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Arte-Educação e processos mentais

José Glaucio Ferreira de Figueiredo1

A Arte enquanto foco, na busca e compreensão da relação entre mente e cérebro,


considerando que a Arte é um processo mental que se materializa sob a regência do
cérebro, remonta a Platão, com a discussão sobre a supremacia do mundo das ideias, dos
pensamentos sobre o mundo sensível. Contudo, como problema, mente-cérebro
formalmente enunciado aparece apenas com René Descartes (1596-1650). Descartes
instaurou um problema de grandes proporções: o problema mente-cérebro. Para ele o
mental seria indivisível, portanto, não possuiria espacialidade, enquanto o corporal, o
cérebro, seria material e, portanto, extensível, dotado de espacialidade. Afirmava também
que a mente e os estados subjetivos seriam inescrutáveis e não passíveis de observação.
Com o advento das técnicas de neuroimagem (conjunto de técnicas de diagnóstico
médico que buscam obter imagens do encéfalo, como meio de aferição da atividade
cerebral), se sobressai a perspectiva monista, uma vez que estabelecem o paralelo entre
funções mentais e atividade em determinadas regiões cerebrais.
Atualmente duas visões polarizadas de mundo parecem nortear a
contemporaneidade: a visão pela dimensão subjetiva, apoiada pelas humanidades e pelas
artes, e a visão do mundo pela ciência.
Algumas pesquisas específicas da relação Arte e Neurociência, dentro da academia
enveredam nesta seara, um exemplo é a pesquisadora Cury (2007), com seu trabalho
“Relações entre a neurociência e o ensino e aprendizagem das artes plásticas”, que visa
estabelecer as possíveis relações entre as neurociências e o ensino/aprendizagem das artes.
Essas relações se dão a partir da análise conceitual e argumentativa de temas que são
comuns a ambas as áreas, como percepção, imaginação, emoção e cognição. A autora
sugere que as pesquisas sobre os processos mentais subjacentes às práticas de dança,
música, artes visuais, teatro podem fornecer dados para ampliar a compreensão da
cognição humana e fornecer subsídios para arte-educadores.
Conhecer mais acerca do funcionamento neural é conhecer mais sobre o
comportamento do homem, sobre a relação entre afeto e cognição, entre emoção e
motricidade, atenção e memória e, consequentemente, sobre sua capacidade de

Autor Psicólogo (UFPB), Mestre em Serviço Social (UFPB), Doutor em Ciências da Educação
1

(UAA), Pós Doutor em Gestão e Inovação Educativa. E-mail: glauciofigueiredo@bol.com.br;


aprendizagem. Reconhecendo os dados da neurociência como significativos para os
processos de ensino/aprendizagem em arte, criam-se caminhos para uma nova perspectiva
didática, resultando inclusive, em novas abordagens metodológicas.
Estudar a ação do sistema nervoso na construção do comportamento, da recepção
dos estímulos e na formação da aprendizagem, constitui um universo à parte.
A Arte enquanto processo mental encontra no campo na neurociência, um lastro de
elementos que permeiam sua estrutura constitucional em toda sua dimensão funcional. É
impressionante visualizar as inúmeras possibilidades de conexões neurais realizadas no
encéfalo para que um simples movimento de criação artística possa ser efetuado.

