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O Pentecostalismo é, na América Latina, o segmento religioso do

Cristianismo que mais cresce. Tem suas origens nos EUA do começo do
século XX, nos acontecimentos da escola bíblica de Charles Fox Parham, em
Topeka. Este foi o primeiro a teorizar que a fala em línguas sempre
acompanharia a experiência do Batismo no Espírito Santo. O avivamento se
expandiu ao redor do planeta a partir de dois centros de irradiação principais: a
Apostholic Faith Gospel Mission3 da Azuza Street, dirigida por William J.
Seymour, em Los Angeles, Califórnia, e o círculo eclesiástico protagonizado
por William H. Durham, em Chicago, Illinois.
No dia 19 do mês de novembro de 1910, Daniel Berg e Gunnar Vingren,
dois imigrados suecos nos EUA, onde foram influenciados pelas ideias de
Durham, desembarcaram em Belém, no Pará, para começar a obra missionária
da qual surgiriam as Assembleias de Deus no Brasil. Neste empreendimento,
foram ajudados inicialmente pelas igrejas norte-americanas de imigrados
escandinavos e, predominantemente a partir do ano de 1914, pelo Movimento
das igrejas livres da Suécia, através da mediação de Lewi Pethrus, pastor da
igreja Filadélfia de Estocolmo.
As Assembleias de Deus, durante mais de cem anos de sua história,
marcaram o panorama religioso brasileiro com sua peculiaridade teológica,
litúrgica e eclesiástica. À luz da presença, no ethos assembleiano, de traços de
duas matrizes estrangeiras, a escandinava e a norte-americana, esse labor se
propõe pesquisar qual das duas foi predominante na construção da identidade
da denominação. Na consideração de que as primeiras duas décadas de sua
existência foram cruciais para tal processo, a pesquisa foi limitada aos anos de
1910 a 1930.
No ano de 1930, de 5 a 10 de setembro, a conferência de Natal produziu
decisões fundamentais para o futuro desenvolvimento da denominação,
tornando-se um marco importante na história dessa igreja. A partir dessa
conferência e em força de suas decisões, os pastores nacionais que operavam,
sobretudo, no Norte e Nordeste do Brasil, assumiram a direção dos trabalhos
mais importantes e desenvolvidos do país. As hipóteses que dirigiram a
pesquisa foram três:
1) as primeiras duas décadas da missão pentecostal no Brasil, da
chegada dos pioneiros missionários suecos até a entrega da direção dos
trabalhos aos pastores nordestinos, do ano 1910 ao 1930, foram determinantes
e cruciais para a formação da identidade assembleiana;
2) entre as duas matrizes estrangeiras, a norte-americana e a
escandinava, uma das duas foi predominante para o estabelecimento do ethos
das Assembleias de Deus;
3) os elementos originários constitutivos da influência estrangeira foram
mediados e reelaborados pelo contexto social, cultural e econômico brasileiro.
Esse processo de adequação teve no corpo dos pastores nordestinos, que
cooperaram com os missionários estrangeiros desde o começo e assumiram a
direção a partir de 1930, seu agente privilegiado.
A metodologia empregada na pesquisa consta da utilização,
principalmente, de fontes originais em língua sueca, quais as cartas e relatórios
que os missionários enviaram a seu país e que foram publicados no órgão
oficial do Pingströrelse4, o Evangelii Härold5, fundado por Lewi Pethrus em
1915. Livros e obras literárias de autores contemporâneos suecos e norte-
americanos, pesquisadores sobre assuntos ligados ao Pentecostalismo
escandinavo, foram também utilizados, junto aos relatos dos pioneiros da obra,
Vingren e Berg, elaborados e publicados pelos respectivos filhos. Obviamente,
o acervo da historiografia oficial assembleiana e, parcialmente, batista entraram
no compêndio da pesquisa.
A pesquisa evidenciou a influência predominante, na construção da
identidade das Assembleias de Deus, do Movimento das igrejas livres da
Suécia, o Pingströrelse. Este nasceu da institucionalização do avivamento
pentecostal sueco, a partir da ação de Lewi Pethrus, pastor da igreja Filadélfia
de Estocolmo, a maior igreja livre daquele país. Pethrus foi, igualmente, o ator
principal nos bastidores da missão pentecostal da Suécia no Brasil, enviando e
sustentando muitos dos missionários que vieram do país nórdico, além de
ajudar os que procederam dos EUA e alguns dos obreiros nacionais. Ele foi,
também, o pregador da conferência de Natal 1930, durante a qual expressou
sua opinião favorável à entrega da direção dos trabalhos originados da missão
sueca aos líderes nordestinos.
Na consideração de todos estes fatores, pode-se afirmar que o ethos do
Pingströrelse6, o Movimento pentecostal da Suécia, moldado e dirigido por
Lewi Pethrus, forneceu, através da Missão pentecostal sueca no Brasil, muitos
dos elementos constitutivos presentes na maneira de ser das Assembleias de
Deus. Evidenciou-se, doutro lado, que houve uma amalgamação destes com
os elementos socioculturais nordestinos, trazidos pelos pastores nacionais.
Este processo está à base da construção da identidade teológica, litúrgica e
eclesiástica da denominação, permitindo que as Assembleias de Deus no
Brasil sejam definidas como uma igreja sueco-nordestina (FRESTON, 1992).
Essa monografia consta, junto com esta introdução e as considerações
finais, de três capítulos, nos quais os vários temas foram elaborados. No
capítulo dois, foi apresentada a história do avivamento pentecostal moderno, a
partir de suas origens nos EUA, no começo do século XX, sua chegada à
Escandinávia, o surgimento do Pingströrelse, o Movimento pentecostal da
Suécia, com suas características e peculiaridades, e uma descrição da
atividade da Filadelfiakyrkan i Stockholm, a igreja Filadélfia de Estocolmo, e de
seu pastor, Lewi Pethrus, a personalidade mais marcante do panorama
eclesiástico do Pentecostalismo sueco.
O capítulo três trata da atividade da missão pentecostal sueca no Brasil,
durante as décadas de 1910 e 1920. O operado dos pioneiros, Daniel Berg e
Gunnar Vingren, e dos primeiros missionários suecos que cooperaram com
eles no desenvolvimento da obra no Brasil, Otto Nelson, Samuel Nyström,
Frida Vingren, foi pesquisado e descrito, prestando particular atenção à história
não contada pela historiografia oficial: episódios e anedotas foram retirados,
sobretudo, das cartas pessoais enviadas pelos nórdicos para seu país. O
capítulo se conclui com uma lista das demais missionárias e missionários
suecos e sueco-americanos que chegaram ao Brasil nos anos de 1910 a 1930.
No quarto capítulo, foram individuados os traços da influência sueca na
construção da identidade assembleiana e analisado o processo de adequação
sócio-cultural operado pelos pastores nacionais, que deu origem ao ethos
sueco-nordestino das Assembleias de Deus no Brasil.

