LIMA, Nathália Matos Lima. O Direito, O Poder e a Violência: Observações Sobre
Meios e Fins segundo Benjamin e Luhmann
O texto nos apresenta considerações expostas pelos pensamentos jurídicos de Walter
Benjamin e Niklas Luhmann, analisando a concepção de Direito como meio ou fim e como estão relacionadas as categorias de “poder” e “violência” ao Direito. O Direito, para a filosofia moderna, passou a representar o ápice da civilização, uma representação da racionalidade, a solução para a saída definitiva dos tempos míticos (ou mitológicos) que antes aprisionavam a humanidade. Walter Benjamin, leva-nos a questionar essa verdade filosófica. E nos traz uma ambiguidade com a palavra Gewalt, que tanto pode ser traduzida por poder, autoridade, como também força, violência, coerção. Trata-se aí de conceber o poder como algo que se constitui e se mantém pela violência e, inseparavelmente, a violência como poder que se estabelece e reproduz com base em si mesmo; nesse sentido, podemos falar em um poder-violência. Em relação a concepção de Luhmann, a comunicação seria o elemento constitutivo do Direito, o qual é visto como sistema autorreferente e autopoético, capaz de promover sua diferenciação em relação ao ambiente, ou seja, sua distinção quanto ao seu entorno. Sob o pensamento de Luhmann, o Direito seria um sistema que tem como base a generalização de expectativas congruentes e que se utiliza da autorreferência para se reformular e de uma abertura cognitiva sobre o ambiente para evoluir/adequar-se estruturalmente por intermédio de um processo de autopoiese, logo sobre esta perspectiva o Direito opera como um fim em si mesmo, sistematicamente utilizando-se da comunicação e, vinculado a esta, do poder para desenvolver a estabilização das complexidades. Benjamin parte dessa ambiguidade para pensar as relações do poder-violência com o Estado e o Direito, entendendo que este último não exclui o poder-violência, mas, antes, como forma jurídica do Estado (portanto, do poder), mantém com ele uma relação cíclica, própria ao mito e ao destino, relação essa na qual o poder-violência institui e sustenta o Direito. O Direito é fundado pelo poder-violência e se mantém através dele, ou seja, a violência e o poder estão tanto na origem como na manutenção do Direito. Luhmann, a definição de poder parte da generalizada seletividade proporcionada pela comunicação, de forma que a ausência desta seletividade caracteriza a violência. Do ponto de vista estruturante do Direito, a violência, para Luhmann, assume um papel secundário, presente sobretudo na sanção ou mesmo na ameaça a imposição desta, apesar de constituir uma situação limite a ser evitada, cuja legitimidade assenta na própria comunicação desenvolvida pelo sistema jurídico É dessa relação do Direito com o poder-violência que nosso trabalho parte. Nas pegadas de Benjamin, temos como proposta discutir a relação do poder-violência com o Direito e, como sua antítese, com a Justiça, já que tanto o poder como a violência constituem partes fundamentais das relações jurídicas do mundo capitalista. No Direito, essas relações de ordens jurídicas são de meios e fins – o que para Benjamin constitui um específico problema ético a ser pensado –, em que a violência é considerada meio para fins justos (que, portanto, a legitimam, tal como ocorre para o Direito Natural) ou meio legítimo, historicamente já legitimado, que tornam justos seus fins, tal como o propugna o Direito Positivo. Conforme Benjamin, as relações da ordem jurídica são de meios e fins: meios legítimos de um lado e fins justos de outro. Aparentemente, essa seria uma contradição, mas que o autor afirma ser, na realidade, apenas uma contradição aparente. Contudo, sua preocupação é com a Justiça na esfera dos meios, é pensar uma distinção dos próprios meios em relação ao uso do poder-violência. Para Benjamin, é a pergunta pelo meio que deve ser a preocupação ética, a pergunta pela Justiça dos meios, sem tomar como central os fins a que tais meios servem. Essa posição benjaminiana se explica pela sua busca de crítica do Direito, crítica que teoricamente precisa se distinguir das teorias do Direito Natural e do Direito Positivo, os quais legitimam o poder-violência como meio, seja porque tal meio se legitima tendo em vista os fins justos (Direito Natural); ou porque se constituem historicamente legítimos (Direito Positivo). Trata-se, então, de pensar criticamente o Direito fazendo a crítica dos meios: o poder e a violência. Para tal, é preciso num primeiro momento concluir a crítica das teorias modernas do Direito, que os justificam. Por conseguinte, a divergência teórica demonstrada pelo posicionamento de ambos os teóricos demonstra a possibilidade do trato do Direito tanto como meios e fins, mas também ressalta a afirmação da presença do poder e da violência em sua estruturação e operacionalização frente a realidade fática.