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Artigo de Revisão/Review

Infecções Sistêmicas em Pacientes Oncológicos: Revisão de


Literatura
Systemic Infections in Oncology Patients: Literature Review

Viviane Marques dos Santos¹ Resumo


Cristiane Boff Trevisol² As infecções sistêmicas em pacientes oncológicos constituem uma
Patricia Regina de Araujo³
das principais causas de morte e morbidade e estão associadas a
vários fatores que predispõem a entrada de micro-organismos na
corrente sanguínea. Objetivo: Explicar como ocorre à entrada de
micro-organismos no sistema circulatório nestes pacientes,
descrever os micro-organismos mais prevalentes, relatar os
principais exames laboratoriais que auxiliam no diagnóstico da
sepse e citar cuidados essenciais para prevenção destas infecções.
Metodologia: A revisão bibliográfica foi delimitada ao período de
2007 a 2017, sendo realizada busca por periódicos, livros e site de
organizações reconhecidas internacionalmente.

Palavras chave:
Oncologia; Sepse; Tratamento; Complicações; Diagnóstico
laboratorial; Prevenção

INTRODUÇÃO

As infecções sistêmicas em pacientes oncológicos constituem uma das


principais ocorrências em emergências médicas e representam uma causa comum de
morbidade e mortalidade. Análises em necroscopia revelam que grande parte das
mortes em pacientes com leucemia aguda e metade das mortes relacionadas a
linfomas são decorrentes e provocadas pela disseminação de micro-organismos na
corrente sanguínea a partir de um foco infeccioso.⁽¹⁾
Alguns fatores estão envolvidos na entrada de micro-organismos no sistema
circulatório, como o rompimento de barreiras biológicas e o grau de toxicidade da
quimioterapia. Essas condições predispõem as infecções sistêmicas e estão
relacionadas com os mecanismos de imunossupressão impostos pela própria doença,
pela progressão do tumor e pela agressividade do tratamento com antineoplásicos.⁽¹‫׳‬²⁾

¹Acadêmica do curso de Farmácia da Universidade de Caxias do Sul -UCS- Caxias do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil
²Meste em Ciências Pneumológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul -UFRGS- Porto Alegre, Rio
Grande do Sul, Brasil
³ Mestre em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul –UFRGS- Porto Alegre, Rio Grande
do Sul, Brasil
Instituição: Universidade de Caxias do Sul -UCS- Caxias do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil
A mielossupressão desencadeada principalmente pela toxicidade dos
esquemas terapêuticos, pode influenciar uma série de desordem hematopoiéticas,
afetando a produção de hemácias, plaquetas e leucócitos.⁽²⁾ Os leucócitos, são os
mais propensos a estes agentes citotóxicos, por consequência ao seu curto tempo de
meia vida. Desta forma, logo após a administração de doses terapêuticas, estas
células em contato com estes agentes acabam não resistindo e entrando em
apoptose, o que pode levar a quadros de neutropenia.⁽¹‫׳‬³⁾
A neutropenia febril é uma importante complicação em pacientes com câncer e
em tratamento com quimioterapia, representando uma ocorrência comum e
potencialmente fatal a este grupo de pacientes, sendo considerada uma consequência
significativa de mielossupressão. É caracterizada por temperatura axilar superior a
38°C e pela contagem diferencial de menos de 1.500 neutrófilos /µL de sangue.⁽²‫׳‬⁴⁾
O risco de infecção nestes pacientes é elevado e pode levar a quadros de
bacteremia e sepse. Somente nos Estados Unidos mais de 60.000 pacientes por ano
são hospitalizados por neutropenia febril com índice de 6,8 % de mortalidade
relacionada à infecção.⁽⁵⁾
Desta forma, pela importância do tema no cenário atual, o objetivo deste
trabalho é explicar como ocorrem as infecções sistêmicas neste grupo de pacientes;
descrever os micro-organismos mais prevalentes nestas infecções; relatar os
principais exames que auxiliam no diagnóstico de sepse e citar cuidados essenciais
para prevenção destas infecções.

