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PERGUNTE E RESPONDEREMOS 377 – outubro 1993

Livros em Destaque
Ainda a crítica dos Evangelhos:

"JESUS DENTRO DO JUDAISMO"


por James H. Charlesworth

Em síntese: James H. Charlesworth, pesquisador protestante, prescin de da fé e procura


entender os Evangelhos e a figura de Jesus a partir de documentos e monumen tos do
judaísmo. O livro levanta hipóteses e cita sentenças de autores diversos, sem chegar ,
por vezes, a uma conclusão. Contudo o resultado do confronto de Jesus com os
testemunhos do judaísmo é, de modo geral, favor ável à clássica imagem que se tem de
Jesus; o autor afirma mais de uma vez essa concordância, e poderia fazê-lo com mais
freqüência no decorr er da sua obr a, se não fosse tão dependente de preconceitos
racionalistas.
=-=-=

James H. Charlesworth é professor do Princeton Theological Semi-nary da Universidade de Princeton.


Escreve mais um livro sobre Jesus, abstraindo da fé e dedicando-se unicamente à consideração de
documentos que possam esclarecer a pessoa e a obra de Jesus Cristo no plano meramente humano (1). É
assim uma obra que se justapõe à de John P. Meier, já analisada em PR 376/1993, pp. 406-420. Ambas
prescindem da fé e procuram o chamado "Jesus real" através dos elementos fornecidos pela literatura
antiga extra-bíblica e pela arqueologia. São livros que R. Pompeu de Toledo citou no seu famoso artigo
sobre Jesus em VEJA de 23/12/1992, pp. 48-59, como se fossem revolucionários ou aptos a desfazer a
clássica imagem de Jesus; na verdade, trata-se de coleções de sentenças hipotéticas, que em parte
destroem umas as outras, tentando fugir do Jesus do Cristianismo. Como se verá, o livro de James H.
Charlesworth (como o de John P. Meier) é interessante pela documentação que cita, mas pouco diz de
novo que exija a aceitação de um pesquisador sincero.

Examinemos, pois, o conteúdo de tal obra.

1. CONSIDERAÇÕES GERAIS

Charlesworth anuncia no subtítulo de seu livro: "Novas Revelações a partir de Estimulantes Descobertas
Arqueológicas". O sumário do livro apresenta os documentos que contêm as "novas revelações"; 1) os
Pseudo-epígrafos (apócrifos) do Velho Testamento (cap. 2); os Manuscritos do Mar Morto (cap. 3); 3) os
Códices de Nag Hammadi e Flávio José (cap. 4); 4) a Arqueologia da Palestina (cap. 5). O último capítulo
(cap. 6) do livro tem por título: "O conceito que Jesus tinha de Deus e sua Autocompreensão".

Além destes estudos, Charlesworth esboça o rumo das pesquisas sobre o Jesus histórico nos anos de
oitenta (pp. 27-44 e pp. 201-218).

Pode-se dizer que as "revelações" aduzidas nada têm de propriamente novo. O autor se detém sobre
trechos de manuscritos antigos (judeus e não judeus) e cita os mais diversos comentários de estudiosos que
vêem ou não vêem pontos de contato entre esses textos e os dizeres dos Evangelhos canónicos; o leitor é
colocado diante de longos e cansativos "vai-e-vem" do arrazoado de Charlesworth, que passa de algumas
sentenças às suas antíteses e geralmente conclui em termos favoráveis à autenticidade ou credibilidade do
texto do Evangelho.

Assim o livro de Charlesworth pouco tem do sensacionalismo ou da índole revolucionária que Pompeu de
Toledo e outros escritores mal informados lhe querem atribuir, o próprio Charlesworth confessa que foi
cético em relação à historicidade dos Evangelhos, mas reviu sua posição e se tornou adepto daquilo que ele
negava:

1 J a m e s H . C h a r l e s w o r t h , Jesus dentro do Judaísmo. T r a d u ç ã o d o o r i g i n a l i n g l ê s Jesus within Judaism, p o r H e n r i q u e


d e A r a u j o M e s q u it a . I m a g o E d it o r a , R i o d e J a n e i r o 1 9 9 2 ( 2 a . e d iç ã o ) , 1 5 5 x 2 1 0 m m , 2 6 7 p p .
"Durante anos citei com aprovação o que já não posso endossar. Re firo-me à seguinte
citação do livro de Rudolf Bultmann Jesus and the Word:

