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Vigilância em Saúde, ao longo da história

Prof. Fernando A Silva


Escola Municipal de Saúde Regional Sudeste
Vigilância = etimologicamente vem do latim vigilare que significa observar
atentamente, em sentinela, procurar, cuidar, precaver.

Na saúde a Vigilância está relacionada aos conceitos de saúde/doença de cada


época e lugar.

O Isolamento e a quarentena são os métodos de intervenções mais antigos no


campo da saúde.
Devemos lembrar que:

Em cada sociedade histórica, os determinantes da saúde são


identificados, valorizados e hierarquizados em:

 Determinantes Naturais

 Determinantes Individuais

 Determinantes Sociais
Pré-História – descoberta do Fogo

Eram nômades, caçadores, viviam em bandos e a sobrevivência estava associada à


disponibilidade de água e alimento.

As doenças e agravas que não podiam ser entendidos como resultado do cotidiano era
vistos como influência do sobrenatural, deuses, demônios e espíritos malignos.

Pensamento mágico-religioso – Esse é responsável pelo desenvolvimento inicial da


prática médica.
Período Neolítico

Pastor e/ou agricultores – Fixaram-se próximos a rios e vales férteis.


Originou os aldeamentos; houve a domesticação dos animais para o trabalho ou para a
alimentação – Isso ocasionou novas doenças . EX: variola e tuberculose do gado para o
homem; gripo do porco e aves e resfriado comum do cavalo.

Esses pequenos aglomerados de pessoas havia armazenamento de alimentos e acúmulo


de dejetos aproximando os vetores do ser humano.
Explicações racionais – Medicina Hipocráticas

A civilização Grega representa o rompimento com a superstição e com as práticas


mágicas e surge as explorações mais racionais.

Gregos:
Panteístas – Os médicos também eram filósofos – Além de cuidar da saúde
procuravam entender as relações do homem com a natureza.

Procuravam interpretar a saúde e a doença como resultados de processos naturais e


não sagrados
Época Romana:
Grandes avanços na Engenharia Sanitária e na administração.

Sexto Julio – Aqueduto da Cidade Romana – descreve os benefícios para a saúde


adquiridos com a implantação dos aquedutos.

Banhos romanos extensivos atos de higiene e saúde.


Sistema de esgoto – Cloaca Máxima.

Entretanto nas regiões mais pobres a degradação ambiental, o amontoado de cortiços e


os dejetos humanos nas ruas indicavam tempos sombrios.
Idade Média – Castigo e Redenção

Caí o Império Romano e ascende o Período Feudal


Significa – Declínio da cultura urbana; decadência da organização e das práticas de
saúde pública.

Ascensão e Fortalecimento da Igreja Católica.


Período de muitas Epidemias.

Catolicismo – Afirmava a existência de uma conexão entre doença e pecado.


Mundo – Lugar de expiação.
Doença = Pecado / expiação de um mal cometido / possessão demoníaca / castigo de
Deus.
Curas

Realizadas pelos religiosos ou invés dos filósofos-médicos.

Ao invés de chás, ervas, exercícios, repouso, banhos e etc eram prescritas rezas,
penitências, invocações aos Santos, exorcismos e unções.

Função: Purificar a Alma.

Para a Igreja os estudos da medicina eram uma blasfêmia que deveria ser julgada
pela inquisição.
Doenças

Período onde as doenças assolavam toda a população:


Ex: varíola, tuberculose, sarampo, difteria, influenza, escabiose, eripsela, lepra
e peste bulbônica.

Lepra = impureza diante de Deus – Quem a possuísse deveria ser retirado do


convívio social e enviado para os leprosários.

Peste bulbônica = deu origem ao nome do período, Idade das Trevas.

Ações de Saúde Pública: Suprimento de água para beber e cozinhar.


Visão do Período

Aglomeração de pessoas convivendo junto com os animais;


Deposição de dejetos humanos e de animais nas ruas;
Cheiro de matéria em putrefação misturado a urina e fezes;
Contaminação e poluição das fontes de água;
Ausência de esgoto;
Péssimas condições de higiene.
Final da Idade Média

Criação dos Códigos Sanitários:


Normatização da localização dos chiqueiros e matadouros;
Normatização para o despejo de restos e dejetos oriundos da população;
Normas para o recolhimento do lixo;
Pavimentação das ruas;
Canalização dos dejetos para poços cobertos.

