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AFONSO

1. Morfologia verbal
Em todas as línguas humanas existem palavras que servem para relatar factos, acções, descrever
estados, seres, situações etc. Tais palavras são chamadas verbos. Em muitas línguas, o verbo
conjugado traz consigo as marcas de sujeito sobre o qual se faz afirmação, o tempo em que o
fenómeno tem lugar, o número dos sujeitos sobre os quais se faz a afirmação ou envolvidos na
acção, etc.

A complexidade da estrutura verbal varia de língua para língua. Com efeito, nas línguas Bantu a
estrutura do verbo é muito complexa.

2. Estrutura do verbo das línguas bantu


A estrutura básica do verbo nas línguas bantu, é ku – Radical - (ext) -a onde ku- é o prefixo da classe
15, radical é parte que transporta o significado básico da palavra, -ext- (extensão verbal) e avogal
final. Excepto nos casos de Emakhuwa, Elomwe, Echuwabo e outras línguas deste grupo, ao invés do
uso do prefixo ku-, as línguas têm o prefixo o- (i.e. o- Radical- (ext) - a).

3. Extensões verbais das línguas bantu


Por extensão verbal designa-se um grupo de morfemas normalmente derivacionais que ao serem
sufixados a um radical verbal modificam a semântica deste passando a ser um novo verbo (ex: -
som- ‘estudar’ vs -somel- ‘estudar para’ em Emakhuwa). Neste exemplo a parte -el- altera o verbo
de estudar passando a ser estudar para. O número das extensões verbais varia de língua para
língua. Na sua diversidade, as extensões verbais podem ser as seguintes:
1. -el- aplicativa

2. -is – causativa

3. -isis – intensiva

4. -ek- pseudo-passiva

5. -ul- reversiva

6. -iw- passiva

7. -an – reciprocal

8. -elel- persistiva

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3.1. Conjugação do verbo nas línguas bantu
Nas línguas bantu os verbos podem ser conjugados em 3 tempos, a saber: o passado, o presente e o
futuro. Contudo, as línguas como Sena, Ndau, Yaawo, têm para além dos habituais 3 tempos,
outras divisões de tempo. Por exemplo, estas línguas distingue o passado recente (passado de
ontem) e o passado remoto (passado do mês ou ano passado), disignam também o futuro
próximo (futuro de amanha) do futuro distante (futuro do próximo mês ou ano ao passo que as
línguas Rhonga, Changana, Citswha já não a fazem, limitando-se um passado e um futuro.

3.1.1. Língua Xichangana


Esta língua apresenta 3 tempos verbais: o passado, o presente e o futuro como se pode ver na
subsecções que se seguem:

3.1.1.1. Tempo passado


A conjugação do verbo será exemplificada com o verbo kuja ‘comer’ na forma afirmativa
Número Pessoa pronome Prefixo de Exemplo significado
gramatical concordância
Singular 1ª pessoa Mina ni- mina nijile Eu comi
2ª pessoa Wena u- wena ujile Tu comeste
3ª pessoa Yena a- yena ajile Ele comeu
Plural 1ª pessoa Hina hi- hina hijile Nós comemos
2ª pessoa n’wina mu- n’wina mijile Vós comestes
3ª pessoa Vona va- vona vajile Eles comeram

A tabela acima mostra a conjugação do verbo no tempo passado. A marca do tempo passado é
expresso por -ile colocada na posição final do verbo enquanto o prefixo de concordância é
colocado na posição inicial do verbo.

MATEUS
3.1.1.2. Tempo presente
Nas línguas normalmente distinguem-se dois tipos de presentes. O presente simples ou pontual e o
presente habitual. O primeiro descreve o que está exactamente a acontecer naquele preciso
momento de enunciação e o segundo o que habitualmente acontece sem que necessariamente
esteja a acontecer.

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3.1.1.3. Tempo presente simples
Número Pessoa Pronome Prefixo de Exemplo Significado
gramatical concordância
1ª pessoa Mina ni- mina nija Eu como
Singular 2ª pessoa Wena u- wena uja Tu comes
3ª pessoa Yena a- yena aja Ele come
1ª pessoa Hina hi- hina hija Nós comemos
Plural 2ª pessoa n’wina mu- n’wina mija Vós comeis
3ª pessoa Vona va- vona vaja Eles comem

Na tabela do tempo presente simples, as marcas de concordância com o sujeito, tal como na tabela
do tempo passado, são as mesmas. O tempo presente simples marca-se pela substituição de ku- em
kuja ‘comer’ na forma infinitiva pelo prefixo de concordância do sujeito.

3.1.1.4. Tempo presente habitual


Número Pessoa pronome Prefixo de Exemplo Significado
gramatical concordância

Singular 1ª pessoa mina ni- mina naja Eu estou a comer

2ª pessoa wena u- wena waja Tu estás a comer

3ª pessoa yena a- yena aaja Ele está comer

Plural 1ª pessoa hina hi- hina haja Nós estamos a comer

2ª pessoa n’wina mu- n’wina maja Vós estais a comer

3ª pessoa vona va- vona vaaja Eles estão a comer

O presente habitual é marcado pela vogal [a] que ocorre logo depois do prefixo de concordância
do sujeito. Em alguns casos, a vogal do prefixo de concordância de sujeito é apagada pela vogal
[a] da marca do presente habitual. Compare o presente simples do habitual para ver a diferença
estrutural dos dois tempos.

