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FACULDADE LUSÓFONA DE SÃO PAULO

CURSO DE DIREITO

VANESSA SCONCERTI

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS GENITORES


-
Alimentos, convívio, abandono afetivo e alienação parental.
Cotia/SP
2022

SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
1. PODER FAMILIAR – CONCEITO

O Poder Familiar nasce do pressuposto de que ter filhos importa em assumir


responsabilidades e que todo ser humano necessita de cuidados e de proteção
integral a partir de seu nascimento é que surge o instituto do Poder Familiar.
Constituída a família e nascidos os filhos, não basta somente alimentá-los, é
necessário educa-los e prestar todo auxílio necessário para que não cresçam às leis
da natureza, como animais.
Neste sentido, os pais são os principais responsáveis por educar e preparar a
criança para a vida, transmitir a eles seus valores e exemplos de vida, uma vez que os
filhos tendem a reproduzir as atitudes que lhes são ensinadas.
É verdade que, diante de tamanha responsabilidade, são necessários meios
proporcionais para que elas possam ser cumpridas e o instituto familiar se amolda à
medida que os pais no exercício de seus deverem, assistam seus filhos buscando a
proteção integral deles.
Fabio Ulhoa Coelho (2013, p. 203) disserta:
“O Poder Familiar é entendido como simples instrumento
para a realização dos objetivos de preparação dos filhos
para a vida; objetivos que a sociedade reserva aos pais e
espera que sejam atendidos, na formação de seus
membros.”

Carlos Roberto Gonçalves (2013, p. 415) entende que:


“Poder familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos
aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos filhos
menores.”
Compreende Roberto Senise (2012, p. 237) que o poder familiar é caracterizado
por sua dualidade “(...) é ao mesmo tempo uma autorização e um dever legal para que
uma pessoa exerça as atividades de administração dos bens e de asseguramento do
desenvolvimento dos direitos biopsíquicos do filho incapaz, pouco importando a
origem da filiação.”
A doutrina destaca que o poder familiar não se consubstancia no direito dos pais
sobre os filhos, mas na concretização dos direitos dos filhos. Ou seja, não se deve
pensar no instituto como um exercício das faculdades de maneira autônoma e
arbitrária, mas, em verdade, um exercício quase altruísta que levará sempre em
consideração o melhor interesse do menor, seja ele criança ou adolescente.
Não obstante, é preciso entender que os interesses devem caminhar alinhados
com o que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei n° 8.069/90). O
art. 20, da referida lei, determina que:
Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento,
ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações,
proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à
filiação.

O art. 1.630, do Código Civil, ainda afirma que os filhos estão sujeitos ao poder
familiar enquanto durar a menoridade, passado o período já não estão mais sob este
poder, restando demonstrada a importância da atuação dos pais no período de
formação de seus filhos. Não obstante, o poder familiar deve ser entendido como um
conjunto de direitos e deveres dinâmicos, e não estático, ou seja, podem se amoldar
com o objetivo de melhor atender a situação fática de cada família – genitores e filhos.

1.2. CARACTERIZAÇÃO DO PODER FAMILIAR


Considerando que o poder familiar é um instituto do direito de família, é inerente
a tal que se ponha com características próprias e bem determinadas. Tais atributos
são instituídos por lei, jurisprudência e até pela doutrina, com a intenção de limitar o
exercício do poder familiar para aqueles que o detém. A doutrina entende que o poder
familiar é inalienável, irrenunciável, indelegável, imprescritível, temporário e
incompatível com a tutela.
Outra característica que tem tomado forma atualmente, e se tornou um grande
norteador do poder familiar, com o advento da paternidade socioafetiva é a
afetividade, que pode ser incluída como característica do poder familiar, como leciona
Paulo Lôbo (2011, p. 72):
“A família, tendo desaparecido suas funções tradicionais, no
mundo do ter liberal burguês, reencontrou-se no
fundamento da afetividade, na comunhão de afeto, pouco
importando o modelo que adote, inclusive o que se constitui
entre um pai ou mãe e seus filhos. A afetividade, cuidada
inicialmente pelos cientistas sociais, pelos educadores,
pelos psicólogos, como objeto de suas ciências, entrou nas
cogitações dos juristas, que buscam explicar as relações
familiares contemporâneas. Não somente do casamento,
mas de todas as entidades familiares e das relações de
filiação.”

Assim, entende-se que a afetividade se tornou o norte do poder familiar, à


medida que os laços de afeto nascem por meio do convívio harmonioso, e não pelo
que decreta a lei. Desta forma, passou o afeto a despertar interesse da ciência
jurídica.

1.3. O PODER FAMILIAR NA ATUALIDADE E SEU EXERCÍCIO


Consoante a evolução do instituto do poder familiar, o filho que era objeto de
direito, tornou-se sujeito de direitos. Essa inversão propiciou a transformação do
conteúdo do poder familiar, em face do interesse social que o envolve.
Nesse sentido, o poder familiar é um encargo imposto por lei aos pais, mas que
serve aos interesses dos filhos. Faz-se oportuno salientar, que este encargo, diz
respeito à intervenção na vida e nos bens dos filhos e ao dever dos pais para com a
sua prole, até que estes alcancem a maioridade civil, ou sejam antecipados, e possam
garantir por si só o atendimento às suas necessidades.
Do mesmo modo destaca Orlando Gomes (1998, p. 389):
“Assim, o poder familiar, sendo menos poder e mais dever,
converteu-se em múnus, concebido como encargo
legalmente atribuído a alguém, em virtude de certas
circunstâncias, a que se não pode fugir. O poder familiar
dos pais é ônus que a sociedade organizada a eles atribui,
em virtude da circunstância da parentalidade, no interesse
dos filhos.”

Ainda, é necessário diferenciar os conceitos de titularidade e exercício do poder


familiar para melhor entendimento da matéria. A titularidade do poder familiar é a
prerrogativa em si, conjunto de deveres intrínsecos aos pais em relação aos seus
filhos. O exercício é a realização da titularidade, que se manifesta em aspecto ativo e
prático. Exercer o poder familiar é participar de forma ativa na vida dos filhos menores,
desenvolvendo as funções conferidas por lei ao titular desse direito.
Aduz Lôbo (2011, p. 302):
“Os pais não exercem poderes e competências privados,
mas direitos vinculados a deveres e cumprem deveres cujos
titulares são os filhos. Enquanto estreitamente
funcionalizado ao interesse do menor e à formação de sua
personalidade, o exercício do poder familiar evolui no curso
da formação da personalidade. À medida que o menor
desenvolve sua própria capacidade de escolha, o poder
familiar reduz-se proporcionalmente, findado quando atinge
seu limite temporal.”

Os direitos e deveres a serem exercidos pelo poder familiar estão elencados no


art. 1.634, do Código Civil, quanto a pessoa de seus filhos menores.
Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a
sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar,
que consiste em, quanto aos filhos:
I – dirigir-lhes a criação e a educação;
II – exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos
do art. 1.584;
III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para
casarem;
IV – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para
viajarem ao exterior;
V – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para
mudarem sua residência permanente para outro Município;
VI – nomear-lhes tutor por testamento ou documento
autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou por
sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
VII – representa-los judicial e extrajudicialmente até os 16
(dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após
essa idade, nos atos em eu forem partes, suprindo-lhes o
consentimento;
VIII – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
IX – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os
serviços próprios de sua idade e condição.

Em uma breve leitura do Código Civil, é possível identificar que o ordenamento


não se preocupou em ressaltar o já determinado pela Constituição federal, em seu art.
227, e seguintes, como o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência
familiar, além dos deveres de assistir, criar e educar os filhos menores.
2. NOÇÕES SOBRE O INSTITUTO DOS ALIMENTOS NO DIREITO
BRASILEIRO

2.1. DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR

Segundo Dias (2005, p. 448):

“A princípio, o conceito de alimentos tem uma diversidade


de definições, sendo que nasce em primeiro plano, da
obrigação estatal em prestar assistência a todos os
cidadãos, tendo como objetivo preservar a dignidade da
pessoa humana.”
E sobre a instituição família leciona Madaleno (2013, online):
“Estende-se como sendo a base para uma sociedade
harmônica, e merece especial proteção estatal, a obrigação
alimentar deriva da responsabilidade moral e humanitária
dos membros da entidade familiar, fixando sua base no
vínculo de parentesco ou no laço estável de afeto.”
A Constituição Federal de 1988, também determina ser a família a base da
sociedade, com absoluta e especial proteção do Estado, nos termos do art. 226, do
Título VIII, Capítulo VII, que trata da família, da criança, do adolescente, do jovem e do
idoso, e dá a igualdade na relação conjugal entre homem e mulher em direitos e
deveres, conforme aduz o §5°:
“Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são
exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.”
Em análise ao art. 227, da Constituição Federal, temos claramente a descrição
do conceito de alimentos, que traz perfeição sobre o que se quer dizer com o termo
jurídico, conforme descrito:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação,
á educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e
comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão.

No mesmo interim, os arts. 1.694 e 1.920, do Código Civil, abrangem mais


algumas noções do que possam ser os alimentos, como além do sustento alimentar –
com comida e bebida, assistência médica, instrução, educação, manutenção do
padrão de vida, vestuário e habitação.
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou
companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que
necessitem para viver de modo compatível com a sua
condição social, inclusive para atender às necessidades de
sua educação.”
“Art. 1.920. O legado de alimentos abrange o sustento, a
cura, o vestuário e a casa, enquanto o legatário viver, além
da educação, se ele for menor.

Portanto, além de serem prestados alimentos somente ligados a comida, o termo


é muito mais abrangente e compreende as demais esferas para a manutenção e
desenvolvimento do outro, envolvendo diversos aspectos e assuntos ligados ao bem
estar e a uma vida digna. É de suma importância mencionar os dizeres de Venosa
(2008, p. 348):
“Que a obrigação nasce para auxílio daquele que não tem
condição de manter a própria subsistência e está em
momento de necessidade, devendo a sociedade prestar-lhe
amparo.”
Assim, o direito é de característica personalíssima e irrenunciável. Os alimentos
prestados mais comumente são aqueles pelos genitores aos seus filhos, mas a
legislação vigente não impede que sejam prestados alimentos entre os cônjuges após
a separação.
A Lei n° 6.515/77, popularmente conhecida como Lei do Divórcio, determinava
que, com o fim do casamento, seriam extintos os deveres de coabitação e fidelidade, e
que o dever material poderia ser preservado ou não durante a separação, podendo
esse ser extinto com o divórcio, art. 26, art. 5°, §§1° e 2°, e art. 50, da Lei
supramencionadas, a seguir transcritos:
Art. 26. No caso de divórcio resultante da separação
prevista nos §§1° e 2° do art. 5°, o cônjuge que teve a
iniciativa da separação continuará com o dever de
assistência ao outro”. (Código Civil – art. 231, n° III)

Artigo 5°. A separação judicial pode ser pedida por um só


dos cônjuges quando imputar ao outro, conduta desonrosa
ou qualquer ato que importe em grave violação dos deveres
do casamento e tornem insuportável a vida em comum.
§1°. A separação judicial pode, também, ser pedida se um
dos cônjuges provar a ruptura da vida em comum há mais
de um ano consecutivo, e a impossibilidade de sua
reconstituição.
§2°. O cônjuge pode ainda pedir a separação judicial
quando o outro estiver acometido de grave doença mental,
manifestada após o casamento, que torne impossível a
continuação da vida em comum, desde que, após uma
duração de 5 (cinco) anos, a enfermidade tenha sido
reconhecida de cura improvável.