Entretanto:
A população mantendo os mesmos hábitos tornou inócuas as medidas.
Hospitais na Idade Média

Serviam para abrigar os pobres e doentes que ficavam nas ordens monásticas e sob
sua direção.

Foi Instituído o período de quarentena com o objetivo de deter o avanço das doenças
– Experiência obtida com o isolamento dos leprosos.

Continuava em voga a Teoria Miasmática, apesar da nítida natureza comunicável das


doenças – Por imposição da Igreja.
Renascimento
Teoria dos Germes de Contagio
Girolano Fracastoro – 1530 com a obra De Contagione - Descreve sobre a hipótese de contágio
da sífilis.
Hipotetizava sobre agentes específicos para cada doença.

No campo da Saúde = grandes avanços em anatomia, fisiologia, descrição individual das doenças
baseada na observação clínica e epidemiológica.

1543 - Obra de Andreas Vesalio, Suíço – De Corporis Humani Fabrica -Contestando as idéias
de Galeno. Reforma está em curso.

Os crentes acreditavam que era sua função observar a obra da criação, incluindo a dissecção humana.
Enquanto; A Igreja Católica defendia a Teoria Humoral.
Rotas Comerciais

Descoberta do Novo Mundo – Isso levou a introdução de novos


agentes infecciosos nos Ameríndios.
Século XV e XVI

Revalorização do saber técnico;


Conhecimento da natureza;
Conhecimento da realidade através da observação dos fenômenos;
Valorização da pesquisa empírica.

Época da Publicação de inúmeros tratados – Favoreceu a aproximação do saber


científico e o técnico artesanal.
Cooperação entre cientistas e técnicos.
Ciência e indústria.
Formou a Base do Pensamento Científico.
Era da Bacteriologia e Discussão da Causalidade

Até século XIX, o controle das doenças era feito através do isolamento e quarentena.
Houve o desenvolvimento das investigações no campo das doenças infecciosas e na
área da microbiologia, cujo resultado foram novas medidas de controle. EX: vacinação.

Final do Séc XIX: Louis Pasteur, com o microscópio demonstra a existência de


microrganismos:
Século XX

Descoberta dos vetores, hospedeiros intermediários e o papel dos portadores sadios


para a transmissão das doenças e manutenção da cadeia epidemiológica.

Princípios da Imunidade Ativa e Passiva.

Criação de Laboratórios de Microbiologia e Imunologia.

Diminuição da mortalidade.

Melhoria nas condições de vida, saneamento e sanitárias.


Era Bacteriológica

Definitivamente mudou o modo de conceber

Saúde e Doença
No mundo apesar das transformação, por causa do Renascentismo, serem bem
evidentes na cultura, sociedade, economia, política, religião, artes, filosofia e nas
ciências, caracterizando a transição do feudalismo para o capitalismo e significando
uma ruptura com as estruturas medievais. No Brasil ainda vê-se um período medieval.

Chamou-se "Renascimento" em virtude da redescoberta e revalorização das


referências culturais da antigüidade clássica, que nortearam as mudanças deste
período em direção a um ideal humanista e naturalista.
No início, no Brasil colônia, não havia vigilância, "não havia nada“. A saúde
praticamente inexistiu nesses tempos.

O modelo exploratório nem pensava nessas coisas. O pajé, com suas ervas e
cantos, a medicina dos jesuítas e os boticários, que viajavam pelo Brasil Colônia,
eram as únicas formas de assistência à saúde. Para se ter uma ideia, em 1789,
havia no Rio de Janeiro apenas quatro médicos e ninguém falava em vigilância em
saúde.
A sociedade nesta época é caracterizada pelos Europeus, povo hegemônico,
escravizando os índios. O Brasil era um lugar a ser explorado e seus habitantes eram
os índios, nome dado pelos portugueses as várias etnias existentes aqui.

