interno
e receberam prêmios. Vários atores afirmaram-se, como Mariano
Ferreira (in memoriam), Lindolfo Amaral, Jorge Lins, Isaac Galvão,
Orlando Vieira, Walmir Sandes, Vieira Neto, Antonio Leite, Virgínia
Lúcia e tantos outros. Numerosas peças de qualidade foram apresen-
tadas. Somente o Imbuaça, em 1997, quando completou vinte anos de
existência, havia montado 13 espetáculos e participado de 91 eventos
nacionais e internacionais.156
Associando o teatro e a música, a Secretaria de Estado da Cultura
promoveu espetáculos do Ballet Folclórico e da Ópera do Milho, re-
sultando em CD que obteve boa aceitação do público, mas não teve
continuidade.
Quanto à dança, nos anos oitenta e noventa, novos espaços fo-
ram criados. Da junção de dois profissionais surgiu a Moemandré.
Aracaju também foi se tornando um mercado emergente, inclusive
para bailarinos. Profissionais de outras terras passaram a morar em
Sergipe, como Lu Spinelli e a gaúcha Olga Gutierry, Senzala, Conga
que atuaram em várias instituições: Cultart, Funcaju, difundindo seus
conhecimentos e sua experiência enriquecedores. Nos anos noventa,
outras casas foram inauguradas, como Danç’Art, Célia Duarte, Nós
e Cia, enquanto ressurgia a Academia Sergipana de Ballet, promo-

154
Sueli Carvalho. Ob. cit., 1999.
155
Cf. Virgínia Lúcia Fonseca de Menezes. Pronunciamento na Assembleia Legislativa em 25.11.1999.
156
Cf. Imbuaça, 20 anos. Aracaju: Imbuaça Produções Artísticas, 1997.

338
História de sergipe: república

vendo grandes espetáculos. Em meio à concorrência, alguns artistas


empenharam-se em explorar novas formas, desde as mais populares,
como a dança do ventre, até aquelas inspiradas em motivos clássicos,
associados com tradições locais, como foi o caso do Forrobalet.157 A
circulação dos artistas foi-se tornando comum, assim como o inter-
câmbio com outros Estados cresceu. Segundo uma profissional do
ramo, a qualidade foi aperfeiçoada assim como se desenvolveu o
nível técnico.158
Durante esse período, alguns nomes destacaram-se como gestores
e animadores culturais, entre os quais devem ser lembrados: Aglaé
Fontes Alencar, Clara Angélica, Ilma Fontes, Ivan Valença, Núbia
Marques, Lânia Duarte, Lindolfo Amaral, Luiz Antônio Barreto, entre
outros.
Enquanto isso, os meios de comunicação também se diversifica-
vam. É certo que as mudanças na imprensa escrita foram pequenas,
embora comportando uma certa desconcentração. Das quatro folhas,
incluindo uma semanal, um membro da família Franco detinha o Jor-
nal da Cidade; o empresário João Alves, o Jornal da Manhã; os herdeiros
de Orlando Dantas continuavam com a Gazeta de Sergipe; enquanto
que o Cinform, sob o controle do empresário Bomfim, afirmava-se
como o semanário mais lido. Entre os jornais alternativos, podem
ser citados O Kapital, Folha da Praia, O Que, O Povão, entre outros.
Maiores alterações ocorreram na radiofonia de Sergipe. Enquanto
em 1982 não chegavam a 10 rádios, ao fim do século já eram 30, sendo
18 FM e 12 AM/OM (Ver Anexo VII). Apesar da grande influência da
TV, os rádios resistiram em Sergipe gozando de grande audiência.
Num momento em que os parlamentares não conseguiam atender
as demandas dos estratos inferiores, o rádio continuou funcionando
como uma tribuna popular, com grande participação do povo em
meio também à manipulação por parte de determinados useiros

157
Dorinha Teixeira Machado. Dança em Sergipe. Sergipe Artístico e Monumental. Aracaju: SEC,
Sebrae, Emsetur, Banco do Brasil, Banco do Nordeste do Brasil, 2000, p. 49-51.
158
Dorinha Teixeira Machado. Ob. cit., 2000, p. 49-51.

339
Ibarê Dantas

dos programas radiofônicos e radialistas que fizeram desse meio de


comunicação instrumento de sensacionalismo e de ascensão política.
Na televisão, os dois canais da década de setenta transformaram-
-se em seis, incluindo duas transmissoras. Além desse crescimento
numérico, houve desconcentração de poder no controle das emisso-
ras de TV. A difusão da antena parabólica no interior acarretou duas
consequências. De um lado, diluiu bastante a influência dos grupos
locais sobre os telespectadores. De outro, levou-os a participar mais
dos problemas de outras terras, em detrimento do acompanhamento
dos fatos locais. De qualquer forma, a TV afirmou-se como a principal
fonte de entretenimento da sociedade de massa. Com a ampliação da
energia elétrica para todos os municípios e para os povoados, a TV
passou a predominar, prendendo o público com seus programas de
auditórios, noticiários, novelas e filmes, operando homogeneização
sem precedente de determinados padrões culturais. Mas esse acesso
equalizador foi erodido com a TV a cabo, que chegou a Aracaju em
1996, oferecendo quase uma centena de canais. Enquanto seus usuá-
rios ampliavam sua inserção no mundo globalizado, em contrapartida
passou a gerar assimetrias e excesso de informações, exigindo dos
telespectadores maior discernimento para se orientar na multiplici-
dade de dados e tendências. Eram faces da era da globalização que
se acelerava marcada de contradições.
Além do jornal e do rádio, que vinham de longas datas, e da TV,
que entrou em Sergipe no fim dos anos setenta, na década seguinte
começou a aparecer o disco CD. Nos anos noventa, propagou-se o com-
putador e com ele pouco depois a internet. Por fim, o telefone celular
(1996). Os avanços tecnológicos formavam um complexo eletrônico
que revolucionava as telecomunicações e ampliava a difusão dos bens
culturais. As interconexões imediatas entre as várias partes do globo
afetaram o mercado financeiro, a produção industrial, as relações
de trabalho. Ampliou-se a mercantilização dos bens simbólicos. O
processo de globalização acelerou-se, atingindo a política, a economia
e a sociedade, gerando problemas novos. Como a tecnologia passou
a desenvolver-se em ritmo muito acelerado através de um processo

340
História de sergipe: república

competitivo bastante acentuado, produziu grande defasagem entre


países e, dentro deles, entre grupos sociais. Especialmente as nações
pobres, marcadas por desigualdades e sem grande poder de compe-
tição, encontraram grandes dificuldades na generalização das ino-
vações tecnológicas aos diversos estratos sociais. Em pouco tempo, o
descompasso social foi-se tornando mais gritante, criando demandas
que os Estados foram se revelando impotentes para atendê-las. A libe-
ralização, no sentido de incentivar a produtividade e tornar o Estado
menos pesado, aumentou a exclusão social, reforçando o discurso dos
estatistas, em baixa desde a derrocada das experiências socialistas. Ao
fim, a luta pela inclusão se afirmava como um dos grandes desafios
legados para os viventes do novo milênio.

341
Ibarê Dantas

5.4 Resumo (1983-2000)

No período 1983-2000, o processo de democratização ampliou-


-se, apesar de ser perturbado pelo descompasso entre o Estado e a
sociedade. Num primeiro momento, o aparato autoritário foi substi-
tuído por uma orientação liberalizante. Nos anos oitenta, o modelo
varguista do nacional-desenvolvimentismo mergulhou em profunda
crise. O Estado passou por profundo descontrole, gerando inflações
recordes e grandes turbulências no mercado. Com a sociedade política
enfraquecida, mal saída de um regime autoritário, a sociedade civil
mobilizou-se, os direitos sociais foram ampliados e a Carta de 1988
os consagrou.
Nos anos noventa, os governos começaram a combater a instabili-
dade atacando suas causas estruturais, mas inicialmente as tentativas
não tiveram o sucesso esperado e o clima de incerteza continuou.
Somente a partir de 1994 o processo inflacionário começou a ser
domado enquanto a máquina pública passava por um processo de
racionalização. Nessa fase inicial, o movimento sindical foi inibido,
os assalariados do setor público e grande parte da classe média foram
prejudicados e houve retrocesso no sistema de segurança pública.
Em Sergipe, o Estado continuou controlado por grupos conser-
vadores, boa parte dos quais originários da ARENA, não se configu-
rando alternância de poder. Três partidos controlaram o governo do
Estado. O PDS (1983-85), o PFL (1985-94) e o PSDB, que assumiu em
1995 e chegou ao fim do século com mais dois anos de mandato pela
frente. Na área de Justiça, apesar do avanço da criação dos Juizados
Especiais, que contribuiu para ampliar a cidadania, os grupos domi-
nantes persistiram influentes, recebendo tratamento diferenciado.
As administrações públicas, em sua maioria, revelaram-se pouco
criteriosas nos seus gastos, enquanto o Judiciário não correspondia
ao esperado. O Estado de Direito careceu de maior abrangência.
Os oposicionistas demonstraram incapacidade em juntar-se e
montar um bloco alternativo para conquistar hegemonia. Apenas
conseguiram dois feitos. O controle da Prefeitura de Aracaju a par-

