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ESPECTROSCOPIA DE ABSORÇÃO UV-VIS COMO FERRAMENTA PARA A

CARACTERIZAÇÃO DE COMPLEXOS METÁLICOS – SÉRIES ESPECTROQUÍMICA E


NEFELAUXÉTICA

Lucas Oliveira César*


Experimentos em Química Inorgânica, QF577 – TB – 2021.1
Professora Mariana Cabrera
Departamento de Química Fundamental, Universidade Estadual de Pernambuco, 50740-560 Cidade
Universitária – PE, Brasil
( ) Manuscrito com material suplementar
( X ) Manuscrito sem material suplementar
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*e-mail: lucas33cesar@yahoo.com.br
ESPECTROSCOPIA DE ABSORÇÃO UV-VIS COMO FERRAMENTA PARA A
CARACTERIZAÇÃO DE COMPLEXOS METÁLICOS – SÉRIES ESPECTROQUÍMICA E
NEFELAUXÉTICA

Neste experimento foi possível utilizar a técnica de espectroscopia de absorção na região UV-Vis
como ferramenta para analisar algumas características dos complexos. Foi possível determinar o
desdobramento dos níveis de energia produzido pelo arranjo dos ligantes, identificar a cor dos
complexos por meio dos seus respectivos espectros provenientes da transferência de elétrons do
orbital d dos átomos centrais, ordenar os ligantes para obter uma série espectroquímica, calcular os
parâmetros de Racah B’ e ordena-los utilizando os valores da razão nefelauxética, para obter uma
série nefelauxética além de desenvolver discussões a respeitos de ambas séries

Palavras chave: Complexos, absorção, espectro, séries.

2
INTRODUÇÃO

A teoria do campo cristalino, postulada por Bethe e van Vleck.1 afirma que a única interação existente
entre o íon central e os ligantes é de natureza eletrostática, pois os ligantes são considerados cargas
negativas ou dipolos pontuais que repele os elétrons dos orbitais d do íon metálico. Esta interação
eletrostática, metal-ligante, remove parcialmente a degeneração dos cinco orbitais d, que existem no
íon metálico isolado, ocasionando o desdobramento destes orbitais em conjuntos com diferentes
energias.2
Diversas técnicas analíticas tem sido utilizadas na determinação de metais, sendo as principais, as
técnicas espectroanalíticas. A espectroscopia é um ramo da ciência que estuda a interação entre a
matéria e a luz eletromagnética. Mais especificamente, a espectroscopia UV-Vis (um dos diversos
métodos de espectroscopia) é utilizada na determinação de diversas espécies químicas se baseando
na absorção de radiação eletromagnética na região visível e ultravioleta.3 A faixa espectral de
interesse vai de 190 a 800 nm, que compreende as regiões do ultravioleta e do visível.4
As unidades comuns utilizadas para a determinação das espécies é a absorbância (A) e transmitância
(T) sendo estas o quanto a espécie absorveu e o quanto transmitiu da luz incidente, respectivamente.
Para a realização dos cálculos se utiliza a lei de Lambeert-Beer na qual propôs a seguinte equação:3

A = bc = Log(P0/P); T = P/P0


Onde o e é a absorvidade molar (L.mol-1.cm-1), o b é o caminho óptico (cm), o c é a concentração
(mol.L-1), o P0 é a radiação incidente e o P a radiação transmitida.

A pesquisa em química de coordenação é uma das linhas mais importantes e ampla no que diz respeito
à investigação para químicos inorgânicos. Dentre as diversas técnicas para identificação de
complexos e seus desdobramentos, a supramencionada é uma delas. A interação entre o íon metálico
e seus ligantes podem ser identificados através das bandas de absorção na leitura da espectroscopia
referentes às transições envolvendo os elétrons quando excitados.4
Neste experimento foi utilizado o método acima mencionado para analisar a interação dos complexos
com a radiação incidente através da leitura de seus espectros provenientes da absorção dos elétrons
no momento da transição do estado fundamental para o excitado.

3
PARTE EXPERIMENTAL

Reagentes

NiCl2.6H2O, DMSO, NH4OH, Acetonitrila, Metanol, Etanol.

