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Entrevista clínica e anamnese

Escolhemos o tema entrevista e anamnese como o primeiro a ser abordado no


blog com relação às modalidades de intervenção na saúde. A entrevista clínica
possui aspectos em comum com a interação social, porém, sua diferenciação
se faz marcadamente por ser uma conversa predominantemente unidirecional,
inserida numa relação profissional, tendo pré-determinado um tempo de
duração, local e frequência dos encontros. Apesar de a maioria das
informações serem advindas do relato do sujeito, é necessário que o terapeuta
relacione estas informações com a observação clínica, relatos adicionais de
pessoas significativas, registros sobre o caso, testagem psicológica e
entrevistas suplementares. A definição da entrevista clínica é retratada de
forma bastante completa segundo Tavares, 2007:

“A entrevista clínica é um conjunto de técnicas de investigação, de tempo


delimitado, dirigido por um entrevistador treinado, que utiliza conhecimentos
psicológicos, em uma relação profissional, com o objetivo de descrever e
avaliar aspectos pessoais, relacionais ou sistêmicos (indivíduo, casal, família,
rede social), em um processo que visa a fazer recomendações,
encaminhamentos ou propor algum tipo de intervenção em benefício das
pessoas entrevistadas”.

O entrevistador deve estar atento aos processos no outro, facilitando seu


contato com a própria experiência. Assim, precisa observar que assume uma
posição de poder na relação, que é assimétrica, conduzindo a entrevista de
forma a colocar seus conhecimentos psicológicos em favor do interesse e bem
estar do paciente, dominando as especificidades da técnica e conhecimentos
utilizados, e reconhecendo a necessidade periódica de treinamento ou
atualização. Nesta relação, cabe ao entrevistado prestar informações e ter
condições de prestar as informações necessárias (Tavares, 2007).
Tipos de entrevista

Podemos classificar a entrevista de acordo com sua estrutura, objetivos,


métodos e enquadramento teórico de referência. Nesta postagem, daremos
enfoque aos objetivos e estrutura.

Quanto ao objetivo, a entrevista pode ser:

Diagnóstica

Visa estabelecer o diagnóstico e o prognóstico do paciente, assim como as


indicações terapêuticas adequadas.

Psicoterápica

Busca colocar em prática uma estratégia de intervenção psicológica de acordo


com alguma das diversas abordagens clínicas.

De encaminhamento

Tem o objetivo de indicar o tratamento do paciente, o qual não será conduzido


pelo entrevistador. Deve-se evitar que o entrevistado desenvolva um vínculo
forte.

De seleção

Visa selecionar um candidato a vaga de emprego, tendo previamente o


conhecimento acerca  de seu currículo e analisando as características do
candidato de acordo com o perfil do cargo, destacando seus aspectos mais
significativos com relação à vaga.

De desligamento

Pode ter relação com a alta do paciente ou demissão do funcionário de uma


empresa. Visa estabelecer planos do pós alta ou a necessidade de trabalhar
alguma questão pendente; no caso do funcionário, tem o objetivo de obter um
feedback sobre o ambiente de trabalho, e em algumas situações também
fornecer um ao funcionário.

Quanto à estrutura, segundo Gil (1999), encontramos os seguintes tipos de


entrevista:

Entrevista informal (não estruturada)

Tem como objetivo básico a coleta de dados. Neste tipo de entrevista, o maior
peso incide no entrevistador. Por não portar um questionário pré-definido, fica a
seu critério explorar as questões que considere mais importantes, podendo se
adaptar as necessidades de cada entrevistado. Porém, como esse tipo de
coleta de dados depende do discernimento do entrevistador, existe o risco de
questões importantes serem menosprezadas em detrimento de outras.

Entrevista focalizada (semi-estruturada)


É livre como a entrevista informal, porém direcionada para um determinado
tema pré-estabelecido. Quando o entrevistado se distancia do tema, o
entrevistador deve fazê-lo retomar o foco.