MATERIAL E MÉTODOS

Foi realizada uma revisão de literatura referente ao tema, utilizando as palavras


chaves: oncologia, sepse, tratamento, complicações, diagnóstico laboratorial e
prevenção.
Para coleta de dados foram consultados artigos nas bases de dados da
CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), buscando
periódicos nacionais e internacionais, além de acesso a livros digitais e físicos nas
plataformas disponíveis na Universidade de Caxias do Sul, bem como busca em sites
de organizações reconhecidas internacionalmente. A pesquisa foi delimitada ao
período de 2007 a 2017.
REVISÃO BIBLIOGRAFICA

Infecções sistêmicas

A bacteremia e fungemia são, respectivamente, definidas pela entrada de


bactérias e fungos na corrente sanguínea, podendo ser classificada em primária ou
secundária, dependendo da origem do foco infeccioso. A bacteremia primária tem
origem no próprio sistema circulatório ou pela entrada direta de micro-organismos na
corrente sanguínea, através de agulhas, infusões não estéreis e uso de cateteres. Já a
bacteremia secundária ocorre através da drenagem de pequenos vasos sanguíneos
ou linfáticos que seguem para o sistema circulatório, tendo origem em um foco
infeccioso conhecido em determinado sítio anatômico.⁽⁶⁾
A bacteremia também pode ser classificada em transitória, quando os micro-
organismos, em geral, membros da microbiota normal são introduzidos na corrente
sanguínea por um leve trauma nas membranas; intermitente, quando bactérias de um
local infectado são liberadas periodicamente na corrente sanguínea; ou continua,
quando a infecção é intravascular, possuindo estreita relação com o uso de cateter de
longa permanência.⁽⁷⁾
A presença de micro-organismos na corrente sanguínea pode estar associada
a um defeito no sistema imunológico em identificar e combater a infecção em seu foco
inicial ou eventual fracasso na remoção ou drenagem de determinado foco infeccioso.
Em pacientes imunodeprimidos, a eliminação destes micro-organismos é menos
eficiente em virtude da ausência de um sistema imune apto e competente, o que pode
levar a quadros mais graves, como a sepse.⁽⁶⁾
A Sociedade Médica de Cuidados Críticos (Society of Critical Care Medicine)
define as principais terminologias importantes para compreender a evolução das
infecções sistêmicas.⁽⁸⁾
 Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (SIRS): Reação inflamatória
sistêmica desencadeada por uma agressão infecciosa ou não;
 Sepse: Disfunção orgânica potencialmente fatal causada por uma resposta
desregulada do hospedeiro a uma infecção;
 Choque séptico: É definida como um subgrupo de doentes sépticos nos quais
as alterações circulatórias e metabólicas são suficientemente profundas para
aumentarem substancialmente a mortalidade;
Compreender a entrada de micro-organismos patogênicos no sistema
circulatório é extremamente relevante e importante na perspectiva de interromper a
cadeia de infecções. O modo como ocorre à penetração destes micro-organismos na
corrente sanguínea pode ser visto na figura 1.⁽⁹⁾

● Dispositivos de longa permanência


● Implantes

● Procedimentos invasivos

●Tratamento
●Imunocomprometimento ●Condições próprias da doença

Figura 1. Modo de penetração de micro-organismos na corrente sanguínea em pacientes oncológicos

