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Doenças do Sistema Digestório das Aves (Revisão Bibliográfica)

Article · January 2006

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2 authors:

Guilherme Augusto Marietto Gonçalves Raphael Lucio Andreatti Filho

Doc.Bird - Consultoria em Medicina Veterinária São Paulo State University
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DOENÇAS DO SISTEMA DIGESTÓRIO DAS AVES
(REVISÃO BIBLIOGRÁFICA).
Diseases of digestive
system of the birds.
O presente trabalho
apresenta as principais
doenças que acometem o
sistema digestório das
aves encontradas na
literatura, abordando
sintomatologia, métodos
de diagnóstico e seu
respectivo tratamento.
RESUMO
As aves apresentam um sistema diges-
tório diferenciado, com diversas particula-
riedades que variam conforme os hábitos
alimentares das espécies. Inúmeros agen-
tes infecciosos e não infecciosos podem
lesar o tubo digestivo e órgãos anexos,
além de comprometer, em maior ou menor
grau, o processo digestório. Os principais
agentes envolvidos são bactérias, fungos,
vírus, parasitas, intoxicações, corpos es-
tranhos e neoplasias.
O presente trabalho apresenta as prin-
cipais doenças que acometem o sistema
digestório das aves encontradas na literatu-
ra, abordando sintomatologia, métodos de
diagnóstico e (quando possível) seu respec-
tivo tratamento. As doenças foram agrupa-
das e discutidas conforme a região anatô-
mica afetada, sendo divididas em doenças
que acometem a cavidade oral, esôfago e
inglúvio, proventrículo e ventrículo, intesti-
nos, cloaca e por fim pâncreas e fígado.
Palavras chave: Aves, sistema digestivo,
doenças.
ABSTRACT
The birds have a differentiated diges-
tive system, with diverse peculiarity that
varies with nourishment of the species.
Several non-infectious and infectious
agents can damage the digestive tube,
pancreas and liver, breaking the digestive
function in bigger or smaller rank.
Bacteria, fungi, virus, parasites, toxic
agents, foreign bodies and neoplasia are
involved. The aim of this article is to review
the main diseases of the birds digestive
Figura 1: Formação de placas esbranquiçadas em palato causada por Candida albi-
cans; Pombo de coleira (Streptopelia risoria).
......................................................................................................................
system, icluding sintomatology, diagnosis
and his respective treatment, when possi-
ble. The diseases were grouped and dis-
cussed according to anatomical region af-
fect including of the oral cavity, esophagus
and crop, proventriculus and ventriculus,
intestines, cloaca and finally pancreas and
liver.
Keywords: Birds, digestive sistem, diseas-
es.
1. INTRODUÇÃO
As aves apresentam um sistema diges-
tório com várias modificações, sendo algu-
mas das quais associadas à ausência de den-
tes. Devido à ausência de lábios, não há
glândulas salivares labiais na boca, nem
glândulas intermaxilares, somente as glân-
dulas sublinguais estão presentes57. O esô-
fago das aves é longo e sua mucosa geral-
mente é corneificada34, situa-se medialmen-
te entre a traquéia e os músculos cervicais,
mas logo se afasta para a direita18. Nas aves
granívoras e carnívoras existe uma porção
em forma de saco, denominada inglúvio, que
se destina ao armazenamento temporário de
alimentos57.
O estômago das aves é formado por uma
porção glandular, chamado proventrículo,
que secreta suco gástrico, e uma câmara
posterior, muscular e com paredes espes-
sas, chamada ventrículo57. O proventrículo
e o ventrículo são pouco distintos nas aves
carnívoras, mas nas granívoras são bem de-
limitadas34.
FOTO: RÔMULO FRANCIS ESTANGARI LOT
Os intestinos ocupam a parte caudal da
cavidade do corpo, estando em extenso con-
tato com o inglúvio e os órgãos reproduto-
res. É constituído pelo duodeno, jejuno, íleo,
ceco (que surge da junção ileocólica) e um
cólon curto que se abre na cloaca18. O duo-
deno sempre forma uma longa e estreita alça
ventral na cavidade do corpo e que está for-
temente unida ao pâncreas. O restante do
intestino delgado é relativamente longo e
forma vários padrões complexos de pregas
e voltas que são constantes dentro das fa-
mílias. A maioria das aves possui dois ce-
cos, raramente um ou mais que dois estão
presentes e em animais carnívoros os
cecos são pequenos ou ausentes34,57.
