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T e n d ê n c i a s

A FUNÇÃO SOCIAL DOS MUSEUS E


CENTROS DE CIÊNCIAS: INTEGRAÇÃO COM
ESCOLAS E SECRETARIAS DE EDUCAÇÃO
Livia Mascarenhas de Paula, Grazielle Rodrigues Pereira e Robson Coutinho-Silva

N
uma sociedade permeada de ciências como espaços e ferramentas Como estratégia para aumentar o seu
pela ciência e tecnologias de inclusão social [2], uma vez que tais público, muitos museus e centros de
(C&T), faz-se necessário co- espaços podem atuar na promoção da ciências têm buscado uma relação mais
nhecer suas potencialidades, inclusão de grupos que por vezes não te- próxima com as pessoas que já os fre-
contribuições e desafios para riam acesso ao conhecimento científico quentam, mas também com aquelas
que as pessoas possam exercer de forma e às discussões geradas em seu entorno. que ainda não o fazem. Na perspectiva
plena a sua cidadania. Nesse contexto, No Brasil, houve um crescimento ex- da inclusão social, destacamos a impor-
entre os diversos agentes que podem pressivo no número de museus e cen- tância da escola, que se constitui como
atuar na divulgação e popularização da tros de ciências desde a década de 1990. uma ferramenta essencial para possibi-
C&T, os museus e centros de ciências A visitação a esses espaços, no entanto, litar o acesso aos espaços museais, em
apresentam-se como espaços profícuos ainda é muito baixa quando comparada especial para as camadas da sociedade
para essas ações. Valente destaca que à de museus de ciências em países mais com menor poder aquisitivo. Con-
“É tendência mundial utilizar cada vez desenvolvidos. Dados da pesquisa de forme destaca Costa, o trabalho cola-
mais os museus e centros de ciência não percepção pública da ciência nacional borativo dos museus com as escolas é
só como instrumento de divulgação do de 2015 apontam que mais de 80% da fundamental para a ampliação do seu
conhecimento científico e tecnológi- população entrevistada não havia visi- alcance social, “uma vez que a escola é
co, mas também de democratização do tado nenhum centro ou museu de ciên- a instituição com maior penetração na
acesso a esse conhecimento” [1]. cia nos 12 meses anteriores [3]. sociedade e com maior capacidade de
Ao longo da história, os museus e cen- Outro ponto relevante a se considerar promover a sistematização com conti-
tros de ciências sofreram transforma- é a distribuição desses espaços pelo nuidade da ação educativa” [5].
ções significativas, principalmente em Brasil. De acordo com o levantamen- A relação dos espaços museais com o pú-
relação às abordagens das expografias, to realizado para o Guia de Centros e blico escolar, por sua vez, passa por ações
à sua relação com o público e à sua fun- Museus de Ciências do Brasil em 2015, de parceria e de trabalho colaborativo
ção social. Atualmente, discute-se um houve um aumento de 41% no número entre museu, escola e secretarias de edu-
museu mais participativo, onde os visi- de instituições do gênero no país em re- cação. Conforme afirma Köptcke: “A
tantes são sujeitos autônomos e críticos. lação a 2009 [4]. Do total de 268 espa- parceria educativa entre o ensino formal
Muitos têm buscado se tornar espaços ços, no entanto, 155 estão localizados e o museu encontra justificativa dentro
de reflexão e discussão acerca de temas na região Sudeste e 43 no Sul. Em um de um projeto social e político de demo-
de ciência e tecnologia, contemplando cenário como esse, de má distribuição cratização da cultura e da educação” [6].
em suas ações o dia a dia da comunida- dos espaços museais, ainda é comum A partir das reflexões tecidas, buscamos
de local. Adotamos aqui a perspectiva que parte da população não visite ou verificar se e quais relações de parce-
da divulgação científica e dos museus sequer saiba de sua existência. ria entre museus de ciências, escolas

