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Ideologia de Gênero : mais um passo da Revolução Anticristã

Ideologia de gênero: mais um passo da revolução anticristã


“A Revolução é o triunfo do esforço de todas as potências tenebrosas que se sucederam no curso dos séculos (…), a
coroação do incansável combate que o Inferno não cessou de travar contra a ordem divina, geração pós geração (...) e
objetiva quase que exclusivamente a destruição do Cristianismo. Pois bem: o Cristianismo somente se encontra em
estado íntegro, vivo e expansivo na Igreja Católica” (Jean Ousset, “Para que Ele reine”)

1. Introdução
O tema desta conversa é a descrição de um novo intento e ataque à ordem natural, à civilização cristã
e à Igreja.
Por trás desse intento existe um poder oculto, inimigo de Deus, cuja cabeça só pode ser Satanás, que,
por meio de organismos internacionais, organizações não governamentais e meios de comunicação de
massa, vai impondo ideologias e modos de pensar e falar, em aberta oposição à Igreja Católica, à
ordem cristã e natural. Sua meta: a Nova Ordem Mundial, humanista, antropocêntrica, na qual Deus é
substituído pelo homem; um pretenso paraíso terrestre, em lugar da vida eterna.
Já faz mais de um século e meio que esse inimigo foi clara e publicamente denunciado pela
hierarquia eclesiástica: “A Igreja teve outros inimigos (…); venceu a todos. Hoje, tem de enfrentar a
Revolução”. E Monsenhor Gaume a definiu assim:
“Se, arrancando-lhe a máscara, perguntarem-lhe: ‘Quem és tu?’, ela responderá: ‘Não sou o que se
imagina. Muitos falam de mim, mas poucos me conhecem. Não sou nem a Carbonária…, nem o
motim…, nem a mudança da monarquia em república, nem a substituição de uma dinastia por outra,
nem os distúrbios momentâneos da ordem pública. Não sou nem as vociferações dos jacobinos, nem
os furores da Montanha, nem o combate de barricadas, nem o saque, nem o incêndio, nem a lei
agrária, nem a guilhotina, nem os afogamentos. Não sou nem Marat, nem Robespierre, nem Babeuf,
nem Mazzini, nem Kossuth1. Estes homens são meus filhos, não são eu mesma. Estes homens e estas
coisas são fatos passageiros; já eu sou um estado permanente. Sou o ódio de toda ordem não
estabelecida pelo homem e na qual ele não seja rei e Deus a um só tempo. Sou a proclamação dos
direitos do homem sem a preocupação com os direitos de Deus. Sou a fundação do estado religioso e
social sobre a vontade do homem em vez da vontade de Deus. Sou Deus destronado e o homem posto
em seu lugar (o homem chegando a ser, ele mesmo, a sua finalidade). Eis aqui por que me chamo
Revolução, quer dizer, inversão’.”
Nesse plano orgulhoso, blasfemo e diabólico, uma nova inversão vai se impondo com força
avassaladora: a ideologia do gênero, aberrante atentado contra a ordem natural. É o que iremos expor
com brevidade, propondo ao final algumas idéias para combatê-la.
2. Que se entende por ideologia do gênero? Sua definição, suas origens.
« Et creavit Deus… masculum et feminam creavit eos » “Varão e fêmea os criou” (Gn 1, 27)
Pouco a pouco, e cada vez com mais freqüência, encontra-se nos documentos e protocolos elaborados
por organismos internacionais, em tratados firmados pelos países, em leis anti-discriminatórias, e
mesmo em formulários corriqueiros, como pedidos de empréstimo, reservas de passagem etc., o
termo “gênero” para se referir aparentemente ao sexo.
Será isto algo corriqueiro, uma normal evolução da linguagem, uma moda que expressa com outra
palavra o mesmo de sempre; ou, ao contrário, trata-se de transmitir e impor uma nova ideologia com
um objetivo determinado?
