Você está na página 1de 11

INTRODUÇÃO

Este trabalho estuda o pensamento político de Marsílio de Pádua (1275-1343), em


suas formulações teóricas, onde defendeu e secularizou o poder civil, tornando-o não
somente único e exclusivo enquanto poder constituído como, sobretudo, independente
da igreja e autónomo em relação ao domínio espiritual.

Segundo Garcia (2008), o paduano na sua obra O Defensor da Paz (1324)


desenvolveu sua teoria acerca daquilo a que chamou a falsidade da plenitudo potestatis,
defendendo a tese de que os pontífices romanos não tinham essa autoridade – a mesma
encontrava-se reservada somente a Deus.

Objectivos
Objectivo geral
Comprender o pensamento político de Marsílio de Pádua, baseado na obra O
Defensor da Paz (1324).
Objectivos específicos
Analisar principais fundamentos do pensamento político de Marsílio de Pádua;
Analisar a ifluência do pensamento político de Marsílio de Padua no poder da
Igreja Católica.

Formulação do problema de pesquisa


Qual é o contributo de Marsílio de Pádua na História do Pensamento Político?

Formulação das hipóteses


Marsílio de Padua, em suas formulações teóricas secularizou o poder civil,
tornando-o independente da igreja e autônomo ao domínio espiritual;

Marsílio de Padua discutiu a relação conflitante entre o Papado e o Império,


desenvolveu sua teoria a falsidade da plenitudo potestatis, defendendo a tese de que os
pontífices romanos não tinham essa autoridade.
Metodogia
Para a realização deste trabalho, optamos pela pesquisa bibliográfica, baseada na
análise qualitativa da bibliografia. Teve como principal fonte a obra do autor em estudo,
intitulada O Defensor da Paz (1324).

1
O Defensor pacis de Marsílio de Pádua (1324)

Garcia (2008) fundamenta que Marsílio de Pádua notabilizou-se na corte do


imperador Luís IV, tendo, assim, uma participação muito importante no contexto
político do século XIV ao escrever vários tratados em defesa do poder imperial. Entre
eles está a primeira e mais importante obra de sua vida, o Defensor Pacis (1324), que
tem como principal objetivo auxiliar o império contra a suposta plenitude de poder que
o Papa arrogava para si. Quanto a esse suposto poder, Garcia demonstra que:
Esta – plenitudo potestatis – era entendida, à época, como um poder absoluto
e irrestrito, atribuído aos bispos de Roma tanto no domínio temporal quanto
no espiritual. Dentre seus principais teóricos citam-se Egídio Romano, Tiago
de Viterbo, Agostinho Triunfo e Álvaro Pelágio. Mas a própria noção de
plenitude do poder papal havia sofrido, com o tempo, mudanças conceituais.
Dessa forma, as primeiras aparições do termo plenitudo potestatis nos
documentos pontifícios faziam referência antes ao poder que era delegado
aos emissários do sumo pontífice do que ao poder do próprio bispo de
Roma. Posteriormente, a expressão passou a referir-se ao poder pontifício
sem, contudo, implicar numa supremacia temporal absoluta: tratava-se
simplesmente de uma supremacia espiritual dotada de consequências
temporais associada a uma autonomia temporal nos Estados Pontifícios. A
partir do final do século XII e do início do XIV, a expressão adquiriria o
significado mais amplo e abrangente que jamais tivera: aquele que serviria
como fundamento para a elaboração das teorias hierocráticas.

Dessa maneira, com o intuito de desmantelar essa teoria hierocrática papal,


Marsílio divide o Defensor Pacis em três partes/discursos. Na Prima Dictio, Marsílio
fundamentou sua teoria política apresentando-a de forma lógica, por meio de
proposições onde não recorre absolutamente a nenhuma verdade revelada. De
Aristóteles, a Política e a Ética a Nicômaco são as fontes que Marsílio usa por
excelência nesse momento. Usa ainda a Retórica, a Física, a Metafísica, os
Analíticos, o De Generatione e o De Anima. Outros autores que o paduano faz
alusão nessa Dictio são: Cícero (De Officiis), Cassiodoro (Varia), Sêneca e Salústio, faz
ainda poucas referências ao Novo Testamento, pois o assunto principal que é tratado é a
formulação de uma teoria política.

