METROLOGIA-2003 – Metrologia para a Vida
Sociedade Brasileira de Metrologia (SBM)
Setembro 01−05, 2003, Recife, Pernambuco - BRASIL
O ESTADO DA ARTE DA METROLOGIA
DE VAZÃO DE GÁS NATURAL NO BRASIL
Kazuto Kawakita1 , Giovanni do Espírito Santo1 , Rubens Silva Telles1
1
IPT-Instituto de Pesquisas Tecnológicas-Centro de Metrologia de Fluidos, São Paulo, Brasil
Resumo: O presente artigo foi escrito com a intenção de
contribuir para a disseminação da cultura metrológica,
fornecendo uma visão geral à comunidade do gás natural
sobre a metrologia de vazão atualmente praticada no país.
É apresentada inicialmente uma série de informações
relacionadas ao gás natural, abordando de forma bastante
simplificada a sua origem e as etapas de exploração,
processamento, transporte e a distribuição até o consumidor
final.
A seguir, é ressaltada a importância econômica e legal da
medição da vazão nas transações comerciais entre
fornecedores e compradores de gás e de transferência de
custódia entre produtores e transportadores de gás.
Os aspectos particulares mais diretamente relacionados à
metrologia, são abordados na descrição do estado da arte em
que se encontra a medição da vazão de gás natural no Brasil,
mostrando os diferentes princípios e sistemas de medição
utilizados nos setores de produção e exploração,
transferência de custódia, industrial, residencial e
automotivo. São apresentadas, além das características de
operação, as vantagens e limitações dos medidores e
equipamentos envolvidos nessas medições e as incertezas
típicas praticadas na medição de vazão de gás natural.
Palavras chave: gás natural, medição de vazão, medidores
de vazão.
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, o gás natural tem se tornado um
importante insumo energético com participação crescente na
matriz energética nacional. As suas qualidades e vantagens
frente às outras fontes de energia fomentaram as aplicações
industriais, domiciliares e automotivas do gás natural,
notadamente nos grandes centros urbanos e industriais das
regiões Sul, Sudeste e Nordeste. Com efeito, somente o
volume de gás transportado através de tubulações em terra já
ultrapassa os 22 milhões de metros cúbicos por dia.
Nas unidades de produção on-shore / off-shore e ao longo
dos milhares de quilômetros de gasodutos e ramais
secundários de distribuição, existem instaladas unidades de
produção e de processo, estações de compressão e de
controle, além de centenas de estações de medição de vazão
utilizadas para quantificar os volumes de gás submetidos à
medição fiscal, operacional e de transferência de custódia.
Se considerarmos os medidores de gás natural domiciliar,
então, este número atinge as centenas de milhares de
unidades, fazendo com que a vazão seja um dos principais
parâmetros submetidos ao controle metrológico.
Devido aos aspectos legais e comerciais envolvidos, é
comum observar, principalmente nas estações de medição
mais importantes, que os fornecedores de gás e os
recebedores operam de forma independente os seus próprios
sistemas de medição, sempre verificando se as diferenças
entre ambas as medições estão dentro das tolerâncias
acordadas entre as partes por meio de instrumentos
contratuais detalhados.
Nesse sentido, pode se dizer que o principal objetivo de um
sistema de medição de gás natural é o de realizar medições
exatas e confiáveis dos volumes de gás, por meio do uso de
equipamentos controlados e técnicas de medição
reconhecidas, que possam assegurar um nível de incerteza
aceitável para as medições, e que atendam aos requisitos e
limites de normas e regulamentos da indústria do gás.
Ressalte-se que, diferentemente de outras áreas da
metrologia como a de longitude, massa, temperatura ou
tempo, já relativamente bem consolidadas, a metrologia de
vazão de fluidos apresenta particularidades e dificuldades
intrínsecas, encontrando-se ainda em amplo
desenvolvimento. A vazão é uma grandeza derivada e
sujeita, entre outros fatores, às condições dinâmicas e
termodinâmicas do escoamento sob medição. O
mensurando[1] depende de uma matriz multidimensional de
condições como uma ampla faixa de vazões, pressões,
temperatura, tipos de fluidos e suas propriedades
fluidodinâmicas. Além disso, os tipos de medidores de
vazão e os princípios de operação ultrapassa as centenas.
Tais razões têm contribuído para que a medição de vazão de