2 O PENTECOSTALISMO NA SUÉCIA
Djurfeldt (2007) afirma que o Pingströrelse, o Movimento pentecostal
sueco, não apareceu do nada, mas é parte de um avivamento espiritual
mundial, centrado na esperança de um novo Pentecostes. Não surgiu do vazio,
antes está correlato a outros avivamentos que aconteceram no seio da
Cristandade e que experimentaram o falar em línguas e o interesse por
milagres e sinais de cura, tendo contemporaneamente suas próprias
peculiaridades.
Uma onda proto-pentecostal já tinha acontecido, a começar da cidade de
Eskilstuna na Suécia, em volta do ano de 1890. Em sua autobiografia, Pethrus
relatou de manifestações carismáticas entre oficiais do Frälsningsarmé 1,
durante a última década do século XIX:
[...] John Brandéli, Gottfrid Leander, Aron
Eriksson, B. A. Bengtsson e Erik Jederblom [...]
haviam pertencido a um movimento chamado "O
Batalhão da Explosão", um rompimento do Exército
da Salvação que surgiu em 1890. Alguns oficiais do
Exército da Salvação foram batizados no Espírito
Santo, falaram em línguas e profetizaram
(PETHRUS, 2004, p. 108-109).

Essas pessoas, já batizadas no Espírito, se tornaram, posteriormente,


participantes do Movimento pentecostal sueco e membros da igreja Filadélfia
de Estocolmo, dirigida por Pethrus. Nesse Sprängbataljon 2, se pregava
salvação, batismo no Espírito Santo com fala em línguas como no dia de
Pentecostes, cura divina pela fé e a iminente volta de Jesus. Isso permite
descrever o Sprängbataljon como um primordial movimento pentecostal que,
no ano de 1899, contava com 425 membros e nove igrejas (GÄRESKOG;
GÄRESKOG, 2011).

2.1 AS ORIGENS AMERICANAS DO MOVIMENTO PENTECOSTAL


MODERNO
O Movimento pentecostal sueco teve sua origem nos acontecimentos
que sacudiram o ambiente eclesiástico norte-americano no começo do século
XX e que, em seguida, deviam se espalhar pelo mundo afora. A respeito do
nascimento do Movimento pentecostal nos EUA, deve-se considerar que:

1
Exército da Salvação.
2
Batalhão da Explosão. Coloquialmente, conforme a gíria pentecostal, pode ser traduzido como
“Batalhão Pipoca”.
O Movimento pentecostal é geralmente datado de Janeiro de 1901,
quando Charles Fox Parham, o líder de uma pequena escola bíblica em
Topeka, afirmou que o falar em línguas sempre evidenciaria o autêntico
batismo com o Espírito Santo (BLUMHOFER, 1993, p. 2, tradução nossa).
A partir da experiência da escola bíblica de Charles Parham em 1900,
em Topeka, Arkansas, o avivamento percorreu os EUA e chegou à cidade de
Los Angeles, na Califórnia, através de William Joseph Seymour. Este foi o
agente mais conhecido de um avivamento de “mil dias”, entre os anos 1906 a
1909, que, sucessivamente, se expandiria às demais cidades norte-americanas
e ao redor do planeta. Três são as personalidades principais destes
acontecimentos nos EUA: Charles Fox Parham, William Joseph Seymour e
William H. Durham.