Portanto, na Prima Dictio do Defensor Pacis, Marsílio de Pádua começou a


formular uma teoria política apoiada na tradição filosófica e na razão natural, sem
recorrer em absoluto à Revelação Cristã. O clero, nesse momento, começa a perder suas
competências jurisdicionais ao mesmo tempo em que é reduzido a uma das partes da
Civitas, onde a soberania e o poder tornam-se uno e indivisível, começando, assim, a
possibilidade do fim dos conflitos entre o poder secular e espiritual.

2
Na Secunda Dictio, o paduano demonstra suas concepções eclesiásticas tendo
como alicerce sua própria teoria política que demonstrou no livro I de sua obra. Trata-se
agora de uma teologia política fundamentada principalmente nas Escrituras: “É isso
também o que o apóstolo afirma claramente na Epistola aos Romanos, capítulo XIII [1]:
Toda criatura se submete às autoridades constituídas, a saber, aos reis, aos príncipes e
aos governantes (...)”. Percebe-se, portanto, que o filósofo deixa um pouco de lado as
fontes profanas que outrora usou na Prima Dictio. Logo, a fim de fundamentar sua
eclesiologia política, Marsílio interpreta literalmente os textos bíblicos usados nessa
parte da obra. Para isso, recorre à teologia de Pedro Lombardo (século XII), em especial
à Glosa Ordinária, à Glosa Interlinear, à Catena Aurea, e às Collectanea in Epistolas
Sancti Pauli.
Dessa forma, o autor Garcia (2008), no início dessa parte do tratado, Marsílio
deixa claro o que vem ser a Igreja que, segundo o filósofo, nada mais é que o “(...)
conjunto dos fiéis que acreditam em Cristo e invocam Seu nome, e a todas as partes
deste conjunto em cada comunidade, inclusive a doméstica”. Essa é uma demonstração
clara de que o Paduano ia de encontro à noção de hierarquia eclesiástica, cujo líder é o
Bispo de Roma.
Em seguida, o pensador rebate a noção de poder sacerdotal coercivo de perdoar
os pecadores de seus pecados, demonstrando que o próprio Cristo, Filho de Deus, não
arrogou para si tal incumbência, a fim de exercê-la neste mundo. Assim, com o intuito
de barrar os excessos cometidos pelo clero, os supostos pecados e heresias, dos
participantes da civitas, estes devem ser julgados pelo detentor do poder coercivo, o
Imperador, eleito pelo povo, visto que as supostas infrações também têm implicações
sociais. Assim, os pecados serão ainda julgados e condenados ou, até mesmo,
absolvidos por Cristo na outra vida, não sendo da competência de um ministro
eclesiástico atribuir com poder a absolvição ou castigo até mesmo na vida futura, como
era costume.
Marsílio vai mais além quando defende também que, para um clérigo ocupar um
cargo mais elevado, como de bispo, ou ainda, ocupar uma paróquia, dependerá agora da
escolha do Legislador Cristão e não mais de seus superiores. Demonstra ainda que
Cristo e os Apóstolos viveram em extrema pobreza, o que seria um exemplo a ser
seguido por todos os seus ministros, que teriam a obrigação de viver das doações dos
fiéis, assim como viveu e ensinou o Apóstolo São Paulo. Dessa forma, o filósofo
chega à conclusão que seria incompatível em uma sociedade perfeita o clero possuir

