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O estereótipo do continente e cultura africana presente nos canais midiáticos

Autor: Vitória Gomes Batistoti Abreu - Ciências da Linguagem I - 2014 Matutino

Postado em 07/04/2014 às 12:15:24 - Editado por Vitória Gomes Batistoti Abreu em


10/6/2014 às 19:09

INTRODUÇÃO

Sabe-se que, muito mais do que informar, os canais e recursos midiáticos têm como função
formar opinião e doutrinar a sociedade no que se refere a pontos de vistas a serem
considerados corretos ou errados, populares ou marginalizados. Estes canais detêm o
monopólio da informação e, devido a essa garantia, podem transmiti-la da forma que lhes for
conveniente: alterando dados ou fundamentando as informações a ideologias próprias, por
exemplo. Entretanto, o monopólio da informação é perigoso: visões unilaterais podem ser
construídas, o que, possivelmente, pode desencadear a formação de estereótipos sobre
determinados assuntos.

Os estereótipos influenciam e restringem a visão de mundo; são perigosos no que tange à


formação de pré-conceitos estabelecidos que impossibilitam abertura para outras visões. O
psicólogo Serge Moscovici, em sua obra Representações sociais, cita que "As representações
sustentadas pelas influências sociais da comunicação constituem as realidades de nossas vidas
cotidianas”. (MOSCOVICI, 2003, p. 8).

A CONSTRUÇÃO DO ESTEREÓTIPO AFRICANO

Este artigo pretende apresentar que há uma grande precariedade de variedade nas notícias
referentes ao continente africano que aparecem diariamente na mídia. E que, nas poucas
vezes que o continente é citado, as notícias associadas a ele majoritariamente referem-se a
questões de fome, pobreza e há uma forte presença de preconceitos e visões unilaterais para
com a diversidade cultural, étnica e religiosa que se encontra ali.

Porém, como seria possível que fossemos capazes de entender e conhecer de forma extensa e
profunda o continente e cultura africanos se há carência de estudos na grade curricular da
educação brasileira? Se o pouco que se conhece sobre os povos africanos remete à época do
Imperialismo e posterior escravidão no Brasil? A grade curricular da educação brasileira
fortifica o estereótipo de submissão, precariedade e servidão de um povo rico em cultura e
história. Esse estereótipo é fortalecido pela presença de imagens e gravuras em livros didáticos
de negros como escravos que sofrem castigos físicos e se submetem a uma figura mais
desenvolvida cientificamente e civilizada que ele: o branco. Como exemplo disso, tem-se a
gravura de Debret acima, imagem que é frequentemente vinculada a materiais escolares
nacionais.

O Neocolonialismo ou Imperialismo do século XIX e a escravidão de povos africanos trouxe


heranças fortes e bastante verificáveis na sociedade vigente. A longa história de exploração e
submissão de grupos africanos aos europeus e americanos acarretou, ao longo dos anos, em
uma desigualdade econômica e social entre os continentes. Como uma das principais
consequências para o continente africano tem-se a Conferência de Berlim, realizada em 1884.
Ela partilhou o continente africano, e as fronteiras nacionais foram formadas respeitando
apenas os interesses dos colonizadores, dividindo tribos semelhantes e unindo tribos rivais, o
que ocasionava guerras pela liderança do território (foto da divisão do continente abaixo). O
processo de estabilidade territorial iniciou-se apenas após a Segunda Guerra Mundial (1939-
1945), quando os movimentos de independência ganharam força. Entretanto, ainda hoje, os
estados africanos, na sua maioria, não possuem a mesma unidade cultural e linguística.

Partilha da África durante a Conferência de Berlim

Charge referente à partilha do continente

ANÁLISE DE NOTÍCIAS REFERENTES À ÁFRICA

Para comprovar que há, por parte dos canais midiáticos, um continente africano fortemente
estereotipado, o site da revista Veja foi objeto de estudo deste artigo. As notícias e manchetes
que foram analisadas conjuntamente pertencem ao período de um mês (do dia 01/03/2014
até 01/04/2014) e, através delas, um levantamento de palavras foi realizado. As palavras mais
frequentes que se referem exclusivamente à África (excluindo-se as notícias da sessão de
esportes e palavras como artigos, preposições e entre outros (estudou-se, portanto, apenas
palavras que caracterizam o continente)), compõe a tabela abaixo:

Tabela de frequência de palavras

Analisando o levantamento das palavras, observa-se a presença de termos que caracterizam o


continente africano de uma forma estereotipada: há, com muita frequência, palavras que
remetem a problemas de saúde (a palavra doença e vírus lideram com maior presença e é
assídua a presença dos termos ebola, casos, AIDS, médicos, malária e saúde), problemas
econômicos etc. A mídia apresenta o continente africano através de suas características
negativas: quase não se encontra questões positivas que se refiram à sua grande diversidade
religiosa, cultural e étnica. Há, portanto, uma visão unilateral do povo africano que
impossibilita que o conhecimento acerca da cultura africana seja ampliado, ficando restrito às
ideias comumente divulgadas, fortalecendo o preconceito e desigualdade mundial.

Darwinismo social

Assim, fica evidente que o darwinismo social, ideologia que fomentava as ações violentas e
injustas dos povos europeus diante dos africanos no século XIX, no período do Imperialismo,
pariu o preconceito da contemporaneidade. O continente africano é minimizado às suas
precariedades. A grande mídia não dá importância às riquezas de um povo tão diverso, ela não
se preocupa em apresentar ao consumidor de notícias a diversidade africana, sua cultura tão
desconhecida pelo "branco civilizado". E, desconhecendo informações profundas sobre a
história do continente, ficamos cada vez mais restritos à visão hegemônica de que o
continente é atrasado, pobre, doente e precário. A visão hegemônica de que o negro é
atrasado perante o branco, sustentada pelo darwinismo social, é, infelizmente, ainda
sustentada (como evidente na foto ao lado; a figura mais desenvolvida perde a coloração
escura ao longo do tempo e ainda adquire cabelos claros).

Perdemos muito com o preconceito que nos domina; perdemos o conhecimento de uma
cultura que deu berço à cultura do povo brasileiro, desconhecendo sua história e sua
importância para a população mundial.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MOSCOVICI, Serge. Representações sociais: investigações em psicologia social. Tradução


Pedrinho A. Guareschi. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2003.

CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2006.

Grupo de Lingüística da Insite <http://linguistica.insite.com.br/corpus.php>. Acesso em: 28


abr. 2014.

ALVES, F. "Estereótipos e preconceitos relacionados ao continente africano, aos africanos em


geral e a continuidade nos dias de hoje". In: Sabiochronos. Disponível em:
<http://sabiochronos.blogspot.com.br/2013/08/estereotipos-e-preconceitos.html>. Acesso
em: 30 abr. 2014.
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Audistico: <http://www.audistico.es/archivos/Evolucion-Darwin.jpg>. Acesso em 26 abr. 2014.

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História Pública: <http://historiapublica.blogspot.com.br/2012/11/partilha-da-africa-


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