342
História de sergipe: república

tir de 1985 e a construção de uma coalizão em 1994. Não obstante a


derrota para governador, houve ganhos na representação do Estado
no Congresso Nacional, resultando em avanços significativos na es-
fera política. O eleitorado aumentou em proporção maior do que o
crescimento da população e realizaram-se dez eleições sem solução
de continuidade em ambiente de ampla liberdade de manifestação
de pensamento e de organização. O jogo político tornou-se aberto e
competitivo.
A economia estadual apresentou baixo crescimento em face da
diminuição dos investimentos da Petrobras, das longas estiagens e
da transferência de alguns órgãos para a Bahia. Dentro do Nordeste,
embora o Estado tenha perdido terreno, seus indicadores sociais con-
tinuaram melhorando e chegaram ao fim do milênio numa posição
mediana dentro da região.
A sociedade civil passou a ocupar maior espaço num ambiente
cada vez mais plural e heterogêneo. A população foi se revelando mais
informada e participativa, exigente e com maior poder de pressão. O
número de votantes ampliou-se consideravelmente e a vida pública
tornou-se mais transparente. Numerosos canais de intermediação
política se formaram e a construção da cidadania progrediu.
No âmbito cultural, aboliu-se definitivamente a censura. As produ-
ções na literatura e nas ciências humanas avançaram em quantidade
e qualidade. As manifestações artísticas gozaram de ampla liberdade
e proliferaram. As artes plásticas adquiriram maior dinamismo.
O movimento editorial e o fonográfico cresceram muito. As artes
cênicas foram cultivadas como nunca. Os meios de comunicações,
apesar de cada vez mais inseridos nos esquemas nacionais padroni-
zados, tornaram-se mais variados em número e propriedade, embora
sujeitos a arranjos suspeitos. As ações do mecenato público e privado
persistiram e, em algumas áreas, ampliaram-se. Isso não impediu que
o desenvolvimento artístico se tornasse mais sintonizado com a lógica
do mercado e cada vez mais sensível às influências externas. Era o
sintoma da era da globalização acentuando a propensão para adoção
de costumes e modas padronizadas. Por outro lado, paradoxalmente

343
Ibarê Dantas

ocorreu também enorme diversificação de tendências, estilos e ritmos.


A competitividade acentuou-se. Na busca de novos caminhos, ocorreu
dispersão e alguma descontinuidade.

344
História de sergipe: república

Fonte: Territórios sergipanos. Ptdocs. Disponível em: https://ptdocz.com/doc/1068791/territ%C3%B3rios-


sergipanos.

345
CONCLUSÃO

N o curso dos 110 anos de forma de governo republicano em Sergipe,


o Estado ampliou sua influência sobre a sociedade, a população
multiplicou-se por 5,7 e muitos desafios foram vencidos.
Enquanto o processo econômico nacional transcorria de forma
subordinada ao sistema capitalista mundial, internamente passava
por ciclos de elevado crescimento e de crise. No aspecto político-
-administrativo, houve uma certa alternância de avanços e recuos.
Como parte da federação, Sergipe compartilhou com essa situação,
vivenciando ao seu modo os diversos momentos institucionais que
plasmaram sua História. Mas esse processo foi prejudicado pela
assincronia no desempenho dos setores político, econômico-social
e cultural.
Nas primeiras três décadas do século XX, quando a economia se
diversificava e os governos, em parceria com empresários, promo-
viam ciclo modernizador, a vida político-partidária esteve travada
pelo esquema de dominação oligárquica. Com a Revolução de 1930, a
intervenção na política fortaleceu o poder público diante dos grupos
que tradicionalmente controlavam a sociedade. Mas a moderniza-
ção econômica diminuiu seu ritmo e a iniciativa privada perdeu
dinamismo. As massas urbanas, no período 1931-37, ampliaram sua
participação, organizaram-se em sindicatos e tiveram direitos reco-
nhecidos. O Estado Novo, de um lado, promoveu a desmobilização da
sociedade civil, que ficou cerceada sob o controle da tutela estatal, e,
de outro, consolidou a legislação trabalhista assegurando numerosos
direitos sociais.
A partir de 1945, a vida político-partidária avançou, o movimento
sindical se robusteceu, politizou-se e a mobilização social ampliou-se.

347
Ibarê Dantas

Em contrapartida, na economia, a dependência comercial do Estado


em relação ao Sudeste se acentuou, e o setor secundário declinou com
fortes repercussões no conjunto dos setores produtivos estaduais.
No novo ciclo autoritário (1964-84), a presença da Petrobras e
algumas políticas nacionais operaram a maior alteração do perfil
da economia sergipana, superando a fase agroexportadora pela
estrutura industrial moderna. Mas os governantes, ao cercearem a
liberdade partidária, o movimento sindical e a participação popular,
comprometeram o exercício da cidadania. Essas limitações devem
ter contribuído para que o ciclo de crescimento da economia não
reduzisse as discrepâncias sociais.
Depois de 1982 e sobretudo a partir de 1985, houve grande avanço
político-eleitoral. O movimento sindical desenvolveu-se como nunca
e houve muitas conquistas, apesar do refluxo na década de noventa.
Enquanto isso, a crise que afetou a economia nacional refletiu-se no
Estado onde o desempenho revelou-se modesto. Enfim, conjunções
internas e externas provocaram esse desencontro, atingindo o quadro
social.
Ao fim do milênio persistia elevado percentual de analfabetos
em grande parte incorporado à enorme massa de pobres, vivendo
como “semicidadãos”, sem usufruir ativamente dos direitos civis e
políticos, participando marginalmente do mercado, sem carteira
assinada, sem vínculos com quaisquer associações de classe e sem
capacidade reivindicatória expressiva. Dentro desse grupo também
estavam muitos descendentes dos escravos que passaram por grande
processo de miscigenação, mas não desfrutaram de reais possibilida-
des de ascensão econômico-social. Num nível superior, estavam os
grupos médios, inclusive os empregados dos setores público e privado
com salários variados, inseridos no mercado, organizados de forma
diversificada, gozando direitos civis, políticos e sociais. Acima dos
dois blocos, situavam-se os grupos dominantes, que secularmente
controlaram os três poderes da República. Ao longo do tempo, do-
minaram os senhores do açúcar, depois os pecuaristas e, por fim, os
empresários urbanos com variados graus de influência na burocra-

348
História de sergipe: república

cia estatal, mas nenhuma fração hegemônica foi capaz de viabilizar


projeto de desenvolvimento democrático efetivamente equalizador.
As experiências ditatoriais de âmbito nacional trouxeram alguns
benefícios materiais, mas desorganizaram grande parte da sociedade
civil e acarretaram grande desserviço à construção da democracia.
Os grupos político-ideológicos que surgiram durante esse tempo
propondo alternativas, inspirados em variadas concepções autori-
tárias, dificultaram a compreensão da democracia como meio mais
eficaz para edificação de instituições sólidas e de uma convivência
mais igualitária. Neste sentido, os momentos mais favoráveis foram
entre 1945-1964 e sobretudo a partir de 1985 quando a participação
popular aumentou e as eleições tornaram-se mais livres, embora
ainda sofrendo as coações do poder econômico.
Apesar dessas limitações, os movimentos políticos contribuíram
para ampliar a cidadania, envolvendo os direitos civis, políticos e
sociais. Entretanto, a melhoria dos costumes foi bem pequena. Os
postulados republicanos da impessoalidade e do exercício das deci-
sões públicas acima de privilégios estabelecidos continuavam care-
cendo de maior vivência. O Estado ampliou-se, as demandas sociais
tornaram-se cada vez mais extensas e diversificadas, a manutenção
da máquina tornou-se onerosa, mas, nas últimas décadas, os agentes
públicos demonstraram pouca sensibilidade diante da sociedade
majoritariamente empobrecida. A força da herança patrimonialista
emperrou a prática dos postulados republicanos. As grandes investi-
das contra o erário várias vezes ficaram impunes como se houvesse
algum acordo tácito entre os poderes constituídos.
Apesar desses óbices, numerosas transformações ocorreram.
Chegamos a 1998 com um percentual de votantes superior a 49% en-
quanto no início do século não chegava a 3% da população. Os pleitos
tornaram-se livres, e os resultados, que antes eram manipulados,
revelaram-se confiáveis. O Estado passou por acentuado processo
de urbanização. Em 1940, quando já havia decorrido meio século
de experimento republicano, 69,3% da população ainda vivia no
meio rural. Nos sessenta anos subsequentes, registraram-se grandes