Artigo 50. São introduzidas do Código Civil as alterações


seguintes:

Art. 12. (...)


I – os nascimentos, casamentos, separações judiciais,
divórcios ou óbitos.

Art. 180. (...)


V – certidão de óbito do cônjuge falecido, da anulação do
casamento anterior ou do registro de sentença de divórcio”.

Art. 186 – Discordando eles entre si, prevalecerá a vontade


paterna, ou, sendo o casal separado, divorciado ou tiver
sido o seu casamento anulado, a vontade do cônjuge, com
quem estiverem os filhos.

Art.195. (...)
VII – o regime do casamento, com a declaração data e do
cartório em cujas notas foi passada a escritura antenupcial,
quando o regime não for o de comunhão parcial, ou o legal
estabelecido no Título III, deste libro, para outros
casamentos.”

Art 240 – A mulher, com o casamento, assume a condição


de companheira, consorte e colaboradora do marido nos
encargos da família, cumprindo-lhe velar pela direção
material e moral desta.
Parágrafo único – A mulher poderá acrescer ao seus os
apelidos do marido.

Art. 248. (...)


VIII – propor a separação judicial e o divórcio.
Art. 258 – Não havendo convenção, ou sendo nula,
vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime de
comunhão parcial.

Art. 267.
III = pela separação judicial;
IV – pelo divórcio.

Art. 1.611 – A falta de descendentes ou ascendentes será


deferida a sucessão ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo
da morte do outro, não estava dissolvida a sociedade
conjugal.”
Neste sentido, a lei em questão desceve que o pagamento dos alimentos seria
obrigado ao cônjuge considerado culpado pela dissolução da relação, conforme previa
o art. 19, da Lei 6.515/77, o juiz fixaria o recebimento dos alimentos ao cônjuge
“inocente” que deles carecesse.
Assim sendo, o juiz, com base nos fatos decidiria quem mereceria a assistência
pleiteada, o que ao presente momento, mesmo não sendo revogada a lei do divórcio,
com advento do Código Civil de 2002, mediante o artigo. 1.704, caput, que prevê a
necessidade como um dos principais requisitos para pleitear alimentos, independente
do que ou quem contribuiu para o fim da relação, que traz em sua redação:
Art. 1.704. Se um dos cônjuges separados judicialmente
vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a
prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não
tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial.
Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a
necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições
de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge
será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor
indispensável à sobrevivência.
Sendo a preferência dada ao auxílio material com base no dever de mútua
assistência entre cônjuges, a lei presta assistência a quem tem real necessidade a
prestação alimentar, sendo tal dever previsto no art. 1.566, III, do Código Civil de
2002:
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
(...)
III – mútua assistência;
2.2. FUNDAMENTOS, NATUREZA JURÍDICA E PRESSUPOSTOS DOS
ALIMENTOS
Gagliano e Pamplona Filho (2012, p. 684) dissertam:
“O primeiro fundamento da obrigação de alimentos está em
dois princípios, no princípio da solidariedade familiar e em
especial no princípio da dignidade da pessoa humana, que
o último é considerado o principal vetor do ordenamento
civil constitucional.”

Neste sentido, entende Lôbo (2011, p. 364):


“Na lógica da Constituição, a obrigação alimentar se baseia
no princípio da solidariedade (art. 3°, I), que se sobrepõe a
organização da sociedade brasileira. A família é base da
sociedade (art. 226), que estabelece efeitos jurídicos, em
específico aos alimentos, vinculando-os no direito/dever de
solidariedade.”
Ainda, Fachin (2005, p. 34), dispõe:
“A obrigação dos alimentos está firmada, nos princípios da
solidariedade familiar e dignidade da pessoa humana,
instituindo uma prestação que advêm do vínculo parental,
sendo este analisado sob uma visão ampla do conceito de
família, para inclusão dos cônjuges e companheiros.”

Não obstante, leciona Dias (2005, p. 449):


“A lei converteu em dever jurídico a solidariedade familiar,
ao propor, as pessoas que mantêm vínculos afetivos
decorrentes de vínculos familiares, a obrigação de garantir a
subsistência dos demais parentes.”

A prestação alimentícia se inicia com a relação de parentesco, assim sendo é


devida entre parentes em linha reta – ascendentes e descendentes, e também
colaterais até 2° grau – irmãos e irmãs, onde todos esses podem exigir alimentos uns
dos outros se estiverem em situação de necessidade, onde não possam garantir por si
só sua subsistência.
Obrigação que decorre do princípio da solidariedade, unindo e vinculando a todos
os membros de um grupo familiar, em igualdade e reciprocidade devendo ser pautada
sempre no binômio necessidade, possibilidade e proporcionalidade.
Seguindo a lógica do binômio, Farias e Rosenvald pautam seu entendimento
(2012, p. 758):
“Que a obrigação dos alimentos está fundamentada em
uma perspectiva de solidariedade da sociedade e da
família, onde a principal finalidade é promover o
imprescindível princípio da dignidade da pessoa humana
firmado na atual norma jurídica, tudo em acordo com os
termos da Constituição Federal.”

Já à natureza jurídica dos alimentos, de acordo com Dias (2005, p. 447):


“Está associada a origem da obrigação. Dessa forma,
enquanto que a obrigação dos pais de sustento dos filhos
decorre do poder familiar – ou pátrio poder, tendo a
Constituição Federal de 1988 estabelecido essa obrigação.
O dever de pagar alimentos aos parentes decorre da
solidariedade familiar e os alimentos relacionados aos
cônjuges está baseado na obrigação de mútua assistência e
perdura mesmo após o fim da vida em comum.”

Quanto aos pressupostos, são regulados pelo art. 1.695, do Código Civil, onde
são observados, a existência de vínculo de parentesco, seja ele ascendente,
descendente ou colateral até 2° grau, necessidade do reclamante, que é a falta de
recurso próprio que possibilite adquirir o seu sustento por seu próprio esforço, tendo
culpa em sua redução ao estado de necessidade, serão devidos apenas os alimentos
naturais, que são aqueles necessários à subsistência, possibilidade do obrigado e
proporcionalidade. Assim dispõe o artigo:
Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem as
pretende não possui bens suficientes, nem pode prover,
pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, pode
fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.

Mesmo existindo a possibilidade dos alimentos entre ex-cônjuges, faz-se


necessária uma observação quanto à possibilidade, do alimentante prestar o auxílio
sem que o recurso prejudique sua própria sobrevivência. Porque se este tem somente
o necessário para a própria subsistência, não seria certo obrigar-lhe a retirada de parte
deste, com intuito de ajudar um parente que necessite, conforme destaca Monteiro
(2004, p. 368), que “não há que se falar em direito alimentar, contra aquele que tem,
somente o básico para a própria subsistência”.
Sendo levado em consideração um terceiro fator, a proporcionalidade, conforme
o art. 1.694, §1°, do Código Civil:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou
companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que
necessitem para viver de modo compatível com a sua
condição social, inclusive para atender às necessidades de
sua educação.
§1°. Os alimentos devem ser fixados na proporção das
necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa
obrigada.

Utiliza-se, de forma habitual na prestação alimentar, o pagamento na proporção


de 1/3, do vencimento líquido do alimentante, como determinação judicial, porém,
nada impede que o juiz fixe pagamentos acima ou abaixo desta fração, desde que,
para a sua aplicação, considere o binômio necessidade-possibilidade e
proporcionalidade.

2.3. CARACTERÍSTICAS, ESPÉCIES E SUJEITOS DA OBRIGAÇÃO


ALIMENTAR
Quanto as suas características os alimentos podem ser classificados da seguinte
maneira: “direito personalíssimo e intransferível, inexistindo a possibilidade de
transferi-los ou cedê-los a alguém, haja vista se tratar de um direito adquirido para a
preservação da própria vida”.
De acordo com o art. 1.707, do Código Civil, são irrenunciáveis pois quem
necessita pode não exercer o direito de receber os alimentos, mas não é possível que
este renuncie ao direito, ou seja, “sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão,
compensação ou penhora.” No entanto, podem ser renunciados os valores de
alimentos já vencidos e não pagos.
Sendo Lôbo, (2011, p. 376):
“sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão,
compensação ou penhora. No entanto, podem ser
renunciados os valores de alimentos já vencidos e não
pagos.”

Lôbo (2011, p. 376), aduz que:


“Os alimentos também não poder ser irrestituiveis, por sua
própria natureza, são irrepetíveis, dessa forma não podem
ser restituídos esse entendimento prevalece
majoritariamente entre a doutrina e a jurisprudência.
Havendo exceção nos casos em que ocorre o erro sobre a
pessoa, isto posto ao necessitado será garantido o direito à
restituição.”

