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Aula 6. O Lugar Da Terapia Analítico-Comportamental No Cenário Internacional
Aula 6. O Lugar Da Terapia Analítico-Comportamental No Cenário Internacional
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ISSN 2177-3548
[1] Paradigma – Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento e Universidade de São Paulo| Título abreviado: Terapia analítico-comportamental no cenário
internacional | Endereço para correspondência: Rua Cardoso de Almeida, 977 - Apto 151 CEP: 05013-001. São Paulo - SP | Email: janleonardi@gmail.com |
DOI: 10.18761/pac.2015.027
Resumo: Ao longo do século XX, o termo terapia comportamental foi utilizado para se re-
ferir a diferentes modalidades de prática clínica, sem que houvesse, muitas vezes, qualquer
afinidade filosófica, conceitual ou metodológica entre elas. Com o intuito de distinguir a
prática psicoterápica exercida por analistas do comportamento dessa eclética terapia com-
portamental, o termo análise do comportamento clínica (clinical behavior analysis, no original)
foi criado, mas diferentes modelos surgiram dentro desse movimento, tais como psicoterapia
analítica funcional, terapia de aceitação e compromisso, terapia de ativação comportamental,
terapia comportamental dialética, entre outros. Paralelamente, no Brasil, o termo terapia
analítico-comportamental foi cunhado no início do século XXI para uniformizar o nome da
prática clínica fundamentada na filosofia do behaviorismo radical e na ciência da análise do
comportamento que vinha sendo praticada nesse país desde o início da década de 1970. Essa
grande diversidade de nomes, modelos e práticas de terapia comportamental somente pode
ser compreendida com algum conhecimento das origens e momentos de transformação da
terapia comportamental. Em vista disso, o presente artigo tem por objetivo apresentar, de
modo introdutório e didático, a história das terapias comportamentais e analisar de que modo
a terapia analítico-comportamental se insere nesse cenário.
Palavras-chave: análise do comportamento clínica; terapia analítico-comportamental; te-
rapia comportamental; história
Desde que Lindsley, Skinner e Solomon (1953) uti- nharia em física e química, a tese defendida pelos
lizaram a expressão terapia comportamental pela pioneiros da terapia comportamental era a de que
primeira vez, uma miríade de práticas foram agru- qualquer intervenção deveria partir do entendi-
padas sob esse rótulo sem que houvesse, muitas mento científico dos processos comportamentais
vezes, qualquer afinidade filosófica, conceitual oubásicos, o que representou uma forte oposição à
metodológica entre elas (Kazdin, 1978; Nolasco, psicologia clínica vigente na época (O’Donohue,
2002; O’Donohue, 1998). 1998).
É possível encontrar na literatura, tanto nacio- No início do século XX, os fisiólogos russos
nal quanto internacional, nomes como modifica- Vladimir Bechterev e Ivan Pavlov investigaram ex-
ção do comportamento, análise do comportamento perimentalmente o processo de condicionamento
aplicada, terapia cognitivo-comportamental, tera- respondente em cães, e corroboraram a proposição
pia comportamental-cognitiva, psicoterapia analí- que Ivan Sechenov havia feito no século anterior de
tica funcional, terapia de aceitação e compromisso,que o conceito de reflexo e os métodos da fisiologia
terapia de ativação comportamental, terapia com- conferiam objetividade para o estudo da psicolo-
portamental dialética, entre outros (cf. Barcellos &
gia, outrora marcado pelo subjetivismo do método
Haydu, 1995; Nolasco, 2002; Pérez-Álvarez, 2006, introspectivo. Nessa época, portanto, todo e qual-
2012). Além disso, o último quarto do século XX quer comportamento – voluntário ou involuntário,
testemunhou a criação e o desenvolvimento de uma inato ou aprendido, humano ou não – era explicado
prática clínica exclusivamente brasileira, chamada pelo conceito de reflexo. As primeiras tentativas de
(atualmente) de terapia analítico-comportamental transposição do conhecimento acerca dos reflexos
(TAC) (Zamignani, Silva Neto & Meyer, 2008). condicionados para a análise de fenômenos clínicos
Essa grande diversidade de nomes, modelos e apareceram rapidamente (Kazdin, 1978).