A ideologia – fruto de um hábito vicioso do espírito – foi definida como “um sistema fechado de
idéias que se constitui, para o homem que se identifica com ele, em fonte de toda a verdade, de toda a
retidão prática e moral”. Não vigora somente no plano especulativo, mas funde as funções teórica e
prática do intelecto numa só, transformando-as numa tarefa criadora, taumatúrgica, que tem de se
realizar sobre o homem, para transformá-lo radicalmente, e sobre a sociedade, vista como a única
dimensão real do novo homem, devendo por isso ser modificada absolutamente, para que seja fiel
expressão e, ao mesmo tempo, o cadinho da transformação do indivíduo.
Em resumo, não é uma teoria comprovada pela lógica ou experimentalmente, mas sim um corpo
fechado de idéias, que parte de um pressuposto básico falso – que por sua vez deve impor-se pela
recusa de toda análise racional – e que logo se desdobra nas conseqüências lógicas desse principio
falso. As ideologias se impõem pelo uso dos sistemas formal (escola e universidade) e informal
(meios de propaganda) de ensino.
No âmbito que nos interessa, [a ideologia] aplica-se a transformar radicalmente as noções de sexo
masculino e feminino, unificando-as na de “gênero”, termo que também deixa de ter seu sentido
biológico clássico aplicado à espécie humana como conjunto de pessoas que “possuem uma ou várias
características comuns dadas pela mesma natureza”, e o substitui pela idéia, não de algo dado pela
natureza (os sexos masculino e feminino), mas sim de uma realidade que é escolhida, que o indivíduo
mesmo constrói a partir do ambiente cultural.
Para entender melhor o sentido dessa verdadeira revolução, não apenas semântica, mas cultural,
citemos um texto utilizado nas universidades norte-americanas sobre o que se pretende introduzir: “O
gênero é uma construção cultural. Por conseguinte, não é o resultado causal do sexo, nem algo tão
aparentemente fixo como o sexo. Ao se teorizar que o gênero é uma construção radicalmente
independente do sexo, o gênero mesmo vem a ser um conceito livre de correntes. Em conseqüência,
homem e masculino poderiam significar tanto um corpo feminino como um masculino; mulher e
feminino, tanto um corpo masculino como um feminino” 2.
Parte-se da falsa premissa de afirmar que as coisas não dependem do que “são”, mas do que alguém
desejaria que elas “fossem”, ou do que alguém decide, e da seguinte suposição (de algo que, para essa
ideologia, é um abuso): que foi para manter a hegemonia do domínio masculino que o homem
constituiu a superestrutura do que denominam “sociedade patriarcal”, na qual a exclusividade da
relação entre homem e mulher é uma construção social e cultural que se pode e deve modificar para
evitar a “violência do gênero”, e obter a libertação e igualdade de direitos da mulher.
Impera um fundo revolucionário de negação dessa realidade que chamamos de “natureza humana” –
sobre isso falaremos mais adiante –, impondo algo a mais que a igualdade entre homem e mulher,
tema tratado habilmente na I Conferência Mundial da Mulher, que aconteceu no México em 1975.
Um dos documentos resultantes dessa I CMM, a chamada “Declaração do México”, tenta definir o
que significa a igualdade entre homens e mulheres. Diz assim: “A igualdade entre homens e mulheres
significa igualdade quanto à sua dignidade e valor como seres humanos, assim como igualdade em
seus direitos, oportunidades e responsabilidades”. Porém, mais adiante, no Plano de Ação da I CMM,
amplia-se a definição de igualdade: “A igualdade entre o homem e a mulher implica que deveria
existir igualdade de direitos, oportunidades e responsabilidades (…). Quanto a isso, é necessária uma
revalorização das funções e dos papéis dados tradicionalmente a cada sexo na família e na sociedade.
A necessidade de uma mudança no papel tradicional dos homens assim como das mulheres deve ser
reconhecida (…)”. E estende-se a explicação quando se descreve como se deve alcançar essa
igualdade tão desejada. A igualdade de direitos, oportunidades e responsabilidades será obtida
mediante a “redistribuição de funções e papéis tradicionais adjudicados a cada sexo”, quer dizer,
através da desconstrução e reconstrução do que são o homem e a mulher. Como vemos, querem
eliminar qualquer resquício de natureza e de tradição.
