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Após terem Sf crms~derado fntre eles um certo tempo,

os tres m;euos dão pmtns alguns passos


que os Levam conpmtamente a transpor a porta' .
Jacques Lacan

1. O adolescente
e o laço social

ara introduzir a questão da delinqüência, direi que esta pato logia bas-
P tante específica da adolescência é tanto patologia da sociedade em seu
conj unto quanto de um ou outro sujeito particular.
O que é um delinqüente? É alguém que delinqüe , que faz falta ao
que "linqüe", mas também àquilo que o "linqüe". A etimologia da palavra
é interessante: de-Linquere. Linquere é deixar algo , ou alguém , no seu lugar
e o de marca a separaçã o, o destacamento.
O delinqüe nte é - contra a natureza própria das coisas, de retornar
ao seu lugar (Aristóteles) - aquele que desaloja : que desaloj a as coisas, que
se desaloja de seu lugar, do lugar que lhe é atribuído pela sociedade.
É o que basta para arruinar as esperanças dos educadores humanistas
de "curar" a delinqüência, encontrando um lugar, um bom lugar, um outro
lugar que não a prisão, para o jovem que delinqüe. É suficiente também se
interrogar sobre a proximidade de um delinqüente, um que não está em
seu lugar, com um imi grante, um que está fora de seu meio. Aliás, o delin-
qüente-modelo é aquele que rouba meios de transporte, carros, velomotores,
para depositá-los, abandoná-los num lugar que não é o seu; na sabedoria
2
popular é um «meteco"*, um que está à parte da casa, um desalojado .

• l: ~c~n.' tcríts, op. cit., p. 198 .


\a _Crccia antiga, estrangeiro domiciliado em Arenas. Em francês o termo é usado pejo-
~tivarncnrc para designar um estrangeiro domiciliado na França. (NT)
ern eto ªº artigo de C. Melman, "Dic Spaltung", Le Discours psychanafytique, 1981 , I,
Pp. 13-15.

55
Jrt1n -) 11rq11es Ramal

O adolescente entre duas leis


. , R m a antiga ond e as diversas idades da vid a eram
Co ntrariam ente a o ' .
. .d . t direito atual fin ge ig norar tud o que se refere a um
trata d as I un 1ca m en e, O . , .
es tatuto do adol esce nte, di stinguindo apenas , em pnnc1p10 , minoridad e e
ma10n· ·d a d e 1ega1·s. O direito funciona n a lógica do sim _ ou n ão , e saben---
"1os
que, ao tentar classifica r cad a caso partí cul a: e_m fun:C~º desta ló~ica biná-
ria , os juristas são obri gados a exced er o co d1go , a Interpreta r sob um
inodo qu ase delirante cad a caso , para forçar sua entrada nesta lógica, no
fina l das co ntas paranóica : é o que se chama de jurisprudê ncia .
A especificid ade do adol csce n te é não ser "nem uma coisa nem ou-
tra", nem co mpl eta m ente crian ça , nem co mpl e tam ente adulto , exatamen-
te como o imigrante , sobretudo aquel e d a seg unda geração -', que não é nem
completam ente francês nem completam ente es tra n geiro . Esta lógica biná-
ria se aplica à diferença sexual; não é surpreend ente qu e o "nem uma coisa
n em outra" seja fác il e freqüentem ente atribuído à p e rversão .
Na verdade, no próprio código , abundan1 as exceções a essa distinção
si mples entre menores e maiores\ exceções que, como todo fracasso , mes-
mo reintegrad o na lógica do sim ou n ão , como lapsos , evocam um a verda-
de outra. Destas exceções, inúmeras , citarei apenas algumas .
Por um lado , resto da curatela , alguns menores são "protegido s" além
dos dezoito anos facídicos e, se observamo s atentamen te , a tota lidade dos
direitos não é adquirida nesta idade : assim , a elegibilida de p ara ce rtos car-
gos n:ío é contempor ânea do direito de voto (talvez seja O traço de uma
tradição romana que distinguia o jovem do homem maduro) . Por exem-
plo , não se pode ser candidato a uma eleição para senador antes da idade de
trin ta e ci nco anos.
Por outro lado , as idades de treze, quinze e dezesseis anos m arcam
algu m acesso à res ponsabilid ade jurídica: aos treze anos , o adolescent e ror-

3 . , E,d ' d 1982 PP· 87-


R. Gori e.: J.-J. Rassia l, "Jc c.:s t un Autrc " L c Droit et !es Jmrmgres,
97 . Assim com _ ·, " ' · 1su , ,
, ,r; o J. J. Rass1<1 l, Rem arqu e sur lc verlan des beurs" La Psvchanafyse de
[ en;ant, 1989 , n º 6. ' ' ._,
1
Agradeço a Gui lh c.: lm Dc.:zc.:uzc por su . •. _,. . ue o
cont exto · urídi co f'· -: . . - . · ~ ~SS I~tc ncia nas questões jurídicas. M esmo ~ de
1 I ancc.:s sep aqui pnvdc r , d d çao
algum as va ri antes c.:lc é c . . . gtLl o , cvc-se observar qu e, com exce ' I
., oc rcnrc co m as outras jurisdições d o mundo dito oci denta .

