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13 | Caderno de estudos

O trabalho com textos narrativos


As narrativas e as crianças
O trabalho com os textos de narrativas proposto nesse conjunto apresenta uma diversidade de situações
que se desenvolvem em sequência, mas não de forma linear. Estão organizadas como em uma espi-
ral, com diferentes níveis de profundidade se alternando entre a oralidade, a leitura e a escrita, e em que as
falas, as ações e os pensamentos são distribuídos entre o professor e as crianças. Os Cadernos de orientações
procuram organizar o trabalho de forma a criar condições para planejar e realizar as atividades dentro de
um percurso no qual as crianças possam conhecer o livro, escutar e ler a história, falar sobre ela e sobre as
ilustrações e os personagens, além de participar de situações de leitura e escrita a partir do texto narrado.
Entretanto, esta proposta não pode ser seguida rigidamente em um caminho único: ela deve ser adequada às
condições de cada grupo de crianças.

Para planejar e desenvolver as atividades propostas, é importante conhecer as decisões sobre os conteúdos e os
procedimentos de atuação e observar atentamente as estratégias que as crianças utilizam em suas aprendi-
zagens. O planejamento de qualquer atividade implica uma tomada de decisões (na leitura em voz alta pelo
professor, por exemplo, implica decidir o que ler, como ler e para que ler). Para dar mais autonomia nessa ta-
refa de adequação de conteúdo, propostas e necessidades de aprendizagem das crianças, justificamos a seguir
algumas das atividades que fazem parte dos Cadernos de orientações deste conjunto.

Conhecer o livro
Apresentação de livros às crianças

Os textos estão nos livros, e estes funcionam como seu suporte. A apresentação de obras impressas para as
crianças ajuda que aprendam conceitos, tais como autor, ilustrador, capa e título, entre outros. Trata-se dos
chamados conceitos letrados, que são aprendidos em contato com o mundo da escrita. Para ajudar na intro-
dução a esse universo, é importante conversar, desvendar a lógica dos livros, nomear seus elementos (capa,
título, ilustração...), falar de estrutura de narrativa (personagem, ação, começo, final) e de atitudes comuns ao
leitor habitual, mas ainda desconhecidas pelas crianças (onde olhar e como manusear os livros, por exemplo).
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Como apresentar um livro


A apresentação de um livro deve ser feita no momento anterior ao da leitura. É o primeiro contato, o
momento de exploração do objeto. É quando a observação e a análise recaem primeiro sobre o “livro por
fora” e depois sobre o “livro por dentro”. Ao falar sobre um livro, o professor apresenta informações sobre
esse objeto. Portanto, é importante que use a terminologia adequada ao se referir a essas características,
por exemplo, autor, editora, capa etc., já que é no contato com esse tipo de material e linguagem que as
crianças aprenderão esses novos conceitos.

Ao apresentar o livro, é preciso estar atento às suas diferentes características. Por exemplo, observar se o
título faz referência ao nome de um herói ou a uma situação, destacar se o tipo de letra traz alguma pista
(o uso de maiúscula indica um nome próprio?) e se as ilustrações indicam um acontecimento importante
ou o surgimento de outros personagens.

Desvendar esse tipo de conhecimento facilita a inserção das crianças no universo da língua escrita. Ajudá-
las a perceber que existem informações “fora do texto” que ajudam a antecipar e compreender o que está
escrito é muito importante para que ganhem maior fluência e habilidade no uso e manuseio de livros.

As crianças precisam ter a oportunidade de entrar em contato com os mais diferentes tipos de livros,
folheando-os e explorando-os para que possam conhecer, aprender e se relacionar melhor com eles, crian-
do familiaridade com o mundo da literatura.

De forma geral, os livros infantojuvenis apresentam as seguintes divisões: capa, guarda (folhas que corres-
pondem à primeira e última páginas de livros), rosto (contém praticamente os mesmos dados da capa e
está no começo do livro), dedicatória, miolo (a parte interna do livro) e créditos (com informações sobre
os direitos e deveres autorais da obra).

Como preparar as crianças para uma boa escuta da história


Essencialmente, é importante criar um clima prazeroso em torno desse momento, de forma a conquistar
as crianças para a hora da leitura. Para isso é importante variar as situações, os espaços em que a leitura
ocorre, a forma com que se propõe o contato com os livros etc. A própria situação de conhecer o livro
(por fora e por dentro) já é um convite especial para que se vinculem ao conteúdo da narrativa. Outra
forma especial é lançando uma pergunta-guia que oriente a escuta das crianças.

