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Conforme demonstrado nos documentos juntados, foi firmado um Contrato

particular de Cessão e Transferência de Direitos entre os promitentes vendedores


Manoel Vicente da Silva e Maria de Lourdes da Silva, sua esposa, e o promitente
comprador Pedro Mayer, no qual são cedidos e transferidos todos os direitos e
obrigações com referência à aquisição do imóvel situado à Rua B, número 08, do
Conjunto Residencial Coqueiros, número 2, no Bairro do Pinheirinho, na cidade de
Curitiba.
Pelo presente instrumento, depreende-se a informação de que os direitos
sobre o imóvel foram transferidos para o comprador, mediante o pagamento de
determinado valor firmado entre as partes, o qual assumiu a obrigação das
prestações mensais restantes junto à Cohab e após a quitação total do valor do
imóvel, o comprador poderia exigir-lhe a escritura definitiva do imóvel objeto do
contrato.
Diante disso, a ação cabível ao presente caso é a Ação de Adjudicação
Compulsória, a qual tem o poder de obrigar o promitente vendedor a assinar a
escritura definitiva de um imóvel, tornado o adquirente o efetivo proprietário do bem,
conforme preleciona a doutrina:
“(...) caso a promessa de compra e venda esteja devidamente
registrada, poderá o compromissário comprador, na forma da legislação
especial, ajuizar demanda de adjudicação compulsória, caso em que,
por sentença, o juiz adjudicará o imóvel compromissado ao seu
patrimônio, se o vendedor não lhe houver outorgado a escritura
definitiva, consoante convencionado”1.

No entanto, ainda que a promessa de compra e venda firmada pelas partes


não esteja registrada, o contrato terá gerado efeitos entre as próprias partes
contratantes, caso em que, a parte prejudicada pelo inadimplemento da outra
poderá lançar mão dos meios comuns de execução específica da obrigação de
fazer, para o fim de satisfazer seu direito.
Nesse sentido, o STJ editou a Súmula 239 que dispõe: “O direito à
adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra
e venda no cartório de imóveis”.

1 Apelação Cível 9094843-57.2007.8.26.0000, da 1ª câmara de direito privado do Tribunal de Justiça


do Estado de São Paulo, Relator Claudio Godoy. Publicado em 10.07.2013
Em todos os aspecto, pode ser possível que o Judiciário 2 fundamente com a
necessidade de entrar com a ação de usucapião, pela imprescritibilidade da
adjudicação compulsória. José Osório de Azevedo Júnior ensina que:
“(...) não pode manter a situação contraditória em que o compromissário
permanece com o seu direito sobre o imóvel e o compromitente fica
desobrigado de dar escritura. Impõe-se a intervenção do Judiciário para
resolver a pendência, com a presteza e simplicidade necessárias, sem o
aguardo de longos prazos e sem os percalços da ação de usucapião” 3

Na sequência, o compromisso de compra e venda já demonstra o interesse


entre as partes, conforme observa Orlando Gomes sobre adjudicação compulsória,

“Ao ordenar a adjudicação compulsória, mais não faz a autoridade judiciária


do que determinar a execução sob forma específica de uma obrigação
contratual voluntariamente descumprida. Torna-se evidente, nestas
condições, que a conclusão do processo translativo anterior à transcrição é
simples execução do contrato de compromisso de venda, tanto assim que a
sentença constitutiva não pode exigir do promitente-vendedor outras
prestações, restrigindo-se a ordenar a adjudicação compulsória” 4

O compromisso de compra e venda pode ser caracterizado como um direito


real levando, em consequência, a caracterização do direito à adjudicação
compulsória, nesse sentido entende Silvio Rodrigues:
“Parece-me indiscutível ter a promessa irretratável de venda o caráter de
direito real de gozo, pois o que visou o legislador não foi afetar a coisa ao
pagamento preferencial do credor, mas, sim, conferir ao promissário
comprador uma prerrogativa sobre a coisa vendida: a) de gozá-la e de fruí-
la; b) de impedir sua válida alienação a outrem; c) de obter sua adjudicação
compulsória, em caso de recusa do promitente em outorgar ao promissário a
escritura definitiva de venda e compra”5