Entrevista por pautas (semi-estruturada ou semi-dirigida)

Estas entrevistas apresentam certo grau de estruturação, pois há uma relação


de pontos de interesse, com perguntas abertas pré-estabelecidas ou um
esquema pré-definido. As pautas devem ser ordenadas e guardar certa relação
entre si. No decorrer da entrevista, o entrevistador pode investigar outros
aspectos que considere relevantes, elaborando novas questões. O entrevistado
poderá falar livremente sobre as pautas, e caso se distancie, o entrevistador
deve intervir de forma sutil.

Entrevista estruturada (fechada)

Na entrevista estruturada, existe uma relação fixa de perguntas, cuja ordem e


formulação permanecem invariáveis para todos os entrevistados, que
geralmente são em grande número. Este tipo de entrevista é frequentemente
utilizado como forma de coleta de dados quantitativos para pesquisas.

Sequência temporal da entrevista diagnóstica

Nesta postagem, teremos como foco a entrevista com objetivo


psicodiagnóstico. Segundo Golder (2000), a sequência temporal pode ser
dividida em entrevista inicial, entrevistas subsequentes e devolutiva, as quais
possuem características e objetivos distintos.

Entrevista inicial

A primeira entrevista tem, em geral, o objetivo de estabelecer um acordo entre


o terapeuta e o paciente. O empenho do terapeuta nessa primeira entrevista
pode ter influência decisiva na continuidade ou abandono do tratamento
(Fiorini, 1987). Deve haver uma breve apresentação que vise eliminar falsas
expectativas do entrevistado, explique os processos de avaliação e explicite os
objetivos, além de definir bem o papel de todos os participantes. É necessário
informar da confidencialidade das informações fornecidas, do sigilo profissional,
e explorar a possibilidade de coletar informação de outras fontes (por exemplo,
com a família). Conforme Gilliéron (1996), a primeira entrevista deve permitir
conhecer o modo de chegada do paciente à consulta, o tipo de relação que ele
busca estabelecer com o terapeuta e as queixas iniciais verbalizadas pelo
paciente. No final desta entrevista, devem ficar esclarecidos os horários,
duração das sessões, honorários, forma de pagamento, condições para
administrar instrumentos de testagem e para a consulta de terceiros.

Entrevistas subsequentes

Após a entrevista inicial, na qual os contratos já foram estabelecidos, nas


entrevistas subsequentes são coletados os dados com relação a história do
entrevistado, tais como suas fases de desenvolvimento, escolaridade e
relações profissionais, familiares e sociais, além da possível aplicação de
testes, conforme o objetivo do processo.

Entrevista devolutiva

Ao final do processo de entrevista, o entrevistador deve dar um feedback ao


paciente. Este processo deve encerrar-se de acordo com o tempo previsto
anteriormente. Cunha (1993), fornece alguns direcionamentos sobre a
entrevista devolutiva: após a interpretação dos dados, o entrevistador deve
comunicar o resultado do psicodiagnóstico e indicar a terapêutica mais
adequada; a devolução deve iniciar pelos aspectos menos comprometidos do
paciente, que mobilizam menos ansiedade, e por fim, deve-se evitar o uso de
jargão técnico, e dar foco ao sintoma que é relatado na queixa principal. Deve
ser feito também com o entrevistado um resumo da entrevista para garantir que
a informação foi bem compreendida por ambos.

Cuidados na hora de entrevistar

Segundo Erickson (apud Scheeffer, 1977), existem algumas recomendações


para o processo de entrevista psicológica:

 O entrevistador deve ter cuidado para não transformar a entrevista numa


conversa social;
 O entrevistador não deve completar as frases do entrevistado, e evitar
perguntas que tenham respostas do tipo sim/não. Não deve interromper
também o fluxo de pensamentos do entrevistado;
 A atitude do entrevistador deve ser de aceitação completa das vivências
do entrevistado
 As pausas e silêncio podem ser embaraçosas para o entrevistador,
porém, o entrevistado poderá estar revivendo experiências ou refletindo acerca
da questão. Se a pausa for longa, o entrevistador pode retomar um tópico
anterior;
 O tempo de entrevista deverá ser marcado, e o entrevistado comunicado
sobre o tempo que dispõe;
 É necessário trocar o pronome pessoal ‘eu’ por expressões mas vagas,
como “parece-me que…”
 É necessário fazer uma síntese do que foi conversado ao final de cada
entrevista;

