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A promessa de compra e venda sem registro e a ação de


adjudicação compulsória
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Luiz Antonio Scavone Junior


Advogado, Administrador pela Universidade Mackenzie, Mestre e Doutor em Direito Civil
pela PUC-SP, Professor de Direito Civil da Universidade Presbiteriana Mackenzie e de pós-
graduação em Direito Imobiliário da Escola Paulista de Direito - EPD, autor de diversas
obras e coordenador do curso de Direito Imobiliário da EPD.
 
Superior Tribunal de Justiça

Acórdão n. 0003605 - Data: 09-04-1996; Num. 0057225; Ano: 1994 - UF: RJ – Terceira Turma
– Recurso Especial: Publicação DJ: 27/05/1996 p.17865. Promessa de compra e venda por
instrumento particular, não inscrita no registro de imóveis. Caso em que não se pactuou
arrependimento. De acordo com a decisão recorrida, " a promessa de compra e venda, por
instrumento particular, não inscrita no registro público, gera efeitos obrigacionais, já que a
adjudicação compulsória e de caráter pessoal, restrito aos contratantes, sendo que aquele
que se comprometeu a concluir um contrato, caso não conclua a sua obrigação, a outra
parte poderá obter uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato firmado". Em tal
sentido, RESP's 30 e 9945, entre outros. 2. O direito de arrependimento supõe que haja sido
pactuado. E que "não poderá o promitente vendedor arrepender-se, se não houver clausula
expressa, no pré-contrato, prevendo essa possibilidade" (REsp-8202). Em caso tal, não tem
aplicação o disposto no art. 1088 do Cód. Civil. 3. Recurso especial não conhecido. Relator:
Min. Nilson Naves – Veja: Recurso Especial n. 9945, 8202, 8944, (STJ).

Verifica-se, in casu, celeuma a respeito da necessidade ou não do registro para se intentar a


ação de adjudicação compulsória, prevista que está no artigo 16 do Decreto-Lei 58/37.

Ressalte-se que, aqui, tratamos indistintamente a promessa e o compromisso, sem fazer a


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distinção levada a efeito por alguns autores em relação o irretartabilidade.

Em verdade, ao revés da propriedade, o titular de uma promessa de compra e venda não


conta com os atributos do domínio.


Aliás, se os tivesse, já não haveria falar num direito real do promitente-comprador, senão
que a promessa se confundiria com a venda, e o promitente comprador, só pelo fato de o ser,
já se equipararia ao comprador (Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de Direito Civi –
Vol IV – 13ª ed. Rio de Janeiro, ed. Forense, 1999, p. 314).

Assim, a promessa de compra e venda não é venda, como confundem alguns com
supedâneo no direito francês, no qual promesse de vent vaut vente (Barbosa Lima
Sobrinho. As Transformações da Compra-e-Venda. p. 84; Planiol Ripert et Boulanger, Traité
Elémentaire, vol. II, n.os 2.414 e segs).

O contrato de promessa de compra e venda possui como objeto a celebração de outro


contrato, definitivo, que, respeitados os requisitos, gerará o direito real de propriedade.

A adjudicação compulsória é a ação que emana do contrato preliminar de promessa de


compra e venda, cujo fim é compelir o promitente vendedor a transferir a propriedade
através de sentença que tem o condão de substituir a vontade do inadimplente.

Demanda semelhante é a execução de obrigação de fazer disciplinada pelos artigos 461, 639
a 641 do Código de Processo Civil, 48 e 84 do Código de Defesa do Consumidor, pelo rito
sumário ou ordinário, conforme o caso.

Carlyle Popp (Execução de obrigação de fazer. Curitiba, Ed. Juruá, 1995. P. 141 a 143) não faz
distinção entre o direito real atribuído pelo registro da promessa de compra e venda e a
natureza real da ação de adjudicação compulsória. Nessa linha, inadmite a adjudicação
compulsória de contrato não registrado, vez que, apenas seria possível, nesse caso, a
execução de obrigação de fazer.

