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SOBRE O ETNOCÍDIO

Por que não usar a palavra genocídio? É preciso, inicialmente, diferenciar genocídio de
etnocídio.

GENOCÍDIO:

Conceito jurídico criado em 1946 no processo de Nuremberg: “Mais precisamente, ele se


refere à primeira manifestação, devidamente registrada pela lei, dessa criminalidade: o
extermínio sistemático dos judeus pelos nazistas alemães” (p.82)

É um delito que tem sua raiz no racismo: um racismo que se desenvolve livremente só
pode conduzir ao genocídio.

Uma pergunta: por que, em relação às guerras coloniais posteriores a 1946, não houve processos judiciais
como os de Nuremberg? Por que nunca houve processos judiciais em relação às guerras coloniais?

O genocídio dos índios americanos: Foi a partir da experiência americana que etnólogos
se viram levados a formular o conceito de etnocídio. É uma ideia que se refere
primeiramente à realidade indígena da América do Sul.

O etnocídio, portando, é a destruição sistemática dos modos de vida e


pensamento de povos diferentes daqueles que empreendem essa
destruição. Em sua, o genocídio assassina os povos em seu corpo, o
etnocídio os mata em seu espírito” (p.83).

Ambos os casos (genocídio e etnocídio) tratam da morte: a supressão física e imediata e


a supressão cultural com efeitos longamente adiados.

Ele tem em comum com o genocídio uma visão idêntica do Outro: o


Outro é a diferença, certamente, mas é sobretudo a má diferença. (p.83)

Distinguem-se pelo tratamento dado à diferença: o genocida busca pura e simplesmente


negá-la; o etnocida lhe impõe uma identidade: “A negação etnocida do Outro conduz a
uma identificação a si”. “Em outras palavras, o etnocídio resulta na dissolução do
múltiplo no Um”. (p.87)

Quem são os praticantes do etnocídio? Em primeiro lugar, os missionários, uma vez que
o Outro, sendo mal do ponto de partida, pode ser convertido e alcançar, por identificação,
a perfeição que o cristianismo representou. “Eliminar a força da crença pagã é destruir
a substância mesma da sociedade” (p.84) (a aula seguinte abordará esse tema a partir da
arquitetura imposta aos povos nativos pelas missões jesuítas).

Trata-se de conduzir o indígena da selvageria à civilização: “O etnocídio é praticado para


o bem do selvagem”
Etnocentrismo e Etnocídio

“[...] se toda cultura é etnocêntrica, somente a ocidental é etnocida” (p.85-6).

O que faz com que o etnocentrismo ocidental tenha se tornado etnocídio?

Trata-se de sua formação como uma “sociedade com Estado”?

O que significa o Estado? Ele é, por essência, o emprego de uma


força centrípeta que tende, quando as circunstâncias o exigem, a
esmagar as forças centrífugas inversas. (p.87)

Seria, então, que a essência unificadora do Estado conduz logicamente a dizer que
toda formação estatal é etnocida? O que diz, para além do eixo formal, a histórica
concreta?

Uma análise a partir da formação política dos Incas: “Os Incas toleravam uma relativa
autonomia das comunidades andinas quando estas reconheciam a autoridade política e
religiosa do Imperador” (p.91)

A partir do exemplo, fica a questão: “Onde se situa a diferença que impede colocar no
mesmo plano, ou pôr no mesmo saco, os Estados bárbaros (Incas, faraós, despotismos
orientais etc.) e os Estados civilizados (o mundo ocidental)?” (p.90)

Nos Estados ocidentais a capacidade etnocida se mostrou sem limites e desenfreada: “É


exatamente por isso que ela pode conduzir ao genocídio e que se pode falar do mundo
ocidental, de fato, como absolutamente etnocida” (p.91)

Ponto chave para a passagem à próxima aula: “Mas de onde provém isso? O que a
civilização ocidental contém que a torna infinitamente mais etnocida que qualquer outra
forma de sociedade? É seu regime de produção econômica” (p.91)

(A articulação entre etnocídio e produção econômica ocidental será abordado na próxima


aula a partir da relação entre a “guerra contra a idolatria pagã” e as práticas de extração
coloniais).

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