Você está na página 1de 66

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 2

3 A LEITURA E SUA FUNÇÃO ...................................................................... 6

4.1 Considerações iniciais: objetivos e fatores que influenciam o


desenvolvimento da leitura ...................................................................................... 8

5.1 A leitura e fases do aprendizado do aluno ......................................... 15

5.2 Estratégias da leitura na escola ......................................................... 17

5.3 Estratégias para leitura proveitosa na escola ..................................... 20

6 CRIANÇA E O DESENVOLVIMENTO DA ESCRITA ............................... 27

6.1 O papel da escola e do professor no processo do ensino e da


aprendizagem da escrita pela criança ................................................................... 33

6.2 O papel do sujeito no processo de aquisição da escrita .................... 35

6.3 A relação entre a linguagem oral e a aquisição da escrita ................. 37

6.4 A segmentação da escrita .................................................................. 38

7 O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO ...................................................... 40

8 O CENÁRIO ATUAL DA ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL ......................... 42

9 CONCEITOS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO ............................ 46

10 O MÉTODO PAULO FREIRE DE ALFABETIZAÇÃO ............................ 49

11 PIAGET E VYGOTSKY: DIVERGÊNCIAS E APROXIMAÇÕES PARA A


COMPREENSÃO DA AQUISIÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM ....... 50

12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................... 60

1
1 INTRODUÇÃO

Prezado aluno!
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante
ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável -
um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma
pergunta , para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum
é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão
a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as
perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão
respondidas em tempo hábil.
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da
nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à
execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da
semana e a hora que lhe convier para isso.
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser
seguida e prazos definidos para as atividades.

Bons estudos!

2
2 BREVE PERCEPÇÃO HISTÓRICA DA LEITURA

Fonte: historiadomundo.com.br

A prática da leitura advém dos primórdios da civilização, quando o homem


busca por compreender os sinais por meio de uma leitura interpretativa em face das
anotações de seus antepassados. O aprimorar deu-se com o surgimento da escrita
formal, em que a sociedade passa a buscar por normatizar as informações a serem
disseminadas. Por consequência das distâncias que os homens passaram a produ-
zir no tempo, surgem às cartas e outros mecanismos escritos para se comunicarem.
A observação de Bajard (1994, p. 16), de que “[...] a invenção da escrita ocor-
reu não para duplicar o oral, mas pra completá-lo”, nos ajuda a compreender que a
leitura tem, de fato, a função de informar, de apresentar um tema, um assunto que
complete o leitor. Numa perspectiva de assimilação da amplitude de mundo, num
todo. Com a leitura, ao longo dos tempos, tem sido transmitido, de geração a gera-
ção, a imagem em codificação escrita do mundo, dos sentimentos humanos.
A evolução humana passa, necessariamente pelo crivo da leitura, seja ela da
escrita tal qual conhecemos hoje, ou das imagens gravadas pelos nossos ances-
trais. Neste sentido, estudiosos apresentam pesquisas que revelam necessidade de
compreensão dos símbolos e a mitigação de técnicas de ensino e aprendizagem.

Segundo relatos históricos e arqueológicos, foi na Babilônia onde tudo co-


meçou. Hoje, dessa cidade só restam ruínas na região Mesopotâmica do
Egito. Seu povo foi o precursor de muitos avanços da civilização como, por

3
exemplo, agricultura, arquitetura, comércio, astronomia, direito, escrita.
Nesse local, surgiram as primeiras inscrições do que viria a consumar o
nascimento de uma prática revolucionária - a leitura. (KILIAN, 2012, apud
COELHO, 2016, p. 2).

No contexto, se percebe o nascimento do ler pela necessidade evolutiva do


próprio homem, uma vez que os símbolos precisavam ser decodificados e compre-
endidos. Considerando que a história mostra a leitura de figuras em paredes de ca-
verna e em outros artefatos pré-históricos, o que consideramos o momento do sim-
bolismo. A leitura, então, se torna uma necessidade para a sobrevivência, do ser
humano. O que foi ao longo dos anos se aperfeiçoando e ficando cada vez mais ne-
cessário.
Segundo DeNipoti (1996, p. 82) “Foi em virtude do cristianismo que, durante a
Idade Média, as técnicas pedagógicas de ensino da leitura se multiplicaram. A histó-
ria da leitura nesse período é possibilitada pelo que remanesceu dessas técnicas”.
Técnicas estas que o homem foi aprimorando ao longo de sua história. No contexto,
é importante considerar que a leitura é uma arte que vai passando de geração a ge-
ração. Num contexto, que vai além do saber físico, parte para conhecer o mundo e
compreender a vida pelos olhos de quem escreveu.
Nestas circunstâncias, vale ressaltar que a necessidade do ser humano em
alcançar novos horizontes, o levou a encurtar espaços, isto não ficou só nas nave-
gações e viagens físicas, o abstrato também levou a encurtar distâncias. A leitura
serve de fonte de informação e aquisição da mesma. O processo de leitura configura
o sentimento de liberdade de vir e ir, de escolhas.

Neste sentido, Fonseca (2013, p. 92) destaca que “[...] a história da leitura
tem sido um dos mais instigantes objetos de estudo das últimas décadas
por dar voz a personagens até então silenciadas nas análises que focavam
o texto e não os usos e interpretações dos textos”. (FONSECA, 2013, apud
COELHO, 2016, p. 2).

Ao escrever o autor coloca sentimentos em palavras e leva o leitor a acompa-


nhar suas ideias pela imaginação.

Os antigos leitores, muitas vezes obscurecidos nas pesquisas seriais e


quantitativas, ao ganharem destaque nos estudos históricos mostraram que
havia uma grande distância entre o prescrito e o vivido, entre o leitor ideali-
zado e o leitor real, entre a interpretação considerada correta pelo autor
e/ou editor e a compreensão adquirida no ato da leitura. (FONSECA, 2013,
apud COELHO, 2016, p. 2).

4
Entretanto, mesmo não sendo aqui o objeto de estudo interpretar o que era
real ou fantasioso, ou mesmo, “sem sentido”. Consideramos que as fases da história
da leitura estão motivadas ao hábito de ler, de viajar com o autor de um livro, de
uma revista, compreender as informações de um jornal, de rótulos de remédios e
etc. O fato é que a escrita e sua interpretação tem força de grande magnitude, le-
vando as mais variadas interpretações, a qual pode não ser a intenção do autor. Se-
gundo Pinheiro e Alves (2012, p. 2449), a leitura, “apresenta uma natureza política e
ideológica, sendo capaz, em alguns casos, de moldar o indivíduo a agir de acordo
com determinado modo de ver o mundo”. Isto pode ser observado, por exemplo, nos
manifestos publicados nas décadas revolucionárias de 1950 a 1970, tanto quanto,
em panfletos religiosos disponíveis no século XXI e as propagandas eleitoreiras em
ano de votações.
Neste contexto, é de se considerar Alves (2012, p. 2449), que de uma forma
específica explica que “[...] a leitura é uma arma que pode ser utilizada para domi-
nar, com o pretexto de que se está possibilitando acesso à informação, muitas ve-
zes, para justificar e/ou disfarçar ideias autoritárias”.

[...] a leitura não constitui tão-somente uma idéia, com a força de um ideal.
Ela contém também uma configuração mais concreta, assumindo contornos
de imagem, formada por modos de representação característicos, expres-
sões próprias e atitudes peculiares. A ela pertencem gestos, como o de se-
gurar o livro, sentar e escrever, inclinar-se, colocar os olhos. Faz parte
igualmente dessa representação a alusão a resultados práticos, mensurá-
veis em comportamentos progressistas. (ZILBERMAN, 199, apud COELHO,
2016, p. 4).

O percurso da leitura leva há um enorme aparato teórico. Cabe aqui destacar


Kilian e Cardoso (2012, p. 2), pois enfatizam que “Inicialmente, cumpria seu papel
por meio da oralidade; após, houve a invenção da leitura silenciosa na Grécia Anti-
ga; e, hoje, articula-se com os mais variados processos de circulação, especialmen-
te, com a mídia eletrônica”. No Brasil, a leitura surgiu com os portugueses. Segundo
Chartier (1999) e Schwarcz (2010), a primeira biblioteca instituída no Brasil foi aos
primórdios do século XIX, através da família real. Hoje a Biblioteca Nacional tem o
maior acervo de livros de todo território brasileiro.

5
3 A LEITURA E SUA FUNÇÃO

Fonte: parentalidadedigital.com

A leitura serve ao propósito de levar o indivíduo a descobrir novos mundos, a


interpretar a escrita de forma sistematizada e conclusa. A leitura é essencial para a
inserção do ser humano na sociedade, o incentivo a leitura começa muito cedo na
infância, onde a criança começa a descobrir o mundo da imaginação e descobertas.
O indivíduo que não busca por compreender a escrita, se fecha e se torna prisionei-
ro em si. Entretanto, a leitura é libertadora, a partir do momento que a mesma passa
a ser realizada de maneira reflexiva.
Bamberger (2002, p. 32) explica que “A leitura impulsiona o uso e o treino de
aptidões intelectuais e espirituais, como fantasia, o pensamento, à vontade, a simpa-
tia, a capacidade de identificar etc.”. Difere, naturalmente, a situação de interpreta-
ção temporária, ou seja, de identificação das letras sem assimilação. Vale destacar
que o indivíduo tem habilidade de abrir janelas imaginarias, para um contato com o
mundo. Sua função formal é de levar, ou receber informações, porém, vai além da
imposição científica.
É preciso entender que a função da leitura está no ser humano como o mes-
mo esta para a leitura, ou seja, existe todo um processo de leitura da vida no mundo
e do mundo na vida. Segundo Foucambert (1994, p. 30).

Ser leitor é querer saber o que se passa na cabeça de outro, para compre-
ender melhor o que se passa na nossa. Essa atitude, no entanto, implica a
6
possibilidade de distanciar-se do fato, para ter dele uma visão de cima, evi-
denciando um aumento do poder sobre o mundo e sobre si por meio desse
esforço teórico. Ao mesmo tempo, implica o sentimento de pertencer a uma
comunidade de preocupações que, mais que um destinatário, nos faz tex-
tos, seja um manual de instruções, seja um romance, um texto teórico ou
um poema. (FOUCAMBERT,1994, apud COELHO, 2016, p. 4).

Por se tratar aqui de uma discussão teórica da importância da leitura na Edu-


cação Infantil, podemo-nos afastar da questão da relação com a formalidade dos
textos literários. Mas, precisamente nesse sentido é importante à maneira pela qual
todo o ânimo humano recebe o impacto de uma determinada relação com a desco-
berta de novos horizontes para com a própria natureza aventureira do Homem. Con-
tudo, necessário de complemento para que a indicação da importância da desvincu-
lação da leitura formal para a informalidade está na leitura pelo prazer em detrimento
da leitura compulsória, ou obrigatória.
Não restam dúvidas quantos ao caráter e função da leitura formal. A reflexão
sobre o ensino e estimulo da leitura no ambiente escolar é de extrema importância.
O mundo contemporâneo com a escrita espalhada em todos os espaços é exemplo
da importância do conhecimento. Silva (2003) destaca que a leitura faz parte de um
processo continuo que muda a vida do indivíduo, é um caminho onde o arrastara a
libertação e a obter um escudo contra o processo de alienação.
O horizonte e perspectivas existem em conjunto e de certa forma não sofrem
segregação. O hábito de leitura estimula a capacidade criadora, multiplica o vocabu-
lário, simplifica a compreensão do que se lê, facilita à escrita, melhora a comunica-
ção, amplia o conhecimento, acrescenta o senso crítico e ajuda na vida profissional.
O contato com a leitura deve começar desde a tenra idade quando as crianças estão
mais flexíveis com a curiosidade aguçada. Assim como diz Mello (2010) a criança
desde o berçário pode ter uma relação com o objeto chamado livro, que são cheios
de significado.

7
4 PRINCIPAIS ASPECTOS DO DESENVOLVIMENTO DA LEITURA

Fonte: quindim.com.br

No século passado, muitos educadores consideraram que o ensino formal da


leitura tinha início na primeira série do Ensino Fundamental, fase esta em que a
Educação Infantil já preparou o aluno para a futura escolaridade. Hoje, porém, o en-
foque denominado leitura emergente, valoriza as atividades típicas da noção de pre-
paração como, por exemplo, o desenvolvimento das funções básicas. Tal enfoque
supõe que a aprendizagem da leitura não tem uma sequência definitiva, assim como
não possui um ponto real de partida (ALLIENDE & CONDEMARÍN, 2005).

4.1 Considerações iniciais: objetivos e fatores que influenciam o desenvol-


vimento da leitura

Alliende & Condemarín (2005) elencam as principais proposições da leitura


emergente:

- O conceito do letramento evolutivo é mais apropriado para descrever o


que tradicionalmente se denominou preparação para a leitura, já que a cri-
ança não se envolve meramente como leitor, mas como leitor/escritor.
- A leitura se desenvolve dentro do contexto das atividades da vida real;
- As crianças aprendem a linguagem escrita por meio de atividades que o
comprometem com seu mundo;
- As crianças se tornam letradas por meio de um nível muito amplo de co-
nhecimentos, de disposições e de estratégias;

8
- Mesmo que a aquisição da leitura possa ser descrita por meios de etapas
gerais, as crianças adquirem a leitura e a escrita com diferentes ritmos e
mediante uma variedade de caminhos. (ALLIENDE, 2005, apud GAIARDO,
2014, p. 11).

Alliende & Condemarín (2005) afirmam que é importante envolver as crianças,


desde cedo, em um ambiente letrado, oportunizando a criança a possibilidade de
abstrair a linguagem escrita de seu contexto. Assim a leitura tem melhor desenvol-
vimento quando ocorre numa sala de aula com variedade de estímulos para a lin-
guagem oral e escrita, que possibilite experiências informativas que permitam às
crianças escutar, olhar e descrever, expressando sentimentos e pensamentos.
Também a utilização de textos autênticos da sala de aula e do ambiente pró-
ximo, estimula sensivelmente a habilidade natural das crianças de formular pergun-
tas relacionadas ao mundo que a cerca. Sendo assim, é recomendável o uso de ca-
tálogos, cartazes, anúncios comerciais, receitas, embalagens, cartas, entre outros.
Já o trabalho do professor pode ser enriquecido com o uso de livros, manuais,
cadernos para as crianças ou softwares educativos que, normalmente, vêm acom-
panhados de sugestões metodológicas.

A aprendizagem da leitura pode ser entendida como sendo um processo in-


tegrado por quatro fases, determinadas pela necessidade de sistematizar a
informação, sendo: leitura emergente, leitura inicial, leitura nas séries inter-
mediárias e leitura avançada. (ALLIENDE, 2005, apud GAIARDO, 2014, p.
11).

É importante frisar que os alunos precisam de um espaço para a seleção de


suas leituras, considerando suas necessidades, interesses pessoais e o nível de lei-
tura. Além disso, eles devem dispor de um horário onde possam realizar suas leitu-
ras sem serem interrompidos.
Betts apud Alliende & Condemarín (2005) classifica a competência na leitura
do aluno em três níveis, com seus correspondentes critérios:
1. Nível independente, onde a criança pode ler o material de forma inde-
pendente com fluência, precisão e compreensão;
2. Nível instrucional, onde a criança pode ler o material com leitura guiada
ou apoiada;
3. Nível de frustração, onde a criança não está pronta para ler o material
e mostra um padrão de frustração quando tenta fazê-lo.

9
Na visão de Alliende & Condemarín (2005), o principal objetivo da leitura é
conduzir à compreensão da linguagem escrita, implicando um processo de pensa-
mento multidimensional existente na interação entre o leitor, o texto e o contexto.
Nessa direção, é essencial que o leitor interligue seus conhecimentos prévios com
as novas informações fornecidas pelo texto. Para eles, é primordial que a criança
tenha consciência das interações que ela faz em sua comunicação com a linguagem
escrita, assim como também é importante como ela desenvolve estratégias naturais
para trabalhar com informações gráficas, fonética, semântica e sintática.
A prática docente diária permite afirmar que, nesse cenário, o professor deve
ter consciência da necessidade de conhecer os interesses de leitura de seus alunos,
com o objetivo de programa-los com materiais a ela relacionados. Outro fato impor-
tante que merece destaque é a importância da integração da comunidade, princi-
palmente da família, na promoção da leitura para crianças e adolescentes.
Jolibert et al. (1994), ao discorrer sobre a atuação dos pais no aprendizado da
leitura de seus filhos, orientam que modificar profundamente as práticas pedagógi-
cas nunca torna simples as relações com os pais de alunos. Segundo os autores, ao
lado de alguns pais informados, disponíveis para as mudanças e de pais que confi-
am na escola como um meio de possível promoção para seus filhos, a maioria dos
pais mostram-se angustiados frente à incerteza das perspectivas de futuro escolar e
profissional de seus filhos, embaraçados em relação aos “métodos modernos” para
os quais não têm mais os critérios de seu próprio passado escolar, preocupados an-
te o que eles vivenciam amiúde como a tolerância excessiva dessa nova escola na
qual “as crianças só fazem o que querem”, onde “só brincam”, etc.
Jolibert et al. (1994) ressaltam que não é por acaso que o processo de apren-
dizado da leitura constitui-se dos pontos de cristalização dessas preocupações: os
pais sabem muito bem que o domínio do ler/escrever é um dos fatores determinan-
tes do sucesso ou do fracasso escolar. Além disso, muitos consideram como sendo
ao mesmo tempo sua obrigação e seu prazer “fazer ler” seus filhos, à noite, em ca-
sa. Paralelamente, é preciso reconhecer que os docentes que tentam transformar
suas práticas às vezes não têm segurança e hesitam ao enfrentarem o que eles vi-
vem primeiramente como sendo as críticas dos pais, adotando posturas tensas ou
defensivas.