2.1.1 Charles Fox Parham


O evangelista e pregador americano Charles Fox Parham (1873-1929), é
considerado o primeiro expoente do Pentecostalismo moderno. De família
metodista, freqüentou um seminário da denominação, abandonando-o em
seguida por ser da ideia que o pregador devesse utilizar a inspiração divina
direta, e saiu da denominação para fundar seu próprio ministério itinerante no
Estado do Kansas. Em seguida a uma experiência pessoal de cura divina,
começou a pregar sobre o assunto em 1897, rejeitando o uso de
medicamentos.
Influenciado pelas doutrinas de Frank Sandford9, no outubro de 1900
abriu uma escola bíblica em Topeka, no Kansas, o Bethel Bible College 3, com
cerca de quarenta alunos. Único livro de texto era a Bíblia, com o Espírito
Santo como professor e Parham sendo o seu porta-voz (HYATT, 2004). Este
era contrário a cobrar mensalidades e recolher ofertas durante os cultos, em
sua radical compreensão da vida de fé cristã (BLUMHOFER, 1993). Terminado
o curso, Parham impulsionou os alunos à oração e busca da evidência da
descida do Espírito Santo e, no dia 1 de janeiro de 1901, na ausência de
Parham, Agnes Ozman foi batizada no Espírito com manifestação do falar em
línguas.

3
Escola Bíblica Bethel.
Charles Parham foi o primeiro a associar a glossolalia ao batismo no
Espírito, considerando aquela ser a evidência deste. Essa posição teológica
marcou a distinção do Pentecostalismo moderno dos precedentes avivamentos
carismáticos. Ele, também, em suas pregações encorajava os crentes a se
vestir elegantemente, para atrair as pessoas ao estilo de vida cristão. No ano
de 1905, mudou a escola bíblica para Houston, Texas, onde permitiu a diversos
Afro-americanos, entre os quais William J. Seymour e a pastora Lucy Farrow,
de participarem das aulas, ainda que do corredor. Apesar de ser
posteriormente acusado de racismo e simpatia ao Ku Klux Klan 4, Parham foi
um precursor nas críticas à separação racial. Nesse sentido, ele costumava
pregar em igrejas de negros e convidava pregadores negros nos seus cultos.
Hyatt escreve que:
Quando a vida de Parham é avaliada no
contexto social, jurídico e religioso de seu tempo, o
que emerge não é nem um santo cruzado pela
igualdade racial nem um racista fanático. O que
emerge é um indivíduo que, em muitas maneiras,
reflete os tempos nos quais vivia, em que a
segregação racial era geralmente aceita e praticada
pelo país afora. Mas o que também emerge é um
indivíduo que, em tempos críticos, tinha vontade de
romper com os padrões culturais e atravessar as
linhas raciais, quando isso não era a coisa mais
popular a fazer. [...] Charles Parham merece o
crédito por elevar o tom da abertura e harmonia
inter-racial que prevaleceu por um tempo no início
do Pentecostalismo (HYATT, 2004, tradução nossa).