349
Ibarê Dantas

deslocamentos para os centros urbanos de forma que, no ano 2000,


aquela situação havia se invertido, pois apenas 28,64% das pessoas
permaneciam no campo. A maior concentração realizou-se em torno
da capital. A grande Aracaju, envolvendo os municípios de São Cris-
tóvão e Nossa Sra. do Socorro, no fim do milênio, já se aproximava
de 700 mil habitantes. Isoladamente, a capital aumentou 28,2 vezes
no período 1890-2000.
A partir do início dos anos quarenta do século XX, a referida
urbe foi perdendo sua função portuária, mas se afirmou como centro
político-administrativo, econômico e cultural. Recebeu contingente
razoável de imigrantes, verticalizou-se em alguns bairros e desenvol-
veu amplo setor de serviços, que passou a contribuir majoritariamente
na formação do PIB estadual. Ao fim do milênio, manifestava-se uma
cidade heterogênea, dotada de um centro vistoso banhado pelo rio
Sergipe, grande parte da zona sul com boa apresentação, enquanto
quase toda a zona norte formava extenso aglomerado humano, ca-
recendo de maior infraestrutura.
Ao longo do século XX, adotamos, como a grande parte da
população mundial, novas formas de transporte (trem, automóvel,
avião) e comunicação (telefone, rádio, TV, Internet), transformando
hábitos e comportamentos. A modernidade trouxe numerosos be-
nefícios para as pessoas, acompanhando os progressos dos centros
mais civilizados. No aspecto material, adotamos a energia elétrica
em todo o Estado, passamos a dispor de água tratada. O saneamento
foi assimilado como uma necessidade básica. As grandes epidemias,
tão frequentes durante a Primeira República, praticamente foram
controladas. Os indicadores sociais avançaram. O atendimento nos
hospitais universalizou-se, melhorando as condições de saúde e bem-
-estar. As mulheres ocuparam enorme espaço na sociedade dentro
do processo de mobilidade social, diferenciação e laicização. Houve
grande liberação dos costumes, revolucionando os padrões sexuais.
Contudo, as desigualdades sociais permaneceram muito acentua-
das. A violência tornou-se um problema endêmico. Não conseguimos
erradicar o analfabetismo. É verdade que houve progressos. Se no

350
História de sergipe: república

início da República apenas 10,19% da população de cinco anos ou


mais sabiam ler e escrever, esse percentual aumentou para 76,5%
no ano 2000, computando apenas os de 15 anos ou mais. Foi um
avanço considerável, mas inferior à média nacional que foi de 87,2%.
Enquanto isso, surgiam novos problemas provocados pelo cresci-
mento da população. Desequilibramos o ecossistema. Dizimamos
quase toda nossa fauna e devastamos nossas florestas. As constan-
tes queimadas degradaram nosso solo. A poluição e as derrubadas
das matas ciliares afetaram a vitalidade dos rios. Quando os danos
ao meio ambiente foram se revelando ameaçadores ou mesmo de-
sastrosos, a sociedade começou a pressionar e os administradores
passaram a tomar algumas tímidas medidas, visando diminuir as
agressões à natureza.
Quanto às manifestações culturais, em todos os momentos apa-
receram permeadas de conotações políticas. No período 1890-1930,
observamos a predominância da sociedade em relação ao Estado. As
produções ocorreram dentro de uma comunidade tradicional, sob a
hegemonia de grupos privados reduzidos em número, mas expressivos
em poder. As iniciativas culturais dos intelectuais e artistas alcan-
çaram mais repercussão do que as ações do setor público. O Estado,
quando muito, atuava esporadicamente como mecenas, subsidiando
artistas ou estudantes e publicando obras. Em contrapartida o nível
de interferência política nas produções culturais parece ter sido o
menor em relação às fases subsequentes.
Num segundo período (1930-45), a situação inverteu-se com a pre-
dominância do Estado. Os governos foram interferindo no mercado
editorial e, numa segunda fase mais definidamente autoritária, passa-
ram a implementar política cultural envolvendo ensino, patrimônio
histórico, controle das informações, servindo para a montagem de
um Estado-nação de feição autoritária. No conjunto, foi um período
mais modesto em produções.
Na terceira fase (1946-64), o Estado perdeu terreno, mas conti-
nuou bastante presente no amplo setor cultural. A sociedade ganhou
dinamismo, tomou iniciativas variadas, entre as quais a tentativa de

351
Ibarê Dantas

construção de ambicioso projeto cultural nacional popular. Mas essa


vertente perdeu o embate político-ideológico.
Com a tutela militar (1964-82), gestou-se novo projeto sob os
auspícios do Estado, atualizando o modelo capitalista, orientando
as produções culturais para o mercado. Dentro desse novo contexto,
houve empenho de atender a demanda no ensino médio, com a cria-
ção de novos estabelecimentos. Nasceram a Universidade Federal de
Sergipe, o festival de São Cristóvão e os encontros culturais. As artes
receberam incentivos sem precedentes.
No período subsequente (1983-2000), o Estado retraiu-se um
pouco, mas numerosas agências ligadas ao campo artístico foram
institucionalizadas, envolvendo o poder público e grupos privados,
proporcionando-lhe respaldo e dinamismo. Num ambiente cada vez
mais globalizado, reforçando a lógica do mercado, novas escolas do
terceiro grau foram instaladas. As produções aceleraram-se diver-
sificadas em qualidade, mas, no conjunto, bastante enriquecedoras
nas ciências humanas, na literatura e nas demais artes. Entretanto,
o processo foi-se revelando contraditório. Se, de um lado, as mani-
festações culturais contribuíam para a construção da identidade dos
sergipanos através de suas realizações simbólicas mais expressivas,
de outro, enquanto a cultura local assimilava os padrões capitalistas
voltados para o consumismo, engendrava a massificação de bens
culturais, comprometendo a qualidade de parte das produções cada
vez mais inseridas no mercado internacionalizado e envolvente. Cer-
tos filmes, determinados programas de TV e alguns grupos musicais
contribuíram também para a exacerbação do ciclo de violência dos
anos noventa. Enquanto crescia o movimento de universalização da
cultura, internamente também se afirmavam as criações individuais
voltadas para expressar nossas diferenças e especificidades, traduzin-
do os sentimentos mais genuinamente locais. É certo que, nos planos
nacional e local, o desafio da sociedade de estender para todos as
novas potencialidades da era da informação permanecia candente.
Contudo, no cômputo geral, houve grande evolução criativa e, a
partir da educação, verificou-se inegável democratização dos bens

352
História de sergipe: república

culturais. Ao fim, podemos dizer que ao longo do período republicano,


as representações da identidade dos sergipanos sofreram algumas
oscilações. Num primeiro momento, que cobre a Primeira República,
o florescimento de uma plêiade de homens talentosos proporcionou
bastante júbilo aos seus cidadãos. A partir de 1930, houve um refluxo,
se bem que irregular, na vida intelectual e na economia, levando a um
sentimento de pessimismo sobre o seu papel no âmbito da federação.
Com o desenvolvimento do meio universitário, as revelações da ri-
queza do subsolo e a emergência de novo ciclo produtivo, conforme
observou o pensador Silvério Fontes (1999), os sergipanos passaram
a acreditar mais em suas potencialidades. Pode-se dizer, então, que
os quadros de seus pintores, as imagens de seus escultores, as letras
de seus compositores, as músicas de seus cantores, as danças de
seus bailarinos, a força dramática de seus atores, as representações
de seus prosadores, os versos dos seus poetas, as análises dos seus
cientistas, as relações dos cidadãos com o meio, o enfrentamento das
adversidades naturais e sociais, as lutas pela democracia, enfim as
obras dos habitantes de Sergipe foram a expressão mais significativa
de sua engenhosidade e de sua capacidade realizadora.