Além disso, o entrevistador deverá atentar para a adequação da linguagem ao


entendimento do entrevistado; perceber a influência que exerce na resposta do
entrevistado (através da entonação de voz que faz ao perguntar, por exemplo,
ou mesmo expressões faciais de reação à resposta do entrevistado); levar em
consideração o contexto sócio-econômico, idade, sexo e classe social para
adequar as perguntas e compreender as respostas; considerar a diferença
entre o que as pessoas relatam e o que realmente fazem; tomar cuidado com
as especificidades de perguntas que se relacionem com atitudes, crenças e
hábitos; compreender que respostas anteriores afetam as respostas à
perguntas seguintes; que as pessoas podem ter dificuldade para emitir suas
opiniões; evitar termos técnicos e jargões profissionais; e, por fim começar com
perguntas mais genéricas, deixando as específicas ou que provoquem maior
mobilização emocional para o final.

Desvantagens da entrevista

A entrevista depende diretamente da capacidade de comunicação das


pessoas, e de verbalizar suas ideias. Portanto, a falta ou excesso de motivação
do entrevistado podem comprometer a fidedignidade dos resultados, além de
algumas respostas poderem ser falseadas, quer seja consciente ou
inconscientemente. Estas podem também reter dados, por receio da violação
do anonimato. O entrevistador está sempre sujeito a causar indução nas
respostas das pessoas, suas opiniões tem influência sobre a interpretação dos
dados, tornando a análise de conteúdo delicada, devido à suas noções pré-
concebidas, expectativas e visão de mundo.

Anamnese

A Anamnese é uma recuperação da memória, o processamento de


informações preestabelecidas que são informadas pelo paciente, um resumo
de todo um histórico de seu processo saúde-doença. Não é uma história
qualquer, a anamnese, juntamente com a entrevista, precisa ter um foco para a
investigação ser bem-sucedida e as informações adquiridas serem bem
aproveitadas. Dependendo da área em que o psicólogo trabalhe, alguns
aspectos de anamnese são mais importantes que outros, cabe ao psicólogo ter
uma negligência seletiva para separar o que é fundamental do que pode ser
negligenciado em sua investigação.

Diferente da entrevista, que busca informações que o paciente não está ciente
(dentre outras), na anamnese o paciente é o moderador, pois, supõe-se de que
ele conheça sua própria história e que é capaz de fornecer informações sobre
ela. Porém, a anamnese pode ser feita dentro do processo de entrevista.

Antes de obter qualquer informação, é necessário estabelecer uma boa relação


com o cliente, mostrar interesse pelo que ele tem para contar é de fundamental
importância para que a conversa flua naturalmente, em alguns casos se deter
ao roteiro pode passar uma impressão de desinteresse pelo que o cliente tem a
dizer, e isto pode resultar em respostas vazias por parte do cliente. Algumas
palavras e expressões são perigosas para se usar em uma anamnese, evitem
o uso de expressões e entonações que sugerem julgamento à fala do cliente,
como também frases que cobram justificativas de alguns comportamentos do
sujeito.

Evite perguntar “por quê?”, induzir alguma coisa, por palavras na boca do
cliente. Respeite o silêncio em perguntas polêmicas e dê espaço para o cliente
chorar, respeitando aquele momento, pode dar uma pausa na entrevista se
necessário.

Existem alguns modelos de anamnese pré-estabelecidos para ajudar o


profissional com algumas perguntas importantes, exibiremos a seguir roteiros
elaborados pela nossa turma, cada roteiro foi adaptado à realidade dos
estágios de cada grupo.

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