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Concepções e Práticas
Interprofessional Education in Health: Concepts and Practices
Nildo Alves Batista1
1 Professor Titular. Departamento de Saúde, Educação e Sociedade. Universidade Federal de São Paulo, Santos, SP, Brasil.
Neste ponto, poderíamos questionar: do outro como parceiro legítimo na construção de co-
nhecimentos, com respeito pelas diferenças num movi-
• Os Cursos de Graduação em Saúde no Brasil tem mento de busca, diálogo, desafio, comprometimento e
se comprometido com o desenvolvimento de pro- responsabilidade são componentes essenciais.
fissionais para trabalho em equipe? Esta estratégia tem como pressupostos educacio-
• Como preparar os estudantes para o trabalho na nais a aprendizagem de adultos (aprende-se quando se
perspectiva da integralidade do cuidado? vê significado, considera-se o conhecimento prévio de
• Como propiciar melhor conhecimento dos estu- aprendiz e percebe-se aplicabilidade no que se apren-
dantes sobre as especificidades de diferentes pro- de), a aprendizagem baseada nas interações e a aprendi-
fissões de saúde? zagem baseada na prática (movimentos de observação,
simulação, ação).
Apesar de óbvias, estas preocupações não têm sido A EIP se compromete com o desenvolvimento de três
objeto de novas propostas de formação profissional no competências - competências comuns a todas as pro-
Brasil. É reconhecida a sua importância, mas mantém-se fissões, competências específicas de cada área profissio-
uma ênfase nos cursos em si, procurando-se estratégias nal e competências colaborativas, ou seja, o respeito às
de aprimoramento voltadas para uma visão de prática especificidades de cada profissão, o planejamento parti-
isolada das diferentes profissões. cipativo, o exercício da tolerância e a negociação, num
A implantação da EIP na formação em saúde aparece movimento de redes colaborativas.
como resposta a estas indagações. Consiste de oportuni- Na avaliação das experiëncias de EIP na formação
dades de treinamentos conjuntos para o desenvolvimen- profissional em saúde, dois instrumentos são descritos
to de aprendizagens compartilhadas. Enfim, ocasiões nas na literatura – um Questionário com Escala de Percep-
quais duas ou mais profissões aprendem juntas com e ção da Experiência Interprofissional (IEPS), criado em
sobre as outras. 1990 e modificado em 20074,5, e um Questionário para
Como proposta de formação, a educação interprofis- avaliação de atitudes e prontidão (RIPLS) que utiliza uma
sional vem sendo discutida nos últimos trinta anos, espe- escala Likert para avaliar a competência para o trabalho
cialmente nos Estados Unidos e Europa, com o intuito de equipe e colaboração, a identidade profissional e a
de estimular o aprimoramento do cuidado em saúde por discussão dos papéis profissionais.
meio do trabalho de equipe. Os princípios da educação Revisões sistemáticas da literatura mostram os efeitos
interprofissional se aplicam tanto para a graduação das di- positivos da EIP na formação em saúde. Isto não significa
ferentes profissões de saúde quanto para a educação per- a inexistência de dificuldades na sua implantação, como
manente dos profissionais componentes de uma equipe de falta de definição precisa, resistências tanto institucio-
trabalho2. nais como de docentes e discentes, entraves curricu-
Para Barr3, a EIP consiste na inversão da lógica tra- lares, iniciativas simplificadas como estratégia de redu-
dicional da formação em saúde - cada prática profissio- ção de custos e eventuais problemas com corporações
nal pensada e discutida em si -, abrindo espaços para a profissionais.
discussão do interprofissionalismo. O mesmo autor afir- No Brasil, ainda são escassas as experiências sobre
ma também que a EIP é uma proposta onde profissões EIP. Experiências de aprendizagem conjunta existem,
aprendem juntas sobre o trabalho conjunto e sobre as mas não com o objetivo de desenvolvimento de compe-
especificidades de cada uma, na melhoria da qualidade tências para o interprofissionalismo. Ainda temos qua-
no cuidado ao paciente. se que uma ausência de publicações relativas ao tema,
A EIP se compromete com uma formação para o in- apesar de existirem experiências pontuais. Atualmente,
terprofissionalismo, no qual o trabalho de equipe, a dis- vivências e relatos de experiências de treinamento con-
cussão de papéis profissionais, o compromisso na solu- junto e aprendizagens compartilhadas em políticas indu-
ção de problemas e a negociação na tomada de decisão toras de mudanças na graduação como o Pró-Saúde e
são características marcantes. Para isto, a valorização da o PET-Saúde têm-se revelado como potenciais espaços
história de diferentes áreas profissionais, a consideração de EIP.
anos do curso, momentos de aprendizagem compartilhada nos-, prova do progresso, instrumentos qualitativos e
(80% no primeiro ano, 40% no segundo ano, 20% no ter- quantitativos para avaliação do processo pelos alunos.
