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Excluindo-se os

traumatismos
abdominais, o que mais
pode causar um
sangramento intra-
abdominal?

10.1 ETIOLOGIA
Definem-se como Abdome Agudo Hemorrágico (AAH) os casos
de dor abdominal associados ao quadro clínico de choque
hemorrágico por sangramentos intracavitários. As principais
causas são gravidez ectópica rota e rotura de aneurisma da aorta
abdominal, porém outras etiologias mais raras devem ser
consideradas.
Suspeita-se de gravidez ectópica nas mulheres em idade fértil
com atraso menstrual e quadro clínico sugestivo. Rotura de
miomas subserosos pode causar sintomatologia semelhante,
assim como a hemorragia de cistos ovarianos. A suspeita de
rotura de aneurisma da aorta abdominal deve ser levantada em
pacientes com frêmitos ou massas pulsáteis abdominais ou que já
se saibam portadores de aneurismas. Ainda que mais raramente,
lesões da artéria esplênica podem ocorrer, principalmente em
gestantes ou em pacientes com antecedente de pancreatite.
Outra causa de abdome agudo hemorrágico é a ruptura de
tumores hepáticos, principalmente o adenoma, que é um tumor
benigno mais comum em mulheres jovens e usuárias de
anticoncepcional.
10.2 DIAGNÓSTICO
A dor abdominal costuma ser súbita, porém de localização difusa.
Entre as alterações hemodinâmicas, a taquicardia é o sinal mais
precoce, seguida de queda da pressão arterial, palidez, sudorese
fria e agitação. É possível quantificar a perda volêmica por meio
de sinais clínicos. Sinais de hemorragia retroperitoneal — Cullen e
Grey Turner — podem estar presentes, à semelhança de quadros
de pancreatite aguda grave. O sinal de Kehr é um sinal de
ocorrência de dor aguda no ombro em razão da presença de
sangue ou outros irritantes na cavidade peritoneal homolateral,
quando uma pessoa está deitada e com as pernas elevadas. O
sinal de Kehr no ombro esquerdo é considerado um sinal clássico
de ruptura de baço.
A ocorrência de hematoma do músculo iliopsoas na vigência de
tratamento anticoagulante é rara. Sua apresentação é
usualmente unilateral, com sintomatologia relacionada à
compressão do plexo nervoso do membro inferior e com
diagnóstico diferencial abrangendo diversas áreas clínicas.

#importante
Na gravidez ectópica rota existe um sinal
clássico ao toque vaginal, que é a dor ao
tocar o fundo de saco posterior,
conhecido como grito de Douglas, ou
sinal de Proust.
Quadro 10.1 - Classificação do choque hemorrágico

Exames laboratoriais gerais servem para avaliação global, mas


são inespecíficos. A reposição volêmica não deve se basear nos
valores de hemoglobina e hematócrito na fase inicial do
atendimento.
Toda mulher com hipótese diagnóstica de abdome agudo
hemorrágico e em idade fértil admitida na Emergência deve ser
submetida à dosagem de beta-HCG e teste qualitativo. Esses
exames podem confirmar a suspeita de gravidez ectópica.
Entre os pacientes estáveis hemodinamicamente, os exames de
imagem podem colaborar para a confirmação diagnóstica. A
ultrassonografia abdominal pode diagnosticar as duas principais
causas de AAH. Na suspeita de aneurisma da aorta abdominal, a
tomografia computadorizada pode oferecer mais dados, como
altura do aneurisma e comprometimento das camadas da parede
arterial.
Figura 10.1 - Tomografia computadorizada que evidencia aneurisma da aorta
abdominal infrarrenal

Fonte: Erosão de corpo de vértebra lombar devido à aneurisma de aorta


abdominal, 1999.

Apesar de a dor abdominal fazer parte do quadro clínico, não são


os sinais de irritação peritoneal que chamam atenção ao
diagnóstico. Ao exame físico, os sinais de hipovolemia como
palidez, sudorese fria, agitação, taquicardia e hipotensão se
sobrepõem à descompressão brusca dolorosa, ou seja, os sinais
sistêmicos de hipovolemia chamam mais atenção do que a
palpação abdominal.

#importante
Nos pacientes instáveis
hemodinamicamente com suspeita de
abdome agudo hemorrágico, o lavado
peritoneal diagnóstico e o FAST são
exames adequados, assim como no
atendimento do trauma.

#importante
Na mulher, pela possibilidade de causas
gineco-obstétricas de trauma, a
culdocentese é um exame simples e fácil
de se realizar, em que a aspiração de
sangue não coagulável na seringa é sinal
de positividade para hemorragia.

10.3 TRATAMENTO
A primeira conduta no abdome agudo hemorrágico,
independentemente da etiologia, compreende a reposição
volêmica de acordo com a perda sanguínea estimada. Nenhum
exame complementar deve ser realizado em pacientes instáveis
hemodinamicamente.
Na gravidez ectópica, o tratamento é cirúrgico e pode variar de
anexectomia unilateral a histerectomia total, dependendo da
origem do sangramento. O sangramento de miomas subserosos
pode ser tratado da mesma maneira.
O tratamento dos aneurismas rotos pode ser feito por via
intravascular, desde que rapidamente disponível. Entre as opções
cirúrgicas, é possível a colocação de próteses ou derivações
vasculares, dependendo da altura do aneurisma.
Figura 10.2 - Colocação de próteses em aneurisma
Legenda: (A) aneurisma da aorta abdominal infrarrenal até bifurcação das ilíacas;
(B) aspecto tomográfico após a colocação de endoprótese.
Fonte: Tratamento endovascular dos aneurismas de aorta abdominal: experiência
inicial e resultados a curto e médio prazo, 2006.