353
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tiva, Aracaju-Se, 1948-1994.
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411 e Indicadores Sociais de Sergipe, Aracaju, v.7, Instituto de Economia e Pesqui-
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Proposta Orçamentária para 1948. Aracaju: Secretaria da Fazenda, Produção e
Obras Públicas, 1947.
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Relatório de Gestão da UFS 1996-2000. São Cristóvão/SE: Fundação Oviêdo Tei-
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Salvador, Condese -Bureau Gráfica Editora, s/d.

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367
anexos

369
Ibarê Dantas

ANEXO I

REPÚBLICA (GOVERNANTES DE SERGIPE - 1889 – 2000)

Período de
Nome Profissão
Governo
15.11.1889 a
Tomás Rodrigues da Cruz (1852-1919) Empresário
17.11.1889
Antônio Diniz Dantas Melo Militar
17.11.1889 a
José Siqueira de Meneses (1852- 1931) Militar
18.11.1889
Antônio Siqueira Horta Proprietário Rural
Vicente Luís de Oliveira Ribeiro (1852-1895) Proprietário Rural
18.11.1889 a
Baltasar de Araújo Góis (1853-1914) Professor
02.12.1889
José Siqueira Meneses (1852- 1931) Militar
Baltasar de Araújo Góis (1853-1914) Professor 02.12.1889 a
José Siqueira Meneses (1852- 1931) Militar 13.12.1889
13.12.1889 a
Felisbelo Firmo de Oliveira Freire (1858-1916) Médico
17.08.1890
17.08.1890 a
Augusto César da Silva (1833-1918) Militar
04.11.1890
04.11.1890 a
Lourenço Freire de Mesquita Dantas (1848-1902) Juiz
25.12.1890
25.12.1890 a
Antonio Siqueira Horta Proprietário Rural
26.01.1891
26.01.1891 a
Luís Mendes de Morais Militar
28.05.1891
28.05.1891 a
Vicente Luís de Oliveira Ribeiro (1852-1895) Proprietário Rural
24.11.1891
Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel (1825-1909) Advogado
27.11.1891 a
Marcelino José Jorge (1860-1945) Militar
18.05.1892
Olindo Rodrigues Dantas (1861-1932) Médico
18.05.1892 a
José de Calazans (1863-1948) Militar
11.09.1894
11.09.1894 a
João Vieira Leite (1867-1902) Médico
24.10.1894
24.10.1894 a
Manoel Presciliano de O. Valadão (1849-1921) Militar
27.07.1896
27.07.1896 a
Antônio Leonardo Silveira Dantas (1858-1919) Padre
24.10.1896
24.10.1896 a
Martinho César da Silveira Garcez (1850-1918) Advogado
11.10.1897
11.10.1897 a
José Joaquim Pereira Lobo (1864-1933) Militar
20.03.1898
20.03.1898 a
Martinho César da Silveira Garcez (1850-1918) Advogado
08.04.1898
08.04.1898 a
Daniel de Campos (1855-1922) Médico
24.07.1898

370
História de sergipe: república

Período de
Nome Profissão
Governo
24.07.1898 a
Martinho César da Silveira Garcez (1850-1918) Advogado
14.08.1898
14.08.1899 a
Apulcro Motta (1857-1924) Jornalista
24.10.1899
24.10.1899 a
Olímpio de Sousa Campos (1853-1906) Padre
24.10.1902
24.10.1902 a
Josino Meneses (1866-1939) Farmacêutico
24.10.1905
24.10.1905 a
Guilherme de Sousa Campos (1850- 1923) Desembargador
10.08.1906
10.08.1906 a
João Maria Loureiro Tavares (1844-1910) Desembargador
28.08.1906
28.08.1906 a
Guilherme de Sousa Campos (1850-1923) Desembargador
24.10.1908
24.10.1908 a
José Rodrigues da Costa Dória (1859-1938) Médico
10.07.1909
10.07.1909 a
Manoel Batista Itajaí (1858-1918) Médico
13.11.1909
13.11.1909 a
José Rodrigues da Costa Dória (1859-1938) Médico
24.10.1911
24.10.1911 a
José de Siqueira Menezes (1852- 1931) Militar
29.07.1914
29.07.1914 a
Pedro Freire de Carvalho Proprietário Rural
24.10.1914
24.10.1914 a
Manuel Presciliano de Oliveira Valadão (1849-1921) Militar
24.10.1918
24.10.1918 a
José Joaquim Pereira Lobo (1864- 1933) Militar
24.10.1922
24.10.1922 a
Maurício Graccho Cardoso (1874-1950) Advogado
13.07.1924
Eurípedes Esteves de Lima (1884-?) Militar
Augusto Maynard Gomes (1886-1957) Militar 13.07.1924 a
João Soarino de Melo (1898-? ) Militar 02.08.1924
Manoel Messias de Mendonça (1894-?) Militar
02.08.1924 a
Maurício Graccho Cardoso (1874-1950) Advogado
24.10.1926
24.10.1926 a
Ciro Franklin de Azevedo (1858-1927) Diplomata
16.01.1927
05.03.1927 a
Manoel Correia Dantas (1874-1937) Usineiro
16.10.1930
16.10.1930 a
Eronildes Ferreira de Carvalho (1895- 1969) Militar
20.10.1930
20.10.1930 a
José de Calazans (1863-1948) Militar
04.11.1930
04.11.1930 a
Marcelino José Jorge (1860-1945) Militar
10.11.1930
10.11.1930 a
José de Calazans (1863-1948) Militar
16.11.1930

371
Ibarê Dantas

Período de
Nome Profissão
Governo
16.11.1930 a
Augusto Maynard Gomes (1886-1957) Militar
27.03.1935
27.03.1935 a
Aristides Napoleão de Carvalho Dentista
02.04.1935
02.04.1935 a
Eronildes Ferreira de Carvalho (1895- ) Militar
09.07.1941
09.07.1941 a
Milton Pereira de Azevedo Militar
27.03.1942
27.03.1942 a
Augusto Maynard Gomes (1886-1957) Militar
27.10.1945
27.10.1945 a
Francisco Leite Neto (1907-1964) Advogado
05.11.1945
05.11.1945 a
Hunald Santaflor Cardoso (1894-1973) Advogado
31.03.1946
31.03.1946 a
Antônio de Freitas Brandão Militar
30.01.1947
30.01.1947 a
Joaquim Sabino Ribeiro (1912-1981) Industrial
29.03.1947
29.03.1947 a
José Rolemberg Leite (1912-1996) Engenheiro
31.01.1951
31.01.1951 a
João Dantas Martins dos Reis (1884-1978) Desembargador
17.02.1951
17.02.1951 a
Edelzio Vieira de Melo (1909-1962) Médico
12.03.1951
12.03.1951 a
Arnaldo Rolemberg Garcez (1911-2010 ) Prop. Rural
31.01.1955
31.01.1955 a
Leandro Maynard Maciel (1897-1984) Engenheiro
31.01.1959
31.01.1959 a
Luiz Garcia (1910-2001) Advogado
06.06.1962
06.06.1962 a
Dionísio de Araújo Machado Proprietário Rural
30.01.1963
30.01.1963 a
Horácio Dantas de Góis (1914-1998) Proprietário Rural
31.01.1963
31.01.1963 a
João de Seixas Dória (1917-2012 ) Advogado
01.04.1964
02.04.1964 a
Sebastião Celso de Carvalho (1923-2009) Advogado e empresário
31.01.1967
31.01.1967 a
Lourival Batista (1915-2013) Médico
14.05.1970
14.05.1970 a
Volney Leal de Melo (1921-1995) Empresário
04.06.1970
04.06.1970 a
João Andrade Garcez (1926-2001) Dentista
15.03.1971
15.03.1971 a
Paulo Barreto de Menezes (1925-2016) Engenheiro Civil
15.03.1975

372
História de sergipe: república

Período de
Nome Profissão
Governo
Engenheiro de Minas e 15.03.1975 a
José Rolemberg Leite (1912-1996)
Proprietário Rural 15.03.1979
15.03.1979 a
Augusto do Prado Franco (1912-2003) Médico e Empresário
14.05.1982
14.05.1982 a
Djenal Tavares de Queiroz (1916-1997) Militar e Prop. Rural
15.03.1983
Engenheiro Civil e 15.03.1983 a
João Alves Filho (1941-2020)
Empresário 15.03.1987
15.03.1987 a
Antônio Carlos Valadares (1943- ) Químico e Advogado 15.03.1991

Engenheiro Civil e 15.03.1991 a


João Alves Filho (1941-2020)
Empresário 01.01.1995
01.01.1995 a
Albano do Prado Pimentel Franco (1940- ) Advogado e Empresário
01.01.2003
Engenheiro Civil e 01.01.2003 a
João Alves Filho (1941- 2020)
Empresário 01.01.2007
Marcelo Déda Chagas (1960-2013) Advogado 01.01.2007 a
02.12.2013
Jackson Barreto de Lima Advogado 03.12.2013-
06.04.2018
Belivaldo Chagas Advogado 07.04.2018

Obs. Várias datas de nascimento e morte dos presidentes do Estado foram fornecidas pelo pesquisador
Jackson da Silva Lima, a quem agradecemos.