fluidos continue sendo um dos desafios a serem vencidos
tanto no campo da metrologia legal quanto na científica e
industrial.
2. O GÁS NATURAL
O gás natural é um combustível
fóssil encontrado em rochas
porosas no subsolo, podendo
estar associado ou não ao
petróleo. A sua formação advém
Fig. 1. O gás natural. das eras pré-históricas, como
resultado do acúmulo de energia solar sobre matérias
orgânicas soterradas em grandes profundidades ao longo o
processo de acomodação da crosta terrestre [2].
O gás natural é composto por gases inorgânicos e
hidrocarbonetos saturados, predominando o metano e, em
menores quantidades o propano e o butano, entre outros.
Geralmente, apresenta baixos teores de contaminantes como
o nitrogênio, CO2 , água e compostos de enxofre. O gás
natural permanece no estado gasoso, sob pressão
atmosférica e temperatura ambiente.
Mais leve que o ar, o gás natural dissipa-se facilmente na
atmosfera em caso de vazamento. Para que se inflame, é
preciso que seja submetido a uma temperatura superior a
620°C. A título de comparação, vale lembrar que o álcool se
inflama a 200°C e a gasolina a 300°C. Além disso, é incolor
e inodoro, queimando com uma chama quase imperceptível.
Por questões de segurança, o gás natural comercializado é
odorizado com enxofre.
São inúmeras as vantagens econômicas do uso do gás
natural, mas sua maior contribuição está ligada diretamente
à melhoria dos padrões ambientais. Devido à sua pureza,
produz uma queima limpa e uniforme, sem a presença de
fuligem e de outras substâncias que prejudicam o meio
ambiente. Ao substituir, por exemplo, a lenha, o gás reduz o
desmatamento.
Nos grandes centros, diminui consideravelmente a emissão
de compostos de enxofre e particulados, sem gerar cinzas ou
detritos poluentes oriundos da utilização de outros
combustíveis, seja no uso industrial ou no automotivo. O
uso do gás natural assegura a melhoria da qualidade do ar
que se respira, baixando os índices de poluição nas grandes
cidades e, consequentemente, de doenças respiratórias.
Numa época em que as atenções estão cada vez mais
voltadas para as questões relacionadas a meio ambiente, haja
visto o tema do presente evento “Metrologia para a Vida”, o
gás natural se apresenta como uma das melhores alternativas
energéticas para o país, pois trata-se de trata um combustível
versátil, econômico e limpo que vem sendo disponibilizado
em escala compatível com a demanda nacional.
2.1 Principais usos do gás natural
O gás natural é usado como combustível para fornecimento
de calor, geração de eletricidade e de força motriz; como
matéria-prima nas indústrias siderúrgica, química,
petroquímica e de fertilizantes. Na área de transportes é
utilizado como substituto do óleo Diesel, da gasolina e do
álcool.
Tais fatores permitem a utilização quase irrestrita do produto
em vários segmentos, atendendo as determinações
ambientais e contribuindo de forma eficaz e eficiente no
controle dos processos, segurança e qualidade. Desta forma,
o gás natural participa direta ou indiretamente da vida de
toda a população.
§ Gás natural domiciliar - O gás natural utilizado dentro
de residências é chamado de "gás natural domiciliar". É um
mercado em franca expansão, especialmente nos grandes
centros urbanos de todo o País. As companhias
distribuidoras estaduais têm planos de grande ampliação de
suas redes, e o aumento do consumo de gás domiciliar
demanda investimentos expressivos em expansão, conversão
e em recepção e adaptação nas residências.
§ Gás natural veicular (GNV) - No uso em automóveis,
ônibus e caminhões, o gás natural recebe o nome de "gás
natural veicular", oferecendo vantagem no custo por
quilômetro rodado em relação à gasolina. Como é seco, o
gás natural não provoca resíduos de carbono nas partes
internas do motor, aumentando a sua vida útil e o intervalo
entre trocas de óleo e, reduzindo significativamente os
custos de manutenção.
§ Uso industrial - Utilizado como combustível, o gás
natural proporciona uma combustão limpa, isenta de agentes
poluidores. É ideal para processos que exigem a queima em
contato direto com o produto final, como, por exemplo, na
indústria cerâmica e na de fabricação de vidro e cimento. O
gás natural também pode ser utilizado como redutor
siderúrgico na fabricação de aço e, de formas variadas,
como matéria-prima: na indústria petroquímica,