Em visita às reuniões de Seymour na missão da Azuza Street, em Los


Angeles, Parham criticou os cultos dirigidos pelo ex-aluno, ficando ressentido
pelo seu sucesso na 9 Frank Sandford (1862-1948), líder da seita apocalíptica
“The Kingdom”, fundou uma comunidade no Estado americano do Maine, cujos
membros viviam “pela fé”, sem trabalho remunerado, e cria nas curas divinas.
Identificou a si mesmo, por suposta revelação de Deus, como o Rei Davi de
Israel e como Elias, o profeta do A.T., sendo também convencido de ser uma
das duas testemunhas do capítulo 11 do livro de Apocalipse.
liderança do Movimento que ele tinha criado. Isso e uma acusação de
homossexualismo provocaram-lhe o abandono da parte dos novos líderes do
avivamento, preocupados em buscar respeitabilidade diante da sociedade
(BLUMHOFER, 1993).
4
Grupo suprematista branco.
2.1.2 William Joseph Seymour
William J. Seymour (1870-1922) era filho de ex-escravos católicos.
Convertido ao Metodismo, se tornou aluno, junto com a pastora Lucy Farrow,
de Parham na escola bíblica em Houston, no ano de 1906, onde apreendeu as
ideias sobre o batismo no Espírito, sem porém experimentar pessoalmente. No
mesmo ano, mudou-se para Los Angeles, para assumir uma igreja, onde ele
começou a expor a doutrina pentecostal. Rejeitado, teve que abandonar a
igreja e organizou um grupo de oração na casa de Richard Asberry, situada no
endereço 214 North Bonnie Brae Avenue 5. O propósito declarado do grupo era
buscar “The Second Shower of the Latter Rain” 6, como era chamado o
derramamento do Espírito.
A falta de resultados levou Seymour a pedir ajuda à sua mentora, a
pastora Lucy F. Farrow, de Houston, batizada no Espírito Santo, que
programou uma campanha de jejum e oração e, fatidicamente no "décimo dia",
o Espírito caiu sobre o grupo e alguns dos presentes começaram a falar em
línguas. O primeiro batizado, no dia 9 de abril de 1906, foi Edward Lee, com
evidência do falar em línguas. No dia 12 de abril, Lucy Farrow impôs as mãos
sobre Seymour, que foi batizado no Espírito. Os acontecimentos da casa
atraíram o interesse de muito povo. Seymour, então, transferiu as reuniões
para um prédio na Azuza Street, um templo abandonado da Igreja Metodista
Africana, no dia 13 de abril, onde a missão recebeu o nome de Apostolic Faith
Gospel Mission7, por se considerar parte do Movimento de Parham.
No edifício da Azuza Street, os bancos de madeira eram colocados ao
longo dos quatros paredes, como nas sinagogas judaicas. A mistura racial, em
um país com legislação segregacionista, e a presença feminina eram notáveis
durante os primeiros acontecimentos do avivamento pentecostal. Este ganhou
rapidamente o interesse da imprensa nacional e internacional, e durou cerca de
três anos, de 1906 a 1909.
Pode-se ver, entre as manifestações carismáticas daquelas reuniões, a
presença não somente da glossolalia8, mas da xenolalia9 também. Isso ficou
importante na compreensão de Seymour e seu grupo, que entendiam esse
5
A casa ainda existe hoje em dia.
6
O Segundo Derramamento da Chuva Serôdia.
7
Missão Evangélica da Fé Apostólica.
fenômeno como um sinal legitimador de sua experiência, conforme At 2.4-6, e
como uma indicação do futuro lugar de trabalho de evangelização da pessoa
que recebia a língua desconhecida (ALVARSSON, 2007). Tanto Farrow como
Seymour foram influenciados, através de Charles F. Parham, professor de
ambos, pelos ensinos de Frank Sandford de que a xenolalia era o último e
definitivo sinal exterior a ser usado na obra missionária, sendo, portanto, inútil o
estudo linguístico para o serviço missionário. Essa teoria foi abandonada aos
poucos pelo movimento depois das primeiras malsucedidas tentativas de
colocá-la em pratica.
Além da simplicidade nos cultos e da abertura aos milagres, típicos do
metodismo pioneiro entre os escravos afro-americanos, o avivamento
pentecostal evidenciou, desde o início, uma marcada perspectiva escatológica.
O segundo Pentecostes era interpretado como o início do tempo do fim, o que
realçava a importância da missão frente à iminente segunda vinda de Cristo.
Isso se revelaria, sucessivamente, de extrema importância na compreensão
querimática10 do Pingströrelse11, em seus esforços missionários pelo mundo
afora. No dia 20 de abril, somente sete dias depois de chegar ao edifício na
Azuza Street, os primeiros missionários foram enviados para expandir a
mensagem pentecostal ao mundo. Muitos dos líderes da missão da Azuza
Street saíram para fundar igrejas dirigidas à evangelização de vários grupos
étnicos, a maioria entre os pobres e marginalizados.

2.1.3 William H. Durham


O americano William H. Durham (1873-1912) se converteu na igreja
batista e, em seguida a uma visão, dedicou-se ao ministério integral, tornando-
se pastor de uma igreja Holiness12 situada numa região de muita imigração, em
Chicago, no Estado americano do Illinois, no ano de 1901. Por ele considerar
as estruturas eclesiásticas denominacionais como um grande obstáculo à
causa de Cristo, entrou na simpatia dos líderes do movimento da Azuza Street,