Excluindo-se os
traumatismos
abdominais, o que mais
pode causar um
sangramento intra-
abdominal?
As principais causas são gravidez ectópica rota e rotura
de aneurisma da aorta abdominal. À semelhança dos
pacientes de trauma, a estabilização hemodinâmica e a
reposição volêmica são fundamentais em seu manejo.
Hospital Israelita Albert Einstein
O processo seletivo do HIAE é dividido em duas fases. Na
primeira, há uma prova teórica, enquanto na segunda, é realizada
a prova prática, a entrevista individual e a análise do currículo do
candidato por um profissional designado pela coordenação de
cada um dos programas.
Para a primeira etapa, estude o conteúdo para as especialidades
de Clínica Médica, Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia e
Obstetrícia e Medicina Preventiva e Social. Você deverá
responder 50 questões de múltipla escolha, com caráter mais
direto. Cada questão apresenta cinco opções de alternativas
cada, com apenas uma resposta correta.
Alguns dos temas mais recorrentes são: trauma abdominal e
torácico, atendimento inicial ao politraumatizado, Cirurgia
Vascular, doenças inflamatórias intestinais, doenças
cardiometabólicas, pneumologia, Neurologia, Psiquiatria,
principalmente intoxicações medicamentosas, distúrbios
hidroeletrolíticos, cefaleias, insuficiência cardíaca congestiva,
diabetes mellitus e hipertensão arterial sistêmica e taquiarritmia.
Também estude com atenção imunização, infecção das vias
aéreas superiores, síndromes gastrintestinais e desidratação na
infância, asma, reanimação neonatal, puericultura, distúrbios
acidobásicos, parto, anticoncepção, câncer de colo de útero,
prematuridade, assistência pré-natal, doenças benignas da
mama, Sistema Único de Saúde (SUS), análise de métodos
diagnósticos, vigilância epidemiológica e prevenção.
Já a prova prática terá três estações e estará baseada em casos
clínicos. Nas estações, o candidato poderá interagir com atores
atuando como pacientes, profissionais de saúde ou simuladores.
É importante destacar que você será cobrado pelas suas
habilidades de trabalhar em equipe e comunicar-se, sua ética e
empatia, além dos conteúdos teóricos.
HIAE | 2020
Um homem de 30 anos está internado na Unidade de Terapia
Intensiva por quadro de anemia, desnutrição e queda do estado
geral, secundário a adenocarcinoma gástrico com células em anel
de sinete, com metástase hepática. Há uma semana, seu KPS
(Karnofsky Performance Status) foi avaliado em 80%. Evolui com
hematêmese, sendo que a endoscopia mostra sangramento
difuso, em porejamento, da neoplasia. Conduta:
a) terapia com argônio, por endoscopia
b) instilação de adrenalina, por via endoscópica
c) suporte clínico apenas, sem nenhuma medida invasiva
d) gastrectomia de urgência, sem linfadenectomia
e) radioterapia hemostática
Gabarito: e
Comentários:
a) O paciente apresenta hemorragia por porejamento, compatível
com Forrest IB. A coagulação por plasma de argônio (CPA) é
empregada no tratamento desse tipo de lesão, nos pacientes com
câncer gástrico irressecável. A CPA atinge até cerca de 3 a 5 mm
de profundidade. Há, entretanto, fatores que possivelmente
limitam a CPA nesse paciente: o sangramento é difuso e sua
origem pode ser mais profunda na parede gástrica.
b) A hemorragia é difusa, por porejamento. A injeção de
adrenalina é mais eficiente na hemorragia localizada. Nesse
paciente, possivelmente seria pouco eficaz, pela área difusa da
hemorragia ou pela profundidade da fonte da hemorragia.
c) Apenas o suporte clínico não controlará a hemorragia, levando
provavelmente o paciente a óbito. O paciente é um adulto jovem.
Acresce-se que seu estado funcional ainda é bom: apesar do
estágio avançado da neoplasia, o doente é capaz de realizar
atividades normais com algum esforço, mas sem auxílio. Portanto,
medidas mais agressivas devem ser empreendidas para o
controle da hemorragia.
d) Os objetivos da gastrectomia de urgência, nesse paciente,
seriam: 1) Tratar a complicação — hemorragia digestiva alta; 2)
Salvar a vida do paciente. A indicação de gastrectomia de
urgência na presença de hemorragia, obstrução ou perfuração é
controversa. Sua mortalidade é elevada. Em pacientes com
menos de 70 anos e com um único sítio de metástase, é uma
possível opção. Levando em conta o contexto da questão, a
gastrectomia poderia ser indicada no insucesso de outras
modalidades menos agressivas de tratamento.
e) Nesse paciente, a radioterapia está indicada porque: 1) O
paciente é um adulto jovem. Acresce-se que seu estado funcional
ainda é bom: apesar do estágio avançado da neoplasia, o doente é
capaz de realizar atividades normais com algum esforço, mas sem
auxílio; 2) O câncer é avançado localmente e outras modalidades
terapêuticas não são efetivas para o controle da hemorragia.
Além da radioterapia hemostática, outra modalidade de
tratamento empregada na hemorragia digestiva por câncer
gástrico irressecável é a embolização arterial por cateter.

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