Arte e neurociência
Para entender a relação Arte e neurociência, se faz necessário compreender algumas
funções do cérebro, começando pelo encéfalo. O encéfalo funciona em um sistema
integrado, raramente uma parte funciona isolada.
Por exemplo, o homem, ao tocar um violino, ativa simultaneamente várias áreas
encefálicas (córtex motor, córtex sensorial e áreas de associação), para realizar a mesma
ação.
Tocar violino é a expressão de um comportamento complexo. O comportamento
pode ser definido como qualquer tipo de movimento em um organismo vivo. Assim sendo,
o comportamento tem tanto uma causa como uma função. Embora a flexibilidade e a
complexidade de um comportamento possam variar muito, o encéfalo é o órgão que exerce
o controle destas funções. O encéfalo pode ser comparado a um maestro, que organiza e
utiliza continuamente a atividade sensorial e motora para executar uma sinfonia. Neste
exato momento, o seu encéfalo está executando a sua sinfonia! (Cury, 2007).
O sistema nervoso age fazendo a interação do organismo com o ambiente percebe e
identifica as condições ambientais externas, bem como as condições reinantes dentro do
próprio corpo, elaborando respostas que adaptem a essas condições.
O cérebro é um conjunto de estruturas que se situa no topo da coluna vertebral. A
parte de evolução mais recente do cérebro é o neocórtex, que é mais desenvolvido nos
humanos do que nos outros animais, é uma camada fina de neurônios que envolvem a
superfície do cérebro. É aí que o pensamento ocorre e onde residem três quartos dos
neurônios de um cérebro humano.
Os estados mentais são produzidos por padrões de atividade neural, o
conhecimento, definido como aquilo que dirige o fluxo cognitivo de um estado mental para
outro, deve ser codificado nas conexões neurais, a entrada de qualquer novo conhecimento
de longo prazo no cérebro requer a modificação de sua anatomia.
A expansão e refinamento das funções do encéfalo foram desenvolvidas através das
vivencias com a experiência subjetiva-representacional, desde o princípio da humanidade
onde a representação de uma mão, com gordura e carvão, impressa na parede da caverna,
criou uma transposição de realidade, impulsionou o processo mental de reorganização
mental para aceitação dessa experiência como aprendizagem. Esse resquício de quebra dos
limites do real gerou a potencialização de refazer a experiência com novas possibilidades
de representação, a experimentação do pigmento sobre a mão, mostrou uma representação
oposta, e ampliou o universo de representações com animais e cenas mais estruturadas.
Essa experiência, provavelmente, produziu reorganizações neurais no artista
primitivo. As representações produzidas podem ter induzido os expectadores a
vivenciarem através da observação, experiências de representações secundarias,
percebendo essas representações e reorganizando a função mental para convivência com
essa nova “realidade”. Pode-se estender a partir dessa dedução, que o limiar que separou o
ser humano dos outros animais foi a capacidade de “representação” da natureza. É
impressionante o avanço do desenvolvimento do comportamento humano a partir dessa
fase, o raciocínio se complexificando com processos mentais se reestruturando a cada nova
experiência dedutiva. Os processos de abstração que transformaram a humanidade estão
ligados aos fundamentos da Arte.
As funções mentais complexas que associam o aprender por imitação,
compreendidas a partir das recentes descobertas dos “neurônios-espelhos.
Essa função foi descoberta por acaso, há cerca de dez anos. Três cientistas italianos
da Universidade de Parma conduziam um experimento com um macaco. Instalaram fios
numa área de seu cérebro que é responsável pelo movimento. Sempre que o macaco
pegava ou movia um objeto, determinadas células cerebrais disparavam. O monitor em que
os eletrodos estavam ligados registrava a área de localização desses neurônios e emitia um
sinal. Como era verão, um dia um aluno entrou no laboratório tomando um sorvete.
Quando o rapaz levou a casquinha à boca, o monitor começou a apitar. Foi aí que os
cientistas se espantaram: o macaco permanecia imóvel. A cena voltou a se repetir com
outros alimentos, como amendoins e bananas. Portanto, a resposta de seus neurônios-
espelhos só podia vir da ação de outra pessoa. Os cientistas perceberam que as células
cerebrais disparavam quando o macaco via ou ouvia alguém fazer algo ou, ainda, quando
ele mesmo realizava uma tarefa. Assim chegaram às primeiras conclusões sobre a
capacidade dos neurônios-espelhos.
Descobriu-se que os seres humanos têm neurônios-espelho muito mais perspicazes,
flexíveis e altamente evoluídos do que os encontrados nos macacos, um fato que teria
resultado na evolução de habilidades sociais mais sofisticadas nos seres humanos.
Espalhados por partes fundamentais do cérebro – o córtex pré-motor e os centros
para linguagem, empatia e dor – esses neurônios agem quando realizamos uma
determinada ação e nos momentos em que se observa alguém realizar essa ação. Na sua
forma mais básica, isso significa que ensaia ou imita mentalmente toda ação observada.
Segundo a descoberta dos neurônios espelho que a observação do movimento
permite partilhar a experiência, senti-la como se fosse do observador. Num certo sentido,
isto significa que, mentalmente, há movimentos com a observação do movimento. Assim, a
descoberta dos neurônios espelho implica demonstrar que são as aprendizagens e
experiências sensório-motoras que fazem sentir e compreender as imagens vistas.
O cérebro humano tem múltiplos sistemas de neurônios-espelho especializados em
executar e compreender não apenas as ações dos outros, mas suas intenções, o significado
social do comportamento deles e suas emoções.
Estudos recentes têm mostrado que eles são fortemente relacionados com a
capacidade de aprender. Além de responder a ações dos outros (daí o nome espelho), eles
podem ser a chave para descobrir como o ser humano começa a sorrir, andar, falar e até
dançar. Num plano mais profundo, pode explicar a relação entre as pessoas e como as
diferentes culturas são entendidas. "Compreender as intenções dos outros e ter empatia
pelas emoções deles são as principais funções descobertas até o momento", disse a ÉPOCA
o neurocientista Marco Iacoboni, da Universidade da Califórnia, um dos principais
especialistas no assunto.
Por isso, a descoberta das funções dos neurônios-espelhos vem sendo considerada
um dos principais feitos da neurociência. Há cientistas que comparam o nível de
importância desses estudos ao das células-tronco. O cérebro tem cerca de 100 bilhões de
neurônios - dos quais 5% são espelhos. Não são muitos, mas, se tudo o que se estuda sobre
eles for comprovado, esses cinco bilhões respondem por muito do que somos.
Os neurônios-espelho nos permitem captar a mente dos outros não por meio do
raciocínio conceitual, mas pela simulação direta. Sentindo e não pensando. A descoberta
está sacudindo várias disciplinas científicas, alterando o entendimento de cultura, empatia,
filosofia, linguagem, imitação, autismo e psicoterapia. E também de fatos do cotidiano.
Toda a linguagem é baseada em neurônios-espelho, segundo Michael Arbib,
neurocientista da University of Southern California. Tal sistema, encontrado na parte
frontal do cérebro, contém circuitos superpostos para a língua falada e a linguagem dos
sinais.
"Quando você me vê executar uma ação, você automaticamente simula a ação no
seu cérebro", diz Marco Iacoboni, neurocientista da Universidade da Califórnia, Los
Angeles (UCLA), que estuda o tema.
Encontradas em várias partes do cérebro, essas células disparam em resposta a
cadeias de ações relacionadas a intenções.
"Mas agora vemos que os neurônios-espelho absorvem a cultura diretamente, com
cada geração ensinando a próxima por meio do convívio social, imitação e observação",
completa Patricia Greenfield, psicóloga da UCLA.
Os neurônios-espelhos são especializados em imitar. Novos estudos mostram como
isso afeta nosso comportamento, como essas células cerebrais nos levam a agir de acordo
com o que os outros fazem, e não apenas com o que o próprio cérebro manda, e ainda, tudo
o que vemos alguém fazer, fazemos também, nem que seja apenas em nossa mente. Os
neurônios-espelhos leem a mente dos outros. E influenciam nosso comportamento a partir
da leitura.
A arte compreendida sob a perspectiva das funções cerebrais complexas demonstra
a importância das vivências artísticas para o exercício da sensibilidade e das
reorganizações das estruturas neurais impulsionadas pelas composições artísticas. A
composição artística em sendo um conjunto de estímulos organizados de forma equilibrada
e harmônica, instiga no observador “um entrar” nessa estrutura e vivenciar, dependendo da
linguagem artística, uma exercício da sensibilidade, onde a mente é conduzida por
experiências no nível de deduções, sensações e sentimentos que se organizam em uma
nova percepção experimental fora da vivência cotidiana. A Arte, geralmente, causa uma
sensação de prazer, onde os estímulos da atividade artística provocam a produção de
hormônios específicos, portanto, uma atividade de necessidade individual e coletiva de
equilíbrio mental. Daí, os principais eventos sociais de convívio social serem recheados de
atividades artísticas, como também a Arte está em todas as formas de relações
mercadológicas, em propagandas onde as estratégias de convencimento usam a Arte como
meio de sensibilização. Independente do uso, a Arte é uma atividade onde o ser humano
embala a mente.
A Arte na educação é um caminho para definir e ampliar horizontes.

