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PORQUE É DOMINGO, UM ESCRITOR ANGOLANO

GABRIELA ANTUNES
Conhecer as palavras dos mais velhos

... Virei o cubo e vi o Sol. Sol GRANDE, bonito, amigo quente. Que eu conhecia tão bem
por o ver todos os dias. Que eu conhecia tão bem porque era ele que aquecia o meu
corpo, quando me estirava preguiçosa na areia dura, grossa e meiga da praia... Que eu
conhecia tão bem. Mas afinal, eu não sabia que o Sol já tinha vivido com a terra na
mesma casa. É verdade: há muitos, muitos anos, tantos que ninguém mais se lembra, o
Sol e a Terra viviam juntos na mesma casa. Casa que era uma nuvem de gases. Devia
ser bem lindo uma casa-nuvem-gás...

Assim começa o conto “O Cubo Amarelo”, escrito, em 1991 por GABRIELA ANTUNES.
Maria GABRIELA Cardoso da Silva ANTUNES, nascida no Huambo, a 8 de Julho de 1937,
faleceu em Lisboa, por doença, a 3 de Abril de 2004, um dia depois do Dia
Internacional da Literatura Infantil.
Fez o curso superior de Filologia Germânica, na Faculdade de Letras de Lisboa, em
Dezembro de 1961, ano da grande efervescência nacionalista.
Integrou o grupo da Casa dos Estudantes do Império.
A nível profissional, começou a trabalhar na Escola Comercial e Industrial Sarmento
Rodrigues, no Huambo, leccionando a disciplina de Inglês, foi directora da Escola
Vicente Ferreira/ 1º de Maio, também no Huambo, onde leccionou português e Inglês.
Em 1964, em Luanda, exerceu actividades docentes no Instituto Comercial de Luanda e
no Colégio Vasco da Gama como docente de Inglês e Alemão.
Em Luanda, fez a pós graduação (1973/74) em pedagogia e didáctica da língua Inglesa.
De professora a pioneira da literatura para crianças

Graças aos seus dotes intelectuais, em 7 de Março de 1983, foi nomeada Directora da
Biblioteca Nacional de Angola coordenando, simultaneamente o curso médio de
jornalismo no Instituto Karl-Marx-Makarenko, cargo que acumulou com a docência da
cadeira de “Arte e Literatura Angolana” e Português.
Gabriela Antunes foi ainda docente universitária do Instituto Superior Privado de
Angola (ISPRA), assessora do Ministério da Educação e Cultura e desempenhou, de
Novembro de 2001 a Novembro de 2003, na direcção da União dos Escritores
Angolanos, para a qual fora admitida como membro em 1984, a função de Secretária
das Relações Exteriores. Falava sete línguas diferentes, tendo feito traduções
simultâneas em conferências internacionais e de brochuras diversas.

E fez-se a escritora

Após a Independência de Angola, dedicou-se à literatura para crianças “porque – dizia


- não havia nenhum livro para elas que lhes falasse das suas coisas, das suas terras,
belezas e gentes”, recreando para isso, não poucas vezes, contos da tradição oral
angolana por considerar que era uma necessidade da jovem nação conhecer as
palavras dos mais velhos que faziam das fábulas, dos provérbios, dos contos, uma
forma de transmitir conceitos, regras e ensinamentos há muito calados pelas
autoridades coloniais.
Gabriela Antunes trabalhou com uma equipe de outros escritores, todos vocacionados
para a literatura infanto-juvenil, ligados ao então Instituto Nacional do Livro e do
Disco, (INALD), ao lado de Dario de Melo, Cremilda da Lima, Maria Eugénia Neto,
Octaviano Correia, Rosalina Pombal e colaborando no 1.º de Dezembro, suplemento
infantil do Jornal de Angola. Foi uma das organizadoras e mentoras dos primeiros
Jardins do Livro Infantil em Luanda, que tiveram lugar no antigo Parque Heróis de
Chaves, realizados pela então equipa do INALD.
A obra de Gabriela Antunes primou sempre por se basear no que ela dizia dever, ter de
ser a literatura para os mais novos: “qualquer tema pode ser dado a uma criança:
homens e bichos falando em conjunto, flores que dançam e se comportam como
crianças, viagens fantásticas, sonhos e o mar, a lua, a vida, a morte, o nosso mundo, o
mundo dos outros... tudo pode ser dito, contado a uma criança, até a guerra, desde
que escrito numa linguagem simples, ilustrada e bem adaptada à idade da criança que
lê e à sua realidade. O desenvolvimento do tema deve ter em conta a faixa etária e os
conhecimentos do pequeno leitor, se quisermos que ele sinta prazer com o que lê (ou
lhe contam) e possa interessar-se pelo livro".
Participou em vários seminários e encontros de Literatura para crianças na Europa,
América Latina e África.
Foi coordenadora nacional da UNESCO e do Fundo Bibliográfico de Língua Portuguesa
em Angola.
Em 1999 recebeu o prémio Fundação Casa da Cultura de Língua Portuguesa, da
Universidade do Porto, entregue por Jorge Sampaio, Presidente da República
Portuguesa, na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e em Fevereiro de
2000, em reconhecimento pela sua obra literária, foi homenageada pelo Instituto
Camões, na Embaixada de Portugal em Angola.
São de sua autoria as seguintes obras, todas de cariz infanto-juvenil, para além de
diversos contos publicados nos jornais de Angola.
- A Águia, a Rola, as Galinhas e os 50 Lweis (1982)
- Luhuna, o Menino que Não Conhecia Flor-viva (1983)
- Kibala, o Rei Leão (1983)
- A Abelha e o Pássaro (1982)
- O Castigo do Dragão Glutão (1983)
- O Jardim do Kim - incluído na colectânea “Lutchila e Outras estórias” (1985)
- O João e o Cão (1988)
- Estórias Velhas Roupa Nova (1988)
- Crónicas Apressadas I, (colecção de textos lidos na Rádio LAC - Luanda Antena
Comercial, em 1999)

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Em «Kibala, o rei leão», Gabriela Antunes escreve sobre a importância do poder da união. Das maldades de Kibala, o rei da
floresta, surge a força de um povo que se une pela mudança. Este conto é uma reflexão sobre o trabalho comunitário, uma
crítica ao sentimento de vingança, e um apelo à necessidade de fazer o bem, mesmo a quem nos faz mal. (Ilustrações de
Mário Jorge).
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Anos 50 - na escadaria do Liceu Diogo Cão – Lubango
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Dragão( Capa e ilustrações de Henrique Arede)

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