A cloaca, comum aos sistemas digesti-
vo e urogenital, abre-se para o exterior atra-
vés da abertura da cloaca. O cólon, os ure-
teres e os ductos deferentes (ou oviduto
esquerdo) entram na cloaca em diversos ní-
veis. É seqüencialmente dividida em copro-
deu, urodeu e proctodeu, por duas pregas
anulares mais ou menos completas18.
O fígado das aves consiste em lobo di-
reito (que é mais largo e apresenta a vesícu-
la biliar) e esquerdo, ligados cranialmente
por um canal dorsal ao coração. Os dois
ductos biliares, partindo um de cada lobo,
penetram na porção final do duodeno junto
com os ductos pancreáticos. O pâncreas é
alongado e se encontra entre as partes da
curva duodenal, é algumas vezes trilobado
e geralmente têm três ductos18,34.
Inúmeros agentes infecciosos e não in-
fecciosos podem lesar o tubo digestivo e
órgãos anexos, além de comprometer, em
maior ou menor grau, o processo digestó-
rio. Bactérias, intoxicações e vírus são os
principais agentes etiológicos a causar pro-
blemas no trato gastroentérico, já fungos,
vermes e protozoários são condições qua-
se tão freqüentes quanto a erros nutricio-
nais e de manejo a comprometerem o siste-
ma digestório36.
2. DOENÇAS DO SISTEMA
DIGESTÓRIO DAS AVES
2.1. Doenças da cavidade oral
A orofaringe é um local que comumente
ocorre uma variedade de lesões em aves. A
sintomatologia de doenças orofaringeanas
varia muito e pode incluir halitose, anorexia,
inapetência, disfagia, esfregamento do bico
ou uma postura boquiaberta52,70.
Placas ou granulomas são sinais clíni-
cos comuns de várias doenças, podendo
ser por infecções bacterianas ou fúngicas,
hipovitaminose A, doenças parasitárias ou
virais52. O exame citológico e cultura de le-
sões podem ajudar a determinar a causa das
lesões. Amostras citológicas podem ser
obtidas por esfregaço estéril (swab) ao lon-
go da lesão e observado em lâminas por
microscopia, onde várias lâminas devem ser
feitas, pois colorações específicas (GRAM,
PAS, GIEMSA) podem ser necessárias9,17.
Infecções bacterianas orofaringeanas
podem ser causadas por uma grande varie-
dade de bactérias, incluindo os gêneros Sta-
phylococcus, Streptococcus, Pseudomo-
nas, Aeromonas, Klebsiella, a Escherichia
coli e outras bactérias GRAM negativas.
Estas bactérias podem causar granulomas
ou estomatites generalizadas27. O cresci-
mento bacteriano excessivo pode ser esti-
mulado por doenças imunossupressivas ou
secundárias a lesões na mucosa oral por
fatores irritantes, alimentos ásperos ou pelo
acúmulo de alimento devido a deformida-
des do bico. O tratamento com antibióticos
deve ser baseado em cultura e auxiliada com
antibiograma. O tratamento pode ser auxili-
ado com a administração de solução anti-
séptica, ou por lavagem da cavidade
oral27,52,54.
Candidíase pode provocar o aparecimen-
to de placas esbranquiçadas dentro da ca-
vidade oral (Figura 1), sendo causada pela
Candida albicans, um organismo normal-
mente encontrado na cavidade oral. A in-
fecção pode ser primária ou secundária a
outra doença da região orofaríngea ou por
antibioticoterapia prolongada (principal-
mente em aves jovens). No raspado citoló-
gico da lesão, corados com Cotton Blue,
observam-se células leveduriformes e bro-
tamentos que se coram mais escuros. O tra-
tamento pode ser efetuado com a adminis-
tração de clorexidine e nistatina para infec-
ções suaves. Infecções mais severas podem
exigir uma droga antifúngica mais efetiva
como o cetoconazol, anfoteracina B ou flu-
conazol10,14,29,42,56.
A deficiência de vitamina A pode resul-
tar em metaplasia escamosa da mucosa oral
resultando na formação de placas ou gra-
nulomas, podendo ocorrer infecção secun-
dária. O histórico nutricional pode ajudar
no diagnóstico, sendo a modificação dieté-
tica e a suplementação vitamínica o proce-
dimento de eleição32,54,67.
