Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
I. RELATÓRIO
O nosso parecer centra-se numa figura jurídica que nos últimos dois anos tem
granjeado espaço no regime da prestação do trabalho, quer no sector público, quer no
sector privado, que é o Teletrabalho, sendo este uma forma de prestação do trabalho à
distância, ou seja, normalmente fora do domicílio profissional do empregador, com
recurso às tecnologias de informação e comunicação.
Principais legislações:
1
Entra em vigor a 14 de Março de 2022.
Página 1 de 13
PONTO PRÉVIO: inconstitucionalidade do Decreto Presidencial n.º 52/22, de 17 de
Fevereiro
Apesar de não ser o escopo do presente parecer, importa referir que é nosso
entendimento que deve ser suscitada a constitucionalidade do Decreto Presidencial n.º
52/22, de 17 de Fevereiro – sobre o Exercício da Actividade Laboral em Regime de
Teletrabalho, pelas razões que em síntese apresentamos:
Página 2 de 13
III. O TELETRABALHO – Conceito e enquadramento jurídico
i. Modalidades
O teletrabalho pode assumir uma das seguintes modalidades (i) teletrabalho
domiciliário; (ii) teletrabalho em escritório satélite; (iii) teletrabalho em centro de
trabalho comunitário e (iv) teletrabalho nómada.3
2
Organização Internacional do Trabalho, Teletrabalho durante e após a pandemia da COVID-19, Guia
Prático, disponibilizado em www. lisbon/documents/publication/wcms_771262.pdf, acedido em 02 de
Março de 2022
3
Vide artigo 4.º do Decreto Presidencial n.º 52/22, de 17 de Fevereiro – sobre o Exercício da Actividade
Laboral em Regime de Teletrabalho
Página 3 de 13
vários trabalhadores vinculados a diferentes entidades ou com aqueles que exercem a
actividade liberal ou independente.
O regime do teletrabalho pode ser constituído por iniciativa de qualquer uma das
partes na relação laboral, podendo este ser inicial – quando as partes constituem ab intio
(desde o início) a relação laboral em regime de teletrabalho ou superveniente – por
transformação de uma relação, digamos presencial, já existente, em regime de
teletrabalho. Sobre esta temática, importa referir que a lei não limita a possibilidade de
existir uma relação simultaneamente presencial e em regime de teletrabalho nalguns dias
ou meses da prestação da actividade laboral, ao qual maior parte da doutrina denomina
por contrato em regime de teletrabalho parcial.
Página 4 de 13
Nestes casos, o empregador não pode opor-se ao pedido do trabalhador, desde que
a tarefa a exercer seja compatível com a realização do trabalho à distância e a empresa
disponha de meios para o efeito4.
Página 5 de 13
sendo, porém, possível utilizar os meios próprios do trabalhador, caso este consinta se e
não for possível a disponibilização por parte do empregador, ficando este último com o
dever de reembolso de todas as despesas que, comprovadamente, o trabalhador vier a
suportar para a realização do trabalho.5
5
Cfr. Artigos 8.º e 9.º do RJTL.
6
Cfr. Artigo 10.º do RJTL.
Página 6 de 13
É visível que o teletrabalho pode ocasionar uma dilatação das horas de trabalho,
bem como trabalhos em períodos noturnos ou mesmo aos fins de semana, isto porque
torna-se mais difícil haver um marco entre o tempo para o desempenho das actividades
domésticas e de lazer e o exercício da actividade.
7
JM ADVOGADO, Boletim Informativo 1 - IMPLEMENTAÇÃO DO REGIME JURÍDICO DO TELETRABALHO,
disponível em https://www.jmadvogado.com/post/boletim-informativo-1 regime-jur%C3%ADdico-do-
teletrabalho-uma-mudan%C3%A7a-na-realidade-laboral-angolana, acedido em 02 de Março de 2022, pelas
13h08m.
Página 7 de 13
disponível na rede local de computadores (intranet), poderá não ser suficiente para o cabal
controlo da prestação da actividade laboral.
Destarte, dentre outros mecanismos que se possam lançar mão a fim de melhorar o
controlo da prestação do trabalho, entendemos que a avaliação de desempenho logrará
melhores êxitos, salvo melhor opinião. Por outro lado, a relação de trabalho é
essencialmente constituída com base na lealdade e confiança, sendo estes os elementos
que deverão nortear a relação laboral neste regime em que o controlo da actividade
afigura-se mais diminuta.
8
Vide n.º 1 do artigo 155.º da Lei n.º 7/15, de 15 de Junho – Lei Geral do Trabalho – LGT.
9
Pese embora, deixamos uma crítica ao legislador por confundir o termo remuneração e salário, sendo que
comungamos com o entendimento da Equipe Guia Trabalhista, quando estabelece a diferença entre
remuneração e salário, entendendo assim que Salário é a contraprestação devida ao empregado pela
prestação de serviços, em decorrência do contrato de trabalho.