Estados emocionais e Arte

Para entender a natureza humana ou sua relação com o mundo, tem que se
considerar a vida emocional das pessoas. As emoções têm um princípio neural, são
expressas como estados de felicidade, tristeza, medo, ansiedade, culpa, paixão. A
linguagem, utilizada para denominar essas emoções, é rica e variada. O desafio da
neurociência é estudar os componentes da comunicação neuronal necessários para gerar os
estados emocionais. Assim como são também as emoções que estão no âmago da
expressão artística, desde a poesia, passando pelo cinema, até a pintura. De fato, uma razão
pela qual as pessoas apreciam a arte é que ela evoca emoções, que independentemente de
serem agradáveis ou desagradáveis, foram habilmente captadas, reordenadas e transmitidas
nas obras de arte (Cury,2007).
Os estudos de Damásio (1998) enfatizaram um aspecto importante da ligação entre
emoção e fatores cognitivos, em sua hipótese do marcador somático, determina que sinais
“marcadores” surgidos de emoções e sentimentos agem para guiar o comportamento e as
tomadas de decisões, em um processo que se estabelece normalmente de modo
inconsciente. Segundo essa hipótese as emoções estão normalmente ligadas a pensamentos,
decisões e ações de uma pessoa.
O contato do expectador com uma produção artística provoca sensação (ação de
sentir), os estímulos são captados, interpretados e a reação emocional provocada é
resultado do construto do observador com relação a suas vivências, que são provocadas
pelo estímulo artístico.

Arte e imaginação
Imaginação é a representação mental das coisas (objetos, eventos, ambientes, etc.)
que presentemente não estão sendo percebidas pelos órgãos sensoriais, é um fenômeno
cognitivo, traduz a habilidade em criar e experimentar situações virtuais, de combinar
informações de forma pouco comum ou de inventar imagens mentais.
A imaginação tem o potencial de representar coisas que jamais haviam sido
observadas pelos seus sentidos em momento algum, As imagens mentais podem, mesmo,
representar coisas que absolutamente não existem fora da mente da pessoa que as cria, essa
condição desenvolvida pelo ser humano e experienciada através da Arte, coloca essa
atividade como propulsora do desenvolvimento das ideias, e das criações que
transformaram o mundo.
A maioria das pesquisas sobre a imaginação, na psicologia cognitiva, focalizou a
imaginação visual, a representação mental do conhecimento visual (p.ex., objetos ou
ambientes) não-visíveis presentemente aos olhos. Pesquisas recentes demonstraram que a
imaginação pode envolver representações mentais em quaisquer modalidades sensoriais
não apenas na modalidade visual. Pelo menos hipoteticamente, cada forma de
representação mental está sujeita à investigação e alguns cientistas estudaram cada uma das
representações sensoriais. Pesquisas que utilizam as técnicas de neuroimagem funcional
têm mostrado, repetidamente, que o ato de imaginar ou visualizar, ativa muitas das mesmas
regiões do cérebro ativadas pela percepção, (Cury, 2007).
As práticas da Arte-Educação nas escolas sempre fizeram uso da imaginação como
parte importante no processo de aprendizagem, mas o uso dos resultados de pesquisas
científicas referentes ao processo cognitivo da imaginação pode trazer informações
valiosas a serem incorporadas na área pedagógica. A organização das práticas com
estímulos sendo ministrados de acordo com o desenvolvimento perceptivo dos alunos,
onde as atividades sejam ministradas com um conjunto elementos previamente
estabelecidos, seguindo as especificidades de cada linguagem, inter-relacionadas enquanto
diversidades representativas, estimulando de forma mais direcionada e produtiva na
expansão da criatividade e cognição.
A Arte transformou a humanidade e pode de forma bem aplicada, transformar a
educação.

Entre nossas características culturais únicas, a arte é talvez a mais


nobre invenção humana. Imaginem, por exemplo, a necessidade de
recrutamento de bilhões de neurônios, milhares de músculos,
imensa capacidade sensorial, visual e auditiva, a espantosa
capacidade de memória envolvida para saber de cór e executar um
concerto para tocar uma serenata de Chopin ao piano. São bilhões e
bilhões de neurônios, treinados ao longo de anos de prática,
espalhados por todas as regiões do cérebro, e trabalhando em
harmonia para produzir um resultado de uma complexidade
inimaginável. (CARDOSO & SABBATINI, 2000).

A imaginação é o receptáculo onde as imagens captadas pela percepção, se


agrupam num processo de lógica organizativa, potencializadas segundo os construtos
vivenciais de cada pessoa, e se expressam numa linguagem interativa na busca constante
do equilíbrio e harmonia com o meio.

Percepção e potencialização artística


Compreender como se processa a percepção, como se relacionam aspectos
psicológicos e neurofisiológicos na captação, interpretação e construção dos estímulos
sensoriais é essencial na compreensão do próprio processo criativo. Para Arnheim (1986)

Longe de ser um registro mecânico de elementos sensórios, a visão prova


ser uma apreensão verdadeiramente criadora da realidade... Toda
percepção é também pensamento... toda observação é também invenção
(Introdução).