práticas de terapia comportamental costuma gerar Em 1920, em um experimento que ficou co-
confusão quanto à identidade da prática clínica nhecido na história da psicologia como “o caso do
dos analistas do comportamento (se é que exis- Pequeno Albert”, Watson e Rayner demonstraram
te uma) e somente pode ser compreendida com como a reação de medo a determinado estímulo
algum conhecimento das origens e momentos de pode ser construída por meio de condicionamento
transformação da história da terapia comporta- respondente. Albert, um bebê de 11 meses de vida,
mental, isto é, a partir do passado do qual essa foi exposto inicialmente a uma série de animais e
multiplicidade é fruto. Em vista disso, o presente objetos (coelho, rato branco, cachorro, macaco, al-
artigo tem por objetivo apresentar, de modo intro- godão, folhas de jornal em chamas, casaco de pele,
dutório e didático, a história das terapias compor-entre outros), não demonstrando qualquer reação
tamentais, explicitando o modo pelo qual a TAC de medo frente a esses itens. Posteriormente, o rato
se insere nesse cenário. branco foi colocado próximo a Albert e, toda vez
que ele tentava tocá-lo, um som alto e estridente era
produzido, ocasionando uma forte resposta de so-
Uma Breve História das Terapias bressalto e choro. No total, sete pareamentos entre
Comportamentais esses estímulos (rato branco e som) foram realiza-
dos ao longo de aproximadamente duas semanas.
A criação do modelo comportamental de inter- Após um intervalo de cinco dias, Albert foi nova-
venção clínica seguiu a mesma estratégia que ha- mente exposto ao rato banco, agora sem a apre-
via se mostrado bem-sucedida em outras ciências: sentação do ruído, e sua reação foi chorar, cobrir
extrapolar princípios validados empiricamente os olhos para não ver o animal e engatinhar para
na pesquisa básica para a resolução de problemas longe, comprovando o condicionamento de medo.
aplicados. Assim, da mesma forma que a medicina Duas semanas depois, Albert foi exposto a estímu-
se baseava em fisiologia e microbiologia e a enge-
los com propriedades físicas em comum com o rato introduzidas por Wolpe (1954, 1958) na África do
branco (e.g., coelho, casaco de pele), o que demons- Sul e por Eysenck (1960, 1964) na Inglaterra.
trou generalização de sua reação emocional1. Entre as décadas de 1930 e 1950, período em
Poucos anos depois, Jones (1924a, 1924b), alu- que procedimentos terapêuticos baseados no para-
na de Watson à época, investigou o efeito isolado e digma respondente estavam sendo desenvolvidos
combinado de sete procedimentos na diminuição e utilizados, Skinner (e.g., 1938/1991) dedicava-se
da resposta de medo de crianças, a saber: (1) desu- ao estudo do comportamento operante. Após rea-
so (não exposição ao estímulo temido por semanas lizar diversos experimentos com ratos e pombos,
ou meses); (2) apelo verbal (relato de histórias pra- Skinner descobriu processos comportamentais bá-
zerosas envolvendo o estímulo temido); (3) adapta- sicos, como reforçamento, discriminação, etc.