Mas foi na IV Conferência Mundial da ONU sobre a mulher, celebrada em Pequim, em 1995, que
começou a difusão em escala mundial dessa nova ideologia, persuadindo vários delegados de
diversos países de que se tratava de uma luta em favor dos direitos da mulher.
As ativistas tiveram a habilidade de distribuir alguns textos com definições ambíguas sobre a
sexualidade polimorfa, evitando utilizar palavras como marido, mulher, esposa, mãe, pai etc., e
ressaltando em tons vitimistas a perseguição que, segundo elas, sofrem por parte dos setores
tradicionais.
A diretora da conferência, ao ser perguntada sobre o tema, assim o definiu: “o gênero se refere às
relações entre homens e mulheres baseadas em papéis socialmente definidos que se atribuem a um
ou a outro sexo”, o que por sua generalidade e ambigüidade provocou o pedido de esclarecimentos e
definições. Estas chegaram rapidamente com a intervenção de Bella Abzug, representante e ex-
congressista americana, explicando mais detalhadamente a noção de gênero: “o sentido do termo
gênero evoluiu, diferenciando-se da palavra sexo, para expressar que a realidade da situação e dos
papéis da mulher e do homem são construções sociais sujeitas a mudanças”.
A canadense Rebecca J. Cook, redatora do informe oficial da ONU na reunião, não fez cerimônia e
disse explicitamente o que se buscava: “os sexos já não são dois, mas cinco, e portanto não devemos
falar de homem e mulher, mas de mulheres heterossexuais, mulheres homossexuais, homens
heterossexuais, homens homossexuais e bissexuais”.
Outra das feministas [presentes] não hesitou em dizer que “não existe homem natural ou mulher
natural, não existe um grupo de características ou condutas exclusivas a um só sexo, nem sequer na
vida psíquica”. Chegou-se a afirmar também que era preciso reconhecer os direitos reprodutivos das
mulheres lésbicas, no que se incluiria o “direito” a conceber filhos por meio da inseminação artificial
com sêmen anônimo, e de adotar legalmente os filhos de suas companheiras.
Para essa corrente revolucionária, o sexo aparece como algo secundário frente ao gênero. O sexo é o
aspecto biológico do ser humano; o “gênero”, porém, resulta da própria construção cultural da
sexualidade a partir de uma decisão ou escolha autônoma de cada pessoa.
Em suma, cada um não apenas escolhe ser homem ou mulher, mas também o conteúdo do que para
cada um significa ser homem ou mulher.
Divinização da pessoa, negação e destruição da natureza.
Isso fica evidente a partir do que disse uma das defensoras dessa nova ideologia, Marta Lamas: “a
riqueza da investigação, reflexão e debate acerca do gênero conduz inevitavelmente a suprimir a
essência da ideia de mulher e homem”. E, mais adiante, “não existe homem (natural) ou mulher
(natural)…”. E, mais radicalmente, afirma que “o movimento gay surge como uma instância
libertadora, já que afirma, com razão, que a sociedade está errada a respeito da homossexualidade e
da heterossexualidade: nem a primeira é antinatural, nem a segunda é natural”.
Assim negada a natureza, [essa ideologia] trata de apagar os aspectos biológicos do sexo humano.
Supõe, para isto, serem possíveis, ao menos em teoria, múltiplas combinações entre cinco áreas
fisiológicas do ser humano: genes, hormônios, gônadas, órgãos reprodutores internos e externos,
combinações diversas que configurariam “inter-sexos” que se somariam ao masculino e ao feminino.
Como esta tese é indemonstrável biologicamente, outros autores, escamoteando as diferenças
corporais, trataram de fundar suas teses em aspectos psicológicos, muito menos rigorosos do ponto de
vista científico.