Com a colonização inciou-se a mistura de sangue:

Branco com o Índio = Caboclo

Mais tarde, século XVI, vieram os escravos, negros trazidos da África:

Branco com o Negro = Mulato

Negro com o Índio = Cafuzo


Em 1808, com a chegada da família real portuguesa, as necessidades da corte
forçaram a criação das duas primeiras escolas de medicina no país:
• O Colégio Médico Cirúrgico no Real Hospital Militar da Cidade de Salvador;
• A Escola de Cirúrgia do Rio de Janeiro.

Foram essas as únicas medidas governamentais até a República.

Como notamos o modelo é baseado no médico hospitalar, não há programas de


vigilância, não promoção e prevenção, muito menos medidas educativas.
No governo de Rodrigues Alves (1902-1906) houve a primeira medida sanitarista no
país.

O presidente nomeou Oswaldo Cruz para resolver o problemas das doenças (varíola,
malária, febre amarela) que assolavam o país. Devemos lembrar que no Rio não havia
nenhum tipo de saneamento básico.

Com ação de polícia, casas foram invadidas, roupas e colchões queimados.


Entretanto, sem nenhum tipo de ação educativa. A população foi ficando cada vez mais
indignada.

O auge do conflito foi a instituição da vacinação obrigatória anti-varíola. Iniciou a


Revolta da Vacina. Oswaldo Cruz acabou afastado.
Nos séculos XVIII e XIX, a vigilância tinha como função evitar a propagação de
doenças no meio urbano. A execução desta atividade, exclusiva do Estado, por meio
da polícia sanitária, tinha como finalidade observar o exercício de certas atividades
profissionais, coibir o charlatanismo, fiscalizar embarcações, cemitérios e áreas de
comércio de alimentos.

Com a evolução no entendimento sobre a origem das doenças, avançando do modelo


místico/religioso, a teoria miasmática e chegando ao modelo uni-causal, com o
advento da bacteriologia (meados do século XIX), novas medidas de controle das
doenças foram iniciadas.
A sociedade encontrava-se bastante mestiça entre os portugueses, índios e negros. E,
agora, o Brasil encontra-se com um grande número de imigrantes vindos de outros
países, italianos, espanhóis, alemães, japoneses, chineses, etc.

Essa imigração teve início em meados do ano de 1800, século XIX.


Na década de 50 o conceito de Vigilância em Saúde é mais uma vez modificada e de
uma simples observação sistemática de contatos de doentes passa para o
acompanhamento sistemático de eventos adversos à saúde na comunidade.
Alexandre Langmuir em 1963 assim conceituou Vigilância em Saúde = Observação
contínua da distribuição e tendências da incidência de doenças mediante a coleta
sistemática, consolidação e avaliação de informes de morbidade e mortalidade.
Assim como de outros dados relevantes, e a regular disseminação dessas
informações a todos os que necessitam conhece-la.
Em 1964, Karel Raska, propõe o qualificativo ‘epidemiológica’ ao conceito de
‘vigilância’.

Em 1965 –É criada a Unidade de Vigilância Epidemiológica da Divisão de Doenças


Transmissíveis da Organização Mundial da Saúde (OMS). O que consagra essa
designação.

Em 1968, a 21ª Assembléia Mundial da Saúde promove ampla discussão sobre a


aplicação da ‘vigilância’ no campo da saúde pública, que resulta em uma visão mais
abrangente desse instrumento, com recomendação de sua utilização não só em
doenças transmissíveis, mas também em outros eventos adversos à saúde (Waldman,
1998).
A ‘campanha de erradicação da varíola’, nas décadas de 1960 e 1970, propiciou a
disseminação da ‘vigilância’ como instrumento em todo o mundo foi. Neste período, no
Brasil, a organização do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (1975), se dá
através da instituição do Sistema de Notificação Compulsória de Doenças.

Em 1976, é criada a Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária.