Pergunta-guia
É aquela que se faz antes de iniciar a leitura e serve para manter a atenção. É o objetivo da leitura. Pode
criar suspense, despertar o interesse e a curiosidade das crianças, favorecer a escuta do texto e deixá-las
atentas e alertas para a busca de uma resposta.

Como formular uma pergunta-guia


A pergunta-guia deve ser formulada de maneira a traduzir um evento central da história (resumo) ou
chamar a atenção para um aspecto formal do texto. No primeiro caso, é possível lançar uma pergunta,
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antes de iniciar a leitura, criando um suspense para orientar a escuta do texto (como, por exemplo, no
Caderno de orientações Histórias com engano: “Será que o Lobo vai conseguir enganar os cabritinhos?”).
No segundo caso, o professor pode lançar uma pergunta, por exemplo, voltada para o que está escrito no
texto: “Será que aqui está escrita a palavra BRUXA?” A escolha do tipo de pergunta que o professor fará
depende da história e dos objetivos de leitura.

Escutar e ler a história


Situações de leitura
São diversas as situações em que as crianças podem ser convidadas a ler e escutar histórias. Nos Cadernos
de orientações deste conjunto trabalhamos com algumas delas: leitura em voz alta pelo professor, leitura de
partes do texto, leitura compartilhada e leitura teatralizada.

Leitura em voz alta


A leitura em voz alta por parte do professor tem muitos objetivos.

Em primeiro lugar, cria uma situação em que as crianças presenciam o ato de leitura antes de poderem
praticá-la por si mesmas, de forma autônoma.

Em segundo lugar, favorece que se apresente às crianças um bom modelo de leitura e de leitor. Isso devi-
do ao fato de o professor exercer o papel de parceiro mais experiente, que pode fazer uso de expressões e
entonações que favoreçam uma maior compreensão da história e um maior envolvimento com as ações e
personagens da narrativa. A leitura em voz alta pelo professor permite que as crianças tenham acesso a tex-
tos que dificilmente conseguem ler sozinhas, favorecendo, assim que conheçam uma variedade de padrões
da língua, bem como vocabulários e conceitos novos.

Em terceiro lugar, ao realizar uma leitura bem preparada, o professor também contribui para que as crian-
ças desenvolvam o gosto por ouvir histórias. Ao demonstrar seu desejo de que se envolvam com a leitura,
ele funciona como exemplo de leitor e mediador para o acesso a textos que as crianças não teriam autonomia
para ler. Nessa perspectiva, é importante que o professor conheça o texto de antemão, para que possa prati-
car a história treinando o uso da voz e a expressão ao ler.

Leitura compartilhada
As situações de leitura compartilhada propostas nos Cadernos deste conjunto se configuram como momentos
em que as crianças participam da leitura juntamente com o professor, ora lendo partes do texto, ora lendo o
texto todo.

É importante que a leitura compartilhada faça parte da rotina das crianças e seja sistemática. É recomen-
dável garantir um tempo diário para que possam ler e reler suas histórias favoritas e encontrem prazer e
significado nessa atividade. Ao ter a oportunidade de acompanhar a leitura e ler com o professor, a criança
observa as relações existentes entre o discurso oral e o escrito (por exemplo, ao perceber que o ritmo da fala
corresponde a uma parte do texto escrito, ou quando nota que o que está escrito é sempre falado por todos
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do mesmo jeito). O professor também constrói modelos de conceitos sobre a escrita por meio dos movimentos de
leitura na página da esquerda para a direita e de cima para baixo.

Além disso, ao compartilhar a leitura com o professor, é possível para a criança não só ter acesso “ao que
está escrito” como também observar “como” o autor escreveu, ou seja, quais recursos ele utilizou (pontuação,
letras diferentes, efeitos de diagramação etc.).

Ao dar a oportunidade de as crianças lerem junto, elas experimentam diferentes usos e ritmos da voz ado-
tados pelo professor e observam quando ele antecipa os eventos no texto abaixando ou levantando a voz, ou
pela velocidade na qual ele lê a história. Por fim, vale destacar que a oportunidade de participar desse tipo
de leitura possibilita à criança, eventualmente, poder ler o livro autonomamente, com base na experiência de
leitura compartilhada.