Para isso, afirma-se que investigações em diversas populações do mundo mostraram que a
masculinidade psicológica de uma pessoa (homem ou mulher [sic]), prediz de maneira muito
significativa não apenas aproveitamento matemático, mas ainda a habilidade matemática e ansiedade
pelas matemáticas. Prediz também rendimento em tarefas espaciais. Mesmo assim, dependendo de se
a masculinidade é alta, também será a motivação de sucesso e expectativa de êxito.
Nessa suposta comprovação, pode-se observar, como diz um autor: 1) que se escamoteiam os
condicionamentos biológicos; 2) não haveria natureza humana, uma vez que os atributos masculinos
poderiam ser construídos psicologicamente por qualquer um, seja homem ou mulher; 3) nega-se a
complementaridade dos sexos, não apenas para procriar, mas em todos aspectos da vida; 4) atribui-se
arbitrariamente a determinadas características o serem elas masculinas ou femininas, em virtude de
algumas estatísticas (como se os comportamentos humanos fossem quantificáveis).
Uma vez negada a natureza humana, será preciso afirmar a autonomia absoluta de cada pessoa para
“construir” seu próprio gênero; cada cultura conceberia o que é masculino ou feminino por um
processo, uma aprendizagem. Por isso, Simone de Beauvoir afirmava que “não se nasce mulher, mas
se chega a sê-lo”, e que “identidade de gênero refere-se ao sentimento de pertencer ao gênero
feminino ou masculino. É a inscrição psíquica do gênero. Posso ou não coincidir com o meu sexo
biológico”. Mais ainda, para essas ideólogas, o gênero não apenas determina os sexos, mas também a
percepção de todo o resto, o social, o político, o religioso, o quotidiano.
Se [tudo isto] se escolhe, então pode ser mudado; está aí um elemento para renovar a história cultural,
pela “desconstrução (eliminação) de certas práticas, discursos, e representações sociais que
discriminam, oprimem e agridem as pessoas em função do gênero”. Importa chegar ao objetivo final,
que é reformular, simbólica e politicamente, uma nova definição do que é ser pessoa – um ser
humano e um sujeito –, seja em corpo de mulher ou de homem.
A base profunda dessa ideologia é o ateísmo teórico e prático: uma cultura sem Deus, na qual o
homem, sem nenhuma limitação que lhe imponha princípios ou alguma ordem determinada, torna-se
dono absoluto de seu destino. É o homem que brinca de ser Deus, a heresia liberal, eco daquele
primeiro grito luciferino ―“não servirei” ―, e que soprou no ouvido do primeiro casal ― “sereis
como deuses”. O fundo filosófico que os sustenta é o relativismo, o liberalismo malthusiano, o
marxismo freudiano e o existencialismo de Sartre, que podemos resumir no personalismo.
Os meios de que se vale já adiantamos: organismos internacionais, meios de comunicação de massa,
leis3, currículos educacionais obrigatórios com conteúdos “transversais”, isto é, que introduzem a
“perspectiva de gênero” em todas as áreas educativas, isto desde a infância4, acompanhados de uma
mudança de linguagem5 pela qual os termos usados já não expressam as essências das coisas, mas
respondem a significados diversos e carregam uma ressonância espiritual que funciona como um
reagente sobre o espírito e faz com que as pessoas não se entendam ainda que utilizando as mesmas
palavras. Léxico fechado, inteligível só para os iniciados. É a moderna Torre de Babel 6.
3. Crítica e modo de enfrentar esta revolução:
Nossa refutação será a partir da Revelação, da teologia moral e da sã filosofia.
Do primeiro ponto de vista, é necessário saber o que a Sagrada Escritura diz.