Conforme o art. 373, II, do Código Civil, “os alimentos também são
incompensáveis”, porque o principal objetivo dos alimentos é prover as necessidades
do alimentado, da mesma forma, são impenhoráveis pelo fator sobrevivência do
necessitado, não cabendo a penhora dos alimentos, mas a regra não se estende aos
frutos dos alimentos, podendo estes, por sua vez, serem penhorados.
O caráter personalíssimo do direito de alimentos afasta a possibilidade de
transação desse direito, sendo assim intransferível. Entretanto, quando houverem
alimentos já devidos pode ocorrer a transação, pois já se trata de direito disponível.
Os alimentos são imprescritíveis, apesar de sua pretensão prescrever em 2 anos,
conforme o art. 206, §2°, do Código Civil:
Art. 206. Prescreve:
(...)
§2°. Em dois anos, a pretensão para haver prestações
alimentares, a partir da data em que se venceram.
Segundo a imprescritibilidade a pessoa pode solicitar os alimentos em qualquer
tempo, assim sendo o direito nasce da necessidade do alimentado em determinada
situação.
Já a variabilidade de firma no questionamento que a prestação pode variar de
acordo com a situação econômica em que se encontra tanto do alimentado quanto do
alimentante.
Segundo a periodicidade afim de prover a subsistência do alimentado, ou
alimentos devem ser pagos com frequência e periodicidade, não cabendo ser
realizado um único pagamento, vez que um novo recebimento seria em um período de
tempo mais longo, e sendo considerado o fato do alimentado não saber administrar o
valor recebido.
Na divisibilidade a responsabilidade de alimentar pode ser distribuída entre vários
membros da família, assim todos que quiserem podem contribuir de acordo com as
suas possibilidades.
Sobre as espécies de alimentos, tem-se que: podem ser classificados quanto a
sua natureza, civis e naturais, onde os naturais referem-se apenas ao mínimo vital –
que é alimentação, tratamento de saúde, vestuário e habitação.
Já os alimentos civis são aqueles que abrangem necessidades para além da
simples sobrevivência, como o direito a dignidade, englobando a educação, lazer,
qualidade de vida, respeito a integridade moral e intelectual do alimentado.
Com relação à causa jurídica dos alimentos, disserta Buzzi (2003, p. 39):
“Que a obrigação alimentar pode nascer diretamente da lei,
por vontade da pessoa, ou pela prática de algum delito”.

Razão pela qual entendem existir três causas jurídicas, sendo elas: as causas
legais, decorrentes da obrigação prevista em lei; os alimentos voluntários que se dão
por vontade própria do alimentante; e indenizatório.
As causas legais são obrigações previstas no art. 229, da Constituição Federal e
1.694, do Código Civil:
Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os
filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e
amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.”
“Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou
companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que
necessitem para viver de modo compatível com a sua
condição social, inclusive para atender às necessidades de
sua educação.
§1°. Os alimentos devem ser fixados na proporção das
necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa
obrigada.
§2°. Os alimentos serão apenas indispensáveis à
subsistência, quando a situação de necessidade resultar de
culpa de quem os pleiteia.
Os alimentos voluntários são aqueles que ocorrem por declaração de vontade do
alimentante, que pode ser por meio de um contrato entre vivos, em que uma pessoa
assume a obrigação de pagar alimentos a outra, ou causa mortis, onde a pessoa
determina em testamento que pagará alimentos a um sobrevivente, podendo ainda ser
indenizatórios, quando são decorrentes da prática de ato ilícito do alimentante.
Descreve Venosa (2008, p. 353), sobre a prestação de alimentos futuros e
pretéritos, que: “os alimentos futuros são pagos a partir da propositura da ação judicial,
sendo que os pretéritos são os anteriores a demanda, os quais não podem ser
cobrados, haja vista a característica irretroativa dos alimentos.”
Sobre a matéria, ainda complementa Cahali (2002, p. 28): “a distinção tem
relevância na determinação do termo a quo a partir do qual os alimentos se tornam
exigíveis.”
Quanto aos sujeitos da obrigação, alimentar pode derivar do poder familiar que é
a obrigação descrita pelo art. 229, da Constituição Federal, obrigação destinada ao
desenvolvimento e subsistência do filho.
A obrigação de alimentar parente com base no princípio da solidariedade,
descrita nos arts. 1.694 e 1.697, do Código Civil, devendo a necessidade de receber
alimentos ser comprovada, podendo o devedor pagar quantia que não seja prejudicial
à sua própria subsistência.
E, por fim, a obrigação entre os cônjuges, que tem origem na mútua assistência,
conforme destaca o art. 1.566, III, do Código Civil, onde são observadas as condições
necessárias para a manutenção do próprio sustento.

3. REPERSONALIZAÇÃO DO DIREITO DAS FAMÍLIAS


Ao longo dos anos, a estrutura familiar foi sofrendo alterações, confrontada
frequentemente conforme a realidade fática se altera, o formato inicial de família foi se
tornando cada vez mais subjetivo e o paradigma anteriormente criado, e até então
irredutível, foi se tornando inadequado.
O conceito de família, criado pelo direito romano e alterado pelo cristianismo está
passando por novas alterações. Com o advento da Lei n° 4.121/62 – Estatuto da
Mulher Casada, o pátrio poder passou a não ser mais aplicado, posto que, com a
alteração da Constituição Federal, os cônjuges teriam igual direito e dever, podendo
exercer o pátrio poder de maneira igualitária, não recaindo mais somente sobre o
homem.
A organização da família acompanhou a evolução da sociedade, sendo esta um
dos principais fatores determinantes de várias mudanças e do aparecimento de
diversos modelos de família. Gustavo Tepedino (2001, p. 352) aduz:
“(...) altera-se o conceito de unidade familiar, antes
delineado como aglutinação formal de pais e filhos legítimos
baseada no casamento, para um conceito flexível e
instrumental, que tem em mira o liame substancial de, pelo
menos, um dos genitores com seus filhos – tendo por
origem não apenas o casamento – e inteiramente voltado
para a realização espiritual e o desenvolvimento da
personalidade de seus membros.”

Segundo Silvana Maria Carbonera (1998, p. 273):


“(...) a valorização do afeto e das pessoas trouxe uma
moderna concepção jurídica de família, gradativamente
construída, deslocou-se do aspecto desigual, formal e
patrimonial para o aspecto pessoal igualitário.”

Nos tempos atuais, a família já não se estabelece apenas pelo casamento,


podendo ser reconhecida por diversas outras formas, como por meio de união estável,
seja ela formal ou informal, e encontra proteção no art. 226, §3°, da Constituição
Federal.
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial
proteção do Estado:
(...)
§3°. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a
união estável entre homem e a mulher como entidade
familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento.

Sendo assim, após diversos anos, a família passou a ser aceita pelo direito com
diversas inovações e relações pautadas em afeto, amor, diálogo e igualdade.

4. A RESPONSABILIDADE DOS PAIS NOS MOLDES DA AFETIVIDADE E A


SUA RELAÇÃO COM O ABANDONO AFETIVO
Sabe-se que o desenvolvimento da personalidade das crianças e dos
adolescentes é um dever compartilhado solidariamente entre os pais e o Estado, ou
seja, todos tem a obrigação de assistir, assegurar e ensinar aquele jovem, com a
finalidade de garantir seus direitos fundamentais inerentes aos filhos enquanto sujeitos
ativos na sociedade.
A parentalidade, seja programada, acidental, adotiva ou por meio de reproduções
e fertilizações assistidas, criam o mesmo laço e relação de parentesco e com ela
nascem os direitos e deveres, atribuídos a descendentes e ascendentes do menor.
Junto com a consanguinidade, a socio afetividade também constitui vínculo familiar,
ainda que muitos entendam que a genética carregue um peso maior. Neste contexto,
explana Ana Carolina Brochado Rodrigues (2010, p. 194):
“(...) condutas necessárias para criar e educar filhos
menores, com o escopo de edificar sua personalidade,
independentemente de vínculos consanguíneos que geram
tal obrigação legal. Portanto, nesse novo vínculo de
parentesco, não é a paternidade ou maternidade que
ocasiona a titularidade da autoridade parental e o dever de
exercê-la em prol dos filhos menores. É o próprio exercício
da autoridade parental externado sob roupagem de
condutas objetivas como criar, educar e assistir a prole, que
acaba por gerar o vínculo jurídico da parentalidade.”

Nesse liame, a jurisprudência brasileira entende que a importância dos pais vai
além do dever de pagar alimentos, mas abrange também o suporte educacional e
psicológico. Assim entende Nancy Andrigh, em sede de Recurso Especial n°
1159242/SP, ainda que o entendimento verse sobre a não necessidade de amar o
filho e sim sobre a necessidade de prestar orientações baseadas no afeto a que essa
relação, em vias habituais, seria pautada. O pai, do caso em questão, foi condenado a
indenizar sua filha por abandono afetivo em R$ 200.000,00.
Caso os genitores descumpram seus deveres, as punições extrapolam a esfera
civil alcançando sanções penais, conforme determinam os arts. 133, 244, 246 e 247,
do Código Penal.
Art. 133. Abandonar pessoa que está sob seu cuidado,
guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo,
incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono.
Pena – detenção, de seis meses a três anos.
Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência
do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou
inapto para o trabalho (...) não lhes proporcionando os
recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão
alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada;
deixar sem justa causa, de socorrer descendente ou
ascendente, gravemente enfermo.
Pena – detenção, de 1 a 4 anos e multa, de uma a dez
vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Art. 246. Deixar, sem justa causa, de prover à instrução
primária de filho em idade escolar:
Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.
Art. 247. Permitir alguém que menor de dezoito anos,
sujeito a seu poder ou confiado à sua guarda ou vigilância.
I – frequente casa de jogo ou mal afamada, ou conviva com
pessoa viciosa ou de má vida;
II – frequente espetáculo capaz de perverte-lo ou ofender
lhe o pudor, ou participe de representação de igual
natureza;
III – resida ou trabalhe em casa de prostituição;
IV – mendigue ou sirva a mendigo para excitar a
comiseração pública.
Pena – detenção, de um a três meses, ou multa.
No que concerne à perda do poder familiar, é necessário afirmar que, no advento
desta, as consequências são muito mais sérias à criança do que ao seu genitor. A
partir desse entendimento, é possível compreender que, o já difundido, direito de
visitas é uma concessão visando benefício do menor, para que este posa ter mais
próximo de si seu pai ou mãe, tem como objetivo priorizar a convivência familiar,
porém seu nome não é o mais adequado, pois já é entendimento pacífico que os
genitores não devem visitar seus filhos e sim conviver com eles, haja vista, visitamos
parentes distantes ou amigos, com a nossa família devemos conviver, posto o correto
é direito de convivência.
Mas, indo contra todo o progresso já feito pela legislação e sociedade, buscando
priorizar o bem estar do menor, ainda existem decisões que autorizam aos pais não
desempenharem suas funções com seus filhos, ainda eximem a aplicação de multa,
com base em justificativas pífias dos genitores, como ocorreu no Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul, onde a decisão fundou-se na ideia de que a convivência
poderia acarretar problemas ao desenvolvimento da criança.
A matéria é controvertida, posto que grande parte dos doutrinadores não
entendem dessa forma e acreditam que o direito a convivência familiar deve ser
garantido a todo e qualquer menor, independente da vontade de seus genitores, não
se obriga a amá-los mas ter afeto, afinal não estamos falando de um objeto e sim de
um filho.