Várias doenças parasitárias podem cau-
sar lesões orais nas aves. A Capillaria con-
torta pode causar lesões na cavidade oral,
esôfago e inglúvio. As lesões incluem mas-
sas inflamatórias na cavidade oral, inflama-
ção hemorrágica da comissura do bico e
membranas diftéricas na cavidade oral. Os
nematóides, de aparência filiforme, podem
ser achados no exsudato inflamatório. O tra-
tamento é baseado na administração de iver-
mectina74,75. Outro nematóide que também
parasita a cavidade oral é o Avioserpens
sp.75. A tricomoníase é comum em gaviões e
pombas, mas também é relatada em psitací-
deos29,52,64. As lesões consistem em placas
brancas ou amarelas, ou nódulos na orofa-
ringe. O organismo pode ser observado atra-
vés de exame microscópico obtido por
swab. O tratamento é realizado com a admi-
nistração de metronidazol ou dimetrida-
zol39,50,68,70.
A forma diftérica da bouba aviária tam-
bém pode causar lesões orais que variam de
lesões exsudativas a placas caseosas (quan-
do ha infecções secundárias). As aves afe-
tadas podem apresentar alopecia na região
ao redor dos olhos e bico. A forma cutânea
da bouba é mais comum em gaviões e estes
podem mostrar as lesões somente na jun-
ção mucocutânea. O diagnóstico é obtido
pelo exame histológico das lesões, onde
corpos de inclusão intracitoplasmatico (cor-
púsculos de Bollinger) são característicos
da infecção por bouba. O tratamento é ba-
seado em uma terapia de suporte, como an-
tibióticos ou antifúngicos para se evitar in-
fecções secundárias e o prognóstico é re-
servado em aves severamente afetadas. O
isolamento da ave afetada é importante para
se prevenir sua disseminação26,37,70.
Doenças neoplásicas da cavidade oral
são menos comuns, mas podem ocorrer em
psitacídeos. Papilomas são as neoplasias
orais mais comuns e podem ocorrer na oro-
faringe, coana e laringe. Carcinoma de célu-
la escamosa é a segunda neoplasia oral mais
comum e pode envolver a cavidade oral e
língua. Estes tumores produzem lesões ul-
cerativas, dolorosas e freqüentemente es-
tão associados com inapetência. Outras
neoplasias orais incluem fibrohistiossarco-
ma e fibrossarcomas11,60.
2.2. Doenças do inglúvio (papo)
e esôfago
Muitas das doenças que afetam a cavi-
dade oral também afetam o inglúvio e esôfa-
go, como a candidíase, infecções bacteria-
nas, tricomoníase e capilariose. Os sinais
clínicos das desordens do papo incluem re-
gurgitação, inapetência, anorexia, e esvazi-
ando lento. A estase de papo pode ocorrer
em conseqüência de doença metabólica ou
sistêmica, fatores ambientais ou dietéticos,
impactação, assim como corpos estranhos
esofágicos ou gástricos, sendo muito co-
mum em aves recém-nascidas23,54. O cresci-
mento excessivo bacteriano GRAM positi-
vo ou negativo pode ocorrer como um pro-
blema primário ou secundário na estase. O
diagnóstico é baseado na citologia por swab
ou por cultura. A presença de qualquer ou-
tra doença subjacente deve ser determina-
da e tratada23,29,54,71.
A candidíase é uma infecção comum no
inglúvio, especialmente em aves jovens. O
diagnóstico é baseado na presença de blas-
tósporos e pseudohifas em amostras de
swabs. Em casos crônicos ou avançados
um espessamento da parede pode ser per-
cebido mediante palpação durante exame
físico. O tratamento é base de nistatina oral
ou outros antifúngicos.
Antifúngicos sistêmicos devem ser usa-
dos em casos de disseminação sistêmi-
ca10,14,29,42,56.
Os nematóides do gênero Spiroptera,
Capillaria, Synhimantus e Gongylonema
podem ser encontrados parasitando o ing-
lúvio de várias espécies aviárias41,63,74,75.