É através da percepção que realizamos a conexão entre o mundo exterior e o


mundo interior, e essa conexão é feita numa constante análise das informações e reações
apropriadas ao contexto perceptivo.
Todos os seres vivos têm um conjunto de sentidos que possibilitam ao organismo
elaborar respostas e interagir aos estímulos do meio. Ao longo da evolução da espécie,
esses sentidos foram indispensáveis para desenvolver habilidades sensitivas e propiciar a
sobrevivência. É na espécie humana que a percepção está mais desenvolvida,
possibilitando habilidades de planejar e construir novos objetos, alguns destinados a
ampliar ainda mais a sua capacidade perceptual; indagar-se sobre a origem, o passado e o
futuro das coisas percebidas e até mesmo imaginar coisas imperceptíveis (mesmo na
ausência de qualquer estimulação sensorial correspondente). Enfim, proporcionado ao ser
humano a capacidade que o distingue dos outros animais: a habilidade de produzir cultura
(Cury, 2007).
Os estímulos nos chegam através dos sentidos, esse sistema sensorial capta as
informações que são decodificadas e processadas numa relação memória e cognição,
portanto criar uma condição de interação entre campo sensorial e condição estimulatória,
reflete diretamente na qualidade do aprendizado. A situação pedagógica no campo das
Artes requer condições específicas, estudadas e programadas, pois o “como” está
relacionado com o “que”, e esse complexo envolvendo as condições ambientais,
sincronismo entre prática e intencionalidade, sobretudo o domínio experiencial do
professor quanto ao conteúdo, permitirá um resultado produtivo do potencial criativo e
cognitivo dos alunos.

Funções sensoriais ligadas a Arte


Os sentidos permitem a percepção do mundo que nos rodeia. Em cada sistema
sensorial, o contato com o mundo externo ocorre através de células especializadas
chamadas de receptores sensoriais.
Através do sistema visual que se percebe a luz, energia eletromagnética provinda
diretamente de uma fonte, com uma lâmpada ou o sol, ou indiretamente de um objeto
luminoso, após ser refletida por um ou mais fontes. Essa energia luminosa vem do mundo
exterior, atravessa a pupila e entra no olho atingindo a retina. A partir dessa estimulação
dos receptores na retina, começa o processo de criação de um mundo visual. Segundo
Kandel (2003):

Forma, movimento, profundidade e cor. Simplesmente olhar o mundo e


reconhecer um rosto, ou apreciar uma paisagem requer uma atividade
neuronal imensa, maior do que a utilizada para solucionar problemas
lógicos ou jogar xadrez (p. 492).

Para Helmholtz (1821- 1894), a percepção é construída por meio de inferências que
inconscientemente se faz sobre o mundo em volta. Essas inferências são contrastadas com
informações que o organismo colhe do ambiente.
Cada vez que essas expectativas não são correspondidas, ajustamos nossos
preceitos, criando inferências e testando novas conjecturas (Baldo, 2002).
Diversas atividades artísticas como músicas, melodias, danças, esculturas, pinturas,
poemas, realizadas em todos os períodos da história da arte, traduzem uma época e foram
geradas com o funcionamento dos sistemas sensoriais e expressam sua mensagem também
com o acionamento dos sistemas sensoriais de quem as observa havendo uma interação
mútua.

Memória e aprendizagem
As vivências no dia a dia, são construídas a partir de inúmeras situações onde se
interage com estímulos e as respostas de acordo com a estrutura individual de
reconhecimento, ao estudar, aprender, colecionar fatos e acontecimentos, armazenar e
elaborar cultura, se está ativando o encéfalo. O encéfalo trabalha incessantemente enquanto
se aprende e armazenam as memórias.
A memória, capacidade de alterar o comportamento em função de experiências
anteriores, depende de estruturas localizadas em diferentes regiões do sistema nervoso; o
processamento de informações nessas estruturas neurais resulta em alterações nestas e/ou
em outras regiões, levando a alterações no funcionamento do sistema.
A cada nova experiência a memória é acionada, as experiências anteriores servem
para correlacionar e avaliar à luz do contexto presente, de forma a consolidar o processo de
cognição de reorganização da informação em uma nova aprendizagem
Os estudos de como ocorre o aprendizado e de como as memórias são armazenadas,
iniciam- se com a filosofia, prosseguiram por vários campos científicos e hoje são mais
profundamente analisados com a neurociência. O estudo científico da memória e do
aprendizado percorreu uma longa história e ainda tem muitas coisas a serem reveladas.
A definição do construto identitário deve-se em grande parte ao que se aprende, a
forma como se aprende e ao que pode ser lembrado. Assim, aprendizagem e memória
formam o suporte para todo o conhecimento, habilidades e planejamento. É através do
repertório mnemônico que se forma um banco de dados, para que se possa considerar o
passado, se situar no presente e vislumbrar o futuro.
Greenfield e Bruner (1969, p. 654) escreveram que as culturas com tecnologias
simbólicas “estimulam o crescimento cognitivo melhor, mais cedo e mais profundamente
que as outras”.
O cérebro funciona em módulos cooperativos, que se ajudam na hora de recuperar
informações. Quanto mais caminhos levarem a elas, mais fácil será o “resgate”. Exemplo:
se um conceito estiver conectado simultaneamente a uma imagem e a um som, pelo menos
três áreas diferentes do cérebro trabalharão para recuperá-lo. Dessa forma, inventar uma
imagem simbólica – associar conceitos a formas, palavras a sons, cores a significados e
assim por diante irá consolidar o aprendizado.
O aprendizado e a memória podem ser subdivididos, hipoteticamente, nos
principais estágios: codificação, armazenamento e evocação. A codificação refere-se ao
processamento da nova informação a ser armazenada e envolve duas fases: aquisição e
consolidação. A aquisição registra as informações em arquivos sensoriais e estágios de
análise sensorial, enquanto a consolidação cria uma forte representação da informação
através do tempo. O armazenamento, resultado da aquisição e da consolidação, cria e
mantém um registro permanente. Finalmente, a evocação utiliza a informação armazenada
para criar uma representação consciente ou executar um comportamento aprendido com
um ato motor (GAZZANIGA, 2006, p. 320).
A maneira como as informações são organizadas levou ao desenvolvimento de
teorias e modelos sobre a memória semântica.
O conhecimento semântico se consolida com a exposição a informações e a
possibilidade de integração dessas informações (RÜEGG, 2004). Assim sendo, a idade e a
escolaridade podem estar associadas ao maior e mais consistente conhecimento semântico.
Cury (2007) traz a seguinte citação conhecimento semântico:

