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MÓDULO – FUNDAMENTOS DE SAÚDE

DISCIPLINA - Epidemiologia e processos de saúde doença


AULA 01 – Conceitos Básicos da epidemiologia
Prof Ivana Maria Saes Busato

Introdução:
O principal objetivo desta aula é conceituar epidemiologia a partir de uma
contextualização histórica e sua importância para a integridade e manutenção da
saúde individual e coletiva. Também reconheceremos a influencia da epidemiologia
no desenvolvimento social e a sua participação na organização do Sistema Único de
Saúde no Brasil.

Contextualizando:

A Epidemiologia na Mundo
As raízes históricas da epidemiologia são atribuidas a Hipócrates (470 a 370 aC-Grécia),
descendente de uma família de sacerdotes de Asclépios. A estrutura e o conteúdo dos
textos hipocráticos sobre as epidemias e sobre o meio ambiente, deram início ao
raciocínio epidemiológico, mostrando uma tradição de promover a saúde com ações
preventivas (Deusa Higeia), pelo equilibrio entre os elementos da natureza: terra, fogo,
ar e água.

Os primeiros médicos de Roma eram em geral escravos gregos sendo muito


valorizados nesta época. Um dos mais importantes foi Claudius Galenus (130-200 dC
Roma), que desde cedo foi incentivado pela família no aprendizado da medicina.
Iniciou como atendente no templo de Asclépios. Em Roma, Galenus tornou-se médico
das celebridades pelo seu conhecimento e arroujo. Além da medicina galênica, o
império romano contribuiu para epidemiologia coletiva com sua infraestrutura
sanitária, seus aquedutos e esgotos, bem como na realização de registro periódico de
nascimento e óbitos, como também censos populacionais periódicos.
Devemos destacar, os avanços tecnológicos e o caráter coletivo da medicina no
mundo árabe. Avicena (980-1037 dC Irã), médico, matemático e filósofo persa,
reintroduziu Hipócrates e Galeno na medicina ocidental. Os médicos muçulmanos,
baseados na escola hipocrática, adotaram uma prática precursora da saúde pública,
com grandes avanços nos registros de informações demográficas e sanitárias, bem
como os sistemas de vigilância epidemiológica.

Na Idade Média é fundada a London Epidemiological Society (Sociedade de


Epidemiologia de Londres), com a participação de jovens com idéias de médicos-
sociais, com oficiais da saúde pública e membros da Real Sociedade Médica, tendo
como objetivo promover o intercambio de conhecimento sobre o pensamento de
epidemiologia.

No século XIX devemos destacar Florence Nightingale (1820 – 1910 Italia), fundadora
da enfermagem, que realizou pesquisas pioneiras sobre a mortalidade por infecção
pós-cirúgica nos hospitais militares na Guerra da Criméia. Outro membro importante
foi John Snow (1813 – 1858, Inglaterra) realizou a mais notável investigação da
epidemia cólera de 1854.

John Snow é considerado por muitos autores o fundador da Epidemiologia, filho mais
velho de um trabalhador de York, aos 14 anos começou a ser aprendiz e ter
conhecimentos cirúrgicos transmitidos pelo sistema mestre-discípulo com um cirurgião
da época. Estudou medicina em Londres pelo Royal CollegeofPhysicians graduando-se
em 1844 e começou a clinicar na capital britânica. Snow foi um proeminente
anestesiologista e pioneiro no uso de éter e clorofórmio, escreveu um livro sobre o
assunto em 1858, ficando famoso por anestesiar a Rainha Victória no parto das
Princesas Leopoldina e Beatrice.

Vamos conhecer melhor o estudo de John Snow sobre a cólera em Londres! Seu
primeiro contato com os doentes de cólera aconteceu no surto de 1831/32 quando era
aprendiz, acompanhou também um novo surto da cólera 1848/49, porém ambos
surtos mantiveram-se estáveis.
Desde 1832 Snow já questionava a teoria do miasma para explicar a epidemia da
cólera, em sua observações havia notado que mineiros trabalhando no interior da
terra, longe das regiões miasmáticas também haviam adoecido. Assim, em agosto de
1849 publicou um panfleto defendendo a transmissão da cólera pela água. Evitando
confrontar com a teoria do miasma não falava em germes e sim afirmava que um
veneno contaminava a água com capacidade de se multiplicar no intestino

Em 1854 a cólera reapareceu com características de uma grave epidemia,


registrandomais de 616 casos fatais. Nesta época Snow era ministro da saúde de
Londres.Uma das teorias apontadas na época foi de que os miasmas haviam escapado
por causa de uma nova construção na região, visto que no local que aconteceram o
maior número de mortes tinha sido enterrado vários corpos na época da peste
bubônica.Outra teoria falava nas más condições de higiene das casas, porém as casas
foram verificadas e esta teoria não conseguiu explicar a epidemia.