4.1. A RESPONSABILIDADE CIVIL NO QUE TANGE A AFETIVIDADE


Existe um questionamento acerca da responsabilidade e do abandono afetivo, é
devido pagamento de indenização para reparar o abandono moral, mesmo quando as
obrigações alimentares estão em seu pleno cumprimento, ou seria esse um
enriquecimento ilícito?
Silvio de Salvo Venosa (2005, p. 1) leciona sobre a responsabilidade civil no
ordenamento jurídico brasileiro:
“O termo responsabilidade civil é utilizado em qualquer
situação na qual alguma pessoa, natural ou jurídica, deve
arcar com as consequências de um ato, fato, ou negócio
jurídico danoso. Sob essa noção, toda atividade humana,
portanto, pode acarretar o dever de indenizar.”

Antes de firmarmos opinião, se faz necessário entender os três elementos


basilares da responsabilidade civil, sendo eles: a culpa concebida com a inobservância
de um dever que o agente deveria conhecer e observar, no caso é dever de cuidar e
ter afeto; o dano que nada mais é do que o efetivo prejuízo sofrido pelo agente sobre
um bem que está sob a tutela jurídica de proteção, devendo ser real e é esperado que
o juiz fixe indenização capaz de repor o prejuízo sofrido; e por fim, o nexo causal que é
a conexão entre a conduta culposa ou dolosa do agente e o prejuízo da vítima.
O acórdão proferido pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais, registrado pelo n°
408.550-5, de 01/04/2004, por sua Sétima Câmara Cível, retrata sobre a
responsabilidade aplicada ao abandono afetivo:
INDENIZAÇÃO DANOS MORAIS – RELAÇÃO PATERNO-
FILIAL – PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA – PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE.
A dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno,
que privou do direito à convivência, ao amparo efetivo,
moral e psíquico, deve ser indenizável, com fulcro no
princípio da dignidade da pessoa humana.
(Tribunal de Alçada de Minas Gerais, Apelação Cível n°
408.550-5, Sétima Câmara Cível, Rel. Unias Silva, j.
01/04/2004).
No caso supramencionado, a questão versa sobre um casal que, após a
separação, teve a guarda do filho atribuída a mãe e o pai apesar de cumprir as
obrigações com o pagamento dos alimentos é completamente ausente da vida da
criança. O comportamento e a ausência do pai trouxeram ao filho danos de natureza
moral e psíquica.
Ressalta-se que, é necessário compreensão de todas as situações que
abrangem o fato para formular o entendimento do juiz, deve ser considerado o
princípio constitucional da razoabilidade em casos desse sentido, posto que, o genitor
que desempenha serviço militar e está a todo tempo sendo removido de um local para
o outro terá seu convívio com o filho dificultado, o mesmo acontece quando a própria
criança se recusa estar na presença do pai ou da mãe, sendo preciso, nesses casos,
que os genitores busquem outras formas de se fazerem presentes, o que atualmente
não é uma dificuldade tão grande posto os meios tecnológicos que nos auxiliam
diariamente – por exemplo, podem ser utilizadas chamadas de vídeo, para tornar o
convívio mais próximo.
Sobre a indenização pleiteada no caso, Daniel Cuba dos Santos (2005), entende:
“(...) no entender deste operador uma ação deste porte tem
o ônus probandi do inciso I do art. 333, do CPC, ou seja, a
peça tem que ser instruída com as provas do abandono
moral que são revestidas nos registros fotográficos, de
filmagens, e testemunhas sobre aqueles momentos
presenciais de fundamental assistência moral à criança com
especificação de alguns destes momentos, para que a
presunção seja deduzida não só dos fatos, mas de atos que
não foram praticados pela omissão e que estabelece como
verdadeiros os fatos arguidos no abandono moral.”

Desta forma, entende-se como fundamental o nexo causal entre o


comportamento culposo do genitor e o dano apresentado pela vítima. E é um dever do
sistema judiciário estar atento ao fato que originou o dano à criança, podendo este não
estar relacionado ao vínculo parental, causando uma insegurança jurídica nos
relacionamentos familiares, poso que os pais seriam responsabilizados por prejuízos
que não deram causa.

4.2. O ABANDONO AFETIVO NA JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA


O judiciário brasileiro possui um vasto rol de casos de filhos abandonados
afetivamente por seus pais, e que buscam uma compensação pecuniária em razão da
ausência do genitor durante seu crescimento. Nesta seara, o STJ julgou o Recurso
Especial n° 757.411-MG, negando a ação do filho que tinha como objetivo a reparação
dos danos morais por conta do abandono sofrido pelo pai.
O caso foi rejeitado em primeira instância, mas teve sua sentença reformada em
sede de apelação, pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais. São válidas as
afirmações feitas pelo Juiz Relator para maior entendimento sobre a decisão:
A relação paterno-filial em conjugação com a
responsabilidade possui fundamento naturalmente jurídico,
mas essencialmente justo, de se buscar compensação
indenizatória em face de danos que pais possam causar a
seus filhos, por força de uma conduta imprópria,
especialmente quando a eles é negada a convivência
paterna ou materna concretas, acarretando a violação de
direitos próprios da personalidade humana, magoando seus
sublimes valores e garantias, como a honra, o nome, a
dignidade, a moral, a reputação social, o que, por si só, é
profundamente grave.
Esclareço, desde já, que a responsabilidade em comento
deve cingir-se à civil e, sob este aspecto, deve decorrer dos
laços familiares que matizam a relação paterno-filial,
levando-se em consideração os conceitos da urgência da
reparação do dano, da re-harmonização patrimonial da
vítima, do interesse jurídico desta, sempre prevalente,
mesmo à face de circunstâncias danosas oriundas de atos
dos juridicamente inimputáveis.
No seio da família da contemporaneidade desenvolveu-se
uma relação que se encontra deslocada para a afetividade.
Nas concepções mais recentes de família, os pais de família
tem certos deveres que independem do seu arbítrio, porque
agora quem os determina é o Estado (Tribunal de Alçada de
Minas Gerais, Apelação Cível n° 408.550-5, da 7ª Câmara
Cível, Relator Juiz Unias Silva, Minas Gerais, j. 01 de abril
de 2004).

No desfecho, o relator chega à conclusão da existência do dano “em relação à


sua dignidade” e a “conduta ilícita praticada pelo réu, ao deixar de cumprir seu dever
familiar de convívio e educação, a fim de, através da afetividade, formar laço paternal
com seu filho, e o nexo causal entre ambos”, fixando a indenização no valor
equivalente a duzentos salários mínimos.
Contra a decisão supramencionada, fora interposto recurso encaminhado ao STJ
que, por maioria de votos, negou o dever de indenizar, como dito anteriormente, e
proferiu a seguinte ementa:
RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL.
REPARAÇÃO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE
1. A indenização por dano moral pressupõe a prática de
ato ilícito, não rendendo ensejo à aplicabilidade da
norma para o art. 159 do Código Civil de 1916, o
abandono afetivo, incapaz de reparação pecuniária.
2. Recurso especial conhecido e provido (ATJ, REsp n°
757.411-MG, Rel. Fernando Gonçalves, j. 29 de
novembro de 2005).
3.
Os apontamentos iniciais dos ministros tratavam do fato de que já se faz
presente no ordenamento jurídico a pretensão punitiva no caso de descuido por parte
dos pais em relação aos seus filhos. Tanto no ECA (Estatuto da Criança e do
Adolescente) em seu art. 24, quando no art. 1.638, II, do Código Civil:
Art. 24. A perda e a suspensão do poder familiar serão
decretadas judicialmente, em procedimento contraditório,
nos casos previstos na legislação civil, bem como na
hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e
obrigações a que alude o art. 22.

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou


a mãe que;
(...)
II – deixar o filho em abandono;

Conforme o exposto, é prevista a perda do poder familiar como punição no caso


de abandono ou descumprimento injustificado do dever de sustento. Observa-se,
ainda, a legislação específica, no âmbito do Direito das Famílias, referente aos
alimentos que devem ser prestados a fim de suprir as necessidades do filho.
O Ministro Relator mostra-se contrário a essa ideia de quantificação do afeto. Em
seu voto, ele esclarece:
“Ainda outro entendimento deve ser enfrentado. O pai, após
condenado a indenizar o filho por não lhe ter atendido às
necessidades de afeto, encontrará ambiente para
reconstruir o relacionamento ou, ao contrário, se verá
definitivamente afastado daquele pela barreira erguida
durante o processo litigioso?
Quem sabe admitindo a indenização por abandono moral
não entraremos enterrando em definitivo a possibilidade de
um pai, seja no presente, seja perto da velhice, buscar o
amparo do amor dos filhos (...).
Por certo um litígio entre as partes reduziria drasticamente a
esperança do filho de se ver acolhido, ainda que
tardiamente, pelo amor paterno. O deferimento do pedido,
não atenderia, ainda, o objetivo de reparação financeira,
porquanto o amparo nesse sentido já é providenciado com a
pensão alimentícia, nem mesmo alcançaria efeito punitivo e
dissuasório, porquanto já obtidos com outros meios
previstos na legislação civil, conforme acima esclarecido.
Desta feita, como escapa ao arbítrio do Judiciário obrigar
alguém a amar, ou manter um relacionamento afetivo,
nenhuma finalidade positiva seria alcançada com a
indenização pleiteada.
Nesse contexto, inexistindo a possibilidade de reparação a
que alude o art. 159 do Código Civil de 1916, não há como
reconhecer o abandono afetivo como dano passível de
indenização. (STJ, REsp. n° 757.411-MF, Rel. Fernando
Gonçalves, j. 29 de novembro de 2005).
Diante do exposto, são válidas as indagações que versem sobre a real
impossibilidade do judiciário em se posicionar quanto à reparação pela ausência de
afeto, uma vez que, por mais que não se possa forças a existência do amor, é justo
que seja concedida uma chance de reparação a pessoa, para que essa possa
reconstruir sua vida.
Acredita-se que estipular o valor para o reparo afetivo seria negar a relevância
para a afirmação da dignidade da pessoa humana em desenvolvimento. Com esse
raciocínio, firmou Ministro Barros Monteiro, sendo voto vencido:
O Tribunal de Alçada de Minas Gerais condenou o réu a
pagar 44 mil reais por entender configurado nos autos o
dano sofrido pelo autor em sua dignidade, bem como por
reconhecer a conduta ilícita do genitor ao deixar de cumprir
seu dever familiar de convívio e afeto com o filho, deixando
assim de preservar os laços de paternidade. Esses fatos
são incontroversos. Penso que daí decorre a conduta ilícita
da parte do genitor, que ao lado do dever de assistência
material, tem o dever de dar assistência moral ao filho, de
conviver com ele, de acompanha-lo e de dar-lhe o
necessário afeto.
Como se sabe, na norma do art. 159 do Código Civil de
1916, está subentendido o prejuízo de cunho moral, que
agora está explícito no Código novo. Leio o art. 186:
“Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito moral ou causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. (...)
(STJ, REsp. n° 757.411-MG, Rel. Fernando Golçalves, j. 29
de novembro de 2005).