Infecções relacionadas a dispositivos de longa permanência

O uso do cateter venoso central representa uma condição importante no


tratamento ao paciente com câncer, permitindo a infusão de medicamentos, a
administração de nutrição parenteral e a transfusão de hemocomponentes com a
máxima proteção contra irritações da parede do vaso sanguíneo, já que o volume de
sangue e o calibre da veia facilitam tais procedimentos.⁽³⁾
O uso do cateter central também pode diminuir a ansiedade e o desconforto
gerado nas coletas de sangue e nas punções para inserção de acessos periféricos,
evitando desconfortos desnecessários, porém requerem cuidados especiais e uma
equipe atenta e capacitada em prevenção de doenças infecciosas.⁽¹⁰⁾
As infecções relacionadas ao cateter de longa permanência constitui uma
causa comum de morbidade e mortalidade, com riscos e agravos adicionais em
pacientes muitas vezes debilitados e imunodeprimidos. Estas infecções podem ser
divididas em 3 categorias, infecção de óstio, infecção de túnel e infecção da corrente
sanguínea (ICS) relacionada ao cateter. Em geral, as infecções de óstio podem ser
tratadas sem necessidade de remoção do dispositivo, representando menor gravidade
e respondendo bem a cuidados locais e tratamento tópico. Porém, as infecções de
túnel e a ICS relacionada ao cateter necessitam remoção do dispositivo e tratamento
com antibioticoterapia.⁽¹¹⁾
O perfil de micro-organismos associados a infecções em cateteres sofreram
alteração nas últimas décadas, influenciados pela substituição da matéria prima
utilizada na fabricação dos dispositivos, pela impregnação de agentes antimicrobianos
ao cateter, pelo local de implantação e pela resistência antimicrobiana decorrentes do
uso de antibióticos.⁽¹⁰⁾
Atualmente, os quatro grupos de micro-organismos encontrados em maior
frequência em infecções relacionadas a cateteres são: estafilococos coagulase-
negativo, Staphylococcus aureus, espécies de Candida e bacilos Gram-negativos
entéricos. Apesar de serem encontrados em maior frequência, os estafilococos
coagulase-negativo estão associados a infecções mais brandas, enquanto a presença
de Staphylococcus aureus e espécies de Candida em cateteres estão relacionadas a
complicações mais graves como endocartite e tromboflebite supurativa.⁽¹²⁾
O diagnóstico de infecções sistêmicas relacionadas ao cateter deve ser
realizado através de culturas de sangue. As culturas devem ser coletadas pareadas e
simultaneamente obtidas através do cateter venoso central e de punção periférica.
Partindo do princípio que ambas as amostras foram coletadas com o mesmo volume e
no mesmo instante, se a amostra do cateter apresentar positividade precoce em
relação à coleta periférica em tempo superior a 2 horas, a infecção sistêmica está
relacionada fortemente com a presença de micro-organismos no dispositivo
implantado.⁽⁶⁾