8
Glossolália é a capacidade de falar ou emitir sons em um idioma ininteligível e desconhecido entre a
humanidade.
9
Xenolália é a capacidade de falar em uma língua estrangeira que o indivíduo desconhece, a qual não
aprendeu nem foi exposto. No grego, xenos significa "estranho" e lalia "linguagem".
10
Referente à pregação do Evangelho.
11
Movimento pentecostal da Suécia.
12
Pertencente ao Movimento da Santidade.
que ele visitou no ano de 1907. De retorno a Chicago, o avivamento se
expandiu na sua igreja, fazendo dele uma figura proeminente do
Pentecostalismo na cidade. Muitos pastores, ministros e pessoas comuns
vieram do país e do exterior para participar de seus cultos, experimentando o
batismo no Espírito Santo e as curas instantâneas, entre eles Aimee Semple 13.
A igreja de Durham se tornou um centro para a expansão do avivamento no
mundo. Daniel Berg, pioneiro ao Brasil, foi um dos membros da igreja de
Durham em Chicago (REILY, 1984) e foi por ele influenciado (CAUCHI, 2004).
Teologicamente, Durham defendia a doutrina do “Finished Work” 14, em
contraste com a doutrina da santificação defendida pelo Movimento Holiness e
pela maioria das igrejas protestantes da época. Ele declarava que o que o
crente precisava estava embutido na obra consumada por Cristo no Calvário,
no momento da justificação do pecador. Os benefícios do Calvário seriam
disponíveis aos fieis ao longo de toda sua vida cristã, ao contrário da crença
Holiness, de que a santificação era uma experiência instantânea subsequente
à conversão.
Em 1911, Durham mudou-se para a cidade de Los Angeles, na
Califórnia, por causa de atritos com as lideranças da denominação em Chicago
e por desejar se sediar na cidade que ele considerava ser o lugar de
nascimento do avivamento. Durante uma viagem de Seymour para fora da
cidade, Durham foi convidado para pregar na Missão da Azuza Street, onde
suas ideias tiveram grande consenso. Ao seu retorno, Seymour e Durham
discutiram sobre o assunto, sem chegar a um acordo sobre as diferenças
doutrinárias, e o segundo foi impedido de continuar as pregações na Missão
Apostólica. Ele, então, alugou um grande edifício nas vizinhanças, onde
conseguiu reunir, com suas pregações, milhares de crentes, com conversões e
batismos no Espírito. Contemporaneamente, a velha missão da Azuza Street ia
se definhando rapidamente. Acometido por uma pneumonia durante uma
viagem a Chicago, Durham veio a falecer no ano seguinte.

2.2 OS SUECOS PRESENTES NAS REUNIÕES DA AZUZA STREET, EM


LOS ANGELES.
13
Posteriormente, Aimee McPherson, canadense, fundadora da Four Square Gospel Church (Igreja do
Evangelho Quadrangular), em Los Angeles, nos EUA.
14
“Obra Consumada”.
Proporcionalmente, havia um grande número de suecos presentes nas
reuniões no edifício da Azuza Street, possivelmente porque eram originários de
um país que não tinha questões raciais e com uma cultura simples e
etnicamente homogênea (ALVARSSON, 2007). Os nomes de alguns são: H.
Olsson; os casais de futuros missionários Adolph e Linda Johnson e Gustaf e
Ellen Lundgren; Jennie Jacobson, Agnes Jacobson, Conrad Björkman e Ludvig
Gustafson, L. G. Österberg, Eric Hollingsworth e esposa, que, com Andrew G.
Johnson e duas jovens mulheres suecas, participavam já desde as reuniões na
casa da North Bonnie Brae.
Andrew G. Johnson era o nome americanizado, costume comum aos
imigrantes da época, de Anders Gustaf Johansson, nascido no ano de 1878 na
cidade sueca de Skövde15, e que foi o sueco mais ativo do grupo. Tinha se
convertido dois anos antes e batizado na Califórnia, trabalhava como vendedor
e viajava pregando e vendendo livros e folhetos. Conheceu Seymour durante
uma pregação deste e os dois se reuniram no grupo de oração na North Bonnie
Brae e, posteriormente, na Azuza Street. O desejo da experiência do batismo
levou Anders Johansson a subir ao cume de uma montanha vizinha à cidade,
para lutar em oração com Deus. Retornado às reuniões, pediu para que lhe
fossem impostas as mãos e, a seguir, recebeu seu batismo pentecostal e
começou a falar uma língua, que ele julgou ser um dialeto dos índios norte-
americanos. Essa peculiar compreensão do fenômeno da xenolalia se tornou
importante para a vida de Anders Johansson e, subseqüentemente, para o
Movimento pentecostal sueco.

2.2.1 O primeiro missionário do avivamento da Azuza Street


Conforme Alvarsson (2007), o primeiro missionário a ser enviado pelos
líderes da Missão da Azuza Street foi Anders Gustaf Johansson, o qual, junto
com Louise Condit e Lucy Leatherman, formava um grupo que tinha como
destino a Palestina, por supostamente julgar ter recebido do Espírito línguas do
Oriente Médio. Johansson se dirigiu primeiramente para Chicago, onde
encontrou o pastor William H. Durham, que foi despertado para a busca do
batismo no Espírito em seguida ao encontro, e New York, onde encontrou
Tomas Ball Barratt, pastor metodista galês que teria importante papel para a
15
Na província do Västergötland, na Suécia meridional.
expansão do avivamento pentecostal na Escandinávia, sobretudo na Noruega,
e que influenciaria profundamente Lewi Pethrus.