Procedimento Experimental

• Pesar, em um béquer, 1mmol (0,2377 g) de NiCl2.6H2O. Em seguida, adicione o ligante


escolhido em quantidade suficiente para dissolver o cloreto conforme especifica o Quadro 1;
• Realizar medida de absorção no UV-visível em cubeta de quartzo;
• Realizar leitura do “branco” com o mesmo solvente (ligante) utilizado.

Quadro 1: Especificidades de solubilidade de cada solvente

4
RESULTADOS E DISCUSSÃO

Visto que o metal do composto analisado é o níquel, é possível concluir algumas características sobre
ele antes do prosseguimento das discussões. O elemento níquel possui 28 elétrons com configuração
[Ar] 3d8 4s2, porém, por estar carregado positivamente (déficit de dois elétrons), sua configuração
termina em 3d8 na qual já podemos concluir, com base no Quadro 2, que este possui 45 microestados,
número quântico total de momento angular de rotação (S) = 1, número quântico de momento angular
orbital total = 3 , a multiplicidade de termo = 3 e o termo do estado fundamental 3F.

Quadro 2: Configurações e termos atômicos do estado fundamental das configurações de d1a d9 em átomos ou íons livres.

Com base na regra de Hund, os termos espectroscópicos para o d8 é exatamente igual ao do d2 que
são 1S, 1D, 1G, 3P e 3F. É possível concluir que o termo de menor energia é o 3F na qual possui um
desdobramento em três níveis de energia sendo estes A2g, T1g e T2g.
A campo cristalino para complexos octaedros d8, como o Ni2+, apresentam uma distribuição com
desdobramentos em dois orbitais, o eg e T2g como podemos observar na Figura 1.

Figura 1: desdobramento do campo para o complexo de Ni2+

5
Conforme foi discutido anteriormente, a configuração
d8 possui os termos 3P e 3F na qual pode-se observar
seus desdobramentos na Figura 2. Com base no
observado, é possível concluir que este possuirá três
transições eletrônicas entre os orbitais A2g e T1g do
termo F, A2g e T2g do termo F e A2g2 T1g do termo P.
Com base nisto, espera-se observar três bandas no
espectro visto que a leitura realizada pelo equipamento
monitora justamente as transições eletrônicas.
Figura 2: Desdobramento para os termos 3F e 3P

Análise individual das amostras


Ao se adicionar os solventes aos tubos contendo o NiCl2.6H2O foi possível observar algumas
mudanças.

Amostra 1 – DMSO
Ao se adicionar o DMSO a solução ficou levemente esverdeada e, após o aquecimento, adquiriu uma
coloração mais forte, devido a formação do [Ni(DMSO)6]2+, e o espectro proveniente da leitura desta
amostra pode ser observada na Figura 3.
60000
52,996

50000

40000
Absorbância

30000
18,606
20000

10000

0
200 300 400 500 600 700 800
-10000
Comprimento de onda (nm)

Figura 3: Espectro do complexo [Ni(DMSO)6]2+

É possível observa uma banda de maior sinal no comprimento de onda de 290 nm relacionado à
transição T1g←A2g, e uma banda de menor sinal no comprimento de onda 429 nm relacionado à
transição T2g←A2g que configura a coloração esverdeada da solução.

6
Amostra 2 – NH3OH
Ao se adicionar o NH3OH a solução ficou levemente azulada e, após o aquecimento, adquiriu uma
coloração mais forte, devido a formação do [Ni(NH3)6]2+ através da reação Ni2+ + NH3 → [Ni(NH3)6]2+
+ 6H+, e o espectro proveniente da leitura desta amostra pode ser observada na Figura 4.
25000
19,559
20000

15000
Absorbância

11,338

10000

5000

0
200 300 400 500 600 700 800
-5000
Comprimento de onda

Figura 4: Espectro do complexo [Ni(NH3)6]2+

É possível observa uma banda de maior sinal no comprimento de onda de 250 nm relacionado à
transição T1g←A2g, e uma banda de menor sinal no comprimento de onda 356 nm relacionado à
transição T2g←A2g.