O esvaziamento lento do inglúvio é associ-
ado a desordens tiroidianas, como o bócio
e adenocarcinomas. Infecções bacterianas
e fúngicas secundárias podem ocorrer nes-
tas situações. O diagnóstico definitivo de
doenças tiroidianas pode ser obtido atra-
vés de radiografias, exame cirúrgico ou por
necropsia7,54,71.
Doenças não-infecciosas do inglúvio e
esôfago incluem fístulas, feridas traumáti-
cas por corpos estranhos e doenças neo-
plásicas. Fístulas de inglúvio ocorrem devi-
do à natureza fina da parede. Este quadro é
mais comum em aves recém-nascidas alimen-
tados manualmente, mas pode ocorrer em
qualquer idade. Quando a parede do papo é
lesada, esta necrosa facilmente. A pele que
sobrepõem o inglúvio é muito aderida e
pode ser afetada também após a evolução
do tecido necrosado. Observa-se nos ca-
sos de fístula o vazamento de conteúdo ali-
mentar sobre as penas da ave. O tratamento
de eleição é o cirúrgico (ingluviotomia), po-
rém só deve ser efetuado após todo tecido
lesado ter formado a fístula23,29,31,40,52,54.
Feridas traumáticas podem ocorrer se-
cundariamente à alimentação por sonda, fe-
ridas por mordida ou corpos estranhos e
são tratadas semelhantemente as fístulas.
Se há deposição subcutânea de alimento e
formação de abscessos o prognóstico é re-
servado e pode-se exigir uma sutura na le-
são primária do papo enquanto permiti-se
uma cicatrização por segunda intenção da
pele. Corpos estranhos (sementes, nozes,
madeira, metal, cálculos e outros) são facil-
mente localizados utilizando-se exame radi-
ográfico. O diagnóstico é baseado na pal-
pação, história clínica e exame radiográfico.
Os objetos podem ser retirados manualmente
ou através de ingluviotomia5,31,52,76.
Lesões neoplásicas do inglúvio e esô-
fago torácico incluem carcinoma de célula
escamosa, adenocarcinomas, leiomiossar-
coma e fibrossarcoma. Os sinais clínicos
incluem disfagia, regurgitação, seleção de
alimentos macios, anorexia e inapetência. O
diagnóstico em caso de suspeita pode ser
obtido através de exames radiográficos nor-
mal ou contrastado ou fluoroscopia da área.
Um diagnóstico definitivo que pode ser
obtido através de biópsia pela boca ou por
ingluviotomia usando-se um endoscópio
flexível ou rígido. O tratamento de massas
esofágicas clinicamente severas muitas ve-
zes não apresenta um bom resultado 11,60.
2.3. Doenças do proventrículo e
ventrículo
Há uma variedade de doenças que po-
dem afetar os estômagos aviários e a dife-
renciação destas pode ser difícil. Os sinais
clínicos dependem da etiologia e podem in-
cluir regurgitação, perda de peso, inapetên-
cia e anorexia.
A síndrome da dilatação proventricular
(Figura 2) é uma doença na qual suspeita-
se ser de origem viral. Esta doença acomete
as estruturas miontéricas e do sistema ner-
voso central causando uma neurite linfo-
plasmocítica resultando em uma disfunção
dos nervos28,29. Acomete psitacídeos (vári-
as espécies), onde os sinais clínicos inclu-
em perda de peso (apesar do animal apre-
sentar um apetite voraz), depressão, emaci-
ação, regurgitação esvaziamento ingluvia-
no e proventricular lento e presença de ali-
vés de raspados de parede, como também
por cultivo24,66. O tratamento consiste na ad-
ministração de suplementação com probió-
FOTO: GUILHERME AUGUSTO MARIETTO-GONÇALVES
tico e antifúngicos orais tal como a nistati-
na ou anfoteracina B24,29. Relataram-se per-
das econômicas significativas em aviários
devido à associação da megabacteriose com
o microsporídio Encephalitozoon hellem
em periquito australiano6.
Parasitando o proventrículo e o ventrí-
culo, pode-se encontrar em várias espécies
Figura 2: Macroscopicamente na síndro- aviárias os nematóides Amidostomum, Por-
me da dilatação proventricular observa- rocaecum, Contracaecum, Cheilospirura,
se um aumento de tamanho do proven- Synhimantus, Cyrnea, Streptocara, Histi-
trículo; Papagaio verdadeiro (Amazona
ocephalus, Dispharynx, Echinuria, Tetra-
aestiva).
meres e Eustrongylides 60,63,74,75.
