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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Graduação em Ciências Sociais

Beatriz da Costa Silva

POLÍTICA I

“Noção de Poder”: Giovanni Sartori, Max Weber, Hannah Arendt e Norberto Bobbio.

O que é poder? A noção de poder vem a muito sendo pautada e discutida por cientistas sociais
em suas diversas formas. Desde Aristóteles em que a ideia de política começava a existir ou
com Maquiavel, o pai das ciências políticas, a noção do que é político, envolve poder. E o que
envolve poder, por via de regra envolve coação e/ou violência física. Pode-se começar essa
análise partindo do pressuposto de que o poder não é um fim e está ligado à política e a todos
os fenômenos associados à essa ciência. Por isso faz se necessário compreender certos conceitos
antes de, de fato, falar-se de poder.

Toda ciência parte de classificações e todos os conceitos são diacrônicos. No livro “A Política”
de 1981, Giovanni Sartori desenvolve o que é política através da história não linear da mesma,
mostrando como as ideais de política e seus conceitos se desenvolveram até a forma atual. A
política de Aristóteles, no pensamento grego, estava muito ligada ao espaço da pólis, sem
separação entre social e político em sua estrutura organizacional horizontal. Já em Roma, há
uma juridicização, a ideia de pólis é trocada por civitas e o homem passa a viver de forma
negativa. Na Idade Média o mundo político é teologizado. Com Maquiavel ocorre a autonomia
da política, que, baseada em uma ética própria e na verticalidade, funda a política como uma
ciência específica. A partir disso diversos pensadores como Hobbes e Locke desenvolvem
novas teorias relacionadas a cientificidade da política. Isso, até o tempo de Sartori, que defende
que a política vem sofrendo uma crise identitária por ser um conceito muito amplo atualmente.
Se tudo é política, então o que de fato é política?

Nesse contexto de generalidade da política, Max Weber no seu livro “Ciência e Política: duas
vocações”, de 1919, traz um novo conceito de política e junto a ele, o de Estado e poder. Weber
(1919) a define da seguinte forma: “"Política", portanto, significaria para nós aspiração à
participação no poder ou a exercer influência sobre a distribuição do poder, seja entre Estados,
seja no interior de um Estado, entre os diversos grupos humanos que o Estado abarca.” Surge
então a primeira noção de poder interligada ao Estado. E é abordando o Estado que se chega à
noção de violência, pois Weber o define como sendo a “relação de dominação do homem sobre
o homem, fundada no instrumento da violência legitima” ou de estado contemporâneo como
“comunidade humana que dentro dos limites de determinado território reivindica o monopólio
do uso legitimo da violência física”. Com tais conceituações é possível perceber a política como
sendo o agrupamento político “Estado”, em que o meio do Estado que o define é a coação física,
tendo a violência como instrumento específico (mas não único), sendo através da
monopolização, a única fonte do direito a violência, que se baseia na dominação e obediência.
A dominação está ligada a autoridade e a autoridade é fundada na obediência. A obediência
normalmente é motivada por medo ou esperança, divina ou terrena, de punição ou recompensa.
E só existe poder quando há obediência. O poder independe da aceitação, mas a dominação é a
aceitação do poder.

Partindo disso, Weber discute então as formas de dominação política baseadas na legitimidade.
Elas são três: o poder tradicional, o carisma e a legalidade. A forma tradicionalista, do poder
tradicional que é o “eterno ontem”, tem a ver com os costumes, a validez imemorial e o hábito.
Baseada na obediência à pessoa e não ao cargo, remete a ideia de “santidade das ordens”. A
forma carismática, do carisma, é uma escolha por fé, devoção e confiança, tendo como destaque
o heroísmo. Ela não conhece regras por ser revolucionária e tem-se como exemplo o homem
político por vocação. Por fim, a forma legalista, da legalidade, é burocrática, baseada na lei, na
crença na validez de um estatuto legal, que gera então um servidor do estado. Ordens
impessoais, especialização profissional e concurso no lugar de nepotismo, são algumas das
bases dessa forma de dominação legítima. Weber discute então política, Estado, poder,
violência, dominação e desenvolve o conceito de Estado Moderno: “é um agrupamento de
dominação que apresenta caráter institucional que procurou (com êxito) monopolizar, nos
limites de um território, a violência física legítima como instrumento de domínio e que, tendo
esse objetivo, reuniu nas mãos dos dirigentes os meios materiais de gestão” Weber (1919). Se
para Weber política é o agrupamento Estado, Estado é um agrupamento de dominação,
dominação é aceitação do poder e tem violência física legitima como instrumento, poder e
violência andam juntos. Poder, segundo Weber diz respeito ao potencial de imposição de
vontades, mesmo resistido, pois, como dito, independe da aceitação e em caso de aceitação gera
o domínio que usa a força como instrumento.

