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INTRODUÇÃO
Desde a origem dos tempos, quando o caos do mundo foi desfeito e surgiram as
forças cósmicas que conduziriam o Universo, já estava presente a simbologia da
cópula, do ato sexual como engendradores de novas forças e seres.
É o poeta Hesíodo do século VII a.C., o primeiro de que se tem notícia, quem
aborda a questão narrando a sua Teogonia e relacionando a copulação à origem do
Cosmos.
Depois, surge o homem criado por Deus pela modelação do barro. Aborrecido e
solitário, o homem não encontra companhia adequada entre os animais. Necessário foi
inventar também a mulher. Dois seres livres na Terra, no Cosmos. Viviam puros e nus
e sem ter acesso ao " fruto do conhecimento " e da noção do Bem e do Mal. E veio a
tentação. Eva não resistiu e provou da maçã.
"E foram abertos os olhos de ambos e souberam que estavam nus. Os humanos
saem, portanto, da inocência natural, para ter acesso à humanidade. De fato, na
tradição israelita, a nudez é indecente, sinal de entrada no mundo desregrado. A
conseqüência seguinte é o abandono do Paraíso e o castigo divino. O homem é
condenado ao duro trabalho dos campos e a mulher a parir na dor. É neste momento
que ela recebe o nome de Eva, ou seja, mãe dos viventes.[ Assim, o primeiro casal é
expulso pelo Criador do Éden]. Ele [ o casal ] provou da árvore do Discernimento-do-
Bem-e-do-Mal, que o torna semelhante ao Criador. Não se pode admitir que ele se
aproprie da Árvore da Vida que tornaria o humano igual a Deus".
( Catonné, p.48 )
Muito embora alguns insistam na ideia de que o pecado original tenha sido pela
Gula ( daí o costume do jejum e recolhimento aos mosteiros dos monges na Idade
Média que alegavam que a comida gerava um excesso de energia que seria
extravasada através da liberação do prazer pelo sexo ), prevalece o consenso sobre o
pecado pela Desobediência e o consequente acesso ao fruto do conhecimento do Bem
e do Mal, ( talvez da nudez e do sexo).
E como fruto do sexo surge a humanidade. No início dos tempos, o sexo foi
apenas a condição necessária à perpetuação da espécie humana, cumpriu uma função
biológica.
Com o decorrer dos tempos, passou o sexo a expressar as relações sociais e
simbólicas do homem referendando a divisão de trabalho e a delegação de papéis em
uma determinada sociedade. Tal evolução só pode ser mais bem compreendida com a
introdução do conceito de relações de gênero ”que permite uma passagem da análise
do sexo biológico/genético para as relações entre o masculino e o feminino como
construções sociais e históricas" ( BOCK 2001, p. 180 ).
Assim, o feminino e o masculino são construções sociais que variam conforme o
contexto histórico em que se inserem. Como construções, carregam em si muitas
contradições. Essas contradições podem ser observadas ao se analisar a própria
história do homem através dos tempos.
Junto com a história humana surge a construção da ideia do que seja
sexualidade em cada tempo e em cada sociedade. Essa ideia está sempre carregada
dos valores e significações próprios de cada contexto. Não se pode dizer que
evoluem ou que regridem, mas que acompanham a história dos homens. Muito
embora a sexualidade e tudo que a ela se relaciona seja uma opção individual, trata-se
de um conceito, de uma ideia construída coletivamente.
Vejamos como isso se dá.
Esse poeta grego nos narra como surgiram as forças cósmicas primordiais e as
relações sexuais que as animavam:
No princípio era o caos. Depois de uma estrondosa separação surgiram a Terra (
Gaia ) e o Amor, o mais belo dos deuses. Gaia era constantemente solicitada
sexualmente por Urano ( Céu ). Dessas cópulas diversas nasceram os filhos. Urano,
tomado de grande ira por aqueles frutos, escondeu os próprios filhos no seio da terra.
Gaia, visando punir o pai que privara os filhos da luz, confeccionou uma foice de metal
branco com a qual planejou decepar os testículos de Urano. E seria seu filho Cronos
quem se incumbiria da tarefa. O tempo ( Chronos, em grego ) é, desde então, o
princípio da separação entre Céu e Terra. Do membro mutilado de Urano jorrou uma
espuma branca que era ao mesmo tempo esperma e espuma do mar. Da castração
original surgiu o princípio da disjunção entre o feminino e o masculino. Nascera Afrodite
( Aphros =espuma ), a deusa do Amor que fora prontamente cercada pelo belo deus
Desejo. Assim, pelas palavras de Catonné ( 1994 ) "desde sua origem, essa cosmo-
teologia é sexualizada. Os seres divinos, nos quais os homens se projetam, são
precedidos de movimentos de aproximação e de separação. No curso desses
movimentos o deus Amor está onipresente". E essa idéia de união é, aqui,
essencialmente sexual.
De acordo com Catonné ( idem ), a onipresença do amor também pode ser
verificada em O Banquete, obra de Platão segundo a qual o amor permite ao ser
humano atingir o divino em si mesmo e imortalizar-se pelo pensamento. Mostra-se a
transposição do amor carnal para a soberania das ideias: primeiro amam-se belos
corpos com um amor sexual. A sensualidade é estendida a todos os belos corpos. Em
seguida, amam-se belas almas capazes de belas ações. E, por último e como
consequência das etapas anteriores, ama-se o conhecimento, a intelectualidade, ama-
se a ciência. O amor, como filosofia, ignora a atividade sexual. Platão sacrifica o amor
em nome da busca da verdade e, para isso é necessário sacrificar o sexo.
Essa inversão de valores no jogo do amor masculino do jovem grego quando da
passagem da erótica comum e carnal à erótica filosófica também é analisada por
Michael Foucault ( 1985 ): "os jovens amantes apaixonam-se pela verdade e
renunciam aos prazeres sexuais".
E o que tudo isso tem a ver com uma abordagem histórico-cultural da
sexualidade? Ora, pode-se perceber que as modalidades da sexualidade são relativas
ao tempo histórico e elaboradas a partir da ideia de cada contexto. Avancemos para
que possamos melhor compreender isso.
A ANTIGUIDADE CLÁSSICA
SEXUALIDADE NA GRÉCIA