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USO DE PSICOFÁRMACOS EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Mateus Silvestre MOREIRA1

Rodrigo Gomes de MORAIS1

Edimar Agnaldo MOREIRA2

Sâmara Fernandes LEITE3

Claudia Cristina TEIXEIRA4

Malu Emanuelle SILVA5

Daniela Fernanda de FREITAS 6

1. Discente, Faculdade de Ciências e Tecnologias de Campos gerais do Curso de Enfermagem Bacharelado;


2. Discente, Universidade Federal de Alfenas, Pós Graduação em Ecologia e Tecnologia Ambiental;
3. Enfermeira da Unidade de Terapia Intensiva Cardiovascular do Hospital Aroldo Tourinho-Montes Claros
(MG).
4. Medica oncologista da Santa casa de Montes Claros - MG e da Clínica Oncovida.
5. Enfermeira da Estratégia de Saúde da Família(ESF) Viva a Vida – Bocaiúva (MG).
6. Docente, Faculdade de Ciências e Tecnologias de Campos gerais, Curso de Graduação em Farmácia
Generalista e Enfermagem Bacharelado. danielaffreitas@bol.com.br

Recebido em: 07/10/2014 - Aprovado em: 18/09/2014 - Disponibilizado em: 15/12/2014

Resumo. Buscou-se com este trabalho verificar, a eficácia, as indicações e as contra-indicações


da utilização de psicofármacos em crianças e adolescentes. Para tanto, utilizou-se de um
levantamento bibliográfico em revistas, livros e artigos publicados na Internet, por meio dos
quais pode-se concluir que: 1) o profissional da área de saúde deve entender a categoria
farmacológica de cada medicamento, suas indicações, contra-indicações, interações
medicamentosas e efeitos adversos; 2) a escolha e o início da intervenção medicamentosa devem
ser baseados na história do paciente, na situação clínica atual e no plano de tratamento; 3) o
emprego de psicofármacos em crianças e adolescentes deve visar o quadro sintomatológico e
sindrômico; 4) As drogas psicoativas mais utilizadas em crianças e adolescentes são: A
clomipramina, a fluoxetina, a paroxetina, os inibidores da monoamino-oxidase metilfenidato,
Bupropiona, desipramina, haloperidol, dentre outros; 5) Em crianças e adolescentes, a
associação de psicofármacos entre si ou com medicamentos para problemas clínicos requer
cautela. 6) a psicoterapia com crianças e adolescentes em geral é mais direta e ativa do que
costuma ser com adultos.
Palavras-chave: Psicofármacos. Adolescência. Infância. Drogas. Psicoterapia.

Abstract. We tried this experiment to verify the efficacy, indications and contraindications for the
use of psychotropic drugs in children and adolescents. For this purpose, is a literature in journals,
books and articles published on the Internet, through which one can conclude that: 1) the health
care professional must understand the pharmacological class of each drug, its indications,
contraindications, drug interactions and adverse effects, 2) the selection and initiation of drug
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intervention should be based on patient history, the current clinical situation and treatment plan, 3)
the use of psychotropic drugs in children and adolescents should aim to symptomatology and
syndromic; 4) The most widely used psychoactive drug in children and adolescents are:
clomipramine, fluoxetine, paroxetine, inhibitors of monoamine oxidase methylphenidate,
bupropion, desipramine, haloperidol, among others, 5) In children and adolescents The association
of psychotropic drugs among themselves or with drugs for clinical problems requires caution. 6)
psychotherapy with children and adolescents in general is more direct and active than it used to be
with adults.
Keywords: Pharmacotherapy. Adolescence. Childhood. Drugs. Psychotherapy.

INTRODUÇÃO não deve ser reduzido à abordagem do tipo um


diagnóstico, um medicamento. Muitas variáveis
O uso de medicamentos para tratar
afetam essa prática, incluindo a seleção e a
transtornos psiquiátricos costuma ser
administração dos medicamentos, o significado
fundamental para a abordagem de um
psicodinâmico para o paciente e as influências
tratamento bem sucedido, que também pode
da família e do ambiente.
incluir outros tipos de intervenções, como a
De acordo com estes autores, alguns
psicoterapia ou as terapias comportamentais. À
pacientes podem considerar a medicação como
medida que o conhecimento sobre a biologia do
uma violência. Assim, o paciente, seus parentes
funcionamento cerebral normal ou anormal
e a equipe de enfermagem devem ser instruídos
cresce, a prática da psicofarmacologia clínica
sobre as razões para o tratamento
continua a evoluir quanto a seus objetivos e
medicamentoso, bem como sobre os benefícios
efetividade. Os envolvidos na prescrição e no
esperados e os riscos potenciais.
acompanhamento clínico de tratamentos com
O questionamento do uso de
medicamentos psiquiátricos devem estar
psicofármacos tem sido assunto desde 1950,
atualizados em relação à pesquisa, inclusive
quando o primeiro neuroléptico começou a ser
sobre o lançamento de novos agentes,
utilizado. Mas na pós-modernidade este tema
demonstração de outras indicações para agentes
tem tomado as páginas de jornal e revistas,
existentes e a identificação e o tratamento de
graças ao avanço na tecnologia das indústrias
efeitos adversos relacionados aos
farmacêuticas.
mesmos(MARI ET AL., 2005).
Apesar das intensas campanhas de
Segundo Kaplan e Sadock (2007), a
divulgação e promoção de novos fármacos,
prática da farmacoterapia em psiquiatria não
continuam a ser muito escasso os dados acerca
deve ser simplificada demais – por exemplo,
dos efeitos a longo-prazo deste tipo de
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medicação. Estudos recentes trazem revelações Transtornos psiquiátricos em crianças e
preocupantes acerca da utilização de adolescentes
psicofármacos em crianças e adolescentes
(BRASIL, 2000). A Adolescência é o período do
São muitas as possibilidades de desenvolvimento humano que marca a transição
transtornos mentais nessa fase da vida, mas entre a infância e a idade adulta. Esta é uma
todas as situações devem ser muito bem etapa de mudança dramática do ponto de vista
avaliadas antes de se fechar um diagnóstico, social, cognitivo e físico que pode aumentar a
principalmente na adolescência. Além das vulnerabilidade aos distúrbios psicológicos e
dificuldades pessoais dos adolescentes e de sua psicofisiológicos.
intensa modificação corporal e mental, o que Segundo Galvão e Abuchaim (2001,
por si só já pode gerar comportamentos e p.1),
sentimentos de inadequação, suas atitudes “A Adolescência é um período de intensas
podem ainda refletir problemáticas familiares. atividades e transformações na vida mental do
No entanto, Candiani (2009) relata que é cada indivíduo, o que, por si só, leva a diversas
vez maior o uso de psicofármacos em crianças e manifestações de comportamento que podem
adolescentes, sendo indiscutível a eficácia ser interpretadas por leigos como sendo
destes na atenuação do sofrimento dos doença. Assim sendo, muitas das manifestações
pacientes com transtornos mentais. ditas normais da adolescência podem se
Neste sentido, este trabalho trata de tais confundir com doenças mentais ou
polêmicas, abordando inicialmente a comportamentos inadequados”.
classificação dos medicamentos utilizados para Na adolescência, o indivíduo está
tratar transtornos psiquiátricos, as diretrizes descobrindo o que é ser adulto, mas não está
clínicas para utilização dos psicofármacos; a preparado para assumir as responsabilidades de
questão do tratamento com combinações ser adulto. Neste contexto, ele procura
medicamentosas; para, em seguida, tecer exemplos para construir seu caráter e seu
considerações especiais quanto ao tratamento comportamento, seja nas pessoas que estão
em crianças e adolescentes. mais próximas, em ídolos ou artistas (FEB,
2003).
Nesta fase, nota-se, a busca intensa da
própria identidade, muitas das vezes esta busca
faz com que ocorram conflitos entre os
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adolescentes e seus pais. No entanto, percebe-se de ar ou fadiga – tornem-se uma forma de viver
que os mesmos ainda não são capazes de viver (BATISTA,OLIVEIRA, 2005).
esta separação, o que gera um sentimento de
medo e um intenso conflito em seus Transtornos do Humor e Depressão
sentimentos. Neste contexto, o uso de drogas
pode constituir-se tanto em um simples Os transtornos do humor ocorrem em
comportamento de experimentação da vida crianças de todas as idades, consistindo de
como um caso de dependência. Portanto, deve- padrões persistentes de alteração de humor,
se avaliar bem o comportamento de um redução de prazer na realização de atividades,
adolescente, antes de se garantir a existência ou nos esportes, nas amizades e até na escola;
não de um transtorno mental(GALVÃO, além de sentimento de desvalia em geral
ABUCHAIM, 2001). (KAPLAN; SADOCK, 2007).