No caso da vigilância ambiental, essa somente começou a ser pensada e discutida, a


partir da década de 1990, especialmente com o advento do Projeto de Estruturação
do Sistema Nacional de vigilância em saúde - VIGISUS (Brasil, 1998; EPSJV, 2002).
Na década de 1990 com a reorganização do sistema de ‘vigilância epidemiológica’,
possibilitou conceber uma proposta de ação baseada na ‘vigilância da saúde’, que
continha pelo menos três elementos que deveriam estar integrados:

1) a ‘vigilância’ de efeitos sobre a saúde, como agravos e doenças, tarefa


tradicionalmente realizada pela ‘vigilância epidemiológica’;

2) 2) a ‘vigilância’ de perigos, como agentes químicos, físicos e biológicos que


possam ocasionar doenças e agravos, tarefa tradicionalmente realizada pela
‘vigilância sanitária’;

3) 3) a ‘vigilância’ de exposições, através do monitoramento da exposição de


indivíduos ou grupos populacionais a um agente ambiental ou seus efeitos
clinicamente ainda não aparentes (subclínicos ou pré-clínicos), este último se
coloca como o principal desafio para a estruturação da ‘vigilância ambiental’
(Freitas & Freitas, 2005; EPSJV, 2002).
No Brasil, o processo de implantação dos distritos sanitários buscava redefinir as
práticas de saúde, tentando articular a epidemiologia, o planejamento e a
organização dos serviços (Teixeira, 2000).

A preocupação incidia sobre a possibilidade de reorganizar a prestação dos serviços,


buscando a integração das diferentes lógicas existentes: a atenção à demanda
espontânea, os programas especiais e a oferta organizada dos serviços, com base na
identificação das necessidades de saúde da população.
Três vertentes apontam diferentes concepções em torno da noção de vigilância em
saúde:

Primeira, que a entende como sinônimo de ‘análise de situações de saúde’, embora


amplie o objeto da ‘vigilância epidemiológica’, abarcando não só as doenças
transmissíveis, não incorpora as ações voltadas ao enfrentamento dos problemas.

Segunda, concebe a ‘vigilância em saúde como integração institucional entre a


‘vigilância epidemiológica’ e a ‘vigilância sanitária’, resultando em reformas
administrativas e, em alguns casos, no fortalecimento das ações de ‘vigilância
sanitária’ e na articulação com os centros de saúde.

Terceira, concebe a ‘vigilância em saúde ’ como uma proposta de redefinição das


práticas sanitárias, organizando processos de trabalho em saúde sob a forma de
operações para enfrentar problemas que requerem atenção e acompanhamento
contínuos.
O sistema de saúde brasileiro, após a constituição de 1988 (Constituição Cidadã), vem
buscando modelos de atenção que respondam de forma eficaz e efetiva às reais
necessidades da população brasileira, seja em sua totalidade, seja em suas
especificidades locais. Os modelos hegemônicos atuais – o médico-assistência e o
modelo sanitarista, não conseguem mais responder à complexidade e diversidade dos
problemas de saúde comum nesse início de século (Teixeira, Paim e Vilasboas, 1998).

A busca por modelos alternativos que, sem negar os anteriores, estimulem as ações de
promoção, proteção e recuperação da saúde a outras formas de cuidado voltadas para
qualidade de vida das coletividades, incorporando atores sociais, antes excluídos do
processo de produção da saúde, é estratégia para superar o ciclo biologicista,
hospitalocêntrico, antropocêntrico, medicalizante e iatrogênico em que se encontra o
sistema de saúde há quase um século.
A ‘vigilância em saúde ’, entendida como rearticulação de saberes e de práticas
sanitárias, indica um caminho promissor para a consolidação das premissas e princípios
do Sistema Único de Saúde (SUS).

Apoiada no conceito positivo do processo saúde-doença, ela desloca o olhar sobre o


modo de vida das pessoas (condições e estilos de vida).
A vigilância em saúde , vista como uma área de práticas, proposta de ação, articulação
de saberes e de práticas sanitárias deve apresentar as seguintes características:

• intervenção sobre problemas de saúde que requerem atenção e acompanhamento


contínuos;

• adoção do conceito de risco;

• articulação entre ações promocionais, preventivas, curativas e reabilitadoras;

• atuação intersetorial;

• ação sobre o território;

• intervenção sob a forma de operações (Paim & Almeida Filho, 2000).

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