Você está na página 1de 7

Brazilian Journal of Development 48308

ISSN: 2525-8761

Trombose venosa mesentérica causada por anticoncepcional: relato de


caso

Mesenteric venous thrombosis caused by anticonceptional: case report

DOI:10.34117/bjdv7n5-300

Recebimento dos originais: 07/04/2021


Aceitação para publicação: 14/05/2021

Camila Senedese Grendene


Biomédica, pós graduada em Imagenologia, discente de Medicina
União das faculdades dos grandes lagos - UNILAGO
Endereço: Rua Brasília de Araújo 206, centro. Bela Vista do Paraiso-PR CEP 86130000
E-mail: senedesegrendene@gmail.com

Salua Alves Ally da Silva Custódio


Tecnóloga em Gestão Financeira, MBA em Gestão Empresarial, discente de medicina
UNIÃO DAS FACULDADES DOS GRANDES LAGOS - UNILAGO
Endereço: Paraguai, n. 1200, CENTRO, Medianeira- PR Cep 85.884-000
E-mail: saluaally@gmail.com

Mario Amaral Puglisi


Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina de Petrópolis - FMP (2013).
Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Rio Preto - UNIRP (2018). Mestrando
em Mestrado Profissional em Medicina da Família e Comunidade - UNESP - Botucatu.
(em curso desde 2017) Pós-graduação: Especialização em Medicina do Trabalho -
FAMERP (2014). Pós-Graduação: Especialização em Medicina da Família e
Comunidade - UNIFESP (2014). Pós-Graduação: Especialização em Preceptoria médica
no SUS - Hospital Sírio Libanês (2017).
Endereço: Rua Dr. Presciliano Pinto, nº 2347, Alto Rio Preto - São José do Rio Preto –
SP
E-mail: marioamaralp@hotmail.com

Amanda Oliva Spaziani


Médica, residente de ortopedia e traumatologia.
Hospital Ensino Santa Casa de Misericórdia de Fernandópolis
Endereço: Av Afonso Cafaro, Fernandópolis, SP – 15600-000
E-mail: spazianimedicina@gmail.com

RESUMO
O diagnóstico de trombose venosa mesentérica aumentou nas últimas duas décadas com
o uso rotineiro de tomografia computadorizada (TC) com contraste em pacientes com dor
abdominal e hipertensão portal. A dor abdominal é o sintoma mais comum,
principalmente na trombose aguda, enquanto a TVM crônica se manifesta como
hipertensão portal e varizes esofágicas. Considerando a importância do tema, esse
trabalho visa relatar um caso de trombose venosa mesentérica e discutir o presente na
literatura acerca do tema. Relatamos um caso de TVM provavelmente induzida por
contraceptivos. A descrição mais antiga da TVM foi em 1895, e o primeiro caso de TVM

Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.5, p. 48308-48314 may. 2021


Brazilian Journal of Development 48309
ISSN: 2525-8761

relacionado a contraceptivos orais (COs) foi relatado em 1963. O MVT relacionado ao


uso de OC é responsável por 4-5% de todos os MVTs.

Palavras-Chave: trombose venosa mesentérica, anticoncepcional.

ABSTRACT
The diagnosis of mesenteric venous thrombosis has increased in the past two decades
with the routine use of contrast-enhanced computed tomography (CT) in patients with
abdominal pain and portal hypertension. Abdominal pain is the most common symptom,
especially in acute thrombosis, while chronic TVM manifests itself as portal hypertension
and esophageal varices. Considering the importance of the theme, this work aims to report
a case of mesenteric venous thrombosis and discuss the present in the literature about the
theme. We report a case of DVT probably induced by contraceptives. The oldest
description of TVM was in 1895, and the first case of TVM related to oral contraceptives
(OCs) was reported in 1963. MVT related to OC use accounts for 4-5% of all MVTs.

Keywords: contraceptive mesenteric venous thrombosis.

1 INTRODUÇÃO
O diagnóstico de trombose venosa mesentérica aumentou nas últimas duas
décadas com o uso rotineiro de tomografia computadorizada (TC) com contraste em
pacientes com dor abdominal e hipertensão portal. Simultaneamente ao reconhecimento
crescente, o uso rotineiro e frequente de anticoagulação reduziu a necessidade de
intervenção cirúrgica e melhorou o resultado nesses pacientes. A trombose aguda
geralmente se manifesta com dor abdominal, enquanto a doença crônica se manifesta
como achado incidental na TC ou como hipertensão portal [1].
A tomografia com contraste aprimora cerca de 90% dos casos. A presença de
circulação colateral e cavernoma ao redor de uma veia trombosada crônica diferencia a
doença crônica da aguda. A veia mesentérica superior geralmente está envolvida,
enquanto o envolvimento da veia mesentérica inferior é raro. A trombose venosa porta
associada pode ser observada se a doença se originar nas veias principais em vez das veias
retas pequenas. Trombofilia e condições inflamatórias abdominais locais são causas
comuns. O tratamento visa prevenir o infarto intestinal e a trombose recorrente. A
anticoagulação, principal pilar do tratamento, também tem sido utilizada com segurança
em pacientes com cirrose e hipertensão portal [2].
A trombose venosa mesentérica foi originalmente descrita por Warren e Eberhard
como uma entidade distinta, separada da trombose arterial mesentérica. A trombose
isolada da veia porta também é uma entidade distinta, mas pode ocorrer em associação
com a TVM. Estados protrombóticos ou trombofilia e infecções intra-abdominais locais

Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.5, p. 48308-48314 may. 2021


Brazilian Journal of Development 48310
ISSN: 2525-8761

são as principais causas da TVM. A dor abdominal é o sintoma mais comum,


principalmente na trombose aguda, enquanto a TVM crônica se manifesta como
hipertensão portal e varizes esofágicas [3].
O uso crescente da tomografia computadorizada (TC) para a investigação de dor
abdominal e anticoagulação como primeira abordagem ao tratamento da TVM aguda
melhorou o resultado nesses pacientes. Ocasionalmente, a cirurgia e a ressecção intestinal
podem ser necessárias para pacientes com infarto, perfuração e peritonite intestinal. O
manejo de pacientes com TVM crônica visa reduzir as complicações da hipertensão portal
[2].
Considerando a importância do tema, esse trabalho visa relatar um caso de
trombose venosa mesentérica e discutir o presente na literatura acerca do tema.

2 ESTUDO DE CASO
Mulher branca, 31 anos, com queixa de dor abdominal e sensação de plenitude
gástrica associada há náuseas há 6 dias. Questionada acerca da característica da dor, a
descreveu como “dor aborrecida, como câimbra na barriga”. Negava vômitos, diarreia,
febre e perda de peso.
Nega episódios trombogênicos prévios, viagens, cirurgias recentes, uso de álcool,
tabaco e drogas ilícitas. Nos antecedentes familiares destacava-se trombose venosa
profunda em seu avô materno. Seu único medicamento de uso contínuo era contraceptivo
oral: etinilestradiol 0,02 mg e levonorgestrel 100 ug, em uso há 7 anos.
Foi inicialmente tratada na atenção básica, com protetor gástrico e fármaco para
flatus, sem melhora. Sem melhora, buscou o pronto atendimento.
Ao exame físico geral na admissão apresentava-se em bom estado geral, corada,
hidratada, acianótica, anictérica e afebril. Sem alterações ao exame cardiorrespiratório.
No exame físico abdominal, apresentava ausência de alterações em pele e fâneros,
abdome globoso, flácido, ruídos hidroaéreos presentes, dor à palpação epigástrica
superficial e profunda e ausência de visceromegalias ou massas palpáveis.
À avaliação laboratorial constatou-se discreta leucocitose. Sem demais alterações.
Já a tomografia computadorizada do abdome com contraste revelou trombose venosa
mesentérica superior (SMV) (ver seta Figura 1). Dopplers de extremidade não mostraram
evidência de trombose venosa profunda.

Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.5, p. 48308-48314 may. 2021


Brazilian Journal of Development 48311
ISSN: 2525-8761

Figura 1: Tomografia computadorizada abdominal contrastada demonstrando trombose parcial da veia


mesentérica superior, conforme observado pela flecha.

Posteriormente, foi realizado um estudo arterial por meio de ressonância nuclear


magnética com imagem da fase venosa, que demonstrou fase arterial sem alterações. A
fase venosa mostrou que as veias esplênica e portal pareciam normais; no entanto, houve
oclusão parcial do SMV.
A paciente foi tratada com heparina endovenosa e varfarina; os seguintes estudos
foram obtidos: tempo normal de protime e tromboplastina parcial, nível normal de
homocisteína, estudos negativos para mutações nos fatores 2 e 5, estudos com
anticoagulante e cardiolipina negativos para lúpus, antitrombina III e proteína normais
Atividade C e S, triagem negativa de anticorpos antinucleares e estudos virais de
imunodeficiência humana. A paciente apresentava tela negativa de sacarose para
paroxismo hemoglobinúria noturna.

3 DISCUSSÃO
Relatamos um caso de TVM provavelmente induzida por contraceptivos. A
descrição mais antiga da TVM foi em 1895, e o primeiro caso de TVM relacionado a
contraceptivos orais (COs) foi relatado em 1963 [1, 2]. O MVT relacionado ao uso de OC
é responsável por 4-5% de todos os MVTs [3]. Os efeitos adversos do estrogênio-
progestina OC estão relacionados ao componente estrogênio. As principais complicações
incluem doença tromboembólica, hipertensão venosa, tumor hepático, especialmente
adenomas hepatocelulares e raramente colite [3]. A trombose induzida por CO pode ser

Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.5, p. 48308-48314 may. 2021