'Eu penso que agora quase nada podemos saber sobre a vida e a per sonalidade de Jesus,
já que as primeir as fontes cristãs não mo stram interes se em qualquer das duas e que
não existem outras fontes sobre Jesus' (p. 1 4).
... A compreensão que Bultmann tem das fontes cristãs, a saber, a tra dição subjacente à
redação dos Evangelhos, é muito diferente da minha própria. Difiro de Bultm ann não só
em conclusão, mas também em me todologia" (pp. 146s).
Em várias passagens de seu livro, Charlesworth aponta a semelhança de expressões existentes na literatura
extra-bíblica (judaica, gnóstica) e nos Evangelhos: tais seriam "água viva" (p. 93), "perdoai-nos as nossas
ofensas..." (p. 67), a idéia de que Deus julgará os homens (p. 56)... Ora ponderemos, de um lado, que
existem conceitos dependentes da religiosidade natural de todo homem e anteriores às concepções judias
e cristãs; por isto não nos surpreendemos ao encontrá-las em documentos judeus e cristãos; não significam
dependência de uns em relação a outros. De outro lado, sabemos que o Cristianismo se situa na
continuidade do judaísmo como término e consumação das expectativas de Israel; por isto é natural
encontrarmos no Cristianismo alusões a proposições do judaísmo ou abonadas ou ampliadas ou retificadas.
Dito isto, percorramos as principais conclusões a que chega Charlesworth em sua obra.

2. TRAÇOS MARCANTES

2.1. Jesus e os Pseudo-epígrafos (apócrifos) do Velho Testamento (cap. 2)

Neste capítulo de seu livro Charlesworth considera a literatura apocalíptica judaica, os escritos
escatologistas (que proclamavam o fim dos tempos para breve), a consciência do pecado e a necessidade
do perdão expressa pelos apócrifos... Refere-se a comentadores diversos... E conclui muito sobriamente:
"A plena significação dos pseudo -epígrafos para a pesquisa sobre Je sus ainda não foi
contemplada ou escrita. Mas está -se tornando clara a im portância que o s pseudo -
epígr afos têm par a a compreensão do judaísmo anter ior a 70 e do próprio Jesus" (p.67).
Como se vê, o autor não ousa adiantar-se num terreno que ele considera ainda insuficientemente
explorado.

2.2. Jesus e os Manuscritos do Mar Morto (cap. 3)

Sabe-se que se trata de documentos de judeus (monges essênios provavelmente) encontrados em 1947 e
nos anos seguintes nas grutas de
Qumran a N.O. do Mar Morto. Os judeus que para lá se retiraram a partir de meados do século II a.C.
viviam na oração e no trabalho, aguardando a próxima vinda do Messias.

Após citar textos judaicos e compará-los com o Evangelho, conclui Charlesworth:

"Sem sombra de dúvida, a importância mais significativa, e não sujei ta a controvérsias,


dos Manuscritos do M ar Morto para a pe squisa sobre Jesus é a luz que lançam sobre um
período anteriormente obscur o. Pene trar no mundo dos Manuscritos do Mar Morto
equivale a mergulhar no tempo e no ambiente ideológico de Jesus. Os M anuscritos
fazem mais do que r evelar o panorama ideológico da vida de Jesus ou o espírito do
tempo (Zeitgeist) que ele conheceu. Eles e os objetos encontrados no mosteiro de
Qumran também refletem timidamente os contextos social e econômico dos judeus
palestinos anteriores a 70 E.C.

Além destes curtos comentários, os Manuscritos do Mar Morto — juntamente com os


Pseudo -epígrafos e a Mishná — habilitam -nos a começar a avaliar os traços distintivos
da teologia do próprio Jesus. Esses antigos tex tos judeus pr oporcionam a estrutur a a
partir da qual podemos estimar a 's ingularidade' de Jesus de Nazaré. Começam a
aparecer os contornos do Jesus histórico, e é surpreendente discernir como é verdade
que a gênese e o gênio do mais antigo Cristianismo e a única razão pela qual ele se
distinguiu do judaísmo encontr a-se essenci almente numa vida e numa pessoa.