Infecções relacionadas à neutropenia febril induzida por quimioterapia

A quimioterapia é uma das principais modalidades no tratamento de tumores,


pois age de forma sistêmica e pode estar associada à cirurgia, a radioterapia ou aliada
a terapia combinatória. O princípio do tratamento baseia-se no emprego de
substâncias químicas antineoplásicas com o objetivo principal de erradicar células
malignas em todas as fases da proliferação celular.⁽¹³⁾
A primeira tentativa utilizando-se de substâncias com este princípio surgiu no
final do século XIX, porém somente na metade do século XX foi implantado o primeiro
protocolo com diretrizes para o tratamento sistêmico do câncer. A substância utilizada
foi obtida partir do gás mostarda muito manipulada como arma química durante as
duas grandes guerras mundiais e conhecida principalmente pela toxicidade
desencadeada sobre a medula óssea.⁽¹⁴⁾
O efeito sistêmico da quimioterapia pode gerar consequências indesejáveis no
tratamento, pois além de combater a proliferação celular desregulada destruindo as
células malignas também acaba atingindo células sadias que estão sofrendo divisão
celular. Por essa razão, com o passar dos anos a busca por substâncias químicas
mais seletivas às células tumorais ganhou grande repercussão no meio científico, e foi
o foco para o desenvolvimento da terapia-alvo, onde substâncias químicas são
produzidas para identificar e combater somente as células tumorais⁽¹⁴⁾
Porém, mesmo com o desenvolvimento de fármacos mais seletivos, a maioria
dos tratamentos sistêmicos utilizados na oncologia causa toxicidade medular, afetando
diretamente as células tronco-hematopoiéticas, podendo provocar anemia,
plaquetopenia e leucopenia. A neutropenia é a condição mais grave desencadeada
nas desordens medulares; conhecido por sua ação bactericida, os neutrófilos, são
importantes componentes do sistema inato de defesa; quando em menor número gera
imunocomprometimento predispondo a infecções sistêmicas.⁽²‫׳‬⁹⁾
Apesar de ser uma ocorrência comum, a neutropenia em pacientes oncológicos
pode permanecer por até duas semanas após a administração de uma única sessão
de quimioterapia, afetando o esquema farmacoterapêutico ou evoluindo para um
quadro mais crítico quando associado à febre. A neutropenia febril (NF) é uma
condição grave e potencialmente fatal principalmente por estar relacionada com a
entrada de micro-organismos na corrente sanguínea.⁽²‫׳‬¹⁵⁾
Cerca de 10% a 50% dos pacientes com tumores sólidos e 80 % de pacientes
com leucemias desenvolvem neutropenia febril no mínimo em um dos ciclos da
quimioterapia, sendo que cerca de 70 % a 80 % destes pacientes não terão o foco de
infecção identificado. Entretanto, sabe-se que as bactérias Gram-positivas são os
principais patógenos responsáveis pela infecção na NF. Entre as bactérias Gram-
positivas, o Staphylococcus epidermidis, o Staphylococcus aureus e o Streptococcus
spp, são os responsáveis na maioria das vezes pela infecção.⁽²‫׳‬¹⁶⁾
As infecções sistêmicas causadas pelas bactérias Gram-positivas são mais
brandas quando comparadas com as infecções causadas por bactérias Gram-
negativas. O alto índice de mortalidade relacionado as bactérias Gram-negativas está
associado às endotoxinas que constituem a parede celular destes micro-organismos.
As endotoxinas são lipopolissacarídeos (LPS) que produzem febre e choque séptico
mesmo quando os antibióticos combatem as bactérias da corrente sanguínea. Isso
ocorre porque as endotoxinas estimulam a ativação de citocinas como o fator de
necrose tumoral (TNF) e a interleucina 1 (IL-1). ⁽²‫׳‬⁹⁾
Outra situação preocupante associado às bactérias Gram-negativas é o
aumento crescente de infecções causadas por agentes produtores de Beta-
lactamases de espectro estendido (ESBL) em pacientes com NF. Os genes ESBL
adquiridos principalmente pela espécie Klebsiella spp e por cepas de E. coli,
disponibilizam a estes micro-organismos a produção de enzimas (beta-lactamases)
com alto poder de resistência a antibióticos beta-lactâmicos, responsáveis pelo mal
prognóstico no tratamento. A Klebsiella pneumoniae e outras enterobactérias também
podem estar associadas a produção de carbapenemases, enzima capaz de hidrolizar
não só os antimicrobianos carbapenêmicos, como também os demais beta-lactâmicos
como cefalosporina, penicilinas e monobactâmicos produzindo um grave problema de
saúde pública principalmente pela elevada mortalidade e pelo número reduzido de
opções terapêuticas disponíveis atualmente.⁽¹⁷⁾
Os fungos também podem causar infecções na neutropenia febril induzida por
quimioterapia e estão associados a pacientes que passam longos períodos de
imunocomprometimento. A mucosite, condição que mais predispõe essa situação, é
desencadeada pela agressividade do tratamento e propicia a entrada de leveduras
presente na mucosa oral para a corrente sanguínea. As espécies de Candida são as
principais responsáveis pela fungemia, seguida pelos Aspergillus spp, que apesar de
serem menos frequente, estão associados ao alto índice de mortalidade.⁽¹⁶⁾ Outros
micro-organismos também são comuns na NF em pacientes oncológicos e podem ser
verificados na tabela 1.⁽¹‫׳‬²‫׳‬⁹‫׳‬¹⁶⁾

Tabela 1. Micro-organismos comuns na neutropenia febril induzida pela quimioterapia


Gram-positivo Gram-negativo Fungos
Estafilococos coagulase-negativos Escherichia coli Candida spp
Staphylococcus aureus Klebsiella spp Aspergillus spp.
Enterococcus spp Enterobacter spp
Estreptococos do Grupo viridans* Pseudomonas aeruginosa
Streptococcus pneumoniae Citrobacter spp
Streptococcus pyogenes Acinetobacter spp
* , como S. sanguinis, S. mutans, S. mitis, S. gordonii, S. salivarius, S.
anginosus, S. milleri e S. intermedius.