...........................................................................
Corpos estranhos proventriculares e
mento não digerido nas fezes13.28,29,48. ventriculares como madeira, metais, plásti-
Radiograficamente observa-se o proven- co e outros materiais ocorrem com freqüên-
trículo e o ventrículo dilatado como se esti- cia em psitacídeos e outra espécies, princi-
vessem cheios. A radiografia contrastada palmente em ratitas e aves aquáticas. Papa-
pode ser útil no diagnóstico por demons- gaios recém-nascidos podem engolir mate-
trar uma contratilidade fraca do proventrí- riais da cama e brinquedos, casca de amen-
culo, istmo e ventrículo. Os intestinos apre- doim e outras sementes. Estes materiais
sentam hipomotilidade, mas pode haver hi- podem causar impactação proventricular e
permotilidade em alguns casos. O diagnós- estase, resultando em regurgitação e anore-
tico definitivo é baseado na ganglioneurite xia. O diagnóstico é baseado na história clí-
linfoplasmocítica e pela leiomiosite linfocí- nica, radiografia, endoscopia ou exploração
tica encontrada através da biópsia do pro- cirúrgica. O tratamento médico pode ser ins-
ventrículo ou ventrículo46,48. O tratamento é tituído, e inclui lavagem do proventrículo e
paliativo e a administração de alimentos ma- ventrículo, laxantes e endoscopia. Lesões
cios de fácil digestão pode estender a vida ulcerativas podem ocorrer devido aos cor-
da ave afetada por mais de um ano55. pos estranhos23,31,52.
Megabacteriose é uma doença que aco- Neoplasias em proventrículo e ventrículo
mete proventrículo e ventrículo. É causada são relatados em várias espécies. Estestu-
por um fungo ascomiceto anamórfico deno- mores podem ocorrer em qualquer estrutura
minado Macrorhabdus ornithogaster, um ou no istmo. Os tipos de tumores que mais
organismo longo bacilar com 45¼m de com- são observados são adenocarcinomas, car-
primento e 3-4¼m de diâmetro3,35. Apresen- cinomas e leiomiossarcoma. Os sinais clíni-
ta um núcleo eucariótico (característica de cos incluem perda de peso, anorexia, mele-
fungo), não possuindo organelas organiza- na e má digestão11,60.
das dentro do citoplasma (como uma bacté-
2.4. Doenças intestinais
ria). É GRAM e PAS positivo, que não res-
ponde a terapia antibiótica, porém apresen- A diarréia é o achado mais freqüente em
ta sensibilidade à antifúngicos22. Acomete aves como resposta a desordens intestinais,
principalmente psitacídeos, mas também frin- embora outros sinais como perda de peso,
gilídeos, ratitas e há relatos em aves indus- má-digestão, anorexia, melena e fezes volu-
triais22,24,29,35. A doença é caracterizada por mosas possam ocorrer. As enterites bacteri-
um emagrecimento progressivo seguido de anas são as causas mais comuns de diarréi-
morte. Pode se observar apatia, dificuldade as em aves de companhia. Bactérias GRAM
respiratória, regurgitação, incoordenação negativas como Escherichia coli, Klebsie-
motora e diarréia e dilatação proventricular lla, Citrobacter, Yersinia, Salmonella e En-
também pode ser vista radiograficamente3,29. terobacter são as mais freqüentemente as-
No exame necroscópico observase, além do sociadas a distúrbios entéricos. Outras bac-
aumento de tamanho do proventrículo, um térias importantes incluem o Clostridium,
aumento de secreção na mucosa, um espes- Chlamydophila, Pseudomonas, Pasteure-
samento de parede e lesões ulcerativas na lla, Staphylococcus, Chromobacterium,
mucosa do proventrículo e junção proven- Campylobacter e Mycobacterium. A má hi-
trículo e ventrículo4. O diagnóstico é obtido gienização de recintos, dietas de baixa qua-
na observação do organismo em amostras lidade nutricional, stress, idade e doenças
fecais ou na parede do proventrículo atra- simultâneas predispõem a fatores que con-
tribuem para uma proliferação bacteriana
indesejável27,29,52,73. O diagnóstico é obtido
na cultura fecal e o tratamento deve ser ba-
seado em resultados de antibiograma17. O
Clostridium tertium causa megacólon com
diarréia crônica fétida em psitacídeos27, já o
Clostridium perfringes pode causar enteri-
te necrótica caracterizada por um cheiro fé-
tido das fezes. Os esporos de Clostridium
podem ser visto em amostras fecais cora-
das com GRAM e se assemelham a peque-
nos alfinetes e o diagnóstico definitivo é
obtido por cultura anaeróbica. O Campylo-
bacter jejuni pode causar distúrbios em
várias espécies aviárias e podem causar le-
targia, anorexia, diarréia e emaciação27.