2 AZEVEDO JUNIOR, José Osório. Compromisso de Compra e Venda. 4ª ed., São Paulo, Ed.
Malheiros, 1998, p. 72
3 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: Direito das Coisas. v. 5. 28. ed. rev. e atual. de acordo com o
novo Código Civil (lei n. 10.406, de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva, 2003, p. 314
4 AZEVEDO JÚNIOR, José Osório. Compromisso de Compra e Venda. 5 ed. rev. ampl. São Paulo:
Malheiros Editores, 2006, p. 69.
5 GOMES, Orlando. Direitos Reais. Atualizado por THEODORO JÚNIOR, Humberto. 14. ed. Revista
Forense: Rio de Janeiro, 1999, p 334
Entende-se, portanto, que tal direito, com todos os elementos
caracterizadores do direito real, é oponível contra terceiros em virtude do
compromisso de compra e venda permitindo ao autor da ação o direito ao gozo.
Nesse sentido, entende, também o professor, José Osório de Azevedo Junior sobre
a existência do direito real:

“Essa postura é muito mais de dominação frente à coisa do que de


dependência de uma colaboração do compromitente para a outorga da
escritura definitiva: utiliza-se da coisa pelo dono; dispõe dela livremente
(mesmo havendo preço a pagar, o compromitente não pode se opor à
cessão, e ainda que o contrato disponha em sentido contrário); alienações
posteriores não o atingirão; tem sequela contra a coisa [...].” 6

Pode-se verificar que a natureza do compromisso de compra e venda é


obrigacional tendo por razão a entrega da coisa, onde ao ser concluída o
pagamento das parcelas pelo autor, o réu deveria outorgar a escritura definitiva de
compra e venda caracterizando como uma obrigação de fazer. Nesse sentido, ao
ser pactuada entre as partes a outorga da escritura pública cumpre com a obrigação
de fazer, seguindo nessa lógica, ensina Valter Farid Antonio Junior:

“O dever de outorga da escritura pública deriva do vínculo


contratual, corresponde a ato de execução do compromisso de
compra e venda e tem por fundamento direito pessoal que se
opera inter partes. Depende de ato de colaboração do devedor,
no caso, o compromitente vendedor, a quem incumbe a
obrigação de conferir eficácia, mediante simples reiteração a
manifestação de vontade já externada no compromisso de
compra quanto à transferência da propriedade do imóvel
compromissado após o pagamento integral do preço.”

Assim também é o entendimento jurisprudencial acerca do tema, que


reconhece o direito do promitente comprador por meio da ação de adjudicação
compulsória, conforme pode ser vistos nos seguintes julgados:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA.
SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO PROCESSO. AUSÊNCIA DE

6 Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho. NOVO CURSO DE DIREITO CIVIL 5 - DIREITOS REAIS .
Disponível em: Minha Biblioteca, 3ª edição. Editora Saraiva, 2021
INTERESSE DE AGIR. INSURGÊNCIA DA AUTORA.
ACOLHIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO.
EXISTÊNCIA DE MATRÍCULA DO LOTEAMENTO. NECESSIDADE
DE DILIGENCIAR JUNTO AO REGISTRO DE IMÓVEIS. ALÉM
DISSO, INDISPENSÁVEL OPORTUNIZAÇÃO DE A AUTORA
COMPROVAR A REGULARIDADE DAS CESSÕES REALIZADAS.
SENTENÇA CASSADA.- A adjudicação compulsória é a medida
judicial por meio da qual a sentença, quando favorável, substitui
o consentimento do proprietário do imóvel para transferir o
domínio a quem lhe é de direito. - Tal pretensão pode prosperar
apenas se estiverem presentes no negócio jurídico os seguintes
requisitos: (1) individualização do imóvel, (2) registro em nome
do promitente vendedor, (3) contrato de promessa de compra e
venda sem cláusula de arrependimento e (4) dívida quitada.- No
caso, considerando que no compromisso de compra e venda original
consta a existência de registro do loteamento em matrícula, é
necessário oficiar o Cartório de Registro de Imóveis da localidade
competente para se conferir a matrícula aberta para o loteamento.-
Ainda, merece ser dada a oportunidade de a autora comprovar a
regularidade das cessões, com o intuito de demonstrar que adquiriu
de forma legítima os direitos dos compromissários compradores.
Recurso provido, com cassação da sentença. 11. 0002691-
10.2019.8.16.0160 (Acórdão) Relator: Pericles Bellusci de Batista
Pereira Desembargador Processo: 0002691-10.2019.8.16.0160
Órgão Julgador: 18ª Câmara Cível - Data Julgamento: 13/10/2021

Quando remete a presença dos requisitos da adjudicação compulsória, o


seguinte julgado decide pelo provimento do recurso:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA.


SENTENÇA DE EXTINÇÃO. APELO DAS AUTORAS. CESSÃO DO
DIREITO E AÇÃO SOBRE O IMÓVEL DOADOS ÀS AUTORAS.
PROMESSA DE COMPRA E VENDA TENDO OS RÉUS COMO
PROPRIETÁRIOS E PROMITENTES VENDEDORES, COM PREÇO
DEVIDAMENTE QUITADO. LEGITIMIDADE DAS PARTES.
PRESENÇA DOS REQUISITOS DA ADJUDICAÇÃO
COMPULSÓRIA. PROVIMENTO DO RECURSO.