Histórias para as situações de leitura compartilhada

A familiaridade da criança com o texto que vai ler é fundamental para que possa interagir na leitura. Co-
nhecer melhor o que vai ler favorece a autonomia leitora, a fluência, a compreensão, o desenvolvimento do
vocabulário e o gosto por aprender.

Os livros de fácil memorização ajudam as crianças a entender como a escrita funciona, a aprender sobre
estrutura de histórias e a reconhecer palavras, além de representar uma fonte de prazer e informação.

Podemos considerar livros de fácil memorização aqueles que possuem histórias:

Com textos rítmicos, pois permitem às crianças realizar antecipações de algumas das palavras. Por exemplo,
os livros Não confunda (Eva Funari, Editora Moderna) e Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente
feliz (Otavio Roth, Editora Ática).

Com repetição no texto, pois nesses há repetição de situações e de palavras, tornando o texto mais previsível.
Os tipos de repetições presentes nas histórias podem se classificar em:

Repetição por justaposição: um ou mais personagens realizam ações sucessivas e que se repetem. Por exemplo,
Cabritos, Cabritões e outras obras citadas no Caderno de Indicações Literárias.
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Repetição por acumulação: a cada parte da história repete-se continuamente o texto da página anterior, somando
uma nova linha. Por exemplo, O grande rabanete, A casa sonolenta e Uma girafa e tanto e outras obras citadas
no Caderno de Indicações Literárias;

Repetição por subtração: vão-se eliminando personagens ao longo da história. Por exemplo, Eram cinco (Ernst
Jandl, Editora Cosac Naify) e Dez sacizinhos (Tatiana Belinky, Editora Paulinas).

As partes do texto que se repetem facilitam a memorização da criança e favorecem uma leitura autônoma de
partes da história.

Com textos com padrão básico de oração, que por sua estrutura dão um apoio ao leitor. Esse padrão básico
poderia ser representado por “Esta é __________” que está repetido em todos os versos com variações na
primeira parte da oração (a casa, a farinha, o gato etc.). A história A casa que Pedro construiu, presente no
livro Histórias de contar (Editora Companhia das Letrinhas), é um exemplo desse tipo de história.

Com textos de duas partes, como, por exemplo, Bruxa, Bruxa, venha à minha festa. Esse tipo de texto pro-
move uma leitura próxima a uma conversação, na qual uma pergunta é feita em uma página do livro e se
determina a resposta na página seguinte.

Memória e repetição nas experiências de leitura e escrita


A memória tem papel importante no processo de elaboração e construção de novos conhecimentos, a partir
de experiências de leitura e escrita. Ela é a responsável pelo trabalho cognitivo e mental da criança. O proces-
so de aprendizagem implica transformação ativa de um conteúdo em novos conhecimentos e habilidades, de
modo que possam ser usados (lembrados) quando necessário.

A incorporação de um novo conteúdo à memória envolve diferentes recursos, como:

Atenção, pois ajuda na seleção da informação a ser processada;

Ativação de conhecimentos prévios (que incluem tanto os conhecimentos e as informações que se têm sobre
o próprio conteúdo como aqueles conhecimentos que, direta ou indiretamente, estão relacionados ou podem
vir a estar relacionados a ele), pois o processo de aprendizagem implica integração do novo conteúdo nos
esquemas existentes;

Codificação e organização do conteúdo integrado, pois à medida que memorizam e utilizam o novo conteú-
do é que se cria a condição para que seja efetivamente integrado aos esquemas existentes;

Metacognição e autorregulação, que possibilitam a transformação do conteúdo em conhecimentos, habilida-


des, motivação e aprendizagem.

Portanto, estimular o desenvolvimento da memória significa promover desenvolvimento cognitivo e mental


das crianças. Quanto mais textos memorizados, maior o repertório de referência no qual podem se apoiar
para enriquecer as novas aprendizagens.
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A repetição, por sua vez, ajuda a fixar a memória. Em todos os níveis da linguagem ocorre repetição: de
fonemas, sílabas, estruturas gramaticais, lexicais etc. A repetição ajuda as crianças a aprender as histórias de
forma que seja possível recuperá-las de memória (mais ou menos literalmente).