Já a remuneração é a soma do salário contratualmente estipulado (mensal, por hora, por tarefa etc.) com
outras vantagens percebidas na vigência do contrato de trabalho como horas extras, adicional noturno,
adicional de periculosidade, insalubridade, comissões, percentagens, gratificações, diárias para viagem
Página 8 de 13
empregador ao trabalhador, quando destinadas ao reembolso ou compensação de despesas
por este realizadas em relação com a prestação de trabalho, tais como ajudas de custo
abonos de viagens e de instalações, fornecimento obrigatório de alojamento e outras de
idêntica natureza.
i. Remuneração do teletrabalho
Ora, após a nota deixada supra importa referir que quanto a remuneração do
teletrabalhador, este goza dos mesmos direitos e deveres que goza um trabalhador em
regime presencial, isto por tudo quanto já se disse e pelo entendimento que teletrabalho
não é menos trabalho em relação ao regime presencial, isto é, quer num como noutro
regime, o trabalhador presta o seu labor em favor do empregador. Por esta razão deve
beneficiar do mesmo direito à remuneração sem qualquer limitação, desconto ou outra
dedução que se fundamenta no facto de este não estar a exercer a sua actividade
laboral no domicílio do empregador.
entre outras. Vide Equipe Guia Trabalhista em “QUAL É A DIFERENÇA ENTRE SALÁRIO E REMUNERAÇÃO?”,
disponibilizado em http://www.guiatrabalhista.com.br/tematicas/diferenca-salario-remuneracao.htm,
acedido aos 03 de Março de 2022, pelas 01h41 minutos.
Página 9 de 13
medida em que, mesmo em regime à distância, este efectivamente prestou a sua
actividade.
Uma posição mais complexa deve adoptada no que diz respeito ao subsídio de
transporte e, antes de responder à problemática, torna-se imprescindível entender que o
subsídio de transporte “é uma compensação da empresa por custos incorridos com
deslocações dos seus colaboradores”12.
10
CATARINO, Diana. Componentes do salário: conheça as mais comuns, disponibilizado em
https:Componentes do salário: conheça as mais comuns (doutorfinancas.pt), agosto de 2021, acedido em 03
de Março de 2022, pelas 02h4 minutos.
11
Na linguagem usada para designar subsídio de alimentação.
12
VIEIRA, Paula. Subsídio de transporte, disponibilizado em https://www.economias.pt/subsidio-de-
transporte/, acedido aos 2 de Março de 2022, pelas 13h46.
13
Idem.
Página 10 de 13
Mesmo apenas concordando em parte, vale referenciar as palavras de SANTOS,
Edgar (2021:3)14, quando diz que “o subsídio de transporte tem natureza de benefício
social e se destina a compensar os trabalhadores pelas despesas suportadas em razão da
deslocação da sua residência ao domicílio do empregador, sendo certo que o
teletrabalhador não se desloca, não é consentânea a exigência do seu pagamento”.
Pois bem, referimos que concordamos em parte, pelo facto de, na sua abordagem
não se ater a todas as modalidades de teletrabalho, ao que parece, fez apenas uma análise
genérica e por isso inaplicável para toda e qualquer modalidade deste regime, senão,
vejamos, na página 2 do presente documento apresentamos quatro modalidade de
teletrabalho e dentre eles, salvo entendimento contrário, o único que nos parece fazer
sentido não beneficiar do subsídio de transporte é o teletrabalho domiciliário, pois, este é
exercido no próprio domicílio do trabalhador, não implicando qualquer deslocação do
mesmo e assim não justificar a compensação por deslocações.
Por fim, entende-se que tal posicionamento em nada fere com o disposto no artigo
12 do RJTL, quando faz alusão ao direito de igualdade de tratamento, estabelecendo que
o teletrabalhador tem os mesmos direitos dos demais trabalhadores, nos termos da
legislação vigente, incluindo a protecção contra acidentes de trabalho, doenças
profissionais e garantia de subsídios. E não fere porque o princípio da igualdade material,
comummente denominado por princípio da isonomia apresenta a ideia do tratamento
igual a todos que são iguais e desigual a todos que são desiguais, na medida da sua
desigualdade.
Ora, trata-se aqui de uma discriminação positiva, que tem como finalidade
seleccionar pessoas que estejam em situação de desvantagem tratando-as desigualmente e
14
SANTOS, Edgar. O Subsídio de Transporte nos contratos de teletrabalhos em Angola, 2021, Lunada,
Apreciação Técno-jurídica, disponibilizada pelo autor, via WhatsApp, aos 28 de Fevereiro de 2022.
Página 11 de 13
favorecendo-as com alguma medida que as tornem menos desiguais. tem como objectivo
tornar a sociedade mais igualitária diminuindo os desequilíbrios que existem em certos
grupos sociais e favorece melhor a justiça como fim último do direito.
Página 12 de 13
VII. CONCLUSÕES
Após o trabalho de pesquisa e estudo legislativo que culminou com este parecer,
podemos concluir que o teletrabalho é uma modalidade nova de prestação da actividade
laboral, pelo menos, no ordenamento jurídico e tem vindo a ganhar espaço desde a
necessidade de cumprir com o distanciamento social imposta pela pandemia da COVID-
19.
Por fim, concluímos ainda que, quanto aos subsídios de alimentação e transporte,
o primeiro é exigido na mesma proporção que um trabalhador “presencial” e, no que diz
respeito ao subsídio de transporte, entendemos não ser consentâneo exigir o mesmo
quando se exerça o teletrabalho na modalidade domiciliária, sem desprimor de disposição
em contrário pelas partes no contrato.
Com data vênia e sempre aberto a pensamentos contrários, este é o nosso mais
singelo e humilde parecer.
Feito por,
Jurista e Advogado.
Referência: SANTOS, Gomes Mateus dos. Parecer sobre o regime jurídico do teletrabalho,
2022, Luanda/Angola.
Página 13 de 13