O mapa com a distribuição espacial das 616 mortes indicava a possível fonte da
contaminação mostrando a posição da Bomba de água da Broad Street. Assim, Snow
começou analisando essses casos: fez entrevistas, verificou todos os estabelecimentos
comerciais e hospitais que estavam neste distrito. Analisou que estabelecimentos
próximos que não faziam uso desta bomba tinham poucos casos de óbitos, inclusive
um hospício bem perto da bomba tinha 535 internos somente 5 haviam adoecido.
Todas as pessoas que usavam a bomba de água da Broad Street morriam, o caso mais
curioso foi de uma senhora que morava em outro distrito e gostava de tomar água
desta bomba, ela e sua sobrinha morreram de cólera.

Snow colheu uma amostra da água para análise microscópica, viu que havia muita
matéria orgânica na água, porém não conseguiu provar a contaminação da água. Desta
maneira começou análise estatística da doença para provar sua teoria: a contaminação
dava-se pelo uso da água que vinha da bomba de Broad Street. Com este estudo
epidemiológico Snow conseguiu convencer as autoridades a fecharem a bomba, e os
casos de cólera começaram a diminuir. Publicou novamente sua teoria de
contaminação HÍDRICA da cólera, agora com suas observações sobre a bomba de
Broad Street. Snowfoi capaz de usar os métodos epidemiológicos para identificar a
origem do germe da cólera.

No final do século XIX houve muitos avanços várias ciências como: a fisiologia, a
patologia e a bacteriologia, fazendo a medicina clínica superar o enfoque coletivo. Esta
medicina individual aparecia como a nova "panaceia" e que finalmente superava o
enfoque coletivo “higiênico”. Mesmo neste contexto a medicina social evoluiu
intensamente dentro da estrutura do Estado, como Saúde Pública, fundamentada na
aplicacão de tecnologia e atividades profiláticas (saneamento, imunização e controle
de vetores) destinada principalmente aos pobres e setores excluídos da população.

No final do século XX com introdução dos computadores provocou a matematização


da epidemiologia promovendo sua expanção na capacidade de investigação e
impondo-se no estudo do complexo saúde-doença-cuidado por meio da quantificação.
Na década de 1980 duas tendências despontaram: uma epidemiologia Clínica com uso
pragmático da metodologia epidemiológica com ênfase na identificação de caso e
avaliação da eficácia terapêutica, aonde foi difundida a medicina baseada em
evidências

Outro fator hitórico importante foi o re-aparecimento de doenças (cólera, dengue) e


principalmente de novas doenças (AIDS) levaram a epidemiologia buscar seu
desenvolvimento tentando superar estes novos desafios. O uso dos métodos
epidemiológicos foi fundamental para descoberta da AIDS, vamos conhecer um pouco
desta história!

A síndrome da imunodeficiência adquirida (aids) foi reconhecida em meados de 1981,


nos EUA, quando epidemiologistas começaram observar um número elevado de
pacientes adultos do sexo masculino, homossexuais e moradores da cidade de São
Francisco (EUA), que apresentaram um conjunto de doenças iguais entre os doentes,
destacando um tipo de câncer. A imprensa ficou muito interessada nestas
informações, e no jornal americano The New York Times virou uma grande notícia. Esta
notícia trazia informações alarmantes de médicos de Nova York e da Califórnia, haviam
diagnosticado 41 casos deste câncer, com oito óbitos em menos de 24 meses após o
diagnóstico. A causa era desconhecida, sem qualquer evidência sobre a causa e o
contágio.

Os médicos que fizeram estes primeiros diagnósticos, principalmente em Nova York e


na área de São Francisco, alertaram outros médicos para o problema, num esforço
para ajudar a identificar mais casos e reduzir o atraso do tratamento de quimioterapia,
e assim por meio da investigação epidemiológica puderam detectar os fatores de risco,
e a definição de grupos de risco (homossexuais, hemofílicos e haitianos).

O vírus da Aids foi identificado em dois anos e meio após os primeiros diagnósticos.
Jamais uma doença infecciosa teve sua causa esclarecida em período tão curto, e a
principal estratégia foi o método epidemiológico. A autoria da descoberta, no entanto,
foi cercada de controvérsias entre dois grupos: o de Luc Montagnier, do Instituto
Pasteur, na França, e o de Robert Gallo, do NationalCancerInstitute nos EUA

A Epidemiologia no Brasil

A epidemiologia brasileira tem suas raízes nos estudos sobre as doenças tropicais. As
condições sanitárias das cidades portuárias eram marcadas pela febre amarela, peste
bubônica e varíola, isto espantava as transações comerciais porque as grandes
companhias não queriam expor seus marinheiros.

