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CASO CLÍNICO NEUROANATOMOFISIOLOGIA – TRONCO ENCEFÁLICO

ENCEFÁLICO – CHRISTEL ESTUARDO CUNNINGHAM (RA 918104061)

1. S. M., homem destro de 19 anos de idade, caiu em uma calçada debatendo-se em convulsões. Quando os paramédicos
chegaram, as convulsões já haviam cessado, porém, os olhos do paciente estavam paralisados e desviados conjugadamente para a
direita. Pouco tempo depois, iniciaram-se movimentos convulsivos no braço esquerdo, assim como, os olhos exibiam movimentos
rítmicos e involuntários para a esquerda. Após as crises, e com o paciente já acordado, foi realizado exame neurológico, o qual
revelou uma discreta fraqueza do lado esquerdo do corpo. A anamnese revelou que o paciente tivera, 2 anos antes, um acidente
de moto, no qual sofrera uma contusão na região frontal-parietal direita e occipital, o que confirmou o diagnóstico de epilepsia
secundária ao Trauma Crânio Encefálico. O TCE foi grave e o paciente, na época, permaneceu hospitalizado, já que o resultado da
escala de Glasgow foi 09.
Em relação ao caso relatado, responda:

a) Por que o paciente apresenta fraqueza no hemicorpo esquerdo, após convulsão, se o TCE comprometeu a região fronto-
parietal direita do cérebro? Justifique baseando-se na neuroanatomofisiologia.

O Traumatismo Cranioencefálico (TCE) é um insulto ao cérebro, não degenerativo ou congênito, provocado por uma força física
externa. O TCE pode produzir um estado alterado ou diminuído de consciência, dessa forma decorrendo deficiências dos
desempenhos cognitivo, comportamental, emocional ou físico.

O dano ao tecido cerebral pode ser causado por uma lesão focal ou lesão axonal difusa. A lesão focal, por contusão ou laceração,
refere-se aos danos decorrentes do impacto em um local específico do cérebro. Em caso de golpe intenso, há lesão concomitante
em um ponto ao do impacto, o que é denominado lesão por contragolpe.

A lesão axonal difusa consiste em um cisalhamento disseminado dos axônios no interior da bainha de mielina, resultando em uma
degeneração grave e generalizada da substância branca. Esse tipo de lesão está relacionado com a presença de velocidade, ou seja,
quando há interrupção brusca da movimentação do cérebro, como ocorre em acidentes com veículo motorizado ou quedas de
altura.

Algumas pessoas podem apresentar lesão focal associada à lesão axonal difusa decorrente, por exemplo, de um acidente
automobilístico no qual ocorra um impacto sobre a cabeça somado ao impacto relacionado à velocidade.

No caso clínico, indica-se que o jovem sofreu no passado uma contusão na região frontal-parietal direita e occipital decorrente de
um acidente de moto. Este evento, junto com o Resultado 09 de Glascow, ainda, indica que a lesão à época foi considerada
moderada.

A lesão moderada na região frontal-parietal direita e occipital afeta diretamente o funcionamento das informações descendentes
vindas do trato corticoespinhal ou trato piramidal.

O trato piramidal é uma grande coleção de axônios que viajam entre o córtex cerebral do cérebro e a medula espinhal, passando,
por tanto, pelo tronco encefálico (composto pelo mesencéfalo, ponte e bulbo).

O sistema piramidal é chamado de sistema ou conjunto de vias nervosas motoras que vão do córtex cerebral aos neurônios motores
do corno anterior da medula espinhal, onde se conectam aos neurônios motores que eventualmente causam movimento.

Esse sistema se autodenomina pelo tipo de neurônio que os configura e geralmente envia informações sobre o controle motor
voluntário.

Os neurônios motores do sistema piramidal são chamados neurônios motores superiores. Suas fibras estabelecem sinapses com os
neurônios motores de núcleos do tronco encefálico e neurônios motores da coluna cinzenta anterior da medula, chamados
neurônios motores inferiores ou neurônios alfa. Um dos principais feixes nervosos desse sistema é o corticoespinal, que está ligado
ao controle preciso dos movimentos e contrações musculares.

Entretanto, é importante notar que as fibras motoras descendentes desse sistema não permanecem em um único hemisfério. Chega
um momento em que a maioria das fibras motoras de uma parte do cérebro cruza para o lado oposto.

Chamamos decus
decussação piramidal ao cruzamento feito pelas fibras de um lado para o outro dos hemisférios opostos do corpo. Dessa
forma, na decussação das pirâmides, situada na parte distal do bulbo, a maior parte (75% a 90%) das fibras do trato córticoespinhal
cruzam para o lado oposto, constituindo o trato córticoespinhal lateral ou cruzado, ocupando o funículo lateral da medula.