56
O adoftretntl' , o p1u11nnlwa

na-se plenamente respo nsáve l, mes mo que até os d


, ezesse1·s anos, 6ener1c1
e. ·
e-
c;c
. quase auro m,1t1cam cnte da escusa de minorid adc - · -
e nao In corra senao na
metade das penas presc ritas pelo código· a cman cipaça- , , 1
, e'. 0 e poss1 ve aos
dezesseis anos ; a idade núb il da moça é fixad a aos quinze anos, que é tam -
bém a idade em que, ao mesmo tempo, a adoção plena torna-se impossível
e a adoção simples req uer o acordo do adotado .
De um po nto de vista jurídico , a adolescência é o período da ambi-
guidade en tre minoridade e maioridade , irrespon sabilidade e responsabili -
dade, pe rvertendo , pela fo rça das coisas e dos princípios, o texto de uma lei
que não fu nciona senão por limites .
A organ ização da psiquiatria na França desconhece esta especificidade
da ado lescência e raros são os locais que , aquém de um a especialização liga-
da a uma patologia então privilegiada (delinqü ência , toxicomania, etc), de-
finem-se com o abertos à população desta idade.
A instaura ção de setores, como o ensino, efetua-se em função de um
corte entre crianças e adultos . As consultas de adolescentes ocorrem , em
geral, no con texto da pedopsiquiatria ; o que se explica, entre outras razões,
e não por acaso, por problemas de financiamento , pois a assistência social
cobre o reembolso dos tratamentos em nome dos pais. Mas o remetimento
dos adolescentes para o lado das crianças é justificado também pela escola-
ridade, termo que, por exemplo , define a clientela dos CMPP (Centros
Médico-Psico-Pedagógicos) , que chegam às vezes a receber estudantes am-
plamente maiores .
É por isso que, sob o pretexto de que o adolescente estaria ainda,
oficialmente, no inacabam ento, os problemas que ele coloca são ou consi-
derados como purame nte patológicos (o que acontece , mas nem sempre é
o caso) ou "explica dos", em função da ideologia genético -psicológica, por
um pretenso estádio que a "maturidade" permitiria ultrapassar, como se
nada tivesse acontecido.
O fato de alguns psiq uiatras se distanciarem desta posição não resol-
ve a dificuld ade, pois comparar o adolesce nte ao adul to é muitas vezes ne-
gar o caráter transitório dos sintomas mais fre qüentes no adolescente, con-
siderando-os co mo si nal de uma es trutura , quando eles não fazem , às vezes,
sen ão experim entação da sintom arologia possível para o adulto, ou, pelo
menos, para aquele que não é mais criança.

57
_j
}Nm -Jr1rq,m R11ssi11I

,., à siquiacria infantil não avalia o sujeit


Fnquanto uma re d uçao P . . . o a.
J e ma redu ção à ps1qu1atna adulta só ava.t ·
não ser em relação ao seu ruturo, u . 1 Ia.
" A . dois casos, é evitado o a cance do apelo d
em relação ao seu ser. ss1m, nos . , - . e
· O uvi-lo pois o que esta entao em Jogo é
un1 adolescente a quem aceite ' . o
irredutível da relação entre ser e vir a ser. Véron1que, ~e quem se tratará
. . d •· · t com perspicácia, como a dificuldade de "mu-
ma1s adiante, cs1gnava is 0 ,
dar permanecendo a mesma". . . .
O dup lo aspecto da adolescência, de ser?º mesm o tempo l1rnne e
· a organi·zação do que se pode chamar de crise .formal da
, d o, d etermma
peno
ado lescência: um limi te entre dois estatutos , um rege nd º ª criança que
brinca e aprende, outro o adulto que trabalha e participa da r~produção da
espécie; um período de indecisão subj etiva e de incert~za soc~al, _d urante 0
qual a fam ília e as instituições exigem, segundo as c1rcunstanc1as, que 0
sujeito se reconheça como criança ou como adulto .