Leitura teatralizada
A situação de leitura teatralizada envolve a proposta de as crianças lerem em voz alta ou recitarem os diálo-
gos de uma história usando suas vozes e expressões corporais. Esse tipo de leitura favorece que as crianças
desenvolvam fluência ao ler, pois participam de situações em que ensaiam o texto usando expressividade,
entonação e inflexão. É uma oportunidade de as crianças participarem de leituras repetidas em um contexto
intencional e com significado.

Para potencializar as situações de leitura teatralizada, é importante que o professor realize atividades que
chamem a atenção para elementos da história, enquanto as crianças desenvolvem uma compreensão dos
personagens, cenários, problemas, eventos e soluções.

O Caderno de orientações Histórias clássicas apresenta um conjunto de atividades para esse tipo de leitura,
tendo como referência o conto Chapeuzinho Vermelho.

Falar sobre a história


O que falar sobre a história
São muitas as possibilidades de conversas após a leitura de uma história: comentar o texto, falar sobre o que
foi compreendido, deixar que as crianças façam perguntas e deem respostas. A atividade de comentar um
livro pode ser extremamente rica e ter diferentes focos. É importante ter em mente a diferença entre “falar
sobre o livro para as crianças” e “falar com as crianças a partir de um livro”. No primeiro caso, damos infor-
mação de maneira que elas possam se aproximar mais da história ou da maneira como o texto foi escrito. A
conversa gira em torno do que está proposto: ao falar com as crianças, criamos condições para que o livro
(seja em razão de seu conteúdo, seja de sua forma) dispare relações e comentários que dão lugar a expe-
riências particulares de cada uma delas. É um momento de troca, em que é possível aprender a se colocar,
interagir e conhecer o ponto de vista de cada um. Esta é uma experiência importante que pode começar
desde muito cedo.

Relação entre a compreensão da história e a apresentação do texto


É possível representar o conteúdo de uma história,
sua estrutura ou o discurso que nela se expressa de
diferentes formas.

As histórias com textos repetitivos, como, por exem-


plo, Cabritos, cabritões, são facilmente representáveis,
seja pelos eventos narrados (os encontros do persona-
gem Ogro), seja pelos objetos da narração (os cabritos
com quem o Ogro se encontra), seja pela visualização
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do itinerário narrativo (o Ogro encontra-se com Cabrito na ponte), em um caminho linear. Ao favorecer
que as crianças pensem sobre essas representações, ampliam-se as possibilidades de compreensão de textos
narrativos. Essas situações ajudam as crianças na compreensão da história e do discurso.

A estrutura da narrativa
Estrutura da narrativa, ou “gramática da história”, são as regras formais que descrevem as sequências tempo-
rais e a relação causal dos acontecimentos de uma história. É o esquema do relato da narrativa.

Para que o leitor ou ouvinte possa interpretar a sucessão de ações, e para que o texto tenha coerência, não
basta uma relação cronológica. É necessária também uma relação de causalidade lógica para explicar as
transformações que ocorrem a partir da ação de algum personagem. Isso formará um todo, ou seja, começo,
meio e fim da história.

Por exemplo, nos contos populares, a estrutura possui uma situação inicial, um final em que há uma resolução e um
meio em que uma transformação justifica a passagem do início para o fim. A estrutura da narração consiste em:

Situação inicial para propor a história;

Apresentação do momento, do lugar, das personagens e da situação inicial;

Complicação e transformação que introduzem uma quebra no desenvolvimento dos eventos;

Avaliação dos fatos;

Solução que indica que a história terminou (às vezes, com uma inversão da situação inicial: pobre-rico, infeliz-feliz etc.).

Ajudar as crianças a entrar nessa dimensão de um texto pode ser bastante promissor, no sentido de trans-
formá-las em futuros leitores autônomos. Estaremos favorecendo a que compreendam o texto à medida que
conversamos sobre a estrutura da história e propomos atividades que as ajudem a entender esse esquema
que dá sustentação às histórias.

Falar sobre a estrutura da narrativa


Em uma simples conversa bem preparada é possível fazer as crianças refletirem sobre aspectos que nem
sempre ficam evidentes na narrativa. Conforme conhecem outros livros, elas vão se tornando capazes de
apreender conhecimentos para além do conteúdo imediato e identificar regularidades que se apresentam
nos diferentes textos. Conversas voltadas para a estrutura da narrativa fazem com que as crianças, aos pou-
cos, ganhem liberdade no universo letrado e passem a ter de fato uma participação ativa no universo dos
livros. Quando o professor lança questões que deixam clara a estrutura da narrativa – onde, quem, o que,
quando, como e por que –, está facilitando a identificação de aspectos-chave da organização do texto.