Infecções relacionadas às condições da própria doença

A morte celular programada é um processo altamente regulado que garante a


homeostase ao tecido celular. Esse processo é coordenado geneticamente e pode ser
ativado a qualquer momento quando o sistema imunológico perceber que algo de
errado esteja acontecendo. O equilíbrio entre morte e divisão celular depende de uma
série de processos celulares tais como, transcrição de genes, reparo do DNA e
tradução de proteínas. Qualquer desequilíbrio que ocorra nestas etapas é o principal
evento para formação de tumores.⁽⁴‫׳‬¹⁸⁾
A proliferação descontrolada com redução da morte celular pode resultar na
expansão aberrante no número de células tumorais cancerosas em determinado órgão
ou tecido, comportando-se como estruturas que perderam suas funções e deixaram de
responder aos sinais que normalmente limitavam seu crescimento.⁽⁴⁾
Essa alteração morfológica e funcional das células neoplásicas provoca uma
série de condições que predispõem a diversas comorbidades, entre elas a ruptura de
barreiras biológicas e a predisposição a infecções (Tabela 2).⁽¹⁾
A prevalência de certos micro-organismos e a tendência à infecção depende do
tipo de neoplasia diagnosticada, do órgão ou tecido onde as células tumorais estão
localizadas e do tipo de lesão associada. Por isso, em muitos casos onde o risco de
sepse é potencialmente fatal a terapia profilática com antibióticos é a melhor opção
para prevenção de infecções sistêmicas.⁽¹⁾

Tabela 2. Ruptura de barreiras biológicas e predisposição a infecção em pacientes com


câncer
Tipo de câncer Lesão Micro-organismos Desfecho
específica Prevalentes
Doenças metastáticas Rim, ovários e Bacilos Bacteremia
ductos biliares Gram-negativos rápida e maciça

Leucemia Baço Streptococcus pneumoniae, Sepse rápida e


Linfoma de Hodgkin (Esplenectomia) Haemophilus influenzae, maciça
Neisseria meningitidis

Leucemia de células Neutrófilos Estafilococos spp, estreptococos Bacteremia


pilosas, leucemia spp ,
mielocítica aguda e fungos
leucemia linfocítica
aguda

Infecções relacionadas a procedimentos invasivos

A cirurgia oncológica faz parte de processos importantes na prevenção, no


diagnóstico, no estadiamento e no tratamento do paciente com câncer, porém como
qualquer outro procedimento invasivo há riscos e a taxa de infecção associada ao sítio
cirúrgico é uma das principais complicações que surgem em decorrência do
procedimento.⁽¹⁾
De acordo com dados recentes em estudo realizado no Brasil a Infecção do
Sítio Cirúrgico ocupa o 3° lugar entre as Infecções Relacionadas à Assistência a
Saúde e estima-se que 60% dos casos poderiam ser evitados com medidas de
orientação e prevenção.⁽¹⁹⁾
O aparecimento e a disseminação do foco infeccioso a partir do sítio cirúrgico
dependem de fatores de riscos relacionados ao paciente, ao procedimento e as
características dos micro-organismos presentes no local da cirurgia. Nos pacientes
oncológicos estes fatores estão envolvidos com o tipo de neoplasia e a presença de
imunocomprometimento.⁽²⁰⁾
A septicemia pode ocorrer no pós-operatório e surge em decorrência do
agravamento da infecção no sítio cirúrgico. Os principais micro-organismos
responsáveis pela disseminação da infecção estão normalmente associados à
microbiota normal do corpo humano e ao local em que houve o procedimento invasivo
(tabela 3).⁽²⁰⁾

Tabela 3. Relação de bactérias da microbiota humana que podem causar infecções no sítio
cirúrgico
Órgão/tecido Micro-organismos frequentes
Pele Estafilococos coagulase negativa, Streptococcus spp, S.aureus*
Cavidade oral Streptococcus do grupo viridans, Haemophilus spp
Vias aéreas superiores S.pneumoniae, S. pyogenes, Neisseria spp, H. influenza, S.aureus*
Intestino grosso e reto S. bovis, Enterococcus spp, E. coli, Enterobacter spp
Intestino delgado Enterococcus spp, E. coli, Enterobacter spp, Citrobacter spp
Trato geniturinário Candida spp, E. coli, Streptococcus spp.