principalmente para a produção de metanol, e na indústria de
fertilizantes, para a produção de amônia e uréia.
§ Termelétricas - A utilização de turbinas a gás para
geração de eletricidade, combinada com a recuperação de
calor para a produção de calor, é conhecida como cogeração.
Esse processo vem sendo utilizado por indústrias do mundo
inteiro, devido à garantia de economia e segurança
operacional. No Brasil, o gás natural já foi considerado
como uma solução para recente crise na geração da
hidroeletricidade, fato que o consolidou também como uma
potencial opção para um eventual aumento da demanda de
energia elétrica.
2.2 A história do gás natural no Brasil
A utilização do gás natural no Brasil começou de forma
modesta por volta de 1940, com as descobertas de óleo e gás
no Estado da Bahia, atendendo a indústrias localizadas no
Recôncavo Baiano. Depois de alguns anos, as bacias do
Recôncavo, Sergipe e Alagoas eram destinadas quase em
sua totalidade para a fabricação de insumos industriais e
combustíveis para a refinaria Landulfo Alves e para o Pólo
Petroquímico de Camaçari.
O grande marco do gás natural ocorreu com a exploração da
Bacia de Campos, no Estado do Rio de Janeiro, na década
de 80. O desenvolvimento da bacia proporcionou um
aumento no uso da matéria-prima, elevando a participação
do gás natural na matriz energética nacional.
O Governo Federal tem como meta elevar a participação do
gás natural dos atuais 3% para 12% até 2010. Para isso,
diversos esforços estão sendo realizados. A construção do
gasoduto Bolívia-Brasil representou um grande avanço no
fornecimento de gás natural no país, com capacidade
máxima de transportar até 30 milhões m³ de gás
diariamente. Além disso, alguns projetos já estão em estudo
para a exploração da Bacia de Santos no litoral paulista e a
Bacia do Solimões, na região Norte do país.
2.3 As reservas nacionais de gás natural 3. O CAMINHO DO GÁS NATURAL ATÉ O
CONSUMIDOR
As reservas provadas nacionais são da ordem de 219,8
bilhões de metros cúbicos, sendo que entre os estados com Para chegar ao consumidor final, o gás natural passa por
maiores depósitos destacam-se os Estados do Rio de Janeiro, uma série de etapas que vão desde a exploração da jazida,
Rio Grande do Norte e Amazonas. A maior parte do gás passando pela produção, processamento, transporte, e
existente no país (80%) está associado a jazidas de petróleo, chegando finalmente à dis tribuição.
limitando a extração do produto. Além disso, as reservas da
Nesse caminho, que se assemelha ao percurso do sangue
Amazônia só poderão ser utilizadas após a construção dos
através das artérias e capilares do corpo humano, o gás é
gasodutos ligando Urucú a Porto Velho e Coari a Manaus,
comprimido, processado e transportado ao longo de
ambos em implantação pela Petrobrás.
centenas de quilômetros de tubulações que compõem as
Para complementar a produção nacional, viabilizou-se a malhas de gasodutos que cruzam fronteiras de estados e de
importação da Bolívia e Argentina. Os gasodutos Bolívia-Brasil municípios, passando por estações de regulagem e medição
e Uruguaiana-Porto Alegre, quando totalmente prontos, irão até chegar às distribuidoras e seus consumidores.
abastecer mais de 150 municípios brasileiros, atravessando os
estados do Mato Grosso do Sul, São Paulo, Santa Catarina e
Rio Grande do Sul, além de também beneficiar indiretamente
os estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Na realidade, tem-se um grande desafio à frente: chegar em
2010 com uma participação de 12% do gás natural na matriz
energética brasileira, ultrapassando a marca de
aproximadamente 80 milhões de metros cúbicos dia. A
tendência é que o aumento da demanda interna pelo Fig. 2. Transporte e distribuição do gás natural.
combustível, nos próximos anos, estimule a criação de
novas parcerias internacionais, em particular com os países Na fase de distribuição, o gás já deve estar atendendo a
da América do Sul, garantindo o suprimento para as padrões rígidos de especificação, e praticamente isento de
próximas décadas. contaminantes para não causar problemas aos equipamentos
A figura 2 mostra a localização dos principais gasodutos em onde será utilizado como combustível ou matéria-prima.
operação, em projeto e em construção no País. Quando necessário, deverá também estar odorizado, para ser
detectado facilmente em caso de vazamentos.