Para o Ministro, não se põe em discussão o valor material do amor, o ato de


quantificar o sentimento. O que se prioriza aqui é a reparação pela assistência moral
que não foi dispensada à criança, o que, por conseguinte, pode ter acarretado
consequências negativas à sua personalidade e ao seu desenvolvimento.
Discute-se também essa inconveniência no que se refere á “quantificação do
amor”, fazendo-se uma comparação com a reparação por danos morais. Se é possível
determinar o valor a ser aplicado no caso da dor moral, porque não seria quando a
situação versa sobre a ausência de afeto e os demais danos consequentemente
causados?
Seguindo um pensamento divergente, o Ministro César Asfor Rocha mostra-se
completamente contrário a ideia de Barros Monteiro em seu voto:
(...) é certo que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais
pontificou que o recorrido teria sofrido em virtude do
abandono paterno; são fatos que não podem ser
desconstituídos. E é justamente com base nesses fatos que
aprecio o que está ora posto. Penso que o Direito de
Família tem princípios próprios que não podem receber
influências de outros princípios que são atinentes
exclusivamente ou – no mínimo – mais fortemente – a
outras ramificações do Direito. Esses princípios do Direito
de Família não permitem que as relações familiares,
sobretudo aquelas atinentes a pai e filho, mesmo aquelas
referentes a patrimônio, a bens e responsabilidades
materiais, a ressarcimento, a tudo quanto disser respeito a
pecúnia, sejam disciplinadas pelos princípios próprios do
Direito das Obrigações.
Destarte, tudo quanto disser respeito às relações
patrimoniais e aos efeitos patrimoniais das relações
existentes entre parentes e entre os cônjuges só podem ser
analisadas e apreciadas à luz do que está posto no próprio
Direito de Família. (...)
Por isso é que, por mais sofrida que tenha sido a dor
suportada pelo filho, por mais reprovável que possa ser o
abandono praticado pelo pai – o que, diga-se de passagem,
o caso não configura – a repercussão que o pai possa vir a
sofrer, na área do Direito Civil, no campo material, há de ser
unicamente referente a alimentos; e, no campo
extrapatrimonial, a destituição do pátrio poder, no máximo
isso.
Com a devida vênia, não posso, até repudio essa tentativa,
querer quantificar o preço do amor. Ao ser permitido isso,
com o devido respeito, iremos estabelecer gradações para
cada gesto que pudesse importar em desamor: se
abandono por uma semana, o valor da indenização seria
“x”; se abandono por um mês, o valor da indenização seria
“y”, e assim por diante. (...)
(STJ, REsp. n° 757.411-MF, Rel. Fernando Gonçalves, j. 29
de novembro de 2005).

Nota-se que o STJ, em decisão mais recente, foi favorável ao direito à


indenização à filha proveniente do abandono afetivo pelo pai, mostrando que o Direito
é mutável com o tempo e relativo a cada caso. É válido observar o que é dito por
Nancy Andrighi em seu voto:

RECURSO ESPECIAL N° 1.159.242 – SP (2009-0193701-


9) CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO
AFETIVO. COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL.
POSSIBILIDADE.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS.
FILHA HAVIDA EM RELAÇÃO AMOROSA ANTERIOR.
ABANDONO MORAL E MATERIAL. PATERNIDADE
RECONHECIDA JUDICIALMENTE. PAGAMENTO DA
PENSÃO ARBITRADA EM DOIS SALÁRIOS MÍNIMOS ATÉ
A MAIORIDADE. ALIMENTANTE ABASTADO E
PRÓSPERO. IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO.
(...) Aqui não se fala ou se discute o amar e, sim, a
imposição biológica e legal de cuidar, que é dever jurídico,
corolário da liberdade das pessoas de que gerem ou
adotarem filhos. O amor diz respeito à motivação, questão
que refoge os lindes legais, situando-se, pela sua
subjetividade e impossibilidade de precisa materialização,
no universo meta-jurídico da filosofia, da psicologia ou da
religião. O cuidado, distintamente, é tisnado por elementos
objetivos, distinguindo-se do amar pela possibilidade de
verificação e comprovação de seu cumprimento, que
exsurge da avaliação de ações concretas: presença;
contatos, mesmo que não presenciais; ações voluntárias em
favor da prole; comparações entre o tratamento dado aos
demais filhos – quando existirem -, entre outras fórmulas
possíveis que serão trazidas à apreciação do julgador, pelas
partes. Em suma, amar é faculdade, cuidar é dever (...).
(STJ, REsp. n° 1.159.242-SP, Rel. Nancy Andrighi, j. 24 de
abril de 2012)

Há de se perceber, pela análise do voto da Ministra, que o amor é visto como


algo subjetivo, impossível de valoração, porém o cuidado está inserido no contexto da
assistência moral e pode sim ser valorado, haja vista a existência do dano moral.
O Direito não pode estar alheio ao princípio da afetividade e sua relevância tanto
para a família, como para a própria pessoa. Deve-se levar em consideração que tal
sentimento é fundamental para o desenvolvimento pessoal de cada indivíduo junto à
afirmação da dignidade da pessoa humana. Como não há uma alternativa mais eficaz
para solucionar a omissão desse afeto, ao menos a responsabilização em perdas e
danos deve se mostrar suficiente ou compensatória para a reparação dano sofrido.
Desta forma, é relevante o debate sobre o valor do afeto. Não um simples valor
qualquer, revestido apenas de pecúnia e valor monetário, visto como mero capital ou
elemento de trova, mas um valor inerente à formação do ser humano, subentendido na
sua dignidade para sua formação pessoal.
Não se busca um valor matemático para o sentimento, mas vê-se uma punição
pelo dano que foi causado de forma negligente. Vale ressaltar que também é uma
forma de controle para que os pais agem irresponsavelmente não cometam o mesmo
erro, e aqueles que nunca agiram dessa maneira nem mesmo o façam.
Não se pode falar em convivência familiar, dignidade da pessoa humana,
solidariedade e outros conceitos paralelos enquanto for aceito o abandono moral do
filho que tanto depende do afeto para o seu crescimento. Basta lembrar que os pais
são a primeira impressão que a criança tem do mundo e, a partir deles, ela passa a
moldas seu caráter e suas decisões.
Não se pode ser tão direto e limitado quando o tratamento, neste caso, é
dispensado a um ser humano, que, na sua individualidade e na sua maneira de
observar os comportamentos alheios, pode ter diferentes reflexos e sentimentos em
relação a outra pessoa na sua mesma situação.

4.3. NOVAS PERSPECTIVAS


Em virtude da polêmica e da diversidade de entendimentos acerca do tema, o
senador Marcelo Crivella apresentou, no ano de 2007, o Projeto de Lei n° 700, que
visava alterar a Lei n° 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), para
caracterizar o abandono moral como ilícito civil e penal.
A proposta do senador compreendia solucionar o problema do desamor na
relação paterno-filial, frente à possibilidade de responsabilizar civil e penalmente
aqueles pais que deixam de prestas assistência moral a seus filhos. Para isso, o
projeto previa alterações significativas no art. 4°, §§2° e 3°; art. 5°, parágrafo único; art.
22 e art. 24, do ECA, dentre algumas outras alterações.
Na justificativa do Projeto de Lei, o senador explicou que a importância e a
necessidade de alterações na lei se deram devido a existência de decisões
desfavoráveis, que acabavam gerando uma insegurança jurídica àquele que recorria
ao Judiciário para resolver as questões do abandono moral. Entendeu-se que a
problemática seria facilmente superada por intermédio de uma lei, que regulamentasse
a situação, não deixando dúvidas quanto aos deveres primordiais dos pais.
E assim, para explicar a necessidade de alteração, o senador refere-se:
“(...) a lei não tem poder de alterar a consciência dos pais,
mas pode prevenir e solucionar os casos intoleráveis na
negligência para com os filhos. Eis a finalidade desta
proposta, e fundamenta-se na Constituição Federal, que, no
seu art. 227, estabelece, entre os deveres e objetivos do
Estado, juntamente com a sociedade e a família, o de
assegurar a crianças e adolescentes – além do direito à
vida, à saúde, á alimentação, à educação e ao lazer – o
direito à dignidade e ao respeito. (...) Amor e afeto não de
impõe por lei! Nossa iniciativa não tem essa pretensão.
Queremos, tão somente, esclarecer, de uma vez por todas,
que os pais tem o DEVER de acompanhar a formação dos
filhos, orientá-los nos momentos mais importantes, prestar-
lhes solidariedade e apoio nas situações de sofrimento e, na
medida do possível, fazerem-se presentes quando o menor
reclama espontaneamente a sua companhia.”

A principal modificação, e de maior relevância, seria mesmo a inserção do


parágrafo único do art. 5°, do Estatuto da Criança e do Adolescente, passando a
considerar a conduta ilícita, sujeita a reparação de danos, sem prejuízo de outras
sanções, a ação ou omissão dos pais que ofenda direito fundamental da criança e do
adolescente, incluindo nessas hipóteses os casos de abandono moral.
Assim, o abandono moral dos pais em relação aos filhos seria uma forma de
violação aos direitos fundamentais, capaz de ensejar ação de indenização pela
conduta ilícita e omissão paterna.
Ainda, deve-se mencionar outra inovação legislativa importante, de autoria do
deputado Carlos Bezerra, o Projeto de Lei n° 4.294/2008. Este projeto acrescenta o
parágrafo ao art. 1.632, do Código Civil, de modo a estabelecer indenização por dano
moral em razão do abandono afetivo.
Em justificativa a criação e implantação do projeto, Carlos Bezerra diz:
“(...) o envolvimento familiar não pode ser mais apenas
pautado em um parâmetro patrimonialista-individualista.
Deve abranger também questões éticas que habitam, ou ao
menos deveriam habitar, o consciente e inconsciente de
todo ser humano. Entre as obrigações existentes entre pais
e filhos, não há apenas a prestação de auxílio material.
Encontra-se também a necessidade de auxílio moral,
consistente na prestação de apoio, afeto e também atenção
mínima e indispensável ao adequado desenvolvimento da
personalidade dos filhos (...). No caso dos filhos menores, o
trauma decorre do abandono afetivo parental implica
marcas profundas no comportamento da criança. A espera
por alguém que nunca telefona – sequer nas datas mais
importantes – o sentimento de rejeição e a revolta causada
pela indiferença alheia provocam prejuízos profundos em
sua personalidade. (...) Por sua vez, se é evidente que não
se pode obrigar filhos e pais a se amar, deve-se ao menos
permitir ao prejudicado o recebimento de indenização pelo
dano causado.”
De tal forma, percebe-se a real necessidade de tutela dos menores e a busca
constante do atendimento de suas necessidades primordiais, dadas através do
suporte físico e emocional, da presença, do carinho e do cuidado. Assim, no caso do
descumprimento dos deveres decorrentes da paternidade, surge a obrigação de
reparar o dano causado, como forma de desestímulo a tais condutas e mudança nos
próprios valores e posturas sociais. Tal matéria deve ser analisada com extrema
cautela, devido à subjetividade que a entorna, porém, a sensibilidade do assunto não
pode impedir de avançar por medo de ousar.