ceiro ano e reuniões semanais no quarto ano). Além disso, tem sido objeto de pesquisa apresentado e
Estes momentos de formação compartilhada permi- aprovado por agëncias de fomento, como os projetos
tem a vivência de grupos interprofissionais, onde mistu- “A interdisciplinaridade como princípio formativo na gra-
rar-se implica criar uma disponibilidade para conviver duação em saúde: dos planos às concepções docentes”7
com o outro, conhecendo-o melhor, respeitando-o em e “A educação interprofissional na graduação em saúde:
suas singularidades e buscando construir relações inter- preparando profissionais para o trabalho em equipe e
pessoais mais inclusivas. para a integralidade no cuidado”8.
Na medida em que se altera a lógica tradicional de for- Por fim, importante registrar a cultura criada no Cam-
mar em saúde, insere-se o diálogo com as práticas docen- pus Baixada Santista sobre a Educação Interprofissional.
tes: os professores, com suas histórias de formação pau- Esta cultura, já consolidada na graduação, direcionou a
tadas na especialização disciplinar, veem-se confrontados criação tanto da Pós-Graduação lato como stricto sensu.
com seus desejos e possibilidades de aprenderem a en- Com estes princípios, foi criada a Residência Multiprofis-
sinar de um modo mais participativo, interativo, criativo. sional, envolvendo as áreas de Fisioterapia, Terapia Ocu-
E estas possibilidades podem ser ampliadas por meio do pacional, Nutrição, Psicologia, Serviço Social, Farmácia
envolvimento dos docentes na construção de um projeto e Enfermagem, e o Programa Interdisciplinar, nível Mes-
pedagógico inovador, tomando-os como co-responsáveis trado em Ciências da Saúde.
pelos rumos e rotas da proposta de formação em saúde.
Assim, também é novo para o professor sair da métri- REFERÊNCIAS
ca disciplinar e colocar-se no diálogo com colegas oriun-
1. Freire P. A Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2002.
dos de outros campos disciplinares, relativizando suas
2. Barr H. Interprofessional education: today, yesterday and tomorrow: a re-
certezas e acreditando ser possível e necessário (re) view. (Other) London, UK: Higher Education Academy, Health Scien-
conhecer as dinâmicas do saber, fazer e ser em saúde. ces and Practice Network; 2005.
Constituir um eixo, intrinsecamente interdisciplinar, e 3. Barr H. Competent to collaborate; towards a competency-based
model for interprofessional education. J Interprofessional Care.
atuar nos módulos exige considerar ângulos ainda não
1998;12(2):181-8.
descortinados e/ou valorizados, revisitar o já conhecido 4. Luecht RM, Madsen MK, Taugher MP, Petterson BJ. Assessing profes-
e abrir-se para caminhos novos. sional perceptions: design and validation of an interprofessional edu-
Como nos dizem Larossa e Kohan6: cation perception scale. J Allied Health. 1990;19:181–91.
5. Mcfadyen AK, Maclaren WM, Webster VS. The interdisciplina-
ry education perception scale (IEPS): An alternative remodel-
Também a experiência, e não a verdade, é o que dá led sub-scale structure and its reliability. J Interprofessional Care.
sentido à educação. Educamos para transformar o 2007;21(4):433-43.
que sabemos, não para transmitir o já sabido. Se al- 6. Larrosa J, Kohan W. Apresentação. In: Rancière J. O Mestre Ignorante:
cinco lições sobre a Emancipação Intelectual. Belo Horizonte: Autên-
guma coisa nos anima a educar é a possibilidade de
tica; 2002. p. 1-38.
que esse ato de educação, essa experiência em gestos 7. Edital MCT/CNPq 401539/2006-7: A interdisciplinaridade como prin-
nos permite liberar-nos de certas verdades, de modo cípio formativo na graduação em saúde: dos planos às concepções
a deixarmos de ser o que somos, para ser outra coisa docentes.
8. Edital MCT- CNPq/ MS-SCTIE- DECIT Nº 23/2006: A Educação In-
para além do que vimos sendo.(p.1)
terprofissional na Graduação em Saúde: preparando Profissionais para
o Trabalho em Equipe e para a Integralidade no Cuidado
Nos intercruzamentos das práticas dos sujeitos, dos
conteúdos, das opções didático-pedagógicas, tem- se ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
depreendido o valor dessa experiência formativa que
parece ser potencialmente transformadora da formação Nildo Alves Batista
em saúde comprometida com a construção do Sistema Av. Dr. Altino Arantes, 1300, apto 61-F
Único de Saúde. Saúde - São Paulo
Este projeto tem sido avaliado por diferentes meca- 04042-005 SP
nismos - grupos focais envolvendo professores e alu- nbatista@cedess.epm.br