*Pode ou não estar presente.

Diagnóstico laboratorial da sepse

O Laboratório de Análises Clínicas atua como ferramenta auxiliando no


diagnóstico da sepse e no prognóstico das disfunções causadas por ela. Os exames
oferecidos por este serviço em saúde contemplam inúmeras análises por diferentes
metodologias. São realizados principalmente culturas de materiais biológicos na
tentativa de identificar o foco infeccioso e os micro-organismos responsáveis por ele,
como também, exames que avaliam as manifestações orgânicas que são geradas na
tentativa do organismo em combater e eliminar o agente etiológico da infecção.⁽²¹‫׳‬²²⁾
Culturas de Sangue

A hemocultura é um dos exames mais importantes realizados pelo laboratório


de microbiologia, é um método sensível e significativo para detectar a entrada de
micro-organismos na corrente sanguínea, devendo ser realizada em qualquer paciente
oncológico com suspeita de bacteremia ou fungemia sempre antes da terapia
antimicrobiana.⁽²³⁾
A sensibilidade deste exame depende de muitos fatores, entre eles: ⁽⁵⁾
 Volume de sangue coletado: É a variável mais crítica para a positividade do
exame, pois quanto maior o volume maior será a chance de positividade. O
volume deverá obedecer as recomendações do fabricante, podendo variar de 5
a 10 mL por punção em adultos e em crianças de até 12 anos de 1 a 6 mL.
 Número de amostras: Recomenda-se coletar de 2 a 4 amostras, o que
permite o isolamento do agente etiológico em mais de 95 % dos eventos.
Ressaltando que cada amostra coletada equivale a uma punção e cada punção
corresponde a dois frascos de hemocultura.
 Local da punção: A coleta arterial não aumenta a sensibilidade do exame,
portanto as amostras devem ser coletadas preferencialmente por punção
venosa sempre preservando o sistema circulatório arterial para situações
críticas onde o acesso venoso não está disponível. As amostras também não
devem ser coletadas pelo cateter, exceto quando a infecção está relacionada
ao dispositivo. Neste caso deve estar acompanhada por coleta de 1 a 2
amostras periféricas realizadas simultaneamente e com o mesmo volume.
 Técnica da coleta: A antissepsia do local da punção é parte fundamental do
processo e determina a probabilidade de uma hemocultura positiva ser
considerada infecção verdadeira ou contaminação. Os principais antissépticos
indicados são tintura de iodo 1-2%, álcool iodado, álcool 70% ou clorexidina
alcoólica e deve ser padronizado por cada instituição.
 Metodologia: Os métodos manuais apesar de serem ainda utilizados vêm
sendo substituídos por métodos automatizados que superam a sensibilidade
empregada nas técnicas mais antigas. As duas metodologias automatizadas
que estão disponíveis atualmente no Brasil tem como base a detecção do
crescimento microbiano por fluorescência (BACTEC®-Becton Dickinson) ou por
colorimetria (BacT/ALERT®-bioMérieux) apresentando desempenho
semelhante para os principais patógenos.
Hemograma

O hemograma é o exame de rotina complementar mais solicitado por médicos


para investigação e monitoramento evolutivo de doenças infecciosas e crônicas, além
de ser indispensável em emergências médicas e no acompanhamento de
quimioterapia e radioterapia. É recomendado para avaliação de anemias,
acompanhamento de medicações e investigação de distúrbios hematológicos. Na
série vermelha, fornece informação sobre a contagem, a forma e o tamanho das
hemácias, além de indicar a dosagem de hemoglobina. Na série branca fornece a
contagem e identificação dos diferentes tipos de leucócitos, diferenciando as células
conforme o estágio de maturação.⁽²⁴⁾ As principais alterações no hemograma por
processos infecciosos podem ser vistos no tabela 4.⁽²²‫׳‬²⁵‫׳‬²⁴⁾