Dentre estes transtornos mentais pode- Dois critérios para transtorno do humor
se citar: reações de ansiedade, a depressão, o em crianças e adolescentes são as alterações de
suicídio, a esquizofrenia, a breve reação de humor, como depressão ou euforia e a
psicose e os distúrbios de alimentação, tais irritabilidade.
como anorexia nervosa e a bulimia. Apesar de os critérios de diagnósticos
para transtornos do humor (APA, 1994), na
Reações de Ansiedade revisão do texto da quarta edição do manual
diagnóstico e estatístico de transtornos mentais,
Segundo Paulon (2008), um adolescente serem quase idênticos em todas as faixas
com uma reação aguda de ansiedade sente um etárias, a expressão da perturbação do humor
medo repentino, como se algo ruim estivesse varia na criança de acordo com sua idade. As
para acontecer, bem como ter dificuldades para crianças menores com depressão em geral
adormecer, e o sono em si pode ser limitado e exibem sintomas que aparecem com menor
agitado, talvez com pesadelos ou frequência à medida que crescem, incluindo
sonambulismo. alucinações auditivas congruentes com o
A ansiedade deve ser tratada antes de se humor, queixas somáticas, aparência triste,
tornar crônica e antes que as reações do isolamento e baixa autoestima. Os sintomas que
indivíduo – retraimento psicológico, aparecem com maior frequência na
dificuldade no trabalho, escolar ou persistência adolescência tardia do que em crianças mais
de sintomas físicos como dores, diarréia, falta novas são anedonia, lentidão psicomotora
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grave, delírios e desesperança. Sintomas que por ele. Apesar disso, o conceito de depressão
aparecem com a mesma frequência, anaclítica persiste até hoje. O renomado
independentemente da idade e do estágio do psiquiatra relatou o caso de uma criança de 3
desenvolvimento, incluem ideação suicida, meses de uma instituição que, ao chegar à idade
humor deprimido ou irritado, insônia e redução de 8 meses, mostrou sintomas de depressão
da capacidade de concentração. anaclítica com quadro clínico completo:
Os transtornos depressivos e bipolar choramingo, isolamento, apatia, perda de peso e
tipo I em geral são episódicos, embora seu distúrbio do sono.
início possa ser insidioso. Episódios maníacos Apesar de inexistir uma definição
são raros em crianças pré-púberes, mas bastante consensual acerca da depressão infantil, pode-
comuns entre adolescentes. O transtorno de se afirmar que se trata de uma perturbação
déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), o orgânica que envolve variáveis biológicas,
transtorno desafiador de oposição e os psicológicas e sociais. Do ponto de vista
transtornos de conduta podem ocorrer em biológico, a depressão é encarada como uma
crianças que mais tarde apresentam depressão possível disfunção dos neurotransmissores
(KAPLAN; SADOCK, 2007). devido à herança genética, a anormalidades
De acordo com Lima (2004), o primeiro e/ou falhas em áreas cerebrais
estudo que ligou a depressão infantil à condição específicas(ANDRIOLA; CAVALCANTE,
depressiva maior do adulto foi o do psiquiatra 1999).
Spitz, que descreveu a síndrome de depressão Trata-se da depressão classificada como
anaclítica, onde as crianças separadas das mães endógena, ou seja, aquela geneticamente
e que eram colocadas em creches apresentavam transmitida. Desde a perspectiva psicológica, a
choro, isolamento, retardo do desenvolvimento depressão pode estar associada a algum aspecto
psicomotor, reação lenta, retardo do comprometido da personalidade, baixa
movimento, e algumas apresentavam estupor e autoestima e autoconfiança. No âmbito social, a
perda do apetite. Ele postulava que o mais depressão pode ser vista como uma falta de
importante na etiologia era a perda do objeto adaptação ou um apelo de socorro, bem como
amado. No entanto, sofreu uma série de críticas, uma possível consequência da violentação de
particularmente com relação à sugestão de que mecanismos culturais, familiar, escolar, etc. As
a depressão anaclítica levava a um severo variáveis psicológicas e sociais caracterizam a
retardo do desenvolvimento. As críticas foram depressão classificada como exógena, ou seja, a
também em relação à metodologia empregada que é resultante de problemas psicológicos e/ou
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ambientais (ANDRIOLA; CAVALCANTE, episódio e retornam ao normal em algum ponto
1999). durante ou após a recuperação”
De acordo com a APA (1994), a Giancaterino (2008) relata que a rotina
depressão infantil é semelhante a depressão no que as crianças têm a cumprir pode ser um
adulto, de forma que os mesmos critérios de desgaste não apenas físico, mas também
diagnósticos de depressão no adulto podem ser mental, que começa desde cedo a exigir demais
utilizados para avaliar a depressão na criança. de si mesmo. Nesse sentido, ressalta-se que o
Segundo esse manual, os sintomas de depressão excesso de atividades é um dos principais
são: humor deprimido na maior parte do dia, causadores do stress, na classe média e na
desinteresse nas atividades diárias, alteração de classe menos favorecidas existem muitas
sono e apetite, falta de energia, alteração na situações desgastantes como: trabalhar para
atividade motora, sentimento de inutilidade, ajudar os pais, cuidar dos irmãos menores, irem
dificuldade para se concentrar, pensamentos ou para a escola com fome, ter que tirar boas notas
tentativas de suicídio. sem contar com ninguém para ajudar nas
Um estudo da Organização Mundial de tarefas escolares e vários outros fatores que
Saúde (OMS apud LEITE, 2002), demonstra acarretam o stress, que pode culminar na
que 20% das crianças e adolescentes depressão infantil.
apresentam sintomas da depressão, como Segundo este mesmo autor, crianças
irritabilidade ou apatia e desânimo. Dentro da deprimidas são classificadas como menos
realidade brasileira, esse número cai para 10% populares por seus pares e menos socialmente
conforme o psiquiatra gaúcho Salvador Célia, competentes por seus professores. Não está
presidente do Departamento de Saúde Mental claro se déficits nas habilidades sociais,
da Sociedade Brasileira de Pediatria, afirma, seguem-se ou precedem a depressão.
porém, que se não houver intervenção médica, Segundo Mora (2004), a família exerce
essas crianças são fortes candidatos a tornarem- grande influência na depressão infantil. A
se adultos depressivos pelo resto da vida. criança desde o ventre materno até os três anos
De acordo com Weller e Weller (1992, desenvolve todos os elementos básicos com que
p.19), mais tarde vai construir sua vida; sentimentos,
“Depressão é um transtorno episódico, e os linguagem, afetos, hábitos, motivações. O
marcadores biológicos são classificados como apego com que a mãe e o filho se impregnam
marcadores de traço ou estado. Os marcadores mutuamente é o veículo de uma integração
de estado são positivos ou anormais durante o social e pessoal adequada da criança. Os apegos
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inseguros podem gerar dificuldades de conduta idade escolar e 4,7% dos adolescentes.
e também depressão, assim como o apego Estudos epidemiológicos
seguro é uma boa maneira de criá-la. brasileiros(BIR; DUARTE, 2002; MENEZES;
Assim Mora, 2004, relata que “a depressão MELO, 2010) têm revelado prevalência de
materna aparece claramente definida como um desordens psiquiátricas de 10% a 20%, no
dos fatores de risco associados ao grupo etário entre 5 e 14 anos. Outros estudos
desencadeamento da depressão na criança. sobre depressão também foram realizados,
Também é indispensável para o destacando-se o de Caetano (2009) que relatou
desenvolvimento saudável da criança uma boa que a depressão infantil atinge oito em cada
relação com o pai”. cem meninos e meninas. Fatores genéticos e
Apesar de extremamente importante do ambientais (como viver em meio a conflitos,
ponto de vista preventivo, os estudos com brigas e violência) favorecem o surgimento da
crianças em idade pré escolar são ainda mais doença, que pode ser desencadeada por luto,
escassos em nossa realidade. A taxa de separação dos pais, dificuldades de adaptação.
prevalência encontrada em crianças de 5 e 6 Sem tratamento, ela compromete o
anos no estudo de Andriola e Cavalcante (1999) desenvolvimento, prejudicando a capacidade
foi de 3,9%, não revelando diferenças cognitiva e a estruturação da personalidade. Na
significativas em relação ao gênero. Estudos em adolescência pode levar a comportamentos de
fases iniciais da infância são muito relevantes, risco, como o uso de drogas, e a exposição a
uma vez que se os sintomas depressivos não situações de perigo.
forem identificados podem causar uma série de A depressão tem tratamento, com
dificuldades como a baixa autoestima, queda no sucesso em mais ou menos 80% dos casos. No
rendimento escolar e problemas na interação entanto, metade das pessoas que sofrem de
social, no futuro. depressão não procura tratamento, o que leva a
Cândida (2005) apresentou em seu doença a ser a principal causa dos suicídios
trabalho de estudo populacional que mostrou (MORA, 2004).
que cerca de 20% das crianças e adolescentes
com idade entre nove e dezessete anos têm Suicídio
algum transtorno mental diagnosticável. Em Kaplan e Sadock (2007) relataram em
relação à depressão especificamente, estima-se seu estudo que o suicídio é a segunda maior
que a doença atinja, nos Estados Unidos, 0,9% causa de morte entre adolescentes. Muitas
das crianças em idade pré-escolar, 1,9% em internações resultam de ideação ou
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comportamento suicida. Este comportamento é adolescentes estão transmitindo uma mensagem
o caminho final comum para inúmeros de que alguma coisa está errada e que eles
transtornos, e sua alta incidência reflete precisam de ajuda, ainda que não tenham
psicopatologia grave. seriamente a intenção de se suicidar. Assim,
Segundo os estudos de Cândida segundo Cândida (2005), existe alguns sinais
(2005), a partir dos 15 anos o índice de que podem alertar o observador cuidadoso para
suicídios é frequente entre adolescentes. As a possibilidade de um eventual suicídio: ânimo
mulheres têm mais probabilidade do que os de constante depressão ou desespero; distúrbios
homens de usar métodos passivos (ingestão de na alimentação e no sono; piora do desempenho
drogas e venenos) de suicídio. Entre ambos os escolar; afastamento social gradual e maior
sexos, armas de fogo ou explosivos respondem isolamento dos outros; rompimento de
pelo número de suicídios efetivados, enquanto comunicação com pais ou outras pessoas
drogas e envenenamentos respondem pelo importantes na vida do jovem; tentativas
maior número de tentativas. Os eventos anteriores de suicídio; comportamento
desencadeadores incluem o rompimento ou descuidado, autodestrutivo e atípico;
ameaça de término de romance; gravidez, comentários como “queria morrer ou viver para
fracasso escolar, conflitos com pais, rejeição que?” Indagações sobre as propriedades letais
por parte de um amigo, ser apreendido num ato de drogas, venenos ou armas; acontecimentos
proibido ou delinquente. estressantes demais na vida.