ção negativa (apresentação repetida ao estímulo te- Nas décadas seguintes, o estudo do condicio-
mido); (4) repressão (ridicularização do medo); (5) namento operante com animais de laboratório foi
distração (exposição ao estímulo temido enquanto estendido de forma direta e sistemática para o com-
se envolve em outras atividades); (6) condiciona- portamento humano. Nesse momento, os pesqui-
mento direto (pareamento entre o estímulo temido sadores tinham como único objetivo avaliar se os
e um estímulo prazeroso); (7) imitação social (ex- processos básicos descobertos na pesquisa animal
posição ao estímulo temido em parceria com uma serviriam também para explicar e alterar o com-
criança que não tem medo daquele estímulo). Entre portamento humano e, por conseguinte, tinham
eles, apenas o condicionamento direto e a imita- a caixa de Skinner como protótipo de observação,
ção social foram eficazes, que tinham em comum mensuração e intervenção. Sendo assim, a maior
a exposição gradual ao estímulo temido de acordo parte das primeiras investigações com seres hu-
com o nível de tolerância apresentado pela criança. manos examinava a frequência de respostas de
Os estudos de Jones foram o ponto de partida para pressão à barra (Kazdin, 1978). Por exemplo, em
o desenvolvimento da técnica de dessensibilização 1953, Lindsley iniciou uma série de pesquisas so-
sistemática, o que lhe conferiu o título de “mãe da bre condicionamento operante tendo como partici-
terapia comportamental” (Rutherford, 2010). pantes indivíduos “normais” e pacientes psicóticos
Os estudos de Watson, Rayner e Jones citados residentes em um hospital psiquiátrico. Seguindo
acima incentivaram a extensão dos princípios de a mesma lógica da pesquisa animal, a instalação,
condicionamento descobertos em laboratório para manutenção e extinção de respostas de empurrar
explicar e modificar o comportamento humano um êmbolo foram estudadas utilizando cigarros,
(Kazdin, 1978). Ao longo da primeira metade do doces ou dinheiro como estímulos reforçadores
século XX, tratamentos fundamentados no para- e luzes coloridas como estímulos discriminativos
digma respondente foram elaborados para alcoolis- (e.g., Lindsley, 1956; Lindsley, Skinner & Solomon,
mo (Voegtlin, 1940), enurese (Mowrer & Mowrer, 1953; Skinner, Solomon & Lindsley, 1954).
1938), paralisia histérica (Sears & Cohen, 1933), Ao longo das décadas de 1950 e 1960, diver-
dependência de morfina (Rubenstein, 1931), entre sas universidades e hospitais psiquiátricos torna-
outros. Posteriormente, a aplicação do conhecimen- ram-se centros de pesquisa do condicionamento
to sobre condicionamento respondente culminou operante, tais como Metropolitan State Hospital,
no desenvolvimento das técnicas de exposição e de Harvard University, University of Washington,
dessensibilização para o tratamento de ansiedade, Indiana University School of Medicine, entre ou-
tros. Distribuídos nessas instituições, pesquisado-
1 Embora seja considerada a primeira demonstração experi- res como Azrin, Baer, Bijou, Ferster, Goldiamond,
mental de como o medo pode ser aprendido por meio de con- Lindsley, Lovaas, Staats e Skinner investigaram o
dicionamento respondente, a pesquisa de Watson e Rayner efeito de diferentes condições de controle antece-
(1920) apresenta diversos problemas metodológicos relativos dente e consequente sobre diversas respostas ope-
aos procedimentos utilizados, testes de generalização, impre-
cisões na coleta de dados, etc., envolvendo, inclusive, rela-
rantes em crianças e adultos com e sem psicopa-
ções operantes (para uma análise detalhada, ver Bisaccioni & tologias, comprovando que a explicação, previsão
Carvalho Neto, 2010). e controle do comportamento dos seres humanos
eram muito similares aos observados em ratos e ser observado e medido em suas propriedades; (3)
pombos. Esse foi o ponto de partida para o desen- analítica: deve-se identificar as relações de depen-
volvimento de procedimentos de modificação de dência entre as respostas do indivíduo, os contextos
comportamentos com relevância clínica, conforme em que ocorrem (eventos antecedentes) e seus efei-
explica Kazdin (1978): tos no mundo (eventos consequentes), isto é, deve-
-se identificar as variáveis que controlam determi-
Embora esses relatos iniciais fossem principal- nado responder; (4) tecnológica: a aplicação deve
mente de valor demonstrativo, as aplicações ser operacionalizada, implementada e descrita de
posteriores tornaram-se explicitamente tera- forma clara e detalhada, permitindo que qualquer
pêuticas. No fim da década de 1950 e começo da pesquisador da área consiga replicá-la; (5) conceitu-
década de 1960, tentativas preliminares foram al: o procedimento de coleta e análise de dados de-
feitas para aplicar técnicas de condicionamento vem estar embasados nos pressupostos filosóficos
operante para produzir mudanças de compor- do behaviorismo radical e nos princípios teóricos
tamento em populações clínicas. Em meados e metodológicos da análise do comportamento; (6)
da década de 1960, diversas aplicações foram eficaz: a aplicação deve alterar o comportamento
descritas e, à medida que proliferaram, essas para melhor, sendo que são os participantes da in-
extensões do condicionamento operante e da tervenção e os membros da sociedade que avaliam
análise experimental do comportamento foram a mudança, e não o pesquisador; (7) generalizável:
reconhecidos formalmente como uma nova a mudança comportamental deve persistir ao lon-
área de pesquisa: a Análise do Comportamento go do tempo e em diversos ambientes, além de se
Aplicada. (p. 233-234) estender para outras respostas da mesma classe (a
generalização não deve ser meramente esperada,
A expressão análise do comportamento aplicada mas sim planejada).