3
terras ou outros bens. Até mesmo porque, a Igreja Primitiva teria seguido o exemplo de
Cristo vivendo em pobreza.
Por fim, na Secunda Dictio, o filósofo analisa a pretensão dos Pontífices
Romanos quanto à suposta plenitude de poder sobre todo o clero, sobre os fiéis e sobre
o Império Romano. Analisa, ainda, as consequências danosas desse pseudo-direito sobre
a Cristandade de modo geral, para que, em seguida, respondesse às prováveis objeções
que surgissem contra suas teorias.
Sobre o assunto tratado na Terceira Parte do Defensor Pacis, o próprio autor o
apresenta como uma recapitulação dos principais objetivos e conclusões apresentadas
nas Partes I e II. É uma espécie de conclusão onde Marsílio continua defendendo que a
principal causa da discórdia e intranquilidade civil nos reinos e cidades estão na
obstinação do Bispo de Roma e dos clérigos em se apoderar dos principados seculares,
acumulando também, escessivamente, bens temporais. É ainda nessa parte, no último
capítulo, que o filósofo dá a explicação referente ao título do tratado, Defensor Pacis.
Garcia (2008)

A Comunidade Política

Segundo Cimadon e Schmidt ( 2019, p. 306) Marsílio de Pádua concebe a


sociedade, no Defensor da Paz, “como uma comunidade de seres humanos, universal e
naturalmente ordenada, que se constrói pela razão, tendo em vista o 'bem viver'”. Dessa
forma, “a sociedade é um todo orgânico que tem como causa a tendência natural do
homem à socialização; como origem sua vontade racional e como objetivo a felicidade e
o bem-estar da comunidade”. Assim, Marsílio parte de uma concepção organicista da
comunidade política, na linha de Aristóteles e de toda a reflexão política medieval
precedente.

Para Garcia (2008, p. 25), a comunidade política era, para Marsílio de Pádua,
a comunidade perfeita, a evolução última das agregações humanas a qual
denominou cidade. Era perfeita por apresentar as regras ou maneiras de viver
consolidadas, grupos sociais distintos e uma comunidade que gradualmente
descobria o que era necessário para viver bem a fim de poder se realizar na vida
terrena.

Esta comunidade era comparada por Marsílio de Pádua a um organismo


humano. Todo ser vivo, segundo sua natureza, se constituia de partes distintas e
4
ordenadas umas com as outras, cada qual exercendo suas funções e benefícios ao
todo. O mesmo deveria ocorrer com a cidade para que alcançasse sua finalidade: o
viver bem na vida terrena. Para que isso pudesse acontecer o poder civil tinha a
responsabilidade de arbitrar ou controlar as vontades diversas.
Em suma, para Cimadon e Schmidt ( 2019, p. 306), quanto às funções exercidas
no âmbito da cidade, cada parte do agrupamento social desempenhava uma atividade
específica e distinta, mas interdependente da dos demais, como se compusessem um
verdadeiro organismo vivo. Assim, havia na sociedade do Medievo essencialmente três
ordens, cada qual com sua função: os que rezam (oratores, clérigos), os que lutam
(bellatores, cavaleiros) e os que trabalham (laboratores, camponeses). Estes teriam a
responsabilidade de nutrir, esses o encargo de defender e aqueles o mister de zelar pela
alma de todo o conjunto.

Valores democráticos e sua promoção por meio do Legislador

No que tange à lei humana, Marsílio de Pádua considera que, para organizar a
cidade conforme o justo e o útil e garantir a estabilidade governamental, é necessário
legislar. Todavia, como já exposto, o legislador não deve se ocupar em definir apenas o
que é justo e útil, do contrário sequer haveria lei. É necessário também prever um
preceito coercitivo para punir os transgressores da lei.

Ao analisar a lei humana, o paduano sustenta que seu objetivo principal é


concorrer para o bem comum e o que é justo e útil na cidade, ao passo que seu objetivo
secundário é conceder segurança e estabilidade governamental. Tal regra é cominada
somente para aplicação neste mundo, tanto é que, segundo Walter Ullmann, “para
Marsilio, la ley humana no tenía connotaciones morales ni contribuía a la consecución
de la salvación, ni materializaba tampoco verdades eternas”. Ao contrário, “la función
de las leyes consistía en proporcionar <bienestar> en esta vida y en este mundo; es
decir, que tendían al bienestar humano de todos los ciudadanos”. Cimadon e Schmidt
( 2019, p. 308)

Contudo, Marsílio de Pádua anota que o que é justo e útil para a cidade não é lei
se não houver um preceito coercitivo impondo sua observância.