Segundo Reis e Figueira (2002),
adolescentes com pensamentos e Transtorno Bipolar I
comportamentos suicidas persistentes, tentativa
anterior de suicídio, depressão, baixa O transtorno bipolar I está sendo
autoestima, solidão e pessimismo constituem diagnosticado com frequência crescente em
uma população com alto risco para uma crianças pré-púberes, levando-se em
tentativa de suicídio fatal. consideração o fato de que episódios maníacos
Cândida (2005) salienta que os “clássicos” são incomuns neste grupo etário,
adolescentes que tentam suicídio têm uma mesmo quando os sintomas depressivos já
longa história de instabilidade familiar tenham se manifestado. Uma vez que pré-
progressiva e discórdia, tem menos amigos púberes com manifestações de depressão e
íntimos, mas com relacionamentos mais mania ou hipomania em geral exibem ciclos de
intensos. Ao falarem de suicídio, os humor, permanece controverso se realmente
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satisfazem os critérios diagnósticos para atenção/hiperatividade (TDAH) é o distúrbio do
transtorno bipolar. Esses episódios maníacos neurodesenvolvimento mais comum na
atípicos são, por vezes, associados à história infância. A apresentação clínica do TDAH
familiar de transtorno bipolar I clássico compreende três categorias principais de
(KAPLAN; SADOCK, 2007). sintomas — desatenção, impulsividade e
Características de alterações no humor e hiperatividade — que se manifestam em
no comportamento incluem extrema ambientes diferentes e causam
variabilidade do estado de espírito, comprometimento funcional. Sabe-se também
comportamento agressivo intermitente, altos que o TDAH começa no início da vida e pode
graus de distratibilidade e baixa duração da persistir na adolescência e idade adulta. A
atenção. Esses aspectos não costumam ser prevalência citada em diferentes estudos variou
claramente episódicos, mas mostrar flutuações, de acordo com a faixa etária da amostra e os
e parecem ser menos responsivos aos critérios usados. A prevalência
estabilizadores de humor. tradicionalmente mencionada é de 3 a 5% das
Segundo Del Porto e Versiani (2005), crianças em idade escolar. Porém, é evidente
crianças com episódios hipomaníacos atípicos que os estudos mais recentes encontraram
repetidamente têm história de transtorno de prevalência mais alta, e os estudos
déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) epidemiológicos mais rigorosos definiram taxas
grave, tornando o diagnóstico de transtorno de 4 a 12% da população geral de crianças de 6
bipolar mais complicado. Em geral, famílias a 12 anos de idade(SILVA, 2003).
com muitos parentes com TDAH não tem Seja qual for a população estudada, o
história familiar indicando aumento da taxa de TDAH é diagnosticado com maior frequência
transtorno bipolar I. O grupo de crianças em meninos que em
portadoras de transtorno bipolar I apresenta meninas(WAJNSZTEJN,2006). Segundo a
funcionamento pobre, necessita de APA (1995) apud SÁNCHEZ (2004),
hospitalização frequentemente, exibe sintomas classificou os transtornos de déficit de
de depressão e tem história de TDAH. atenção/hiperatividade junto com os transtornos
de déficit de atenção e de comportamento
Transtorno de déficit de disruptivo incluídos nos transtornos geralmente
atenção/hiperatividade (TDAH) diagnosticados pela primeira vez na infância ou
na adolescência. Trata-se de um padrão de
O transtorno de déficit de conduta apresentado por crianças e
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adolescentes relacionados com dificuldades no Esquizofrenia na Infância e Adolescência
desenvolvimento da manutenção da atenção, no
controle dos impulsos, assim como na É caracterizada por pensamento
regulação da conduta motora em resposta às desordenado, distorções da realidade ou falta de
demandas da situação. contato com a realidade, a capacidade limitada
O TDAH é chamado, às vezes, de DDA para estabelecer relações significativas com os
(Distúrbios do Déficit de atenção). O déficit de outros; e pouco controle emocional. É sem
atenção fica particularmente claro quando se dúvida, o distúrbio psicótico que ocorre com
pede à criança que controle seu maior frequência. Sua incidência aumenta
comportamento. O problema não está tanto na drasticamente a partir dos 15 anos e atinge um
falta de atenção em si, mas na rápida queda da pico durante o final da adolescência e início da
capacidade de prestar atenção contínua fase adulta, estabilizando-se próximo ao final
(ROTHENBERGER; BANASCHEWSKI, da terceira décadA (CÂNDIDA, 2005).
2005). Segundo Kaplan e Sadock (2007), a
Segundo a Liga de Neurocirurgia esquizofrenia pode ser identificada pela falta de
Sistema Nervoso (2005), em muitos casos, o fala do jovem que se torna afetada,
transtorno acompanha o individuo na vida desconectada ou mesmo incoerente, com
adulta, embora os sintomas sejam mais brandos expressões faciais ou movimentos esquisitos,
quando comparados aos das crianças. No distraídos, retraídos ou confusos com reações
Transtorno de Déficit de Atenção emocionais impróprias, alucinações e ilusões
Hiperatividade ocomprometimento não é só intensas, bizarras que também podem estar
social, existe uma perda na aprendizagem presentes.
significativa, muitos chegam na adolescência Estes mesmos autores relataram que,
sem saber ler, mal saberão escrever, e foram fatores biológicos e hereditários amiúde
passadas de ano não por conhecimento, mas por desempenham papel importante no
influência os pais, ou pela lei que algumas desenvolvimento desta doença. Mas, pode ser
vezes comete enganos. mais preciso falar em herança de uma
Maluf (2005) relatou que o TDAH é vulnerabilidade maior à esquizofrenia do que
uma síndrome que, quando diagnosticada cedo em herdar esquizofrenia em si. Indivíduos
e tratada corretamente por profissionais, pode vulneráveis têm mais probabilidade de
fazer parte da vida da criança sem causar sérios desenvolver a doença ou de sofrer recaídas
problemas em seu dia-a-dia. depois do tratamento, se suas famílias foram
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caracterizadas por altos níveis de stress, a Mas em certos casos, a alimentação excessiva
manifestação de emoções negativas e o pode levar a séria obesidade e, em outros casos,
comportamento nos padrões de comunicação. a dieta extrema e prolongada pode levar a sérios
Os autores acreditam, ainda, que a graus de perda de peso que ameaçam a vida,
esquizofrenia esteja por trás do suicídio com conhecida como anorexia nervosa, mais
mais frequência do que os transtornos do humor provável de acontecer durante a adolescência,
maiores. sendo muito mais comum em mulheres. A
anorexia é uma condição extremamente
Psicose Reativa Breve desconcertante porque o adolescente tem uma
percepção muito distorcida de seu corpo. Os
Segundo Mari et al. (2005), é fatores biológicos podem desempenhar algum
importante distinguir entre episódios psicóticos papel, mas os psicológicos parecem ser de
breves e esquizofrenia. Embora durante os importância fundamental
episódios o indivíduo possa exibir alguns (KAPLAN;SADOCK, 2007).
sintomas psicóticos, repentinos e breves, tais Segundo Mari et al. (2005), os jovens
como incoerência, associações ou anoréxicos sentem que foram mimados e
comportamentos desorganizados, ilusões ou impedidos de conduzir suas vidas, além de ter
alucinações, que costumam aparecer logo sido incapazes de formar uma identidade
depois de um estressor psicossocial severo e pessoal forte. Talvez como reação, eles exibam
reconhecível, como a perda de um ente querido uma necessidade de controlar cada aspecto de
ou um acontecimento que ameace a vida. Há suas vidas, principalmente as funções corporais.
perturbação emocional, manifestada por rápidas Já a bulimia, que de acordo com estes
oscilações no humor, geralmente entre autores, combina elementos tanto da anorexia
depressão e ansiedade. Os autores relatam quanto da obesidade, é a ingestão excessiva de
ainda, que a psicose reativa breve pode ser alimentos alternada com sua eliminação,
acompanhada por sentimentos de leve através do vômito auto-induzido ou uso
depressão ou perda da autoestima. excessivo de laxantes. Adolescentes bulímicos
têm medo de não conseguir romper com esse
Perturbações na Alimentação padrão de alimentação e relatam um estado
depressivo e pensamentos auto-depreciativos
Ao se estabilizar o crescimento, o após a ingestão excessiva de comida.
adolescente corrigirá seu peso com uma dieta.
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Transtornos do uso de substâncias psicoativas central, como a eletroconvulsoterapia.
Os numerosos agentes farmacológicos
O uso de drogas, é um tipo de alteração utilizados para tratar transtornos psiquiátricos
de comportamento bastante visto na são designados por três termos gerais que são
adolescência. A dependência de drogas, que é o usados de forma intercambiável, segundo
transtorno mais grave desse grupo, manifesta-se Kaplan e Sadock (2007): medicamentos
pelo uso da substância associado a uma psicotrópicos, medicamentos psicoativos e
necessidade intensa de ter a droga, ausência de medicamentos psicoterapêuticos.
prazer nas atividades sem a droga e busca Mari et al. (2005) relataram que os
incessante da droga, muitas vezes envolvendo- agentes farmacológicos utilizados para tratar
se em situações ilegais ou de risco para se transtornos psiquiátricos eram divididos em
conseguir a mesma (roubo e quatro categorias: 1) antipsicóticos, ou
tráfico)(GALVÃO; ABUCHAIM,2001). neurolépticos, utilizados para tratar psicoses; 2)
antidepressivos, utilizados para se tratar
Transtornos de conduta depressão; 3) antimaníacos, ou estabilizadores
do humor, utilizados para tratar transtorno
Segundo Galvão e Abuchaim (2001), os bipolar; 4) agentes antiansiedade ou
transtornos de conduta caracterizam-se por ansiolíticos, utilizados para tratar estados
comportamentos repetitivos de contrariedade a ansiosos (os quais eram também eficientes
normas e padrões sociais, conduta agressiva, como hipnóticos em doses elevadas). Hoje,
desafiadora, constituindo-se em atitudes graves. contudo, esta divisão é menos válida do que foi
Geralmente, os adolescentes envolvem- no passado pelas seguintes razões:
se em situações de ilegalidade e violações do 1. Vários medicamentos de uma
direito de outras pessoas, tais como roubos, classe são utilizados para tratar
destruição de patrimônio alheio, brigas, transtornos para os quais antes
crueldade e desobediência intensa como eram indicados fármacos de
algumas das manifestações. outra classe. Por exemplo,
Ramos et al. (2006) chamam de muitos antidepressivos são
tratamento biológico as intervenções que empregados em casos de
envolvem o uso de drogas ou outros transtornos de ansiedade, e
procedimentos que atuam diretamente no alguns ansiolíticos são utilizados
organismo, em particular no sistema nervoso no tratamento de psicose,
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transtornos depressivos e podem ser utilizados para
transtornos bipolares. sedação diurna em baixas doses.