10
Jolibert et al. (1994) instruem que muito significativo que os pais leiam histó-
rias para seus filhos ou folheiem com eles um álbum de literatura infantil, levando-os
a dizerem o que imaginam que irá acontecer na página seguinte depois de virada.

Os pais são também correspondentes privilegiados, nossos parceiros regu-


lares enquanto destinatários dos escritos da aula ou da escola: cartas ou
cartazes informativos, convites, jornal escolar, pedidos de receitas, de mate-
rial ou manuais de uso lhes são endereçados: inversamente, pedimos a
eles, sempre que possível, e desde que não seja artificial, que nos respon-
dam por escrito, que ponham à nossa disposição qualquer documentação
suscetível de nos interessar, etc. (JOLIBERT et al., 1994, apud GAIARDO,
2014, p. 11).

Entretanto, sabe-se que nem todos os pais participam da mesma forma na


escola e no sucesso escolar de seus filhos, cabendo aos professores procurar mé-
todos que permitam que cada um encontre um lugar onde se sinta à vontade e en-
volvido.
Bamberger (1987) orienta que nos primeiros anos de leitura todos os livros
devem ser impressos em letras grandes, o que garante movimentos fáceis e corretos
dos olhos. De forma semelhante, um espacejamento maior entre as linhas e as divi-
sões do texto exerce efeito positivo sobre o desejo de ler.
Segundo Bamberger (1987, p. 50) as ilustrações nos livros infantis exercem
atração redobrada sobre os principiantes e os maus leitores: “elas ornamentam o
texto, estimulam o interesse e dividem o livro de modo que a criança possa virar as
páginas com frequência e ter a impressão de estar lendo depressa”.

11
5 A LEITURA NA FORMAÇÃO CRÍTICA E REFLEXIVA DO CIDADÃO

Fonte: tiespecialistas.com.br

O ato de ler faz com que o indivíduo leitor tenha respostas para o mundo e
para o que está acontecendo ao seu redor. Quando uma pessoa lê, ela passa a ter
uma nova opinião sobre o tema lido, desde política até assuntos relacionados à culi-
nária. Desta forma, se a criança é estimulada a ler desde pequena ela com certeza
será um adulto questionador e crítico, assim, o indivíduo que não lê não terá base
literária e experiências para formar opinião sobre qualquer assunto.

Pessoas que não são leitoras têm a vida restrita à comunicação oral e difi-
cilmente ampliam seus horizontes, por ter contato com ideias próximas das
suas, nas conversas com amigos. [...] é nos livros que temos a chance d en-
trar em contato com o desconhecido, conhecer outras épocas e outros luga-
res – e, com eles abrir a cabeça. Por isso, incentivar a formação de leitores
é não apenas fundamental no mundo globalizado em que vivemos. É traba-
lhar pela sustentabilidade do planeta, ao garantir a convivência pacífica en-
tre todos e o respeito à diversidade. (GROSSI, 2008, apud ARANA, 2015, p.
26670).

A leitura proporciona a descoberta de um mundo novo e fascinante. Para tan-


to, a apresentação da leitura para as crianças deve ser feita de uma maneira dife-
renciada e atrativa, para que assim elas possam ter uma visão prazerosa a respeito
do ato de ler, de modo que seja um prazer e um hábito que ela acrescentará em sua
vida sem que seja visto como algo obrigatório e enfadonho.

12
A leitura tem o poder de desenvolver a capacidade intelectual e crítica das
pessoas, devendo assim, fazer parte do seu dia a dia e desenvolver a criatividade
em relação ao seu próprio meio e o meio externo.
Quando a criança é incentivada a ler, ela se torna ativa e está sempre dispos-
ta a desenvolver novas habilidades, querendo sempre mais. Ao contrário das crian-
ças que não têm acesso à leitura, pois ela se prende apenas dentro de si mesma
com medo do desconhecido. “A leitura, como andar, só pode ser denominada depois
de um longo processo de crescimento e aprendizado.” (BACHA, 1975).
Para tornar o mundo um lugar melhor é necessário que se integre uma políti-
ca de incentivo à leitura e a inclusão de novos leitores à educação. Pois, somente
através do incentivo à leitura é que serão conquistados resultados efetivos para a
educação.

[...] é fundamental que as políticas de incentivo à leitura se descolem da me-


ra organização de feiras ou da criação de bibliotecas e salas de leitura. O
mais urgente é investir em material humano, com a formação de mediado-
res e bibliotecários capazes de semear o prazer da leitura por todo o país.
Mediadores são os instrumentos mais eficientes para fazer da leitura uma
prática social mais difundida e aproveitada. (LINARD; LIMA, 2008, apud
ARANA, 2015, p. 26671).

A leitura na infância é uma descoberta de sentimentos e palavras que conduz


o leitor a desenvolver o seu intelectual, a sua personalidade e a aumentar substan-
cialmente a sua capacidade crítica. O ato de ler estimula o imaginário e dá a possibi-
lidade de responder as dúvidas em relação às milhares de questões que surgem no
decorrer da vida, possibilitando o surgimento de novas ideias e o despertar da curio-
sidade do leitor, fazendo assim com que ele sempre queira mais, e não se contente
com o básico.
Uma das formas de incentivar as crianças a lerem é apresentá-las a livros que
estimulem o hábito de ler pelo prazer. A partir daí elenca-se diversas vantagens,
como a de que elas conheçam mundos novos e realidades diferentes para que, des-
ta forma, elas possam construir sua própria linguagem, oralidade, valores, sentimen-
tos e ideias, essas tais, que a criança levará para o resto da vida.

O livro leva a criança a desenvolver a criatividade, a sensibilidade, a socia-


bilidade, o senso crítico, a imaginação criadora, e algo fundamental, o livro
leva a criança a aprender o português. É lendo que se aprende a ler, a es-
crever e interpretar. É por meio do texto literário (poesia ou prosa) que ela
vai desenvolver o plano das ideias e entender a gramática, suporte técnico
13
da linguagem. Estudá-la, desconhecendo as estruturas poético-literárias da
leitura, é como aprender a ler, escrever e interpretar, e não aprender a pen-
sar. (PRADO, 1996, apud ARANA, 2015, p. 26672).

A ação de ler não é somente para entretenimento ou uso acadêmico, é tam-


bém, uma ótima ferramenta que oferece ao leitor uma visão ampla do mundo, onde
o sujeito pode contextualizar suas próprias experiências com o texto lido.

Assim a produção de leitura consiste no processo de interpretação desen-


volvido por um sujeito-leitor que, defrontando-se com um texto, analisa,
questiona com o objetivo de processar seu significado projetando sobre ele
sua visão de mundo para estabelecer uma interação crítica com o texto.
(INDURSKY, ZINN, 1985, apud ARANA, 2015, p. 26672).

O gostar de ler é construído em um processo que é individual e social ao


mesmo tempo, pois ouvir histórias é pra quem sabe e também para aquele que não
sabe ler. O professor deve entender e compreender as dificuldades particulares de
cada aluno, e deve, ao mesmo tempo, estimulá-los a produzirem e ouvirem textos,
para que assim ele possa desenvolver suas competências e habilidades, estimulan-
do a leitura como um processo de libertação da criatividade e da reflexão crítica do
cidadão.
Assim, a leitura é fundamental e necessária para a criação de um indivíduo
crítico, apto para discutir seus pontos de vista, por estar preparado e equipado com
uma carga intelectual, superior a outro indivíduo que não obteve a mesma carga lite-
rária.

“Crítica é um juízo apreciativo, seja do ponto de vista estético (obra de arte),


seja do ponto de vista lógico (raciocínio), seja do ponto de vista intelectual
(filosófico ou cientifico).”. (JAPIASSU, 1991, apud ARANA, 2015, p. 26672).

É importante ler textos, não somente os escritos, mas também aqueles que
estão sujeitos a uma interpretação pessoal, como os símbolos, uma figura, um de-
senho, e saber o que aquilo está transmitindo.
Sabemos que existem vários tipos de textos, que nos deparamos no dia a dia,
textos longos e breves, sempre com o objetivo de transmitir uma mensagem, uma
ideia. Existem textos que nos deixam desestimulados, pelo conteúdo extenso, e um
contexto distante de nossa realidade, como leitores.

Em relação aos tipos de textos para fins didáticos podemos classificar os


textos em práticos, informativos ou literários e extraverbais, sendo que os
14
três primeiros grupos foram introduzidos, por Landsmann. Essa classifica-
ção segundo ela tem o objetivo de facilitar o trabalho que teve o aluno a
produzir e sistematizar conhecimentos. (NASPOLINE, 1996, apud ARANA,
2015, p. 26672).

Entre os diversos tipos de leitura que são mostrados por muitos autores, po-
demos resumir:
I) Leitura de higiene mental ou recreativa;
II) Leitura técnica;
III) Leitura de informação;
IV) Leitura de estudo. Na “leitura de higiene mental ou recreativa” o objeti-
vo é trazer uma satisfação, um prazer ao ato de ler, bem como entreter
e distrair, seria o caso de leitura de revistas em quadrinhos, romances
etc. Andrade (1999).
A “leitura de informação” estará sempre ligada aos fatos da cultura em geral.
A “leitura técnica” leva em conta a capacidade de se ler, interpretar e desvendar grá-
ficos e tabelas. Existe ainda a “leitura de estudo" que tem em vista a construção de
informações para obter um conhecimento efetivo do objeto estudado.
Como dito, a leitura é, foi e sempre será uma parte fundamental para a vida
em sociedade. Ler é muito mais do que decifrar códigos ou reconhecer as letras e
formar palavras, ler é dar sentido às palavras e aplicar o que se lê a própria vida,
para que assim, seja possível agregar conhecimentos. Para cada finalidade na vida
existe um tipo de leitura específico.

5.1 A leitura e fases do aprendizado do aluno

Atualmente, o aprendizado da leitura e da escrita é considerado de suma im-


portância para o desenvolvimento crítico e social da criança na fase escolar. Sem a
leitura e a prática da escrita, a criança se vê distante de seu papel como aluno: ler e
aprender a escrever de forma a expressar suas ideias. “A leitura e a escrita são fun-
damentais para o aprendizado de todas as matérias escolares. Por isso, em cada
ano/série, o aluno precisa desenvolver mais e mais sua capacidade de ler e escre-
ver”. (BRASIL, 2006).
A leitura dá vazão à imaginação e “abre mundos” para qualquer pessoa.
Aprender a ler é indispensável quando se vive em uma sociedade onde saber ler e
15
escrever é vital. Por isso, o incentivo à leitura nos primeiros anos da escola é de ex-
trema importância para a formação de alunos leitores. Se aprender requer tempo,
aprender a ler requer tempo e prática: só se aprende a ler, lendo.

As investigações interdisciplinares vêm evidenciando, mesmo na leitura do


texto escrito, não ser apenas o conhecimento da língua que conta, e sim to-
do um sistema de relações interpessoais e entre as várias áreas do conhe-
cimento e da expressão do homem e de suas circunstâncias de vida. Enfim,
dizem os pesquisadores da linguagem, em crescente convicção: aprende-
mos a ler lendo. (MARTINS, 1984, apud ARANA, 2015, p. 26674).

Porém, a escola tem papel fundamental no processo de aprendizagem de lei-


tura do aluno. Cabe a ela motivar o aluno para a prática de leitura e escrita e ofere-
cer satisfatoriamente um projeto de leitura a ser seguido, interligando a leitura satis-
fatória com a vida escolar e social do aluno. Dessa forma, amparado pela escola, o
aluno terá subsídios para que seu desenvolvimento como leitor seja de qualidade.
O professor é o mediador entre o que a escola tem a oferecer para o desen-
volvimento do aluno como leitor e o que o aluno tem que aprender para que esse
desenvolvimento seja significativo. Portanto, o desenvolvimento do aluno como leitor
se faz dentro da escola, pois muitos só têm contato com a leitura apenas no ambien-
te escolar, como afirma Martins (1984) “principalmente no contexto brasileiro, a es-
cola é o lugar onde a maioria aprende a ler e escrever, e muitos têm talvez sua única
oportunidade de contato com os livros, estes passam a ser identificados com os li-
vros didáticos”.
O ensino da leitura e da escrita deve ser influenciado por toda a sociedade,
mas a escola toma posto principal nessa função, delegando aos professores o traba-
lho de chamar a atenção dos alunos para a leitura e a desenvolver a escrita de for-
ma a expressar ideias e pensamentos. Os professores têm, então, papel de media-
dores do conhecimento.

A função do educador não seria precisamente ensinar e ler, mas a de criar


condições para o educando realizar sua própria aprendizagem, conforme
seus próprios interesses, necessidades, fantasias, segundo as dúvidas e
exigências que a realidade lhe apresenta. (MARTINS, 1984, apud ARANA,
2015, p. 26674).

No entanto, não cabe só ao professor de Língua Portuguesa ensinar os alu-


nos a ler. É preciso que todos os professores trabalhem em conjunto e estabeleçam

16
metas relacionadas com as suas disciplinas, com o objetivo de ensinar o aluno a ler
diferentes tipos de textos e a perceber diferentes formas de leitura e entendimento.

Não falo de ensino programado, que reduz tudo a um condicionamento pelo


texto, mas penso que a escola precisa ensinar os alunos a ler e a entender
não só as palavras, as histórias das analogias, mas também os textos es-
pecíficos de cada matéria, as provas de cada área, as instruções de como
fazer algo, etc. A leitura não pode ficar restrita à literatura e ao noticiário.
(CAGLIARI, 1994, apud ARANA, 2015, p. 26674).

Assim, o aluno terá mais amparos para a sua leitura racional e emocional e,
principalmente, para a leitura de mundo. Freire (1994) disse que “a leitura de mundo
precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade da leitu-
ra daquele”. Dessa forma, o desenvolvimento da leitura quando é bem trabalhado,
permite ao aluno despojar de todos os benefícios que uma leitura de qualidade traz.
Fazer parte da sociedade como um cidadão ativo, com pensamentos críticos e ide-
ais condizentes são os resultados de uma boa educação literária.

5.2 Estratégias da leitura na escola

A leitura se faz presente na vida do indivíduo a partir do momento em que ele


está apto a decifrar e compreender o mundo em que está inserido. No anseio de in-
terpretar os acontecimentos ao seu redor e contextualizar com a sua vida, o indiví-
duo estará formando um tipo de leitura, mesmo inconscientemente.
Segundo Freire (2008),

“A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura


desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e
realidade se prendem dinamicamente”. (FREIRE, 2008, apud ARANA, 2015,
p. 26675).

Essa citação sintetiza que a leitura gráfica, ou seja, dos livros, revistas, jornais
é precedida pela leitura da vida. Cada ser humano tem vivências e experiências dife-
renciadas, portanto, cada um tem uma forma de interpretar uma determinada situa-
ção, conforme os padrões da construção de ideias em que o mesmo foi inserido.
Afirma Maria Helena Martins (1986), “Enfim, dizem os pesquisadores da lin-
guagem, em crescente convicção: aprendemos a ler lendo. Eu diria vivendo”. É evi-
dente tanto para Martins (1986) quanto para Freire (2008) que viver precede a leitu-

17
ra, cada pessoa tem suas experiências individuais, e ao ler, muitos se identificam na
forma escrita da leitura.
Assim, a escola tem o dever de fornecer a continuidade ao desenvolvimento
da leitura, tanto da leitura de mundo quando à escrita, ao indivíduo. Ela tem o papel
de formar um cidadão crítico, envolvido com as causas sociais e cientes do mundo
ao seu redor. A instituição escolar como parte fundamental da formação leitora do
aluno deve dispor de uma estrutura de qualidade; livros atuais e em bom estado de
uso, usufruir de uma infraestrutura sólida, com ambientes bem projetados e bibliote-
cas conservadas. Conforme Freire (2008): “A compreensão crítica da alfabetização,
que envolve a compreensão igualmente crítica da leitura, demanda a compreensão
crítica da biblioteca”. Assim, quando a escola investe na biblioteca, tanto na parte
física, disponibilizando um ambiente confortável onde o aluno se sinta bem e incenti-
vado a ler um livro tranquilamente, quanto na parte motivacional, exercendo e em-
pregando a cultura da leitura, onde os professores incentivem à ida à biblioteca, a
escola, assim, exercerá seus deveres quanto ao seu papel de fornecer a cultura da
leitura, e assim formar cidadãos capazes de compreender melhor o contexto do
mundo em que estão inseridos e de lidar com questões sociais, emocionais, afetivas
e psicológicas.

Não se formam bons leitores oferecendo materiais empobrecidos, justamen-


te no momento em que as crianças são iniciadas no mundo da escrita. As
pessoas aprendem a gostar de ler quando, de alguma forma a qualidade de
suas vidas melhora com a leitura. No âmbito desta abordagem, fica evidente
que os recursos didáticos e procedimentos devem viabilizar e enriquecer a
forma como se procede a uma atividade, seja ela individual ou coletiva, com
intuito de facilitar à criança desenvolver seus próprios esquemas mentais na
organização do processo de aprendizagem. Sabe-se que os procedimentos
estão relacionados ao domínio do uso de instrumentos de trabalho, que
possibilitem a construção de conhecimento e o desenvolvimento de habili-
dades. Favorecem, portanto, a construção, por parte dos alunos, de instru-
mentos que os ajudarão a analisar os resultados de sua aprendizagem e os
caminhos percorridos para efetivá-la. Como exemplo, tem-se a realização
de pesquisas, produções textuais, resolução de problemas, elaboração de
sínteses e outros. (BRASIL, 1998, apud ARANA, 2015, p. 26676).