373
Ibarê Dantas

ANEXO II

SENADORES DA REPÚBLICA - SERGIPE

Mandato
Nome completo Partido
Início Fim
01/02/1982 31/01/1991
Albano do Prado Pimentel Franco PFL
01/02/1991 31/12/1994
Albino Silva da Fonseca PMDB 22/07/1959 30/09/1959
01/02/1995 31/01/2003
Antônio Carlos Valadares PSB
01/02/2003 31/01/2019
Augusto César Leite PR 02/05/1935 10/11/1937
Augusto César Lopes Gonçalves 26/04/1924 11/10/1930
01/02/1955 12/08/1957
Augusto Maynard Gomes PSP
02/03/1947 31/01/1951
Augusto do Prado Franco PDS 01/02/1971 31/01/1979
Durval Rodrigues da Cruz PR 19/09/1946 31/01/1955
Dylton Augusto Rodrigues da Costa ARENA 1963
Francisco Guimarães Rollemberg PMDB 1987 1995
Francisco Leite Neto PSD 01/02/1963 10/12/1964
Gilberto de Lima Azevedo Souza F. Amado de Faria PR 21/04/1927 11/11/1930
Gonçalo de Faro Rollemberg 01/05/1918 31/01/1926
Guilherme de Souza Campos PCO 28/10/1909 31/01/1917
Heribaldo Dantas Vieira ARENA 01/02/1959 31/01/1967
Heráclito Guimarães Rollemberg PDS 17/06/1985 14/10/1985
Jorge Campos Maynard UDN 30/08/1957 31/01/1963
José Almeida Lima PDT 01/02/2003 31.01.2011
José Alves do Nascimento PFL 01/02/1995 31/01/1999
José Eduardo de Barros Dutra PT 01/02/1995 02/01/2003
07/05/1923 21/04/1930
José Joaquim Pereira Lobo 21/04/1930 11/11/1930
24/12/1914 1918
14/06/1897 18/05/1906
José Luiz Coelho e Campos PR 15/11/1890 14/06/1897
18/05/1906 30/09/1913
José Rollemberg Leite ARENA 08/02/1965 31/01/1971
José Siqueira Menezes PR 24/04/1915 31/12/1923
João Gilvan Rocha PP 1975 1982
03/02/1963 31/01/1971
Júlio César Leite PR/ARENA
10/03/1951 31/01/1959

374
História de sergipe: república

Mandato
Nome completo Partido
Início Fim
01/02/1967 31/1/1975
Leandro Maynard Maciel ARENA
04/05/1935 09/11/1937
Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel PP 18/05/1894 31/01/1903
01/02/1979 31/01/1987
Lourival Baptista PFL 01/02/1987 31/01/1995
1970 1978
Lourival Fontes PTB 01/02/1955 31/01/1963
Manoel Elias de Santana PFL 25/02/2003
02/05/1919 10/11/1921
Manoel Presciliano de Oliveira Valladão PR 27/05/1907 22/04/1912
1912 1914
Manoel da Silva Rosa Júnior 15/11/1890 31/01/1900
Maria do Carmo do Nascimento Alves PFL 01/02/1999 31/01/2022
Partido
Martinho Cézar da Silveira Garcez Constitucional 07/05/1900 31/01/1909
Sergipano
Maurício Gracho Cardoso PR 15/05/1922 03/05/1950
Moacyr Sobral Barreto PR
Olímpio de Souza Campos Partido Católico 23/04/1903 9/11/1906
Pedro Diniz Gonçalves Filho 01/06/1951 30/09/1951
Serapião de Aguiar Mello PR 05/05/1914 31/01/1915
Thomaz Rodrigues da Cruz PR 15/11/1890 1893
Valdiolanda Teófilo Assis Nunes Leite PT 03/01/2003 31/01/2003
Walter do Prado Franco UDN 19/09/1946 31/01/1955

Fonte: Senado Federal. Subsecretaria de Arquivo

375
Ibarê Dantas

ANEXO III

DEPUTADOS FEDERAIS POR SERGIPE (1891-2000)

1891-1893: Ivo do Prado, Manuel Presciliano de Oliveira Valadão, Leandro Ribeiro de Siqueira
Maciel, Felisbelo Oliveira Freire, Olímpio Souza Campos.
1894-1896: Olímpio Souza Campos, Antônio Alves de Gouveia Lima, Geminiano Brasil de
Oliveira Góis, Manoel José de Menezes Prado.
1897-1899: Felisbelo Oliveira Freire, Olímpio Souza Campos, Geminiano Brasil de Oliveira
Góis, José Rodrigues da Costa Dória.
1900-1902: Rodrigues Dória, Sílvio Romero, Fausto Cardoso, Joviniano Joaquim de Carvalho.
1903-1905: Rodrigues Dória, Felisbelo Freire, Joviniano de Carvalho, Oliveira Valadão.
1906-1908: Rodrigues Dória, Joviniano de Carvalho, Fausto Cardoso e substituído por Josino
Menezes, Oliveira Valadão assumiu cadeira no Senado e foi substituído por Manoel Bonfim.
1909-1911: Joviniano de Carvalho, Rodrigues Dória, Gumercindo Bessa, Antônio Pedro da Silva
Marques, falecido em 09.11.1909 e substituído por Felisbelo Freire.
1912-1914: Joviniano de Carvalho, Felisbelo Freire, Antônio Dias de Barros, João de Siqueira
Cavalcanti, falecido em 01.06.1912 e substituído por Moreira Guimarães.
1915-1917: Antônio Dias Rolemberg, Gilberto Amado, Felisbelo Freire faleceu em 07.05.1916 e
foi substituído por Espiridião Ferreira Monteiro 1916-1917.
1918-1920: João Menezes, Deodato Maia, Manoel Nobre, Rodrigues Dória.
1921-1923: Gilberto Amado, Carvalho Neto, Ivo do Prado, Graccho Cardoso renunciou em 1922
para ir para o Senado e foi substituído por Gentil Tavares.
1924-1926: Gilberto Amado, Carvalho Neto, Gentil Tavares, Batista Bittencout.
1927-1929: Graccho Cardoso, Gentil Tavares, Batista Bittencout, Luiz Rolemberg.
1930-1932: Legislatura dissolvida em 1930. Leandro Maciel, Gildo Amado, Graccho Cardoso,
Humberto Dantas.
1933-1934: Constituinte: Deodato Maia, Rodrigues Dórea.
1935-1937: Deodato Maia, Melchisedech Amado, Amando Fontes, José Barreto Filho. Dissolvida
em 1937.
1946-1950: Leandro Maciel, Amando Fontes, Heribaldo Vieira, Leite Neto, Graccho Cardoso,
Carlos Waldemar Acioli Rollemberg, Godofredo Diniz.
1951-1954: F. Leite Neto, Carvalho Neto, Leandro Maciel, Luiz Garcia, Francisco de Araujo
Macedo, Orlando Dantas e Amando Fontes.
1955-1958: F. Leite Neto, Francisco de Araujo Macedo, Armando Leite Rolemberg, Walter do
Prado Franco, José Conde Sobral, Seixas Dória e Luiz Garcia.
1959-1962: Lourival Batista, Passos Porto, Seixas Dória, Euvaldo Diniz, F. Leite Neto, Armando
Rolemberg e Arnaldo Garcez.
1963-1966: Euclides Paes Mendonça (faleceu em 1963) foi substituído por F. de Araujo Macedo,
Arnaldo Garcez, Lourival Batista, João Machado Rolemberg, Euvaldo Diniz, Armando Rolem-
berg e José Carlos Teixeira.
1967-70: Augusto do Prado Franco, Arnaldo Rollemberg Garcez, Raimundo Menezes Diniz, João
Machado Rolemberg Mendonça, Luiz Garcia, José Passos Porto, José Carlos Mesquita Teixeira.
1971-1974: Francisco Guimarães Rollemberg, Luiz Garcia, Raimundo Diniz, José Passos Porto,
Eraldo Machado Lemos.