3.1 Cadeia de transporte e distribuição do gás no Brasil

Partindo da produção até chegar ao consumidor final, em cada
etapa o gás natural é movimentado sob a responsabilidade de
uma empresa diferente que, seqüencialmente, o repassa para a
próxima empresa, por meio de processos denominados de
transferência de custódia.

A transferência de custódia é realizada em estações controle

e de medição específicas, localizadas em entroncamentos de
gasodutos, ou em citygates onde a transportadora entrega o
gás para a concessionária local (Figura 3).

Fig. 2. Malha de gasodutos.

Os gasodutos da Malha Sudeste são responsáveis por cerca

de 80% de todo o gás transportado no País, seguido da
Malha Nordeste com cerca de 14% e da Malha Capixaba
Fig. 3. Citygate típico.
com aproximadamente 6%.
A Figura 4 apresenta de forma esquemática a cadeia de transporte e de distribuição do gás natural no Brasil, mostrando o
p ercurso do gás natural da produção até o consumidor final.

PRODUÇÃO
+
IMPORTAÇÃO
(Petrobrás)

Placa de
orifício

Placa de
orifício

TRANSPORTE
(Transpetro, TBG)

Citygate
Placa de
orifício

Turbina Ultra-sônico

DISTRIBUIÇÃO DISTRIBUIÇÃO DISTRIBUIÇÃO

Concessionário Concessionário Concessionário
A B C

Skid turbina
e rotativo
Placa de
orifício

Consumidor
Consumidor industrial
industrial Anel metropolitano

Consumidores Postos de
residenciais GNV
Consumidores Rotativo
comerciais Diafragma
Diafragma
Coriolis

Skid turbina Skid turbina

e rotativo e rotativo
Consumidor Consumidor
industrial industrial

Fig. 4. Cadeia de transporte e de distribuição do gás natural no Brasil.

4. MEDIDORES DE GÁS NATURAL EM USO NO PAÍS
É possível verificar pela Figura 4 que, no Brasil, as
medições de vazão de gás natural para fins fiscais e de
transferência de custódia são realizadas essencialmente por
meio do uso de placas de orifício e turbinas.
A seguir, são descritos esses medidores, seus princípios de
operação e suas principais características, vantagens e
limitações funcionais e metrológicas.
4.1 Sistemas de medição de vazão por placa de orifício

Nas medições de distribuição aos consumidores industriais
são utilizados medidores dos tipos turbina e rotativos. A
medição do gás domiciliar, por sua vez, é feita por meio do
tradicional medidor tipo diafragma; e a do GNV é realizada
com o uso de medidores mássicos do tipo Coriolis.
Um dos princípios mais comumente utilizados na medição
de gás natural no mundo é a placa de orifício. Trata-se de
uma tecnologia tradicional e bastante conhecida, regulada
por meio de normas como, por exemplo, os documentos da
ABNT[3], ISO[4], API[5] e AGA [6].
A placa de orifício é um elemento de restrição plano, imerso
transversalmente no escoamento, e que provoca uma
diferença na pressão entre duas seções transversais
específicas localizadas a montante e a jusante da placa.
Esta pressão diferencial (∆p) pode ser relacionada
diretamente ao quadrado da vazão em massa ( m & ) do fluido
passante através do orifício, por meio de uma relação do tipo
∆p = K m 2
& , onde K é função de parâmetros dimensionais e
do escoamento sob medição.
Um sistema de medição de gás natural por placa de orifício
é composto basicamente de três partes: os chamados
elementos primário, secundário e terciário.
O elemento primário é o responsável pelo condicionamento
do escoamento e pela geração do sinal de pressão diferencial
de forma a validar as leis de similaridade do escoamento. É
composto dos trechos retos de tubulação de montante e de
jusante, da válvula ou dos flanges porta-placa, das tomadas
de pressão e de temperatura, da placa de orifício e do
condicionador/retificador de escoamento, se utilizado.
O elemento secundário é formado pelos sensores e
transmissores de pressão estática, pressão diferencial,
temperatura e, se utilizado, o cromatógrafo.
Finalmente, o elemento terciário é composto do corretor
eletrônico de volume ou do computador de vazão, responsável
pela conversão da vazão medida ao longo de um período em
um determinado volume referido às condições base de
pressão e temperatura. A Figura 5 mostra os componentes de
um sistema de medição por placa de orifício.
Computador
Elemento
terciário de vazão
∆P P T
Elementos Transmissores
secundários
Elemento primário
Tomadas de
Tubo de medição pressão
calculada por meio de relações empíricas como a equação de
Reader-Harris/Gallagher.
Outra vantagem importante é o custo relativamente baixo da
placa de orifício que, associado ao domínio público da
tecnologia, permite que o índice de nacionalização na
fabricação do elemento primário seja de 100%, permitindo,
assim, que uma instalação de medição possa ser
redimensionada e adequada às novas necessidades com
relativa facilidade.
No Brasil, a exemplo de muitos outros países, a placa de
orifício é amplamente utilizada nas medições de gás natural,
em aplicações de medição fiscal e transferência de custódia.
Na maioria dos casos, desde que devidamente projetados,
fabricados, instalados e operados, os sistemas podem
apresentar níveis de incerteza na medição de vazão
compatíveis com os requisitos do Regulamento Técnico de
Medição de Petróleo e Gás Natural da ANP/INMETRO[7].
Inspeções realizadas pelo IPT em diversos sistemas de
medição de gás natural operados pela TRANSPETRO em
diversos estados do País, mostraram que, após a adequação
cuidadosa dos elementos primários às normas mais recentes,
a calibração dos secundários e a configuração correta dos
computadores de vazão, é possível a obtenção de incertezas
na medição de vazão da ordem de 1,2%, calculadas segundo
as diretrizes da ISO/TR 5168[8].
4.2 Medidor de vazão do tipo turbina
O medidor do tipo turbina foi desenvolvido para aplicações
militares durante a Segunda Guerra Mundial. Entretanto, foi
a necessidade da medição precisa de grandes vazões de
hidrocarbonetos líquidos, particularmente do óleo crú, que
acabou levando à construção e utilização de turbinas de
maiores dimensões, nos anos 50 e 60.
Eles continuam sendo hoje um dos medidores mais
confiáveis para a medição de óleos crús e gás natural, e
encontram aplicação na medição de vazão em plataformas
petrolíferas e em unidades de transferência de custódia e de
Sensor de medição fiscal[9].
temperatura