Em boa parte dos casos o indivíduo não recebe apoio ou incentivo em casa
para manter o hábito de ler, muitas vezes pela situação financeira da família não ser
adequadamente suficiente para manter tal costume, outras vezes pelo círculo vicioso
que passa de pai para filho, pois onde os pais não leem os filhos provavelmente não
lerão também. Daí entra a escola, complementando essa brecha.
18
Muitos alunos talvez não tenham muitas oportunidades fora da escola, de
familiarizar-se com a leitura; talvez não vejam muitos adultos lendo; talvez
ninguém lhes leia livros com freqüência. A escola não pode compensar as
injustiças e as desigualdades sociais que nos assolam, mas pode fazer mui-
to para evitar que sejam acirradas em seu interior. Ajudar os alunos a ler, a
fazer com que se interessem pela leitura, é dotá-los de um instrumento de
aculturação e de tomada de consciência cuja funcionalidade escapa dos li-
mites da instituição. (SOLÉ, 1998, apud ARANA, 2015, p. 26676).

É responsabilidade da escola, também, dispor de professores capacitados pa-


ra ensinar e educar, usando de técnicas pedagógicas para o bom ensino da leitura.
Esse professor deve estar previamente preparado para administrar o conteúdo, deve
ter lido e meditado sobre as supostas dúvidas de seus alunos, para suprir e sanar os
questionamentos dos mesmos.
O professor, dessa forma, estará pronto para administrar o seu conteúdo de
acordo com a necessidade da classe, usando de métodos adequados para cada fai-
xa etária. Portanto, o professor é o principal canal de sabedoria, aquele que ensina a
forma correta do uso da língua e faz com que o educando passe a raciocinar sobre o
que está sendo ensinado, a expor seus ideais e a agregar um pensamento crítico
por meio da meditação pela leitura.

“A escrita é maior do que um sistema de formas linguísticas com o qual o


sujeito se confronta, esforçando-se por compreendê-lo. Ela é uma forma de
linguagem, uma prática social de uma sociedade letrada”. (VYGOTSKY,
apud FONTANA; CRUZ, 1997).

Além de alfabetizar, ensinando o aluno a formar sílabas, palavras e frases, o


educador enfrenta o desafio de fazê-lo entender o significado do enunciado ali utili-
zado, estimulá-lo a formar opiniões sobre o conteúdo lido, além de, e o mais impor-
tante, fazê-los raciocinar. O professor empenhado em traduzir a mensagem intrínse-
ca ao objeto de leitura deve estar atento aos benefícios que isso trará para seus alu-
nos, avaliando se será viável e se está de acordo com as condições de cognição dos
mesmos. O objetivo central da utilização da leitura é fornecer a visão de mundo para
o educando, inseri-lo na sociedade por meio da leitura.

O envolvimento do aluno no processo de aprendizagem deve propiciar ao


aluno encontrar sentido e funcionalidade naquilo que constitui o foco dos es-
tudos em cada situação de sala de aula. De igual maneira, propiciar a ob-
servação e a interpretação dos aspectos da natureza, sociais e humanas,
instigando a curiosidade para compreender as relações entre os fatores que
podem intervir nos fenômenos e no desenvolvimento humano. As formas de

19
ensinar e aprender são contextualizados e dessa forma permite ao aluno se
relacionar com os aspectos presentes da vida pessoal, social e cultural,
mobilizando as competências cognitivas e emocionais já adquiridas para
novas possibilidades de reconstrução do conhecimento. Isso evidencia a
necessidade de trabalhar com o desenvolvimento de competências e habili-
dades, às quais se desenvolvem por meio de ações e de vários níveis de re-
flexão que congregam conceitos e estratégias, incluindo dinâmicas de traba-
lho que privilegiam a resolução de problemas emergentes no contexto ou no
desenvolvimento de projetos. (BRASIL, 1998, apud ARANA, 2015, p.
26677).

O papel da escola, mais do que formar leitores, é de formar leitores que con-
textualizem o objeto lido com a sua carga de conhecimento, leitores que raciocinam
e que mantenham uma relação crítica e opinativa com o que está sendo lido, que
buscam entender o conteúdo transmitido com o objeto de leitura. Ainda indicam os
Parâmetros Curriculares Nacionais:

[...] formar um leitor competente, supõe formar alguém que compreenda o


que lê; que possa aprender a ler também o que não está escrito, identifi-
cando elementos implícitos; que estabeleça relações entre o texto que lê e
outros textos já lidos; que saiba que vários sentidos podem ser atribuídos a
um texto [...](BRASIL, 1998, apud ARANA, 2015, p. 26677).

Então, observou-se aqui que a escola tem um dever para com a os discentes,
estimulando à leitura, ensinando-os, mas não apenas na forma gráfica, ou seja, o
letramento da forma, mas a como se ler os fatos, as mensagens que estão implícitas
no contexto, formando cidadãos conscientes do mundo ao seu redor, passando a
mensagem que por meio da leitura pode-se conquistar conhecimento e crescimento
intelectual, que através da mesma pode-se descobrir e redescobrir fatos que pos-
sam vir a ter várias formas de interpretação. A leitura abre um leque de oportunida-
des de crescimento, e a escola tem o compromisso de repassar esse conhecimento
aos seus alunos, ensinando-os a compreenderem as ciências e o mundo em que
vivem.

5.3 Estratégias para leitura proveitosa na escola

Para conquistar o gosto dos alunos à leitura, são necessárias algumas estra-
tégias, para que todos, desde os que têm facilidade de entender até os que têm difi-
culdade, consigam chegar a um nível satisfatório de compreensão e aproveitamento
da leitura. O objetivo é sempre conquistar o aluno e fazê-lo interagir com o que está

20
sendo transmitido, formar opiniões e ensiná-lo a expressá-las. O termo “estratégia”
pode ser empregado com sentidos diferentes, que depende de um contexto. Aqui,
pode ser considerado como um procedimento, nesse caso, procedimento de leitura.

“Procedimento, com frequência chamada também de regra, técnica, méto-


do, destreza ou habilidade, é um conjunto de ações ordenadas e finalizadas
dirigidas à consecução de uma meta”. (COLL, apud SOLÉ, 1998)

De acordo com Solé (1998), devemos compreender estratégias como um pro-


cedimento de cunho elevado que abrange a presença de objetivos a serem realiza-
dos, o planejamento de ações desenvolvidas no intuito de atingi-las, bem como sua
avaliação.
Essas estratégias de leitura são usadas para se pôr em prática os mecanis-
mos de ações mentais desenvolvidas pelo leitor para se construir um sentido, para
que ele possa compreender com maior aproveitamento o que está sendo lido.

Consideramos as estratégias de compreensão leitora como um tipo particu-


lar de procedimento de ordem elevada. Como poderão verificar, cumprem
todos os requisitos: tendem à obtenção de uma meta, permitem avançar o
custo da ação de leitor, embora não a preservem totalmente; caracterizam-
se por não estarem sujeitas de forma exclusiva a um tipo de conteúdo ou a
um tipo de texto. (SOLÉ, 1998, apud ARANA, 2015, p. 26679).

Pode se iniciar com uma estratégia essencial, a da interação entre professor e


aluno, formando a relação por meio do ensino. O aluno se depara com o desafio de
compreender o conteúdo da matéria ali imposta, e o professor é o encarregado de
lhe auxiliar e orientar.
A leitura é uma estratégia de interação entre o educador e o aluno, através
dela pode-se criar um pensamento crítico por parte do aluno, e o professor age nes-
sa hora como o mediador, moldando as opiniões dos alunos, agregando-lhes a real
mensagem do texto, formando um elo entre o discente e o objeto de estudo da leitu-
ra, e entre aluno e professor.
A leitura desenvolvida em sala de aula é apresentada por Solé (1998) em três
etapas de atividades com o texto: o antes, o durante e o depois da leitura. Na opini-
ão da autora, as crianças que crescem desenvolvendo a dificuldade da leitura pode-
riam ter condições de atingir níveis satisfatórios da mesma se fossem previamente
orientadas a ler do modo apropriado.

21
Seguindo os passos sobre as estratégias de compreensão leitora imposta por
Solé (1998), temos:
I) Atividades antes da leitura:
 Levantamento do conhecimento prévio sobre o assunto;
 Antecipação do tema ou ideia principal como: título, subtítulo, do exa-
me de imagens.
 Expectativas em função do autor ou instituição responsável pela publi-
cação.
II) Atividades durante a leitura:
 Retificação, confirmação ou rejeição das idéias antecipadas ou expec-
tativas criadas antes do ato de ler;
 Utilização do dicionário para consulta, esclarecendo sobre possíveis
dúvidas do vocabulário;
 Identificação de palavras-chave;
 Suposições sobre as conclusões implícitas no texto, com base em ou-
tras leituras, valores, experiências de vida, crenças;
 Construção do sentido global do texto;
 Busca de informações complementares;
 Relação de novas informações ao conhecimento prévio;
 Identificação referencial a outros textos.
III) Atividades para depois da leitura:
 Construção do sentido sobre o texto lido;
 Troca de opiniões e impressões a respeito do texto;
 Relacionar informações para concluir ideias;
 Avaliar as informações ou opiniões expressas no texto lido;
 Avaliar criticamente o texto abordado Solé (1998).
Para conseguir seguir essas ideias apresentadas pela autora, o leitor deve
dominar os níveis mais básicos da leitura, com intervenção de um professor a lhe
orientar como proceder ao longo do processo da mesma.

Um tipo de leitura estratégica que busca agregar conhecimentos, facilitando


os passos do descobrimento das informações, é a leitura informativa ou lei-
tura de estudos. Esse tipo de leitura é estrategicamente utilizado nas esco-
las, que busca auxiliar na construção de trabalhos e projetos ou para res-

22
ponder questões específicas. Portanto, é de extrema importância utilizar as
fases da leitura informativa ou de estudo para se obter uma leitura proveito-
sa. (ANDRADE, 1999, apud ARANA, 2015, p. 26680).

Outra estratégia eficaz utilizada para se manter a concentração durante a lei-


tura é o ato de ler e sublinhar ou destacar termos ou frases sobre o texto lido, porém
é uma ferramenta que tem que ser usada com cautela. Pois deve se atentar ao que
será realmente proveitoso para se sublinhar.
Segundo Ruiz (2002), quem sublinha com inteligência está atento à leitura e
descobre a ideia principal em cada parágrafo, e se mantém concentrado e em atitu-
de crítica pelo tempo dedicado à leitura.
O leitor que não consegue dar destaque às palavras-chave do texto lido, e
que acaba sublinhando excessivamente, terá problemas em fazer uma revisão ou
anotações futuras. Por isso, recomendam-se os seguintes passos, como indicou Di-
niz & Silva (2008).

I) Leia o texto para obter a visão geral sobre o que foi escrito sem a
preocupação de aprender alguma coisa ou discutir as idéias do au-
tor;
II) Faça uma segunda leitura (leitura analítica) e anote palavras,
termos ou frases ou anotadas em uma folha de papel para serem
pesquisados durante a leitura ou posteriormente. Nesse momento
deve ter sempre em mãos um dicionário para esclarecer algumas
dúvidas que porventura surjam durante a leitura. Você deve também
marcar com um ponto de interrogação dúvidas ou discordâncias so-
bre o que foi escrito pelo autor;
III) Leia novamente o texto e destaque ou sublinhe apenas as pala-
vras essenciais ou palavras-chave, que segundo a NBR (Norma
Brasileira) 6028 significa “palavra representativa do conteúdo do
documento, escolhida, preferentemente, em vocabulário” (ABNT,
2003, p.1). Estas palavras ou frases informam sobre a idéia princi-
pal do texto. (Diniz & Silva, 2008, apud ARANA, 2015, p. 26680).

É muito importante esse sistema de destaque para o aluno, assim ele conse-
guirá gravar com mais facilidade os termos destacados. Sublinhando apenas o que é
realmente importante, ele terá maior facilidade ao retomar ao assunto tratado e terá
também aproveitado as partes que mereciam destaque, memorizando com mais fa-
cilidade e guardando, assim, o que realmente será utilizável.
O educador deve estar atento àqueles que demonstrarem dificuldade de raci-
ocínio e àqueles que não compreendem o conteúdo, e que tem problemas ao admi-
nistrar as estratégias de leitura. Para esses, devem ser criadas situações que os fa-
çam se sentir inclusos e seguros para efetuarem a leitura.
23
Os estudos de entrevistas revelam que as crianças com dificuldades
de compreensão apresentam menos conhecimento explícito de lei-
tura e das estratégias de leitura que os bons leitores. (...) A evidên-
cia é bastante consistente de que as crianças com dificuldades de
compreensão são menos eficazes que o grupo sem dificuldade no
uso de estratégias de execução para leitura. O porquê disto ainda
permanece indefinido. A compreensão fraca pode ser o resultado de
uma dificuldade em dispor de estratégias de execução. (DO-
CKRELL; MCSHANE, 2000, apud ARANA, 2015, p. 26681).

Parte dessa deficiência acontece por existir uma variedade de divergência de


mundo entre os alunos, realidades diferentes e complexas. Uns têm mais facilidade
por ter adentrado no mundo da leitura cedo, incentivado pelos pais e/ou comunida-
de, outros, no entanto, não teve contato com essa realidade antes de ter acesso a
escola. Portanto, leitura em sala de aula para uns é agradável, prazeroso, mas para
outros se torna um fardo, por não terem sido previamente capacitados pela carga de
conhecimentos que alguns outros tiveram. Neste caso, o professor deve se inserir
na realidade do aluno, estar em contato com ele, adentrando em seu universo, bus-
cando abordar temas e assuntos que façam com que o aluno se sintam inseridos e
úteis nos debates e nas opiniões, assuntos que estejam de acordo com a sua reali-
dade e perspectiva de mundo.

O fato de me perceber no mundo com o mundo e com os outros me


põe numa posição em face do mundo que não é de quem nada tem
a ver com ele. Afinal minha presença no mundo não é a de quem a
ele se adapta, mas a de quem nele se insere. (FREIRE, 1996, apud
ARANA, 2015, p. 26681).

Portanto, cabe a escola, sob o domínio do professor, propiciar esse momento


ao aluno, de se sentir inserido no mundo. O hábito saudável da leitura o propiciará
isso, desde que o educador não imponha regras severas à leitura, como punições ou
ações forçadas. Deve se respeitar as limitações de cada aluno, inseri-lo no mundo
da leitura, debatendo, dando-lhe voz e oportunidade de expressar um pouco de suas
experiências, para que ele se sinta incluso no mundo da leitura, assim, se familiari-
zando e se sentindo mais a vontade e confortável diante dos desafios que o ato de
ler impõe.
E é com o intermédio do professor, ensinando e dinamizando com os alunos,
e com uma estrutura escolar bem organizada que o aluno, desde aquele com facili-
dade até o que tem dificuldade, conseguirá alcançar um nível considerável de leitu-

24
ra, dentro de seus limites e possibilidades, como diz os Parâmetros Curriculares Na-
cionais.

Para que as dificuldades da leitura sejam superadas, a escola deve


dispor de uma boa biblioteca, de um acervo de classe com livros e
outros materiais de leitura; organizar momentos de leitura livre em
que o professor também leia. Para os alunos não acostumados com
a participação em atos de leitura (…) participem e conheçam o valor
que a possuem, despertando o desejo de ler. É preciso que a esco-
la ofereça condições para que os alunos construam aprendizagens
na leitura, além de conquistar o educando de forma prazerosa, para
que ele desenvolva o hábito de ler utilizando seus recursos e base-
ando-se num planejamento que atenda não só os alunos bem suce-
didos, mas que dê maior ênfase aos que apresentam dificuldades
como leitores, possibilitando um despertar para que as dificuldades
transformem-se em facilidade, sensibilizando-os e assegurando-os
na apropriação de textos orais e escritos. (BRASIL, 1998, apud
ARANA, 2015, p. 26681).

Uma ferramenta bastante eficaz usada no enriquecimento do aprendizado em


geral é a tecnologia. Os utensílios mais tecnológicos como computadores e televiso-
res, e os já tradicionais livros didáticos e lousa são excelentes instrumentos que po-
dem auxiliar o educador, além de ser atrativo para o educando. Através do uso da
tecnologia a leitura é facilmente ministrada ao aluno, fazendo-o dinamizar com o
conteúdo passado, assim, aprendendo mais rápido, além de se tornar um hábito
prazeroso, colocando o aluno no universo da leitura com maior aproveitamento. Os
Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998, p. 141) observam que:

A concepção do ensino e aprendizagem revela-se na prática de sala


de aula e na forma como professores e alunos utilizam os recursos
tecnológicos disponíveis: livro didático, giz e lousa, televisão ou
computador. A presença de aparato tecnológico na sala de aula ga-
rante mudança na forma de ensinar e aprender. A tecnologia deve
servir para enriquecer o ambiente educacional, propiciando a cons-
trução de conhecimentos, por meio de uma atuação ativa, crítica e
criativa por parte de alunos e professores. Entende-se que os recur-
sos tecnológicos pressupõem o desenvolvimento de aulas onde pro-
fessor e aluno incorpora o desejo do saber através de meios mo-
dernos e capazes de processar novas informações e produzir co-
nhecimentos, sendo necessário uma reflexão coerente sobre tais
meios tecnológicos. Os materiais didáticos devem traduzir os objeti-
vos da aula, conduzir os resultados esperados, em termos de co-
nhecimentos, habilidades, hábitos e atitudes. A relação teoria-
prática deverá ser o sustentáculo dos materiais, seu uso deve ser
adequado e a apresentação deve atrair e motivar o aluno para a
tecnologia eletrônica. (BRASIL, 1998, apud ARANA, 2015, p.
26683).

25
Então, observou-se que as estratégias de leitura são apropriadas, porque
através delas pode-se alcançar um melhor aproveitamento do aluno, levando-o a
tomar opinião e partido sobre o objeto lido. Através das estratégias de leitura pode-
se delimitar o espaço do ensino, restringindo cada estratégia para níveis diferentes
de escolaridade.