A organização e a flexibilidade do conhecimento semântico são


surpreendentes. Consideremos uma imagem visual complexa, como a
fotografia de um cavalo. Através da experiência, essa imagem visual
torna-se associada a outras formas de conhecimento sobre cavalos, de tal
forma que, enfim, quando fechamos nossos olhos e pensamos sobre a
imagem de um cavalo, a imagem é baseada em uma representação rica do
conceito de um cavalo. Quanto mais associações tivermos feito sobre a
imagem de um cavalo, melhor nós codificamos tal imagem e melhor
ainda poderemos nos recordar das características de um cavalo no futuro.
Além disso, tais associações caem em diferentes categorias. Por exemplo,
sabemos que um cavalo é um ser vivo, em vez de inanimado, que é um
animal e não uma planta, que vive em um ambiente particular e que tem
características físicas e padrões de comportamento particulares e emite
um repertório de sons. Além disso, sabemos que os cavalos são usados
para realizar certas tarefas e que eles têm nomes específicos. A palavra
cavalo é associada a todos esses pedaços de informações e qualquer um
desses pedaços pode abrir o acesso a todo o nosso conhecimento sobre
cavalos (p.98).

A capacidade de associação numa prática pedagógica, principalmente na atividade


artística, está diretamente associada a contextualizações com vivências dos alunos, ao ligar
imagens, cores, e objetos e sons do cotidiano. Experiências dissociadas tendem a cair no
vazio. Segundo Kandel (2000) nos ilustra:

[...] nós construímos o conhecimento semântico através de associações


feitas ao longo do tempo. A capacidade de recordarmos e utilizarmos esse
conhecimento — nossa eficácia cognitiva — parece depender de quão
bem essas associações organizaram as informações que retivemos (p.
1235).

Para Barbosa (2002), ensinar compreender imagens, sua semântica e


contextualização através da arte, torna as pessoas capazes de posicionamentos
politicamente mais adequados. Apreciar, educar os sentidos e avaliar a qualidade das
imagens produzidas pelos artistas é uma ampliação imprescindível para que os indivíduos
se expressem livremente, se desenvolvam continuamente, mesmo após ter deixado a
escola.
Criatividade
Para os professores de outras áreas, nenhuma disciplina apresenta tantas
possibilidades didáticas para reverter situações problemas na aula e estimular o aluno como
a disciplina de Arte. Estes teriam ao alcance muitas linguagens artísticas, como o teatro, a
música, a fotografia, o desenho, o cinema e a dança. Não se pode negar essa variedade de
opções, porém essas possibilidades só podem contribuir com o trabalho do professor se ele
souber como utilizá-las. É nesse ponto que se faz necessária uma das mais valiosas
potencialidades humanas: a criatividade.
Etimologicamente a palavra criatividade deriva do termo latino crear = fazer e do
termo grego krainen = realizar.
A criatividade envolve o desejo de romper barreiras, o acreditar que algo sempre
pode ser melhorado, a simplificação de todos nossos atos em favor do outro e, por fim, a
negação do impossível.
A criatividade é uma capacidade inerente a todo ser humano e pode ser
desenvolvida a partir da infância até a velhice, segundo as pesquisas de estudiosos como
Torrance (1976), Kneller (1983) e Torre (2005), porém o seu desenvolvimento vai
depender dos estímulos e das percepções internas e externas que a pessoa venha a ter. Ou
seja, a criatividade não é algo acabado, pronto para ser usado; ela precisa, assim como
muitas potencialidades do ser humano, ser exercitada e estimulada.
Para Vygotsky (1999), a criatividade pode ser entendida como sendo uma interação
de processos cognitivos, característica da personalidade, estilos de pensar e condições
ambientais decorrentes do contexto familiar, profissional e social.
Entre os estudiosos da criatividade ligados a arte, entre outro, se destaca Ostrower
(1990) a qual, apesar de ser artista plástica e autora com várias publicações na área de arte,
vê a criatividade como potencial próprio da condição de ser humano, presente em todos os
campos do conhecimento. Baseada nesse pensamento, a autora desenvolveu uma didática
própria para despertar em seus alunos a sensibilidade estética e a capacidade criadora. Em
sua prática de sala de aula, Ostrower (1990) demonstra que são muitas as possibilidades
que se tem para ajudar no desenvolvimento da criatividade de uma pessoa, independente da
faixa etária e do desenvolvimento cognitivo.
Para Vygotsky (1999), o mecanismo de formação da imaginação criativa é bastante
complexo e, ao contrário do que muitos acreditam, não é algo que surge como um lampejo,
como uma luz que acende o cérebro. Para esse autor, toda atividade criativa surge de
experiências prévias já existentes no cérebro, fruto de percepções internas e externas, ou
seja, para Vygotsky (1999), atividade criativa da imaginação depende primeiramente de
quão rica e variada é a experiência prévia que a pessoa armazena no seu cérebro.