Deus fez chover sobre Sodoma e Gomorra fogo e enxofre, destruiu-as completamente por estas ações
nefandas de seus habitantes7. Mais tarde, Deus volta a abominar tais atitudes e/ou ações:
“Não vos mancheis com nenhuma dessas coisas, com que se têm contaminado todas as gentes que eu
expulsarei da vossa vista. Mancharam esta terra, castigarei seus crimes e a terra vomitará seus
habitantes. Guardai as minhas leis e os meus mandamentos, e não cometais nenhuma destas
abominações, tanto os naturais como os estrangeiros entre vós. Todas estas execrações cometeram os
que foram antes de vós habitantes desta terra, e assim a contaminaram. Vede, pois, não suceda que,
assim como ela vomitou a gente que aqui estava antes de vós, vos vomite também a vós, se fizerdes
outro tanto. Todo aquele que cometer alguma destas abominações, será eliminado do meio do seu
povo. (...) Se um homem pecar com um homem, como se ele fosse uma mulher, ambos cometeram
uma coisa execranda; morram sem remissão: o seu sangue caia sobre eles.”8
São Paulo recorda essas coisas acontecidas na raiz da idolatria:
“Pelo que Deus os abandonou aos desejos do seu coração, à imundície; de modo que desonraram os
seus corpos em si mesmos, eles que trocaram a verdade de Deus pela mentira e que adoraram e
serviram a criatura de preferência ao Criador, que é bendito por todos os séculos. Amém. Por isso
Deus entregou-os a paixões de ignomínia. Efetivamente, as suas próprias mulheres mudaram o uso
natural em outro uso, que é contra a natureza, e, do mesmo modo, também os homens, deixando o
uso natural da mulher, arderam nos seus desejos mutuamente, cometendo homens com homens a
torpeza e recebendo em si mesmos a paga que era devida ao seu desregramento. E, como não
procuraram conhecer a Deus, Deus abandonou-os a um sentimento depravado, para que fizessem o
que não convém, cheios de toda a iniqüidade, de malícia, de fornicação... Os quais, tendo conhecido a
justiça de Deus, não compreenderam que os que fazem tais coisas são dignos de morte eterna; e não
somente quem as faz, mas também quem aprova aqueles que as fazem.”9
E insiste:
“Não sabeis que os injustos não possuirão o reino de Deus? Não vos enganeis, nem os fornicadores,
nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os
avarentos, nem os que se dão à embriaguez, nem os maldizentes, nem os roubadores possuirão o
reino de Deus.”10
Para todos eles, ratifica o livro do Apocalipse que “a sua parte será no tanque ardente de fogo e de
enxofre; o que é a segunda morte”11 .
Recordemos agora, seguindo Santo Tomás, o que nos ensina a Teologia moral sobre os pecados
contra a natureza:
“(…) Assim como a ordem da razão reta provém do homem, assim a ordem da natureza procede de
Deus mesmo. Portanto, os pecados contra a natureza, que lhe violam a ordem, fazem injúria ao
próprio Deus ordenador da natureza. Por isso, Agostinho diz: Os delitos contrários à natureza em
toda parte e sempre devem ser detestados e punidos, como o foram os dos Sodomitas; e, se todas as
gentes os praticassem, incorreriam ainda assim no mesmo crime, por força da lei divina, que não fez
os homens para que entre si se entregassem a tais atos. O que também viola a familiaridade que
devemos ter com Deus, pois, a mesma natureza, de que ele é o autor, fica poluída pela perversidade
da lascívia.”12
E ainda: “Os vícios contra a natureza são (...) tanto mais graves que a corrupção do sacrilégio, quanto
a ordem imposta à natureza é anterior e mais estável que qualquer outra ordem superveniente.”13
Vale a pena recordar seus argumentos:
“Em qualquer ordem de coisas, a corrupção do princípio é péssima, porque dele depende tudo o mais.
Ora, os princípios da razão fundam–se na natureza, pois a razão, pressuposto o que foi determinado
pela natureza, dispõe convenientemente a sua atividade. O que se dá tanto na ordem especulativa
como na prática. E portanto, assim como na ordem especulativa é gravíssimo e o mais funesto o erro
em matéria cujo conhecimento é naturalmente infuso no homem, assim, na ordem prática, agir contra
o determinado pela natureza é gravíssimo e desonestíssimo. Ora, como pelos vícios contra a natureza
o homem transgride o determinado por ela quanto à prática dos atos venéreos, daí vem que, nessa
matéria, o referido pecado é o gravíssimo.”14.