Amostra 3 – C₂H₃N
Ao se adicionar o C₂H₃N o complexo de níquel não se dissolveu, logo isto refletiu em seu espectro,
que não levaremos em consideração, na qual apresenta a formação mais destoante de todas as
amostras como pode-se observar na Figura 5.
0,16
0,1477
0,14
0,12
0,1
Absorbância

0,08
0,06
0,04
0,02
0
-0,02 0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
-0,04
Comprimento de onda

Figura 5: Espectro destoante da amostra 3

Amostra 4 – Metanol

7
Ao se adicionar o metanol a solução ficou levemente esverdeada após a agitação devido a formação
do [Ni(MeO)6]2+ através da reação Ni2+ + 6MeOH → [Ni(MeO)6]2+ + 6H+ e o espectro proveniente da
leitura desta amostra pode ser observada na Figura 6.
0,8 0,692
0,7
0,6
Absorbância

0,5
0,4 0,2783
0,3
0,2
0,1
0
-0,1 0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
Comprimento de onda

Figura 6: Espectro do complexo [Ni(MeO)6]2+

O espectro proveniente desta amostra se mostrou bastante eficiente e visível à análise. É possível
observa uma banda de maior sinal no comprimento de onda de 403 nm relacionado à transição
T1g←A2g, e uma banda de menor sinal no comprimento de onda 736 nm relacionado à transição
T2g←A2g sendo esta ultima responsável por conceder a coloração esverdeada à amostra.

Amostra 5 – Etanol
Ao se adicionar o etanol a solução ficou esverdeada e, devido a formação do [Ni(EtO)6]2+ através da
reação Ni2+ + 6EtOH → [Ni(EtO)6]2+ + 6H+ e o espectro proveniente da leitura desta amostra pode
ser observada na Figura 7.
18000 15,455
16000
14000
12000
Absorbância

10000
8000
6000
4000
2000
0
-2000 0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
Comprimento de onda

Figura 7: Espectro do complexo [Ni(EtOH)6]2+

É possível observa apenas uma banda no comprimento de onda de 401 nm relacionado à transição
T1g←A2g de menor energia.

8
Amostra 6 – DMG
Ao se adicionar o DMG a solução formou um precipitado vermelhro devido a formação do complexo
[Ni(DMG)2] através da reação Ni2+ + 2DMG → Ni(DMG)2 + 2H+ e o espectro proveniente da leitura
desta amostra pode ser observada na Figura 8.
60000 52,999
50000

40000
Absorbância

30000

20000

10000

0
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
-10000
Comprimento de onda

Figura 8: Espectro do complexo [Ni(DMG)2]

É possível observa apenas uma banda no comprimento de onda de 292 nm relacionado à transição
T1g←A2g de menor energia.

Amostra 7 – H2O
Ao se adicionar a água pretende-se realizar a leitura do cloreto de níquel na qual o espectro
proveniente da leitura desta amostra pode ser observada na Figura 9.
0,6
0,4872
0,5
0,4
Absorbância

0,3
0,1945
0,2
0,1
0
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
-0,1
Comprimento de onda

Figura 9: Espectro do cloreto de níquel

O espectro proveniente desta amostra se mostrou bastante eficiente e visível à análise. É possível
observa uma banda de maior sinal no comprimento de onda de 396 nm relacionado à transição
T1g←A2g, e uma banda de menor sinal no comprimento de onda 721 nm relacionado à transição
T2g←A2g.

9
É possível observar que em nenhuma das leituras ocorreu a presença de três bandas, mesmo sendo
este o resultado esperado. Este fato dar-se-á devido à transição (P) T1g←A2g ser bastante energética,
consequentemente, possuindo um comprimento de onda baixo impossibilitando sua visualização.

Cálculos

De posse dos comprimentos de onda das transições e utilizando a equação do efeito fóton elétrico
(Equação 1), foi possível calcular os valores das energias de cada transição.

Equação 1: E = (h.v)/λ
Onde h é a constante de planc (6,63x10-34 J.s) e o c é a velocidade da luz (3,0 x 108 m/s).

De posse do diagrama de Tanabe-Sugano (Figura 10), é possível calcular a energia de desdobramento


do campo ou o 10Dq a partir de algumas relações e do cálculo do parâmetro de Racah.