(do inglês, applied behavior analysis) é empregada Um exemplo de pesquisa aplicada, ilustrativo
para referir dois campos distintos de atuação do do lugar intermediário que ela ocupa entre a pes-
analista do comportamento: (1) a pesquisa aplica- quisa básica e a intervenção, é o estudo de Ayllon,
da, que consiste no uso dos princípios comporta- Layman e Kandel (1975). Após registrarem a frequ-
mentais básicos para produzir conhecimento sobre ência de comportamentos hiperativos (correr, pu-
procedimentos de modificação de comportamentos lar, gritar, sacudir objetos, virar excessivamente as
humanos socialmente relevantes; (2) a prestação de folhas do caderno, destruir objetos, movimentar-se
serviços, que consiste na aplicação do conhecimen- em excesso) e a quantidade de acertos em matemá-
to científico oriundo das pesquisas experimental tica e em leitura de crianças que utilizavam metil-
e aplicada com o intuito de prevenir e remediar fenidato como tratamento para hiperatividade, os
problemas comportamentais humanos nas áreas pesquisadores suspenderam o uso da droga durante
da saúde mental, educação, trabalho, entre outras três dias e notaram que os comportamentos hipera-
(Carvalho Neto, 2002; Tourinho & Sério, 2010). tivos aumentaram abruptamente de frequência (re-
Em um artigo publicado no primeiro volume velando o papel da droga como variável de contro-
do Journal of Applied Behavior Analysis (JABA), le) e que as habilidades acadêmicas permaneceram
Baer, Wolf e Risley (1968) demarcaram os critérios inalteradas. Em seguida, ainda na ausência do me-
que uma pesquisa aplicada em análise do compor- tilfenidato, os pesquisadores introduziram na sala
tamento deveria atender. São eles: (1) aplicada: os de aula um procedimento em que cada resposta
comportamentos envolvidos devem ser socialmen- correta em matemática era recompensada por uma
te relevantes e a análise deve levar em consideração ficha que, posteriormente, poderia ser trocada por
as mudanças a curto e longo prazos, tanto para o diferentes reforçadores, como tempo livre, doces,
indivíduo quanto para o grupo social; (2) compor- materiais escolares, entre outros. Depois de aplicar
tamental: a pesquisa deve estar comprometida com esse procedimento por seis dias, os pesquisadores
aquilo que o indivíduo faz e não apenas com o que passaram a dar uma ficha também para cada res-
ele relata fazer; portanto, o comportamento deve posta correta de leitura. Ao fim dos 12 dias de in-
Apesar de postularem que os processos de con- analistas do comportamento dos Estados Unidos
dicionamento eram insuficientes para o estudo do da América buscaram desenvolver um modelo de
comportamento humano, as novas modalidades de psicoterapia consistente com os pressupostos da
terapia comportamental que surgiram no final dos análise do comportamento e distingui-lo da eclética
anos 1960, cuja ênfase recaía sobre os processos terapia comportamental, o que culminou no surgi-
cognitivos, incorporaram muitos dos procedimen- mento da análise do comportamento clínica (CBA,
tos comportamentais (dessensibilização, exposição, do inglês clinical behavior analysis).
