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CBI of Miami 2
Estratégias Adicionais para Ensinar Comportamento Verbal
Prof. Iara Andriele Carvalho

Aula 1: Ensino avançado de intraverbais

Antes de iniciar um treino avançado de Intraverbais, é importante se


certificar se o estudante já apresenta alguns pré-requisitos importantes como,
por exemplo, emitir aproximadamente entre 50 a 100 tatos e repertórios de
discriminação auditivo visual bem estabelecidos; emitir um número considerável
de respostas de ouvinte por função, característica e classe (ROFCC), e já ser
capaz de realizar alguns intraverbais simples. Estes últimos inclusive, precisam
ser expandidos e generalizados antes de se avançar para os complexos. O treino
deve ser realizado de forma paralela a outros repertórios avançados, como
mando, outros tatos e outras formas de comportamento do ouvinte.
Se o aprendiz já adquiriu repertórios de completar a sentença, uma das
opções de treino é revertê-las de forma a gerar respostas mais complexos. Se
ele já responde a “Você dorme na... ?”, a pergunta poderia ser transformada em:
“Na cama você... ?”. Esta intervenção permitirá que o aplicador possa avaliar se
as respostas emitidas pelo estudante estão de fato sobre controle discriminativo
adequado e não são apenas respostas decoradas. Se o estudante demonstrar
dificuldade nestas inversões, é possível que ele ainda precise de mais tempo
generalizando e expandindo repertório.
Outro procedimento baseado em transferência de função é aproveitar as
respostas de ouvinte por função, característica e classe que o estudante já
desempenha, removendo os elementos visuais da tarefa. De forma que ele emita
a resposta, apenas através da pergunta. Se ele já é capaz de selecionar a bola,
ao mesmo tempo que diz “bola”, entre um conjunto de diferentes objetos quando
o aplicador pergunta “O que serve para brincar”, o aplicador pode remover os
objetos físicos da mesa e realizar a pergunta sem qualquer apoio visual
esperando assim que o estudante diga “bola”.
No próximo passo, é necessário inserir as perguntas “o quê?”, “onde?”,
“quem?”, “como?”. Uma estratégia simples de conduzir este processo é realizar

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uma tentativa das perguntas já trabalhadas em treinos dos intraverbais mais
simples e, após a criança responder, repetir a pergunta, mas agora inserindo a
pergunta trabalhada. Você pode perguntar ao estudante: “você escreve com
o...?”. Ele então responde “Lápis”. Você repete a tentativa, mas dessa vez o
estímulo discriminativo é “O que você usa para escrever?”. Espera-se que assim
ocorra uma transferência gradual à medida em que os diferentes exemplares
forem sendo treinados.
Quanto mais elementos houver em uma determinada pergunta, mais
complexa ela se torna e mais exigirá do repertório intraverbal do estudante. A
quantidade de palavras e complexidade da resposta exigida também é um
elemento que deve ser ponderado ao se planejar um bom treino de repertórios
intraverbais. Sendo assim, é importante planejar situações onde o estudante
consiga responder a perguntas simples a partir da categorização de elementos.
Desta forma, podemos aumentar o número de respostas possíveis para uma
única pergunta e evitar um responder estereotipado.
Você pode apresentar a figura de uma fazenda contendo diversos animais
e então perguntar: “Onde está o animal?”, quando o estudante responder. Você
pode pedir “me diga outro animal” e assim ir produzindo diversas respostas para
esta mesma pergunta. Depois, você deverá repetir esta mesma pergunta, mas
sem o apoio visual e aguardando o estudante fornecer o máximo de respostas
que conseguir antes de você fornecer a ajuda verbal “Me diga outro”. É
importante garantir diversas situações de generalização destes repertórios.
Um outro procedimento baseado nos repertórios de tato é apresentar um
determinado objeto que o estudante conheça, perguntar o que é o objeto e então
prosseguir com perguntas do tipo “Para que ele serve?”, “Aonde ele costuma
ficar?”, “Como ele é?”, dentre diversas outra mais que façam com que o
estudante tateia informações relevantes do objeto. Este tipo de treino, ensina o
estudante a dar mais informações a respeito das coisas que ele vê ou interage
em seu cotidiano.
Após passar pelas etapas de treino anteriores, é importante tornar mais
complexos as perguntas que são apresentadas ao aprendiz. Para isso
apresentaremos perguntas que terão mais de uma propriedade relevante que
terá de ser discriminada pelo estudante. Podemos começar a fazer perguntas