5. O ABANDONO MORAL E A ALIENAÇÃO PARENTAL


Segundo Douglas Freitas (2014, 9.21), a Síndrome de Alienação Parental teve
entre os seus primeiros identificadores, o professor especialista em psiquiatria infantil e
perito judicial, Richard Gardner, em 1985, que publicou um artigo sobre as tendencias
atuais em litígios de divorcio e guarda.
Ainda, de acordo com o doutrinador Freitas (2014, p. 23), no Brasil, a Síndrome
de Alienação Parental, passou a se destacar no Poder Judiciário em 2003, surgindo as
primeiras decisões sobre o tema. Ocorreu ainda, a participação ativa de institutos
como APASE (Associação dos Pais e Mães Separados e o IBDFAM – Instituto
Brasileiro de Direito de Família).
Rodrigo da Cunha Pereira (2013, p. 32), leciona:
“Uma das mais importantes e recentes evoluções do direito
de Família foi a nomeação e demarcação de um conceito
para a criação de um novo instituto jurídico para um velho
problema, que se tem denominado alienação parental.”
Na sociedade atual, vem ocorrendo um crescente número de separações e
divórcios, dos quais decorre a quebra do vínculo familiar. Ademais, resta demonstrada
a igualdade de direitos e deveres dos pais na criação dos filhos menores, sendo que
os homens estão cada vez mais participativos na vida dos filhos mesmo após a ruptura
da família.
Neste sentido, Jorge Trindade (2013, p. 21 e 22), dispõe que:
“A Síndrome de Alienação Parental é um acontecimento
frequente na sociedade atual, que se caracteriza por um
elevado número de separações e divórcios. Ela costuma ser
desencadeada nos movimentos de separação ou divórcio
do casal, mas sua descrição ainda constitui novidade,
sendo pouco conhecida por grande parte dos operadores do
direito.”
Desta forma, se um dos pais identificar que a criança ou adolescente está
sofrendo alienação parental, o mesmo deve levar o caso ao judiciário, para que
atendendo ao melhor interesse do filho menos, sejam tomadas medidas para que este
seja o mínimo prejudicado com a situação.
Ocorre que, nos casos onde além da alienação parental a criança sofre com o
abandono moral, a situação se torna muito delicada, pois o menor não tem o convívio
com um de seus genitores e o outro torna a relação, que quase não existe, turbulenta,
causando aumento ou a criação de danos psicológicos ao menor.
Trindade (2013, p. 29) ensina que: “a alienação parental constitui um tipo
sofisticado de maltrato e abuso, e o direito deveria estudar novos caminhos para
reparar o dano que recai sobre o filho e sobre o alienado”.
A Lei n° 12.318/2010 entra em vigor visando coibir a denominada alienação
parental e traz sua definição no art. 2°, conforme segue:
Art. 2°. Considera-se ato de alienação parental a
interferência na formação psicológica da criança ou do
adolescente promovida ou induzida por um dos genitores,
pelos avós ou pelos que tenham a criança ou o adolescente
sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repute
o genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à
manutenção de vínculos com este.
O legislador na definição do ato na alienação parental adota um conceito aberto,
abrangendo todo e qualquer tipo de conduta que prejudique relacionamento da criança
ou do adolescente com um dos seus pais.
Maria Berenice Dias (2011, p. 15), discorre sobre a prática da alienação parental:
“Os filhos tornaram-se instrumentos de vingança, sendo
impedidos de conviver com quem se afastou do lar. São
levados a rejeitar e a odiar. Com a dissolução da união, os
filhos ficam fragilizados, com sentimento de orfandade
psicológica. Este é um terreno fértil para plantar a ideia de
terem sido abandonados pelo genitor. Acaba o guardião
convencendo o filho de que outro genitor não lhe ama. Faz
com que acredite em fatos que não ocorreram só com o
intuito de leva-lo a afastar-se do pai.”
Cabe asseverar que a síndrome não se confunde com a prática da alienação
parental, uma vez que diz respeito ao transtorno psicológico desencadeado na criança
ou adolescente vítima desse processo. Todavia, para haver Síndrome da Alienação
Parental, obrigatoriamente houve o estágio da alienação parental.
Os doutrinadores Pablo Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2013, p. 471)
discorrem sobre a diferenciação:
“A síndrome da alienação parental não se confunde,
portanto, com a mera alienação parental. Aquela
geralmente é decorrente desta, ou seja, a alienação
parental é o afastamento do filho de um dos genitores,
provocado pelo outro, via de regra, o titular da custódia. A
síndrome da alienação parental, por seu turno, diz respeito
às sequelas emocionais e comportamentais de que vem a
padecer a criança vítima daquele alijamento. Assim,
enquanto a síndrome refere-se à conduta do filho que se
recusa terminante e obstinadamente a ter contato com um
dos progenitores, que já sobre as mazelas oriundas daquele
rompimento, a alienação parental relaciona-se com o
processo desencadeado pelo genitor que intenta arredar
outro genitor da vida do filho.”

Ainda, Pereira (2013, p. 32) aduz que “a síndrome pode ser a


consequência da alienação parental, quando atingida em um grau mais elevado.
Mas nem sempre há uma síndrome, embora possa estar presente a alienação
parental”.
Madaleno (2013, p. 463) traz a definição da Síndrome de Alienação
Parental de Richard Gardner, um dos primeiros identificadores da alienação
parental:

A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é um transtorno que


se desenvolve primordialmente, em um contexto de disputa
pela guarda. Sua principal manifestação é a campanha de
difamação da criança em relação a um de seus pais. É o
resultado da combinação de inculcação de um pai que está
programando seu filho (lavagem cerebral) com a própria
contribuição da criança ao vilipêndio do genitor rechaçado.
Quando está presente uma situação de abuso ou negligência a
animosidade da criança pode estar fundamentada por estas
próprias situações, e, portanto, nesse caso não é aplicável a
síndrome de alienação parental para a hostilidade infantil.

Freitas (2014, p. 24) conceitua de Síndrome de Alienação Parental:

Trata-se de um transtorno psicológico caracterizado por um


cônjuge sintomático pelo qual um genitor, denominado cônjuge
alienador, modifica a consciência de seu filho, por meio de
estratégias de atuação e malícia (mesmo que
inconscientemente), com o objetivo de impedir, obstaculizar ou
destruir seus vínculos com o outro genitor, denominado
cônjuge alienado. Geralmente, não há motivos reais que
justifiquem essa condição. É uma
programação sistemática promovida pelo alienador para que a
criança odeie, despreze ou tema o genitor alienado, sem
justificativa real.

Para Trindade (2013, p. 28) “A Síndrome de Alienação Parental constitui


uma forma grave de mau-trato e abuso contra a criança, que se encontra
especialmente fragilizada por estar vivendo um conflito que envolve a figura de seus
próprios pais”.
Para Amato (2013, p. 76) a alienação parental fere princípios
fundamentais que devem ser preservados para que os pais estabeleçam um
ambiente de desenvolvimento favorável para os filhos:

A alienação parental fere o princípio da paternidade


responsável, na medida em que tal instituto impede que ambos
os pais não exerçam seu dever de cuidado para com os filhos.
Quando o alienador é um dos genitores, este não cuida porque
está preocupado em fazer com que o menor odeie o genitor
alienado. O genitor alienado não exerce seu dever de cuidado
porque é impedido pelo alienador. Nessas circunstâncias,
restam violados também os princípios da absoluta prioridade e
do melhor interesse da criança, tendo em conta que, instaurada
a Síndrome de Alienação Parental, os conflitos dos pais
preponderam sobre os interesses dos filhos, não sendo mais
prioridade o que é melhor para estes.

Assim, a alienação parental além de ser uma afronta ao saudável


desenvolvimento emocional dos filhos, também fere princípios inerentes à criança e
ao adolescente.
Dessa forma, atualmente está vigente a Lei nº 12.318/2010, conhecida
como a Lei de Alienação Parental. Sobre a referida lei, conclui-se ser mais uma
ferramenta para assegurar maior expectativa de efetividade na eventual busca de
adequada atuação do Poder Judiciário, em casos envolvendo alienação parental.

3.1 EFEITOS E CONSEQUÊNCIAS

Para Trindade (2013, p. 23) “A alienação parental produz diversas


consequências, tanto em relação ao cônjuge alienado, bem como ao próprio cônjuge
alienador. Porém, seus efeitos mais dramáticos irão recair sobre os filhos”.
Trindade (2013, p. 24) descreve enfermidades somáticas e
comportamentais que podem ser desenvolvidos pela criança ou adolescente que
está sendo alienado:
Esses conflitos podem aparecer na criança sob forma de
ansiedade, medo e insegurança, isolamento, tristeza e
depressão, comportamento hostil, falta
de organização, dificuldades escolares, baixa tolerância a
frustração, irritabilidade, enurese, transtorno de identidade ou
de imagem, sentimento de desespero, culpa, dupla
personalidade, vulnerabilidade ao álcool e às drogas, e, em
casos mais extremos, idéias ou comportamentos suicidas.