376
História de sergipe: república

1975-1978: Raimundo Meneses Diniz, Sebastião Celso de Carvalho, Francisco Guimarães


Rollemberg, José Passos Porto, José Carlos Mesquita Teixeira.
1979-1982: Antônio Carlos Valadares optou pela Secretaria de Educação e foi substituído por
Adroaldo Campos Filho (1º suplente), Francisco Guimarães Rollemberg, Raimundo Menezes
Diniz, Sebastião Celso de Carvalho, Jackson Barreto de Lima, Tertuliano Azevedo.
1983-1986: Augusto do Prado Franco, Francisco Guimarães Rollemberg, Hélio Dantas, José
Gilton Pinto Garcia, Sebastião Celso de Carvalho, José Carlos Mesquita Teixeira, Jackson
Barreto de Lima.
1987-1990: Antonio Carlos Leite Franco, Acival Gomes Santos, João Bosco França Cruz, Djenal
Goncalves Soares, José Cleonâncio da Fonseca, Manoel Messias de Góis, José Queiroz da Costa,
João Machado Rollemberg Mendonça. Suplentes que assumiram temporariamente Leopoldo
de Araújo Souza Neto, Gerson Vilas Boas.
1991-1994: Pedro Almeida Valadares Neto, Jerônimo de Oliveira Reis, Manuel Messias Gois,
Benedito de Figueiredo, Jose Teles de Mendonça, Djenal Gonçalves Soares, José Everaldo de
Oliviera, José Cleonâncio da Fonseca.
1995-1998: José Cleonâncio da Fonseca, Jerônimo de Oliveira Reis, Manuel Teles de Mendonça,
João Bosco França Cruz, Carlos Magno Costa Garcia, Adelson Rosendo Lima Ribeiro, Marcelo
Déda Chagas, José Wilson Cunha.
1999-2002: José Cleonâncio da Fonseca, José Teles de Mendonça, Sérgio Reis, Marcelo Déda
Chagas (substituído por Tânia Soares em 2001), Ivan Paixão, Pedrinho Valadares, Jorge Alberto,
Augusto Franco Neto.
2003-2006: Bosco Costa, José Carlos Machado, Jackson Barreto, Jorge Alberto, Mendonça
Prado, Pastor Heleno, Cleonâncio Fonseca, João Fontes.
2007-2010: Jackson Barreto, Iran Barbosa, Albano Franco, Valadares Filho, Eduardo Amo-
rim, José Carlos Machado, Jerônimo Reis.
2011-2014: Valadares Filho, Mendonça Prado, Andreé Moura, Laércio Oliveira, Almeida
Lima, Pastor Heleno, Marcio Macedo, Fábio Reis.
2015-2018: Adelson Barreto, Laércio Oliveira, Fábio Mitidieri, Fábio Reis, Valadares Filho,
Pastor Jony, João Daniel, Mendonça Prado.
2015-2022: Fábio Mitidieri, Laércio Oliveira, Fábio Reis, Gustinho Ribeiro, João Daniel, Bos-
co Costa, Valdevan Noventa (cassado e substituído por Márcio Macedo), Pastor Jony, Pastor
Antonio, Fábio Henrique.

Fonte: TRE: 100 anos de Eleições em Sergipe. Aracaju, TRE, 2002, TSE.

377
Ibarê Dantas

ANEXO IV

PERIÓDICOS DE SERGIPE (1890-1930)

Quantidade
Nome Período
de Números
1. Revista Literária 34 1890-91
2. Caderneta Jurídica 01 1898
3. Cenáculo 05 1902
4. A Revistinha 13 1905-?
5. Revista Agrícola 92 1905-08
6. A Trombeta – Revista Humorística, Literária, Crítica e Ilustrada 08 1907
7. A Redempção 06 1907
8. Revista Forense do Estado de Sergipe: doutrina jurisprudência
16 1907-9
e legislação
9. Revista do Brasil 03 1908-10
10. Revista Médica de Sergipe 01 1911
11. A Onda 06 1912
12. Revista D’arte e Propaganda – Vida Sergipana 04 1912
13. A Diocese de Aracaju – Órgão Oficial 13 1912
14. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe 17 1912-29
15. A Sergipana 06 1914-15
16. Heliantho 06 1924
17. A Semana 03 1924
18. Revista de Sergipe 12 1928-29
19. Sergipe Judiciário 19 1928-30
20. Mercúrio 119 1928-30

378
História de sergipe: república

PERIÓDICOS DE SERGIPE -1931-1945

Quantidade
Nome Período
de Números
1. Revista da Academia Sergipana de Letras 09 1931-43
2. Lírio Mariano 01 1936
3. Revista de Aracaju 02 1943-44
4. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe 04 1939-45
5. Renascença 05 1935-36
6. Renovação 34 1931-34
7. Revista de Sergipe 01 1936
8. Sergipe Artífice 13 1934-45

PERIÓDICOS DE SERGIPE –1946-1963

Quantidade
Nome Período
de Números
1. Alvorada: Revista de Difusão Literária Artística e Esportiva 07 1946-51
2. Época 03 1948-49
3. Vida Nova 02
4. Revista da Academia Sergipana de Letras 10 1946-62
5. Revista da Associação Sergipana de Imprensa* 06 1949-63
6. Revista da Faculdade Católica de Filosofia 01 1961
7. Revista de Aracaju 02 1943-44
8. Revista de Faculdade de Direito 10 1953-6
9. Revista de Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe 08 1948-61
10. Revista Sergipana de Contabilidade 03 1953
11. Sergipe Rodoviário 01 1956
* A revista da Associação Sergipana de Imprensa, até o número 2, intitulava-se Poliantéa.

379
Ibarê Dantas

PERIÓDICOS DE SERGIPE – 1964-1982

Quantidade
Nome Período
de Números
1. Artes de Jovens 10 1968-72
2. Boletim do Ministério Público 145 1971-82
3. Cadernos de Folclore Sergipano 05 1976
4. Cadernos Sergipanos de Geografia 06 1978-80
5. Momento: Revista Cultural da Gazeta de Sergipe 19 1976-79
6. Revista Alvorada 29 1972-82
7. Revista da Academia Sergipana de Letras 06 1969-81
8. Revista da Faculdade de Direito 02 1970-71
9. Revista da Faculdade de Filosofia de Sergipe 01 1967
10. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe 03 1965-82
11. Revista da Universidade Federal de Sergipe 02 1979-80
12. Revista Sergipana da Cultura 02 1977-78
13. Revista Sergipana do Folclore 03 1976-79
14. Síntese 06 1969-77

380
História de sergipe: república

PERIÓDICOS DE SERGIPE – 1983-2000

Quantidade
Nome Período
de Números
1. Agenda 03 1993
2. Aracaju Magazine 54 1996-2000
3. Boletim do Ministério Público 45 1983-87
4. Cabeça de Negro 02 1993
5. Caderno de Cultura do Estudante – UFS 11? 1985-1999
6. Cadernos da UFS – Comunicação 04 1995-97
7. Cadernos da UFS – Economia 01 1999
8. Cadernos da UFS – História 04 1995-97
9. Cadernos de Arqueologia 13 1997-98
10. Cadernos de Cultura Popular 06 1983-84
11. Cadernos de Extensão – UFS 04 1995-97
12. Cadernos de Geografia 13 1991
13. Cadernos do CECH –UFS 01 1991
14. Candeeiro – Política e Cultura – Revista da Seção Sindical dos 03 1998-99
Docentes da UFS
15. ECOS – Ensaios Econômicos e Sociais – IESAP 02 1987-8
16. Educar-se 03 1996-97
17. Fragmenta- Revista da Faculdade de Direito da Tiradentes 01 1984
18. Fragmenta- Revista da Faculdade de Direito da Tiradentes 04 1986-98
19. GeoNordeste – UFS 14 1984-2000
20. Hora de Estudo – Sistema Municipal de Ensino em Aracaju 05 1997-2000
21. Nordeste Hoje* 04 1985-86
22. Philosphica. Revista de Filosofia da História e Modernidade 01 2000
23. Revista da Academia Sergipana de Letras 05 1990-99
24. Revista Alvorada 26 1983-88
25. Revista da Pós-Graduação de Educação – Educação e 01 1995
Informática UFS
26. Revista da Procuradoria Geral do Estado 01 1993
27. Revista da Secom: Sergipe Trabalha 13 1993
28. Revista de Aracaju 01 1985
29. Revista do Curso de Direito 01 1991
30. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe 07 1965-99
31. Revista do Mestrado de Educação – UFS 01 1998
32. Revista do Ministério Público 15 1991-99

381
Ibarê Dantas

Quantidade
Nome Período
de Números
33. Revista do Poder Judiciário 03 1996-97
34. Revista dos Municípios 02 1985-91
35. Sergipe Hoje 03 1985
36. Sergipe SA: Negócios e Atualidade 23 1999-2000
37. Tomo – Revista do NPPCS – UFS 02 1998-99
38. Turismo & Lazer em Revista 06 1986-91
39. UNIPÊ 03 1997-98
Obs. A revista Nordeste Hoje representou a continuidade de Sergipe Hoje. Foi editada pelo governo do Estado
com fins promocionais.