O princípio de operação de um medidor tipo turbina baseia-se

em um rotor multi-pás, montado sobre rolamentos livres, que
Retificador de escoamento Placa de orifício
Elemento é rotacionado pela energia cinética do fluido passante a uma
porta-placa
velocidade angular que é proporcional à velocidade axial
média do fluido.
Fig. 5. Componentes de um sistema de medição por placa de orifício.
Um medidor típico do tipo turbina para gás é mostrado na
Duas das principais desvantagens da placa de orifício são a Figura 6.
significativa perda de carga permanente que a placa impõe ao
escoamento e a faixa de operação relativamente pequena (3:1
ou 4:1), o que a torna indicada para instalações que operem
sob regimes com pequena variação na vazão e em linhas onde
a perda de carga permanente não é um fator crítico.
Algumas das principais vantagens da placa de orifício é que
ela não possui partes móveis expostas ao escoamento e não
requer uma calibração individual em laboratório, vez que o
coeficiente de descarga de uma placa de orifício pode ser
Fig. 6. Medidor tipo turbina para gás.
Características:
• Medidor tradicional e altamente confiável.
• Apresenta uma boa repetitividade.
• Permite medições com incerteza inferior a 1%.
• Ocasiona apenas pequena perda de carga ao escoamento.
• Faixa de operação usual de 10:1.
• Permite a troca de sensores sob escoamento.
Restrições:
• Seu custo ainda é relativamente elevado.
• Possui partes móveis.
• Exige manutenção e recalibração sistemática.
• Requer trechos retos a montante e a jusante.
• É recomendável o uso de condicionador de escoamento.
• Não aplicável a gases sujos com particulados em suspensão.
• Devido à inércia do rotor, não é indicado em aplicações
com variações súbitas na vazão.
• Overspeeding pode danificar os mancais e os rolamentos.
No Brasil, o medidor do tipo turbina é utilizado
principalmente pelas concessionárias de gás, encontrando
grande aplicação na medição do gás natural entregue por
essas empresas às indústrias, onde são utilizados nos
chamados CRM-Conjunto de Regulagem e Medição.
As turbinas utilizadas pela Petrobrás na medição de gás
natural em estações de transferência de custódia e em
citygates, vêm sendo gradativamente substituídas pela
tradicional placa de orifício.
4.3 Medidor de vazão ultra-sônico
O princípio de operação do medidor ultra-sônico se baseia
no fato de que um pulso ultra-sônico, atravessando um
escoamento de um fluido, viaja mais rapidamente na direção
do escoamento do que contra o mesmo. Assim, quanto
maior for a diferença entre os tempos de trânsito desses
pulsos ultra-sônicos, maior será a vazão de gás passante
através do medidor (Fig. 7).
Transdutores
ϕ V
D •
L/2 L/2
Fig. 7. Medidor ultra -sônico e seu funcionamento.
Na realidade, a tecnologia ultra-sônica só se viabilizou
tecnicamente para a medição de gás com o advento, na
década passada, dos processadores de computador de alta
velocidade. Isto tornou possível a detecção de diferenças de
tempo extremamente pequenas (da ordem de nanosegundos)
entre os tempos de trânsito dos pulsos em seu percurso a
favor e contra o escoamento.
As equações (1), (2) e (3) a seguir mostram de forma
simplificada como é determinada a velocidade média do
escoamento:
L
tm = (1)
c − v ⋅ cos ϕ
L
tj= (2)
c + v ⋅ cos ϕ
L  1 1 
V= − (3)
2 cosϕ  t j t m 
 