Como se pode ver, o núcleo central deste erro monstruoso é sua recusa da ordem divina revelada e
impressa também na própria natureza. Esforçam-se assim em rechaçar a própria natureza humana,
substituindo-a pela pura subjetividade, um feroz individualismo, liberalismo, que na ordem filosófica
se apresenta como uma conseqüência do mais bruto personalismo.

a) a heresia personalista
[Nota da Permanência: as linhas seguintes, em que Pe. Olmedo refuta a heresia personalista,
parecerão áridas aos pouco familiarizados com o linguajar e termos filosóficos. É possível, no
entanto, pular para a seção final do artigo sem prejuízo da compreensão]
Para todas essas teorias, a sociedade, a autoridade e suas leis, a ordem natural são modos de submeter
e eliminar a liberdade, que aparece como o primeiro dos bens humanos.
Por isso têm o prurido especial de insistir na liberdade da pessoa, reduzindo ao mínimo as conexões
de ordem natural e as obrigações ou sujeições que se seguem das diversas leis: eterna, natural,
humana justa. Em toda lei, o personalista vê uma afronta à dignidade de sua pessoa humana.
Reduzindo a um mínimo as conexões com a norma moral, e desconfiando desse mínimo que resta, o
personalista altera o sujeito da moralidade, que já não é mais o ato humano definido pelo seu objeto,
mas a própria pessoa. O acento é colocado no individual, na individualidade do sujeito contra a
universalidade da natureza.
Às tendências e exigências da natureza, a ética personalista responde que a pessoa transcende a
natureza. É a resposta à mão para responder às vozes da própria natureza. O personalismo destaca a
pessoa como uma segunda natureza; põe o destaque na pessoa sem se perguntar pelo constitutivo
íntimo da própria personalidade; a pessoa é considerada como algo singular e fechado, concebida
como algo superior a ela [natureza].
Em todos esses “ideólogos”, a recusa da Natureza e de sua ordem procede de um mesmo erro
fundamental. Compartilham a falsa crença de que falar de “essência”, de “natureza”, de “ordem”,
implica cair em uma postura rígida, imóvel, totalmente estática, o que é absurdo, pois não há conexão
alguma entre ambas as afirmações. Daí o seu “construcionismo” e escolha do que se deseja ser,
daquilo que o homem sente a respeito de si mesmo.
A filosofia cristã opõe a esses erros uma concepção muito diferente, que se conforma à nossa
experiência. Para além de toda mudança, há realidades permanentes: a essência ou natureza de cada
coisa ou ser: “de si – diz Santo Tomás –, a intenção da natureza visa sempre e principalmente ao que
é perpétuo”15. A evidência da mudança não apenas não suprime essa natureza, mas também
necessariamente a pressupõe. A experiência cotidiana nos mostra que as pereiras dão sempre peras e
não maçãs nem nozes, e que o olmeiro nunca produz pera. A “estabilidade” de sua natureza faz com
que as vacas tenham bezerros e não girafas, e que os bezerros tenham sempre uma cabeça, uma cauda
e quatro patas. E quando, em alguma ocasião, aparece algum com cinco patas ou com duas cabeças, o
bom senso espontaneamente compreende que é algo defeituoso, antinatural. Reações de senso
comum que só fazem comprovar que existe não apenas natureza, mas ordem natural. A evidência
dessa ordem universal é o que nos permite distinguir o normal do patológico, o são do enfermo, o
louco do sensato, o motor que funciona bem do que funciona mal, o bom pai do mau pai, a lei justa
da lei iníqua.