A porção remanescente (25% a 10%) das fibras constituem o trato córticoespinhal ventral ou direto, ocupando o funículo anterior
da medula. Uma parte das fibras do trato córticoespinhal ventral inerva neurônios motores inferiores do mesmo lado, enquanto
outra parte cruza para o outro lado, inervando neurônios motores contralaterais.

Portanto, dos dois grandes feixes de neurônios que srugem, o corticoespinhal anterior/ventral permanece ipsilateral e o
corticoespinhal lateral configurado pela maioria das fibras nervosas que decodificam e permanece associado ao movimento fino
das partes mais distais do corpo, como os dedos, permitindo habilidades como escrever ou manipular objetos.
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O processo neurofisiológico da decussação piramidal explica, portanto, a lesão à direita com reflexos no lado esquerdo do corpo do
paciente.

b) Qual é o objetivo da escala de Glasgow e o que significa o resultado 09?


A Escala de Coma de Glasgow é amplamente utilizada por diversos profissionais da saúde, especialmente por aqueles que
trabalham no âmbito hospitalar, com o intuito de definir o estado neurológico de pacientes a partir da análise de seu nível de
consciência. É uma ferramenta bastante útil para traçarmos prognósticos da vítima e prevenirmos eventuais sequelas.
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ENCEFÁLICO – CHRISTEL ESTUARDO CUNNINGHAM (RA 918104061)
Entretanto, em 2018, essa escala sofreu algumas modificações importantes na sua aplicação, com o intuito de que fossem obtidas
informações mais precisas sobre o prognóstico do paciente. Confira, agora, as mudanças que foram realizadas na nova Escala de
Coma de Glasgow:

1. Inclusão da reatividade pupilar nos critérios de avaliação


avaliação:
iação: Na antiga versão da escala, os únicos critérios avaliados eram:
abertura ocular, resposta verbal e resposta motora. Agora, na nova versão, foi incluída a Reatividade Pupilar,Pupilar ou seja, a
reatividade da pupila à luz. Ao contrário dos outros critérios, este é pontuado de forma decrescente: o pior resultado apresenta
a maior pontuação. Assim, teremos a seguinte atribuição:
 2 pontos – Nenhuma reatividade em ambas as pupilas pupilas
 1 ponto – Sem reação em apenas uma das pupilas pupilas
 0 pontos – Caso as duas pupilas estejam funcionando normalmente

2. Mudança no score total


total de 1 a 15 pontos:
pontos: Na antiga versão da Escala de Coma de Glasgow, a pontuação variava de 3 a 15
pontos. Agora, na nova versão, a escala varia de 1 a 15 pontos.
pontos Isso acontece porque, na nova aplicação, pontuaremos
normalmente todos os outros critérios e, após a nota final, o score da reatividade pupilar será subtraído.
subtraído O cálculo do score
será feito da seguinte forma:
 Escore final = Abertura ocular [1 a 4] + Resposta verbal [1 a 5] + Resposta motora [1 a 6] – Reatividade
Pupilar [0 a 2]
2]
Caso todos os critérios estejam normais, teremos um escore de 15 (afinal, as pupilas normais significam 0 pontos a
menos). Entretanto, caso o paciente apresente a menor pontuação em todos os critérios, teremos o escore final de 1.

3. Inclusão de “critério não-


não-testável”:
testável”: Sabemos que nem todos os pacientes são susceptíveis a serem avaliados da forma como a
antiga Escala de Glasgow propõe. Por exemplo: pacientes amputados não necessariamente terão uma avaliação fidedigna da
resposta motora; pacientes que apresentam surdez não serão responsivos a comandos verbais; pacientes com algum quadro
de afasia não necessariamente conseguirão emitir respostas verbais adequadas. Considerando essas necessidades tão
individuais, além das pontuações nos critérios previamente estabelecidos, podemos agora marcá-los como “NÃO TESTÁVEL”
(NT).

c) Defina estado
estado de coma e descreva sobre a relação fisiológica entre o estado de coma e a formação reticular.
reticular.

Coma (do grego κῶμα, "sono profundo") é um estado de inconsciência do qual a pessoa não pode ser despertada. A manutenção da
consciência depende de dois componentes neurológicos importantes: o córtex, a matéria cinzenta cerebral da camada mais externa
do cérebro, e o sistema de ativação reticular ascendente (SARA).

Em meados do século passado (1949), o americano Horace Magoun e o italiano Giuseppe Moruzzi fizeram uma incrível descoberta,
por engano. Eles estudavam gatos anestesiados quando inadvertidamente estimularam a formação reticular de um dos felinos,
localizada no mesencéfalo.