onde:
tm tempo de trânsito do pulso ultra-sônico para montante.
tj tempo de trânsito do pulso ultra-sônico para jusante.
L percurso do pulso ultra-sônico entre os transdutores.
c velocidade do som no meio.
ϕ ângulo do feixe ultra-sônico com o vetor velocidade.
v velocidade do escoamento em contato com o pulso
ultra-sônico.
Características:
• Não depende da energia cinética do escoamento.
• Não ocasiona perda de carga ao escoamento.
• Isento de partes móveis.
• Requer baixa manutenção.
• Permite uma ampla faixa de operação.
• Possibilidade de medição de escoamentos bidirecionais.
• Alta repetitividade e linearidade.
• Aplicável a gases sujos com particulados em suspensão.
• Aplicável a gases úmidos com gotículas em suspensão.
• Permite a troca de transdutores sob escoamento.
• Opera com temperaturas do gás na faixa de –30°C a 80°C.
• Funciona sob temperaturas ambiente entre –40°C a 60°C.
• Permite pressões na faixa de 1 a 690 barg.
Restrições:
• Seu custo ainda é relativamente elevado.
• teor de CO2 no gás deve ser inferior a 20%.
• Limitado a velocidades do gás até 30 m/s.
• nível de H2 S tolerado depende do transdutor.
• Requer trechos retos de no mí nimo 10D a montante.
• Requer trechos retos de no mínimo 5D a jusante.
• É recomendável o uso de condicionador de escoamento.
• Evitar válvulas reguladoras de pressão com queda >15 bar.
Recomendável calibrar o medidor com o gás de operação.
• Faltam instalações para calibração com gás natural no país.
• custo da calibração no exterior é elevado.
Sem dúvida, tecnicamente a tecnologia ultra-sônica é a que
mais se aproxima do medidor ideal para a indústria do gás
natural. Em diversos países, o medidor ultra-sônico já pode
ser encontrado em aplicações de medição fiscal e de
transferência de custódia [10].
No Brasil, embora a ANP aprove a utilização do medidor
ultra-sônico de múltiplos feixes para a medição de gás
natural, este medidor ainda não encontrou a devida aceitação
pelo mercado, estando limitado, no momento, essencialmente
a sistemas de medição de vazão operacional.
4.4 Medidores de gás do tipo deslocamento positivo
A descrição mais geral de um medidor do tipo deslocamento
positivo é a de um instrumento que mede a quantidade do
fluido escoando por meio da separação e contagem desse
escoamento em bits discretos.
Existem basicamente três tipos principais de medidores de
deslocamento positivo utilizados na medição de gases. Os
dois primeiros tipos, o de rotor semi-submerso e o
diafragma, são utilizados para a medição de baixas vazões
de gás e em condições próximas à ambiente. Medidores do
tipo rotor semi-submerso são normalmente utilizados como
medidores padrão de referência secundários em laboratórios
de medição de vazão. Por sua vez, os medidores do tipo
diafragma encontram mais aplicação na medição doméstica
e comercial de gás.
Os medidores rotativos, que se constituem no terceiro tipo
de medidor a ser descrito, são utilizados em aplicações sob
vazões e pressões mais elevadas do que aquelas cobertas
tanto pelos medidores do tipo rotor semi-submerso quanto
pelos diafragmas.
4.4.1 Medidores de gás do tipo rotor semi-submerso
Um medidor de gás do tipo rotor semi-submerso consiste de
um tambor disposto horizontalmente e subdividido em
compartimentos como mostrado na Figura 8.
MEDIDOR TIPO ROTOR SEMI-SUBMERSO
Fig. 8. Medidor tipo rotor semi-submerso.
O tambor é livre para rodar em torno de seu eixo, mantendo-