A Síndrome de Alienação Parental também é reconhecida como a


implantação de falsas memórias. Essas falsas memórias são implantadas a partir de
uma campanha de difamação, causando uma verdadeira lavagem cerebral na
criança ou adolescente. (GUAZELLI, 2013, p. 192)
Para Guazzelli (2013, p. 193) “As falsas memórias são uma evidência
científica. Com efeito, as pesquisas sobre falsas memórias demonstram que o ser
humano é capaz de lembrar-se de forma espontânea ou sugerida, eventos que
nunca aconteceram”.
Ainda sobre o tema de falsas memórias, vários estudiosos têm
pesquisado profundamente sobre o assunto e concluíram que a criança ou
adolescente podem depois de adultos apresentarem recordações de fatos e
situações que nunca aconteceram. (GUAZELLI, 2013, p. 194)
Pereira (2013, p. 37) ainda acrescenta, que “As consequências desta
gravíssima forma de abuso e violência contra os filhos são devastadoras”.
Trindade (2013, p. 24) ressalta as consequências inerentes da alienação
parental:

Sem tratamento adequado, ela pode produzir sequelas que são


capazes de perdurar para o resto da vida, pois implica
comportamentos abusivos contra a criança, instaura vínculos
patológicos, promove vivências contraditórias da relação entre
pai e mãe e cria imagens distorcidas das figuras paterna e
materna, gerando um olhar destruidor e maligno sobre as
relações amorosas em geral.

Infelizmente, a perversidade dos pais em penalizar cruelmente os filhos,


por não saber lidar com o fim do vínculo conjugal, gera danos muitas vezes
irreparáveis decorrentes da alienação sofrida, que só poderão ser minorados com a
identificação e tratamento adequado. (FREITAS, 2014, p. 37)
A Síndrome de Alienação Parental acaba sendo identificada em etapa
avançada, uma vez que seus efeitos nem sempre são visíveis. Assim, seu
reconhecimento pode ser difícil e demorado. (TRINDADE, 2013, p. 24)
A dificuldade de identificação é um grande problema encontrado, tendo
em vista a sutileza da maldade empregada na prática da alienação parental. A
comprovação geralmente será atestada através de laudos e testes para a
sua constatação. (PEREIRA, 2013, p. 37)
A criança ou adolescente por possuírem uma limitada capacidade
de se defenderem e a restrita habilidade de avaliar a disputa ocorrida entre
os pais torna- se alvo facilmente manipulável. (CARVALHO; VIEIRA, 2015, p.
102)
Diante disso, os filhos decidem por manterem-se aliados ao
alienador. É bem comum a criança ou adolescente envolvida nesses
casos, desenvolver medo do alienado, sabotando assim, seu
relacionamento. (CARVALHO; VIEIRA, 2015, p. 102)
Ainda, há uma grande probabilidade de que a criança ou
adolescente ao se tornar adulta, tenha inclinação ao álcool e às drogas, e
apresentem sentimentos de profundo mal estar e baixa auto-estima.
(CARVALHO; VIEIRA, 2015, p. 102)
A alienação parental não afeta apenas a pessoa do alienado, que
perde o contato com o filho, mas também todas as pessoas que cercam a
criança ou adolescente, como os outros familiares, privando do necessário
convívio com todo o núcleo familiar. (CARVALHO; VIEIRA, 2015, p. 102)
Confirmada a Síndrome de Alienação Parental, o normal
desenvolvimento da criança ou adolescente restará definitivamente
comprometido. Porém, a principal consequência será correspondente à perda
de contato com o alienado e os outros familiares.

3.2 FORMAS DE OCORRÊNCIA

Além da definição proposta no artigo 2º, “caput”, a Lei de


Alienação Parental, nº 12.318/2010, descreve de forma exemplificativa as
condutas configuradoras de alienação parental:

Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a


interferência na formação psicológica da criança ou do
adolescente promovida ou induzida por um dos
genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou
adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância
para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao
estabelecimento ou à manutenção de vínculos com
este.
Parágrafo único. São formas exemplificativas de
alienação parental, além dos atos assim declarados
pelo juiz ou constatados por perícia, praticados
diretamente ou com auxílio de terceiros:
3.2.1 - realizar campanha de desqualificação da
conduta do genitor no exercício da paternidade ou
maternidade;
3.2.2 - dificultar o exercício da autoridade parental;
3.2.3 - dificultar contato de criança ou adolescente
com genitor;

3.2.4 - dificultar o exercício do direito


regulamentado de convivência familiar;
3.2.5 - omitir deliberadamente a genitor
informações pessoais relevantes sobre a criança ou
adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações
de endereço;
3.2.6 - apresentar falsa denúncia contra genitor,
contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou
dificultar a convivência deles com a criança ou
adolescente;
3.2.7 - mudar o domicílio para local distante, sem
justificativa, visando a dificultar a convivência da criança
ou adolescente com o outro genitor, com familiares
deste ou com avós. (BRASIL, 2016-E)

Para Perez (2013, p. 48) o rol de exemplos de qualificação de


alienação parental também tem a função de instituir limites durante o litígio
do casal:

O sentido do rol exemplificativo, que traz nas condutas


práticas que, regra geral, tendem a frustrar a
convivência saudável da criança ou adolescente com
seus genitores, também é o de imprimir caráter
educativo á norma, na medida em que devolve
claramente à sociedade legítima sinalização de limites
éticos para o litígio entre ex-casal.

O inciso I considera ato de alienação parental a realização de


campanha de desqualificação da conduta de um dos pais exercendo a
maternidade ou paternidade. Essa situação decorre das brigas que ocorrem
após a separação do casal. (CUNHA; LÉPORE; ROSSATO; 2011, p. 163)
Nessa linhagem, são próximos os incisos II, III e IV, que
denominam ato de alienação parental a conduta de dificultar o exercício da
autoridade parental, o contato da criança ou adolescente com um dos pais ou
o direito a convivência familiar. Comum a prática de criar empecilhos para a
convivência dos filhos para com um dos pais. (CUNHA; LÉPORE;
ROSSATO; 2011, p. 163)
Já o inciso V dispõe sobre a conduta de omitir deliberadamente a
um dos pais informações pessoais relevantes sobre os filhos. Trata-se de
uma espécie de alienação imprópria, tendo em vista que, não há diretamente
uma interferência na formação psicológica da criança ou adolescente. Isso
inclui informações escolares, médicas e até mesmo alteração de endereço.
(CUNHA; LÉPORE; ROSSATO; 2011, p. 163)
O inciso VI pode ser considerado um dos mais graves, sendo que
refere- se a apresentação de falsa denúncia, para dificultar ou até mesmo
impedir a convivência com o filho. É comum a denúncia da prática de abuso
sexual contra a criança ou adolescente. (CUNHA; LÉPORE; ROSSATO;
2011, p. 163).
Segundo Guazzelli (2013, p. 191) “a falsa denúncia de abuso
retrata o lado mais sórdido de uma vingança, pois vai sacrificar a própria
prole; entretanto, é situação lamentavelmente recorrente em casos de
separações mal resolvidas”.
Um caso de falsa denúncia de abuso sexual pode se configurar
para o imaginário da criança ou adolescente em um fato real. A dificuldade
de se provar esse fato como falso, pode fazer com que o alienado seja
afastado do filho por um longo tempo. (CARVALHO; VIEIRA, 2015, p. 103)
Por fim, o inciso VII prevê como ato de alienação parental, a
mudança de domicílio para local distante, visando também impedir a
convivência com um dos pais. Esse impedimento de convivência, nesse
caso, é ampliado aos outros familiares, como por exemplo, os avós.
(CUNHA; LÉPORE; ROSSATO; 2011, p. 164)
Ainda, sobre a forma de ocorrência da alienação parental,
Madaleno (2013, p. 463) ensina:
A síndrome de alienação parental é geralmente
alimentada pelo ascendente guardião, que projeta na
criança ou adolescente os seus sentimentos negativos,
de indignação e de rancores do ex-parceiro. Com o uso
de chantagens de extrema violência mental, sem
nenhuma chance de defesa da criança que acredita
piamente que o visitante não lhe faz bem, e o menor
expressa isso de forma exagerada e injustificada para
rejeitar o contato. Isso quando nos casos mais severos
de alienação um genitor fanático não acrescenta uma
falsa acusação de agressão ou abuso sexual.

Dias (2013b, p. 16) adiciona:

Nestes jogos de manipulações, para lograr o seu


intento, o guardião dificulta as visitas e cria toda forma
de empecilho para que elas não ocorram. Alega que o
filho está doente ou tem outro compromisso. Leva-o
para viajar nos períodos que teria que estar com o outro
genitor. Impede o acesso deste á escola, sonega
informações sobre questões de saúde e muitas vezes
muda de cidade, de estado ou de país. Mas a
ferramenta mais eficaz é a denúncia de práticas
incestuosas.

Para Trindade (2013, p. 23) “A Síndrome de Alienação Parental


manifesta-se, principalmente, no ambiente da mãe, devido a tradição de que
a mulher é mais indicada para exercer a guarda dos filhos, notadamente
quando ainda pequenos”.
Embora a prevalência dos casos de alienação parental seja
praticada pelas mães, em um sentido amplo, o papel de alienador pode
até se estender a outras pessoas que não os próprios pais. Assim, outros
guardiões, como parentes próximos podem surgir na relação, impedindo a
convivência do alienado com o filho.
Pereira (2013, p. 32) ressalta a sutileza de crueldade empregada
em muitos casos de alienação parental:

Os requintes de crueldade do jogo do alienador são


redobrados quando o ex-conjuge/companheiro
estabelece uma nova relação amorosa. É muito comum
que a criança seja impedida pelo alienador de
estabelecer contato com esta nova companheira ou
namorada. E isto, às vezes, se dá de forma bastante
sutil, como, por exemplo, mostrando-se incomodada ou
triste quando a criança volta alegre após passar o final
de semana com o pai ou a mãe.

O alienador, assim como todo abusador, se utiliza da ingenuidade


e da inocência da criança ou adolescente para praticar a alienação parental.
As estratégias de alienação parental são diversas, sempre visando o
distanciamento entre pai e filho, como forma de vingança.