3.1.1.5. Tempo futuro


Os verbos no tempo futuro na forma afirmativa nesta língua são conjudagos da seguinte maneira:

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Número Pessoa Pronome Prefixo de Exemplo Significado
gramatical Pessoal concordância

Singular 1ª pessoa Mina ni- mina nitaja Eu comerei

2ª pessoa Wena u- wena utaja Tu comerás

3ª pessoa Yena a- yena ataja Ele comerá

Plural 1ª pessoa Hina hi- hina hitaja Nós comeremos

2ª pessoa n’wina mu- n’wina mitaja Vós comereis

3ª pessoa Vona va- vona vataja Eles comerão

O tempo futuro é expresso por -ta- que se encontra logo depois da marca de concordância de
sujeito.

MICHAER
3.1.2. Língua Cinyungwe
Apresentam-se a seguir as formas do verbo ku-lir-a "chorar" na primeira pessoa do singular do
passado (remoto e recente), presente (pontual e habitual) e futuro (próximo e distante) nesta língua nas
formas afirmativa e negativa:

3.1.2.1.Passado
Remoto Recente
Infinitivo Significado
ku-tsuk-a ndi-da-tsuk-a nd(i)-a-tsuk-a ‘lavar’

ku-lir-a ndi-da-lil-a nd(i)-a-lil-a ‘chorar’

Presente
Pontual Habitual
Infinitivo Significado
ku-tsuk-a ni-n-tsuk-a ni-mba-tsuk-a ‘lavar’

ku-lir-a ni-n-lir-a ni-mba-lir-a ‘chorar’

Futuro

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Próximo Distante
Infinitivo Significado
ku-tsuk-a Ni-n-tsuk-a Ni-n-lir-a ‘lavar’

ku-lir-a Ni-n-lira ni-n-lira ‘chorar’

Em Nyungwe, a marca de presente pontual e de passado é o morfema -a- que também pode marcar
presente e de futuro. A vogal /i/ de ndi- apaga-se quando próximo de -a- que marca o tempo o segue
imediatamente. Isto sugere um sistema simplicado de marcação de tempos verbais.

A marca de aspecto habitual é -mba-. Neste caso, tal como acontece em muitas línguas bantu, a marca
de aspecto sobrepõe-se à marca de tempo.

3.1.3. Língua Emakhuwa


A estrutura básica do verbo em Emakhuwa é o – Radical – a. Diferentemente das línguas bantu
vistas acima que apresentam a forma ku-, em Emakhuwa, o prefixo que marca a forma de
infinitivo é o-. Em seguida apresenta-se a conjugação do verbo nesta língua.

Passado

Miyo khorowa omatta eu fui a machamba

António oholya enika o António comeu a banana

O tempo passado é a construído através da adjunção de -ho- logo depois da marca de concordância
com o sujeito. O prefixo do infinitivo ku- é substituído pelo prefixo de concordância e a vogal do
prefixo é substituído por -ho-.

Presente pontual

Miyo kinrowa omatta eu vou à machamba

António onlya enika o António come a banana

Na formação do tempo presente (simples), a marca de tempo é –n- que é colocada lodo depois do
prefixo de concordância nominal

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DANIEL

Presente habitual

Miyo kinirowa omatta eu estou a ir a machamba

António onilya enika o António está a comer a banana


O tempo presente habitual é construído através da adição do prefixo –ni- logo depois da marca de
concordância com o sujeito.

Futuro

Miyo kinorowa omatta eu irei à machamba

António anolya enika o António comerá a banana

O futuro é construído com a adjunção do prefixo -no- logo depois da marca de sujeito. Para a
conjugação de verbos neste tempo o prefixo ku- da marca do infinitivo é substituído pelo prefixo
de sujeito.

3.1.4. Língua Cisena


Apresentam-se a seguir as formas dos verbos ku-suk-a ‘lavar’ e ku-lir-a "chorar" na primeira pessoa
do singular do passado (remoto e recente), presente (pontual e habitual) e futuro (próximo e distante)
nesta língua nas formas afirmativa e negativa:

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Passado
Remoto Recente
Infinitivo Significado
Ku-suk-a ndi-da-suk-a nd(i)-a-suk-a ‘lavar’

Ku-lir-a ndi-da-lir-a nd(i)-a-lir-a ‘chorar’

Presente
Habitual
Infinitivo Pontual Significado
Ku-suk-a n-a-suk-a ndi-as-suk-a ‘lavar’

Ku-lir-a n-a-lir-a ndi-as-lir-a ‘chorar’

Futuro
Próximo Distante
Infinitivo Significado
Ku-suk-a n-a-dza-suk-a ndi-na-dza-suk-a ‘lavar’

Ku-lir-a n-a-dza-lir-a ndi-na-dza-lir-a ‘chorar’

3.2. Reduplicação

A reduplicação é “um processo de repetição de uma parte ou de todo o tema verbal (Ngunga
2004:181). Este fenómeno é comum nas línguas bantu e visa sobretudo modar a interpretação
semântica do radical verbal. Observe-se os seguintes exemplos extraídos de Ngunga (2004:182):

Changana:
- tlanga-tlanga 'brincar repetidamente'
-famba-famba 'andar repetidamente'
-hundza-hundza 'passar repetidamente'
Sena:
-fungula-fungula ‘abrir frequentemente’
-gula-gula ‘comprar frequentemente’

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-lima-lima ‘cultivar repetidamente’
Rhonga:
-famba-famba ‘andar repetidamente’
-jondza-jondza ‘estudar frequentemente’
-tsala-tsala ‘escrever frequentemente’
Como se pode ver dos exemplos acima, a repetição do tema verbal origina novos significados.

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