2. Agentes de todas as quatro Por essas razões, o profissional da área
categorias são utilizados para de saúde, principalmente os médicos, devem
tratar condições que antes não entender a categoria farmacológica de cada
recebiam atenção medicamento, suas indicações, contra-
medicamentosa, como indicações, interações medicamentosas e efeitos
transtornos da alimentação, adversos.
transtorno de pânico e
transtornos do controle dos Diretrizes clínicas para a escolha do
impulsos. medicamento
3. Drogas como clonidina
(Atensina), propanolol (Inderal), Segundo Kaplan e Sadock (2007), os
Verapamil (Dilacoron) e médicos que praticam psicofarmacologia
gabapentina (Neurotin) que clínica necessitam de capacidade tanto de
podem tratar uma série de diagnosticadores como de psicoterapeutas,
transtornos psiquiátricos de conhecimento dos medicamentos disponíveis e
forma efetiva não se encaixam capacidade de planejar um regime
com facilidade na classificação farmacoterapêutico.
tradicional de medicamentos. A escolha e o início da intervenção
4. Alguns termos descritivos medicamentosa, segundo Mari et al. (2005),
psicofarmacológicos se devem ser baseados na história do paciente, na
sobrepõem em significado. Por situação clínica atual e no plano de tratamento.
exemplo, os ansiolíticos Os psiquiatras devem conhecer o propósito ou o
reduzem a ansiedade, os objetivo do ensaio com o medicamento, o
sedativos produzem um efeito período em que o mesmo medicamento precisa
calmante ou relaxante e os ser administrado para avaliar sua eficácia, a
hipnóticos, sono. Contudo, a abordagem a ser tomada para se reduzir
maioria dos ansiolíticos atua quaisquer possíveis efeitos adversos, estratégias
como sedativos e, em doses medicamentosas alternativas a serem utilizadas
elevadas, podem ser utilizados caso a atual falhe e as indicações para a
como hipnóticos, e todos estes manutenção do regime de longo prazo.
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Segundo ensinamentos de Ramos et al. interligados: o diagnóstico e os sintomas-alvo.
(2006), os dois primeiros passos na escolha do É importante fazer um diagnóstico preciso e
tratamento medicamentoso, o diagnóstico e a também identificar e quantificar os sintomas-
identificação dos sintomas-alvo, devem ser alvo. Estes devem ser graves o suficiente a
preferencialmente realizados quando o paciente ponto de interferir no funcionamento e no
estiver livre de medicação para uma a duas desenvolvimento do paciente.
semanas. Este estado deve incluir também a Em alguns casos, continuam os autores,
ausência de medicação para o sono (como os esta decisão é facilitada, pois a mesma
hipnóticos), em vista da qualidade do sono medicação é efetiva tanto na patologia de base
poder ser um importante guia para o como nos sintomas-alvo. Por exemplo, os
diagnóstico e um sintoma-alvo. Se o paciente antipsicóticos são utilizados para tratar tanto a
está hospitalizado, contudo, razões de esquizofrenia como os seus sintomas-alvo
segurança podem tornar difícil ou mesmo (alucinações, delírios, distúrbios do
impossível conseguir um período livre de pensamento). O mesmo não ocorre com o
medicação. sintoma hiperatividade, presente em vários
Deve-se dar atenção não só aos transtornos psiquiátricos. O psiquiatra deve
medicamentos administrados no momento, mas fazer o diagnóstico de transtorno de déficit de
também aos que foram interrompidos, que atenção/hiperatividade antes de iniciar o
poderiam estar produzindo sintomas de tratamento com metilfenidato. O uso dessa
abstinência. Uma exceção a essa prática ocorre droga em um paciente com esquizofrenia em
quando se está ingerindo uma dosagem remissão, transtorno bipolar ou com um quadro
inadequada de um medicamento que, em outros borderline pode desencadear sintomas
momentos seria a mais apropriada. Nesses psicóticos.
casos, Ramos et al. (2006) ressaltam que o Kaplan e Sadock (2007) enfatizam que a
psiquiatra pode decidir continuar com o escolha do medicamento e de intervenções não-
medicamento, administrando-o em uma dose medicamentosas deve ser baseada na revisão
mais alta para completar um ensaio terapêutico cuidadosa e completa de todos os problemas e
adequado. recursos do paciente. Deixar de diagnosticar
Segundo Rocha et al. (2004), ao decidir uma condição tratável é uma razão comum de
qual psicofármaco usar em determinado resultados clínicos insatisfatórios.
paciente, deve-se levar em consideração dois
fatores igualmente importantes e comumente
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A importância do diagnostico tricíclicos e lítio, pois estes podem causar
alterações cardiológicas. O eletroencefalograma
Segundo Brasil (2000), a investigação (EEG) também está indicado em casos
clínica da criança tem suas particularidades. selecionados (pacientes com epilepsia ou de
Uma avaliação adequada oferece condições alto risco para epilepsia) ao se usar
para o diagnóstico inicial e para o antipsicóticos, antidepressivos e lítio, pois estes
encaminhamento do caso. Nela, o psiquiatra podem baixar o limiar convulsivo. Testes de
precisa levar em conta variáveis determinantes função da tireóide são recomendados ao se usar
para se chegar a uma formulação diagnóstica; lítio, pois este pode causar hipotireoidismo.
deve ir além da queixa dos pais e da história da Com o uso de tricíclicos, um funcionamento
criança contada por eles. Nem sempre o motivo tireóideo anormal prévio pode agravar arritmias
da consulta e os dados de anamnese são cardíacas causadas por estes fármacos.
coerentes entre si e com os obtidos no encontro
com a criança ou adolescente. Na anamnese da Considerações especiais quanto à utilização de
criança deve-se levar em conta o contexto psicofármacos em crianças e adolescentes
familiar e social; realizar seu exame psíquico;
detectar áreas saudáveis de seu funcionamento; Kaplan e Sadock (2007) relataram que
o grau de seu sofrimento psíquico ou o prejuízo durante a década de 1990, houve muitos
nas áreas comprometidas; sua idade e seu avanços na farmacoterapia de transtornos
desenvolvimento motor, cognitivo e emocional. psiquiátricos na infância, incluindo dados
Rocha et al. (2004) salientaram que apoiando a eficácia dos inibidores seletivos de
deve-se obter uma história clínica e exames recaptação de serotonina (ISRS), no tratamento
físico e neurológico completos para descartar de transtornos depressivos, transtornos
fatores orgânicos que possam estar obsessivo-compulsivos e transtornos de
contribuindo para a sintomatologia psiquiátrica. ansiedade.
Recomendam-se os seguintes testes Segundo Maia et al. (2007), os
laboratoriais: hemograma completo; níveis transtornos de ansiedade (TA) são patologias
plasmáticos de uréia, creatinina, sódio, freqüentemente identificadas em crianças e
potássio, cloro, cálcio, dióxido de carbono e adolescentes, podendo ocasionar prejuízos no
fosfato; e testes de função hepática. Um funcionamento familiar, social e escolar.
eletrocardiograma (ECG) basal deve ser obtido Transtorno de pânico (TP), fobias específicas
antes da administração de antidepressivos (FE), fobia social (FS), transtorno obsessivo
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compulsivo (TOC), transtorno de estresse pós- foram devidamente explorados.
traumático (TEPT) e transtorno de ansiedade O sintoma, ao pertencer a quadros
generalizada (TAG) podem ocorrer em todas as sindrômicos ou categoriais distintos, receberá
faixas etárias. Os TA, em crianças e indicações de tratamento e/ou de psicofármacos
adolescentes, são, frequentemente, comórbidos de grupos totalmente diferentes. Por exemplo,
e os psicofármacos, em especial os inibidores num paciente o sintoma de "hiperatividade
da recaptação da serotonina (ISRS), são psicomotora" pode estar presente no transtorno
considerados importantes componentes do de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH),
tratamento destas patologias. num transtorno difuso do desenvolvimento, no
A indicação de psicofármacos para o retardo mental, em transtornos do humor, em
tratamento de problemas de saúde mental em transtornos de ansiedade e em situações reativas
crianças e adolescentes traz preocupação, mas ao ambiente.
também esperanças. Preocupação pelo risco A autora lembra que alguns transtornos
dessas indicações tenderem a banalizar o uso mentais, em crianças e adolescentes, com
como solução imediata e não como um recurso frequência apresentam comorbidade, o que
possível a partir da avaliação risco-benefício. influencia o plano terapêutico, a evolução e o
Esperança pela possibilidade de novas drogas prognóstico do quadro clínico. Por exemplo, o
ajudarem a diminuir graves prejuízos que os TDAH tem melhor prognóstico quando não
transtornos mentais acarretam às crianças e aos associado ao transtorno de conduta e seu
adolescentes a curto e a longo prazo. tratamento como quadro único tem muito mais
Segundo Brasil (2000), embora, em chance de sucesso. Quando em comorbidade a
grande parte, o emprego de psicofármacos em um transtorno depressivo, o planejamento
crianças e adolescentes vise mais os sintomas terapêutico precisa levar em conta essa
do que o quadro geral de um transtorno, a associação.
escolha da droga deve ser feita a partir de Segundo Rocha et al. (2004), a
critérios sindrômicos. Ou seja, o tratamento dos farmacocinética lida com o processo biológico
transtornos mentais e do comportamento com que leva a alterações na concentração de drogas
drogas psicoativas é sintomático e seu uso deve nos tecidos e fluidos corporais. As mudanças
limitar-se ao imprescindível. Na decisão de se que ocorrem durante o crescimento na
usar um psicofármaco, é preciso ponderar se a absorção, distribuição, metabolização e
relação risco-benefício potencial da droga excreção de fármacos podem afetar o
justifica seu emprego e se outros recursos fornecimento de uma droga ao tecido-alvo.