(TJ-RJ - APL: 05068005720158190001 RIO DE JANEIRO CAPITAL


37 VARA CIVEL, Relator: CESAR FELIPE CURY, Data de
Julgamento: 15/03/2017, DÉCIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data
de Publicação: 16/03/2017)

Para consumar a ação de adjudicação, a seguinte jurisprudência confirma


que as provas documentais são suficientes para provar a pretensão do autor,
vejamos:
AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA JULGADA
PROCEDENTE. Insurgência fundada em ausência de contrato
escrito, de demonstração da cadeia negocial e de individuação do
lote. Descabimento. Provas documentais que corroboram a
pretensão autoral. Documento assinado pelo cedente e
cessionário, no qual constam o nome das partes, o objeto e o
preço, o que denota a natureza contratual. Comprovação da
quitação do preço. Individuação do imóvel bem demonstrada,
sendo alterada a sua designação pela municipalidade, o que
não é capaz de obstar o deferimento do pedido. Nos termos da
Súmula nº 239, do C. STJ, o direito à adjudicação compulsória não
se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no
Cartório de Registro de Imóveis. Presentes os requisitos para a
adjudicação, é de rigor a manutenção da procedência do pedido.
Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SP - AC:
10007120220198260650 SP 1000712-02.2019.8.26.0650, Relator:
Márcio Boscaro, Data de Julgamento: 29/09/2021, 10ª Câmara de
Direito Privado, Data de Publicação: 30/09/2021)

Para a questão de contrato de gaveta, a seguinte jurisprudência reconhece o


direito do bem negociado, bem como a quitação integral, em consequência foi
declarada judicialmente a adjudicação:

AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA DE IMÓVEL.


“CONTRATO DE GAVETA”. CESSÃO DE DIREITOS REALIZADA
SEM ANUÊNCIA DO AGENTE FINANCEIRO. PRECEDENTES.
QUITAÇÃO INCONTROVERSA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
PARTE AUTORA CONDENADA AO PAGAMENTO DOS
HONORÁRIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. INSURGÊNCIA.
RESISTÊNCIA DA COHAPAR. ACOLHIMENTO. NEGATIVA
ADMINISTRATIVA E RESISTÊNCIA JUDICIAL. PRINCÍPIO DA
SUCUMBÊNCIA. CAUSALIDADE. COHAPAR QUE NÃO INFIRMA
O INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO E REITERA A
IMPOSSIBILIDADE DE ADJUDICAÇÃO JUDICIAL. NECESSIDADE
DE INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. - No caso,
incontroversa a quitação integral do bem negociado e a
adjudicação declarada judicialmente e não recorrida. Desse
modo, para além da negativa administrativa que, por si só, denota a
causalidade da demanda, nota-se que a apelada opôs resistência a
pretensão autoral também nesta esfera judicial, restando vencida, o
que atrai o disposto no art. 85 do CPC.Recurso de apelação provido.
32. 0003693-46.2021.8.16.0030 (Acórdão) Relator: Pericles
Bellusci de Batista Pereira Desembargador Processo: 0003693-
46.2021.8.16.0030 Órgão Julgador: 18ª Câmara Cível Data
Julgamento: 09/09/2021

No caso relatado, não restou configurado os motivos pelos quais o autor


necessitou recorrer ao poder judiciário para ver reconhecido seu direito como
proprietário do imóvel, pois não houve a juntada de nenhum documento que
comprovasse a recusa do promitente vendedor em assinar a escritura definitiva do
imóvel.
BIBLIOGRAFIA:

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho. NOVO CURSO DE DIREITO CIVIL 5 -


DIREITOS REAIS . Disponível em: Minha Biblioteca, 3ª edição. Editora Saraiva,
2021

AZEVEDO JUNIOR, José Osório. Compromisso de Compra e Venda. 4ª ed., São


Paulo, Ed. Malheiros, 1998,

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: Direito das Coisas. v. 5. 28. ed. rev. e atual. de
acordo com o novo Código Civil (lei n. 10.406, de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva,
2003, p. 6

AZEVEDO JÚNIOR, José Osório. Compromisso de Compra e Venda. 5 ed. rev.


ampl. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

ANTONIO JUNIOR, Valter Farid. Compromisso de Compra e Venda. São Paulo:


Atlas, 2009.

GOMES, Orlando. Direitos Reais. Atualizado por THEODORO JÚNIOR, Humberto.


14. ed. Revista Forense: Rio de Janeiro, 1999.

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