O simples contato com as coisas nos mostra que o natural existe na intimidade de cada ser, e que essa
natureza é a explicação das operações e atos de cada ser: o porquê de a formiga ser o que é, e
construir formigueiros e fazer tudo quanto faz; por que o joão-de-barro é como é, pode construir seu
ninho tal como faz, por que o homem é como é naturalmente, pode pensar, sentir, amar e trabalhar
“humanamente”…
A própria ciência confirma não apenas que cada ser tem uma essência ou natureza, mas também que
essa natureza não é fruto de um cego acaso, mas de uma ordem, de um princípio de finalização ou de
finalidade, e de uma hierarquia, uma harmonia que se manifesta em todos os seres e em todos os
fenômenos, e que a submissão a essa ordem é o que o aperfeiçoa. Quando a gata tem gatinhos, tudo
vai bem, mas se dela nascessem passarinhos, diríamos que existe uma desordem, que algo
monstruoso e antinatural está acontecendo.
O homem não é simplesmente bom pelo mero fato de ser pessoa, mas pela conformidade de seu agir
com o fim. A dignidade moral vem à pessoa humana da conformidade de sua operação com o fim
último. Somente assim torna-se bom e digno moralmente.
No desprezo da natureza, vai implícito o desprezo de toda ordem heterônoma ao próprio homem. A
pessoa fica solitária e isolada em sua racionalidade. Mais ainda, há uma verdadeira amputação
metafísica, por assim dizer, na própria ordem da natureza específica do homem. Desprezada a
natureza humana específica, estabelece-se uma dissociação mais radical de ordem metafísica, que
dissolve todo saber e todos os afazeres em uma problemática do concreto e singular. E do concreto
não se tira senão problemas e generalizações de dados empíricos. Por isso, dizemos uma
problemática de fatos concretos: chegamos ao historicismo, ao materialismo e à anarquia.
Ao dizer que a pessoa transcende a natureza, parte-se de premissa falsa. A pessoa transcende a
natureza animal; não transcende a natureza específica e própria do homem. Não há, portanto, um
desdobramento que oponha realmente pessoa e natureza. A pessoa é tal pela racionalidade, a pessoa é
a substância individual racional; a racionalidade é, por sua vez, a diferença específica, ou a forma
constitutiva do homem enquanto tal. A espécie humana está em cada um dos indivíduos,
constituindo-os em seres racionais. Cada homem é racional, não pelo que tem de singular, mas pelo
que tem de específico. O específico se concretiza no indivíduo pela matéria assinalada pela
quantidade. Aquilo que o especifica é sua racionalidade, e o racional é constitutivo da personalidade.
A pessoa é inteligente, livre etc., não pelo que o homem tem de individual e concreto, mas pelo que
possui de racional, de sua natureza específica.
Cada pessoa humana possui a mesma natureza de Adão, e são incalculáveis as conseqüências que se
tiram dessa unidade de natureza comum a todos os homens; como são também incalculáveis as
conseqüências, na ordem do saber e na ordem prática, de um desconhecimento da própria natureza.
Não existe mera unidade de natureza, mas uma unidade da natureza humana de categoria racional, ou
seja, pessoal. Os homens nos comunicamos entre nós não por algo baixo e desprezível, mas pela
própria natureza específica. Cada homem é pessoa porque é um indivíduo que possui aquela natureza
formalmente humana, que é a racional. A racionalidade, que é o específico e constitutivo, constitui o
supósito como racional, isto é, como pessoa16.
A racionalidade, enquanto imaterial e espiritual, é principio do conhecimento e liberdade do supósito.
Enquanto princípio cognoscitivo, dá-lhe o conhecimento de si mesmo, o sentido de sua autonomia e
independência. Mas a racionalidade, enquanto constitutivo da espécie, une os indivíduos da mesma
espécie em nível altíssimo. Os homens somos livres, mas estamos ligados por uma natureza comum,
que nos une na mesma espécie, exige de nós um esforço comunitário, e nos pede responsabilidades
comuns em ordem ao nosso fim.
Em cada homem não existem apenas valores individuais; existe uma zona profunda e comum a todos,
de valores específicos, que arrasta consigo o individual e concreto; exigências que arrastam o homem
individual e o levam ao bem moral, que é o bem da espécie.