Trabalhar com estratégias de leitura permite ao leitor ampliar e mo-


dificar os processos mentais de conhecimento, bem como compre-
ender um texto. Compreender é a base para que todas as crianças
se engajem completamente na leitura de livros de literatura e se tor-
nem leitoras. (GIROTTO; SOUZA, 2010, apud ARANA, 2015, p.
26683).

Assim, o educador terá uma meta, um horizonte por onde se guiar, podendo
assim explorar o que o educando tem de melhor. Com uma boa estratégia de leitura
pode se observar um rendimento positivo do aluno, pois ele passa a entender me-
lhor a leitura e os seus meios de se aprender. A partir do momento que a criança é
inserida no universo da leitura, a sua vida passa a ter mais sentido, pois a literatura
proporciona o entendimento das ciências, e faz com que o individuo crie o hábito de
refletir, proporcionando assim uma evolução interior, evolução do pensar e do viver.
Nenhum lugar seria melhor para ser ministrado esse hábito básico, que é o
hábito da leitura, do que no ambiente escolar, onde a criança e o adolescente têm
todo um aparato, uma estrutura para se ter sucesso na aprendizagem do mesmo.
Nesse ambiente é que se encontram profissionais habilitados para ministrar aulas;
os professores que acompanham a vida escolar do educando desde a sua pré-
escola, são os verdadeiros responsáveis pelo sucesso do ensino da leitura. Um pro-
fessor apaixonado pelo o que faz é sinônimo de alunos apaixonados pelo o que
aprendem. As estratégias de ensino funcionam desde que existam professores que
acreditem nelas e na capacidade de que com paixão e vontade o sucesso vem. Tal-
vez essa seja a maior estratégia de ensino da leitura, a paixão de ensinar.

26
6 CRIANÇA E O DESENVOLVIMENTO DA ESCRITA

Fonte: novaescola.org.br

Luria (1988) apresenta um estudo sobre a aquisição da escrita desenvolvido


com um grupo composto por algumas crianças russas, com idade entre quatro e seis
anos que nunca haviam tido contato ou sofrido qualquer influência da escola. Inte-
grava-se também ao grupo uma criança com nove anos que já frequentara a escola,
e outra que apresentava deficiência cognitiva. Este estudo foi realizado em 1929,
influenciado por Vygotsky, e teve por objetivo pesquisar e analisar, juntamente com
as funções de atenção e memória, o desenvolvimento da escrita em crianças russas,
e camponeses iletrados (GONTIJO, 2002).
A abordagem realizada nos estudos de Luria (1988) foi na perspectiva históri-
co cultural de Vygotsky, que concebe o desenvolvimento como um processo marca-
do por descontinuidades e dependente da aprendizagem, e a criança se desenvolve
através de mediações de instrumentos e signos. Segundo Vigotski (1998, p. 70) “to-
das as funções psíquicas superiores são processos mediados, e os signos constitu-
em o meio básico para dominá-las e dirigi-las. O signo mediador é incorporado à sua
estrutura como parte indispensável, do processo como um todo”.
Para Luria o desenvolvimento da criança acontece a partir da necessidade da
mesma se relacionar com a sociedade. Assim, o desenvolvimento não deve ser visto
como resultado de adaptações, mas deve-se compreendera relação da criança com
a sociedade construída historicamente a partir das necessidades dos homens
27
(FACCI, 2004). Segundo Vygotsky; Luria, (1996) foi a partir da necessidade de uma
relação mais complexa do homem com os objetos e com os outros homens, que
surgiu a linguagem,

[...] seria incorreto pensar que os sons, que assumiram paulatinamente a


função de transmitir certa informação, eram “palavras” capazes de designar
com independência os objetos, suas qualidades, ação ou relações. Os sons,
que começavam a indicar determinados objetos, ainda não tinham existên-
cia autônoma. Estavam entrelaçados na atividade prática, eram acompa-
nhados de gestos e entonações expressivas, razão por que só era possível
interpretar o seu significado conhecendo a situação evidente em que eles
surgiam. Além do mais, nesse complexo de meios de expressão parece
que, a princípio, coube posição determinante aos atos e gestos; estes, se-
gundo muitos autores, constituíram os fundamentos de uma original lingua-
gem ativa ou “linear” e só bem mais tarde o papel determinante passou a
ser desempenhado pelos sons, que propiciaram a base para a evolução
paulatina de uma linguagem de sons independente. Durante muito tempo,
porém, essa linguagem manteve a mais estreita ligação com o gesto e o ato
e por isto o mesmo complexo de sons (ou “protovocábulo”) podia designar o
objeto para o qual a mão apontava, a própria mão e ação produzida com
esse objeto. Só depois de muitos milênios a linguagem dos sons começou a
separar-se da ação prática e a adquirir independência. É a essa época que
pertence o surgimento das primeiras palavras autônomas, que designavam
objetos e bem mais tarde passaram a servir para distinguir as ações e qua-
lidades dos objetos. Surgiu a língua como um sistema de códigos indepen-
dentes, que durante um longo período histórico posterior de desenvolvimen-
to assumiu a forma que distingue as línguas atuais (Luria, 1979, apud
BORDIGNON, 2015, p. 26029).

A linguagem foi considerada por Luria como um dos fatores “decisivo que de-
termina a passagem da conduta animal à atividade consciente do homem” (Luria,
1986, p.22).
Nesse sentido, a linguagem é entendida pelo autor como necessidade de co-
municação no processo de trabalho, que durante muito tempo esteve ligada à ativi-
dade humana concreta. Somente após longo processo de complexificação das for-
mas de existência, foi gradativamente se separando da prática e se tornando “um
sistema de códigos suficientes para transmitir qualquer informação, inclusive fora do
contexto de uma ação prática” (Luria, 1986, p.25).
Luria (1988) contrariando muitos psicólogos desenvolvimentistas (que procu-
ravam estudar a escrita na criança no momento em que esta iniciava sua vida esco-
lar) entendia que havia a necessidade de compreender como se desenvolve o pro-
cesso de aquisição da escrita, antes de ser submetida ao processo sistematizado de
alfabetização, já que ao começar a escrever seus primeiros registros no caderno, ela
não se encontra no seu primeiro estágio do desenvolvimento da escrita.
28
As origens deste processo estão localizadas na pré-história do desenvolvi-
mento das funções superiores do comportamento infantil; portanto, quando a criança
atinge a idade escolar, ela já se relacionou, exercitou, interagiu e apropriou-se de
habilidades e técnicas que possibilitarão a ela aprender a escrever em um espaço
muito pequeno de tempo (GONTIJO, 2002).

[...] se apenas pararmos para pensar na surpreendente rapidez com que


uma criança aprende esta técnica extremamente complexa, que tem milha-
res de anos de cultura por traz de si, ficará evidente que isto só pode acon-
tecer porque durante os primeiros anos de seu desenvolvimento, antes de
atingir a idade escolar, a criança já aprendeu e assimilou um certo número
de técnicas que prepara o caminho para a escrita, técnicas que a capacitam
e que tornam incomensuravelmente mais fácil de aprender o conceito e a
técnica da escrita. (LURIA, 1988, apud BORDIGNON, 2015, p. 26030).

Ao entrar na escola, a criança passa a interagir com um sistema de signos


produzidos historicamente pela humanidade para sistematizar e padronizar a escrita,
signos que podem ser desconhecidos para ela, caso não tenha tido contato com a
escrita sistematizada, embora ela já houvesse adquirido habilidades e técnicas que
irão contribuir para a aquisição da escrita formal. Seria importante para os professo-
res “[...] desenterrar essa pré-história da escrita [...] o conhecimento daquilo que a
criança era capaz de fazer antes de entrar na escola, conhecimentos a partir do qual
eles poderão fazer deduções ao ensinar seus alunos a escrever” (LURIA, 1988, p.
144).
Luria (1988) registra que em contraste com certo número de outras funções
psicológicas, a escrita pode ser definida como uma função culturalmente mediada
através da utilização de instrumentos e signos que possibilitam, via interação social,
a transformação do meio e dos sujeitos.
O autor esclarece ainda que existem algumas condições prévias que devem
estar presentes nas crianças para ela compreender o uso da escrita e aprender que
a língua escrita é um sistema de signos os quais não tem significado em si, mas
uma função instrumental, funcionando como suporte para memória, registro de idei-
as e conceitos. A primeira condição remete às coisas que apresentam um significa-
do imediato para a criança ou representam um significado funcional, enquanto auxí-
lio para aquisição de um determinado objeto ou atingir algum objetivo. A segunda
refere-se à capacidade da criança em controlar o seu comportamento e estabelecer
relações com os objetos ou por interesse ou por seu valor instrumental. A criança
29
começa, neste momento, a desenvolver suas formas complexas do comportamento
humano (LURIA, 1988).

Isso remete a observar que o processo de apropriação da escrita não acon-


tece da mesma forma, tampouco ao mesmo tempo para toda criança. As
habilidades para a escrita e as condições que possibilitam a sua aquisição
devem ser compreendidas pelas pessoas que interagem com a criança,
pois, quando uma criança faz alguns rabiscos desordenados em uma folha
de papel e aponta dizendo que é o seu nome, isto já pode ser considerado
como um registro (GONTIJO, 2002, apud BORDIGNON, 2015, p. 26030).

Gontijo (2002) parafraseando Luria escreve que os rabiscos das crianças são
os primeiros indícios de escrita pela criança na tentativa de imitar a escrita realizada
pelos adultos com que esta interage. “Esses primeiros rabiscos ou garatujas produ-
zidos pela criança [...] dizem respeito às formas externas da escrita, e a escrita é um
conhecimento que não se reduz à sua externalidade” (GONTIJO, 2002, p. 17). A es-
crita é muito mais que imitação de gestos ou riscos ela é carregada de significados
adquiridos nos contextos culturais. Assim, a escrita é um meio pra recordar, para
representar algum significado (LURIA, 1988).
Durante as investigações acerca da escrita das crianças Luria observou que
por volta dos três a cinco anos de idade as crianças rabiscam como se fosse uma
brincadeira. Ou seja, “nesse estágio de desenvolvimento, na realidade ainda não
constituem uma escrita ou mesmo um auxílio gráfico, mas apenas desenhos no pa-
pel” (LURIA, 1988, p.156). Assim, as crianças quando rabiscam organizam de tal
maneira os rabiscos para que possam lembrar com facilidade o significado do que
estaria representado pelos rabiscos (GONTIJO, 2002, p. 17).
No entanto, muitas vezes as crianças organizam os rabiscos, ao se remete-
rem aos mesmos não lembravam mais o que significavam.

As crianças imitavam o formato da escrita do adulto, produzindo apenas ra-


biscos mecânicos, sem nenhuma função instrumental, isto é, sem nenhuma
relação com os conteúdos a serem representados. Obviamente este tipo de
grafismo não ajudava a criança em seu processo de memorização. Ela não
era capaz de utilizar sua produção escrita como suporte para a recuperação
da informação a ser lembrada. (OLIVEIRA, 2010, apud BORDIGNON, 2015,
p. 26031).

Para Luria (1988) esta fase do grafismo se apresenta como sinais primários
da escrita, porém ainda não podem ser chamados de signo simbólico, porque nem
sempre a criança recorda os seus significados. Nesta fase a escrita é imitativa, o

30
grafismo realizado pela criança não a ajudam a lembrar do que ela fez em razão de
a criança não ter desenvolvido a função mnemônica. Ou seja, a criança não é capaz
de “utilizar sua produção escrita como suporte para recuperação da informação a ser
lembrada” (OLIVEIRA, 2010, p. 71).
Pode-se inferir que Luria faz uma comparação da pré-escrita (rabiscos) reali-
zada pela criança com as primeiras tentativas de escrita realizadas pelos primórdios.
Assim, evidencia-se que a escrita é uma criação cultural e por meio da qual o sujeito
vai estabelecendo relações sociais. A criança ao estabelecer relações externas com
a escrita por meio das vivências faz com que a escrita vá ganhando significação e
passa a ser internalizada por meio das mediações que vão ocorrendo. À medida que
estes processos ocorrem às funções psicológicas superiores se desenvolvem e os
conceitos do uso social da escrita na cultura, vão sendo apropriados, muitas vezes,
mesmo sem a criança conhecer o sistema de escrita alfabética.
A criança desde que nasce estabelece relação com o mundo que a circunda
seja ele de natureza física ou humana. É nas relações e interações com os sujeitos
humanos que a criança desde que nasce vai se comunicando, primeiramente por
meio de uma linguagem rudimentar (choro, resmungos, gestos, entre outros) que vai
ganhando significado cultural e, nestes contextos, se apropria de aprendizagens e
desenvolve a fala. Também, nestes espaços vai interagindo com signos e os signifi-
cados destes na e pela cultura.
Prosseguindo o processo de desenvolvimento da aquisição da escrita, a cri-
ança também apresenta a fase topográfica em que distribui registros, rabiscos como
manchas linhas no “espaço de papel” sem relação com o conteúdo das sentenças
faladas, produzindo o que Luria chama de ‘marcas topográficas’: “[...] essas marcas
ainda não são signos, mas fornecem pistas rudimentares que poderão auxiliar na
recuperação da informação” (OLIVEIRA, 2010, p. 73).
Na fase topográfica da escrita as crianças começam a fazer relação da escrita
com as sentenças faladas. Assim, para as frases curtas são registradas marcas cur-
tas, frases longas identificadas por marcas longas. As marcas realizadas pela crian-
ça no papel são os primeiros rudimentos que mais tarde se tornarão a escrita (LU-
RIA, 1988).

Paralela à fase topográfica se desenvolve a fase pictórica, em que os dese-


nhos têm a função simbólica, do que a criança deseja supostamente repre-
31
sentar. “A fase pictográfica do desenvolvimento da escrita baseia-se na rica
experiência dos desenhos infantis, os quais, em si mesmos, não precisam
desempenhar a função de signos mediadores em qualquer processo intelec-
tual” (DEMENECH, 2012, apud BORDIGNON, 2015, p. 26032).

Nesse sentido, o desenho ocupa o lugar da palavra e alguns elementos gráfi-


cos passam a ser incorporados nos registros da criança. Nesta fase a criança come-
ça a utilizar outras marcas para representar a sua escrita. Passa a desenhar dizendo
que está escrevendo e os desenhos passam a serem signos mediadores e repre-
sentam determinado conteúdo, ou algo que a criança diz que escreveu. “O desenho
transforma-se, passando de simples representação para um meio, e o intelecto ad-
quire um instrumento novo e poderoso na forma da primeira escrita diferenciada”
(LURIA, 1988, p. 166).

Assim, a escrita passa a ter para a criança valor simbólico. E outros elemen-
tos começam a aparecer nos registros de escrita como “número, forma, cor,
são introduzidos e influenciam a escrita que se torna diferenciada e permite
que a criança, pela primeira vez, leia o que escreveu” (COELHO, 2012,
apud BORDIGNON, 2015, p. 26033).

Quando a criança chega a esta fase dá um salto significativo no processo de


aquisição da escrita enquanto elemento da cultura passando a representar em seus
escritos signos como números, letras e sinais que observa nas interações sociais e
culturais letradas.
Dessa forma, à medida que a criança vai se desenvolvendo vai assimilando
alguns conceitos referentes à relação da fala com a escrita e, assim, a escrita da
criança começa a ter representação simbólica. Assim, a escrita realizada pela crian-
ça ”sai do nível da imitação mecânica para o status de instrumento funcionalmente
empregado. Pode ocorrer que a criança utilize a escrita pictográfica como recurso,
se ela não conhece as letras ainda” (COELHO, 2012, p. 68). No entanto, quando a
criança consegue perceber a diferença entre desenhar e escrever passa a rejeitar a
escrita pictográfica e busca grafar letras mesmo sem o domínio propriamente dito da
escrita convencional (OLIVEIRA, 2010, p. 74).
Porém, ao acompanhar o desenvolvimento de crianças, observa-se que nem
todas as crianças passam, prioritariamente pelas fases acima descritas. Atualmente,
a maioria das crianças desde muito cedo está em contato com o mundo letrado, o
que lhes permite construir memórias e percepções acerca do processo de aquisição

32
da escrita sem que, muitas vezes, passem pelo processo descrito, conforme estudos
realizados por Luria por volta dos anos de 1920. Isto ocorre porque atualmente as
crianças ingressam mais cedo na escola, são alfabetizadas mais cedo e vivem em
um meio que a presença da língua escrita é muito marcante.

“Assim sendo, o sistema simbólico da escrita interfere antes e mais forte-


mente no processo de desenvolvimento da criança” (OLIVEIRA, 2010, apud
BORDIGNON, 2015, p. 26033).

Desse modo, a criança vai se desenvolvendo biológico e culturalmente, assi-


milando aspectos simbólicos e passando a compreender que a escrita enquanto re-
presentação da fala apresenta algumas especificidades de signos que tornam o pro-
cesso de escrita melhor compreendido.
O Processo de alfabetização

6.1 O papel da escola e do professor no processo do ensino e da aprendiza-


gem da escrita pela criança

Quando a criança inicia a escolarização é colocada em contato mais direto


com o sistema de escrita que circula na sociedade. Assim, muitas informações acer-
ca da elaboração e apropriação da escrita começam a fazer parte das atividades
escolares. Desta forma, a criança vai se apropriando de alguns conceitos e regras
que estruturam a escrita e passa a assimilar aspectos simbólicos e compreender
que a escrita é a representação da fala e que para isso existem algumas especifici-
dades de signos que tornam o processo de escrita melhor compreendido.
É comum as crianças desenharem em diferentes suportes ao iniciarem o pro-
cesso de escrita. Luria (1986, p. 173) ressalta que “o período de escrita por imagens
apresenta-se plenamente desenvolvido quando a criança atinge a idade de cinco,
seis anos; se ele não está claro e completamente desenvolvido nessa época é ape-
nas porque já começou a ceder lugar à escrita alfabética simbólica, que a criança
aprende na escola e às vezes mesmo antes”. Ainda, referindo-se ao desenvolvimen-
to da escrita pela criança Luria (1986) enfatiza,

[...] que o desenvolvimento da escrita na criança prossegue ao longo de um


caminho que podemos descrever como a transformação de um rabisco não
diferenciado para um signo diferenciado. Linhas e rabiscos são substituídos
por figuras e imagens, e estas dão lugar a signos. Nesta sequência de
33
acontecimentos está todo o caminho do desenvolvimento da escrita, tanto
na história da civilização como no desenvolvimento da criança (LURIA,
1986, apud BORDIGNON, 2015, p. 26034).