Em resumo, podemos afirmar que a máxima de Renan, tantas vezes citada, de que o
Cristianismo é um essenismo que teve êxito, é simplista e distorcida. O Cristianismo não
se desenvolveu a partir de uma 'seita' na periferia de um judaísmo normativo. O
Cristianismo se desenvolveu a par tir de muitas correntes judaicas; não houve uma fonte
ou tr ajetória única. Jesus é o fundador do Cristianismo. Ele naturalmente não era um
essênio; mas pode ter partilhado com os essênios mais do que a mesma nação, tem po e
lugar" (pp. 87s).

Como se vê, o autor, quando não confirma as proposições do Cristianismo clássico, se limita a afirmações
vagas e pouco significativas.

2.3. Jesus e os Códices de Nag Hammadi e Josefo (cap. 4)

Os Códices de Nag Hammadi são documentos descobertos no Alto Egito, perto de Nag Hammadi. Dois
irmãos camponeses lá encontraram um jarro de cerâmica vermelha, em cujo interior havia doze códices
depapiro escritos em copta ou cinqüenta e três escritos antigos. Muitos destes eram de origem gnóstica
(2), outros de origem judaica.

Charlesworth se detém sobre o Evangelho de Tomé, apócrifo, aí encontrado: o lógion ou a sentença 101
desse texto tem afinidade com Lc 14,26 (3) ... O pesquisador procura definir o parentesco existente entre
um e outro texto; formula interrogações, para as quais não oferece resposta. E conclui:
"É óbvia a importância do Evangelho de Tomé em nossa busca dos ditos do Jesus
histórico" (p. 101).

"O Evangelho de Tomé e, portanto, o copta são fontes e instrumen tos para toda a futura
pesquisa sobre o Novo Testamento, especialmente seu aspecto que é rotulado de
'Pesquisa sobre Jesus' " (p. 102).
Realmente é muito magro o resultado das ponderações de tantas páginas do capítulo.
A seguir, no mesmo capítulo 4, Charlesworth se volta para um texto do historiador judeu Flávio José, que
nas suas Antiguidades Judaicas (18.63-64) escreveu:
"Por volta desse tempo, havia Jesus, um homem sábio, se com efeito o devemos chamar um
homem. Pois ele era alguém que praticava feitos s urpreendentes (e) um mestre de
pessoas que recebiam o extraordi nário com prazer . Ele motivou muitos judeus e também
muitos gregos. Ele era o Cristo. E, quando Pilatos o condenou à cr uz, já que ele era acusa do
por aqueles da mais alta categoria entre nós, os que o haviam amado (desde) o início
não parar am (de causar perturbações), pois ele lhes apareceu ao terceiro dia, tendo novamente
vida, como os profetas de Deus haviam previsto esta e outras coisas maravilhosas a seu respeito. E até
agor a a tribo dos c ristãos assim chamados por causa dele (ainda?) não se extinguiu".

2 O g n o s t ic is m o é u m a c o r r e n t e f i l o s ó f ic o - r e l i g i o s a d o s s é c u lo s H / I l l , q u e f u n d i u e n t r e s i e l e m e n t o s
j u d a ic o s , e l e m e n t o s d a m ís t ic a o r i e n t a l e d a f i l o s o f i a g r e g a .
3 Lc 14,26: " S e a l g u é m v i e r a m im e n ã o o d i a r s e u p r ó p r i o p a i , s u a m ã e e s u a m u l h e r , s e u s f i l h o s , s e u s
i r m ã o s e i r m ã s , e m e s m o a s i p r ó p r i o , n ã o p o d e s e r m e u d is c í p u lo " .
N o t e m o s q u e o v e r b o g r e g o misein ( o d i a r ) , n o c a s o , t e m s i g n if i c a d o o r i g i n a l s e m i t a : q u e r d i z e r " a m a r
menos" (e não odiar propriamente),... amar menos pai e m ãe... do que Jesus.
Charlesworth reconhece que as alusões elogiosas a Jesus (postas em negrito) não podem ser da pena do
judeu Flávio José, mas são interpolações cristãs. Este fato sugere a Charlesworth oito páginas de
ponderações sutis, após o que escreve:

"A existência de Jesus não pode ser provada aos céticos pelas narra tivas do Novo
Testamento, porque estas estão obviamente predispostas a favor de Jesus. Certamente,
Flávio José não é pró -Jesus na versão árabe das Antigüidades 18, as quais, como o erudito
judeu Pines corretamente julga, apesar de seu retrato mais favorável, têm
essencialmente 'uma ati tude de não comprometimento' com relação a Jesus" (p. 108).