Da mesada*

Este entre-dois é freqüentemente evocado pelo adolescente a propó-


sito de sua relação com o dinheiro .
Enquanto a criança está submetida ao regime do «cofrinho" , isto é,
uma economia que tem por origem o presente, e o adulto conta com "ren-
dimentos" , o que supõe lhe caber por seu trabalho na circulação financeira ,
a reivindicação típica do adolescente é por uma «mesada" . Excedente quase
vestimentário, considerado como um direito , a mesada tem por sentido a
perda do presente, o "esbanjamento" , sem outra troca senão a possibilidade
de gozos muito parciais, de que a figura do <'flipper" é a mais evocadora e
que tem por sentido, entre outros, marcar, sinalizar uma saída da família,
em direção a lugares coletivos: cinemas, cafés, locais de passagem, etc.
A origem deste dinheiro, assim como valor do que ele permite,
O

conta menos do que a revelação, recalcada pela economia política e pelo


adulto, de que O dinheiro, longe de garantir a liberdade do sujeito, garante

* Em francês, f 'argent de poche, dinheiro destinado a despesas miúdas, pessoais. (NT)

58
-- - - .
-
O adolescente e o psicanaÍJSta

um cert o func iona men to social. Sabe -se com o, entr


e eles, os adolesce ntes
pode m pref erir as regras da troca.
Se o dinh eiro é simb ólic o, não é pela poss ibilidade
para O sujeito de
ter acesso ao seu desejo, mas sim do lado de D eus5
. De Deu s , pois se trata ,
então, de se conf ront ar ao desejo de um Out ro ,
que se torn ou anôn imo e
som ente iden tific ável pelo que se supõ e vir ou resu
ltar dele: um sinal ou
um obje to. Assi m, por um lado o dinh eiro não cont
a por seu uso possível ,
mas som ente pela alter nânc ia entr e a acum ulaç
ão mes quin ha e o gast o ,
enqu anto conc ebid o com o um esba njam ento agre
ssivo. Por outr o lado , a
mer cado ria deixa apar ecer sua inde pend ência quan
to ao valor de uso, em
benefício do gadget, perf eito quan do dese ncadeia
o riso devi do a sua inut i-
lidade.
Assim, a reiv indi caçã o de dinh eiro do adolescente
não é a de uma
"me lhor situa ção" que o dinh eiro perm itiria , mas
ime diat ame nte uma de-
man da ao Out ro: dem and a de que seu lugar de
suje ito lhe seja dado e
reco nhec ido. O essencial não é, desde entã o , a imp
ortâ ncia da som a que
seus pais lhe outo rgam , mas o estilo mes mo desta
outo rgação, no que ela se
disti ngui ria do dom .
Des conf iand o das lógicas da circulação finance ira,
recu sand o ao mes-
mo tem po a do pres ente , dirig ido à criança, e a do
inte rcâm bio, que fun-
cion a entr e adul tos, o adol esce nte consegue com pree
nder que, se o dinh ei-
ro circula, é para que o suje ito perm aneç a.
Vemos aqui com o, tent ando subv erte r as relações
sociais de prod u-
ção e de distr ibui ção, aqueles que "peg am a estra da"
ou "vivem à margem"
denu ncia m para dox alm ente o jogo da circulaçã
o. Ten tam circular "real-
mente" no luga r simb ólic o do dinh eiro .
Que r seja uma reiv indi caçã o da mes ada no tem po
mes mo em que o
dinh eiro é denu ncia do com o uma enga naçã o, quer
seja pelo roub o de ob-
jetos quan do o que cont a não é o obje to roub ado
mas o ato de roubar, quer
seja ainda pela fuga, a adol escê ncia é o mom ento de
uma tent ação nôm ade ,
que resp ond e ao anon ima to da circulação financei
ra.

5
Apesar de sua veia anti-sem ita, o rexto de Marx o pinra com
justiça (K. Marx , La QueSfion
Juive, múltiplas edições).

59
. . . () oh/'do
. tio rouho
fug,1s r ,,,r1gem.
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1
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:1 formuh de D W. Winnicotr, .~cn11r-sc real \ Jlém do CSt· aruto