Fontes: (1) Dados coletados pelo autor no Instituto Histórico Geográfico de Sergipe e na Biblioteca Ephifânio
Dória. (2) Jorge Carvalho do Nascimento e Itamar Freitas. A Revista em Sergipe. Revista de Aracaju. Aracaju:
FUNCAJU, Ano LIX, n. 9, 2002, 169-187.

382
História de sergipe: república

ANEXO V

AMOSTRA DE DISCOS DE MÚSICA POPULAR


DE CANTORES SERGIPANOS (1983-2000)

Produtor Nome do Disco


Antonio Carlos du Aracaju Pássaro LP
Cataluzes Viagem Cigana LP
Paulo Lobo, Irineu e Lula Ribeiro Cajueiro dos Papagaios LP
Rogério Água do Azul LP
Funcaju Aracaju para Cantar LP
Emsetur Aracaju Estação Sedução LP
Chico Queiroga Cor de Laranja LP
Amorosa Iluminada LP
Amorosa Brejeira CD
Joésia e Outros Êta Nóis CD
TV Sergipe Canta Nordeste LP
Valter Nogueira Sem Despedida LP
Alvino Argolo Nordestinadas Brasileiras CD
Antonio Carlos du Aracaju Genuinamente Brasileiro CD
Banda Java Além da Crítica CD
SEC Aracaju Canta Aracaju CD
Doca Furtado Vento Cai CD
Lula Ribeiro Sono de Dolores CD
Antonio Rogério Serpente CD
Joésia Ramos De Passagem CD
Rubens Lisboa Assim Meio de Lua CD
Ismar Barreto Tremendamente Sacana CD
Anderson Lind Lirismo Amargo CD
Minho San Liver Bem CD
Antonio Carlos du Aracaju Minha Terra é Sergipe CD
Chico Queiroga Pálpebras CD
Sena Canto dos Pássaros CD
Mingo Santana Som das Araras CD
Sena Cantoria CD
Paulo Lobo Ruas de Ará CD
Tom Robson Aventuras CD
Nery Na Ponta do Lápis CD
Chiko Queiroga e Antônio Rogério Ao Vivo CD
Vários Canto da Terra CD
Vários Fruto da Terra CD
Fonte: Cf. Antônio Alves do Amaral e Wellington dos Santos (irmão). Alguns Aspectos Sobre a Música Popu-
lar Sergipana. Sergipe Artístico e Monumental. Aracaju: SEC, Sebrae, Emsetur, BB, BN, 2000, p 43-46.

383
Ibarê Dantas

ANEXO VI

AMOSTRA DE PRODUÇÕES CINEMATOGRÁFICAS


DE SERGIPANOS (1966-1982)

Nome Direção Roteiro Ano Bitola Tempo


Mercado Vinicius Dantas Vinicius Dantas 1966 8 mm 4’
Nosso Tempo de Pesquisa Leonardo Alencar Leonardo Alencar 1966 8 mm 12’
OH Que Delícia de Cidade Vinicius Dantas Vinicius Dantas 1966 8mm 4’
Todos Animais do Mundo Vinicius Dantas Vinicius Dantas 1966 8mm 4’
Vampiro Vinicius Dantas Vinicius Dantas 1966 8 mm 4’
Crase Hunald de Alencar Hunald de Alencar 1967 8 mm 2’
Formação das Palavras Hunald de Alencar Hunald de Alencar 1967 8 mm 2’
Pistoleiros da Morte Eduardo Cabral 1968 8 mm
O Declínio Vinicius Dantas Vinicius Dantas 1969 16 mm 7’
Dia Novo Vinicius Dantas Vinicius Dantas 1969 16 mm 2’
A Esfera Vinicius Dantas Vinicius Dantas 1969 8 mm 10’
Fantasia Augusto César Augusto César 1969 8 mm 4’
Macieira Macieira
Momento Vinicius Dantas Vinicius Dantas 1969 16 mm 2’
Batalha de Busca-Pés Evaldo Costa Evaldo Costa 1970 8 mm 20’
Cantadores de Viola Michael Tacher Luiz Antonio 1971 16 mm 8’
Barreto
Adauto Machado, Evolução Djaldino Mota Djaldino Mota 1972 8 mm 3’
Moreno Moreno
Badoque Jairo de Araújo Jairo de Araújo 1972 8 mm 3’ e 5”
Andrade Andrade
Boom Augusto César 1972 8 mm 2’
Macieira
Caranguejo Valfran Soares Osmário Antonio 1972 Sup.8 3’
Santos
A Ética, 3 min.:O Faraó Vinicius Dantas 1972 8 mm 7’ e 10”
Hiro, Esparsos, só isso Djaldino Mota Djaldino Mota 1972 8 mm 2
Moreno Moreno
Luta Newton Menezes Newton Menezes 1972 8 mm 3’ e 55”
A Morte do Templo Marcos Prado Dias Angela Maria Dias 1972 Sup. 8 7’
Uma vez, em Olduvai Hunald Alencar Hunald Alencar 1972 8 mm 4’
A Farinhada José Freire de José Freire de 1973 Sup. 8 7’
Oliveira Oliveira
Feliciana, A Artesã de Djaldino Mota Djaldino Mota 1973 Sup. 8 5’
Carrapicho Moreno Moreno

384
História de sergipe: república

AMOSTRA DE PRODUÇÕES CINEMATOGRÁFICAS DE SERGIPANOS (1966-1982)

Nome Direção Roteiro Ano Bitola Tempo


Judite Edvaldo de Assis Edvaldo de Assis 1973 Sup. 8 5’ e 30”
Muié Rendeira Augusto César Augusto César Macieira 1973 Sup. 8 4’ e 30”
Macieira
Pesadelo Thales Pinna Roberto Melo 1973 Sup.8 2’
Dantas
II Festival de Arte de Jairo Andrade Jairo Andrade 1973 16 20
São Cristóvão
Tô te Ajeitando Marcos Prado Wagner da Silveira Ribeiro 1973 Sup. 8 7’ e 40”
Dias
Cotidiano Jorge Alberto Jorge Alberto Moura 1974 Sup.8 7’ e 25”
Moreno
A Humanização da Carlos Nobre José Anselmo de Oliveira 1974 16 mm 12’
Técnica Cruz
Inácio, sua vida e Maria Anamira Airton Machado 1974 Sup. 8 7’
sua arte Batalha Amado
Neta
Psico-Deus Diomedes Santos Diomedes Santos da Silva 1974 Sup.8 7’ e 50”
da Silva
São Cristóvão, o Carlos Nobre José Gouveia do Couto 1974 Sup. 8 10’
passado marcando Cruz
o presente
Taieira, na festa de Jairo Andrade Beatriz Góis Dantas 1974 16mm 10’
São Benedito
Zabumba de Justino Alves Justino Alves Lima 1974 Sup.8 7’
Quendera Lima
Perdão, já era Marcos Prado Lúcio Prado Dias 1975 Sup.8 5’
Dias
Cultura Popular em Djaldino Mota Djaldino Mota Moreno 1975 Sup. 8 17’
Laranjeiras Moreno
I Encontro Cultural Marcos Aurélio 1976 Sup 8 13’
de Laranjeiras Prado Dias
Réquim (A Grande Augusto César Augusto César Macieira 1976 Sup 8 11’
Missa dos Mortos) Macieira
A Dança de São Augusto César Beatriz Góis Dantas 1977 Sup.8 12’
Gonçalo Macieira
O Enterro do Marcos Sergipe e Marcos Sergipe e Virgílio 1977 Sup.8 10’
Celulóide Virgílio
O Caçador de Almas Jorge Lins de Jorge Lins de Carvalho 1978 Sup.8 18’
e Jardins Azuis Carvalho
Modernismo Hunald Alencar Hunald Alencar 1978 Sup.8 30’
Momento M Grupo Fase 1978 Sup.8 3’
Taieira na Festa de Djaldino Mota Djaldino Mota Moreno 1978 Sup.8 16’
Reis Moreno