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como: “Qual dos animais tem quatro patas?”, “Quais são os meios de transporte
que andam na terra?”, “Onde compramos os remédios?”, dentre outras opções.
Observe que nestas perguntas há pelo menos duas propriedades que servem
como núcleo central. Respectivamente: animais e quatro patas; meio de
transporte e terrestre; comprar e remédios. Para dar uma resposta correta, o
estudante precisará discriminar corretamente estas duas propriedades e então
encontrar os elementos que atendem a esta necessidade.
Expandir os tópicos conversados com o estudante também é uma forma
importante de tornar as perguntas mais complexas. Perguntar onde ele mora,
quem são seus familiares, falar sobre as coisas que aconteceram na escola. Está
estratégia pode ser ainda mais difícil se o estudante demonstrar dificuldade em
falar de assuntos diferentes daqueles aos quais se interessa mais.
À medida que o estudante vai desenvolvendo competência para
responder a uma diferente gama de perguntas, vai tornando-se cada vez mais
possível expandir as conversações aumentando os turnos de diálogo. Observe
as seguintes perguntas: “Você foi ao parque ontem?”, “Quais brinquedos havia
lá?”, “Do que você brincou?”, “Quem estava com você por lá?”, “Depois de
brincar o que você fez?”. Ao responder todas estas perguntas, o estudante
estaria desenvolvendo um diálogo bastante interessante com o interlocutor.
Agora será necessário ensiná-lo a realizar perguntas. Mas este é assunto para
outra aula.

Aula 2: Substituindo estereotipia vocal

É comum observamos estereotipias vocais em crianças com transtornos


do espectro do autismo, sejam elas frutos da própria história de vida ou por
implantação de procedimentos errôneos ou inapropriados.
Estereotipias vocais são comportamentos vocais que não adquiriram controle
discriminativo adequado (Greer & Ross, 2008). Na literatura psiquiátrica elas são
chamadas de ecolalias. Quando estas estereotipias acontecerem sob controle
da fala de outra pessoa em condições muito próximas as que seriam esperadas
para um comportamento intraverbal, nós a denominamos de ecolalia imediata.

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Por exemplo, quando você pergunta para a criança “O que você quer?” e ela
responde “O que você quer?”
As respostas vocais estereotipadas que não acontecem após a fala de
outra pessoa, como por exemplo, aquelas que uma criança pode emitir enquanto
brinca sozinha ou em outros contextos onde não necessariamente há uma
audiência são chamadas de ecolalia tardia. Pode haver pelo menos três motivos
para a ocorrência delas: 1) respostas por repetição mecânica estereotipadas; 2)
respostas que produzem reforçadores generalizados e; 3) primeiros episódios
de fala direcionada para si mesmo (Greer & Ross, 2008)
Nos dois primeiros casos é possível utilizar um treino de tatos para
transferir a função e assim fazer com que a criança obtenha os mesmos
reforçadores através de comportamentos apropriados. Na terceira das situações,
as respostas são até desejáveis, mas situação de planejamento de transferência
de função para que elas fiquem sob controle de uma audiência podem ser
necessários.
Neste texto, veremos algumas estratégias para reduzir estas estereotipias
vocais e produzir comportamento verbal funcional.
Se o aprendiz já possuir um repertório adequado de leitura, é possível utilizar
dicas textuais para substituir as ecolalias imediatas por intraverbais funcionais
(Greer & Ross, 2008). Por exemplo, nas tentativas de programas intraverbais,
anote a resposta em um cartão. Você irá realizar a pergunta e então mostrar o
cartão para o aprendiz contendo a resposta esperada. Quando ele terminar a
leitura, apresente as consequências reforçadoras.
À medida que o aprendiz alcança êxito, é necessário esvanecer esta dica.
Para isso, é possível que o cartão apresente não mais a fala completa, mas
apenas parcial. Se a pergunta é: “Qual é o nome da sua escola?”, e a resposta
correta é “Escola Maria Teresa Augustino”. Na etapa de esvanecimento o cartão
poderia conter apenas “Escola Maria _____ ______” escrito. De forma que o
aprendiz tivesse de recordar do restante da frase.
Quando esta estratégia não logra êxito, seja porque o aprendiz não possui
repertório textual ou porque ele continua emitindo a ecolalia apesar da ajuda
textual, é possível que a dificuldade esteja na discriminação de estímulos
auditivos. De forma simplificada, é como se o aprendiz não entendesse