Em 1903 foi nomeado o médico Oswaldo Cruz (1872 -1917, São Luiz do Paraitinga –SP)
como Diretor-Geral de Saúde Pública, com a tarefa de sanear a cidade do Rio de
Janeiro. A campanha contra febre amarela foi estruturada nos moldes militares, com
medidas rigorosas, multas e demolições de imóveis insalubres. Em seguida Oswaldo
Cruz implantou a notificação compulsória dos casos de peste bubônica e combate aos
ratos. Conseguiu controlar essas epidemias, porém a sociedade não aceitava essas
imposições.

Em 1904 na grave epidemia de varíola Oswaldo Cruz conseguiu aprovar no Congresso a


obrigatoriedade da vacinação contra varíola. A forma autoritária como essa vacinação
foi imposta provocou uma ampla oposição da população que resultou na Revolta das
Vacinas. Outro grande avanço foi realizado por Carlos Chagas (1879-1934,Oliveira-MG)
em 1905, ele conseguiu controlar o surto de malaria no interior de São Paulo, e
descobriu o protozoário causador da doença que nominou Plamodium sp, em
homenagem a Oswaldo Cruz.

A Fundação Rockefeller (Norte Americana) com papel importante no avanço da


epidemiologia no mundo, e no Brasil, promevendo a formação do pensamento
sanitário, diminuindo a influência européia até então hegemônica. A Organização Pan-
Americana (OPAS) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) impulsionadas pelo
governo norte-americano empreenderam diversas ações no controle e erradicação de
várias doenças. No Brasil destaca-se a malária e a dengue, esta última com pleno êxito
porém não foi permanente.

As campanhas de erradicação da varíola na década de 1960 e da poliomielite na


década de 1970, aliadas a grave epidemia da doença meningocócica contribuiram para
consolidar o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica no Brasil (MEDRONHO,
2009).

A epidemiologia no Brasil é marcada pela preocupação com as desigualdades sociais


ajudando na luta pelo Sistema Único de Saúde, público e gratuito com foco na atenção
coletiva.

CURIOSIDADE 1 - Na mitologia da Grécia Antiga o deus da saúde, Asclépios (em grego)


ou Esculápio (em latim), possuia duas filhas, Higéia e Panacéia. Uma deusa da medicina
individula e outra da medicina coletiva, já mostram a disputa entre a medicina
individual e coletiva. Panacéia, filha mais velha, pradoeira da medicina individual
curativa, realizada por meio de intervenções sobre os indivíduos, manobras físicas,
preces e uso de fármacos. Higéia, era adorada por aqueles que acreditavam que a
saúde era resultado da harmonia entre os homens e os ambientes, dando início aos
conceitos de higiene e higiênico, sentido de promoção de saúde no âmbito coletivo.
(ALMEIDA FILHO E ROUQUAYOL, 2013)
CURIOSIDADE 2 - A Fundação Oswaldo Cruz é um importante espaço de ensino,
pesquisa e desenvolvimento da epidemiologia brasileira, vamos saber como foi sua
história e sua importância para epidemiologia brasileira, fundada em 1900, como
Instituto Soroterápico Federal. Em 1902 Oswaldo Cruz assume a direção geral do
Instituto Soroterápico Federal. Assim,com os trabalhos de Oswaldo Cruz, Manguinhos
tornou-se referência em saúde pública, traçou um grande plano de modernização e
saneamento aos portos brasileiros. Primeira vez que houve um levantamento sobre as
condições de saúde do Brasil. Em 1909 é implementado, no Instituto Oswaldo Cruz, um
sistema de disseminação de informação entre os cientistas que se baseava na leitura e
resumo, realizados semanalmente, de artigos de periódicos científicos nacionais e
internacionais recém-chegados à instituição. Esse sistema é denominado “Mesa das
quartas-feiras”. Em 1970 efetivamente é chamada de Fundação Instituto Oswaldo Cruz
- FIOCRUZ, cujo objetivo de realizar pesquisas científicas no campo da medicina
experimental, biologia e patologia, formar e aperfeiçoar pesquisadores, além de
elaborar e fabricar remédios e vacinas para atividades da própria Fundação e do
Ministério da Saúde.Agora, a Fiocruz tem 17 unidades técnico-científicas, sendo 11
localizadas no Rio de Janeiro, 5 localizadas em outros estados brasileiros e uma
unidade em Maputo capital de Moçambique. Todas as unidades técnico-científicas da
Fiocruz desenvolvem programas de pós-graduação stricto sensu, com cursos de
doutorado, mestrado acadêmico ou profissional. São 32 programas, inseridos em dez
áreas de avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(Capes) e ainda diversos cursos de pós-graduação lato sensu (especialização,
aperfeiçoamento, atualização e residência); e de educação profissional, por meio da
Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). A Fundação possui 19
diferentes cursos com foco a epidemiologia