Sendo assim, acredita-se ser relevante a criança conhecer a história da escri-


ta para as civilizações, enquanto marco evolutivo nas comunicações entre os povos,
se apropriando assim de conhecimentos históricos, culturais e sociais que marcam a
relação do homem com a natureza, entendendo natureza como tudo o que envolve
os sujeitos nas mais diversas relações que este estabelece. O processo de ensino
da escrita para as crianças exige que o professor conheça como ela se desenvolve,
para assim, realizar mediações significativas para que a criança se aproprie do sis-
tema de escrita alfabética considerando as experiências de letramento que este vi-
vencia em seus contextos.

É de fundamental importância que, desde o início, a alfabetização se dê


num contexto de interação pela escrita. Por razões idênticas, deveria ser
banido da prática alfabetizadora todo e qualquer discurso (texto, frase, pala-
vra, “exercício”) que não esteja relacionado com a vida real ou o imaginário
das crianças, ou em outras palavras, que não esteja por elas carregado de
sentido (OLIVEIRA, 1998, apud BORDIGNON, 2015, p. 26034).

Com base nos autores abordados, identifica-se que a escrita enquanto produ-
ção cultural do sujeito humano é construída a partir de necessidades destes de se
comunicar com seus pares. “A escrita não é algo natural no desenvolvimento do ser
humano, mas algo que se aprende dentro da cultura e, por isso, necessita do esfor-
ço de quem aprende e de quem ensina” (DUARTE, 2014, p. 4).
Portanto, a escrita não é algo inato, mas apreendida e significada pelos sujei-
tos nas relações sociais que este vai estabelecendo ao longo de seu desenvolvimen-
to. Neste sentido, entende-se como fundamental que a escola, no seu fazer pedagó-
gico, no tocante a aquisição dos processos da escrita, reveja seu fazer pedagógico.
Pois,

Até agora, a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em


relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cul-
tural da criança. Ensina-se as crianças a desenhar letras e construir pala-
vras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal
forma a mecânica de ler o que está escrito que acaba-se obscurecendo a
linguagem escrita como tal (VYGOTSKY, 1998, apud BORDIGNON, 2015,
p. 26034).

34
Vygotsky (1998) observa que existe diferença entre a apropriação da escrita e
a linguagem escrita, uma vez que o ensino da linguagem escrita depende de um
treinamento artificial. Tal treinamento requer atenção e esforços enormes, por parte
do professor e do aluno, podendo-se, dessa forma, tornar fechado em si mesmo,
relegando a linguagem escrita para segundo plano (VYGOTSKY, 1998).
Nessa perspectiva, o processo de aquisição da escrita pela criança necessita
ser compreendido a partir de contextos culturais e históricos de desenvolvimento e
inserção dos sujeitos humanos. Assim, como o sujeito não nasce pronto, mas se
constrói humano nas relações que estabelece com os membros de sua espécie,
também a escrita não é um processo nato no sujeito, mas construída nas relações
dos sujeitos humanos em situações concretas que envolvem a escrita.

6.2 O papel do sujeito no processo de aquisição da escrita

Considerando-se o processo de aquisição da língua escrita como um proces-


so de aquisição de conhecimento, são necessárias algumas reflexões sobre a teoria
de Piaget.
Segundo Piaget (1972), o conhecimento não nasce com o indivíduo; o que lhe
é inato é a capacidade de conhecer, de aprender, de desenvolver qualquer área do
conhecimento. Por causa dessa capacidade inata e através da ação do sujeito sobre
o objeto é que o indivíduo constrói o seu conhecimento. Sendo esse conhecimento
resultado de uma construção, jamais será absoluto, pois se encontra em um proces-
so de elaboração contínua.
O “sujeito cognoscente” da teoria piagetiana se revela no processo de aquisi-
ção da língua escrita. Esse sujeito descrito por Piaget é aquele que não espera que
alguém lhe transmita o conhecimento, ele aprende por intermédio de suas ações
sobre os objetos do mundo que o cerca. Fazendo isso, constrói suas próprias cate-
gorias de pensamento enquanto organiza seu mundo.
Assim, o sujeito cognoscente é a criança em fase de aquisição da escrita, e o
objeto de conhecimento é a língua escrita. A criança i estudada é aquela que:

[...] procura ativamente compreender a natureza da linguagem que se fala à


sua volta, e que, tratando de compreendê-la, formula hipóteses, busca regu-
laridades, coloca à prova suas antecipações e cria sua própria gramática.
[...] aparece uma criança que reconstrói por si mesma a linguagem, toman-
35
do seletivamente a informação que lhe provê o meio. (FERREIRO, 1999,
apud CUNHA, 2004, p. 27).

A aprendizagem acontece, segundo a teoria piagetiana, por intermédio de um


processo de equilibração, no qual estão envolvidos esquemas de assimilação, reor-
ganização e acomodação que o sujeito possui. Todo estímulo externo recebido pela
criança será transformado de acordo com seus “esquemas de assimilação”, será
reorganizado e acomodado na busca de uma equilibração entre o novo e o já exis-
tente, o que torna o processo de aprendizagem subjetivo, sendo a criança o centro
desse processo.
O sujeito da aprendizagem não espera por instruções para começar a intera-
gir com o seu entorno. A criança, quando entra para a escola, já possui uma série de
concepções sobre a língua escrita, pois o mundo está carregado de informações
escritas com as quais ela se relaciona o tempo todo. No entanto, é no ambiente es-
colar que ela vai testar suas hipóteses sobre a língua escrita e adquiri-la de forma
mais estruturada.
Segundo Piaget (1978), a aquisição do conhecimento não acontece de manei-
ra linear, ou seja, um passo depois do outro, ela se efetua de forma global, através
de grandes reestruturações. Durante esse processo de reestruturação muitas vezes
chega-se a um resultado “errôneo”, no entanto, o processo como um todo é sempre
“construtivo”.
A ideia de “erro construtivo”, segundo Ferreiro e Teberosky (1999), é de fun-
damental importância para o processo de aprendizagem. Particularmente no que se
refere à aquisição da língua escrita, pode-se observar, através dos tipos de “erros”
cometidos pela criança, os processos pelos quais ela está passando para adquirir a
escrita. Para o professor, é fundamental saber quais etapas são mais facilmente su-
peráveis e quais causam maiores dificuldades nessa aquisição, podendo, até mes-
mo, transformarem-se em problemas permanentes nas produções escritas do aluno.
Segundo a teoria piagetiana, o objeto do conhecimento só está compreendido
quando o sujeito é capaz de reconstruí-lo, quando tiverem entendido quais são suas
leis de composição. A criança só terá efetivamente adquirido a escrita no momento
em que for capaz de manuseá-la nas suas mais variadas possibilidades, não a as-
sociando mais diretamente à língua falada, mas utilizando-a como um objeto único,

36
independente, que pode ser construído e reconstruído a cada momento, de acordo
com suas próprias características e regras de composição.
Assim como Piaget, Vigotski (2000) também afirma que o sujeito é ativo no
processo de aquisição do conhecimento. Para este autor o indivíduo adquire o co-
nhecimento através da sua inserção na vida social e cultural do ambiente em que
vive. Isso ocorre através de relações interpessoais (interpsicológicas) que se trans-
formam em relações internas (intrapsicológicas).
No entanto, esses dois autores divergem quanto ao modo como ocorre a in-
ternalização do conhecimento. Enquanto Piaget diz que o conhecimento surge dire-
tamente da ação do sujeito sobre o objeto, Vigotski afirma que o processo do conhe-
cimento necessita de uma mediação entre o sujeito e o objeto, ou seja, a relação do
homem com o mundo não é uma relação direta, mas fundamentalmente mediada.
De acordo com essa afirmação de Vigotski, pode-se dizer que os momentos
de experimentação, de “erros” e “acertos”, são extremamente importantes para o
progresso do conhecimento da criança. Esses momentos devem ser detectados pelo
professor para que ele possa efetivamente ajudar o aluno, pois o papel da interven-
ção pedagógica é o de uma relação mediadora entre o sujeito e o objeto na constru-
ção do conhecimento.

6.3 A relação entre a linguagem oral e a aquisição da escrita

Embora se tenha dito que, no começo da aquisição da escrita, a linguagem


oral serve de referencial para a criança, não se pode ignorar que o desenvolvimento
da fala é diferente do desenvolvimento da escrita. A escrita exige um nível de abs-
tração por parte da criança muito maior do que a fala.

Ao aprender a escrever, a criança precisa se desligar do aspecto sensorial


da fala e substituir palavras por imagens de palavras. Uma fala apenas ima-
ginada, que exige a simbolização de imagem sonora por meio de signos es-
critos (isto é, um segundo grau de representação simbólica), deve ser natu-
ralmente muito mais difícil para a criança do que a fala oral. (VIGOTSKI,
2000, apud CUNHA, 2004, p. 30).

A linguagem oral é uma capacidade inata do ser humano e se desenvolve na-


turalmente na criança, além do que a fala tem uma função prática de comunicação,
enquanto que a escrita possui um interlocutor imaginário ou ausente. A fase de
37
aquisição da escrita deve ser acompanhada pelo professor com muita atenção, pois
ela é um marco no desenvolvimento da criança. Conforme Vigotski (2000, p.124) “a
escrita exige um trabalho consciente” tanto no que se refere à construção da forma
escrita (da gramática), como à construção do significado do texto (da semântica). Ao
adquirir consciência da produção escrita, a criança também eleva o seu nível de de-
senvolvimento da fala.
Antes de dominar a língua escrita a criança já domina a língua falada, e é esta
que ela vai usar como objeto de comparação para a aquisição daquela. Segundo
Kato (2001, p.10): “a percepção das propriedades de um objeto torna-se mais fácil
quando o confrontamos com outro objeto de natureza semelhante”.
Ao confrontar a língua escrita com a língua falada é absolutamente natural
que a criança, no início do processo de aquisição da escrita, tenha tendência a es-
crever sem segmentações e que somente aos poucos, ao longo desse processo,
comece a segmentar. De acordo com Kato (2001), a fala é uma cadeia contínua de
sinais acústicos, ela não é segmentada em unidades linguísticas. Quem ouve é que
reestrutura esta cadeia sonora em unidades psicologicamente significativas. Esse
processo acontece de forma inconsciente, somente quando passa pelo processo de
aquisição da escrita é que a criança toma consciência desse fato. A escrita faz com
que ela reflita sobre a língua, e é nesse momento que começa a perceber, conscien-
temente, que a escrita não é um espelho da fala, como diz Cagliari (2002).

6.4 A segmentação da escrita

No começo da aquisição da língua escrita é muito mais comum à criança en-


tender a palavra como um enunciado do que como uma unidade gramatical ou se-
mântica, por isso a maior tendência à hipossegmentação. A segmentação só come-
ça a acontecer com o desenvolvimento do processo da escrita.

Dizemos que ao escrever separamos as palavras. Seria mais adequado di-


zer que a escrita define a unidade ‘palavra’, já que a escrita nos oferece a
melhor definição prática (não teórica) de ‘palavra’: conjunto de letras sepa-
radas por espaços em branco. (FERREIRO, 1996, apud CUNHA, 2004, p.
30).

38
Apesar de as autoras considerarem como uma das melhores a definição dada
acima sobre a unidade “palavra”, elas fazem, logo a seguir, a reflexão de que exis-
tem “zonas de flutuação, incerteza ou oscilação na definição dentro da mesma lín-
gua”. Elas usam como exemplo, no português, as palavras antes de ontem e anteon-
tem, que carregam a mesma ideia conceitual, mas que são escritas de maneiras di-
ferentes, com uma ou com três palavras gráficas. Essa “flutuação” também pode ser
um dos fatores que dificulta a segmentação das palavras para a criança.
Para Ferreiro e Pontecorvo (1996), a noção de “palavra” é instável para a cri-
ança pré-alfabetizada, podendo significar um fragmento do enunciado, o enunciado
completo ou ainda letras isoladas. A segmentação lexical começa a sistematizar-se
quando a criança entra para a escola. As autoras verificam que nesse período é
mais fácil a criança identificar, como palavras, os substantivos, os verbos e os adjeti-
vos, ficando as demais classes gramaticais, principalmente os artigos, conjunções,
preposições e outros elementos de ligação, como uma “não palavra”.
Quando a criança não reconhece algum segmento como palavra, a tendência
natural é que associe esse segmento àquele que reconhece como tal, aparecendo,
portanto, uma grande incidência de hipossegmentações. Pode-se, consequentemen-
te, verificar uma elevada tendência à construção de “palavras fonológicas” e “grupos
clíticos”. No entanto, Ferreiro e Pontecorvo (1996, p.61) constatam que “as mesmas
sequências que produzem a maior parte dos problemas de hipossegmentação são
também as que produzem a maior parte dos problemas de hipersegmentação”. Isso
aconteceria devido à instabilidade da conceituação por parte da criança do que é
“palavra” e de seus limites. Enquanto algumas unem o clítico à palavra adjacente
(1.a), outras, ao identificarem sequências semelhantes dentro de uma palavra, as
separam (1.b).
(1) a) de repente > derepente
em cima > emcima
b) demais > de mais
embora > em bora. (Cunha, 2004).
Ferreiro e Pontecorvo (1996, p.64) concluem dizendo que “a escrita das cri-
anças parte de formas unidas (em geral, segundo critérios gráficos e sintáticos) e
evolui para uma segmentação cada vez mais completa”. As autoras também consi-

39
deram importante que seja levado em conta, nos textos infantis, qual a noção de pa-
lavra gráfica na língua estudada.

7 O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO

Como se deve o processo de ensinar a ler e a escrever? Tal questão sempre


permeia o processo de alfabetização. Por muito tempo acreditou-se que o aprendi-
zado da leitura e da escrita era de responsabilidade apenas da escola, e que a solu-
ção para as dificuldades acarretadas neste processo estava na escolha adequada
do método de alfabetização, o qual garantiria ao educador ter o domínio sobre a
aprendizagem do aluno. Muito se tem discutido sobre o assunto, fazendo-se neces-
sário retomar algumas considerações a respeito da alfabetização no Brasil.
Segundo Mortatti (2006), a alfabetização no Brasil ganhou destaque no século
XIX. Durante este período, a metodologia era baseada na dificuldade das crianças
em aprender a ler e a escrever. A partir da Proclamação da República, o estudo or-
denado sobre as práticas de leitura e escrita ganhou maior ênfase, “saber ler e es-
crever se tornou instrumento privilegiado de aquisição de saber/esclarecimento e
imperativo da modernização e desenvolvimento social” (MORTATTI, 2006, p. 2).
A aprendizagem, que até então era restrita a algumas classes sociais e ofere-
cidas no próprio ambiente familiar, tornou-se gratuita nas escolas, como direito de
todos. Assim, faz-se necessário um “ensino organizado, sistemático e intencional,
demandando, para isso, a preparação de profissionais especializados” (MORTATTI,
2006, p. 3).
Neste contexto, desde muito tempo vem se mobilizando administradores pú-
blicos, intelectuais de diferentes áreas do conhecimento e educadores a buscarem
soluções para os problemas de ensino e aprendizado da língua escrita, visando o
fim do “fracasso escolar” na alfabetização.
No entanto, como afirma Mortatti (2006), por muito tempo os esforços para
solucionar tais problemas estavam associados apenas aos métodos de alfabetiza-
ção. Havia aqueles que defendiam métodos revolucionários, e os que consideravam
apenas os antigos e tradicionais como válidos.

40
A partir desta perspectiva, Soares (2004) assegura que a alfabetização era
compreendida, até então, apenas como a aprendizagem do sistema convencional de
escrita, por isso oscilava-se em busca do melhor método de alfabetização, os quais
tinham por objetivo a aprendizagem do sistema alfabético e ortográfico da escrita.
Para o mesmo autor, até meados dos anos 80 a alfabetização escolar no Bra-
sil pendia entre os métodos analítico e sintético, com a hipótese de que para o aluno
aprender o sistema de escrita precisaria de estímulos externos. O domínio do siste-
ma de escrita era pré-requisito para o desenvolvimento das capacidades de uso da
leitura e da escrita, “isto é, primeiro, aprender a ler e a escrever [...] para só depois
de vencida essa etapa [...] ler textos, livros, escrever histórias, cartas, etc” (SOA-
RES, 2004, p. 98).
Porém, com o objetivo de sanar problemas ainda relacionados ao fracasso
escolar na alfabetização de crianças, introduziu-se no Brasil o pensamento constru-
tivista sobre alfabetização, resultante de pesquisas de Emília Ferreiro e outros parti-
cipantes. O foco deixa de ser o processo de aprendizagem através dos métodos de
ensino, e volta-se para o processo de aprendizagem da criança.
Esse novo olhar da escola sobre o ensino e aprendizagem da leitura e escrita
como processo de alfabetização, trouxe uma significativa mudança para a área de
educação, pois quebrou os paradigmas da mera codificação (escrever) e decodifica-
ção (ler), contrapondo-se com o “tradicional”.
Soares (2004, p. 98) explica que o construtivismo “alterou fundamentalmente
a concepção do processo de aprendizagem e apagou a distinção entre aprendiza-
gem do sistema de escrita e práticas efetivas de leitura e de escrita”. Tal mudança
permitiu explicar a maneira pela qual uma criança constrói o conceito sobre o siste-
ma e as práticas de leitura e escrita, o que possibilitou identificar como o processo
se desenvolveria de modo mais adequado, a partir da interação dos alunos com prá-
ticas e materiais reais.