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perfeitamente o que está sendo dito, mas sabe que aquela é a situação ao qual
ele precisa emitir uma resposta vocal. Nesse caso, um treino intensivo de
repertórios de ouvinte pode auxiliá-lo a melhorar seu controle de estímulos
auditivo.
É importante que as ecolalias e comportamentos verbais disfuncionais
sejam tratados adequadamente antes de iniciar o treino de operantes verbais
mais complexos, como o intraverbal.

Aula 03 – O uso de comunicação aumentativa e alternativa

Muitas crianças com autismo e outros atrasos no desenvolvimento podem


demorar para desenvolver fala ou nunca conseguirem falar. Embora a fala seja
a forma mais desejada de comunicação em virtude de suas vantagens (é
econômica, portátil e mais facilmente modelada pela comunidade verbal), cabe
ressaltar que comportamento verbal não é apenas fala e existem outras formas
de proporcionar aos indivíduos com atrasos conseguirem interagir com o seu
meio.
Quando a criança demostra atraso em desenvolver a fala, uma opção a
se considerar é o uso de um sistema de comunicação aumentativa e alternativa.
Esse tipo de intervenção busca compensar os déficits no repertório de falante.
Por aumentativa, entende-se que essa intervenção irá tornar a comunicação
mais efetiva, inclusive ampliando os meios que o indivíduo já dispõe, como a
própria fala. Alternativa, por sua vez, implica na substituição temporária ou
permanente da fala. (Bondy e Frost, 2011)
Duas formas de comunicação alternativa utilizadas com mais frequência
são o uso de línguas de sinais e sistemas de comunicação por troca de figuras.
O uso de uma língua de sinais pode ser a primeira opção a ser considerada, pois
possui algumas vantagens. Assim como a fala, a língua de sinais é livre de
suporte ambiental e baseada na topografia, o que significa que há um sinal
específico para cada palavra, o que permite ao indivíduo se expressar com mais
riqueza de detalhes. Também existe uma comunidade verbal que a utiliza (a
comunidade surda) e por isso existe mais variedade de pessoas treinadas e