Brazilian Journal of Development 48312
ISSN: 2525-8761

venosa ou arterial nas circulações sistêmica, pulmonar e esplâncnica. As progestinas estão


associadas à oclusão arterial, ao contrário, os estrógenos podem produzir complicações
venosas e arteriais [3]. A trombogenicidade se correlaciona com a dose do estrogênio no
CO [3]. O risco de um paciente desenvolver trombose induzida por CO não aumenta com
a duração do uso da CO; no entanto, aumenta com a idade ou uso de tabaco [3]. Os riscos
de uma complicação tromboembólica diminuem dentro de 1 mês após a descontinuação
do CO; portanto, recomenda-se que os CO sejam descontinuados pelo menos 1 mês antes
da cirurgia eletiva importante [3].
Outros fatores como doença do tecido conjuntivo, hipertensão e uso de tabaco
aumentam o risco de o paciente desenvolver uma trombose. Mulheres com deficiência
hereditária de antitrombina III correm maior risco de desenvolver trombose ao tomar
COs. Portanto, o uso de CO nesses pacientes é contraindicado com esse distúrbio [4].
Dados sobre o uso de CO em mulheres com deficiência de proteína C como um risco
aumentado de trombose não são claros [5, 6]. Anticorpos anticoagulantes para lúpus não
foram associados a um risco aumentado de trombose em mulheres que tomam CO [7]. A
presença de mutações no fator 5 de Leiden pode aumentar o risco de trombose [7]. Os
mecanismos responsáveis pelo desenvolvimento de fenômenos tromboemblóicos em
usuários de CO continuam incertos.
Vários mecanismos foram postulados; (1) OCs podem induzir um estado
hipercoagulável por aceleração das vias interna e externa da cascata de coagulação ou por
redução dos níveis de antitrombina IIII. No entanto, nada disso é preditivo para
discriminar quais mulheres desenvolverão trombose, (2) OCs podem induzir atividade
antifibrinolítica diminuindo a fibrinólise espontânea, (3) OCs podem induzir hiperplasia
intimal [4].
Poucos relatos de casos documentaram SMVT sem algum infarto [4]. As séries
post-mortem sugerem que aproximadamente 50% dos pacientes com SMVT não
desenvolvem infarto intestinal [4]. Em um caso, verificou-se que o paciente apresentava
nódulos mesentéricos e fibrose perivascular com evidência de isquemia subaguda
transitória sem infarto do tendão [4]. No nosso caso, a dor abdominal do paciente estava
relacionada à SMVT como resultado do uso de CO por exclusão de outros estudos
normais. A SMVT é uma doença incomum que apresenta uma taxa significativa de
morbimortalidade que deve ser considerada no diagnóstico diferencial de dor abdominal
em mulheres grávidas em CO, especialmente aquelas que usam OC por mais de um ano

Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.5, p. 48308-48314 may. 2021


Brazilian Journal of Development 48313
ISSN: 2525-8761

e têm histórico pessoal de doença venosa profunda trombose sem fatores de risco
tradicionais.

Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.5, p. 48308-48314 may. 2021


Brazilian Journal of Development 48314
ISSN: 2525-8761

REFERÊNCIAS
[1] J. W. Elliot, "O alívio operatório da gangrena do intestino devido à oclusão dos vasos
mesentéricos", Annals of Surgery, vol. 21, pp. 9–23, 1895.
[2] D. L. Reed e W. W. Coon, "Tromboembolismo em pacientes que recebem drogas
progestionais", The New England Journal of Medicine, vol. 269, pp. 622–624, 1963.
[3] H. A. Hassan, "Trombose venosa mesentérica induzida por contraceptivo oral com
resultante isquemia intestinal", Journal of Clinical Gastroenterology, vol. 29, n. 1, pp. 90–
95, 1999.
[4] D. R. Miller, "Trombose venosa mesentérica focal incomum associada à medicação
contraceptiva: um relato de caso", Annals of Surgery, vol. 173, n. 1, pp. 135–138, 1971.
[5] I. Pabinger e B. Schneider, “Risco trombótico de mulheres com antitrombina
hereditária IIII, deficiência de proteína C e S em uso de contraceptivos orais. O Grupo de
Estudo GTH sobre Inibidores Naturais ”, Thrombosis and Haemostasis, vol. 71, n. 5, pp.
548-552, 1994.
[6] J. J. Trauscht-Van Horn, E. L. Capeless, T. R. Easterling e E. G. Bovill, "Perda de
gravidez e trombose com deficiência de proteína C", American Journal of Obstetrics and
Gynecology, vol. 167, n. 4 I, pp. 968–972, 1992.
[7] J.P. Vandenbroucke, T.Koster, E.Briet, P.H. Reitsma, R.M. Bertina e F.R. Rosendaal,
“Aumento do risco de trombose venosa em usuários de contraceptivos orais portadores
da mutação do fator V Leiden”, The Lancet, vol. 344, n. 8935, pp. 1453-1457, 1994.

Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.5, p. 48308-48314 may. 2021

Você também pode gostar