41
8 O CENÁRIO ATUAL DA ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL

Fonte: novaprint.com.br

O fracasso escolar é um problema que vem sendo constantemente debatido


no cenário da educação brasileira. Os índices de baixa proficiência de leitura e escri-
ta dos alunos nos anos iniciais têm assustado toda a sociedade, no entanto, o que
tem mais preocupado nos últimos anos é o fato de crianças saírem do ensino fun-
damental sem conseguirem dominar adequadamente o sistema de escrita alfabética.
Nessa perspectiva, Morais (2012, p. 21) ressalta que:

“[...] num sistema escolar tão excludente como o brasileiro, o fracasso na


“série de alfabetização”, isto é, logo no primeiro ano do ensino fundamental,
tornou-se a principal marca de ineficiência de nossa escola”. (MORAES,
2012, apud SANTOS, 2017, p. 2).

Um dos principais problemas da alfabetização atualmente é a carência de me-


todologias de alfabetização;

A partir da década de 1980, houve um processo de “desinvenção” da alfa-


betização, em decorrência da divulgação e disseminação da Psicogênese
da língua escrita e estudos sobre o letramento. A partir desse cenário, proli-
feraram-se muitos equívocos acerca dessas teorias. Um desses equívocos
é o de que o professor não poderia intervir no processo de alfabetização da
criança, pois ela como construtora do conhecimento aprenderia sozinha.
(SOARES, 2003, apud MORAIS, 2012, p. 2).

De acordo com Morais (2012), a partir da década de 80, houve uma grande
aversão às antigas formas de alfabetizar, o que fez com que os professores aban-
42
donassem as velhas metodologias, como se fosse algo proibido. Assim, não havia
uma didática sistematizada de alfabetização, visto que passou a acreditar-se que os
alunos aprenderiam a ler e a escrever espontaneamente, apenas com o auxílio de
atividades de leitura e produção textual. Dessa maneira,

“[...] para a prática da alfabetização, tinha-se, anteriormente, um método, e


nenhuma teoria; com a mudança de concepção sobre o processo de apren-
dizagem da língua escrita, passou-se a ter uma teoria, e nenhum método”
(SOARES, 2003, apud MORAIS, 2012, p. 2).

Os Ciclos de Alfabetização foram implantados no Brasil pelo Ministério de


Educação (MEC) entre os anos de 2004 e 2006, com o objetivo de sanar o fracasso
na alfabetização de crianças. Conforme manual do Pacto Nacional pela Alfabetiza-
ção na Idade Certa (PNAIC) o Ciclo da Alfabetização nos anos iniciais do ensino
fundamental:

[...] é um tempo sequencial de três anos (600 dias letivos), sem interrup-
ções, dedicados à inserção da criança na cultura escolar, à aprendizagem
da leitura e da escrita, à ampliação das capacidades de produção e com-
preensão de textos orais em situações familiares e não familiares e à ampli-
ação do universo de referências culturais dos alunos nas diferentes áreas
do conhecimento. (MEC, 2004, 2006, apud MORAIS, 2012, p. 3).

Nesse contexto, o ciclo de alfabetização foi implantado na Educação Básica a


partir da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 com o intuito de alfabetizar todas as
crianças até os oito anos de idade. No entanto, Moreno e Rodrigues (2015) sinali-
zam que a Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA) realizada em 2014, mostrou
que uma em cada cinco crianças brasileiras de oito anos de idade não sabem ler
frases. O que constata que mesmo com a instituição desta política o problema do
fracasso na aprendizagem de leitura/escrita persiste. Nessa perspectiva, Morais
(2012) salienta que:

Muitos educadores passaram a achar não só natural que uma alta percen-
tagem de alunos das redes públicas conclua o primeiro ano sem estar com-
preendendo a escrita alfabética, como também que o processo de alfabeti-
zação pode se “arrastar”, sem que as crianças cheguem ao final do terceiro
ano ensino fundamental com um domínio das correspondências grafema-
fonema de nossa língua, que lhes permita ler e escrever pequenos textos
com autonomia. (MORAES, 2012, apud SANTOS, 2017, p. 3).

Em consonância a esses dados supracitados, o Índice de Desenvolvimento


da Educação Básica (IDEB) do município de Jequié, cidade onde o presente estudo
43
foi realizado, divulgado em 2015, mostrou a partir de resultados da Prova Brasil a
média de 3,8 das crianças do 4º e 5º anos do Ensino Fundamental avaliando os as-
pectos de leitura, escrita e cálculo numa escala de 0 a 10. Isto nos revela um índice
muito abaixo do IDEB da rede pública de ensino brasileiro, o correspondente a 5,3.
Isto quer dizer que assim como a educação no Brasil em geral precisa melhorar, a
do município de Jequié está abaixo da Média Nacional e distante do que se conside-
ra adequado para os referidos anos de escolaridade.
Diante dessa problemática, percebemos a importância de uma metodologia
sistemática de alfabetização que contemple também o letramento. As discussões
sobre a alfabetização e letramento constituem-se como processos indissociáveis
que precisam e devem caminhar lado a lado, tendo em vista que a alfabetização
consiste no conhecimento do código escrito, o aluno sabe ler e escrever, enquanto o
letramento designa a função social da leitura e da escrita, sendo um processo amplo
em que o sujeito é capaz de fazer uso da escrita em diversas situações do cotidiano.
Nesse sentido, Mendonça e Mendonça (2011, p. 37) ressaltam que:

“[...] a aprendizagem da leitura, entendida como questionamento a respeito


da natureza, função e valor deste objeto cultural que é a escrita, inicia-se
muito antes do que a escola imagina, transcorrendo por insuspeitados ca-
minhos”. (MENDONÇA, 2011, apud SANTOS, 2017, p. 3).

Antes mesmo de adentrar o espaço escolar a criança tem ideias e faz hipóte-
ses sobre o código escrito. Compreende-se então a importância da inserção das
práticas de letramento na escola, pois segundo Kleiman (2007):

[...] é na escola, agência de letramento por excelência de nossa sociedade,


que devem ser criados espaços para experimentar formas de participação
nas práticas sociais letradas e, portanto, acredito também na pertinência de
assumir o letramento, ou melhor, os múltiplos letramentos da vida social,
como o objetivo estruturante do trabalho escolar em todos os ciclos. (KLEI-
MAN, 2007, apud SANTOS, 2017, p. 3).

É importante que nos espaços escolares, os professores desenvolvam o tra-


balho de leitura e escrita, pois as crianças já chegam à escola com conhecimentos
em relação à cultura letrada, tornando-se imprescindível que o educador realize es-
se trabalho com a utilização de recursos, como textos, com diferentes gêneros tex-
tuais, leitura de revistas, cartas, jornais e produções de bilhetes, entre outros, para a
aprendizagem e a integração da criança no mundo letrado.

44
O processo de letramento refere-se ao conjunto de práticas que modificam a
sociedade, é mais que alfabetizar, consiste em ensinar a ler e escrever num contex-
to onde a leitura e a escrita tenham sentido e que leve em consideração a vida do
aluno, seus conhecimentos (ALMEIDA; FARAGO, 2014).

A construção da linguagem escrita na criança faz parte de seu processo ge-


ral, se dá como um trabalho contínuo de elaboração cognitiva por meio de
inserção no mundo da escrita pelas interações sociais e orais, considerando
a significação que a escrita tem na sociedade. (ALMEIDA, 2014, apud
SANTOS, 2017, p. 4).

Assim, é notável a importância do papel da escola e dos professores no dire-


cionamento do trabalho da leitura e da escrita, visto que a criança já tem representa-
ções sobre o que é ler e escrever. É preciso que o professor alfabetize letrando, que
utilize diversos textos, desenvolvendo ações significativas de aprendizagem sobre a
língua, proporcionando ao aluno a interação com a escrita. Implica levar para a sala
de aula uma grande diversidade textual que leve a criança a refletir sobre a escrita
(ALMEIDA; FARAGO, 2014).
Assim, é importante que a escola tenha consciência da complexidade do en-
sino e da aprendizagem da leitura e da escrita, levando em conta que a criança só
aprende aquilo que faz sentido para ela. A alfabetização a partir da repetição de le-
tras e sílabas não dá conta da aquisição do sistema de escrita alfabética, visto que
esse necessita de habilidades mais sofisticadas como sinalizam Mendonça e Men-
donça (2011):

A escrita se apresenta como um conjunto de habilidades adquiridas no


campo linguístico. Para que aconteça, é necessário relacionar as unidades
de sons da fala aos símbolos gráficos e, para complementar, é preciso ter a
habilidade de expressar as ideias sabendo organizá-las na língua escrita. A
escrita é a habilidade do sujeito em transcrever a fala, obedecendo a uma
série de características discursivas específicas da língua escrita, pois fala-
mos de um jeito e escrevemos de outro. (MENDONÇA, 2011, apud SAN-
TOS, 2017, p. 5).

Percebemos a partir disso, que a alfabetização é uma atividade científica em


que a criança (re) constrói a língua escrita. De posse desse conhecimento, Mendon-
ça e Mendonça (2011, p. 56) reforçam que “é urgente à adoção de metodologia
adequada para que crianças sejam alfabetizadas em nosso país, assumindo a defi-
nição de alfabetização, em sua especificidade, como conjunto de técnicas para
exercer a arte e a ciência da escrita.”
45
Para enfrentar o fracasso na alfabetização segundo Soares (2003), é preciso
que se compreenda a alfabetização em sua especificidade, como um processo de
aquisição do sistema de escrita alfabético e ortográfico. E ainda que a alfabetização
seja desenvolvida concomitante ao letramento, além disso, é necessário que haja
uma reformulação da formação de professores alfabetizadores.
Portanto, compreendemos que o atual momento está aberto para novas pro-
postas para reconfiguração pedagógica da alfabetização no país. As discussões pa-
ra isso são amplas e multifacetadas, pois o fracasso da escola em alfabetizar envol-
ve muitos aspectos, que partem tanto das microestruturas quanto das macroestrutu-
ras. A alfabetização como um fundamental período de formação da criança, deve ser
cuidadosamente debatida para que se chegue a soluções mais adequadas para su-
prir ou amenizar as deficiências recorrentes nesse processo.

9 CONCEITOS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO

Fonte: webquestfacil.com.br

Segundo SOARES (1998), o termo letramento é uma versão em português da


palavra inglesa “literacy” que significa “o estado ou condição que assume aquele que
aprende a ler e escrever”.

O surgimento do termo literacy (cujo significado é o mesmo de alfabetismo),


nessa época, representou, certamente, uma mudança histórica nas práticas
sociais: novas demandas sociais pelo uso da leitura e da escrita exigiram

46
uma nova palavra para designá-las. Ou seja: uma nova realidade social
trouxe a necessidade de uma nova palavra. (SOARES, 1998, apud ARDI-
TO, 2016, p. 18).

O tema letramento é recente na educação brasileira, conforme Soares (1998,


p.33), esse termo foi usado pela primeira vez no Brasil em 1986 por Mary Kato, no
livro “No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística”. A partir de então esse
termo passou a ser usado para nomear quem estava alfabetizado e dominava o uso
da leitura e escrita.
No Brasil os conceitos de alfabetização e letramento se misturam não se po-
dem separar esses conceitos, pois eles se completam. Alfabetizado é quem sabe ler
e escrever, e letrado é quem sabe ler e escrever e faz uso desse conhecimento no
seu dia a dia.

Alfabetizar é propiciar condições para que o indivíduo-criança ou adulto te-


nham acesso ao mundo da escrita, tornando-se capaz não só de ler e es-
crever, enquanto habilidade de decodificação e codificação do sistema de
escrita, mas, sobretudo, de fazer uso real e adequado da escrita em todas
as funções em que ela tem em nossa sociedade, também como instrumento
de luta pela conquista da cidadania.
Letramento é usar a escrita para se orientar no mundo (o atlas), nas ruas
(os sinais de transito) para receber instruções (para encontrar um tesouro...
para consertar um aparelho... para tomar um remédio), enfim, é usar a escri-
ta para não ficar perdido. (SOARES, 1998, apud ARDITO, 2016, p. 18).

O conhecimento das letras é um meio de se chegar ao letramento. Deve-se


alfabetizar letrando, isto é, ensinar a criança a ler e escrever nos contextos sociais
de leitura e escrita.

[...] alfabetizar e letrar são duas ações distintas, mas não inseparáveis, ao
contrário, o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e escrever
no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, do modo que o indi-
víduo se tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado. (SOARES,
1998, apud ARDITO, 2016, p. 18).

Segundo FERREIRO (2006) estar alfabetizado “é poder transitar com eficiên-


cia e sem temor numa intricada trama de práticas sociais ligadas a escrita”. Saber ler
e escrever não garante que o indivíduo conseguirá ler e produzir textos, muitas ve-
zes os alunos saem das escolas com o domínio da escrita, mas são incapazes de ler
e escrever em diferentes situações do dia-a-dia.
Diz Ferreiro (1993) “para alfabetizar é preciso ter acesso à língua escrita (tan-
to quanto para aprender a falar é necessário ter acesso a língua oral”. (p.34) Segun-
47
do Ferreiro (1993) “O desenvolvimento da alfabetização ocorre, sem duvida, em um
ambiente social. Mas as praticas sociais assim como as informações sociais, não
são recebidas passivamente pelas crianças”. (p.24). Desde antes de chegar a esco-
la, a alfabetização começa a acontecer em um ambiente social cheio de informa-
ções, continua no período escolar e segue pela vida toda, estamos em constante
aprendizado. Para Ferreiro (1993) “[...] a alfabetização não é um estado ao qual se
chega, mas um processo cujo inicio é na maioria das vezes anterior a escola, e que
não termina ao finalizar a escola primária”. (p.47).
O letramento é cultura, por isso a maioria das crianças vão para a escola
com esse conhecimento, isso acontece por meio da leitura de histórias feita à ela por
alguém alfabetizado, pelo manuseio de livros, revistas, rótulos e tudo que uma soci-
edade letrada pode oferecer a criança. Cabe a escola orientar a criança para que ela
aprenda a ler e escrever e incentivá-la a fazer uso real destas práticas no seu dia a
dia.

Do ponto de vista social, o alfabetismo não é apenas, nem essencialmente,


um estado ou condição pessoal; é, sobretudo, uma prática social: o alfabe-
tismo é o que as pessoas fazem com as habilidades e conhecimento de lei-
tura e escrita, conhecimentos e as necessidades, os valores e as práticas
sociais. Em outras palavras, o alfabetismo não se limita pura e simplesmen-
te à posse individual de habilidades e conhecimentos; implica também, e
talvez principalmente, em um conjunto de práticas sociais associadas com a
leitura e a escrita, efetivamente exercidas pelas pessoas em um contexto
social específico. (SOARES, 2004, apud ARDITO, 2016, p. 19).

Existem alfabetizados iletrados, que são aqueles que sabem ler e escrever,
mas não sabem fazer uso das práticas sociais de leitura e escrita. E existem os anal-
fabetos letrados, que mesmo sem a aquisição da leitura e escrita, compreendem o
que pessoas alfabetizadas leem, sabem opinar e criticar se necessário, compreen-
dem o mundo.

[...] a leitura e escrita, são sistemas construídos paulatinamente. As primei-


ras escritas feitas pelos educandos no inicio da aprendizagem, devem ser
consideradas como produções de grande valor, porque de alguma forma os
seus esforços foram colocados nos papéis para representar algo. (FER-
REIRO, 1996, apud ARDITO, 2016, p. 20).

48
10 O MÉTODO PAULO FREIRE DE ALFABETIZAÇÃO

Paulo Freire ficou conhecido mundialmente por ter criado um “método” de al-
fabetização de adultos que partia do diálogo e da conscientização. Diferencia-se dos
demais quando, em seus dois primeiros passos, “codificação” e “descodificação”,
busca transformar a consciência ingênua do alfabetizando em consciência crítica,
por meio da “leitura do mundo” enquanto, no 3º e 4º passos (Análise e síntese, e
Fixação da leitura e da escrita), desenvolve a consciência silábica e alfabética, le-
vando os alunos ao domínio das correspondências entre grafemas e fonemas. Nes-
tes passos, está caracterizado o avanço desse método em relação ao método fônico
e o das cartilhas, visto que a análise e a síntese vêm de uma palavra real, cujo signi-
ficado o aprendiz conheça, retirando-se dela a sílaba, para que o aluno veja e per-
ceba a combinação fonêmica na constituição de sílabas e, a seguir, na composição
de novas palavras.
A proposta fônica desconhece que as letras são realidade da escrita e só po-
dem ser lidas em sílabas na realidade da fala, quando faz o aluno repetir os sons
das letras, ignorando que os fonemas consonantais não são pronunciáveis isolada-
mente. Hoyos-Andrade esclarece, conceituando as sílabas como:

[...] fenômenos fonéticos obrigatórios, dada a linearidade do discurso e as


características dos sons da linguagem humana. De fato pronunciamos síla-
bas e não sons isolados. Estas sílabas são pacotes de 1, 2, 3, 4 e até cinco
sons (dependendo da língua) emitidos em um único golpe de voz [...] e co-
mo pacotes de fonemas, as sílabas compartilham com estes as funções que
os caracterizam. (HOYOS-ANDRADE, 1984, apud MENDONÇA, 2011, p.
34).