Diante disso, Hannah Arendt vem em seu livro “Sobre a violência”, de 1969, discutir tais noções
de violência e poder, em um contexto de consenso de que a violência é a forma mais manifesta
de poder, contrariando essa percepção. Arendt discorda da ideia de que violência e poder sejam
sinônimos, os meios pelos quais os homens governam e que tem a mesma função, trazendo
então uma visão paralela. Na verdade, para ela, eles são opostos. Airendt ainda considera
importante diferenciar alguns conceitos que se conversam, mas se confundem como sendo a
mesma coisa, quando não são. A violência é um instrumento, mas a essência é o poder e o poder
está ligado ao conjunto de pessoas de apoio. A principal diferenciação de poder e violência vem
então de que a violência é um instrumento e o poder está ligado a números, ao apoio popular.
Não pode existir um quando se há outro, por isso a violência é vista como o último recurso para
um governo em desintegração, ou seja, quando há perda de poder, estando ligado então a
impotência. Nesse mesmo sentido, a violência pode destruir o poder, mas é absolutamente
incapaz de criá-lo. É acrescentado que a força extrema do poder é todos contra um enquanto a
força extrema da violência é um contra todos. Arendt debate que as questões da política são
resumidas a “domínio” e nisso todas as palavras adquirem um mesmo “significado”, de modo
que é importante ver suas diferenças. Por isso, traz outros conceitos como de vigor, força,
autoridade, obediência civil, revolução. Segundo ela, quando o governo perde o poder e recorre
a violência, vem o terror (não é só contra os inimigos, mas amigos também) e a tirania é a forma
de governo mais violenta e menos poderosa. A filósofa aborda ainda que todos os governos
assentam se na opinião e através disso pode-se discutir a teoria das formas de governo de
Norberto Bobbio.

Em seu livro “A teoria das formas de governo” de 1985, Norberto Bobbio baseia-se em duas
questões básicas: quem governa e como se governa. A história das tipologias das formas de
governo tem início na discussão referida por Heródoto, que aborda as três formas de governo
"clássicas" através da defesa de Otanes, Megabises e Dario para cada uma delas. Elas são: o
governo de muitos, de poucos e de um só, ou seja, "democracia", "aristocracia" e "monarquia".
De forma sucinta, quando quem governa é “um” e o como se governa é “bom”, é monarquia e
“mal” é tirania. Seguindo essa linha, quando poucos governam bem é aristocracia e mal é
oligarquia. Por fim, quando muitos governam bem é democracia e mal é oclocracia. Para
Bobbio a melhor forma de governo é a monarquia, pois em um governo do melhor dos homens
há mais chances de manter objetivos políticos a salvo dos adversários. Isso, pois na aristocracia
(oligarquia) é fácil surgir a discórdia dos bons e na democracia (oclocracia), o acordo entre os
maus. Segundo ele, na busca por poder, sempre haverá corrupção. Mesmo no governo
monárquico que exigiria “o melhor”, o melhor dos homens também pode ser corrompido, se
tornado um tirano (o governo referido por Arendt como mais violento e menos poderoso).
Contudo, o que efetivamente é poder segundo Bobbio?
Em a “Teoria Geral da Política”, de 1999, Norberto Bobbio aborda então política e poder, como
conceitos ligados, apresentando algumas tipologias importantes. Poder para ele é um meio para
se obter vantagens ou efeitos desejados. O poder está ligado ao domínio sobre o homem e a
natureza, mas o poder político é o domínio apenas sobre outros homens, em que o domínio é
um meio, não um fim. Mas o poder político é apenas uma das formas de poder. Segundo a
tradição clássica há o poder paterno, fundado na natureza, como na relação de dever do filho ao
pai, em que o fim é o interesse do objeto; o poder despótico, fundado no castigo, como na forma
de um senhor punindo um escravo, em que o fim é o interesse do sujeito; e o poder civil, fundado
no consenso, como na relação governantes e governados, tal como seria na democracia, em que
o fim é o interesse do objeto e do sujeito (contudo a ideia de consenso na democracia poder ser
discutida, pois por vezes é fictícia ou não justificada por não possuir bases sólidas). Tais formas
de poder correspondem às três expressões clássicas do fundamento da obrigação: ex natura, ex
delicio, ex contractu. Para Bobbio, existem três formas de poder, classificados de acordo com
elementos específicos: o poder econômico, em que a necessidade induz o comportamento
(como na relação subordinado-chefe), o poder ideológico, que tem influência nas ideias dos que
“sabem mais” (baseado na autoridade) e o poder político, que se constitui na posse dos
instrumentos com que se exerce força física. Para ele o poder político vai ser sempre o mais
forte pelo uso da força, todos estão subordinados a ele por seu fator coativo. Suas características
são em decorrência da monopolização da força pela exclusividade, universalidade e
inclusividade e por poder recorrer à extrema ratio. Ou seja, poder nem sempre envolve
violência, mas o poder político que envolve a relação de dominação do homem sobre o homem
leva novamente a essa relação.

Giovanni Sartori, Max Weber, Hannah Arendt e Norberto Bobbio através de seus trabalhos
expressam algumas concepções importantes para a ciência política, trazendo classificações,
diferenciações e consensos. Respondem à pergunta ou contribuem na resposta do que é poder,
de uma forma diferente, mas que dialogam em sua maioria. A noção de poder é desenvolvida
através da noção de política. O poder em sua essência pode ser visto como algo que se tem e/ou
se busca para se ter influência sobre o outro e/ou sobre o cenário. Mas o exercício do poder se
ramifica em diversos tipos, meios e modos de ser empregado, motivações, resultados, objetivos,
fins. Mas que demandam sempre uma relação de mando e obediência.

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