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materiais disponíveis. Se o indivíduo alvo da intervenção tiver boas habilidades
de imitação, se torna ainda mais fácil de ensinar.
Porém, o uso da língua de sinais também possui algumas desvantagens.
É necessário que pais e professores sejam treinados e que se comuniquem com
a criança usando a língua de sinais para servirem como modelo. Além disso,
cada sinal deverá ser ensinado isoladamente, o que pode se tornar um pouco
custoso.
Outra forma de comunicação aumentativa e alternativa é o PECS (Picture
Exchange Communication System ou Sistema de Comunicação por Troca de
Figuras, em tradução simples). O PECS é uma estratégia de ensino para
repertórios de comunicação funcional. Através dele, o indivíduo aprende a se
expressar a partir da utilização de figuras. A comunicação funcional é definida
como comportamento, cuja forma é definida pela comunidade, dirigido a outra
pessoa, que por sua vez responde com recompensas diretas ou sociais.
O PECS foi desenvolvido originalmente para auxiliar crianças em idade
escolar diagnosticadas com autismo. Ao criar oportunidades de comunicação
funcional, elas conseguiam participar com muito mais desenvoltura destes
ambientes, o que permitiu alguns avanços importantes na inclusão. Atualmente
o PECS é utilizado também com diversos públicos, inclusive adultos que por
processos de adoecimento ou trauma acabaram perdendo a fala e precisam
continuar se comunicando.
O principal objetivo do PECS é garantir que o indivíduo possa se
comunicar de forma funcional com as pessoas ao seu redor. Um dos mais
importantes benefícios de se estabelecer uma estratégia funcional de
comunicação é reduzir os comportamentos inapropriados. Frost e Bondy (2009)
destacam três funções principais destes comportamentos: 1) ganhar acesso a
algum tipo de reforço, na maioria das vezes social; 2) evitar ou escapar de
alguma condições do ambiente e; 3) eles também podem ser induzidos por
eventos inesperados como a eliminação ou redução acentuada de recompensas
esperadas, dor ou eventos semelhantes, ou até mesmo a introdução de
poderosas recompensas.
No ensino do PECS são priorizadas 9 habilidades de comunicação
críticas: 1) pedir assistência ou auxílio para uma tarefa;

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2) pedir um item desejado;
3) pedir um intervalo ou pausa;
4) rejeitar algo;
5) afirmar algo;
6) responder adequadamente à uma solicitação para aguardar alguma
coisa;
7) responder a instruções funcionais como “pegue seu sapato”, ou “ache
seu copo”;
8) responder a dicas de transição;
9) seguir programas envolvendo rastreio visual (rotinas visuais,
pareamento ao modelo e etc.).
Uma intervenção baseada em PECS sempre se inicia a partir da
investigação dos repertórios atuais do aprendiz com sua família e círculo social
próximo, como a escola por exemplo. Este esforço de obter informação garante
que um plano de ensino adequado ao nível do aprendiz seja preparado, sem
ignorar as capacidades que ele já possui ou ignorar necessidades importantes.
Neste processo avaliativo, situações onde haja comportamentos comunicativos
são investigadas para detecção de competências como a capacidade de se guiar
por dicas visuais, como gestos do interlocutor.
A partir daí se trabalha para construir um ambiente propício a
aprendizagem nos lugares de convívio do aprendiz. É importante que os
ambientes produzam diversas oportunidades de aprendizado, de forma que o
ele possa treinar seu repertório de forma contínua na rotina. Conforme apontado
anteriormente, ter clareza das habilidades que o aprendiz possui ou não possui,
auxilia a planejar ambientes aos quais ele tenha mais chance de sucesso, o que
pode manter seu interesse e engajamento nas diferentes tarefas propostas. Por
último é importante presumir que haverá a comunicação. É necessário planejar
as situações e dar tempo adequado para que o estudante possa emitir o
comportamento de interesse.
Por outro lado, alguns fatores podem dificultar a aprendizagem do
repertório. Um deles é o da antecipação ambiental: se tudo estiver facilmente
acessível para o aprendiz ele não precisará se comunicar para conseguir as
coisas que precisa, logo o número de oportunidades de aprendizado será