"A recensão grega do texto de Flávio José, se m as interpolações cr is tãs, revela como um
judeu do pr imeiro século provavelmente qualificava Jesus: e/e er a uma pessoa rebelde e
um perturbador da fr ágil paz, mas era também uma pessoa sábia que praticava obras
'surpreendentes', talvez mesmo mar avilhosas , e foi seguido por muitos judeus e gentios"
(p. 109).

Mais uma vez Charlesworth não chega a conclusões claras e satisfatórias. Diz e não diz. "Chove e não
molha".

2.4, O Jesus da história e da arqueologia da Palestina (cap. 5)

Charlesworth estuda os vestígios da Jerusalém e da Palestina do tempo de Jesus; principalmente


Cafarnaum e os monumentos relativos ao fim de vida de Jesus são considerados. Em conclusão lemos:

"Por mais que isso tenha parecido incrível antes, os arqueólogos não estão jogando
pedras no caminho da fé cristã. Em termos da história do Novo Testamento, estão
mostrando a areia e o leito de rocha em que se fundamenta a fé. A pesquisa sobre Jesus
é influenciada pela pesquisa ar queológica. 0 Jesus da história é agora menos
incompreensív el, graças à arqueologia da P alestina" (p. 142).

Em particular, Charlesworth admite com probabilidade que foi descoberta a casa de Jesus em Cafarnaum
(p. 129). É contrário aos que negam a historicidade do Evangelho segundo São João: "Não se pode pôr de
lado João como um documento desprovido de informação histórica" (p. 136).

No tocante ao túmulo de Jesus, Charlesworth reconhece a autenticidade do Santo Sepulcro incluído na


basílica do mesmo nome em Jerusalém; esta igreja recobre também o Calvário, onde Jesus esteve
crucificado. O autor rejeita explicitamente o chamado "Túmulo do Jardim", que está distante da basílica e é
tido como o sepulcro de Jesus pelos protestantes. Eis as suas palavras:

"O chamado 'Túmulo do Jardim , que a maioria dos peregr inos a Jerusalém hoje
presumem (como lhes é ruidosamente informado) ser o túmulo de Jesus, não pode ser o
seu túmulo. Foi descoberto apenas no sé culo passado (em 1867) e anunciado como
sendo o túmulo de Jesus por um herói militar, o general Charles George Gordon, em
1883. As escavações demonstr am que o túmulo não pode sequer ser her odiano. G.
Barkay conclui um estudo do Túmulo do Jar dim com as segui ntes palavras: 'Com base em
todas as provas, parece claro que a cova do Túmulo do Jar dim foi aberta na Idade do
Ferro II, o período do Primeiro Templo, entr e os sécu los oito e sete A.E.C. Não voltou a
ser usada para fins funerários até o pe ríodo bizantino. Portanto, não poderia ser o
túmulo onde Jesus foi enter rado' (páginas 56-57). Ver Barkay, The Garden Tomb: Was Jesus
Buried Here?, BAR 12(1986) 40 -57" (p. 173, nota 24).

2.5. O Conceito que Jesus tinha de Deus e sua Autocompreensão (cap. 6)

Charlesworth analisa o apelativo abbá (Pai querido), que Jesus atribuiu a Deus, e observa:

"Jesus escolheu usar abba e não abinu quando se dirigia a Deus, e punha uma ênfase
singular nessa palavr a Abba. Era sua maneira habitual de se referir a Deus e de chamá -
lo. Não será concebível que tenha chama do Deus de Abba porque tinha uma concepção de
Deus que era, de algu mas maneiras , diferente daquela da maioria dos seus
contemporâneos? Muitos antigos judeus tendiam a conceber Deus como distante, só
visitando a humanidade através de intermediár ios, como os anjos, como sabe mos por
estudar os Pseudo -epígrafos e os Manuscr itos do Mar Morto. Jesus percebeu que o
próprio Deus estava muito próximo e que se importa va diretamente com cada pessoa,
mesmo (e talvez especialmente) com os pecadores" (pp. 148s).

O autor não vai mais longe porque prescinde da fé. Julga, porém, aos olhos mesmos da razão, que Jesus se
diferenciou dos outros homens em seu trato com Deus Pai.