modelagem, etc.), culminando num ecletismo téc- A CBA foi definida como um ramo da análise
nico e teórico que viria a receber o nome de tera- do comportamento aplicada que se distingue pelos
pia cognitivo-comportamental (Barbosa & Borba, tipos de clientes atendidos, problemas clínicos abor-
2010; Pérez-Álvarez, 2006; O’Donohue, 1998), dados, procedimentos utilizados e ambiente no qual
ainda que as diferenças filosóficas entre os mode- a intervenção é conduzida (Guinther & Dougher,
los cognitivista e analítico-comportamental fossem 2013; Kohlenberg, Hayes & Tsai, 1993; Kohlenberg,
grandes demais para possibilitar uma integração. Tsai & Dougher, 1993). Porém, alguns autores
Como explica Costa (2002): “defender a compati- (Hayes, 2004; Pérez-Álvarez, 2006, 2012) explicam
bilidade, complementaridade e/ou integração entre que a CBA não indica ou é representada por uma
Behaviorismo Radical e Cognitivismo constitui em única terapia, mas abarca diversas modalidades te-
uma incoerência teórica que só pode ser explicada rapêuticas (às vezes referidas como terapias compor-
pela ausência de familiaridade com os pressupostos tamentais de terceira onda), a saber: terapia de acei-
de uma ou outra orientação” (p. 44). tação e compromisso (ACT, do original acceptance
As décadas de 1970 e 1980 testemunharam uma and commitment therapy; Hayes, Strosahl & Wilson,
gigantesca expansão das terapias comportamentais, 1999), psicoterapia analítica funcional (FAP, do origi-
com a publicação de inúmeros livros, surgimento nal functional analytic psychotherapy; Kohlenberg &
de periódicos científicos e fundação de associações Tsai, 1991), terapia comportamental dialética (DBT,
profissionais, mas, devido à mistura de teorias e do original dialectical behavioral therapy; Linehan,
técnicas, o campo ficou extremamente fragmenta- 1993a, 1993b), ativação comportamental (BA, do
do. Nesse cenário, os princípios teórico-conceituais original behavioral activation; Martell, Dimidjian
da análise do comportamento e sua filosofia sele- & Herman-Dunn, 2013), terapia comportamental
cionista foram abandonados quase completamente integrativa de casais (IBCT, do original integrative
na prática clínica de consultório, embora estives- behavioral couples therapy; Christensen, Jacobson &
sem acumulando cada vez mais evidências de efi- Babcock, 1995), e terapia cognitiva baseada em min-
cácia nas pesquisas em análise do comportamento dfulness (MBT, do original mindfulness-based cogni-
aplicada. Certamente, a pouca atenção dada pelos tive therapy; Segal, Teasdale & Williams, 2002).
analistas do comportamento às queixas clínicas tí- Assim, embora o movimento intitulado CBA
picas de indivíduos verbalmente competentes e o possa ter sugerido um avanço para aqueles que bus-
estabelecimento da eficácia da terapia cognitivo- cavam exercer uma prática psicoterápica embasada
-comportamental em ensaios clínicos randomi- na análise do comportamento (uma vez que seria
zados contribuíram para isso (Barbosa & Borba, um retorno da terapia comportamental às carac-
2010; Hayes, 2004; Kohlenberg, Hayes & Tsai, 1993; terísticas essenciais dessa abordagem), ele acabou
Pérez-Álvarez, 2006). culminando na criação de diferentes modalidades
No fim dos anos 1980, então, a prática das te- de prática clínica, repetindo, mais uma vez, a histó-
rapias comportamentais estava dividida: analistas ria de ecletismo da terapia comportamental.
do comportamento trabalhavam em ambientes Por fim, é importante observar que, quando se
institucionais com problemas severos de compor- postula que ACT, FAP, DBT, BA, IBCT e MBT fazem
tamento e terapeutas cognitivo-comportamentais parte de um movimento intitulado análise do com-
atuavam no consultório intervindo sobre as mais portamento clínica, sugere-se, à primeira vista, que to-
variadas queixas clínicas. Esse cenário começou a das essas modalidades de terapia são embasadas nos
mudar no início da década de 1990 quando alguns fundamentos filosóficos, conceituais, metodológicos e
Nos Estados Unidos, a aplicação plena de uma Por essa razão, Tourinho e Cavalcante propu-
visão externalista na prática de consultório seram, em 2001, o uso do termo terapia analítico-
ocorreu depois que a terapia cognitivo-compor- -comportamental, que se tornou consenso entre
tamental (internalista) já tinha sido estabelecidaterapeutas de diferentes regiões do Brasil como a
com firmeza. Foi uma contribuição inovadora melhor denominação para qualificar sua prática
[da CBA] propor uma prática clínica coerente- profissional, por especificar, já em seu nome, as
mente externalista. A situação brasileira foi bem bases filosóficas, conceituais e metodológicas que
diferente. No Brasil, a tradição comportamen- a sustentam2. Deve-se ressaltar que a criação do
tal aderiu desde cedo à análise Skinneriana e a termo não teve a intenção de propor uma nova
terapia comportamental se desenvolveu dentro modalidade de terapia, mas apenas uniformizar o
da comunidade verbal behaviorista radical. . . nome da prática clínica fundamentada na ciência
. Por isso, o externalismo não constituiu uma do comportamento Skinneriana que vinha sendo
inovação na terapia comportamental brasilei- praticada no Brasil desde o início da década de
ra. Os terapeutas comportamentais no país não 1970 (Zamignani, Silva Neto & Meyer, 2008).