Naquele exato momento, o eletroencefalograma (EEG) mudou o traçado prévio compatível com o estado de sono profundo e
passou a acusar um estado semelhante ao de vigília. Animados pela descoberta, Magoun e Moruzzi observaram ainda que a
estimulação da mesma região do tronco encefálico não só alterava o traçado do EEG como provocava um estado de alerta nos
gatos.

Os animais, sonolentos ou adormecidos, mas não anestesiados, recuperavam a “consciência”. Eles haviam descoberto uma
substância inerente ao sistema nervoso capaz de ativar o cérebro – a SARA, formação reticular localizada no tronco encefálico, mais
especificamente no bulbo, mesencéfalo e transição mesencéfalo-pontina.
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A SARA (Substância Ativadora Reticular Ascendente) está envolvida na regulação dos ciclos do sono e em ações como o despertar;
atua também filtrando os estímulos sensoriais antes que os mesmos sejam percebidos pelos núcleos diencefálicos e córtex cerebral.
A SARA intervém na regulação do estado de vigília.

A “consciência” passou, então, a ser entendida como um processo contínuo que emergiria basicamente de relações entre o córtex,
algumas formações do diencéfalo e formação reticular. Como hoje se sabe, o coma e outros estados de inconsciência podem ser
produzidos tanto pela destruição da SARA, como também pela inativação de grandes extensões da superfície cortical.

De maneira geral, os neurônios internunciais curtos que formam a zona reticulada da SARA podem atuar, do ponto de vista
eletrofisiológico, em um sistema ascendente, através do diencéfalo, sobre o córtex cerebral, ou através de vias descendentes, as
quais influenciam os sistemas sensitivo-motores da medula espinhal.

Existe um relógio biológico neurológico para o sono, um ritmo circadiano que depende fundamentalmente da produção de certos
neurotransmissores por parte da formação reticular, produção esta que sofre influência de uma gama de fatores.

Atualmente, a maioria dos investigadores concorda que um componente chave do sistema ativador reticular é composto por um
grupo de núcleos produtores de acetilcolina, localizados na transição entre ponte e mesencéfalo, responsáveis pelas projeções de
inúmeros neurônios talamocorticais. Esses mesmos núcleos encontram-se ativos durante a vigília e o sono-REM. Todavia, outras
vias neurais correlatas também interferem diretamente no sono.

É o caso dos núcleos da rafe e do locus coeruleus, com suas projeções serotoninérgicas e monoaminérgicas, respectivamente. O
início do sono seria dado pela inibição de algumas dessas vias, através da atividade do núcleo hipotalâmico pré-óptico ventrolateral
(POVL).

O conceito de consciência é intuitivo. É uma tarefa difícil ou quase impossível descrevê-la adequadamente em palavras. Algumas
das definições mais aceitas afirmam que a consciência é o estado subjetivo de algo percebido, esteja este algo dentro ou fora de
nós. Não há definição consensual. Mas ela remete à opinião, ou à experimentação de algo oposto a objetividade.
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Em alguns escritos, consciência é considerada sinônimo de mente. Mas a mente inclui processos mentais inconscientes, e pode ser
definida como o funcionamento do cérebro imbuído de processar informações e controlar a ação de forma flexível e adaptável. A
consciência tem conteúdo que, embora possa ser variado, não encontra brechas para percepções simultâneas.

Por outro lado, ela não seria somente um fenômeno passivo em resposta a estímulos, mas uma interpretação ativa construída a
partir de dados externos e relações destes com os processos de memória. Algo especificamente relevante para este artigo, a
consciência tem sido equiparada à vigília; eventualmente até são tidas como sinônimos. No entanto, estar vigil não é o mesmo que
estar consciente. Particularmente, encaramos a vigília como a primeira etapa para a produção da consciência. Como se aquela
conferisse ao cérebro autoconhecedor as condições para perceber os estímulos internos e externos, qualificando-os a ponto de
gerar conteúdo. Dali em diante, o cérebro torna-se verdadeiramente consciente.

A SARA teria essa missão: criar as condições para que o cérebro incorpore um estado de alerta e vigília, a ponto de produzir
consciência, em conjunto com outros inúmeros fenômenos neurológicos, mais ou menos complexos, mas vitais para a construção
do eu. Por tudo isso e outros tantos motivos, o assunto instiga a curiosidade. Já imaginou como seria a mente se todos os milhões
de estímulos ambientais alcançassem o cérebro simultaneamente? Seleciona-se o “vital” ao passo que o “trivial” é impelido. Umas
das qualidades mais inteligentes do sistema nervoso repousa justamente na seleção de estímulos.

Referências: USP, MedicinaGeriátrica, Tendencias21, Roberto Lent

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