segu ndo , · · .
soci:11 (0 endcrcc;o dos pais) . Busca de um local onde poderiam im aginari-
amente se r vividas , ao mesmo rcmpo, urn:i existência soci;i l e uma avc:n rura
so lid ria; um local onde se rcconcili:uiam o Imaginário do corpo , 0 Real da
puberdade e o Simbólico d:1 lei.
Entre 3 criança e o :idulro, o êxodo adolescente critica a paródia eco-
nômica através de uma viagem iniciática, cujos riscos são dois: a errância
esquizofrênica e os refügios perversos. O senso comum reconh ece que a
adolescência implica esta dimensão, nesta fórmula recuperadora: "as via-
gens formam a juventude". Exceto que, para o adolescente - e isto pode
assumir um tom dramático - , não se trata de fazer turismo , de dar uma
volta antes de retornar ao ponto de partida , mas sim de partir sem prever
retorno , de partir para a conquista de um outro lugar, às vezes sob um
modo muito particular : por exemplo, na viagem do toxicômano , trip. Sabe-
se como podem estar associados a droga e o exotismo, indiano ou sul-
americano , por exemplo .
Esta questão da circubç5o possível do sujeito me parece esclarecer
uma das questões da delinqüência.
5
Com efeito, têm -se o hábito de orientar toda explicação de ra
sinto matologia para o lado de uma deficiência da função paterna, 0 que
não é falso (retornarei a este ponto), mas insuficiente. Se observarm os ª
articulação, no discurso do delinqüente, entre o sujeito, o objeto e o di-

r, D. W. Wínnicott, ''L'adolesccncc"(l %2), in De la f>éclíatrie à la psychanaryse, op. ci r..


pp. 257-266.

60

() ,11/11/,.rrrnte t' o /Jíl l'llfl rtl11tr1

nhciro, pndcnws j,i id cnrit't c:1r :1lgurnas car:1c tcrísti c:1s es pecíficas da dclin
-
qücnci.l juven il: insisrirrnws ncsrc que ''dclinqü c", na mu(b n ça de lu gar,
113 prod uç~o de um outro cs p:1ço que n:io o csp:1ço co tidiano onde o
sujeito
,1dolesccnrc 1130 tem luga r sim boi izado.

Articulaç5o, portanto, cnt.rc:


Primeira mente, o sujeito ass uj citado a uma ord em social que o situa
ego icamente, enqu:1nto criança num a cerra rigidez, enqua nto adu lto numa
outra rigide z. N ão dando nen hum es tat uto ao adolescente, poder-se-ia
di-
ze r que esta ordem socia l deixa o suj eito cuj o cu se fragili za à deriva de
um
desejo sem referência, confrontado a imperativos sociai s, até mes mo a
uma
injunção superegóica, de um supcreu que perd eu sua face co nsoladora
(tal
qual a evoca Freud), para co nse rvar so ment e sua face repressiva.
Em segun d o luga r, o obj eto furtado. Com efe ito , longe de satisfaze r
plenamente, se revela sempre decepcionante e só tem por efeito reedit
ar o
desejo de roubar novos objetos. Ele tem o valor de qualquer objeto parcia
l,
que não preenche a pulsão mas a reedit a.
Em terceiro lugar, o dinheiro, em sua equivocidade: ao mesmo tem-
po significante-mestre da circulação dos objetos-mercadorias e do sujeit
o
enqua nto fixado, identificado, autôn omo, pela ((disponibilidade" que
teria,
e ele mesmo objeto a acumular, perder, ganhar.
Antes mesmo de falar de uma outra lei, a lei do bando delin qüen te
por exe mplo , vê-se bem que, no ato de roubar, a ênfase deve ser dada
à
relação do sujeito com a ordem simbólica, tal qual ele mesmo está aí toma
-
do , muito mais do que sobre uma qualidade específica do objeto. E no
fato
de que estes objetos permitem, primeiramente, um deslocamento do
sujei-
to, de modo direto - o roubo de um meio de transporte -, ou indireto
- o
aro sendo legitimado pelo desejo de obter os meios de "cair fora", de
partir
de onde se está determinado. Isto vale tanto para a delinqüência "abon
ada"
quant o para a dos gra ndes conjuntos habitacionais.
O ato delinqüente é, antes de tudo, uma tentativa, dentre outras, de
inventar um outro es paço, outras regras de deslocamento do sujeito
e dos
objetos. Não jogar o jogo para criar um fora-de-lugar.