Quanto à consciência que tinha de si mesmo, o autor reconhece que é difícil defini-la, pois isto significaria
penetrar no íntimo de alguém que viveu, como homem na terra, há quase vinte séculos. Como quer que
seja, Charlesworth se fixa em três momentos da vida de Jesus, nos quais descobre a noção que Jesus tinha
de estar exercendo uma missão de alcance transcendental: 1) a vocação dos doze Apóstolos (cf. Mt 10,1-4;
Mc 3,13-18; Lc 6,12-16), correspondentes às doze tribos de Israel, e pilastrasdo novo povo messiânico; 2) a
entrada triunfal em Jerusalém, na qual Jesus afirmou sua messianidade (ou permitiu que a afirmassem); 3)
a parábola dos vinhateiros homicidas, que termina descrevendo de antemão o morticínio do Filho,
herdeiro, por parte dos locatários da vinha (os maiorais de Israel), conforme Mc 12, 1-9; Mt 21, 33-46; Lc
20, 9-19; ao narrar esta parábola, Jesus se apresentava como o Filho de Deus enviado pelo Pai para
converter os homens, mas massacrado por estes (como de fato aconteceu). Eis os dizeres de Charlesworth:

"Como compreendemos ao estudar o ato simbólico, de Jesus, de escolher doze


discípulos, ele tinha a intenção clara de se envolver de algu ma maneir a com a
contribuição de estabelecer uma nova era messiânica. Alguma autocompreensão messiânica
pode muito bem ter sido parte de sua autocompreensão. Essa autopercepção também
parece exigida pela maneira como entrou em Jerusalém, cavalgando um animal e
aceitando as sau dações. Ele também provavelmente pensou em si próprio, de alguma
maneira, como alguém que foi enviado a Jerusalém presumivelmente par a morrer e
como o filho retratado no cerne autêntico da Parábola dos Vinhateiros Maus" (p. 170).

3. CONCLUSÃO

Como se depreende, o livro de Charlesworth, em seu conjunto, não é destruidor dos clássicos dados da fé
cristã. Verdade é que considera hipóteses pouco fundamentadas de certos críticos, hipóteses que podem
deixar perplexo o leitor, mas que não passam de concepções subjetivas, alheias à grande corrente da
Tradição e à pesquisa objetiva.

Como estudioso que prescinde das proposições da fé, Charlesworth em sua conclusão julga poder
transmitir o seguinte retrato de Jesus:

"Jesus existiu; sabemos mais sobre ele do que a re speito de qualquer outro judeu
palestino antes de 70 E.C. Ele era uma pessoa real, que viveu na Palestina, crescido na
Galileia.

Os seguintes aspectos de sua vida são relativamente fidedignos: ele manteve algum
relacionamento com João Batista (que certame nte o batizou), começou seu ministério
público em Cafarnaum, chamou homens e mulheres que o seguissem (inclusive um grupo
especial de doze), pr aticou curas (provavelmente também exorcismos), era um pregador
itiner ante que pr oclamou a proximidade (e mesmo, por momentos, a presença) do Reino
de Deus, ensinou que Deus devia ser concebido como um pai amo roso (Abba), pode ter
tido alguma autocompreensão messiânica, provavel mente de algumas formas se tinha
na conta de filho de D eus, possivelmen te enfrentou s em medo a pr emonição de que ser ia
assassinado (talvez ape drejado), mas, não obstante, depois de um período desconhecido
de pregação pública na Galileia, foi para o Sul, para Jerusalém, onde com ousa dia e
êxito demonstrou seu desprezo pela corrupção no T emplo dur ante uma confrontação
pública com a casta sacerdotal, sofreu por causa da trai ção de Judas e da negação de
Pedro, e terminou morrendo ignominiosa mente numa cruz, do lado de fora da muralha
ocidental de Jerusalém, na primaver a de 30 E.C." (p. 182).

É certo que, mesmo prescindindo das proposições da fé, seria possível afirmar ainda várias outras verdades
históricas a respeito de Jesus. Charlesworth não foi tão longe quanto podia ir dentro do seu projeto, mas
não perturba essencialmente a imagem de Jesus que a fé concebe (não a fé cega, mas a fé ilustrada por
sério estudo).

Como quer que seja, o livro não é de fácil leitura; supõe um usuário já iniciado em estudos bíblicos e
cristológicos.

A propósito ver
François Dreyfus, Jesus sabia que era Deus? Ed. Loyola 1987. René Latourelle, Existiu Jesus? Ed.
Santuário 1989.

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