A nosso ver, tanto a execução de obrigação de fazer, quanto a adjudicação compulsória, são
demandas de caráter pessoal e colocadas a disposição do promissário no caso de
inadimplemento do promitente na transferência do domínio do imóvel:

Tribunal de Justiça de São Paulo


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Adjudicação Compulsória - Necessidade de registro do compromisso de compra e venda -
Inadmissibilidade - Eficácia e validade não condicionadas a formalidade do instrumento
público - Obligatio faciendi assumida pelo promitente-vendedor que possui o condão de dar
ensejo a adjudicação - Inaplicabilidade da Súmula 167 do Supremo Tribunal Federal -
Extinção do processo afastada - Recurso provido. A promessa de venda gera pretensões de

direito pessoal, não dependendo, para sua eficácia e validade, de ser formalizada em
instrumento público. A obligatio faciendi, assumida pelo promitente vendedor, pode dar
ensejo à adjudicação compulsória. O registro imobiliário somente é necessário para
produção de efeitos relativamente a terceiros. (Apelação Cível n. 000.747-4 - São Paulo - 8ª
Câmara de Férias de Direito Privado - Relator: Cesar Lacerda - 31.01.96 - V. U.)

Ricardo Arcoverde Credie (Adjudicação compulsória, São Paulo, Ed. Malheiros, 1997) e
Mário de Aguiar Moura (Promessa de Compra e Venda, Rio de Janeiro, Ed. Aide, 1986, p. 160)
entendem que não há necessidade de registro para que o promissário se valha da ação de
adjudicação compulsória. De fato, é a interpretação mais coerente com o espírito da própria
Lei que busca a proteção do promissário comprador. Pensar diferente seria impor uma
injustificada sanção em detrimento da obrigação do promitente vendedor outorgar a
escritura. Acrescenta-se, apenas, a necessidade de que a promessa não seja retratável.

Ora, tal obrigação do promitente vendedor decorre do próprio contrato, tenha ele sido ou
não sido registrado. É uma obrigação de fazer que, inadimplida, pode perfeitamente ser
substituída por decisão judicial nos termos dos artigos 461, 639 e 641 do Código de Processo
Civil (execução de obrigação de fazer – pelo rito ordinário ou sumário) ou, facultativamente,
pelo disposto nos artigos 16 e 22 do decreto-lei 58/37 (adjudicação compulsória, pelo rito
sumário).

O registro seria, apenas, mais uma garantia ao promissário comprador, que teria
assegurada a propriedade contra futura alienação do promitente vendedor para terceiros
em face do direito real oponível erga omnes. O registro retira do promitente vendedor a
disponibilidade do bem, a despeito de, estranhamente, continuar com o domínio sobre ele.

O registro atribui à promessa de compra e venda uma eficácia real cujo objeto é o futuro
contrato definitivo.

Antes do registro, observa-se mero direito pessoal, que gera direitos obrigacionais e não
reais.

Na lição de Serpa Lopes (M.M. Serpa Lopes. Curso de Direito Civil. vol. VI, Rio de Janeiro,

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Livraria Freitas Bastos, 1961, n° 119) trata-se de um novo direito real: direito real de
aquisição.
Registra-se, contudo, que Orlando Gomes considera a promessa de compra e venda um
misto de direito real de gozo e de garantia (Direitos Reais – 11ª ed. Rio de Janeiro, Ed.

Forense, 1995, p. 313/314)

Para Maria Helena Diniz, a inscrição da promessa de compra e venda de imóvel equivale a
um direito real limitado, direito de aquisição, assecuratório do ‘contrahere’ futuro, não só
em relação às partes contratantes, como ‘erga omnes’ ( Curso de Direito Civil Brasileiro. 4°
Vol. Direito da Coisas. São Paulo, Ed. Saraiva, 1996. p. 413).

Na verdade, pelo registro, atribui-se eficácia real a um direito pessoal.

Segundo Orlando Gomes, tratar-se-ia de anotação preventiva na exata medida em que o


promitente-vendedor não pode alienar o bem nem impedir ou dificultar o cumprimento da
pretensão do promitente comprador de se tornar seu legítimo proprietário (ob. cit. p. 315).

Para Wolff, o registro atribuiria ao direito pessoal um direito negativo de senhorio (Martin
Wolff. Derecho de cosas, 8ª ed, traducida de la 32ª ed. Alemana y anotada com referencia al
Derecho español por Blas Pérez Gonçalez y José Alguer, Barcelona, 1936. § 48).