A essas perguntas, as crianças respondem retomando a sequência da narrativa, fixando-se primeiro no


QUEM e depois no QUE, ONDE, QUANDO e COMO aconteceu a trama, além de quais são os persona-
gens secundários envolvidos. Esses aspectos estão relacionados à ordem da sequência de acontecimentos da
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história (sequência cronológica) e ao seu conteúdo.

O somatório de diferentes oportunidades para fazer esse exercício para as diferentes histórias que são lidas é
que criará condições para que compreendam como se dá o desenvolvimento temporal da narração. Mas tam-
bém é importante entender o encadeamento causal que explica o PORQUÊ do conflito central da história e o
desenvolvimento dos eventos até o desenlace.

Falar sobre a ilustração


As ilustrações nos livros
Em contato regular com livros, as crianças iniciam-se na aprendizagem relativa às ilustrações, que são uma
linguagem visual. Existe uma grande variedade de materiais, técnicas e recursos gráficos para fazer ilustra-
ções. Elas podem ser feitas com desenhos, gravuras, imagens de vídeo, esculturas, massa de modelar que
depois são fotografadas etc. Esses trabalhos podem vir em papéis especiais, no formato de carimbo, feitos
com nanquim, tinta pastel e com efeitos de luz, entre outras possibilidades.

É importante perceber que algumas ilustrações apresentam a narração, outras complementam ou agregam
informações ao texto, enriquecendo a compreensão da história. O conceito de ilustração é muito amplo e não
pode se restringir a um simples sinônimo de desenho, que é uma das técnicas que podem ser utilizadas.

As crianças podem compreender melhor a narrativa, se apropriar do texto de


forma significativa e até mesmo desenvolver noções de estética se elas forem
chamadas à atenção para as ilustrações dos livros. Basta propor diferentes situa-
ções que as convidem a pensar sobre as relações que as ilustrações estabelecem
com o texto (já lido e memorizado), usando-as como recursos para que pensem
sobre a estrutura da história, seu conteúdo, personagens etc.

Como observar uma ilustração


As ilustrações de um livro passam diversas informações que podem ser trabalhadas com as crianças. A seguir,
há uma série de sugestões de abordagens possíveis para orientar uma eventual conversa com as crianças:

Como a ilustração se relaciona com o texto? É preciso investigar de que maneira texto e imagem se comple-
mentam. No livro A casa sonolenta, as páginas se apresentam em dupla: de um lado, onde há o texto, desta-
cam-se os diferentes personagens que são introduzidos na história; no outro, sem texto, a ilustração ocupa a
página toda, mostrando a acumulação dos personagens e reforçando a repetição do texto, já que a ilustração
é praticamente a mesma, acrescentada apenas de um novo personagem.

Qual a técnica utilizada? É colagem, pintura, pena, lápis, fotografia? Existe alguma relação entre a técnica
escolhida e a história contada?

Qual o estilo artístico da ilustração? É arte popular, realismo, impressionismo, história em quadrinhos? Esse
estilo se relaciona com a história, com o tema?
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Qual o tamanho, o formato, o tipo de letra? São apropriados para o tema, o tom e o entendimento do livro?
Por exemplo: um fundo preto com letras tremidas ajusta-se a uma divertida história de terror.

Quais os elementos componentes? Linha, espaço, uso da cor, perspectiva: como esses detalhes colabo-
ram com a história? Por exemplo, no livro Bruxa, Bruxa, venha à minha festa, parece que há uma lente de
aumento nas ilustrações; no livro O rei Bigodeira e sua banheira, cada cena ocupa duas páginas inteiras.

Que reação a ilustração provoca? Por exemplo, em livros nos quais as imagens de animais são humanizadas,
elas em geral causam simpatia e afetividade nas crianças.

Essas informações são úteis para organizar as atividades. Nos Cadernos de orientações deste conjunto, são
diversas as atividades que usam as ilustrações do livro ou os desenhos produzidos pelas crianças. Vamos ver
algumas delas:

Ordenar ilustrações e corresponder com o texto

Ordenar as ilustrações de uma história favorece que as crianças se apropriem de alguns conhecimentos bási-
cos sobre o texto, como a ordem temporal ou cronológica que explica a sucessão de fatos relatados.