Daí se infere que Marsílio concebe dois aspectos na lei humana: um aspecto
material, de conteúdo (concorrer para o bem comum e o que é justo e útil para a cidade;

5
conceder segurança e estabilidade governamental) e outro formal, de caráter
sancionatório (previsão de preceito coercivo para punir eventuais transgressores).

Com efeito, quanto à forma, Marsílio de Pádua aduz que a lei, “em si mesma,
enquanto revela somente o que é justo ou injusto, útil ou nocivo […] é chamada
doutrina ou ciência do direito”. No que toca ao conteúdo, consoante Marsílio de Pádua a
lei “considera o que um preceito coercitivo estipulado impõe como recompensa ou
castigo a ser atribuído neste mundo, conforme a finalidade do seu cumprimento, ou,
ainda, na medida em que é dado mediante tal preceito”.

Ainda quanto ao conteúdo da lei, exige-se a dimensão exata do que é justo e útil
para que a lei seja considerada perfeita. Quando um ponto de vista distorcido sobre o
que é justo e útil acaba se tornando lei (porque acrescido de preceito coercitivo quanto a
seu cumprimento), não necessariamente tem a condição exigida para que seja lei justa
(do que se conclui que a lei humana nem sempre é justa), mas ainda assim será
considerada lei.

O legislador, para Marsílio de Pádua, é o povo, ou seja, “o conjunto dos


cidadãos ou sua parte preponderante (pars valentior ou valentior pars), por meio de sua
escolha ou vontade externada verbalmente no seio de sua assembleia geral prescrevendo
ou determinando que algo deve ser feito ou não, quanto aos atos civis, sob pena de
castigo ou punição temporal.

Os argumentos empregados por Marsílio de Pádua, na obra O Defensor da Paz


segundo Cimadon e Schmidt ( 2019, p. 310) , em favor da tese de que o legislador é o
conjunto dos cidadãos ou sua parte preponderante são, em suma, os seguintes:

a) Dele provirão com exclusividade as melhores leis: o que o conjunto global


dos cidadãos aspira por meio de inteligência e sentimento é mais útil e verdadeiro;
alguns não acatarão o ponto de vista comum, mas a realização do bem comum não pode
ser obstada por uma oposição descabida;

b) Um maior número de pessoas pode apontar com mais exatidão alguma falha
na proposição legal: a utilidade comum de uma lei é melhor percebida pela totalidade
dos indivíduos, porque ninguém se prejudica conscientemente; lei não pode ser
promulgada por um ou alguns mais em seu benefício que no bem comum;

6
c) As leis serão melhor cumpridas ou observadas: uma lei é melhor cumprida se
o cidadão julga tê-la imposto a si mesmo (e, se a lei não viesse a ser cumprida, seria
inútil promulgá-la);

d) O agir previsto em lei consiste em prover a suficiência comum à maior parte


dos cidadãos, de modo que seu estabelecimento inadequado causaria prejuízo comum:
como visto, os homens se reuniram em sociedade para obter seus benefícios e vida
suficiente e evitar seus opostos; a suficiência consiste em leis estabelecidas
corretamente, e seu oposto (servidão, pobreza, opressão) dissolve a sociedade política.

Quanto à autoridade do legislador, Marsílio de Pádua assinala:

a) É por meio do legislador que as leis e tudo o que se estabelece por eleição
deve ser ratificado;

b) É por meio do legislador que as leis recebem acréscimo, supressão, mudança,


interpretação ou suspensão, tendo em vista o bem comum;

c) É ao legislador que cabe promulgar e proclamar leis após sua elaboração.