3.3 GUARDA COMPARTILHADA E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA


ATENUAR A ALIENAÇÃO PARENTAL

Considerando a entrada das mulheres no mercado de trabalho,


nos dias de hoje os homens estão cada vez mais participativos na vida dos
filhos, dividindo responsabilidades na criação dos filhos. (PEREIRA, 2012, p.
73)
Da dissolução do vínculo conjugal decorre muitas vezes a vontade
do pai em manter a convivência com a criança ou o adolescente. Segundo
Dias (2013a, p. 473) “Quando da separação, ele não mais se conforma com
o rígido esquema de visitação, muitas vezes boicotado pela mãe, que se
sente “proprietária” do filho, exercendo sobre ele um poder absoluto”.
São inúmeros os efeitos traumáticos provocados pelo fim do
relacionamento dos pais no desenvolvimento psíquico da criança e do
adolescente e juntamente ocorre a perda de contato frequente com um dos
genitores.
Essa perda de convívio entre pais e filhos, muitas vezes é
ocasionada pela alienação parental, muito comum nas separações e
divórcios onde ocorre o litígio. Nesse sentido, verifica-se que a guarda
compartilhada pretende evitar esse distanciamento, incentivando a
manutenção da convivência entre pais e filhos.
No âmbito da guarda unilateral e do direito de visita, há muito
mais espaço para que um dos pais se utilize dos seus próprios filhos como
forma de investir contra seu antigo parceiro.
Sobre a minoração dos efeitos da quebra do vínculo conjugal, a
guarda compartilhada é caracterizada pela manutenção responsável e
solidária dos direitos- deveres inerentes ao poder familiar, minimizando-se os
efeitos da separação dos pais.
Para Gagliano e Pamplona (2013, p. 469) a guarda compartilhada
impede a alienação parental, sendo que como ocorre na guarda unilateral, o
guardião exclusivo não possui a possibilidade de utilizar o filho como objeto
de vingança contra o ex-companheiro, conforme segue:

De outro lado, a guarda compartilhada também possui o


importante efeito de impedir a ocorrência do fenômeno
da Alienação Parental e a conseqüente Síndrome da
Alienação Parental, já que, em sendo o poder familiar
exercido conjuntamente, não há que se falar em
utilização do menor por um dos genitores como
instrumento de chantagem e vingança contra o genitor
que não convive com o mesmo, situação típica da
guarda unilateral ou exclusiva.

Com efeito, as duas grandes vantagens da guarda compartilhada


são a convivência da criança ou adolescente com ambos os pais, não
obstante o fim do relacionamento amoroso entre aqueles, e a diminuição dos
riscos de ocorrência da alienação parental. (GAGLIANO; PAMPLONA, 2013,
p. 469)
Assim, os laços afetivos que foram criados na convivência familiar
podem ser conservados, à medida que ambos os pais poderão participar
efetivamente no desenvolvimento da criança e adolescente, tendo em vista
que o afeto e a cumplicidade são primordiais quando se objetiva esclarecer
possíveis conflitos familiares.
Merece destaque o princípio da afetividade nas relações entre pais
e filhos. Para Dias (2011, p. 71) “o direito das famílias instalou uma nova
ordem jurídica para a família, atribuindo valor jurídico ao afeto.”
Para Pereira (2012, p. 212) “o que se conclui é ser o afeto um
elemento essencial de todo e qualquer núcleo familiar, inerente a todo e
qualquer relacionamento conjugal e parental”.
Dias (2011, p. 72) argumenta que “A teoria e a prática das
instituições de família dependem, em última análise, de nossa competência
em dar e receber amor”.
Assim, o princípio da afetividade deve ser observado, de modo
que sirva de estímulo e amparo para a criança ou adolescente, o que acaba
contribuindo para que a mesma possa ter um desenvolvimento sadio e possa
enfrentar as dificuldades que a vida lhe proporcionará. Somente mantendo a
convivência dos pais com seus filhos torna-se possível preservar a relação
de afeto construída, bem como fortalecê- la.
A guarda compartilhada para Dias (2013a, p. 454) é a
“permanência da vinculação mais estrita e a ampla participação destes na
formação e educação do filho, a que simples visitação não do espaço”.
A guarda compartilhada também estende a convivência da criança
ou adolescente com os demais familiares de ambos os pais. Para Cunha et al
(2011, p. 165) “a criança ou adolescente faz jus não só a presença física de
familiares, mas também a convivência afetiva com seus parentes mais
próximos”.
Dias (2013a, p. 455) traz seu ensinamento:

Agora a guarda compartilhada está definida na lei:


responsabilização e exercício conjunto de direito e
deveres concernentes ao poder familiar (CC 1.583, §
1º). Ocorreu verdadeira mudança de paradigma. Sua
aplicabilidade exige dos cônjuges um desarmamento
total, uma superação de mágoas e das frustrações. E,
se os ressentimentos persistem, nem por isso deve-se
abrir mão da modalidade de convívio que melhor atende
aos interesses dos filhos.

Colaborando para melhor elucidação do instituto da guarda


compartilhada na manutenção da convivência entre pais e filhos, elucida Dias
(2013a, p. 454):

No momento em que ocorre o rompimento do convívio


dos pais, a estrutura familiar resta abalada, deixando
eles de exercer, em conjunto, as funções parentais. Não
vivendo com ambos os genitores, acaba havendo uma
redefinição de papéis. Tal resulta em uma divisão de
encargos. O maior conhecimento do dinamismo das
relações familiares fez vingar a guarda conjunta ou
compartilhada, que assegura maior aproximação física
e imediata dos filhos com ambos, mesmo quando
cessado o vinculo de conjugalidade.
A guarda compartilhada objetiva acabar com os atos abusivos e a
manipulação do poder que costumava ter o guardião na guarda unilateral,
o qual considera a criança como um objeto de posse, que acaba limitando o
convívio dos filhos com um dos pais.
Tanto que dentre as formas de ocorrência da alienação parental
que se encontram elencadas na Lei de Alienação Parental, uma delas
consiste na obstrução da convivência com o outro genitor, fato que pode ser
atenuado com a guarda compartilhada.
Para Dias (2013a, p. 473) “A guarda compartilhada já foi uma
vitória para reverter esse quadro”.
Sobre o tema, Pereira (2013, p. 31) preleciona:

A dissolução da sociedade conjugal não pode e não


deve significar o distanciamento de pais e filhos. Na
esteira deste raciocínio é que surge o instituto da
guarda compartilhada, trazendo uma nova concepção
para a vida dos filhos de pais separados, pois a
separação é da família conjugal e não da família
parental. Ou seja, os filhos não precisam se separar dos
pais quando o casal se separa, e ambos os pais
deverão continuar participando da rotina e do cotidiano
dos filhos.

Assim, Pereira (2013, p. 31) conclui que “a guarda compartilhada é


forte aliada no combate à alienação parental, e pode funcionar como seu
antídoto”.
Para Freitas (2014, p. 96) “a convivência em vez de visita,
certamente será evitada a mazela da síndrome de alienação parental”.
Dessa forma, a guarda compartilhada vem resgatar o clássico
poder familiar, pois os pais, mesmo separados, não perdem o direito de
gerenciar a vida de seu filho igualitariamente. (FREITAS, 2014, p. 97)
A guarda compartilhada é agora a modalidade regra em nosso
ordenamento jurídico. Essa modalidade possui grande poder em sua
nomenclatura, atingindo o sentimento de posse sobre o filho, sendo eficaz
contra a conduta alienadora. (FREITAS, 2014, p. 97)
É de extrema importância a preservação da convivência do filho
com o genitor que está sendo vítima da alienação parental juntamente com o
filho, não somente porque mantém os laços afetivos, mas também para
enfraquecer o comportamento do alienador, para que o mesmo não logre
êxito na sua tentativa de separar o filho do genitor alienado. (MADALENO,
2013, p. 467)
Ainda, importante destacar, que muitas vezes a síndrome da
alienação parental é difícil de ser revertida e, em alguns casos torna-se
impossível. Torna-se um direito de ambos os genitores estarem
integralmente presente na vida de seu filho, a fim de evitar a instalação da
síndrome da alienação parental.
Ademais, a própria Lei de Alienação Parental, em seu art. 6º, V, já
prevê a possibilidade de alteração para guarda compartilhada quando
caracterizada a alienação parental:

Art. 6º Caracterizados atos típicos de alienação parental


ou qualquer conduta que dificulte a convivência de
criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma
ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não,
sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou
criminal e da ampla utilização de instrumentos
processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos,
segundo a gravidade do caso:
[...]
II- determinar a alteração da guarda para guarda
compartilhada ou sua inversão; (BRASIL, 2016-E)

Identificar a alienação parental e evitar que esse processo afete a


criança e o adolescente e se instale a síndrome são tarefas que se impõem
ao Poder Judiciário. Para tanto, o Judiciário necessita de profissionais
capacitados para prevenir e combater a alienação parental, tomando todas
as medidas cabíveis, dentre elas a utilização da guarda compartilhada.
Cabe ressaltar que embora a guarda compartilhada tenha se
tornando um importante instrumento na prevenção e combate da alienação
parental, o alienador poderá continuar alienando a criança ou adolescente.
(CARVALHO; VIEIRA, 2015, p. 97)
Assim, a Lei de Alienação Parental também exerce um importante
papel, orientando os operadores do Direito sobre as medidas a serem
tomadas e, principalmente, punindo o agente praticante da alienação
parental. (CARVALHO; VIEIRA, 2015, p. 97)
Nesse viés, Freitas (2014, p. 97) traz seu entendimento no que
concerne a convivência oriunda da guarda compartilhada na vida da criança
e do adolescente no combate à alienação parental:

Por esta razão, é adequado que a Lei de Alienação


Parental incentive a realização da Guarda
Compartilhada, pois esta permite a aproximação dos
filhos sem a conotação de posse que advém da guarda
unilateral, embora, na prática, a guarda compartilhada,
como instituto, seja o resgate do conceito clássico de
Poder Familiar.
Embora que a aplicação da guarda compartilhada demanda
adequações diversas na rotina dos pais e dos filhos, bem como o esforço
para superação das desavenças advindas do rompimento conjugal, o que se
discute é o saudável desenvolvimento da criança e do adolescente, para que
possam usufruir durante sua formação, das referências de pai e mãe. (REIS,
2016, p. 29)
Contudo, importante ressaltar que não se trata de aplicar a guarda
compartilhada de forma indiscriminada, devendo o magistrado, com base em
estudos realizados por equipe multidisciplinar e nas peculiaridades do caso
concreto, decidir com muita cautela e sensibilidade, qual das modalidades de
guarda atende ao melhor interesse da criança e do adolescente. (REIS,
2016, p. 30)
Nesse sentido, para Nader (2016, p. 401) “A guarda, em qualquer
situação, deve ser exercida com responsabilidade, atendendo-se o melhor
interesse dos filhos”.
Cumpre o Judiciário fazer valer o melhor interesse da criança e do
adolescente, através da aplicação da modalidade de guarda compartilhada,
para que ambos os genitores possam construir uma relação de respeito e
amparo com seus filhos, não permitindo a desconstituição da convivência e
dos laços afetivos intencionada pela prática da alienação parental.

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