Ciências estruturantes da epidemiologia

A Clínica, a Estatística e Medicina Social compõem os elementos conceituais,


metodológicos e ideológicos, da epidemiologia, a articulação desses elementos
resultou na evolução da ciência epidemiológica. A epidemiologia tem revelado uma
forte vocação de ciência aplicada, na solução de problemas de saúde.
Conceito de epidemiologia

Almeida Filho e Rouquayrol (2013) fazem a seguinte conceituação da epidemiologia -


ciência que estuda o processo saúde-enfermidade na sociedade, analisando a
distribuição populacional e fatores determinantes do risco de doenças, agravos e
eventos associados à saúde, propondo medidas específicas de prevenção, controle ou
erradicação de enfermidades, danos ou problemas de saúde e de proteção, promoção
ou recuperação da saúde individual e coletiva, produzindo informação e conhecimento
para apoiar a tomada de decisão no planejamento, administração e avaliação de
sistemas, programas, serviços e ações de saúde.

Podemos conceituar a epidemiologia de forma resumida como estudo da distribuição


e dos determinantes de estudos ou eventos relacionados à saúde em populações
específicas e a aplicação desses estudos no controle dos problemas de saúde. Partindo
de dois pressupostos:

1 – as doenças, condições de saúde e seus determinantes não se distribuem ao


acaso na população;

2 – o conhecimento desses fatores tem na aplicação prática no controle e na


prevenção das doenças e agravos à saúde.

Pesquisa
Considerando que a aula apresentou pesquise sobre a influência de Oswaldo
Cruz para epidemiologia brasileira consulte os links:

Parte 1 http://www.youtube.com/watch?v=HewYqBClEyA,

Parte 2 http://www.youtube.com/watch?v=NbyMLOAT0AI,

Parte 3 http://www.youtube.com/watch?v=vNvL0pnpLXk ,

Parte 4 http://www.youtube.com/watch?v=HQxUs0wiRis

Trocando Ideias
Utilize o fórum para discutir com seus colegas de curso sobre a influência da
epidemiologia na sua vida cotidiana, apontando a importância da epidemiologia do
ponto de vista individual e coletivo.

Síntese
Nessa aula, vimos as raízes históricas da epidemiologia desde a mitologia grega,
acompanhando a história da humanidade, na sua preocupação com a melhoria da
qualidade de vida das pessoas e da coletividade, na luta do homem contra as
enfermidades. A evolução da epidemiologia contou com a importante contribuição da
clínica, da estatística e da medicina social. Vimos o conceito de epidemiologia. A
epidemiologia tem muito mais para ser apresentado para vocês não deixe de
aproveitar todas as nossas oportunidades de aprendizado

Compartilhando
Vamos propagar os conhecimentos sobre a história da epidemiologia. Compartilhe
com seus colegas e familiares os conceitos e curiosidades vistos durante a aula. Não se
esqueça demonstrar seus novos conhecimentos sobre as raízes históricas da
epidemiologia para compreender sua aplicabilidade como profissional de saúde.

Para aprender um pouco mais com um bom livro:


“O Fisico” de Noah Gordon, da Editora Rocco. Narra a epopeia de um jovem na Idade
Média europeia e sua formação em medicina, baseado em fatos históricos reais este
romance detalha os processos e conhecimentos acumulados pela humanidade até
então vigentes em saúde, tanto no ocidente, como no oriente.

Autoavaliação
-Alguns dos grandes personagens na história da epidemiologiacontribuíram para a
evolução as epidemiologia indique quais foram as contribuições de Avicena, Galeno e
John Snow.
- Faça uma análise sobre a importância de Hipócrates para epidemiologia.
- Quais são os três elementos fundamentais que fizeram a epidemiologia se
desenvolver?
- Quais foram as primeiras preocupações da epidemiologia brasileira?
- Comente sobre a influência da epidemiologia para o desenvolvimento do Sistema
Único de Saúde
- A epidemiologia possui dois pressupostos para o estudo do processo saúde-
enfermidade na sociedade, quais são eles?
- Qual o conceito de epidemiologia?

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