Para que o aprendiz tome consciência da correspondência fala/escrita, basta


questionarmos sobre a quantidade de vezes que abrimos a boca para pronunciar
determinada palavra (Exemplo: es- -co-la), e prontamente saberão responder que
são três vezes. A sílaba é a menor unidade pronunciável e perceptível pela criança
na fala. Se perguntarmos a alunos entre cinco e seis anos sobre a quantidade de
vezes que abrimos a boca para pronunciar qualquer palavra da língua portuguesa,
sempre se obterá a resposta correta, porque a consciência silábica é natural.
Porém, se o alfabetizando não compreender a sílaba escrita de imediato, bas-
ta que se apresente a consoante (B, por exemplo), falando seu nome /be/ e, na fren-

49
te, ir alternando as letras que representam graficamente as vogais (a, i, o, e, u) e
indagando sobre qual sílaba formamos que, de pronto, passará a compreender a
sistemática de associação de consoantes e vogais na composição silábica, de ma-
neira clara e sem artifícios.
O Método Paulo Freire foi pouco divulgado e estudado, no Brasil; quando
usado pelo Mobral, foi descaracterizado, porque teve seus passos da “codificação” e
“descodificação” excluídos do processo de alfabetização, sendo transformado em
mero método das cartilhas, impedindo os alfabetizadores e alfabetizados de fazer a
“leitura de mundo”, que transforma a consciência ingênua em consciência crítica.

11 PIAGET E VYGOTSKY: DIVERGÊNCIAS E APROXIMAÇÕES PARA A COM-


PREENSÃO DA AQUISIÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

Discorrer a respeito do processo de aquisição e desenvolvimento da lingua-


gem requer um conhecimento prévio acerca dos processos de pensamento. Isto é,
exige uma compreensão a relativa à capacidade de simbolizar e da formação dos
conceitos. Esses processos foram bastante estudados por autores como, por exem-
plo, Piaget (2007,1967) e Vygotsky (2007,1998), e embora explicitem significativas
divergências entre si, um fator comum pode ser identificado em suas concepções
relativas ao desenvolvimento cognitivo (pensamento e linguagem), que é a impor-
tância das ações exercidas e/ou “sofridas” por um indivíduo em relação a si mesmo
e ao contexto em que vive, e o impacto de tais ações no curso do desenvolvimento
de processos psicológicos básicos (atenção, memória, pensamento, linguagem), e
em todo o processo do desenvolvimento humano.

[...] a linguagem é o uso organizado e combinado de palavras para fins de


comunicação, principalmente, do pensamento. Para o autor, a linguagem
tem caráter universal, pertence à espécie humana, o que possibilita que as
pessoas sejam capazes de dominar e usar um sistema linguístico bastante
complexo. (ATKINSON, 2002, apud SENRA, 2012, p. 2).

A utilização da linguagem possui dois aspectos: um de produção e um de


compreensão. Produzir linguagem significa partir de um pensamento que de alguma
maneira é traduzido numa oração e expressado através de sons. Compreender par-
te da audição de sons, atrelar significado a estes sons na forma de palavras que

50
consistem na criação de uma oração para posteriormente extrairmos significados
dela. Ambos os aspectos compõem o processo de aquisição da linguagem e apre-
sentam os níveis da sintaxe, da semântica e da fonologia, que envolvem, respecti-
vamente, as unidades de oração, a transmissão de significados e os sons da fala
(Atkinson et al, 2002).
Contudo, é importante salientar que a linguagem não consiste apenas na co-
municação e transmissão de ideias pelas palavras, que são cruciais no desenvolvi-
mento cognitivo, mas também na comunicação não verbal, isto é, em gestos e as
ações, movimentos que expressam emoções sociais (Papalia & Olds, 2000).
As mesmas autoras, ao explanarem a respeito do desenvolvimento da lingua-
gem afirmam que antes das primeiras palavras serem pronunciadas há uma fase
denominada pré-linguística. Esta fase é caracterizada pela emissão de sons que
progridem do choro e da produção de fones como “ahhh” ou “gritinhos”, para os bal-
bucios, gestos e imitação de sons embora não haja compreensão dessa imitação.
Há um repertório de sons sequenciados em padrões que soam como linguagem,
mas que parece não possuir significado. Ao longo desse período os bebês desen-
volvem a habilidade de reconhecimento e de compreensão dos sons da fala e a ca-
pacidade de utilização de gestos com significado, e apenas no final do primeiro ano
dizem a primeira palavra. Vale ressaltar que a fase pré-linguística é rica em expres-
são emocional.
Como já dito antes, em razão da linguagem ter a finalidade também de comu-
nicar principalmente o pensamento, Piaget (1967), com os estudos referentes à gê-
nese do conhecimento, evidencia também aspectos relativos à aquisição e desen-
volvimento da linguagem. Segundo ele, a linguagem não é suficiente para explicar o
pensamento, uma vez que o mesmo tem raízes na ação e nos mecanismos sensó-
rio-motor, os quais, para o autor, são mais significativos que o fator linguístico. Po-
rém,

[...] não é menos evidente que quanto mais refinadas as estruturas do pen-
samento, mais a linguagem será necessária para complementar a elabora-
ção delas. A linguagem, portanto, é condição necessária, mas não suficien-
te para a construção de operações lógicas. Ela é necessária, pois sem o
sistema de expressão simbólica que constitui a linguagem, as operações
permaneceriam no estado de ações sucessivas, sem jamais se integrar em
sistemas simultâneos ou que contivessem, ao mesmo tempo, um conjunto
de transformações solidárias. Por outro lado, sem a linguagem as opera-
ções permaneceriam individuais e ignorariam, em consequência, esta regu-
51
larização que resulta da troca individual e da cooperação (Piaget, 1967,
apud SENRA, 2012, p. 2).

De um modo geral, em relação aos tipos de fala, que é uma das manifesta-
ções da linguagem, vale ressaltar a fala privada. Papalia e Olds (2000) afirmam que
ela é referente à fala consigo mesmo, sem a função de comunicar. Essas autoras
apresentam as concepções de Piaget e de Vygotsky relativas a este tipo de fala, e
afirmam que enquanto para Piaget ela é denominada egocêntrica pelo fato de a fun-
ção simbólica não estar plenamente desenvolvida e, com isso, fazer com que pala-
vras e ações representadas por palavras não sejam distinguidas; Vygotsky a conce-
be como elo de integração entre linguagem e pensamento, pois, à medida que ela
aumenta no curso do desenvolvimento, a criança torna-se capaz de orientar e domi-
nar ações, só desaparecendo quando o mesmo processo é feito silenciosamente.
Nos estudos referentes às raízes genéticas do pensamento e da linguagem,
ao descrever os experimentos que realizou, Vygotsky (1998) compara tais estudos
àqueles realizados por Piaget. De acordo com Vygotsky (1998) há divergências en-
tre eles, sobretudo no que concerne às funções da fala egocêntrica. Enquanto para
este autor a fala egocêntrica deve ser concebida a partir da compreensão da função
primordial da fala, que é o contato social e a comunicação, e que sua função consis-
te na transferência dos modos sociais e cooperativos de conduta para o âmbito das
funções psíquicas superiores e pessoais; para Piaget, esse tipo de fala não objetiva
comunicação, caracteriza-se por ser uma fala consigo mesmo desprovida de inten-
cionalidade, e sem qualquer funcionalidade útil para o comportamento da criança.
A fim de que se possa compreender essa concepção divergente dos dois au-
tores, é importante salientar que para Vygotsky (1998);

O desenvolvimento da fala segue o curso das demais operações mentais,


as quais ocorrem em quatro estágios: (a) estágio natural ou primitivo, que
corresponde à fala pré-intelectual e ao pensamento pré-verbal; (b) estágio
da psicologia ingênua, no qual acontece o exercício da inteligência prática
em virtude da experiência da criança com as propriedades físicas do seu
corpo e dos objetos que a circundam; (c) estágio das operações com signos
exteriores usados como auxiliares na solução de problemas, caracterizados
pela fala egocêntrica; e (d) estágio do crescimento interior. Neste, as opera-
ções externas se interiorizam e passam por mudança no processo, a crian-
ça passa a operar com relações intrínsecas e signos interiores.
(VYGOTSKY, 1998, apud SENRA, 2012, p. 4).

52
Segundo Vygotsky (1998), os estudos desses estágios permitiram concluir
que à medida que as crianças se desenvolvem, dirigindo sua fala para comunica-
ções específicas com os outros como, por exemplo, pedir comida ou brinquedo, elas
começam a dirigir a fala para si mesmas, levando à internalização de palavras e à
constituição da fala interior. Esta, por sua vez, envolve pensamentos verbais nortea-
dores do comportamento e da cognição, processo fundamental no desenvolvimento
e funcionamento psicológico humano, logo, na construção do conhecimento.
Papalia e Olds (2000), ao discorrerem a respeito dos aspectos da linguagem,
mencionam que as crianças ao adquirirem a capacidade de representar, começam a
formar e utilizar conceitos e a compartilhá-los com adultos. Segundo as autoras, as
crianças, em função do contexto em que vivem, rapidamente aprendem palavras por
meio de um mapeamento que logo as possibilitam absorver um significado, embora
ele seja usado de maneira generalizada para quaisquer objetos, espaço e tempo.
Isto é, uma criança, inicialmente, pode referir-se há diversos tempos futuros com a
palavra amanhã, em razão de a interpretação ainda ser bastante literal, o que faz a
criança assimilar um significado distinto daquele pretendido.
No curso do desenvolvimento, esta criança realiza com recorrência o referido
mapeamento, o qual a possibilita lançar mão do uso de metáfora. Em outras pala-
vras, o referido mapeamento viabiliza a utilização de uma figura de linguagem em
que palavras ou frases designadoras de um determinado objeto, pensamento é apli-
cada a outras situações. A recorrência do uso desta figura fornece à criança a capa-
cidade necessária para a aquisição de vários tipos de conhecimento (Papalia &
Olds, 2000).
Por seu curso, Oliveira (1992) faz alguns apontamentos referentes ao proces-
so de formação de conceitos investigado por Vygotsky em seus estudos acerca da
origem e dos tipos de fala. Através desses apontamentos a autora coloca que

[...] a linguagem humana, sistema simbólico fundamental na medição entre


sujeito e objeto de conhecimento, tem, para Vygotsky, duas funções bási-
cas: a de intercâmbio social e a de pensamento generalizante. Isto é, além
de servir ao propósito de comunicação entre indivíduos, a linguagem simpli-
fica e generaliza a experiência, ordenando as instâncias do mundo real em
categorias conceituais cujo significado é compartilhado pelos usuários des-
sa linguagem. Ao utilizar a linguagem para nomear determinado objeto es-
tamos, na verdade, classificando esse objeto numa categoria, numa classe
de objetos que têm em comum certos atributos. A utilização da linguagem
favorece, assim, processos de abstração e generalização. (OLIVEIRA,
1992, apud SENRA, 2012, p. 5).
53
Ao considerar que a linguagem consiste num sistema simbólico que estabele-
ce mediação entre o sujeito e seu objeto de conhecimento, Oliveira (1992), ao citar
Vygotsky, afirma que as palavras, enquanto signos mediadores das relações do in-
divíduo com o mundo são generalizações. Cada palavra refere-se a uma classe de
objetos, constitui-se num signo e numa forma de representação da categoria de ob-
jetos e de conceitos. De acordo com a autora, os conceitos são construções cultu-
rais internalizadas pelos indivíduos no curso do processo de desenvolvimento, e são
definidos por atributos estabelecidos pelas características dos elementos localizados
e selecionados no mundo real, no universo da cultura. Nesta concepção, é a cultura
na qual um sujeito se desenvolve que fornece os significados, permitindo ao indiví-
duo ordenar o real em categorias e conceitos.
Papalia e Olds (2000) salientam em relação ao exposto acima, que as crian-
ças, ao longo do desenvolvimento, se tornam mais competentes na comunicação à
medida que dominam as palavras, as frases e a gramática, o que revela a existência
de uma ligação entre a forma e a função da fala. Essa ligação evidencia seus aspec-
tos pragmático e social. O primeiro aspecto envolve conhecimentos práticos para
fins comunicativos inclusive no sentido de adequar os comentários à perspectiva do
ouvinte; o segundo constitui todas as características do conhecimento pragmático e
compõe a fala socializada, a qual pretende ser compreendida pelo ouvinte.
É importante ressaltar que Papalia e Olds (2000) enfatizam a interpretação
feita por Vygotsky a respeito da fala privada, principalmente por se basearem em
pesquisas que deram sequencia aos estudos realizados por ele. Essas autoras
mencionam que a compreensão deste tipo de fala tem relevância significativa no
contexto escolar, pois falar ou sussurrar com si próprio evidencia ou pode evidenciar
a tentativa da criança de resolver um problema e, por isso, ainda necessita pensar
em voz alta.
No que concerne ao tipo supracitado de fala e sua função, Vygotsky (1998)
afirma que a fala exterior dá origem à interior (privada). Em outros termos, as mu-
danças estruturais e funcionais acumuladas e ocasionadas pela fala exterior e pela
diferenciação das funções social e egocêntrica da fala, possibilitam o desenvolvi-
mento da fala interior, a qual constitui a gênese da formação dos conceitos. Essa
formação, segundo o autor, tem início na infância. Entretanto, as funções intelectuais
combinadas de maneira específica, que compõem a base psicológica desta forma-
54
ção, são configuradas e desenvolvidas apenas na puberdade. As formações intelec-
tuais que se aproximam daquelas dos conceitos verdadeiros estão por surgir.

Vygotsky (1998) concebe o homem e seu desenvolvimento numa perspecti-


va sóciocultural. Contudo, referindo-se aos estudos experimentais da for-
mação dos conceitos, o autor afirmou que “[...] a tarefa cultural, por si só,
não explica o mecanismo de desenvolvimento em si, [...]” (VYTOTSKY,
1998, apud SENRA, 2012, p. 6).

Por meio desta afirmativa explicitou a necessidade de compreender o desen-


volvimento de um indivíduo de maneira global. Noutras palavras, salientou o quão
importante é verificar todas as funções implicadas nesse processo, as quais conti-
nuamente são construídas, reconstruídas e incorporadas à uma já existente ou nova
estrutura, porque durante a formação dos conceitos este indivíduo aprende “[...] a
direcionar os próprios processos mentais com a ajuda de palavras e signos [...]”
(p.74), mesmo que a capacidade de regulação de ações por meio de auxiliares seja
plena apenas na adolescência Durante o processo de formação de conceitos, antes
do período da adolescência, a criança transita por alguns estágios. Esses estágios
são compreendidos pelos momentos que partem da agregação desorganizada de
objetos, para um conglomerado vago e sincrético de objetos isolados, até a compo-
sição do grupo, quando ocorre uma organização também sincrética do campo visual
da criança.

Nestes períodos, o significado passa por uma espécie de transição, uma


vez que, inicialmente, “[...] revela uma extensão difusa e não direcionada do
significado do signo (palavra artificial) a objetos naturalmente não relaciona-
dos entre si [...]” (VYGOTSKY, 1998, apud SENRA, 2012, p. 6).

Posteriormente, a criança passa à etapa do pensamento por complexos. Nes-


te modo de pensamento, os componentes estão ligados de maneira concreta e fac-
tual, isto é, ainda há carência de abstração e de lógica. O pensamento por comple-
xos envolve cinco tipos básicos de complexos: (a) associativo, que se baseia em
relações de semelhança ou diferenças percebidas entre as coisas; (b) coleções,
uma combinação de objetos ou impressões concretas proporcionadas pela experi-
ência prática; (c) cadeia: uma conexão dinâmica e consecutiva de elos isolados nu-
ma só corrente, com a emissão de significados de um elo para outro (a formação em
cadeia denota a gênese concreta e factual do pensamento por complexos); (d) difu-
so, o qual se caracteriza pela fluidez do próprio atributo que une os seus elementos.
55
Nele, conjuntos de imagens ou objetos perceptualmente concretos são construídos
através de ligações difusas e indeterminados; e, por fim, (e) o pseudoconceito. Este
complexo constitui a ponte entre complexos e o estágio final e mais alto do desen-
volvimento da formação de conceitos. Além disso,

“[...] a generalização formada na mente da criança, embora fenotipicamente


semelhante ao conceito dos adultos é psicologicamente muito diferente do
propriamente dito; em sua essência, ainda é um complexo.” (VYGOTSKY,
1998, apud SENRA, 2012, p. 6).

Nesse sentido, a construção gradativa de complexos e de significados das pa-


lavras através da manipulação de objetos agrupados é feita pelas crianças de acor-
do com suas preferências. Isso evidencia a característica ativa que elas possuem
para originar generalizações, cujo percurso é apontado pela linguagem com seus
significados estáveis e permanentes, mesmo que haja interferências da fala de um
adulto. (Vygotsky, 1998).
Ainda em referência ao pensamento por complexos, é importante destacar
que o autor citado acima o considerava fundamental em razão de a história da lin-
guagem evidenciá-lo como a base do desenvolvimento linguístico. Em relação a este
desenvolvimento e de acordo com a linguística, ele afirma que ocorre uma distinção
entre o significado de uma palavra ou expressão e o seu referente, ou seja, pode
haver diversos referentes para um só significado. A título de exemplo, o autor coloca
que se nos referirmos ao vitorioso de Jena ou ao derrotado de Waterloo, estamos
nos reportando à mesma pessoa com expressões que trazem significados distintos.
No entanto, é nesse sentido que “[...] as palavras da criança e do adulto coincidem
quanto aos seus referentes, mas não quanto aos seus significados.”. (Vygotsky,
1998, p. 91). Aos poucos, acontecem, necessariamente, transferências de significa-
dos que constituem, além de indicativas do pensamento por complexos, a regra no
desenvolvimento da linguagem, e, obviamente, no percurso de formação dos concei-
tos desde a fase mais primitiva dos conceitos potenciais, até os conceitos espontâ-
neos, verdadeiros e científicos, no qual a palavra ocupa lugar central.