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bastante reduzido, tornando mais lento todo o processo. Um outro problema
comum é quando a comunidade verbal antecipa a solicitação do aprendiz,
entregando-lhe os itens antes que ele precise emitir algum tipo de resposta de
comunicação (antecipação não verbal), ou mesmo antecipando verbalmente
para ele o que ele está pedindo, de forma que ele só precise executar um
comportamento de comunicação parcial, como uma confirmação, por exemplo.
Para a realização da intervenção, é fundamental mapear com clareza os
reforçadores que serão utilizados pelo aprendiz. Pois estes, serão os objetos que
irão motivá-lo a emitir comportamentos de comunicação. Sem esta motivação,
estes comportamentos não acontecerão.
O treino inicia-se na Fase I, onde o estudante aprende a trocar os
reforçadores por figuras e é aprimorado na Fase II, onde ele fortalece este
repertório. A cada nova fase ele irá aprender a comunicar de formas cada vez
mais complexas, seja aumentando seu vocabulário de forma que possa pedir
coisas cada vez mais complexas como comentários, atributos. Durante as
primeiras etapas, a comunicação sempre parte do estudante que deve iniciá-la
sob controle de variáveis motivacionais. Apenas na Fase V, ele passa então a
responder perguntas, começando pela pergunta “O que você quer” e avançando
para variadas formas. É muito importante que a comunidade verbal do aprendiz
(cuidadores, professores e pessoas próximas) aprendam também a utilizar o
PECS de modo consistente para que a comunicação seja de fato funcional e
efetiva.
Algumas vantagens do uso do PECS é que as figuras são facilmente
compreendidas pelas outras pessoas, o indivíduo precisa aprender poucas
respostas como, apontar, pegar e organizar as figuras na tira de sentenças. As
desvantagens é que é necessário um suporte ambiental sempre presente, como
a pasta ou aplicativos de celular. Também não existe uma comunidade verbal
que modelo esse tipo de resposta de comunicação, pois as pessoas usam a fala
para se comunicar com alguém que usa PECS. Além disso, à medida que a
sentença fica mais complexa as figuras se tornam mais abstratas. (Sundberg &
Partington, 1988).
Dadas as opções, a decisão sobre qual sistema de comunicação utilizar
vai depender do repertório do aprendiz. Se ele tiver impedimentos motores e

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dificuldades nas habilidades de imitação, recomenda-se o uso do PECS. Porém,
a língua de sinais se aproxima mais de formas de comunicação mais complexas,
embora requeira treinamento mais elaborado. O que não se pode fazer de modo
algum é deixar a pessoa sem uma forma de se comunicar e poder controlar de
forma mais efetiva seu ambiente e reforçadores.

Aula 4: A Análise do Comportamento Verbal

A Análise do Comportamento Verbal é uma das vertentes da Análise do


Comportamento Aplicada voltada a pesquisa e aplicação dos conceitos tratados
por Skinner no livro comportamento Verbal de Skinner (1957) em pessoas com
autismo e outros problemas que envolvem déficits nas habilidades verbais.
Seus autores sugerem algumas vantagens decorrentes de tomar por base a
definição de Skinner de comportamento verbal (Sundberg & Michael, 2001;
Greer & Ross; 2008). A primeira delas é a distinção entre os repertórios de
falante e o de ouvinte. As abordagens tradicionais, ao tratá-los como linguagem
expressiva e receptiva, dão a entender que eles são manifestações diferentes
do mesmo processo subjacente: a linguagem. Para Skinner, no entanto, esses
são dois repertórios diferentes e a aquisição de um não implica necessariamente
na aquisição do outro, embora possa ajudar. Desse modo, a criança deverá ser
ensinada a como se comportar diante de estímulos verbais, ou seja, responder
como ouvinte e a como se comportar como falante.
Além disso, ao se adotar uma unidade de análise funcional para o
comportamento verbal que inclui a especificação das variáveis antecedentes que
evocam a resposta, a resposta em si e as consequências (os diferentes arranjos
de contingências são os operantes verbais), podem ser criadas oportunidades
adicionais para que a criança com atraso seja exposta adequadamente e
hierarquicamente a estímulos verbais e aos eventos ambientais relacionados.
Isso é de extrema relevância, pois muitos dos erros cometidos no ensino de
crianças com autismo vêm de subestimar a complexidade de relações verbais e
tentar ensinar palavras e significados sem atentar as diferentes fontes de
controle que influenciam aquele tipo de verbalização. Por exemplo, ensinar a
criança a dizer “bola amarela” sem antes garantir que ela tenha aprendido a