Caminhos epistemológicos da Arte


Embora o conceito de Arte ainda permaneça aberto, serão sugeridas algumas
considerações, como consequência da análise das informações expressas nesse estudo, de
forma a contribuir com os debates sobre a questão epistemológica da Arte-Educação. A
forma artística não pode ser pensada como totalidade significativa, mas apenas nos seus
momentos constituintes, a obra só pode ser pensada nos elementos que a conformam
(MACEDO, 2000, p.19).
Alguns elementos podem ser tidos como comuns a todas as expressões artísticas,
como também em conjunto caracterizam as produções no campo da Arte, possibilitando
uma distinção entre o que é, e o que não é obra de Arte.
Nos acrescenta Macedo (2000):
A teoria da arte não é, pois, gratuita ou arbitrária, não é uma construção
subjetiva, mas guarda relação com a dinâmica da apreensão dos dados
visuais, e é na consideração da realidade visível segundo os princípios da
dinâmica formal que se constitui a teoria da produção (p.25).

Ao considerar os aspectos mentais complexos que envolvem a atividade artística,


pode-se deduzir que a produção da Arte requer técnica e experiência profissional
suficiente, para que o produto final tenha as características necessárias, para produzir a
experiência física e mental complexa no observador, tal qual foram descritas
anteriormente. Portanto Arte não é uma atividade que pode ser desenvolvida por qualquer
pessoa, requer sensibilidade, conhecimento e técnica.

Arte enquanto campo onde acontecem os processos artísticos


Muitos teóricos procuram delimitar o conceito de Arte através de suas características
de apresentação, sob a ótica dos críticos ou das instituições que as expõem, Coli (2002),
em seu livro “O que é Arte”, sinaliza que não se pode chegar a uma definição o que é Arte,
pelo menos em uma parte de sua natureza, a partir da própria Arte, então seja possível fora
dela. Portanto, além do recurso fundamental do discurso sobre o objeto artístico, proferido
pelos especialistas, culturalmente também prevê locais específicos para a manifestação da
Arte, que garantem o rotulo e “arte” aos produtos que expõem. Ou ainda contar com
instituições, que tombam o patrimônio artístico. Desta forma, culturalmente dispõe de
instrumentos que, apesar de não solucionar definitivamente o problema, concedem estatuto
a obra de Arte, livrando-nos de uma definição abstrata do conceito.
Temos em Galimberti (2003) a seguinte afirmação:
O homem não tem nenhum valor se não consegue exprimir algo que
transcenda sua vida biológica, e a arte é uma forma desse transcender.
Mas também a arte não tem nenhum valor se não reflete o ultrapassar do
homem, a sua superação da condição animal (p. 186).

As atividades artísticas podem ser expressas em várias linguagens e técnicas, e


podem ser ampliadas conforme vão se desenvolvendo as áreas de conhecimentos inerentes,
assim como o domínio de materiais e técnicas específicas de representações: artes
plásticas, música, teatro, dança, cinema, vídeos, etc.
0 papel do artista tem dois aspectos centrais. Em primeiro lugar, existe o aspecto
geral que é característico do todos os artistas, nomeadamente, a consciência do que é
criado para apresentação é arte. Em segundo lugar, existe a grande variedade de técnicas
artísticas, sendo que a capacidade de usar uma delas em algum grau permite-nos criar arte
de um tipo particular. Quando estes dois aspectos se dão simultaneamente, a grande
variedade de coisas que os artistas são capazes de fazer ( pintar, esculpir, escrever, compor,
atuar, dançar, etc.) é vista como subsumida na descrição “criando um objeto de um gênero
que é apresentado” (MOURA, 2009. p.146).
O papel de membro do público também tem dois aspectos. Em primeiro lugar,
existe o aspecto geral que é característico de todos os membros de todos os públicos de
arte, nomeadamente, a consciência de que o que lhes está a ser apresentado é arte. O
segundo aspecto do papel de membro de um público é a grande variedade de capacidades e
sensibilidades que tornam alguém capaz de captar e entender o tipo particular de arte que
está a ser apresentado (MOURA, 2009. p.146)
De acordo com a Gestalt, a arte inicia-se no princípio da pregnância da forma, ou
seja, na formação de imagens, os fatores de equilíbrio, clareza e harmonia visual
constituem para o ser humano uma necessidade e, por isso, são considerados
indispensáveis (FILHO, 2003. p.18).
“Artista” é o profissional que atua no campo da Arte com domínio estético e
técnico, o produto artístico é caracterizado como “Obra de Arte” que tem como preceitos
fundamentais a originalidade, a harmonia e o equilíbrio. Considerando a originalidade
enquanto criatividade, inovação, harmonia e equilíbrio.
Segundo a Gestalt:
Harmonia
A harmonia diz respeito à disposição formal bem organizada e
proporcional no todo ou entre as partes de um todo. Na harmonia plena
predominam os fatores de equilíbrio, de ordem e de regularidade visual
inscritos no objeto ou na composição, possibilitando, geralmente, uma
leitura simples e clara. É, em síntese, o resultado de uma perfeita
articulação visual na integração e coerência formal das unidades ou partes
daquilo que é apresentado, daquilo que é visto (FILHO, 2008. p.51).

Equilíbrio
Equilíbrio é o estado no qual as forças, agindo sobre um corpo,
compensam-se mutuamente. Ele é conseguido, na sua maneira mais
simples, por meio de duas forças de igual resistência que puxam ou
atuam em direções opostas. Esta definição física é aplicável também ao
equilíbrio visual. O sentido da visão experimenta equilíbrio quando as
forças fisiológicas correspondentes no sistema nervoso se distribuem de
tal modo que se compensam mutuamente. O equilíbrio, tanto físico como
visual, é o estado de distribuição no qual toda a ação chegou a uma pausa.
Por exemplo, em uma composição equilibrada, todos os fatores como
configuração, direção e localização determinam-se mutuamente de tal
modo que nenhuma alteração parece possível, e o todo assume o caráter
de “necessidade” de todas as partes (FILHO, 2008. p.57).