Segundo Marsílio de Pádua, o legislador atua por si mesmo ou delega suas


atribuições a uma ou muitas pessoas, que não são, em absoluto, o próprio legislador,
mas só relativamente, vale dizer, por algum tempo e sob a autoridade do primeiro
legislador. Em outras palavras, o que se transfere é apenas o exercício, e não a própria
titularidade do poder, sendo certo que os cidadãos controlarão os atos do príncipe,
podendo julgá-lo e até mesmo destituí-lo se ele transgredir a lei

Outrossim, a elaboração da lei, para Marsílio de Pádua, máxime porque esta


tende a perdurar ao longo do tempo, pauta-se pelo seguinte: a) deve se dar a partir da
experiência e da constatação dos fatos; b) requer prudência, que se adquire na prática e
ao longo do tempo; e c) exige auxílio mútuo para chegar à perfeição, pois o que um
homem apenas sabe é irrisório Cimadon e Schmidt ( 2019, p. 312).

A concepção das Formas de Governo

Marsílio de Pádua aborda diversos aspectos das formas de governo, entre as


quais ora serão destacadas as características de cada uma delas, a forma de governo
mais perfeita, as formas de escolha dos governantes, se estes devem ou não ter sucessão

7
hereditária, quem deve ser escolhido governante, que predicados este deve ter, o número
de governantes e a causa eficiente do governo civil.

De início, o paduano classifica os governos ou principados em temperados, nos


quais o príncipe governa para o bem comum, conforme a vontade dos súditos, e
corrompidos, que não têm tal característica. Por sua vez, cada um desses governos ou
principados é classificado em três espécies, partindo da habitual classificação
aristotélica das formas de governo. Marsílio assim os conceitua: temperado pode ser
monarquia real, aristocracia ou república, e o corrompido pode ser monarquia tirânica,
oligarquia ou democracia. Cimadon e Schmidt ( 2019, p. 313)

Assim, a distinção que Marsílio propõe entre os regimes temperados e


corrompidos repousa essencialmente na vontade (ou consenso) dos súditos, que
diferencia os regimes temperados dos corrompidos e assemelha entre si as três espécies
daqueles e destes.

Segundo o paduano, quanto à escolha do monarca, pode ela ser eletiva, na qual o
monarca governa mais de acordo com a vontade dos súditos, com base em leis que
visam ao bem comum, ou não eletiva, em que os súditos são menos conscientes de seus
direitos e as leis não visam ao bem comum. Marsílio considera o governo eletivo
superior ao não eletivo, pois entende que pela eleição se obtém o melhor governo, e
aduz que as outras espécies de governo temperado que não a monarquia real também
são, em sua maioria, instituídas por eleição. Prossegue e indaga se o governo eletivo
deve ser instituído com ou sem o direito de legar o poder a descendentes (sucessão
hereditária), analisando as vantagens e desvantagens de cada uma das duas hipóteses,
inclinando-se, ao final, em favor do modelo que não admite a sucessão hereditária.

Assim, quanto às qualidades do governante, Marsílio de Pádua considera que o


governante ideal deve possuir essencialmente duas, quais sejam, prudência e virtude
moral (justiça), sendo que a prudência guia a inteligência na ação de governar, isto é,
julgar acerca da utilidade das coisas e do cumprimento da justiça, ao passo que por
intermédio da virtude moral (justiça) o príncipe se mantém reto.

Das funções e da limitação do poder político

Com efeito, cabe ao legislador, essencialmente, exercer a titularidade do poder


(por meio do povo, conjunto dos cidadãos ou de sua parte preponderante), escolher a

8
forma de governo (é a causa eficiente do governo civil) e o governante (Marsílio se
inclina pelo governante eleito), elaborar a lei (definir o que é justo e útil para a cidade) e
prever o preceito coercitivo para punir seus transgressores (punição temporal), instituir
os grupos sociais e os ofícios (primariamente) e fiscalizar os atos do governo e, em caso
de transgressão, julgá-lo e depô-lo (consequência da titularidade do poder). Assim, para
Marsílio de Pádua o legislador é quem cria a lei (humana) e o Direito e institui e
controla os responsáveis por sua aplicação e efetivação.