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Crianças e adolescentes freqüentemente quantidade de eventos adversos. Isso é
necessitam de doses mais altas por peso do que importante para que o clínico fique atento aos
adultos para conseguir resultados terapêuticos e sintomas de toxicidade quando receitar algum
níveis séricos equivalentes. Isso se atribui a desses psicofármacos. Por exemplo, 88,3% dos
dois fatores: metabolismo mais rápido pelo pacientes relataram ao menos um evento
fígado e filtragem glomerular aumentada. adverso com o uso de paroxetina. Os
Estes mesmos autores recomendam que, benzodiazepínicos mostraram benefícios pouco
ao escolher o psicofármaco, deve-e optar por expressivos. No ensaio clínico com imipramina,
aquele com menor risco de causar efeitos além do número expressivo de comorbidades,
colaterais sérios, resposta prévia do paciente, houve pouca melhora no grupo tratado.
respostas de familiares àquele medicamento e Contudo, os autores afirmaram que os ISRS
experiência do próprio médico com o são, até o momento, os psicofármacos com
psicotrópico são fatores importantes. Em maior número de ensaios clínicos controlados
relação à posologia, recomenda-se o uso inicial para TA em crianças e adolescentes.
de doses baixas. Com isso, evitam-se doses Apresentam resultados modestos quando
iniciais que excedam a dose terapêutica para comparados ao placebo e são liberados pelo
alguns pacientes, abrangendo-se também FDA apenas para o uso em casos de TOC. A
aquelas crianças e adolescentes que obtêm boa presença de eventos adversos de leves a
resposta com pequenas doses. moderados deve manter o clínico atento durante
O aumento da dose deve continuar até o período de seguimento. Em termos de
que um dos seguintes eventos ocorra: a) uma implicações clínicas, os referidos autores
diminuição satisfatória dos sintomas; b) o sugerem que exista espaço para o tratamento
alcance do limite superior da dosagem farmacológico com os ISRS nos TA em
recomendada; c) a observação de efeitos crianças e adolescentes, mas que seu uso deve
colaterais que impossibilitem um aumento da ser monitorizado com cautela nessa faixa etária.
dose; ou d) após uma melhora quantificável dos Segundo Kaplan e Sadock (2007), os
sintomas-alvo, a ocorrência de um platô na tricíclicos quase não foram recomendados
melhora ou uma piora nos sintomas com desde que os ISRS apareceram no mercado,
aumentos adicionais da dose (ROCHA et al. porque estes têm perfis de efeito adverso mais
2004). favoráveis. Fluoxetina, sertralina, paroxetina,
No estudo de Maia et al. (2007), as fluvoxamina e nefazodona são usadas com
pesquisas com ISRS revelaram maior relativa frequência para crianças e adolescentes.
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A preocupação em relação aos tricíclicos 2000).
centraliza-se em seu potencial para
cardiotoxicidade, que pode ter contribuído para As drogas psicoativas mais utilizadas em
as mortes subidas de quatro crianças que crianças e adolescentes
estavam sendo tratadas com desipramina para
transtorno de déficit de atenção/hiperatividae Os antidepressivos são empregados no
(TDAH). Outros antidepressivos, incluindo tratamento de estados depressivos, de caráter
bupropiona e venlafaxina, são agentes de endógeno ou biológico, e nos transtornos de
segunda linha que costumam ser administrados ansiedade. O tratamento começa com doses
quando os ISRS não são eficazes. baixas, com atenção à tolerância inicial do
As drogas antidepressivas são eficazes paciente. O aparecimento dos efeitos
em muitas formas de depressão, sendo capazes antidepressivos pode levar até 4 a 6 semanas,
de melhorar notavelmente o humor depressivo enquanto os efeitos colaterais surgem mais
sem possuírem ação euforizante sobre a pessoa precocemente. A remissão completa dos
sadia. Em outras palavras, apresentam uma sintomas pode demorar, não se deve considerar
ação específica sobre os mecanismos que uma droga tenha atingido sua maior
fisiopatológicos da depressão. eficácia antes que a dose máxima tenha sido
No tratamento psicofarmacológico, é mantida por um período mínimo de quatro
importante não buscar objetivos gerais, mas semanas(RAMOS; CORDÁS; SALZANO,
específicos, de acordo com o sintoma-alvo. Isso 2006).
possibilita melhor controle da eficácia da Matos e Souza (2005) salientou que os
medicação, controle do tempo de tratamento e a antidepressivos produzem, em média, uma
individualização do mesmo para cada criança. melhora de 60% a 70% dos sintomas
Também é importante explicar aos pais depressivos no prazo de um mês. Em termos de
ou responsáveis que cada medicação requer um eficácia parece não haver diferenças
determinado período de tempo para agir e que significativas entre as drogas, o que não
não se deve interromper abruptamente o uso de significa dizer que todos os pacientes
determinadas drogas. Como procedimento responderão aos diferentes antidepressivos da
inicial, queixas somáticas, esteriotipias, mesma maneira.
maneirismos e tiques devem ser registrados Ramos et al. (2006) relataram que a
para não serem confundidos, posteriormente, clomipramina, a fluoxetina e a paroxetina têm
com efeitos colaterais ou adversos (BRASIL, sido os últimos antidepressivos usados com
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sucesso no tratamento do transtorno obsessivo dieta especial sem tiramina. Eles têm efeitos
compulsivo. As doses necessárias costumam ser adversos graves e interagem com outros
altas e os efeitos terapêuticos podem surgir até medicamentos, podendo causar crises
após seis meses de uso. hipertensivas e convulsões. Entre os alimentos
A clomipramina, de acordo com estes e drogas que devem ser evitados estão queijos,
mesmos autores, é indicada no tratamento de chocolates, comidas defumadas, passas,
TOC em doses iniciais de 25 mg/kg, com remédios para resfriados e para asma,
aumentos semanais, de acordo com a resposta estimulantes, cafeína, tricíclicos, etc (ROCHA
clínica, até chegar à dose máxima, de 3 mg/kg. et al., 2004).
A dose máxima em adolescentes é de 250 mg Segundo Matos e Souza (2005), antes de
ao dia. O risco maior deste medicamento é a iniciar a terapia com antidepressivos, é
diminuição do limiar convulsivo, sendo este necessário investigar a coexistência de
efeito cumulativo. distúrbios decorrentes do uso de substâncias
Rocha et al. (2004) relataram que a bem como outras condições médicas que estão
imipramina (uma representante dos sendo tratadas concomitantemente, para evitar
antidepressivos tricíclicos) tem sua eficácia interações medicamentosas indesejáveis.
comprovada no tratamento de depressão maior Comorbidade com doenças clínicas, em
em crianças, mas nenhum estudo duplo-cego especial as da tireóide, tem sido frequentemente
confirmou esses achados. Os estudos com associada ao quadro depressivo. Este autor
adolescentes também demonstraram uma relata ainda os efeitos colaterais dos
resposta pobre a esses tratamentos. Outras antidepressivos. Segundo ele, a hipomania é
indicações para o tratamento com os tricíclicos uma complicação que atinge de 5 a 20% dos
são enurese, transtorno de déficit de pacientes deprimidos tratados com
atenção/hiperatividade e angústia de separação. antidepressivos. No ganho de peso é induzido,
As doses iniciais sugeridas para o tratamento de principalmente por antidepressivos tricíclicos,
transtorno depressivo maior são de 25 mg à inibidores da monoaminoxidase (MAO) e lítio.
noite, aumentando-se 25 mg a cada 3 dias, de A indução de convulsão pode ser
acordo com a resposta clínica ou até se atingir atribuída a alguns antidepressivos – o risco te
uma dose máxima de 5 mg/kg/dia. sido discreto (menor do que 1%) e pode se
Já os inibidores da monoamino-oxidase elevar com o aumento da dose. Os
(IMAO) são antidepressivos pouco usados na antidepressivos tricíclicos, trazodona e
infância e adolescência porque requerem uma inibidores da MAO usualmente provocam
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hipotensão ortostática como principal efeito Segundo Kaplan e Sadock (2007), os
cardiovascular. Esse efeito indesejável pode ser antagonistas de opióides endógenos, como a
minimizado com o aumento mais lento da dose. naltrexona, e os ISRS, como a fluoxetina, têm
O distúrbio do sono e a ansiedade sido prescritos na tentativa de diminuir
podem ser exacerbados por fluoxetina em comportamento autodestrutivo em pacientes
alguns pacientes, assim como a desipramina e a com retardo mental. Quando TDAH coexiste
bupropiona podem aumentar a com esta condição, o metilfenidato tende a ser
ansiedade(MATOS; SOUZA, 2005). efetivo.
Segundo Rocha et al. (2004), o uso de As doses iniciais de Cloridrato de
lítio tanto em crianças quanto em adultos fluoxetina sugeridas para crianças são de 5 a 10
implica cuidados na manutenção de níveis mg, utilizando-se a forma líquida para melhor
terapêuticos. No caso do uso em crianças deve- dosagem. A dose terapêutica tende a ser entre
se evitar níveis tóxicos, pois nessa faixa etária 10 e 20 mg, administrada pela manhã, para
há rápido metabolismo e riscos aumentados de evitar insônia. Nos adolescentes, inicia-se com
desidratação, especialmente em crianças uma dose matinal de 10 mg, aumentando para
hiperativas. Os principais efeitos colaterais 20 mg em 1 a 2 semanas. As doses para o
incluem náuseas, vômitos, aumento de peso, tratamento de transtorno obsessivo-compulsivo
cefaléias e tremores. Os níveis séricos devem (TOC) em adolescentes podem ser aumentadas
ser monitorados com cuidado, para evitar até 80 mg, divididas em duas tomadas se não
toxicidade, e deve-se estar atento para o houver resposta terapêutica em mais de 5
desenvolvimento de hipotireoidismo e semanas. As doses recomendadas para bulimia
leucocitos. são de 60 mg ao dia. Os principais efeitos
Estes autores relataram que, quando se colaterais incluem inapetência, perda de peso,
usa a carbamazepina é frequente a ocorrência náusea, aumento de ansiedade, insônia e
de tonturas, diplopia e náuseas no início do agitação (ROCHA et al., 2004).
tratamento. E, que o ácido valpróico pode Antidepressivos podem ser tentados
causar sedação e efeitos gastrointestinais, que para crianças com TDAH que são resistentes a
são menores na forma de divalproato sódico. estimulantes e aquelas com transtornos de tique
Também podem ocorrer ganho de peso e preexistentes. Bupropiona é tentada quando os
hepatotoxicidade. Deve-se atentar para a estimulantes são ineficazes no tratamento de
possibilidade de desenvolvimento de ovários TDAH. A desipramina tem sido um pouco
policísticos em meninas. efetiva, mas seu uso é limitado devido aos
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riscos associados. Outros tricíclicos, hoje pouco mental, pois facilita o desempenho em diversos
recomendados, incluindo a nortriptilina e a testes cognitivos, psicolingüísticos, de memória
clomipramina, foram tentados com algum e vigilância padronizados, mas não melhora as
sucesso (ROTHENBERGER; avaliações de desempenho acadêmico ou
BANASCHEWSKI, 2005). avaliações do professor.