385
Ibarê Dantas

AMOSTRA DE PRODUÇÕES CINEMATOGRÁFICAS DE SERGIPANOS (1966-1982)


(continuação)

Nome Direção Roteiro Ano Bitola Tempo


Alerta Geral Justino Alves Lima Justino Alves Lima 1979 Sup.8 10’
O Barroco: Gregório Hunald de Alencar Hunald de Alencar 1979 Sup.8 12’
de Matos
Carro de Bois Floriano Santos Floriano Santos Fonseca 1979 Sup.8 17’
Fonseca
José de Tal, ex-futuro Jorge Alberto Jorge Alberto Moura 1979 Sup.8 17’
cidadão Moura
Perdiquem: Jorge Linas 1979 Sup.8 12’
civilização de reis
São João: Povo em Marcelo Déda Marcelo Déda Chagas 1979 Sup.8 12’
Festa Chagas
Arcanos (O Jogo) Yoya Wurch Yoya Wurch 1980 Sup.8 8’
O Beijo Yoya Wurch Yoya Wurch 1980 Sup.8 7’
Feirinha de Natal Djaldino Mota Djaldino Mota Moreno 1980 Sup.8 15’
Moreno
João Imigrante Cecílio Marinho Cecílio Marinho 1980 Sup.8 13’
Sacramento Sacramento
Um minuto de Hunald de Alencar Hunald de Alencar 1980 Sup.8 1’
Sergipe: Gênese
Um minuto de Hunald de Alencar Hunald de Alencar 1980 Sup.8 1’
Sergipe: Libertação
Transferência Jorge Alberto Jorge Alberto Moura 1980 Sup.8 13
Moura
O Retrato José Dalmo Wilson Ribeiro 1981 Sup.8 12’
Vadeia dois- dois Jairo Andrade Jairo Andrade 1981 Sup.8 11’
Um Calçadão na Djaldino Mota Djaldino Mota Moreno 1982 Sup.8 10’
Doce Província de Moreno
Sergipe Del Rey
Procissão dos Aflitos Marcelo Déda Elieze Santos Silva 1982 Sup.8 10’
Chagas Marcelo Déda Chagas
O tirador de cocos João Freire Amado João Freire Amado 1982 Sup.8 8’
e Carlos Alberto
Bittencourt
Fonte: Djaldino Mota Moreno. Cinema Sergipano Catálogo de Filmes. Aracaju, BANESE, 1988

386
História de sergipe: república

ANEXO VII

EMISSORAS DO ESTADO DE SERGIPE (ANO 2000)

Frequência /
Razão Social Nome Fantasia Cidade Proprietário
Indicativo
TV
Tv Aperipê 55,25 MHz Governo do
Fundação Aperipê Ltda Aracaju
Tve Canal 2 ZYB832 Estado
Tv Canção Igreja
Fundação João Paulo II 211,25 Aracaju
Nova Católica
Tv Sergipe 67,25MHz Albano
Rádio e Televisão de Sergipe SA Aracaju
Globo-4 ZYB 830 Franco
Tv Atalaia 181,25 MHz Walter
Televisão Atalaia Ltda Aracaju
SBT 8 ZYB 831 Franco
RTV
Tv Record 495,25 MHz Igreja
Rádio e Televisão Record SA Aracaju
Canal 18 ZYB 854 Universal
Televisão Independente de São José Rede Vida 621,25MHz Igreja
Aracaju
do Rio Preto Ltda Canal 39 ZYB 886 Católica
FM
99,7 MHz Heráclito
Rádio Liberdade de Sergipe Fm Ltda Liberdade Fm Aracaju
ZYD 786 Rolemberg
95,9 MHz Albano
Rádio Televisão de Sergipe SA Fm Sergipe Aracaju
ZYD 781 Franco
Empresa Sergipana de Rádio 103,1 MHz
103 Fm Aracaju Grupo Cosil
Difusão Ltda ZYD
104,9MHz Governo do
Rádio Aperipê Fm de Sergipe Aperipê Fm Aracaju
ZYD 796 Estado
Walter
Rádio Atalaia Ltda Fm Atalaia 93,5 MHz Aracaju
Franco
98,1 MHz Igreja
Rádio e Televisão Aracaju Ltda Fm Jornal Aracaju
ZYD 784 Universal
88,7 MHz
Rádio Fm Aracaju Ltda Delmar Fm Aracaju Grupo Cosil
ZYD 790
89,5 MHz Barra dos
Rádio Fm da Ilha Ltda Fm Ilha João Alves
ZYD 797 Coqueiros
Empresa Boquinhense de 95,5 MHz Grupo
Lagamar Fm Boquim
Comunicação Ltda ZYD 795 Fonseca
Canindé Luiz
98,7 MHz
Rádio Xingó Ltda Rádio Xingó de São Eduardo
ZYD 792
Francisco Costa
Ouro Negro 94,3 MHz Heráclito
Rádio Carmópolis Ltda Carmópolis
Fm ZYD 788 Rolemberg
94,1 MHz
Rádio Jornal de Estância Ltda FM Jornal Estância João Alves
ZYD 787

387
Ibarê Dantas

Frequência /
Razão Social Nome Fantasia Cidade Proprietário
Indicativo
Rádio Fm Itabaiana Ltda Itabaiana Fm 93,1 Mhz Itabaiana José Carlos
Zyd 793 Machado
Rádio Fm Princesa Ltda Fm Princesa 99,3 Mhz Itabaiana José Queiroz
Zyd 794
Rádio Eldorado De Lagarto Ltda Fm Eldorado 100,7 Mhz Lagarto Grupo
Zyd 782 Ribeiro
Rádio Fm Aparecida do Nordeste Fm Aparecida 94,7 Mhz Lagarto ?
Ltda Zyd 785
Rádio Jornal de Propriá Ltda Fm Jornal 99,1 Mhz Propriá João Alves
Zyd 783
Empresa Sergipana de Rádio Difusão Tropical Fm 104,3 Mhz Simão Dias Grupo
Ltda Valadares
Am-0M
Fundação Aperipê de Sergipe Rádio Aperipê 630 Khz Aracaju Governo do
Zyj 920 Estado
Rádio Atalaia de Sergipe Ltda Rádio Atalaia 770 Khz Aracaju Walter
Zyj 922 Franco
Rádio Cultura de Sergipe Ltda Rádio Cultura 670 Khz Aracaju Igreja
Zyj 921 Católica
Rádio Jornal de Sergipe Ltda Rádio Jornal 540 Khz Aracaju João Alves
Zyj 924
Rádio Liberdade de Sergipe Ltda Rádio 930 Khz Aracaju José Almeida
Liberdade Zyj 923 Lima
Fundação de Educação e Cultura Rádio 1.250 Khz Estância Jorge do
Esperança Zyj 925 Prado Leite
Rádio Educadora de Frei Paulo Rádio 1.440 Khz Frei Paulo José
Educadora Zyj 930 Erinaldo
Rádio Princesa da Serra Ltda Rádio Princesa 830 Khz Itabaiana José Queiroz
Da Serra Zyj 926
Rádio Voz de Itabaiana Rádio Voz de 1.540 Khz Itabaiana Grupo Chico
Itabaiana Zyj 929 de Miguel
Rádio Progresso Ltda Rádio 750 Khz Lagarto Grupo Reis
Progresso Zyj 927
Rádio Atalaia de Sergipe Ltda Rádio Cidade 1.480 Khz Simão Dias Walter
Zyj 928 Franco
Rádio Imperatriz dos Campos Ltda Rádio 1.520 Khz Tobias João Alves
Imperatriz dos Zyj 931 Barreto
Campos
Fonte: Dentel. Os proprietários foram identificados por Alceu Monteiro que nos forneceu os dados desta
relação.

388
Este livro foi composto na tipologia Andada /Bebas Neue
e impresso em papel offset 75g/m2
História de sergipe: república

391

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