Ilustrar e ordenar partes da história

Ao propor às crianças que ilustrem ações da história e as ordenem, favorece-se que retomem a história de
memória e compreendam melhor o encadeamento das ações na narrativa, apropriando-se de sua estrutura.

Ilustrar os personagens da história

Ao pedir que as crianças recuperem de memória quem são os personagens da história e os desenhem,
possibilita-se que elas atentem para detalhes do texto e da ilustração do livro. E ao propor que organizem
suas ilustrações na sequência em que aparecem no texto, se favorece que recuperem a ordem da história e
compreendam a função dos personagens na narrativa.

Falar sobre os personagens


Os personagens nas narrativas
Uma das formas de as crianças perceberem
algumas características dos textos narrativos é
observando a função dos personagens. Os perso-
nagens costumam ser apresentados na narração
por meio de uma série de recursos:

Uma designação – com o nome da personagem;

Uma descrição – por meio de suas característi-


cas físicas, mentais, morais ou de conduta;
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Uma série de ações e intenções – que explicam o desenvolvimento da história.

Em uma atividade em que se pensa sobre os personagens e suas características, as crianças têm mais uma
oportunidade de melhorar a sua compreensão da história contada na narrativa.

Ações e intenções dos personagens


Nas narrativas, explicam-se as ações e intenções dos personagens. As ações se transformam em eventos e
as intenções, em desejos, emoções, enganos etc. Ao propor às crianças que falem sobre as ações e diálogos
dos personagens, favorecemos que compreendam os eventos da história. Por exemplo, saber que o Lobo, no
conto Chapeuzinho Vermelho, é um personagem mau que tenta, nos diferentes episódios da história, enganar
a menina e sua vovó ajuda as crianças a compreenderem por que em alguns momentos o Lobo diz uma coisa
quando na verdade quer dizer outra.

É importante considerar que o professor precisa ajudar as crianças a compreender as intenções que estão
por trás das ações e falas dos personagens, desvendando melhor o enredo da história. Isto se faz necessário,
principalmente, porque muitas vezes o texto não é suficientemente explícito.

As histórias com engano são textos que favorecem essa aprendizagem. Para saber se as crianças realmente
compreenderam as intenções dos personagens, é preciso parar a leitura nas situações de engano e fazer per-
guntas em que elas tenham de pensar sobre a relação entre os fatos, as falas e as intenções dos personagens.
Por exemplo, na história Os sete cabritinhos, é preciso parar e perguntar: “Por que o Lobo imita a voz da Ca-
bra quando tenta entrar na casa dos cabritinhos”. Ou na história Chapeuzinho Vermelho, parar de ler quando
a menina chega à casa da vovó e perguntar às crianças quem elas acham que Chapeuzinho vai encontrar.

Ao propiciar esse tipo de análise das histórias, favorece-se que desenvolvam capacidades importantes que ele-
vam a compreensão dos fatos para além de um plano apenas literal. A partir de indícios e pistas, as crianças vão
aprendendo a identificar possíveis oposições entre intenção e ação, tão presentes na vida.

Participar de atividades de leitura e escrita


Relação entre a aprendizagem da leitura e da escrita
A leitura e a escrita são atividades de linguagem profundamente relacionadas. A grande diferença entre a
aprendizagem delas é que, ao escrever, a criança realiza uma produção na qual coloca em jogo uma série de
conhecimentos e teorias que lhes são próprias. Ao participar de situações que a convidem a pensar sobre como
se escreve, a criança organiza internamente suas ideias e pode ir avançando em relação a esse conhecimento.

Por outro lado, ao ler, o desafio colocado à criança é que se ajuste à intenção e ao pensamento de outra pessoa
(o autor do texto). Trata-se de algo exterior a ela. No momento em que se depara com a necessidade de
“ler” um texto, a pergunta que se faz é: “O que será que está escrito aí?”

Apesar dessa diferença, o aprendizado da leitura está diretamente relacionado ao da escrita. À medida que têm
a chance de escrever, as crianças vão arriscando possibilidades, estabelecendo relações e avançando em sua
compreensão. Ao serem postas diante do desafio de escrever, são “desafiadas” a produzir e, portanto, a colocar

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