A micobacteriose aviária é tipicamente
uma doença do trato gastrointestinal, po-
dendo ser causada pelo Mycobacterium
avium, M. tuberculosis, M. bovis e M.
avium-intracellulare.
A transmissão se dá pela rota ora-fecal e
há formação de nódulos tuberculosos por
todo o trato gastrointestinal20,27,29, sendo
muito descritos em aves industriais, ratitas
e psitacídeos20,59,65. Os sinais clínicos inclu-
em perda de peso (apesar de um apetite bom),
anemia, poliúria e diarréia.
Necroscopicamente observa-se um es-
pessamento das alças intestinais, hepato-
megalia, esplenomegalia e presença de gra-
nulomas em intestinos, baço e medula ós-
sea. Para um diagnóstico confiável é neces-
sário um swab intestinal para cultura. O cul-
tivo do Mycobacterium é importante devi-
do ao seu potencial zoonótico e o tratamen-
to não é recomendado por causa do poten-
cial de resistência a antibióticos, o que pode
ser perigoso para o ser humano27.
Algumas viroses acometem os intesti-
nos das aves causando enterite caracteriza-
da por diarréia e em aves de criação indus-
trial pelo baixo desempenho de produção.
Destacam-se principalmente as infecções
por Adenovirus, Reovirus e Rotavirus. A
doença de Newcastle, causada pelo Rubu-
lavirus, pode apresentar infecção entérica
dependendo do patotipo envolvido. O di-
agnóstico para infecções virais podem ser
obtidos através de ELISA (Enzyme-Linked
Immunosorbent Assay), HI (inibição da he-
maglutinação), histopatológico e isolamen-
to viral12,26,49,53,58.
Infecções parasitárias por protozoários,
como a giardíase, criptosporidiose e cocci-
diose são comuns em várias espécies, prin-
cipalmente em aves aquáticas e pássaros
selvagens. Destas, a giardíase (Figura 3) é
mais comum em psitacídeos e pernaltas, ten-
do maior ocorrência nas espécies de menor
porte. Os sinais clínicos podem ser desper-
tina, Dreponidotaenia, Imparmargo, Me-
troliasthes, Fimbriaria, Diochis, Echinos-
toma, Echinoparyphium, Maritreminoides,
Hypoderaeum, Sphaeridiotrema, Crypto-
cotyle, Plagiorchis, Ribeiroia e Catylurus.
Parasitando os cecos pode ser encontrados
FOTO: FLÁVIO MEDEIROS PAZ E SILVA
Trichostrongylus, Heterakis, Subulura,
Capillaria, Strongyloides, Aulonocepha-
lus, Echinostoma, Pastharmostomum, No-
tocotylus e Zygocotyle40,61,63,74,75.
A intoxicação por chumbo, embora cau-
se principalmente sintomas neurológicos,
Figura 3: Cistos de Giardia sp. observa- pode apresentar sinais como estase, vômi-
do após da aplicação da Técnica de Faust tos e diarréia. O diagnóstico é baseado na
história clínica, presença de outros sinais
típicos e de chumbo no sangue. O tratamen-
to inclui o uso de agentes quelantes, laxan-
FOTO: GUILHERME AUGUSTO MARIETTO GONÇALVES
tes e terapia de suporte33,62.
2.5. Doenças da cloaca
As principais doenças que acometem a
cloaca são o prolapso cloacal e papilomato-
se. O prolapso do tecido cloacal (Figura 4)
pode ocorrer por um período de postura pro-
longado, ovos grandes, diarréia, constipa-
ção, toxemia, desordens nutricionais, papi-
Figura 4: Observa-se a exteriorização do lomas e esforços idiopáticos. O tecido pode
coprodeu, à esquerda, e do urodeu com
estar edemaciado ou hemorrágico por cau-
a fenda vaginal, à direita; Galinha domés- sa de trauma e exposição.
tica (Gallus gallus domesticus).