Artista
Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa (http://www.infopedia.pt/lingua-
portuguesa/artista) Artista = criador de obras de arte plástica.
Considerando as deduções anteriores, pode-se dizer que Artista é o profissional que
atual no campo das Artes, com domínio técnico, estético e criativo.
Para Candido (2006)

[...] os elementos individuais adquirem significado social na medida em


que as pessoas correspondem a necessidades coletivas. As relações entre
o artista e o grupo resumem se a um esquema simples: em primeiro lugar,
há necessidade de um agente individual que tome a si a tarefa de criar ou
apresentar a obra; em segundo lugar, ele é ou não reconhecido como
criador ou intérprete pela sociedade, e o destino da obra está ligada a esta
circunstância; em terceiro lugar, ele utiliza a obra, assim marcada pela
sociedade, como veículo de suas aspirações individuais mais profundas
(p.35).

Obra de Arte

Obra de Arte é o produto artístico com características inerentes da Arte: equilíbrio,


originalidade e harmonia.
- Equilíbrio é a inter-relação de forças entre os elementos da composição,
expresso por suas dimensões, distância e valores. O estado de equilíbrio é
conseguido pela compensação dessas forças entre os elementos.
- Originalidade é o caráter singular da criação artística.
- Harmonia é disposição bem ordenada entre os elementos da composição,
proporção e simetria.

Para Kandinsky (1987):

O mundo da obra de arte está na feliz utilização das forças obstinadas dos recursos
artísticos... não se podem ensinar os ímpetos da inspiração. Porém, o que em
grande parte pode ser ensinado e dirigido são as possibilidades de elaboração.
Temos que saber que, no fundo, são as forças dinâmicas dos recursos, que podem
dar alma e vida à obra de arte (p.270).

Relação entre artista, obra de Arte e expectador


O artista é representado em sua arte por uma série de elementos reconhecíveis em
suas práticas. Embora cada produção seja única, agrega elementos construtivos subjetivos
e objetivos que traduzem um fazer característico do artista, o que o transforma em um
conjunto qualitativo, reconhecível em suas obras. Cada obra artística é única, e traz o todo
reconhecível do criador. Sendo o artista um criador em potencial, a cada obra feita, é
transformado em um novo potencial dedutivo e pré-estruturado a partir da reorganização
mental consequente da compreensão e experiencialização da obra feita. Sobre a criação
artística, Macedo (2000) acrescenta:

(...) a perspectiva teórica do artista não tem sua base na adequação a


objetivos previamente definidos, não se fundamenta pela referência a
uma função utilitária para a forma. O artista não trabalha como o pedreiro
que coloca ladrilhos... A obra cresce e é executada ao mesmo tempo. O
processo criador não corresponde a uma ação linear em direção a um
objetivo pré-determinado, não parte de uma referência ou um sentido já
formulado, mas sim das possibilidades objetivas da produção de um
significado específico à natureza da forma: o sentido da imagem é um
fato a posteriori, está por ser criado, não existe antes, não é a objetivação,
na forma, de significados previamente constituídos com independência
dos processos formadores (p.21).

O artista é transformador e transformado a cada obra feita. Cada obra produzida é


uma nova possibilidade de outra obra ser feita, com outra capacidade experiencial
potencializada.
Segundo o pesquisador Hurpia (2009), cada pintura funciona, de certa forma, como
um ponto de partida para outras. Estão numa espécie de lógica de continuidade que induz
para novas e inesperadas conexões, como em uma espécie de montagem cinematográfica.
O expectador de uma obra de arte capta uma construção perceptiva única do seu
todo momentâneo, consequência de todos os elementos ambientais e psíquicos agregados
ao elemento percebido.
Sobre a percepção da Arte, Macedo (2000) nos dá a seguinte contribuição:

A apreensão não conduz a uma resultante fixa, mas se mantém como


experiência do movimento ou ação cognitiva diante da obra: é no
contato visual com a forma configurada que se dá o entendimento,
como vivência de sua ordenação interna. O sentido artístico é uma
potência indeterminada e se renova a cada contato com a obra. A ordem
formal existe como uma “continuidade significativa” está identificada a
um sistema de relações em que interagem todos os elementos que
constituem a imagem (p. 53).
As obras de artes são potencializadas perceptivamente, em suas visibilidades
qualitativas, de acordo com suas características de apresentação.
Segundo Francastel (1960):

[...] levando em conta a sua dupla função, de manter a coerência ou


desestruturar o corpo social, a arte aparece, necessariamente, realizando
ao mesmo tempo, seja, no concreto, objetos representativos das crenças
mais sólidas de um grupo, seja, ao contrário, no abstrato, esquemas
imaginários de representação. Segundo o caso, a arte é, para um grupo,
memória ou projeto. Ela possui o duplo aspecto de uma atividade técnica
e de um tipo específico de operações intelectuais. Com efeito, estes dois
aspectos da arte não são contraditórios. Eles exprimem simplesmente um
caráter de autonomia entre as atividades comuns da sociedade (p. 288).

As obras de arte em si não constituem nenhuma estrutura valorativa, são elementos


potencialmente valorativos em função dos construtos perceptivos que lhe sejam agregados,
seja em função do criador, das condições de apresentação ou do construto específico do
agente perceptivo.
Na opinião de Pereira (1998):
Diante de um campo visual ordenado segundo as leis abstratas da forma a
consciência é solicitada no interior de uma lógica que se mostra como um
conjunto unitário, produto do equilíbrio de tensões perceptivas, uma
condensação de forças visuais que se mantêm coesas em uma relação de
atração e repulsão simultâneas. Essas forças – presentes em todo estímulo
visual – constituem a matéria-prima mesma da forma e aparecem
corporificadas nos meios materiais abstratos de produção da imagem,
quais sejam: o ponto, a linha, o claro-escuro e a cor. Esse modo da
imagem exibe um sentido identificado à estrutura que a constitui
enquanto forma visível de si mesma. O sentido se concretiza como
construção objetiva sobre a dinâmica dos elementos materiais gráficos da
forma (p.84).