“[...] O desenvolvimento dos conceitos, ou dos significados das palavras,


pressupõe o desenvolvimento de muitas funções intelectuais: atenção deli-
berada, memória lógica, abstração, capacidade para comparar e diferenci-
ar.” (VYGOTSKY, 1998, apud SENRA, 2012, p. 7).

56
As referidas funções, segundo o mesmo autor, não podem ser dominadas
apenas por meio de aprendizagem inicial. Este processo envolve aprendizagem con-
tínua, durante todo o curso do desenvolvimento, sobretudo quando a criança está
em idade escolar, pois ela passa a perceber os seus próprios processos psíquicos
enquanto processos significativos, o que a habilita a conceber as coisas sob uma
nova forma e a criar novas possibilidades de manipulá-las.
Através do estabelecimento de uma relação entre aprendizagem e desenvol-
vimento, verifica-se que o desenvolvimento da linguagem oral e da escrita difere en-
tre si. De acordo com ele, neste processo estão envolvidas as etapas de compreen-
são do significado figurado, a influência da gramática sobre o desenvolvimento men-
tal e “[...] a compreensão das relações no estudo das ciências sociais e naturais.”
(Vygotsky, 1998, p. 122), o que promove a citada diferença. Considerando isso, o
autor salienta que a linguagem escrita difere tanto estrutural quanto funcionalmente
da linguagem oral por exigir um nível de abstração com o qual a criança possa se
desligar do aspecto sensorial da fala e substituir palavras por imagens de palavras;
isto é, exige uma capacidade de representação simbólica ainda mais sofisticada.
A capacidade de representação simbólica exigida pela linguagem escrita ex-
plicita a relação que esta variação da linguagem estabelece com a fala interior e com
a oral, ambas constituintes da linguagem como um todo. A escrita segue o curso da
fala interior, a qual é precedida pela fala oral, que por sua vez permanece em posi-
ção intermediária em relação àquelas. A fala interior é condensada e abreviada, é
predicativa e conhecida pelo sujeito que pensa, enquanto a escrita deve possuir o
caráter explicativo para se fazer inteligível. Por um processo de transição a fala inte-
rior (compacta) passa à oral (detalhada) através de uma semântica deliberada, isto
é, uma “[...] estruturação intencional da teia de significado.” (Vygotsky, 1998, p. 124).
Com essas observações referentes aos tipos de fala – oral interior e escrita –
no decorrer do desenvolvimento, especialmente no período escolar, Vygotsky (1998)
constatou não somente que a gramática e a escrita contribuem para o desenvolvi-
mento da fala, como também que o aprendizado precede o desenvolvimento, mas
não em relação às bases psicológicas que o sustentam. O que acontece de maneira
contínua é uma interação e uma contribuição de/ entre ambos. Nesse processo de
influência mútua, não apenas o aprendizado tem função importante, a imitação é
também um mecanismo essencial, pois juntos – aprendizado e imitação inclusive da
57
fala – fazem emergir qualidades especificamente humanas que orientam o indivíduo
a novos níveis de desenvolvimento, de formação de conceitos.
Nesta perspectiva, Vygotsky (1998) faz uma crítica a Piaget em relação à
compreensão dissociada de pensamento e de aprendizado, afirmando que aprendi-
zado não se inicia na escola. Vygotsky amplia sua crítica ao discorrer a respeito da
inexistência de um elo primário entre pensamento e fala, o qual num determinado
momento promoveria uma influência mecânica de um sobre outro, de maneira que o
pensamento verbal seria resultado de uma união externa de ambos em razão de
serem elementos isolados e independentes. Contudo, de acordo com ele, há uma
evolução desses processos que promove a ocorrência de uma conexão que se mo-
difica e desenvolve. Esta conexão é denominada significado ou conceito, como já
abordado anteriormente.

[...] O significado das palavras é um fenômeno de pensamento apenas na


medida em que o pensamento ganha corpo por meio da fala, e só é um fe-
nômeno da fala na medida em que esta é ligada ao pensamento, sendo ilu-
minada por ele. É um fenômeno do pensamento verbal, ou da fala significa-
tiva – uma união da palavra e do pensamento. (VYGOTSKY, 1998, apud
SENRA, 2012, p. 8).

Como componente essencial e ligação do pensamento e da palavra, o signifi-


cado é fundamental para a compreensão do desenvolvimento da linguagem de
acordo com a concepção de Vygotsky (1998). Para ele, este desenvolvimento impli-
ca também no desenvolvimento do pensamento, pois é através das palavras que o
pensamento ganha existência, se materializa e promove a relação entre coisas. Isso
denota que há uma distinção entre os planos interior (semântico e significativo) e
exterior (fonético) da fala, mesmo que deem origem a uma unidade e tenham suas
próprias leis.
A diferenciação constatada nos planos de fala evidenciou que a unidade da
fala é complexa e envolve um movimento independente nos âmbitos fonético e se-
mântico. No momento em que uma criança começa a dominar a fala exterior utili-
zando uma palavra, ela passa logo a relacionar duas, três palavras entre si até a
construção de frases cada vez mais sofisticadas e coerentes. Entretanto, em relação
ao significado, a primeira palavra é uma frase completa, o que denota que a criança
parte do todo para depois dominar “[...] as unidades semânticas separadas, os signi-
ficados das palavras, e a dividir o seu pensamento, anteriormente indiferenciado,
58
nessas unidades.”. (Vygotsky, 1998, p. 157). Em outras palavras, enquanto o aspec-
to semântico segue do particular para o geral, o fonético faz o caminho inverso.
É interessante expor que o autor citado verificou uma divergência entre se-
mântica e fonética na fala de indivíduos adultos que causa ainda mais surpresa no
que se refere aos sujeitos e predicados gramaticais e psicológicos em razão de fato-
res como: (a) o predicado psicológico poder assumir qualquer fragmento de uma
frase; e (b) da possibilidade de significados distintos ocultarem-se numa determina-
da estrutura gramatical.

Não apenas sujeito e predicado têm seus duplos psicológicos, mas também
gênero, número, caso, grau, etc. Um enunciado espontâneo, errado do pon-
to de vista gramatical, pode ter seu encanto e seu valor estético. A correção
absoluta só é alcançada para além da linguagem natural, na matemática.
Nossa fala cotidiana flutua entre os ideais da matemática e da harmonia
quantitativa. (VYGOTSKY, 1998, apud SENRA, 2012, p. 9).

Como se pode observar, os estudos referentes à aquisição e desenvolvimento


da linguagem até aqui apresentados, partem, de algum modo, dos processos de
pensamento, do período pré-linguístico, do processo de formação de conceitos, dos
processos de aprendizagem e de socialização.

59
12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

______. Curso de psicologia geral. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.

______. O desenvolvimento da escrita na criança. In: VYGOTSKY, L. S. et al. Lin-


guagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone/EDUSP, 1988.

ALLIENDE, F.; CONDEMARÍN, M. A leitura: teoria, avaliação e desenvolvimento. 8.


ed. Porto Alegre: Artmed, 2005.

ANDRADE, Maria Margarida de. Introdução à metodologia do trabalho científico. 4.


ed. São Paulo: Atlas, 1999.

ARANA, A. R. de; KLEBIS, A. B. S. O. A importância do incentivo à leitura para o


processo de formação do aluno. EDUCERE, VII Congresso Nacional de Educação.
Paraná. 2015.

Atkinson, R. L., Atkinson, R. C., Smith, E. E., Bem, D. J. & Nolen-Hoeksema, S.


(2002). Introdução à psicologia de Hilgard. 13. ed. Porto Alegre: Artmed.

BACHA, M.L. Leitura na Primeira Série. Rio de Janeiro: Livro Técnico, 1975. BRA-
SIL. Indicadores da qualidade na educação: dimensão ensino e aprendizagem da
leitura e da escrita /Ação Educativa. São Paulo: Ação Educativa, 2006.

BAJARD, Elie. Ler e Dizer: compreensão e comunicação do texto escrito. São Pau-
lo: Cortez, 1994 (Coleção questões da nossa época; v 28).

BAMBERGER, R. Como incentivar o hábito de leitura. 3. ed. São Paulo: Ática, 1987.

BAMBERGER, Richard. Como incentivar o hábito de leitura. 7. Ed. São Paulo: Edito-
ra Ática, 2002.

BORDIGNON, L. H. C; PAIM, M. M. W. O processo de aquisição da escrita pela cri-


ança: dialogando com Alexander Romanovich Luria. EDUCERE, VII Congresso Na-
cional de Educação. Paraná. 2015.

BRASIL, Parâmetros curriculares nacionais. Língua Portuguesa: Brasília, 1997.


CHARTIER, Roger. A aventura do livro. Do leitor ao navegador. São Paulo: Editora
UNESP, 1999.
60
BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: língua portu-
guesa. Brasília: SEED, 1999.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros


Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. Brasília/ DF: MEC, SEF, 1998.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. Secretaria de Edu-


cação Fundamental. Brasília: MEC, 1997.

BRITO, E. O. A importância da leitura para o desenvolvimento da criança. Artigo


publicado em 2006. Disponível em www.educon.com.br. Acesso em 11 Out. 2013.

CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização & Linguística: 4ª ed. São Paulo, SP, Editora
Scipione, 1994.

COELHO, S. M.. A Alfabetização na Perspectiva Histórico-Cultural. Presidente Pu-


dente: UNESP, 2012.

COELLHO, K; MACHADO, M. A. A importância da leitura na educação infantil: um


estudo teórico. Pimenta Bueno. RO. 2016.

Costas, F. A. T., Kolling, J., Feranandes, M. C. & Cabral, P. A. (2002). O processo de


construção da linguagem a partir dos aportes de Piaget e Maturana. Centro de Edu-
cação, Santa Maria-RS, v. 27, n. 01.

CUNHA, A. P. N. da. A hipo e a hipersegmentação nos dados de aquisição da escri-


ta: um estudo sobre a influência da prosódia. Dissertação de Mestrado apresentada
ao Programa de Pós-Graduação em Educação − FaE − UFPel, como requisito para
obtenção do título de Mestre. Pelotas RS. 2004.

DEMENECH, F. Sentidos próprios do ser humano: linguagem e o processo da apro-


priação da língua escrita. Revista Urutágua: acadêmica multidisciplinar-DCS/UEM.
N. 26. Maio/2012

DINIZ, Célia Regina; SILVA, Iolanda Barbosa da. Leitura: Análise e Interpretação.
21. ed. Campina Grande, Natal: UEPB/UFRN – EDUEP, 2008.

61
DOCKRELL, Julie; MCSHANE, John. Crianças com dificuldades de aprendizagem:
uma abordagem cognitiva. Tradução de Andréa Negrada. Porto Alegre: Artes Médi-
cas Sul, 2000.

DUARTE, L. R. A aprendizagem da linguagem em Vygotsky. In: JORNADA DE


PESQUISA, 9. Revistas. UNIJUÍ, 2014.

FACCI, M. G. D. A periodização do desenvolvimento psicológico individual na pers-


pectiva de Leontiev, Elkonin e Vigostsk. Cadernos Cedes. Campinas, vol. 24, n. 62,
p. 64-81, abril 2004.

FERREIRA, Liliana Soares. Produção de leitura na escola. Ijuí: Unijuí; 2001.

FONSECA, André Dioney. A instigante e complexa história da leitura: apontamentos


teóricos e metodológicos. In: Revista Espaço Acadêmico, nº 144, maio de 2013.

FONTANA, Roseli; CRUZ, Nazaré. Psicologia e Trabalho Pedagógico. São Paulo:


Atual Editora, 1997.

FOUCAMBERT, J. A leitura em questão. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.

FOUCAMBERT, Jean. A leitura em questão. Porto Alegre: Artmed, 1994.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 47.
ed. São Paulo: Cortez, 2006.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 49ª
ed, São Paulo: Cortez, 2008.

FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. 6. Ed. Paz e Terra, 1994. GIROTTO,
C. G. G.S.; SOUZA, R. J. Estratégias de leitura: para ensinar alunos a compreender
o que leem. In: SOUZA, Renata Junqueira (org) . Ler e compreender: estratégias de
leitura. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2010.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.


14ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GAIARDO, V. de A; CUCHI, A. L. V. A importância da leitura nas séries iniciais. São


João da Boa Vista. SP. 2014.

62
GONTIJO, C. M. M. O processo de alfabetização: Novas contribuições. 1. ed. SP:
Martins Fontes, 2002.

GROSSI, Gabriel Pillar. Leitura e sustentabilidade. Nova Escola, São Paulo, SP, n°
18, abr. 2008.

INDURSKY, Freda; ZINN, Maria Alice Kaner. Leitura Como Suporte Para a Produção
Textual. Revistas Leitura Teoria e Prática, Nº 5, 1985. JAPIASSU, H. Vocabulário de
Filosofia. Curso de Filosofia. Jorge Zahar. Rio de Janeiro, 1991.

JOLIBERT, J. et al. Formando crianças leitoras. Vol. I. Porto Alegre: Artes Médicas,
1994.

KATO, Mary. O aprendizado da leitura. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

KILIAN, Carina; CARDOSO, Rosane Maria. Práticas de leitura literária: os casos de


França e Brasil. 2012.

KLEIMAN, A. Oficina de leitura: teoria & prática. 6. ed. Campinas: Pontes, 1998.

KLEIMAN, Angela. Oficina de leitura: teoria & prática. 10. ed. Campinas: 2004.

LINARD, Fred; LIMA, Eduardo. O X da questão. Nova Escola, São Paulo, SP, n° 18,
abr. 2008. MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. São Paulo: Brasiliense, 1984.

LURIA, A. R. Pensamento e linguagem: as últimas conferências de Luria. Porto Ale-


gre: Artes Médicas, 1986.

MAGNANI, M. R. M. Leitura, literatura e escola: sobre a formação do gosto. São


Paulo: Martins Fontes, 1989. Coleção Texto e Linguagem.

Magro, C. (1996, 16 de agosto). Linguagem, biologia e fenômenos psíquicos. Encon-


tro de ex-residentes e psiquiatras da fhemig, II, Mesa Redonda Biologia e Psiquia-
tria. Barbacena.

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. 7 ed. São Paulo: Brasiliense, 1986.

Maturana, H. (2001). Cognição, ciência e vida cotidiana. Org. e Trad. Cristina Magro,
Victor Paredes. Belo Horizonte: Ed. UFMG.

63
MENDONÇA, O. S. Percurso Histórico dos Métodos de Alfabetização. Faculdade de
Ciências e Tecnologia – Departamento de Educação UNESP/ Presidente Prudente.
SP. 2011.

Moreira, M.A . (2004). A Epistemologia de Maturana. Rev. Ciência e Educação, Bau-


ru-SP.

NASPOLINE, Ana Tereza. Didática de Português: Tijolo por Tijolo: Leitura e Produ-
ção Escrita. São Paulo: FTD, 1996. PRADO, Maria Dinorah Luz do. O livro infantil e
a formação do leitor. Petrópolis: Vozes, 1996.

OLIVEIRA, A. M. M. A formação de professores alfabetizadores: lições da prática. In:


GARCIA, Regina Leite. Alfabetização dos alunos das classes populares. São Paulo:
Cortez, 1998.

Oliveira, M. K. (1992). Vygotsky e o processo de formação de conceitos. La Taille,


Yves de.; Oliveira, Marta Khol de.; Dantas, Heloysa. Piaget, Vygotsky, Wallon: teori-
as psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, p. 23-34.

OLIVEIRA, M. K. de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento um processo históri-


co. 5. ed. São Paulo: Scipione, 2010.

Papalia, D. E.; Olds, S. W. (2000). Desenvolvimento humano. 7. ed. Porto Alegre:


Artmed.

Piaget, J. (1967). Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro: Forense-Universitária.

Piaget, J. (2007). Epistemologia genética. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes.

RAMOS, R. 200 dias de leitura e escrita na escola. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2005.

RANGEL, M. Dinâmicas de leitura para sala de aula. 18. ed. Petrópolis: Vozes,
2004.

REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL.Brasília:


Ministério da Educação e do Desporto, 3 vol., 1998.

RUIZ, J. A. Estudo pela leitura trabalhada. In: Metodologia científica: guia para efici-
ência nos estudos. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

64
SANTOS, R. A. de O; SILVA, R. A. O processo de aquisição da leitura e da escrita:
um estudo no ciclo de alfabetização de uma escola municipal de Jequié. Jequié. BA.
2017.

SENRA, L. X; MIRANDA, J. B. Aquisição e desenvolvimento da linguagem: contri-


buições de Piaget, Vygotsky e Maturana. Psicologia, Portal dos Psicólogos. Juiz de
Fora. MG. 2012.

SILVA, E. T. Elementos de pedagogia da leitura. 2. ed. São Paulo: M. Fontes, 1993.

SOLÉ, Isabel. Estratégias de Leitura; trad. Cláudia Schilling. 6 ed. Porto Alegre:
ARTMED, 1998.

SOUZA, L. A importância da leitura para a formação de uma sociedade consciente.


Artigo publicado em 2007. Disponível em www.cinform.ufba.br. Acesso em 03 Jan.
2014.

VIGOTSKI, L. S. Psicologia da arte. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

Vygotsky, L. S. (1998). Pensamento e linguagem. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes.

Vygotsky, L. S. (2007). A formação social da mente. 7. ed. São Paulo: Martins Fon-
tes.

VYGOTSKY, L. S; LURIA, Alexander Romanovich. Estudos sobre a história do com-


portamento: o macaco, o primitivo e a criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

idades envolvidas no domínio das habilidades metalinguísticas.

65

Você também pode gostar