Pode causar obstrução uretral e intesti-
..............................................................................
nal, ruptura do oviduto e necrose da muco-
sa cloacal. O tecido prolapsado pode ser de
cebidos, mas normalmente as aves apresen- porção final de intestino, ovário ou cloaca.
tam apatia e diarréia8,19,29,41,51. O auto-arran-
O tratamento pode ser difícil e consiste na
camento de penas é observado em calopsi- identificação do tecido exposto e reposicio-
tas (Nimphycus hollandicus)54. O tratamen-
namento manual. Uma sutura em “bolsa de
to é realizado com drogas antiprotozoários tabaco” pode ser realizada. Prolapsos recor-
como o metronidazol. A criptosporidiose é
rentes requerem intervenção cirúrgica e nu-
descrita em cerca de 30 espécies de aves, tricional. Opções cirúrgicas de tratamento
sendo comum em galinhas, perus e psitací-
incluem cloacopexia e cloacoplastia25,31.
deos, podendo causar sintomas clínicos de Os papilomas cloacais são irregulares,
suaves a severos44,45,69. A coccidiose intes-
arredondados e apresentam lesões na mu-
tinal é comum em várias ordens aviárias, cosa. Os papilomas são os tumores mais co-
sendo comumente encontrada em pássaros,
muns relatados em cloaca de aves de com-
rapinantes, pombos e aves de produção. As panhia e ocorre principalmente em espécies
espécies mais envolvidas no quadro de coc-
sul-americanas, como araras e papagaios.
cidiose são a Eimeria e o Isospora, onde Uma variedade de causas são levantadas,
estes podem ou não causar lesões nas aves
incluindo herpesviroses e papilomavírus.
parasitadas, sendo os sintomas caracteriza- Podem ser observados hematoquesia, te-
dos por diarréia, inapetência, perda de peso
nesmo, fezes fétidas e flatulência. A biópsia
e óbito38,41,72. O diagnóstico destas parasi- é exigida para um diagnóstico definitivo. As
toses é baseado em exame coproparasitoló-
opções de tratamento incluem remoção ci-
gico, PCR (Polymerase Chain Reaction) ou rúrgica, cauterização química, criocirurgia,
histopatológico. cirurgia de laser ou vacinas autógenas. As
As helmintíases são comuns em aves lesões podem regredir espontaneamente e
domésticas e selvagens, sendo encontra- retornar31,54.
dos nematóides, cestóides e trematóides pa-
rasitando os intestinos destas. Parasitando 2.6. Doenças dos órgãos anexos
o intestino delgado podem ser encontrado (pâncreas e fígado)
os seguintes gêneros: Capillaria, Ornithos- Das principais doenças que ocorrem no
trongylus, Ascaridia, Porrocaecum, Sica- pâncreas, destacam-se a pancreatite aguda
rius, Amoebotaenia, Hymenolepis, Raillie- e a diabetes mellitus. Os sintomas das pa-
tologias pancreáticas e hepáticas são mani-
festados principalmente por disfunções
gastrointestinais, devida a função destes
nos processos digestivos.
A pancreatite aguda pode ser desenvol-
vida quando há ativação das enzimas di-
gestivas (tripsina, protease e fosfolipase)
dentro do órgão, resultando numa autodi-
gestão pancreática.
Lesões causadas na parede celular per-
mitem a liberação destas enzimas no espaço
intramedular e ductos promovendo a pro-
dução de radicais livres, agravando assim
as lesões celulares. Os sintomas de pancre-
atite são vômitos, diarréia, anorexia, letar-
gia, cólica, polidipsia e poliúria. Os fatores
que predispõem a ocorrência de pancreati-
tes incluem obesidade, intoxicação (princi-
palmente por zinco), deficiência de vitamina
E-Selênio, traumas, infecções virais (doen-
ça de Newcastle, adenovirose, influenza
aviária A, bronquite infecciosa e herpesvi-
rose), clamidiose, infecções bacterianas, pe-
ritonites e neoplasias. O diagnóstico é reali-
zado através de biópsia obtido por laparo-
tomia. O tratamento é sintomático e também
é relativo à causa primária15,33,67.