2.3 O AVIVAMENTO CHEGA À SUÉCIA


Desistindo de viajar para Jerusalém por falta de dinheiro, Johansson
embarcou em um navio norueguês em Gibraltar, chegando a Göteborg 16, na
Suécia, no dia 16 de novembro de 1906, de onde se dirigiu para a cidade natal
de Skövde. Nesta cidade, ele encontrou apoio inicial na Igreja Batista Elim,
considerada por ele a denominação com a qual podia ter mais afinidade, e
conheceu Carl Widmark, em cuja casa sucessivamente se hospedou, e que se
tornaria um importante expoente do movimento. Tarefa de Johansson era
difundir as novas do batismo no Espírito e despertar o povo para a busca de
uma vida espiritual mais profunda. Encontrou boa aceitação da parte de seus
conterrâneos, como ele mesmo escreveu em sua primeira carta missionária
dirigida à base na Azuza Street, em Los Angeles, datada 15 de dezembro de
1906: “Tenho testemunhado nas casas e pode-se entender que a porta está
aberta e que as pessoas estão famintas pela Palavra de Deus” (JOHNSON,
1906 apud ALVARSSON, 2007, p. 20, tradução nossa).
A grande pergunta entre os crentes das igrejas tradicionais, porém, era
se aquele avivamento era ou não de Deus. Este era o questionamento do
pastor batista de Skövde, Carl Viktor Hugo, que por isso se dirigiu ao mais
experiente colega, o pastor da igreja Filadélfia de Örebro 17, John Ongman, que
no começo de 1907 viajou para Skövde. Ongman chegou à conclusão que
aquela obra era de Deus. Ele pôde testemunhar que o sinal de falar línguas
acompanhava a difusão do avivamento no país nórdico e convidou A. G.
Johansson para pregar na igreja que estava sob seus cuidados em Örebro.
A publicação, da parte do órgão oficial da Missionsförbundet 18, o
Svenska Morgonbladet19, de notícias sobre o “novo avivamento”, com ênfase
sobre o falar em línguas, e a contemporânea volta dos EUA para Kristiania 20 de
T. Barratt, que começou a pregar sobre o assunto, com reflexos em muitas

16
Segunda maior cidade da Suécia, ao sul do país, frente à Dinamarca.
17
Na província do Närke, Suécia central.
18
Associação Missionária da Suécia.
19
Folha Matutina Sueca.
20
Atualmente é conhecida com o nome de Oslo, a capital da Noruega.
nações européias, motivaram uma reportagem no Dagens Nyheter 21, jornal
cotidiano sueco de tiragem nacional. Esses acontecimentos fizeram de Anders
G. Johansson uma celebridade nacional, mas também lhe criaram um
problema, inclusive para os pesquisadores sobre o avivamento: sabendo de
sua origem sueca, a reportagem re-traduziu seu sobrenome americanizado
Johnson para Jansson, diferente do originário Johansson. Isso o levaria, alguns
anos depois, a mudar novamente seu sobrenome para Ek, como relata
Alvarsson: “O evangelista Andrew Jansson [Johnson]-Ek, que foi batizado no
Espírito durante o nascimento do moderno avivamento pentecostal em Los
Angeles no ano passado” (ALVARSSON, 2007, p. 24, tradução nossa).
Em Örebro, Johansson teve grande sucesso, e foi apoiado por John
Ongman e sua igreja, felizes por terem consigo uma testemunha ocular dos
acontecimentos de Azuza Street, a matéria de conversação mais atual daquele
momento nos ambientes eclesiásticos. Em seu testemunho, Johansson podia
livremente falar em línguas e interpretar para o sueco, sob a curiosidade do
povo. Ele considerava o falar em línguas como um sinal para os ímpios que
não davam crédito à Palavra de Deus em seu próprio idioma. Membros da
igreja de John Ongman experimentaram o batismo no Espírito e desviados se
reconciliaram, o que aumentou ainda mais o interesse das pessoas e
proporcionou que a atmosfera espiritual transformasse a cidade de Örebro na
“Los Angeles da Suécia”, um centro de difusão para o avivamento pentecostal
(ALVARSSON, 2007, p. 24, tradução nossa).
A aceitação irrestrita de John Ongman dos ideais do avivamento
produziu uma atividade a nível nacional. A Örebromissionen 22 era bem
reputada e tinha uma grande influência dentro da denominação batista. John
Ongman era pastor batista formado nos E.U.A, e valorizava muito a
participação das mulheres no trabalho de evangelização e liderança
eclesiástica, com presença feminina numerosa em suas escola bíblicas, o que
deu origem ao apelido “as irmãs de Ongman”, muito efetivas em várias obras e
na difusão da mensagem do avivamento. Um dos demais pastores que
primeiramente aceitaram o novo avivamento foi Olov Leonard Björk, pastor
batista de Stora Mellösa e reconhecido pregador e professor de Bíblia. Sua
21
Notícias do Dia.
22
Missão de Örebro. Posteriormente, se fundiu com outras duas organizações missionárias, dando
origem a InterAct, ainda em atividade.
igreja se tornou “uma igreja-mãe para o avivamento pentecostal na Suécia”
(Bundy 1997, p. 5, tradução nossa). Essa igreja foi uma das primeiras que
apoiaram os missionários Gunnar Vingren e Daniel Berg, pioneiros no Brasil
(ALVARSSON, 2007). Björk foi também o fundador, com Lewi Pethrus e Carl
Hedeen, de um das mais importantes e influentes publicações do avivamento
na Suécia, o Brudgummens Röst23, publicado de 1911 a 1922.
Convidado por diversas igrejas do país, A. Johansson começou a viajar
e pregar pelo resto da Suécia e, nas primeiras semanas do ano de 1907,
chegou à Igreja Betânia em Estocolmo, convidado pelo pastor C. G. Lundin. A
liderança dessa igreja teria posteriormente uma posição contrária ao
avivamento pentecostal. Este fato proporcionou que, no ano de 1910, boa parte
dessa congregação, já fortemente permeada pelos ideais pentecostais, se
tornasse um dos maiores grupos iniciais (cerca de 30%) da Filadelfiakyrkan i
Stockholm24, a igreja que Lewi Pethrus dirigiu por cerca de quatro décadas.
Isso aconteceu devido ao ostracismo dos batistas, que começaram a se
posicionar contra os ideais pentecostais, excluindo as congregações e os
membros que não se alinhassem com a posição oficial da denominação.
Göteborg, no sul da Suécia, foi alcançada por alguns membros do
Movimento que se transferiram de Skövde, e pelo trabalho em cooperação
entre A. G. Johansson, que se estabeleceu na cidade por um tempo, e T.
Barratt, com o reforço de Eric Hollingsworth e esposa, vindos de Los Angeles.
A visão de Johansson, Barratt e Ongman era que o avivamento fosse um
movimento transversal para todas as denominações cristãs, e que os
pentecostais não devessem formar próprias igrejas, mas continuar como
membros “na posição em que Deus os tinha chamados”, conforme 1Co 7.1732.
Entre os metodistas, muitos pastores visitaram T. Barratt na Noruega e
permitiram uma abertura inicial ao avivamento, mas, quando Barratt saiu da
denominação por causa do conflito referente à sua compreensão missionária,
fecharam as portas, com o resultado que poucos metodistas se tornaram
pentecostais na Suécia. Fortemente divulgados pelo famoso jornalista Richard
Edhelberg, A. G. Johansson-Ek viu os ideais do avivamento rapidamente se