Relação entre Arte e Sociedade


O artista produz seus trabalhos e estes são incorporados ao cotidiano das pessoas e
das instituições. De acordo com a recepção e interação da sociedade, as obras de Arte
entram para a grade cultural, sendo as obras e o artista ou uma determinada expressão
artística, elementos que podem assumir o caráter institucional e representativo de um povo
tendo características sociais identitárias e ilustrativas, a exemplo de Picasso e a Espanha,
Leonardo da Vinci e a Itália, o Tango e a Argentina, o Samba e o Brasil.
Tomando o autor, a obra e o público como os três principais elementos que
fundamentam e possibilitam a comunicação artística, Antônio Cândido analisa como a
sociedade define a posição e o papel do artista, como a obra depende de recursos técnicos
para expor os valores propostos e, de que maneira se configuram os públicos. O link entre
sociedade e arte não ocorre de maneira tão simples, trata-se sim de um viés de mão dupla.
Mesmo quando a produção artística é mais “individual”, como no caso da pintura ou da
criação de um romance, a natureza coletiva dessa atividade consiste na participação direta
de numerosas outras pessoas, tanto antes do “ato” identificado como de produção
(professores, inovadores de estilos, patrocinadores, etc.) como mediando entre a produção
e a recepção (críticos, negociadores, editores). Mais geralmente, a individualidade do
artista e as condições de seu trabalho dependem totalmente da existência das estruturas e
instituições da prática artística que facilitam tal trabalho (WOLFF, 1982. p. 133).
Segundo Moura (2009), “se a arte é atividade de exprimir emoções, o leitor é tão
artista quanto o escritor. Não há qualquer distinção de natureza entre o artista e o público”
(pag. 52).
Na produção da arte, as instituições sociais afetam, entre outras coisas, quem se
torna artista, como se torna artista, como é capaz de praticar sua arte, e como pode fazer
com que sua obra seja reproduzida, executada e colocada ao alcance do público. Além
disso, o julgamento e a avaliação de obras e de escolas de arte, determinando seu lugar
subsequente na história literária e artística, não são decisões simplesmente individuais e
“puramente estéticas”, mas fatos socialmente condicionados e socialmente construídos
(WOLFF, 1982. pag. 52).
A atividade do artista estimula a diferenciação de grupos; a criação de obras
modifica os recursos de comunicação expressiva; as obras delimitam e organizam o
público. Vendo os problemas sob esta dupla perspectiva, percebe-se o movimento dialético
que engloba a arte e a sociedade num vasto sistema solidário de influências recíprocas
(CANDIDO, 2006).
Os juízes acreditados da arte e os árbitros do gosto são, também eles, definidos e
constituídos socialmente, e sofrem em seus julgamentos a influência de valores ideológicos
e posicionais específicos (WOLFF, 1982. p.151).
Sobre o tema, é importante considerar a afirmação de Guyau (2009):

A arte é social não somente porque tem sua origem e sua finalidade na
sociedade da qual ela sofre ação e sobre a qual reage, mas porque ela
‘traz em si própria’, porque ela ‘cria uma sociedade ideal’, na qual a vida
atinge seu máximo de intensidade e expansão (p.32).

A glória da grande arte consiste em poder tolerar essa manipulação arbitrária de sua
superfície consciente, porque a sua verdadeira substância pertence a níveis mais profundos
e ainda não alcançados. A única coisa que parece ter importância para nós, é a complexa e
difusa subestrutura da arte. Ela teve a sua origem no inconsciente e o nosso próprio
inconsciente ainda reage a isso, preparando o caminho para reinterpretações sempre novas.
A imortalidade da grande arte parece estar ligada a perda inevitável de sua significação
original de superfície e a seu renascimento no espírito de todas as novas eras
(EHRENZWEIG, (s.d.). p.85).
A Arte na educação funciona como um elo entre o estudante e seu meio,
caracterizando a sua história, seus valores culturais, morais e sociais, através das
ilustrações e representações, construindo um mundo mental através das diversas
linguagens e práticas artísticas. A história do homem só pode ser relatada através da ótica
dos artistas, pois foram estes que durante séculos traduziram as representações do mundo
através de suas obras. O mundo visual do passado é resultado da sensibilidade,
conhecimento e técnica dos Artistas que através de seus trabalhos, permitem que o cidadão
de hoje tenha acesso à trajetória de sua existência enquanto produto evolutivo da espécie.
Arte-educação e seus processos mentais, na construção e potencialização de
redes neurais, enquanto diretamente ligadas à subjetividade, envolvem as funções
executivas do cérebro, que estão associadas ações de projeções mentais, inferências com
experiências vivenciadas e contextualizações funcionais. Esses elementos são inerentes
às diversas disciplinas da formação escolar, matemática, história, geografia, entre
outras. São campos mentais diretamente fortalecidos com o exercício da vivência
artística.
A arte provoca reações importantes tanto para quem produz quanto para quem
recebe, uma das propriedades da Arte é essa capacidade de provocar sensações e
construções mentais, o que traz também ao expectador a experiência transformadora.
A Arte tem uma função primordial para a vida, considerando que é organizada
no campo da imaginação, soma a experiência técnica, a vivência temática, o histórico
cognitivo e o acervo imagético arquivados na memória do artista, e o produto gerado
pela Arte é um conjunto de estímulos que incide no processo comunicacional e
reestrutura a cadeia cultural, reformulando o processo identitário numa dinâmica
constante durante o processo de inferências e reorganização de forças, que a cada novo
elemento acrescido é analisado e posicionado, na busca de uma interação equilibrada e
harmônica com o contexto social.
Arte é uma atividade de construção, arte transforma a mente e cria
potencialidades, arte na educação é responsabilidade com o destino da humanidade e
um direito de cidadania.

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