Antipsicóticos “atípicos” mais recentes Esse mesmo agente (metilfenidato) é o
– antagonistas de serotonina-dopamina (ADSs) mais pesquisado no tratamento de TDAH. A
– como a risperidona, a olanzapina, a clozapina dextroanfetamina tem eficácia comparável e, ao
e a ziprasidona permitiram que uma variação contrário do metilfenidato é aprovada pela Food
mais ampla de pacientes resistentes se and Drug Administration (FDA) para crianças a
beneficiasse de tratamento com neurolépticos. partir dos 3 anos de idade; a idade inicial para o
Acredita-se que os ASDs aliviem tanto os metilfenidato é de 6 ano (ROTHENBERGER;
sintomas positivos como os negativos de BANASCHEWSKI, 2005).
esquizofrenia e produzam menos risco de Kaplan e Sadock (2007) relataram que o
efeitos adversos extrapiramidais e menos haloperidol, em dosagens não-sedativas
potencial para o desenvolvimento de discinesia revelou-se eficaz na redução de acessos de
tardia (ROCHA et al., 2004). raiva, agressividade, estereotipias,
No tocante aos antagonistas dos comportamento autodestrutivo, hiperatividade e
receptores β-adrenérgicos, Kaplan e Sadock retraimento em crianças com transtorno autista.
(2007) relataram que estes reduziram a Este mesmo antipsicótico, assim como a
agressividade em estudos não-controlados de pimozida são os medicamentos mais efetivos
adultos e crianças com retardo mental. Lítico e para o transtorno de Tourette. O uso de
anticonvulsivantes, como carbamazepina, estimulantes como a clonidina reduz tiques
também podem ser tentados. Os antipsicóticos tanto no TDAH em crianças e adolescentes
têm a vantagem de início de ação rápido e como nos casos co-mórbidos.
pouca necessidade de monitoração laboratorial Maia et al. (2007) relataram que os
de seus efeitos adversos, mas o uso de outros ISRS foram estudados no transtorno autista,
fármacos elimina o risco de discinesia tardia. quando pesquisadores postularam uma
Estes autores salientaram, também, que associação entre os comportamentos
o metilfenidato é indicado nos transtornos de compulsivos no tratamento obsessivo-
aprendizagem, mas sem outro transtorno compulsivo e comportamentos estereotipados
comuns em crianças com autismo. Até o
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momento, a clomipramina e a fluoxetina adolescente possam ter que enfrentar,
revelaram-se promissoras para acabar com denominada,ansiedade antecipatória,
estereotipias e outros comportamentos em relacionada a episódios potencialmente
pessoas autistas. geradores de medo e ansiedade, como no caso
A eficácia de medicações como de procedimentos médicos (ROCHA et al.,
alprazolam e clonazepam pode ser claramente 2004).
comprovada no tratamento de sintomas
somáticos e sinais autonômicos de ansiedade Combinações medicamentosas
(palpitações, tremores, sudorese) encontrados
em diferentes transtornos de ansiedade, como Segundo Mari et al. (2005), o
pânico, por exemplo (ROCHA et al., 2004). tratamento com combinações medicamentosas é
Kaplan e Sadock (2007) recomendam a por vezes utilizado para se atingir a melhor
utilização destes agentes (benzodiazepínicos) resposta no tratamento dos transtornos mentais.
assim como dos tricíclicos em casos de terror As razões incluem falta de resposta, resposta
noturno e de sonambulismo. Segundo estes parcial, demora no início da resposta,
autores, estes agentes atuam reduzindo tanto o intolerância aos efeitos adversos e presença de
sono de onda delta como despertares entre os transtornos co-mórbidos.
estágios de sono. De acordo com os autores: As estratégias de combinação, segundo
doses terapêuticas de cloridrato de sertralina Kaplan e Sadock (2007) podem envolvem dois
(entre 25 e 200 mg/dia) são recomendadas para ou mais agentes com a mesma indicação
o tratamento de TOC, transtorno de pânico e terapêutica. Em alguns casos, pode haver uso
transtorno pós-traumático; doses de 20mg de simultâneo de duas classes diferentes de
cloridrato de paroxetina é indicada para casos antidepressivos (por exemplo, um inibidor
de depressão e fobia social. Enquanto que as seletivo da recaptação de serotonina (ISRS) e a
doses de 40mg são utilizadas para o tratamento bupropiona (Wellbutrin). Outras estratégias
de TOC e transtorno de pânico. A clonidina consistem no acréscimo de um segundo agente
(um estimulante) é efetiva quando o transtorno com uma indicação não-relacionada, como
de conduta está associado ao TDAH e quando a hormônio da tireóide associado a um
agressividade é leve. antidepressivo.
Os benzodiazepínicos podem também Alguns medicamentos são utilizados
controlar a ansiedade proveniente de situações quase exclusivamente com papel auxiliar. Os
circunscritas específicas que a criança ou o antiparkinsonianos, por exemplo, costumam ser
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prescritos por psiquiatras para tratar os efeitos consistentes sobre interações medicamentosas,
adversos extrapiramidais dos antagonistas dos principalmente das drogas metabolizadas por
receptores de dopamina. A co-administração de isoenzimas do citocromo P450 (CYPs). Tais
agonistas de benzodiazepínicos pode melhorar fatos têm gerado preocupação tanto pela
o resultado do tratamento ao aumentar os possibilidade de diminuírem a ação das drogas
efeitos do agente principal ou auxiliar a envolvidas, quanto pelo potencial de causarem
manejar sintomas particulares, como a toxicidade.
ansiedade ou a insônia, que acompanham a De acordo com Oliveira (2009), muitos
maioria dos transtornos psiquiátricos. pacientes com transtorno bipolar podem não
No entanto, os referidos autores ficar estáveis com um único estabilizador de
lembram que cada agente adicional aumenta a humor. O tratamento em combinação é, assim,
possibilidade de interações adversas. Além comum no manejo dessa condução. Em geral,
disso, passa a mensagem que a pessoa em os pacientes tomam um estabilizador principal
tratamento pode interpretar – por vezes de fora do humor, como o lítio, a carbamazepina
correta – como o desespero. Em termos de (Tegretol) ou o divalproato (Depakote), ou uma
adesão, quanto mais medicamentos são combinação destes. Como acréscimo, um
utilizados, mais relutante pode ficar o paciente antagonista dos receptores de dopamina, um
em continuar o tratamento. ASD ou o clonazepam (Rivotril) podem ser
As principais considerações ao utilizar a utilizados ao mesmo tempo, em particular
potencialização de medicamentos incluem o durante o tratamento de mania aguda. Os
potencial para o aumento da resposta e os riscos pacientes com transtorno bipolar na fase
possíveis. É prudente informar o paciente dos depressiva também podem ser tratados com um
riscos e benefícios envolvidos nas combinações antidepressivo.
medicamentosas e documentar com clareza as Segundo Brasil (2000), em crianças e
razões para utilizar essa estratégia. adolescentes, a associação de psicofármacos
Segundo Brasil (2000), o uso entre si ou com medicamentos para problemas
concomitante de vários psicotrópicos, seja para clínicos (p. ex. acne, candidíase, problemas de
potencializar efeitos, pela presença de vias aéreas superiores, entre outros) requer
comorbidades ou de outras condições médicas cautela. Benzodiazepínicos (alprazolam ou
associadas, tem sido frequente. O maior clonazepan), quando associados à eritromicina
conhecimento do metabolismo dos oral (usada em infecções cutâneas) ou ao
psicotrópicos tem fornecido dados mais cetoconazol oral (medicação usada na
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candidíase ou outras infecções micóticas), têm humor em crianças e adolescentes seguem os
seus metabolismos alterados, pois a parâmetros de controle usados em adultos,
eritromicina e o cetoconazol são dois potentes devendo-se monitorizar os níveis séricos das
inibidores do CYP3A. O lorazepam não é drogas e realizar hemograma com contagem de
metabolizado via CYP e deve ser a opção de plaquetas para o controle de eventuais
escolha nessas situações. A claritromicina, leucopenias com carbamazepina. O ganho de
antibiótico usado no tratamento de infecções de peso excessivo pode ser um problema com o
vias aéreas superiores e de outros tipos de uso de ácido valpróico, assim como efeitos
infecções, é um potente inibidor do CYP3A e, gastrointestinais no início do tratamento.
se usado com determinados neurolépticos Para Brasil (2000), os tratamentos
(risperidona, pimozide, haloperidol), pode levá- devem ser mistos, envolvendo intervenções
los a níveis tóxicos. farmacológicas, psicoterápicas e psicossociais,
Rocha et al. (2007) relataram que os na maioria dos transtornos mentais na infância
estabilizadores do humor são medicações e adolescência. Portanto, o uso da medicação
usadas em psiquiatria da infância e não deve constituir "o tratamento da criança"
adolescência habitualmente da mesma forma mas sim fazer parte de um plano mais amplo
que são usadas em adultos, ou seja, a sua maior em que outros tipos de intervenções também
indicação é o tratamento do transtorno de sejam incluídas.