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e secretarias de educação vêm sendo do espaço escolar a fim de suprir a ausên- Referências
desenvolvidas pelos espaços do gênero cia do docente. Pereira, em seu estudo
1. Valente, M. E. A. “Os museus de ciência e
localizados na região metropolitana do sobre os programas formativos de profes-
tecnologia: algumas perspectivas no Bra-
Rio de Janeiro. Realizamos entrevistas sores nos museus e centros de ciências,
sil dos anos 1980”. Anais do XVII Encontro
semiestruturadas com os responsáveis aponta que a falta de apoio das secretarias Regional de História – O lugar da História.
por seis museus que aceitaram partici- de educação é um empecilho na divulga- ANPUH/SP-Unicamp. Campinas, 6 a 10 de
par do estudo. ção desses programas junto aos docentes setembro de 2004. Cd-rom.
Entre as atividades voltadas para o públi- e na participação dos mesmos [8]. 2. Cazelli, S.; Coimbra, C. A. Q.; Gomes, I. L.;
co escolar, todos os espaços menciona- Ou seja, a fragilidade das relações entre Valente, M. E. “Inclusão social e a audiên-
museu-escola-secretaria de educação cia estimulada em um museu de ciência”.
ram realizar visitas mediadas às suas ex-
Museologia & Interdisciplinaridade. Vol.1V,
posições e ofertar cursos e programas es- dificulta a mobilização de professores e
nº.7, p. 206-223. Out./nov. de 2015.
pecíficos para professores. Pereira, Paula alunos para visitas aos museus e a reali-
3. Brasil. Percepção pública da ciência e tec-
e Coutinho-Silva salientam que museus zação de atividades de formação nesses nologia 2015: ciência e tecnologia no olhar
e centros de ciência “têm atuado como espaços, bem como a criação de políticas dos brasileiros. Brasília: Centro de Gestão e
coadjuvantes no processo de educação de incentivo a esse tipo de ação. A relação Estudos Estratégicos, Ministério de Ciência
científica e, com sua pedagogia própria, contínua e estruturada entre tais atores e Tecnologia. 2015. Disponível em: < http://

têm investido em ações e atividades que é necessária para a efetiva integração das percepcaocti.cgee.org.br/>
visitas aos museus às práticas pedagógicas 4. Associação Brasileira de Centros e Museus
visam abarcar desde o sujeito que visita a
de Ciência. Centros e museus de ciência
exposição até o professor que busca uma das escolas. Ainda que o estabelecimento
do Brasil 2015. Rio de Janeiro: Associação
formação continuada” [7]. dessas parcerias seja complexo, por con-
Brasileira de Centros e Museus de Ciência:
Se por um lado ficam evidentes os esfor- ta de questões burocráticas e políticas, é UFRJ/FCC. Casa da Ciência; Fiocruz. Museu
ços dos museus no sentido de aproxima- importante que as instituições se empe- da Vida, 2015. 312p.
ção com os professores, a relação desses nhem nessa busca. Somente com esforços 5. Costa A. F. “A importância da colaboração

espaços com a direção das escolas e com contínuos que visem o fortalecimento da museu-escola”. In: Andrade, A. R. P. (org),

as secretarias de educação demons- parceria museu-escola-secretaria de edu- Guia de visitação ao Museu Nacional: refle-
cação será possível criar uma cultura de xões, roteiros e acessibilidade. Rio de Ja-
trou-se precária. Observamos que, em neiro: Editora da UFRJ, p.7-10, 2013.
alguns casos, a parceria limita-se à di- visitação aos museus e centros de ciências,
6. Köptcke, L. S., “Parceria museu e escola
vulgação das atividades do museu por o que se constitui como parte essencial da
como experiência social e espaço de afir-
meio das secretarias. Uma das dificul- função desses espaços numa perspectiva mação do sujeito”. In: Gouvêa, G. et al. (org),
dades atribuídas para a construção de de inclusão social. Educação e museu – A construção social do
relações mais sólidas são as constantes caráter educativo dos museus de ciência.
Livia Mascarenhas é doutora em ensino em
Rio de Janeiro: Access, p. 107-128, 2003.
mudanças de gestão da administração biociências e saúde pelo Instituto Oswaldo
7. Pereira, G. R.; Paula, L. M.; Coutinho-Silva, R.
pública, que levam à descontinuidade Cruz – IOC/Fiocruz, produtora cultural da
Casa da Ciência – Centro Cultural de Ciência “Motivações para a implantação de progra-
de contatos feitos anteriormente. mas formativos de professores nos museus
e Tecnologia da Universidade Federal do Rio
As parcerias entre museus e secretarias de Janeiro (UFRJ) e colaboradora no Espaço de ciência do Rio de Janeiro”. Anais do ­Lasera
de educação faz-se necessária na medida Ciência Viva. 2016, San José de Costa Rica, p.1-11, 2016.
que grande parte das ações realizadas pe- Grazielle Rodrigues é doutora em ciências 8. Pereira, G. R. “O ensino de ciências nos
las escolas, como as visitas aos museus de biológicas pelo Instituto de Biofísica Carlos anos iniciais do ensino fundamental e a
Chagas Filho da UFRJ e diretora de ensino do formação continuada de professores: im-
ciências, devem passar pelo crivo de tais
campus Mesquita do Instituto Federal do Rio plantação e avaliação do programa forma-
instâncias. A participação dos professores tivo de um centro de ciência”, 231 p. Tese
de Janeiro.
nos cursos propostos pelos espaços mu- Robson Coutinho é professor titular do Insti- (doutorado). Programa de Pós-Graduação
seais também demanda a anuência das tuto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ em Ciências Biológicas, Biofísica, Universi-
secretarias de educação e a reorganização e diretor científico do Espaço Ciência Viva. dade Federal do Rio de Janeiro, 2014.

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