Figura 10: Diagrama de Tanabe-Sugano para a distribuição d8

10
Levando em consideração que apenas as amostras 1, 2 e 3 deram respostas satisfatórias (duas bandas),
foi calculado o valor do parâmetro de Racah e a razão nefelauxética (β = B’/B). Procurou-se um valor
/B que correspondesse a razão (E2/B)/(E1/B), obteve-se os seguintes valores:
Amostra Bandas (cm-1) Parâmetro de Racah (cm-1) /B β 10Dq (cm-1)
1 34482,76 e 23310,02 1229,185213 19 1,16 23354,52
2 40000,00 e 28089,89 1194,672109 23,2 1,13 27716,39
4 24813,89 e 13586,97 4520,301461 7 4,28 31642,11

Com base nos valores de 10 Dq calculados, é possível estabelecer uma ordem crescente de energia,
sendo esta a série espectroquímica: DMSO < NH4OH < CH4O. Também de posse dos valores das
razões, foi possível e estabelecer a série nefelauxética em ordem crescente de β utilizando o valor
de 15B = 15836cm-1 para o átomo de Ni2+: NH4OH < DMSO < CH4O.

CONCLUSÃO
Neste experimento foi possível estabelecer uma série espectroquímica e nefelauxética a partir da
leitura da espectroscopia UV-Vis de cada solução e seu respectivo espectro. Foi possível concluir que
as séries apresentaram o metanol como o ligante de maior energia e razão nefelauxética. Alguns
ligantes não apresentaram espectros de boa resolução (1 banda) na qual não permitiu a realização dos
cálculos para os outros ligantes. Este fato pode dar-se-á devido a erros de leituras e/ou tratamento
das amostras.

REFERÊNCIAS

1. Ayala, J. D. Química de Coordenação 1. Acessado em novembro de 2008.

2. Lee, J. D.; Um Novo Texto Conciso. São Paulo: Edard Blücher Editora ltda, 1980.

3. Perkampus, H. H.; UV-VIS Spectroscopy and its Applications, Springer-Verlag: Berlin,


1992.

4. Skoog, D. A.; Princípios de análise instrumental. 5 ed. Porto Alegre: Bookman, 2002, 836p.

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QUESTÕES
1) Como se expressam os parâmetros de Racah para os diferentes termos espectroscópicos
da configuração d2 (que é equivalente a configuração d8). Dentre os 3 parâmetros (A, B
e C) qual deles é o mais importante do ponto de vista da análise da covalência, quando
analisamos os termos tripletos? Por que?
Os parâmetros de Racah para a configuração d 2:
E(1S) = A + 14B + 7C
E(1G) = A + 4B + 2C
E(1D) = A - 3B + 2C
E(3P) = A + 7B
E(3F) = A - 8B
Visto que o foco é a análise de tripletos, apenas os termos espectroscópicos F e P serão
utilizados e, visto que o parâmetro A é comum a todos, o mais importante é o parâmetro B.

2) Por que o valor de β pode ser considerado um indicativo da covalência da reação?


Por que o valor da razão é inversamente proporcional ao grau de covalência das ligações sendo
este valor referente a um efeito de repulsão entre os elétrons compartilhados entre o metal e
os seus ligantes.

3) Quais fatores experimentais podem alterar um espectro de absorção de um complexo.


Liste os fatores e a razão da alteração.
A relação entre o metal e seu respectivo ligante pode alterar o espectro visto que esta relação
envolve o compartilhamento de elétrons na qual tem suas transições analisadas. Outro fator
que pode alterar o espectro é o solvente visto que este tanto pode reagir com o complexo
alterando a análise, quanto este pode possuir alguma característica própria que interfira a
análise.

4) É possível estabelecer uma tendência entre os valores de 10Dq e β em função do ‘overlap’


entre os orbitais dos ligantes e do metal. Se sim, qual?
Sim, visto que estes são inversamente proporcionais e estão correlacionados ao grau de
covalência das espécies.

5) Dentre os termos espectroscópicos de uma dada configuração, qual o termo que deve ser
considerado como termo relativo ao estado fundamental (menor energia)?
Tomando como base os números quânticos (S, L e J) levando em consideração os elétrons
desemparelhados, o termo fundamental será o de maior S, L e J respectivamente caso iguale.
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