humor bipolar. Por outro lado, sintomas como
descontrole de impulsos e agressividade, Psicanálise versus Psicofarmacologia
presentes em uma variedade de outros quadros,
podem também ser controlados com drogas Segundo Pimentel (2008), a psicanálise
como lítio, carbamazepina e ácido valpróico. atua no sentido contrário dos psicofármacos. O
Essas medicações podem ser usadas para o que não significa que ela desconsidere a
tratamento do transtorno, não havendo utilidade e eficácia destes.. Na verdade a
diferenças estatisticamente significativas no psicanálise visa não somente a supressão dos
efeito das drogas quando comparadas entre si. sintomas, mas também pensar o papel que este
Há, no entanto, clara descrição na literatura da sintoma desempenha na organização psíquica
necessidade de, em muitos casos, associar-se do sujeito. Para o uso de medicação basta uma
mais do que um estabilizador para o controle da queixa, algo que cause sofrimento e o desejo de
ciclagem e de episódios maníacos. livrar-se desta dor. Isto acontece porque os
Os cuidados com os estabilizadores do psicofármacos possuem um ideal de eficácia:
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eliminar os sintomas e qualquer fator individual em relação a combinações de psicoterapia e
que altere este resultado deve ser medicação. Psicoestimulantes, como
desconsiderado. Em contrapartida, para a metilfenidato e dextroanfetamina, quando
psicanálise é necessário que haja também um combinados com terapia comportamental ou
desejo de saber sobre o sintoma. A autora cognitivo-comportamental, são mais efetivos
acredita que existe uma articulação da para melhorar o comportamento social e
psicanálise associada com a terapia desempenho acadêmico.
medicamentosa. A função do psicofármaco no Segundo Antônio et al. (2006), nenhum
contexto analítico não buscaria a redução dos estudo de tratamento psicoterapêutico e
sintomas ou adaptação social, mas propiciar medicação combinados de transtornos do
calma ou ânimo suficiente para o paciente, humor, transtornos de ansiedade ou
possibilitando a fala, permitindo que a análise esquizofrenia em adolescentes foi publicado,
possa prosseguir, permitindo melhores mas estudos em pacientes adultos, como
condições para a elaboração dos conflitos. aqueles com transtorno depressivo maior,
Kaplan e Sadock (2007) relataram que a transtorno obsessivo-compulsivo e
psicoterapia com crianças e adolescentes em esquizofrenia sugerem que psicoterapia
geral é mais direta e ativa do que costuma ser combinada com medicação tem maior
com adultos. As crianças não conseguem, eficiência para reduzir os sintomas.
muitas vezes, sintetizar as histórias de suas Avanços no desenvolvimento de
próprias vidas, mas são excelentes relatores de fármacos ampliaram a escolha dos
seus estados internos atuais. Este tipo de medicamentos para tratar transtornos de humor
tratamento é indicado para crianças com (ISRS) e esquizofrenia (ASDs, incluindo
transtornos emocionais que parecem ser risperidona, olanzapina e clozapina). Ainda que
permanentes o suficiente a ponto de impedirem esses medicamentos tenham sido usados para
o amadurecimento e o desenvolvimento. Além tratar transtornos do adolescente, uma pesquisa
disso, pode ser indicada quando seu sistemática é necessária para determinar a
desenvolvimento não está atrasado, mas eficácia e os perfis de segurança de tais agentes
induzindo reações no ambiente que são no tratamento de psicopatologia adolescente
consideradas patogênicas. (MAIA; ROHDE, 2007).
De acordo com estes autores, o As intervenções psicoterápicas podem
transtorno de déficit de atenção/hiperatividade ser de diferentes formatos, como psicoterapia
tem sido estudado de forma mais sistemática de apoio, psicodinâmica breve, terapia
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interpessoal, terapia comportamental, terapia As considerações do tratamento
cognitiva comportamental de grupo, de casais e centralizam-se no conceito de que as pessoas
de família (MATOS; SOUZA, 2005). deprimidas podem aprender a melhorar suas
A abordagem psicodinâmica presume habilidades sociais e a aumentar a sua
que os eventos da história e os aspectos do participação em atividades agradáveis. Quando
desenvolvimento da personalidade interagem as pessoas começam a experimentar um
para causar os problemas psicológicos atuais de aumento nas atividades agradáveis e quando
um paciente. Alguns pesquisadores indicam que sua habilidade para se relacionar bem com os
as experiências de vida são a influência outros resulta em crescente reforço social para
estatisticamente mais importante em relação os comportamentos não-depressivos, sua
aos escores de depressão (WAJNSZTEJN, depressão melhora (TOLMAN, 2009).
2006). Portanto, segundo Tolman (2009), o
A abordagem comportamental focaliza- tratamento comportamental geralmente consiste
se em como o comportamento das pessoas de:
(especificamente as habilidades sociais) atinge • definir uma lista de eventos
a sua capacidade de receber reforço positivo agradáveis para o paciente e
vindo do ambiente. Como o reforço aumenta a pedir que aumente o número
frequência mensurável do comportamento, a de eventos agradáveis que
incapacidade que uma pessoa tem de receber realiza diariamente – isso
reforço para um comportamento saudável afeta geralmente implica que os
diretamente os sintomas depressivos pacientes façam um registro
(TOLMAN, 2009). diário das suas atividades,
Atividades prazerosas podem servir juntamente com uma escala
como reforçador na elevação do humor, mas, de satisfação com as
para as pessoas deprimidas, geralmente faltam atividades, variando de 1 a
às habilidades sociais necessárias para tais 10.
atividades ou falta pelo menos a capacidade de • pedir ao paciente que faça o
manifestar tais habilidades quando estão acompanhamento do seu
deprimidas. Portanto, o objetivo principal da humor, fazendo um diário
terapia comportamental é aumentar a de como se sente durante os
quantidade de atividades prazerosas, bem como eventos e também no início
as interações que elevam o humor.
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Revista da Universidade Vale do Rio Verde, Três Corações, v. 12, n. 2, p. 1013-1049, ago./dez. 2014
e no final do dia – este frequentemente se revela
exercício ajuda o paciente e uma abordagem de
o clínico a conhecerem a tratamento eficaz. Essas
relação entre o humor no técnicas permitem que os
início do dia, durante as pacientes pratiquem novos
atividades e no final do dia. comportamentos e recebam
O diário do humor serve um feedback direto do
como base para a clínico. Clinico e paciente
intervenção, com técnicas podem, então, discutir e
que ajudam a aumentar as trabalhar antecipadamente
habilidades, os reforçadores os empecilhos ao sucesso do
e, consequentemente, o uso dos novos
humor; comportamentos.
• realizar um treinamento de • Praticar a terapia de
habilidades sociais, exposição – o clinico
assertividade, resolução de acompanha o paciente até
problemas e relaxamento – um ambiente típico de uma
o treinamento nessas áreas situação social temida. As
pode ajudar os pacientes a técnicas praticadas durante
construírem as sessões de terapia podem
relacionamentos e a se então ser praticadas no
sentirem mais no controle, a ambiente real. Isso permite
tomarem decisões e a se que o paciente aperfeiçoe
acalmarem; novas habilidades e
• utilizar o ensaio dos solucione problemas no
comportamentos e o role contexto de uma situação
playing – fazer com que os segura.
pacientes ensaiem e
representem novos O uso da terapia comportamental,
comportamentos durante a terapia familiar, treinamento de habilidades
sessão de terapia sociais e treinamento parental constitui um
importante aliado no tratamento do TDAH.
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Lembrando que TDAH não é um problema de • Terapia como colaboração ativa
aprendizado como a dislexia e a disortografia, – desde o inicio do tratamento o
mas dificuldades em manter a atenção, clinico enfatiza a colaboração
associada à desorganização e a inquietude que ativa e envolve o paciente na
atrapalham bastante o rendimento dos estudos definição da pauta das sessões.
(MALUF, 2010). Pergunta explicitamente ao
As teorias cognitivo-comportamentais paciente quais as questões mais
concentram-se em como os pensamentos, as urgentes e pede que compartilhe
imagens e o sistema de crenças internos da a visão do clinico do que
pessoa afetam o seu comportamento. Apesar de poderia ser alcançado na sessão.
existirem várias teorias cognitivas diferentes, os • Educar os pacientes sobre a
métodos de tratamento tendem a incorporar abordagem de tratamento – o
estratégias comportamentais devido à interação clínico educa o paciente a
entre cognições e comportamento (TOLMAN, respeito da relação sobre
2009). eventos, pensamentos,
Segundo Lima (2004) é recomendável a sentimentos e comportamento,
utilização da terapia cognitivo-comportamental enfatizando que os eventos (por
com a criança e a família, treinamento de si só) não determinam a reação
necessidades sociais (semelhante à terapia emocional, mas que são os
cognitivo-comportamental, com grande enfoque pensamentos sobre os eventos
em atividades abertas e desenvolvimento de que lhes dão um significado.
habilidades específicas), psicoterapia • Criar habilidades para testar as
interpessoal, com foco no relacionamento, e hipóteses – o clinico examina
terapia familiar(LIMA, 2004). primeiro as crenças específicas
Os clínicos cognitivo-comportamentais que causam sofrimento
concentram-se na identificação, na testagem emocional (por exemplo: não
objetiva e na correção dos padrões de consigo fazer nada certo), e
pensamento distorcido e dos esquemas então, testando diretamente
subjacentes. Utilizando-se os elementos ativos essas hipóteses (por exemplo:
da terapia cognitivo comportamental associados pedir que o paciente faça listas
à mudança, uma abordagem de tratamento do que fez de errado e certo
típica incluiria, segundo Tolman (2009):
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durante as últimas três semanas) certas crenças; sentimentos que
e pedindo que o paciente avalie se relacionam a crenças
os dados. particulares; alternativas para as
• Aumentar a percepção das crenças irracionais, dentre
distorções de pensamento – outras.
ajuda o paciente a reconhecer as
distorções de pensamento. Em muitos aspectos, a psicoterapia de
Como por exemplo: em resposta grupo é um ambiente natural para adolescentes.