A diabetes mellitus pode ser causada
pela deficiência na produção de insulina,
ineficiência funcional desta ou pelo exces-
so da produção do glucagon, sendo mais
relatada em aves de pequeno porte (princi-
palmente Psittaciformes, Passeriformes e Pi-
ciformes). Os sintomas incluem apatia, poli-
fagia, polidipsia, poliúria e emagrecimento
progressivo, sendo que uma hiperglicemia
pode ser observada através de exames la-
boratoriais. O diagnóstico é obtido com o
histórico clínico associado a insulinotera-
pia2,16,47.
O fígado, devido as suas funções, está
sujeito há várias patologias. A sintomatolo-
gia em casos de problemas hepáticos não é
muito específica e varia muito, inclui-se ic-
terícia, anorexia, vômito e diarréia. As prin-
cipais infecções bacterianas hepáticas são
causadas pela Escherichia coli, Salmone-
lla, Campylobacter, Erysipelothrix, Sta-
phylococcus, Streptococcus, Mycobacte-
rium, Borrelia, Listeria, Pseudomonas e
Chlamydophila. As infecções são caracte-
rizadas por um quadro de hepatite, hemor-
ragias, congestão, necrose hepática, cirro-
se, alterações de coloração e tamanho do
fígado27,52,73. Infecções fúngicas podem ser
causadas por Histoplasma capsulatum e
Cryptococcus neoformans1,14. Quanto a in-
fecções parasitárias destaca-se a causada
por Histomonas meleagridis em Gallifor-
mes41. O diagnóstico e tratamento podem
ser obtidos mediante cultura e isolamento
Guilherme Augusto Marietto-Gonçalves
M.V. Residente, Laboratório de
Ornitopatologia da FMVZ-UNESP/
Botucatu, SP
gmarietto_ornito@fmvz.unesp.br
FOTO: RÔMULO FRANCIS ESTANGARI LOT
Raphael Lucio Andreatti Filho
MV, Prof. Ass. Dr., Departamento de
Clínica Veterinária da FMVZ-UNESP/
Botucatu, SP
Laboratório de Ornitopatologia
andreatti@fmvz.unesp.br
Figura 5: Microscopicamente a hemocro-
matose é caracterizada por acúmulo de
ferro no citoplasma dos hepatócitos (pig- REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
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los de Cowdry) em fígado, baço, rins e pân- gery. Philadelphia: W.B. Saunders Company, 1986, p.250-
creas. O diagnóstico é baseado nos acha- 273.
dos necroscópicos e histopatológico das 10. CAMPBELL, T.W. Mycotic diseases. in. HARRI-
lesões, como também no isolamento vi- SON, G.J.; HARRISON, L.R. Clinical Avian Medicine
ral12,26,55. and Surgery. Philadelphia: W.B. Saunders Company,
1986, p.464-470.
A hemocromatose (Figura 5) é um pro-
11. CAMPBELL, T.W. Neoplasia. in. HARRISON, G.J.;
cesso caracterizado pelo acúmulo de ferro HARRISON, L.R. Clinical Avian Medicine and Sur-
nos hepatócitos e ocorre em aves alimenta- gery. Philadelphia: W.B. Saunders Company, 1986, p.
das com ração contendo altos níveis de fer- 500-508.
ro. 12. CAVILL, J.P. Viral Diseases. in. PETRAK, M.L.
Clinicamente observa-se dispnéia, letar- Diseases of Cage and Aviary Birds. 2.ed. Philadelphia:
Lea & Fabiger, 1982, p.515-527.
gia, caquexia, distensão abdominal e ascite.
13. CLARK, F.D. Proventricular dilatation syndrome in
Em alguns casos pode haver regurgitação e large psittacine birds. Avian diseases, vol.8, n.3, p.813-
convulsão. Radiograficamente observa-se 5, 1984.
uma hepatomegalia. Á necropsia, o fígado 14. CHUTE, H.L. Fungal infections. in. HOFSTAD,
pode se encontrar aumento ou diminuição M.S.; CALNEK, B.W.; HELMBOLD, C.F.; REID,
do tamanho, com coloração normal, bronze- W.M.; YODER JR, H.W. Diseases of Poultry. 7.ed.
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ada ou marrom escuro e espessamento e 382.
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