Se uma pessoa, rebelando-se contra a natureza, ordena ao concreto individual os valores humanos
que devem se ordenar à espécie, e se não obedece aos fins próprios de sua natureza racional, que a
ordenam ulteriormente a Deus, cai na culpabilidade moral e comete um pecado de soberba, que é o
apetite desordenado da própria excelência.
O supósito individual quer [então] suportar sozinho a totalidade dos valores e perfeições da espécie.
Nega a comunicação natural, e dependências naturais que o correspondem com outros sujeitos,
dentro da mesma espécie. Nega a comunicação devida com outras pessoas no nível da racionalidade.
As relações de um sujeito com outro, no personalismo, são opcionais, não exigidas pela natureza.
As liberdades modernas ― liberdade religiosa, liberdade de pensamento etc. ― são a soberba revolta
da pessoa individual que não se resigna a interpretar as tendências e exigências íntimas de sua própria
natureza, como o exige a espécie e sua perfeição. É um desejo de recriar a Humanidade sem Deus,
sem uma natureza criada à imagem de Deus, sem uma finalidade posta por Deus, sem uma
convivência criada também por Deus, e um propósito de refazer em cada homem o programa do
demônio: sereis como deuses.
Quando o homem age, não o faz independente da natureza. Quem age é a pessoa: ser racional; porém
age por sua própria natureza, que é precisamente isto: uma natureza racional e livre. O homem é
simplesmente um indivíduo da natureza humana; ao agir, deve agir segundo as exigências de sua
natureza racional. Assim fará o bem moral. De outro modo, destrói-se a si mesmo, e destrói aos seus
irmãos.
A partir dessa falsa filosofia, o homem pretende realizar uma nova “criação” de si mesmo, da
sociedade e do mundo, em que tudo muda, tudo flui, tendo como fonte originária seus próprios
caprichos e paixões e não, por certo, a reta razão.

b) Modo de neutralizar esta ideologia


Não por meio da objeção de consciência, que se fundamenta precisamente na liberdade de
pensamento e no subjetivismo personalista que acabamos de rechaçar…
Na ordem intelectual, voltar à sã filosofia de sempre, isto é, a de Santo Tomás, e à teologia de
sempre, também a de Santo Tomás, é igualmente primordial; recuperando para o pensamento os
princípios perenes do bem pensar e do bem agir, levando em conta a ação humana em si, suas
circunstâncias e seu fim.
Na conversação ou expressão, recuperar, conservar e divulgar os termos ou palavras da linguagem
escrita e oral em seu significado de sempre, denunciando e rechaçando significados diferentes e
contrários.
No âmbito da educação, recuperar o sentido da virilidade e da feminilidade em que devem ser
formados os homens e as mulheres, sem confusão nem união de sexos.
Fomentar uma maior vida familiar, em que seus integrantes pratiquem toda classe de virtudes,
ajudem-se nas necessidades comuns, desenvolvam-se nas respectivas personalidades, abracem os
sãos princípios morais, espirituais e cívicos que os façam ser homens e mulheres de bem, bons
cidadãos e melhores católicos, animando-se uns aos outros na busca do fim comum transcendente.
Na ordem social, formar grupos, comitês que defendam a sã educação e se oponham por todos os
meios a seu alcance a essas políticas de gênero, fazendo apresentações, manifestações etc., pedindo a
revogação das normas ditadas pelas autoridades contra a ordem natural…
No dia-a-dia, em todas as esferas em que o católico intervenha, deve dar testemunho de sua Fé; é
convidado a atuar, na ordem econômica, política, cultural, não por princípios meramente humanos,
mas inspirando a sua ação na Fé e na Caridade; não para o fim exclusivamente temporal da cidade
pluralista, mas para aperfeiçoá-la quanto ao natural e ao sobrenatural. Toda a vida social deve
inspirar-se em normas verdadeiras e princípios cristãos, amparada no verdadeiro reinado social de
Cristo.

Pe. Ricardo Olmedo - FSSPX

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