Demais disso, sem o registro, o promissário comprador não terá a garantia de que o imóvel
prometido não será penhorado com sucesso por dívidas posteriores a sua celebração, não
obstante jurisprudência vacilante, ora num ora noutro sentido:

Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo

Processo n. 0396642-5/005 - Apelação Cível - São Paulo - Órgão: 6ª Câmara - Julgamento:


13/09/1988 - Relator: Augusto Marin – Decisão unânime. Penhora - incidência sobre imóvel,
objeto de compromisso de compra e venda não inscrito no registro imobiliário -
irrelevância de a promessa ter sido celebrada anterior ou posteriormente ao ato constritivo
- embargos de terceiro improcedentes - sentença mantida. Anotação da comissão: no
mesmo sentido: Apelações nos. 393.256-7 – Rel. Alexandre Germano; 400.585-6 – Rel. José
Bedran; 404.351-6 – Rel. Alexandre Germano.

Superior Tribunal de Justiça

Processo n. 00019319-6/004 - Recurso Especial - Origem: Taubaté - Terceira Turma -


Julgamento: 19/05/1992 - Relator: Min. Waldemar Zveiter - Decisão: unânime. Processual
Civil - embargos de terceiro - contrato de promessa de compra e venda não inscrito no
registro de imóvel - posse - penhora - execução - artigo 1046, parágrafo 1° do Código de
Processo Civil. I - Inexistente fraude, encontrando-se os recorridos na posse mansa e

pacifica do imóvel, estão legitimados na qualidade de possuidores a opor embargos de
terceiro, com base em contrato de compra e venda não inscrito no registro de imóvel, para
pleitear a exclusão do bem objeto da penhora no processo de execução, onde não eram
parte, a teor do artigo 1046, parágrafo 10. Do Código de Processo Civil - precedentes do
Superior Tribunal de Justiça. II - Recurso conhecido pela letra "c", do permissivo
constitucional, a qual se nega provimento.

Importante, por fim, ressaltar que a sentença na ação de adjudicação compulsória não
possui o condão de transmitir qualquer domínio, vez que se trata apenas de substituição da
escritura pública e, como tal, sujeitar-se-á as exigências para que seja registrada e, por
conseguinte, transmita a propriedade.

Caso o promitente vendedor não mais disponha do domínio, este não se transmitirá.

Nesse caso o objeto da obrigação converter-se-á em perdas e danos. A jurisprudência pátria


mais abalizada tende a seguir esta orientação.

Portanto, não é a sentença de adjudicação compulsória que terá o condão de transmitir a


propriedade e sim o seu registro, desde que respeitados os requisitos legais.

Assim, não se registrará, por exemplo, sentença em que o polo passivo não for integrado
pelo proprietário constante do registro.

Tribunal de Justiça de São Paulo

Matéria: adjudicação Recurso: Apelação 15029 0; Origem: Praia Grande; Relator: Dínio
Garcia; Data: 08/07/92. Registro de imóveis - adjudicação - título de origem judicial
circunstância que não isenta o título dos requisitos básicos par o registro - negativa do
registro que não torna ineficaz ou inválida a sentença judicial, senão apenas verifica se o
título quadra com a exigência do registro imobiliário - necessidade, ademais, da carta de
adjudicação para se reportar a promessa de compra e venda.

Resumidamente, a melhor interpretação leva a conclusão de que:

a) a promessa de compra e venda, enquanto não registrada, é um direito pessoal, seja por
escritura pública ou por instrumento particular;
b) registrada, passa a constituir um direito real, oponível erga omnes, atribuindo ao seu

titular o direito de seqüela;

c) registrada ou não, desde que formalmente correta, a promessa autoriza a adjudicação


compulsória, pelo rito sumário (CPC., arts 275 e seguintes) acorde com o disposto no artigo
16 do Decreto-lei 58/37;

d) a diferença entre a promessa de compra e venda registrada e não registrada reside na


oponibilidade a terceiros de que dispõe aquela e não dispõe esta, e não na possibilidade ou
não de se intentar ação de adjudicação compulsória nos termos do Decreto-Lei 58/37,
mesma conclusão que exsurge dos arts. 1.417 e 1.418 do Código Civil.

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