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discriminar somente “bola”, pode geral o efeito indesejado de a criança dizer
“bola amarela” para nomear qualquer bola.
Outra importante contribuição dessa abordagem é a noção de que cada
operante verbal deve ser ensinado separadamente, ou seja, quando se ensina
uma palavra como mando para uma criança, a mesma palavra não emergirá
como um tato sem que isso seja treinado, pois os operantes são funcionalmente
independentes. No caso do autismo isso se torna mais óbvio, pois algumas
crianças autistas conseguem, por exemplo, nomear diversos objetos (tato),
porém não conseguem dizer os nomes desses objetos como resposta a uma
pergunta (intraverbal). Desse modo, após o ensino são feitos procedimentos
para a transferência de função que consistem em mudar o tipo de antecedente
e consequência de uma resposta verbal, transformado, por exemplo, uma
resposta inicialmente adquirida como mando em um tato. Outras contribuições
mais específicas que podem ser citadas adicionalmente a essas são sobre como
se dá uma avaliação efetiva do repertório verbal da criança, a importância de
começar pelo treino de mandos nas intervenções precoces, a pertinência das
operações motivadoras, a relevância do ensino de intraverbal e a função do
reforçamento automático na aquisição do comportamento verbal.
Considerando que os operantes verbais formam repertórios distintos e sendo
eles a unidade de análise do comportamento verbal, uma avaliação do
comportamento verbal poderá indicar mais facilmente em que repertório está o
atraso. Por exemplo, se a criança tem dificuldades no ecoico, a probabilidade de
se beneficiar de uma dica ecoica para a emissão dos outros operantes é bastante
baixa. Se ela não tateia, então o controle por estímulos não-verbais precisa ser
investigado, assim como, o controle por estímulos verbais no caso do intraverbal.
A importância de começar pelo ensino de mando, por sua vez, se dá em
virtude do fato de que o antecedente da emissão de um mando é uma operação
motivadora, ou seja, o falante pede aquilo que quer ou precisa, sendo mais fácil,
portanto, que a criança se engaje nesse tipo de verbalização. A consequência é
específica e o beneficia diretamente, diferente dos demais operantes verbais
cujos reforços são generalizados ou não específicos. Mesmo em crianças
típicas, o mando é a primeira função verbal adquirida e consiste em pedir

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reforçadores incondicionados como comida, desenvolvendo-se para formas
mais avançadas posteriormente.
Como o foco da análise é a função e não a forma do comportamento, é
possível classificar como mando muitos dos comportamentos inadequados que
crianças com autismo emitem para obter itens, tais como chorar, jogar-se no
chão. Nesse sentido, o ensino de mandos é fundamental na diminuição de
comportamentos problemas e na melhoria da qualidade de vida da criança e de
sua família, pois ao adquirir esse repertório a criança pode controlar melhor seu
ambiente físico e social. Essa possibilidade pode aumentar o engajamento da
criança no treino de mando e, posteriormente, de outros operantes. Além disso,
o ensino de mando é importante para começar a estabelecer os papeis de
ouvinte e falante. Todavia, o ensino de mando nem sempre recebe a atenção
que merece e um dos motivos é que, arranjar operações motivadoras para que
a criança emita mandos é mais difícil do que apresentar estímulos para a criança
selecionar como ouvinte, por exemplo.
As operações estabelecedoras desempenham um papel importante na
aquisição de mandos mais complexos, como mandos por informação, e ajudam
no treino dos demais operantes verbais participando como uma variável
antecedente a mais (controle múltiplo) no ensino de ecóicos, tatos e intraverbais.
Na medida em que uma palavra é inicialmente aprendida como mando, a
operação estabelecedora pode ser enfraquecida de modo que a resposta passe
a ocorrer sobre controle discriminativo, adquirindo outra função, ou seja,
tornando-se outro operante verbal.
A relevância do ensino de intraverbais, por sua vez, se dá pelo fato de que
tal repertório auxilia em outros comportamentos verbais e não-verbais e, em
níveis mais avançados, ele contribui no desenvolvimento da conversação. O
repertório de intraverbal nos permite falar sobre objetos e eventos que não estão
presentes. Muitos dos conhecimentos acadêmicos são ensinados como cadeias
intraverbais e elas estão na base do funcionamento intelectual. Muitas crianças
com autismo apresentam dificuldades nesse repertório, por exemplo, sabem
dizer uma palavra como tato ou mando, mas não em forma de resposta a uma
pergunta.