23
A Voz do Noivo.
24
Igreja Filadélfia de Estocolmo.
expandirem por todo o país escandinavo e a si mesmo reconhecido como o
que atiçou o fogo pentecostal na Suécia.

2.3.1 O crescimento na capital sueca


A capital sueca cresceu de 93.000 habitantes no ano de 1850 a 300.000
no começo do XX século, por causa da grande maioria de camponeses vindos
das regiões interiores agrícolas. Muitos se sentiam desamparados sem os
relacionamentos sociais do lar de proveniência e encontraram nas igrejas livres
um lar e um ponto de encontro, onde os indivíduos eram cuidados, valorizados
e reconhecidos. Quando A. G. Johansson visitou Kungsholmen 25 no janeiro de
1907, o avivamento estourou na igreja batista Elim. Na época, a denominação
batista era composta em maioria por pessoas da classe media, mas o novo
avivamento alcançava mais a classe operária. Diante dessa situação, A.
Engzell, um abastado comerciante da cidade, organizou os novos avivados e
comprou um imóvel que passou a ser chamado Filadelfiasalen 26, do nome da
igreja de Ongman em Örebro. A inauguração aconteceu num culto no dia 26 de
dezembro de 1909, com Carl Hedeen como pregador.
Esse local se tornou um refúgio para as pessoas que não se sentiam à
vontade em sua própria congregação e, apesar de existirem já seis igrejas
batistas na cidade, seus membros queriam uma congregação aberta para os
dons do Espírito. Os princípios denominacionais batistas, porém,
obstaculizavam o projeto, que se tornou realidade somente no dia 30 de agosto
de 1910, quando 21 mulheres e 8 homens de seis diferentes igrejas batistas da
cidade e do interior formaram a Igreja Filadélfia de Estocolmo.
A componente feminina e a extração operária sempre foram majoritárias
na Filadélfia. Quando esta alcançou seus primeiros mil membros, em 1919, 762
destes eram mulheres, das quais 712 solteiras, a maioria cozinheiras,
colaboradoras familiares, babás, assistentes de enfermagem, etc. Dos mil
membros, 389 vieram de outras denominações, quase todos batistas, mas os
restantes 611 receberam o batismo na própria Filadélfia, derrubando a
acusação de que o avivamento pentecostal vivia de proselitismo. O numero de
pessoas provenientes de denominações com costumes e doutrinas