61
o hnndo delinqüen te
t jusrn mcnrc a parur. daí que se pode pensar
. ,.,
o fenôm eno do band
l (),
. dd . rransm1 ssao ora prese rvavam , nos .
f nqu:rnro as soc1cdad cs fun a as na d d l ,., . ri -
, . · 1 deste não-lugar a a o escenc1a, pond0
tos inici~ ncos, o es paço potencia · ,, d " . ,,
. de "morte e e renasc imento as le·
cm ce na o que ::tÍ entra cm Jogo . . . . . _ ' l <;
. ó d definir limites e reJe ttar a d1mensao mesma
cscnr:1s , por sua vez, s po em ,., .
e d I d lugar outro · com exceçao do seguinte registro·
de um ro ra- e- u~a r, e um , «. . . ,., . . ,, .
t
definir um denrro quase carcerá rio , o das tn S ttutçoes espe~ia~izadas , cujo
modelo normal seria o exé rcito , num a sociedade º nd e O ultimo resto do
ano de iniciação é o se rvi ço militar. .
De sua ausência de posição na organização soe1al , o adolescente,
mesmo que seja somente por um tempo , pode chegar ª denunciar uma
ausê ncia de fundamentos das regras da vida social; donde uma confronta-
ção com a lei que pode vir acompanhada de um desmoronamento da signi-
ficação - fragilidade simbólica, a um passo da loucura - , ou então cair
numa dialética messiânica de renovação - reedição histérica da questão do
mestre e da mestria.
Entende-se assim que a anarquia, em suas duas vertentes , possa sedu-
zir os adolescentes: por um lado, construção imaginária de um lugar "pré-
histórico" ou "pós-histórico'', utopia de uma sociedade sem outra lei que
não a «natural" , naturalmente boa, cuja fórmula contemporânea seria o
discurso dito ecológico; do outro , a violência real contra os representantes
atuais da lei , até o extremo do terrorismo às vezes .
Mas esta via, de sublimação, que em suma só leva a um novo confor-
mismo , não é a única. De certo modo, ao contrário da utopia, o bando
~o.nsri rui , na a;ualidade , um v~rdadeiro grupo social de tipo tribal , como já
f01 observado . O bando delinqüente é movido , animado mesmo , pela
q uest~o.das rc!ações entre sujei to , significante e objeto:
• o. SUJCtto , pois
. . _ ,
a entrada• no band 0 , ao ·tmp 11car
· em processos exp l'1cnos
· de
e ponto de referência, aquém ou além da identidade civil, de
1n1c1açao,
uma outra dimensão do sujeito.

--·----- --

H. Bl och e A Niederhoffer, Lcs Bandes d' d L .


a o escents, Payot, 1974.

J
>
() adnlrrrmtr e n prrr11.nalma

, sign ifi cante , porqu e é cm torno de um ce rto n úmer o de pa lavras


0 , até
mesm o de um jargão , suste ntado pelo chefe , que o grupo existe e
se orga-
ni za (da rei um exem plo disto mais adian te) .
• 0 objet o , já que a espec ificid ade do band o delin qüen te é inven tar um

outro modo de apro priaç ão e de ci rculaç ão dos bens , onde o objet


o ad-
quire uma outra função , em pa rticul ar a de se r um signo em seu
valor de
interc âmbio , se m consi deraç ão por sua imag em : é o que demo nstra
m as
trocas que , na maio ria das vezes , são o modo de econo mia intern
a no
bando .
O delin qüe nte, quer esteja ou não integ rado a um band o , e o
pró-
prio band o delin qüen te são figuras inven tivas, ativas , cuja dinâm
ica é a de
uma muda nça de luga r, pois o adole scent e - del inqüe nte ou
não - está
semp re num a tal muda nça estru tural que as instân cias sociai s não
si mbol i -
zam , o u sim boliz am mal.
Com o assina la Winn icott 8 , o ato delin qüen te deve ser conce
bido
co mo sinto ma, em sua positi vidad e: é ainda um apelo , até mesm
o uma
interp elação à socie dade. Vamo s mais longe . Talvez o perfil psico
lógic o do
delinq üente juvenil, longe de precisar um tipo clínico partic ular, a
psico patia
por exem plo , não seja radic almen te difere nte daque le de qualq uer
adole s-
cente , exce to por acent uá-lo , estan do mais susce ptível aos impas ses
do laço
social.
Do ponto de vista do psica nalist a que atend e joven s delin qüen tes
- o
que me acont ece u apenas algum as vezes e na maio ria delas por
um viés
instit ucion al - , a tarefa não poder ia ser, porta nto , «cura r" a delin
qüên cia ,
mas perm itir ao suj eito explo rar outras vias meno s perig osas .
Do lado das interv ençõe s sociais, o risco é duplo , e nós o conh
ece-
mos: ou bem, indo no sentid o de uma repre ssão social, confi rmar
para o
adolescente sua queix a de ser vítim a de um mund o injus to; ou
bem, em
nome da comp reens ão educa tiva, negar esta m anife staçã o intem
pesti va do
sujeito desej ante, em benef ício de uma cump licida de egóica. Evita
r estas
duas arma dilha s não é fácil.

x º: W. Winnicott, "Quelques aspects psychologiques de la délinquance juvéni


le", in
LEnfa nt etle Monde extérieur, Payot, 1957, pp. 165 - 173.

~
EEiil. · - 63

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