a uma afirmação como “sempre A maioria deles fica mais à vontade com iguais
fui um fracasso total”, o clinico do que com adultos. O grupo diminui a
poderia perguntar: “você sensação de poder desigual entre o terapeuta
fracassou em tudo ou houve adulto e o paciente adolescente. A participação
algumas áreas em que realmente varia, dependendo do desembaraço. Nem todas
pode ter se saído bem?” ou as interpretações as interpretações e
“Houve vezes em que algumas confrontações devem vir do terapeuta, que
falhas foram piores do que representa o pai; membros do grupo muitas
outras?” vezes são capazes de perceber comportamento
• Atacar os esquemas – o clinico sintomático uns nos outros, e os adolescentes
deve ajudar os pacientes a podem achar mais fácil ouvir e considerar
procurar informações comentários críticos ou desafiadores vindos de
contraditórias ao conteúdo dos seus pares (KAPLAN; SADOCK, 2007).
esquemas negativos e a tirar Segundo Matos e Souza (2005), a
conclusões mais específicas psicoterapia de grupo em geral trata de
para a situação em vez de problemas de vida interpessoais e correntes.
conclusões gerais. Entretanto, alguns adolescentes são muito
• Designar uma tarefa de casa – frágeis para psicoterapia de grupo ou têm
dar ao paciente uma tarefa de sintomas ou traços sociais com muita
casa para se focalizar nos alvos probabilidade de evocar zombaria do grupo;
terapêuticos, como, por eles necessitam de terapia individual para obter
exemplo, documentar: eventos força de ego suficiente para lutar contra esses
ativadores que desencadeiam aspectos. Ao contrário, outros devem resolver
problemas interpessoais em um grupo antes de
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poderem lidar com questões intrapsíquicas na como tratamentos de primeira linha para
intensidade de terapia individual. transtornos depressivos em crianças e
adolescentes.
DISCUSSÃO Os tricíclicos são raramente
recomendados devido aos riscos acentuados de
Segundo Lima (2004), a depressão efeitos adversos perigosos, os quais são
infantil e o transtorno bipolar estão associados a semelhantes àqueles para adultos e resultam das
fatores genéticos, temperamento, eventos propriedades anticolinérgicas dos fármacos. As
adversos da vida, divórcio, problemas consequencias mais graves são
acadêmicos, abuso físico e sexual e fatores cardiovasculares; em crianças, hipertensão
neurobiológicos. São transtornos importantes, diastólica é mais comum, e hipotensão postural
muitas vezes de difícil diagnóstico, que, uma ocorre com menos frequência do que em
vez reconhecidos e tratados, irão minorar o adultos.
sofrimento de crianças e adolescentes. Os inibidores seletivos de recaptação da
O transtorno depressivo em crianças e serotonina (ISRS) são atualmente os
adolescentes é um quadro clínico grave, crônico antidepressivos mais utilizados nessa faixa
e recorrente e que tem como uma das etária, e essa tendência relaciona-se ao perfil de
conseqüências mais desoladoras as tentativas de efeitos colaterais mais seguro, com redução da
suicídio (REIS; FIGUEIRA, 2002). Já o cardiotoxicidade e menor risco de letalidade
transtorno obsessivo em crianças e adolescentes com superdosagem (KAPLAN; SADOCK,
propicia o surgimento de tentativas de suicídio, 2007; ROCHA; BATISTA; NUNES, 2009).
que podem variar desde as de pouca gravidade Os ISRS também são utilizados no
até aquelas que culminam com a morte. tratamento da anorexia nervosa, quando os
É preciso conhecer os psicofármacos, sintomas-alvo são obsessões e compulsões e
assim como os demais procedimentos altos níveis de ansiedade e sintomas depressivo
terapêuticos que têm demonstrado ou vêm (KAPLAN; SADOCK, 2007; MAIA; ROHDE,
demonstrando sua eficácia relativa e seus riscos 2007). Fluoxetina, sertralina, paroxetina,
e efeitos secundários (BRASIL, 2000; fluvoxamina e nefazodona são usadas com
KAPLAN; SADOCK, 2007). relativa frequência para crianças e adolescentes
Os efeitos adversos relacionados a (BRASIL, 2000; KAPLAN; SADOCK, 2007).
antidepressivos diminuíram de forma Caetano (2009) relatou que as drogas
significativa desde que os ISRS foram aceitos mais utilizadas são antidepressivos, como
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sertralina e fluoxetina, que já foram testados ao tratamento e a que TA na infância pode
cientificamente para uso infantil. Eles atuam na cronificar ou evoluir para outras
regulação da serotonina, a substância psicopatologias (MAIA; ROHDE, 2007).
responsável pela sensação de bem-estar e Sendo os psicofármacos substâncias que
satisfação. O remédio é ministrado por cerca de alteram o estado de consciência e o
seis meses com acompanhamento médico. funcionamento neuroquímico do cérebro, e
Antagonistas de serotonina-dopamina observando a ascensão meteórica da sua
(ASDs) são recomendados como agentes de utilização, é necessário implantar uma
primeira linha no tratamento de transtornos intervenção com resultados comprovados: a
psicóticos em crianças e adolescentes psicoterapia (BRASIL, 2000; MATOS;
(ROCHA; BATIST; NUNES, 2004; KAPLAN; SOUZA, 2005; ROTHENBERGER;
SADOCK, 2007). BANASCHEWSKI,2005; KAPLAN;
Os ASDs em geral substituíram os SADOCK, 2007; BEZERRA, 2008).
antipsicóticos convencionais como agentes de O tratamento dos transtornos do uso de
primeira linha no tratamento de todos os substâncias psicoativas envolve psicoterapia,
transtornos psicóticos em crianças e educação familiar e alguns fármacos, por vezes
adolescentes. Historicamente, os antipsicóticos necessitando internação hospitalar (MATOS;
melhor estudados administrados a grupos de SOUZA, 2005; KAPLAN; SADOCK, 2007).O
idade pediátrica são a clorpromazina e o tratamento dos transtornos do humor envolve o
haloperidol. uso de fármacos (antidepressivos), associados a
Maia et al. (2007) sugeriram que exista psicoterapia (MARI; RAZZOUK; PERES;
espaço para o tratamento farmacológico com os DEL PORTO, 2005; MATOS; SOUZA, 2005;
ISRS nos TA em crianças e adolescentes, mas KAPLAN; SADOCK, 2007). A Ritalina é um
que seu uso deve ser monitorizado com cautela dos medicamentos mais utilizados no
nessa faixa etária. De acordo com Rocha et al. tratamento do TDAH. À base de metilfenidato,
(2004); Kaplan e Sadock (2007), o uso atua como estimulante do sistema nervoso
combinado do lítio com o divalproato de sódio central e regulariza a função do
parece ser mais eficaz no tratamento do neurotransmissor dopamina
transtorno bipolar nessa faixa etária, já que (ROTHENBERGER; BANASCHEWSKI,
apenas a metade dos pacientes respondem à 2005).
monoterapia em fase aguda. No caso da bulimia, cuidados médicos
Deve-se ficar atento à falta de resposta especializados e tratamento psicológico são
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Revista da Universidade Vale do Rio Verde, Três Corações, v. 12, n. 2, p. 1013-1049, ago./dez. 2014
essenciais (MATOS; SOUZA, 2005). utilizados para uma série de
O tratamento dos transtornos de conduta transtornos. Portanto, o
envolve basicamente psicoterapia, podendo-se profissional da área de saúde
utilizar alguns fármacos no controle da deve entender a categoria
impulsividade desses pacientes. São transtornos farmacológica de cada
de difícil manejo, e muitas vezes necessitam de medicamento, suas
intervenções familiares e sociais (BRASIL, indicações, contra-
2000; MATOS; SOUZA, 2005). indicações, interações
O desenvolvimento de uma intervenção medicamentosas e efeitos
psicoterapêutica para determinada criança adversos.
inclui avaliação da idade, nível de Em relação às diretrizes
desenvolvimento, tipo de problema e estilo de clínicas que devem ser
comunicação. Seja qual for o estilo ou a utilizadas na escolha do
combinação de técnicas que o terapeuta escolhe medicamento evitando os
usar na psicoterapia, o relacionamento entre fracassos terapêuticos,
este e a criança é um elemento essencial. concluiu-se que a escolha e o
início da intervenção
CONSIDERAÇÕES FINAIS medicamentosa devem ser
baseados na história do
Observamos que: paciente, na situação clínica
os numerosos agentes atual e no plano de
farmacológicos utilizados tratamento.
para tratar transtornos Sobre o tratamento
psiquiátricos são designados terapêutico com
por três termos psicotrópicos, psicofármacos em pacientes
psicoativos e infantis e adolescentes,
psicoterapêuticos, mas que concluiu-se que: o emprego
todas estas categorias são de psicofármacos em
utilizadas para tratar crianças e adolescentes deve
condições que antes não visar o quadro
recebiam atenção sintomatológico e
medicamentosa e alguns são sindrômico. Ou seja, o
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sintoma, ao pertencer a hiperatividade e retraimento
categoriais distintas, receberá em crianças com transtorno
indicações de tratamento e/ou autista).
de psicofármacos de grupos Em crianças e adolescentes, a
totalmente diferentes. Na associação de psicofármacos
decisão de se usar um entre si ou com
psicofármaco, é preciso medicamentos para
ponderar se a relação risco- problemas clínicos requer
benefício potencial da droga cautela. Benzodiazepínicos
justifica seu emprego e se (alprazolam ou clonazepan),
outros recursos foram quando associados à
devidamente explorados. eritromicina oral (usada em
As drogas psicoativas mais infecções cutâneas) ou ao
utilizadas em crianças e cetoconazol oral (candidíase
adolescentes são: A ou infecções micóticas), têm
clomipramina, a fluoxetina e seus metabolismos alterados.
a paroxetina (transtorno E sobre outras formas de
obsessivo compulsivo); Os tratamento psiquiátrico,
inibidores da monoamino- concluiu-se que: a
oxidase (IMAO) são psicoterapia com crianças e
antidepressivos pouco usados adolescentes em geral é mais
na infância e adolescência direta e ativa do que costuma
porque requerem uma dieta ser com adultos.
especial sem tiramina;
fluoxetina (distúrbio do sono REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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