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O reforçamento automático ocorre quando o indivíduo produz
consequências reforçadoras para si próprio. Ele desempenha um papel tanto no
balbucio inicial da criança, visto que os sons que ela emite são reforçados por
serem parecidos com os sons emitidos por sua mãe, mas também em repertórios
mais complexos como as regras gramaticais. Nesse caso, o reforçamento
automático consiste na paridade entre os sons que a pessoa produz com os das
outras pessoas no ambiente. Desse modo, o foco deve ser em desenvolver
formas efetivas de comunicação em crianças com autismo e não em correção
gramatical, visto que tal repertório pode ser adquirido através de reforço
automático.
A atenção aos aspectos mencionados e a hierarquização e priorização
adequada do ensino de operantes verbais pode evitar muitos efeitos indesejados
no comportamento verbal de crianças com autismo, como fala não funcional,
pouca espontaneidade, dificuldades em manter diálogos, dentre outros.

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Ensino por tentativas discretas e naturalístico

O ensino por tentativas discretas é uma das principais estratégias de


ensino utilizadas na análise do comportamento aplicada. Ele possibilita dividir
uma sessão de treino em unidades de ensino que podem facilmente ser
mapeadas e contabilizadas, garantindo que o profissional consiga registrar o
resultado de cada uma das oportunidades de ensino e acompanhar o
desenvolvimento do estudante (Sundberg & Partington, 1998)..
No ensino através das tentativas discretas, primeiro o aplicador garante a
atenção da criança removendo possíveis elementos distratores do ambiente de
atendimento. Ele então apresenta um estímulo discriminativo de forma clara e
tomando os devidos cuidados para que este não seja ambíguo, ou seja, produza
uma resposta diferente daquela que foi planejada. Ele então aguarda o estudante
responder, fornecendo a ajuda adequada de acordo com o planejamento de
ensino do estudante. Caso o estudante não consiga emitir o comportamento de
interesse, um procedimento de correção é realizado, visando estabelecer a
aprendizagem daquele repertório.
O treino por tentativas discretas se caracteriza então como uma estratégia
de ensino bastante estruturada, ao qual cabe ao aplicador iniciar cada
oportunidade de aprendizagem, garantindo assim um fluxo rápido de
oportunidades de ensino, o que torna o processo mais intensivo. Além disso, o
treino por tentativas discretas produz contextos artificiais para comportamentos
que tem baixa oportunidade de acontecer em contextos naturais. O que a
princípio pode parecer uma grande desvantagem, pode tornar-se uma grande
vantagem se usado com o planejamento adequado. Isto facilita que o aprendiz
possa aprender nome de coisas que lhe são importantes no cotidiano, por
exemplo, mas aos quais ele não demonstra a motivação necessária para que
estes elementos sejam adicionados num treino de mandos, por exemplo.
O treino naturalístico, por sua vez, baseia-se em aproveitar os interesses
naturais da criança para ensinar repertórios que lhe sejam úteis. Aqui, boa parte
das oportunidades de aprendizagem são iniciadas pelo estudante e não pelo
aplicador. Cabe ao aplicador, planejar situações de ensino onde o aprendiz

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possa aprender os repertórios que precisa aprender, dentro das atividades pelo
qual manifesta interesse.
Apesar de ser menos estruturado, é fundamental ter em vista que o treino
naturalístico também segue os mesmos princípios e processos esperados para
uma intervenção baseada em análise aplicada do comportamento. Ou seja, é
necessário realizar registro para posterior análise, os repertórios que serão
ensinados para a criança precisam ser pensados e planejados com a devida
antecedência, além de que a própria situação de ensino escolhida pelo estudante
precisa ser previamente pensada e estruturada de forma que produza os
repertórios que serão trabalhados.
Você encontrará um detalhamento mais claro sobre as diferenças entre
diferentes atributos do treino por tentativa discretas e naturalístico na tabela 1 –
Comparativo entre Treino por Tentativas Discretas e Ensino Naturalístico.