Tabela 4. Alterações visíveis nas infecções sistêmicas


Célula Alteração Discussão

Neutrofilia >7.000/µL Resposta normal à infecção bacteriana ou fúngica


Neutropenia <1.500 /µL Associado a mau prognóstico em pacientes com sepse
Neutrófilo Vacuolização Frequente em infecções
Desvio a esquerda Indicador sensível e específico de infecção

Hemácias Hemólise Infecções podem causar hemólise por vários


mecanismos, levando a anemia hemolítica e a
deformidades na estrutura da hemácia.

Proteína C reativa

A proteína C reativa faz parte das proteínas de fase aguda de processos


inflamatórios e é secretada na corrente sanguínea predominantemente pelas células
hepáticas. Tem liberação inicial de 4 a 6 horas, atingindo seu pico entre 36 a 50 horas,
podendo permanecer com níveis basais elevados por dias após um único estímulo. É
utilizada como biomarcador de processos inflamatórios agudos e serve para
estabelecer informações sobre o prognóstico, monitorização e evolução de doenças
infecciosas. Pode ser encontrada também em processos infecciosos crônicos o que
delimita seu uso.⁽²⁵‫׳‬²⁶⁾
Procalcitonina

É uma proteína liberada pelas células da tireoide em pequenas quantidades em


pacientes sadios e encontra-se aumentada durante a fase aguda de processos
infecciosos. Não substitui a proteína C reativa, porém, fornece informações adicionais
por apresentar maior sensibilidade e especificidade para infecções de origem
bacteriana. É utilizada como uma importante ferramenta no diagnóstico e prognóstico
de processos infecciosos, principalmente em pacientes com choque séptico.⁽²⁷‫׳‬²⁸⁾

Medidas preventivas

A prevenção de infecções em pacientes oncológicos necessita medidas que


minimizem as complicações e o alto índice de mortalidade. Em pesquisa recente
realizada pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP) aponta que a
sepse é responsável por 30 % das internações na Unidade de terapia Intensiva e
representa 55 % dos óbitos em pacientes oncológicos.⁽¹‫׳‬²⁹⁾
Devido à intensidade desse problema, medidas simples podem ajudar a
prevenir as infecções e devem ser seguidas por todos os profissionais da saúde,
familiares e inclusive o paciente.⁽²⁹⁾
A tabela 5 mostra alguns cuidados essenciais que devem ser tomados.⁽¹‫׳‬²⁹‫׳‬³⁰⁾

Tabela 5. Medidas preventivas


Medidas Responsabilidade Discussão
Lavagem das Profissionais da As mãos são os principais veículos de micro-
mãos saúde organismos que causam infecções.
Familiares
Paciente
Cuidado ao sítio Profissionais da Cuidados no local da incisão devem ser tomados
cirúrgico saúde e passados ao conhecimento do paciente e
Familiares familiares quando este ganhar alta hospitalar.
Paciente Atentar para troca de curativo e sinais de
inflamação ou infecção.

Cuidado com Familiares Alimentos saudáveis ajudam a manter a


alimentos Paciente imunidade alta.
Em casos de imunossupressão a preferência é
para alimentos cozidos, pois tem menor carga
microbiana.
Automedicação Paciente Em sinais de inflamação ou infecção jamais fazer
Familiares a automedicação, devido à baixa imunidade o
risco de infecção pode evoluir para casos mais
graves e pode ser fatal.
Vacinação Paciente Em geral as vacinas acelulares são indicadas
para pacientes oncológicos principalmente os
esplectomizados. Preferencialmente não realizar
junto com as sessões de quimioterapia. Ex:

H. Influenzae
V z f z .

Práticas sexuais Paciente Recomendado o uso de preservativo nas práticas


sexuais de pacientes com
imunocomprometimento. Cuidar com práticas que
resultem em alguma lesão principalmente em
pacientes neutropênicos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O câncer é uma das doenças mais prevalentes no mundo contemporâneo


acometendo milhões de pessoas anualmente em todas as partes do mundo. O
tratamento do câncer evolui muito nas últimas décadas oferecendo a muitos pacientes
a possibilidade da cura, porém existem condições associadas à doença e as técnicas
de tratamento que podem trazer consequências graves ao paciente. Diversos estudos
demonstram que as infecções sistêmicas são frequentes em pacientes oncológicos e
estão associados a altos índices de morbidade e mortalidade. Saber como ocorre à
entrada de micro-organismos na corrente sanguínea é importante para compreender o
ciclo de todo o processo e tentar impedi-lo através de medidas preventivas. Além
disso, saber que o Serviço de Análises Clínicas também contribui para o diagnóstico,
monitoramento e prognóstico das infecções sistêmicas enfatiza que o tratamento
oncológico engloba múltiplos profissionais com o objetivo único de contribuir para
melhoria da qualidade de vida destes pacientes.
Abstract
Systemic infections in cancer patients are one of the main causes of death and morbidity and are
associated with several factors that predispose the entry of microorganisms into the bloodstream.
Objective: Explaining how it occurs the entrance of microorganisms in pacients blood stream; describing
the most prevalent microorganisms; reporting the most important exams for sepsis diagnosis and quoting
essencial care methods that are applied for preventing these infections.Methodology: The bibliographic
review was delimited in the period from 2007 to 2017, held search in periodicals, books and international
recognized organizations websites.

Keywords
Oncology; Sepsis; Treatment; Complications; Laboratory diagnosis and prevention

Título Corrido/Running Title

Infecções Sistêmicas em Pacientes Oncológicos

Systemic Infections in Oncology Patients

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Correspondência
Viviane Marques dos Santos
Rua Ignez Boff Mazotte, 1085 ap. 14 - Morada dos Alpes
95045 291 - Caxias do Sul, RS
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL

ÁREA DO CONHECIMENTO DE CIÊNCIAS DA VIDA

CURSO DE FARMÁCIA

INFECÇÕES SISTÊMICAS EM PACIENTES ONCOLÓGICOS: REVISÃO DE


LITERATURA

VIVIANE MARQUES DOS SANTOS

CAXIAS DO SUL

2017
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL

ÁREA DO CONHECIMENTO DE CIÊNCIAS DA VIDA

CURSO DE FARMÁCIA

INFECÇÕES SISTÊMICAS EM PACIENTES ONCOLÓGICOS: REVISÃO DE


LITERATURA

VIVIANE MARQUES DOS SANTOS

Trabalho de conclusão de Curso,


apresentado na forma de artigo
científico como requisito para obtenção
do título de bacharel em Farmácia

Professora orientadora: Me Cristiane


Boff Trevisol

CAXIAS DO SUL

2017
Caxias do Sul, 26 de junho de 2017.

Caro professor,

Ao cumprimentar-lhe, gostaríamos de convidá-lo a fazer parte da Banca

Examinadora do Trabalho de Conclusão de Curso da aluna Viviane Marques dos

Santos, intitulado: Infecções Sistêmicas em Pacientes Oncológicos: Revisão de

Literatura. A banca acontecerá no dia 04/06/17, às 17:00 h, em local a ser confirmado.

Junto ao trabalho, que foi redigido em formato de artigo científico, enviamos o

arquivo das normas da revista selecionada e a ficha de avaliação.

Agradecemos a sua disponibilidade em participar desta avaliação e colocamo-

nos à disposição para maiores esclarecimentos.

Atenciosamente,

Viviane Marques dos Santos Me Cristiane Boff Trevisol

Autora e acadêmica do Curso de Farmacêutica e docente do Curso de


Farmácia da Universidade de Caxias Farmácia da Universidade de Caxias
do Sul do Sul

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