Ao julgador, por sua vez, cabe promover os julgamentos conforme a lei e não
segundo seu próprio arbítrio. Desse modo, como quem elabora a lei é o legislador, este
figura acima do julgador, que somente na falta da lei atua segundo a equidade,
prudência e justiça. O julgador também aplica o preceito coercitivo, executando os
julgamentos e aplicando castigo aos transgressores da lei (conforme a terceira acepção
de direito antes exposta), deve fazer justiça, de modo a manter a paz, alcançar a
suficiência comum (conforme a primeira acepção de direito antes exposta) e a restaurar
a igualdade ou proporção (conforme a quarta acepção de direito antes exposta).

Quanto ao governante ou príncipe, lhe compete governar (julgar acerca da


utilidade das coisas e o cumprimento da justiça, conforme a lei, somente na falta da qual
atua conforme a equidade e a prudência), fazer cumprir a lei e suas decisões (usando
para tanto de força coercitiva), estabelecer os grupos sociais e ofícios (secundariamente)
e ordenar o que é justo e honesto, atribuindo recompensas ou prêmios, e proibindo seu
contrário, aplicando castigos e punições.

Todavia, o governante ou o príncipe que não é tirano governa com a


aquiescência e segundo a determinação legal da comunidade, devendo agir conforme a
lei para a conservação da cidade, de modo que também figura abaixo do legislador, por
quem é eleito e pode ser julgado e destituído. Cimadon e Schmidt ( 2019, p. 315)

9
CONCLUSÕES

A fim de provar que não existia, de facto, um poder espiritual, e que a plenitude de
poder era do povo, Marsílio de Pádua retirou do pontífice romano toda a autoridade e
poder ao delimitar e limitar sua esfera de actuação: ligar e desligar os pecados do
mundo e, principalmente, segundo Marsílio, controlar as paixões humanas, a fim de que
o detentor do poder temporal pudesse governar e, através das leis, manter a paz e a
tranqüilidade no reino. Mas isso somente se tornou possível por meio da idéia de
representação por delegação do poder civil e de sua teoria conciliar, a qual estabeleceu o
meio pelo qual seria exercida essa mesma representação. Para Marsílio, todo o poder,
foi transmitido do povo a alguém, ou seja, foi delegado a um representante. A
comunidade política era constituída pela universitas civium, o conjunto dos cidadãos ou
sua parte mais importante, que era a valentiors pars ou o legislador humano. Esse
representante, o governante, não detinha o poder irrestrito, pois, como todo ser humano
estava suscetível a paixões, amores e ódios originários das relações humanas. Para
resolver essa questão, foi necessário o estabelecimento das leis, para que o governante
fosse justo em seus julgamentos.

Marsílio refutou a teoria papal da plenitudo potestatis e, com isso, desvinculou o


poder civil da religião, a fim de que, segundo ele, aquele, de fato, cumprisse seu
papel. Os meios pelos quais o fez foram, sobretudo: a) afirmar que esse Concílio era
convocado, organizado e regido pelo legislador humano; b) estabelecer a
inexistência de hierarquia entre os apóstolos de Cristo, e que, por isso, Pedro não foi
o único vigário de Cristo - pois não existiam vigários, somente sucessores; c)
limitar a esfera espiritual apenas ao campo religioso e, ainda, d) afirmar que, ainda
que o poder viesse de Deus, era transmitido diretamente ao povo e que este, sim -
não a Cúria Romana -, o delegava a um representante para que a comunidade

10
alcançasse seu fim último nesta vida, mantendo a paz e a tranqüilidade, O mais
importante ou inovador na teoria de Marsílio de Pádua foi o início da idéia da
separação do poder civil, nas figuras do legislador e do executor.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

11

Você também pode gostar