se semi-submerso em um banho selante de água ou óleo, até
um nível pouco acima do eixo de rotação. O gás a ser
medido entra pelo centro do tambor preenchendo os
compartimentos de medição que são mantidos selados pelo
líquido. De um lado do tambor, enquanto o compartimento é
preenchido, a sua porta de entrada é vedada com o líquido
selante. Nesse instante, a porta de entrada do próximo
compartimento é aberta e o tambor continua a rodar. No
outro lado do tambor, na medida em que o mesmo gira, o
líquido selante adentra o primeiro compartimento e o gás
contido no mesmo é expelido através da saída do medidor.
Assim, quando calibrado, uma revolução do tambor desloca
um volume conhecido de gás.
Uma das principais desvantagens deste tipo de medidor é
que, mesmo para a medição de vazões moderadas, é
necessária a utilização de medidores de dimensões
consideráveis. Por exemplo, para a medição de vazões
máximas da ordem de 9,5 x 10-3 m3 /s, deve ser utilizado um
medidor de 1,2m de comprimento por 1,05m de altura.
Normalmente, medidores deste tipo são utilizados na
medição de gases na faixa de vazões entre 2,5 x 10-6 m3 /s e 4
x 10-3 m3 /s. Tanto as temperaturas quanto as pressões do gás
medido são próximas à ambiente, sendo as perdas de carga
impostas pelo medidor usualmente inferiores a 2,5 kPa. Sob
condições controladas, é possível atingir incertezas de
medição da ordem de 0,25% da leitura e as faixas de
operação são tipicamente de 10:1.
4.4.2 Medidores de gás do tipo diafragma
O medidor do tipo diafragma encontra aplicação
principalmente na medição doméstica e comercial de gás.
ENTRADA SAÍDA
VÁLVULA
A câmara:
“A” está esvaziando
“B” está enchendo
“C” está vazia
“D” acabou de encher
CARCAÇA
Fig. 9. Medidor diafragma e seu funcionamento.
A Figura 9 ilustra um medidor de quatro estágios e o seu
ciclo de operação. O instrumento consiste de uma carcaça
contendo quatro câmaras, duas das quais, "B" e "C", são
envoltas por foles que se expandem e se contraem na medida
em que elas são, respectivamente, carregadas e descarregadas.
O escoamento para o interior e para fora das câmaras é
controlado por meio de válvulas deslizantes. O volume de
gás passante através do medidor é obtido através de um
dispositivo de transmissão que conecta os diafragmas a um
sistema mecânico de leitura cuja função é totalizar o número
de deslocamentos.
Desde que o medidor sofra manutenção e calibração regular
e cuidadosa, é possível a obtenção de incertezas de medição
da ordem de 1% no volume totalizado. Estes medidores
permitem medições em vazões que vão desde 5 x 10-4 a 10-1
m3 /s, sendo a sua faixa de operação normalmente de 20:1.
Os medidores do tipo diafragma são bastante populares uma
vez que medem diretamente o volume de gás e,
principalmente, podem ser fabricados a um custo
relativamente baixo.
4.4.3 Medidores rotativos de gás do tipo Roots
Um medidor de lóbulos rotativos, ou medidor do tipo Roots,
consiste de dois rotores em formato de "oito" montados
dentro de uma carcaça e que giram em sentidos opostos. Os
rotores são impelidos na direção mostrada pelo gás
escoando e de tal modo que a cada ciclo de rotação um
volume calibrado de gás é deslocado através do medidor. O
escoamento é totalizado por meio da soma do número de
ciclos do rotor (Fig. 10).
Os medidores do tipo Roots podem ser utilizados em
pressões de até 80 bar ou mais, e sob temperaturas de
operação de até 600 C.