Tabela 1 – Comparativo entre Treino por Tentativas Discretas e Ensino


Naturalístico.
Ensino por tentativa discreta Ensino naturalístico

Estímulos a. Escolhidos pelo terapeuta. a. Escolhidos pela criança.


b. Repetido até que o critério seja b. Variam depois de algumas
atingido. tentativas.
c. Fonologicamente fácil, seja ou
não funcional em ambiente natural.
Interação a. Terapeuta segura o item (não a. Terapeuta e criança brincam
necessariamente relacionado ao com o estímulo (isto é, o estímulo
som que se requisita). é
funcional).
Resposta a. Respostas corretas, ou a. Modelagem mais “solta”:
aproximações sucessivas, são tentativas de verbalizar são
reforçadas. reforçadas.
Consequência a. Reforçadores tangíveis + sociais. a. Reforçador natural + social.

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Mas então? Qual é a melhor estratégia para o ensino de crianças com
atraso de desenvolvimento? A literatura aponta que ambas as estratégias são
intercambiáveis (Sundberg & Partington, 1998). Para obter uma maior
abrangência entre os pontos fortes de cada uma das estratégias, o ideal é que
os treinos oscilem entre momentos de ensino naturalístico e momentos de ensino
por tentativa discreta.
Um determinado tipo de treino pode obter melhores resultados para o
ensino de um repertório do que para outro, dependendo das características
necessárias para este tipo de ensino. Além disso, um estudante pode se
beneficiar mais de uma determinada estratégia do que de outra.
Na Tabela 2, é apresentado uma proposta de utilização entre as
diferentes estratégias de ensino de acordo com o repertório a ser ensinado para
o estudante.

Tabela 2 – A utilização das diferentes estratégias de ensino

Fase 1. Ensino naturalístico > Ensino Foco em mandos iniciais, pareamento, seguir
por tentativas discretas comandos e controle de estímulos.

Fase 2. Ensino naturalístico = Ensino Foco no mando, tato, ouvinte, imitação, ecóico
por tentativas discretas e intraverbal.

Fase 3. Ensino por tentativas discretas Foco em atividades acadêmicas e


> desenvolvimento de habilidades específicas.
Ensino naturalístico

Fase 4. Ensino naturalístico > Ensino Foco na aprendizagem de instruções em grupo,


por tentativas discretas de pares e sem um ambiente de aprendizagem
tão estruturado.

Fase 5. Ensino por tentativas discretas Focus em habilidades acadêmicas e


> características de aprendizagem estruturada.
Ensino naturalístico

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Em suma, é necessário possuir uma boa competência em ambas as estratégias
e respeitar a individualidade de cada aprendiz, aplicando cada estratégia e
analisando a qualidade dos resultados produzidos.

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Referências:

Greer, R. D., & Ross, D. E. (2008). Verbal Behavior Analysis: Inducing and
expanding complex communication in children with severe language delays.
Boston: Allyn & Bacon.

Frost, Lori; Bondy, Andy. (2009) The Picture Exchange Communication System:
Training Manual. 2ª Edição. Newark: Pyramid Educational Products,
Incorporated, 2009.

Frost, Lori; Bondy, Andy. (2011) A Picture’s Worth: PECS and other visual
communication strategies in autismo. 2ª edição. Woodbine House,

Sundberg ML, Michael J. (2001). The benefits of Skinner's analysis of verbal


behavior for children with autism. Behav Modif.;25(5):698-724.
doi:10.1177/0145445501255003

Sundberg, M. L., & Partington, J. W. (1998). Teaching language to children with


autism and other developmental disabilities. Pleasant Hill, CA: Behavior
Analysts.

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