precisaram esperar a FAP e a ACT para assumir Enfim, como explica Vandenberghe (2011), a
uma visão externalista. . . . Observamos, então, TAC foi desenvolvida no Brasil por um grupo de
uma cronologia invertida. A terceira onda apa- terapeutas que estenderam os fundamentos filosófi-
receu no cenário internacional depois da terapia cos do behaviorismo radical e os princípios básicos
cognitivo-comportamental. O modelo cognitivo da análise experimental do comportamento para
e as técnicas da terapia cognitiva estavam ampla- o âmbito da psicoterapia. Dessa forma, quando a
mente aceitos como a forma ortodoxa de tratar CBA começou a aparecer no fim da década de 1980
transtornos de ansiedade e de humor. Os autores e começo da década de 1990 nos Estados Unidos
da terceira onda construíram sua abordagem a da América, uma terapia comportamental de base
Skinneriana já estava bem solidificada no Brasil.
partir de uma crítica externalista às práticas exis-
tentes. Eles continuaram atuando basicamente Por fim, deve-se destacar que o termo criado no
como o fizeram os clínicos da segunda onda, Brasil para identificar a terapia comportamental de
mas trocaram o modelo cognitivo por um mo- base behaviorista radical – terapia analítico-com-
delo contextualista, inspirado no behaviorismo portamental – é desconhecido no resto do mundo.
Por exemplo, em uma busca realizada no Google
radical. . . . No Brasil, a sequência foi diferente.
A terapia cognitivo-comportamental se tornou Acadêmico em setembro de 2015 com as expressões
uma força importante quando a terapia com- “behavior-analytic therapy”, “behavioral-analytic
portamental de cunho behaviorista radical já therapy” e “analytical-behavioral therapy” (algumas
estava bem desenvolvida. (pp. 35-36) traduções possíveis para terapia analítico-compor-
tamental), foram identificados quase que exclusiva-
Ao longo de seu desenvolvimento, diversas ter- mente artigos de autores brasileiros que utilizaram
minologias foram utilizadas para se referir à prática tais expressões no resumo ou nas palavras-chave. Em
clínica brasileira de base behaviorista radical, tais poucas palavras, o termo cunhado no Brasil não é
como psicoterapia comportamental (e.g., Barcellos conhecido e utilizado fora dele, o que, naturalmente,
& Haydu, 1995; Lettner & Rangé, 1988), terapia dificulta a inserção da produção de conhecimento
comportamental (e.g., Guedes, 1993; Meyer, 1995) sobre terapia dos analistas do comportamento deste
e psicologia clínica comportamental (e.g., Silvares,
2000/2012). Entretanto, nos anos 1990 e 2000, ana- 2 Outras denominações foram dadas à terapia comportamen-
listas do comportamento brasileiros questionavam se tal de base behaviorista radical no Brasil, como terapia por
essas denominações eram suficientes para represen- contingências de reforçamento, psicoterapia comportamental
tar sua atuação, uma vez que estavam muito associa- pragmática e terapia molar e de autoconhecimento, mas as
semelhanças entre elas (todas são fundamentadas na análi-
das às técnicas respondentes e eram frequentemente se do comportamento e utilizam a análise de contingências
confundidas com a terapia cognitivo-comportamen- como ferramenta de análise e intervenção) sugerem que o uso
tal (Zamignani, Silva Neto & Meyer, 2008). de tais denominações é desnecessário (Costa, 2011).
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Informações do Artigo
Histórico do artigo:
Submetido em: 27/08/2015
Primeira decisão editorial: 27/10/2015
Aceito em: 30/10/2015