Fig. 10. Medidor tipo Roots e seu funcionamento.
Relações de vazão de operação de até 25:1 podem ser
alcançadas nestes medidores, e as faixas de vazão de
operação vão de 2 x 10-3 a 2 m3 /s sob condições normais de
operação. Incertezas de medição no volume totalizado da
ordem de 0,5% podem ser obtidas para aplicações com
gases limpos.
Os medidores de deslocamento positivo são praticamente
imunes aos efeitos de configuração da tubulação de
montante, sendo que somente variações severas nos perfis
de velocidade de montante podem afetar significativamente
o desempenho do medidor.
Com relação às propriedades dos gases medidos, a densidade e
a viscosidade do fluido são os principais parâmetros que
influenciam o desempenho do medidor. Assim, diferentes gases
proporcionarão diferentes perdas de carga através de um
medidor operando a uma mesma vazão. Isto significa que as
taxas de vazamento de gás através das folgas do medidor
variam em função do tipo de gás medido. Este efeito é mais
pronunciado na faixa inferior de operação do medidor.
Um das principais desvantagens dos medidores do tipo
Roots é que eles normalmente introduzem pulsações
significativas no escoamento.
4.5 Medidor mássico tipo Coriolis para GNV
A maioria dos medidores industriais mede a velocidade do
fluido, sendo que a partir desta velocidade é que é inferida a
vazão volumétrica.
A vazão volumétrica dos fluidos compressíveis depende da
pressão, da temperatura e da compressibilidade do gás. Na
prática, o parâmetro mais interessante acaba sendo a vazão
mássica do produto que, esta sim, independe da pressão e da
temperatura do fluido no escoamento.
Tendo-se a vazão volumétrica e a densidade do fluido, é
possível se obter a sua vazão em massa. Até recentemente, a
medição direta e em linha da densidade era difícil e
complexa.
Na prática, ainda usualmente se mede a vazão volumétrica, a
pressão e a temperatura do processo, obtendo-se a partir
destes parâmetros e de um equacionamento a vazão mássica
do fluido.
Atualmente, já se encontram disponíveis comercialmente
instrumentos que medem diretamente a vazão em massa,
sendo o mais comum, o que utiliza o princípio de Coriolis.
A utilização do medidor do
tipo Coriolis na cadeia de
transmissão e distribuição
de gás natural no Brasil
tem se limitado até o
momento à medição nos
dispensers de GNV nos
postos de gás natural
veicular (Fig. 11).
Fig. 11. Medidor tipo Coriolis.
Embora potencialmente o medidor permita a obtenção de
incertezas de medição da ordem de 0,5% a 1,5%, este é um
ponto do sistema de distribuição de gás onde normalmente
ocorrem diferenças substanciais entre os volumes de gás
medidos pelos sistemas de medição por turbinas ou
deslocamento positivo das concessionárias de gás e os
mássicos dos proprietários de postos de GNV.
5. CONCLUSÃO
Como apresentado neste artigo, a medição de vazão de gás
natural é realizada em diferentes etapas do processo de
produção, transporte e distribuição deste insumo energético.
Em cada uma dessas etapas, a medição deve atender a
requisitos legais (normas e regulamentos), operacionais
(vazão, pressão e temperatura), metrológicos (incerteza)
específicos.
Com relação a isso, é importante ressaltar que a calibração
de um medidor de vazão é necessária, porém não suficiente.
É preciso que todos os componentes de um sistema de
medição sejam inspecionados. Isto significa, certificar ou
calibrar o elemento primário de medição, calibrar os
sensores e transmissores de parâmetros de processo como
pressão e temperatura, verificar a configuração dos
computadores de vazão e validar os seus algorítmos de
cálculo.
Atualmente, as companhias produtoras, transportadoras e
distribuidoras de gás desenvolvem um processo de
modernização e adequação dos sistemas de medição aos
regulamentos técnicos da ANP e às portarias do INMETRO,
que em sua essência visam atender aos preceitos básicos da
metrologia legal, que é o de assegurar os direitos das partes
envolvidas nas transações comerciais de gás natural.
Na realidade, a comunidade nacional da área metrológica de
vazão passa por um amplo processo de aprendizagem e de
valorização da metrologia devido à sua importância
econômica, política e estratégica. Nesse esforço estão
envolvidos os órgãos governamentais, a indústria do gás
natural, os fabricantes de medidores, as universidades e os
centros de pesquisa. A despeito das dificuldades, os
resultados obtidos têm sido bastante promissores e indicam
que, num futuro bastante próximo, o País estará praticando
medições de vazão de gás com confiabilidade e exatidão.
Já que muitos metrologistas dizem que a medição de vazão é
uma arte, necessitamos cada vez mais incentivar os talentos
nacionais para que contribuam para o desenvolvimento desta
importante área da metrologia.
REFERÊNCIAS
[1] VIM, Vocabulário Internacional de Termos
Fundamentais e Gerais de Metrologia, INMETRO, 1995.
[2] Site da Petrobrás (http://www2.petrobras.com.br).
[3] ABNT-NBR/ISO 5167-1 - Medição de vazão de fluidos
por meio de instrumentos de pressão – Parte 1: Placas de
orifício, bocais e tubos de Venturi instalados em seção
transversal circular de condutos forçados
[4] ISO 5167 Measurement of fluid flow by means of
pressure differential devices inserted in circular cross-
section conduits running full, Part 1-General principles
and requirements, 2nd Edition, 2003; Part 2–Orifice
plates, 1st Edition, 2003.
[5] API/MPMS, Chapter 14 - Natural gas fluids measurement,
Section 3 - Concentric square-edged orifice meters, Part 1-
General equations and uncertainty guidelines, 3rd Edition,
Sep. 1990; Part 2-Specification and installation
requirements, 3rd Edition, Feb. 1991 and 4th Edition, Apr.
2000; Part 3-Natural gas applications, 3rd Ed., Aug. 1992;
Part 4-Background, development, implementation,
procedures and subroutine documentation, 3rd Ed., Nov.
1992.
[6] AGA Report #3 Orifice metering of natural gas and
other related hydrocarbon fluids.
[7] Regulamento Técnico de Medição de Petróleo e Gás
Natural, Portaria Conjunta N° 1 ANP/INMETRO, de 19
de junho de 2000.
[8] ISO/TR 5168 Measurement of fluid flow–Evaluation of
uncertainties.
[9] AGA Report #7 Measurement of gas by turbine meters.
[10] AGA Report #9 Measurement of gas by multipath
ultrasonic meter.
___________________________________________________________________________
Autores :
Kazuto Kawakita, Giovanni do Espírito Santo, Rubens Silva Telles
IPT-Instituto de Pesquisas Tecnológicas
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