25
Bairro de Estocolmo.
26
Sala Filadélfia.
particularmente rígidas também era particularmente baixo, somente 7,5%,
mostrando que o movimento não era refúgio de disciplinados das demais
igrejas (GÄRESKOG; GÄRESKOG, 2010).
No ano de 1920, existiam ao menos 134 igrejas pentecostais na Suécia,
presentes em todas as mais importantes cidades do país. Apesar de o
avivamento pentecostal ser considerado supraconfessional, existiam muitos
Pentecostais que queriam maior liberdade e se sentiam desprezados e
oprimidos dentro da denominação batista, além de impedidos em suas
atividades. Em todo o território nacional, as congregações livres pentecostais
se multiplicavam e a liderança do Movimento ia agregando mais expoentes
insatisfeitos com as regras dos batistas. Esses sentimentos foram
amadurecendo até prepararem o terreno para a definitiva separação da
denominação.
Nesse aspecto, o episodio da exclusão da Igreja Filadélfia de Estocolmo
da denominação batista, graça ao espírito visionário de seu jovem pastor, Lewi
Pethrus, foi um marco central na história da passagem do avivamento
pentecostal sueco à condição de Pingströrelsen 27, como foi posteriormente
chamado. Paradoxalmente, esses acontecimentos proporcionaram a Pethrus
não somente liberdade, mas também a oportunidade de transformar essa igreja
na maior e mais influente e seu pastor no líder de facto do Movimento na
Suécia.

2.3.2 A ajuda e influência de T. B. Barratt


Durante e logo depois do período da união política entre Suécia e
Noruega28, os pastores das igrejas suecas livres se movimentavam livremente
entre os dois países, mas nenhum deles experimentou o batismo no Espírito na
capital norueguesa Kristiania29, onde era o quartel geral de Barratt. Com vinte
anos de serviço numa organização missionária da Igreja Metodista Episcopal
de Nova Iorque, Barratt elaborou seus conceitos de como devia ser a atividade
de missão, baseando-se na teoria do missionário do Movimento Metodista

27
Movimento pentecostal da Suécia.
28
Desde 1814, em seguida ao resultado da guerra entre Dinamarca e Suécia, esta e a Noruega formaram
um único reino, governado pela monarquia sueca. A dissolução desta união política aconteceu de
maneira pacífica, em 26 de outubro de 1905. Esse período é chamado, em sueco, de Uniontiden.
29
Hoje, é chamada Oslo.
Holiness, William Taylor, o qual pensava que uma igreja, que se formasse
numa cultura diferente como resultado dos esforços missionários, deveria ser
permitida de desenvolver suas próprias formas, política e teologia, sendo
dirigida pelo Espírito Santo e não por um escritório missionário autoritário e
ausente. Isso requeria que a nacionalidade assumisse um papel central
(BUNDY, 1997). Essa teoria missionária foi adaptada pelos movimentos
pentecostais da Escandinávia e tem tido um papel fundamental em definir o
que significa, do ponto de vista missionário, estrutural e teológico, pertencer ao
Movimento Holiness ou ser Pentecostal, fora da América do Norte (BUNDY,
1989).
A experiência pentecostal e essa compreensão teórica missionária
levaram Barratt a deixar a cooperação com a Igreja Metodista e começar o
ministério Byposten na Noruega, com programas musicais, caritativos, sociais e
pregações dirigidas aos que não estivessem ligados a nenhuma denominação,
e ao trabalho de disseminação da mensagem pentecostal na Europa, inclusive
na Suécia. Ao longo de sua vida, Barratt trabalhou para combinar as demandas
éticas e humanitárias da tradição Holiness com o conceito de salvação pessoal.
Em maio de 1907, quando o avivamento estava já bem difundido na Suécia,
Barratt foi para a capital sueca, Estocolmo, para cultos ecumênicos que
reuniram cerca de 4000 pessoas em Djurgården 30. A seguir foi para a cidade de
Uppsala31, depois desceu para Göteborg, nos dias de 22 a 27 de maio, onde
ajudou Anders G. Johansson. Barratt voltou para a Suécia muitas vezes, e sua
contribuição principal não foi ganhar vidas, mas, por ele ser muito famoso, deu
legitimação ao avivamento, e isso através, sobretudo, de sua atividade literária.
Ele publicava o importante periódico Byposten e, posteriormente, o Korsets
Seier32 e apoiou outro, Glöd från Altaret 33, além de editar muitos escritos
menores. Essa atividade o levou a ser reconhecido como o primeiro teólogo e
apologista do avivamento pentecostal na Escandinávia. As ideias de Barratt
influenciaram grandemente a compreensão missionária de Lewi Pethrus.

2.4 MARCAS PECULIARES DO PINGSTRÖRELSE

30
Bairro da capital sueca.
31
Na Suécia central, é sede da mais antiga universidade do país nórdico.
32
A Vitória da Cruz, em língua norueguesa.
33
Brasa do Altar, em língua sueca.
Como em outros países, o avivamento do começo do século XX deu
origem, na Suécia, ao Movimento pentecostal, o Pingströrelse, que tem suas
próprias peculiaridades e características, descritas nos tópicos a seguir.

2.4.1 O relacionamento com a sociedade


O grande número de sem teto e pobres que recebiam atenção da parte
das igrejas pentecostais foi um dos elementos que motivou um forte interesse
da parte da sociedade e dos jornais, inclusive com trabalhos de pesquisa das
instituições universitárias da época. A assim chamada räddningsmission 34 era
amplamente praticada pelas congregações pentecostais, inclusive as quatro
presentes na capital Estocolmo, com instituição de orfanatos, arrecadação de
roupas, distribuição de alimentos e hospedagem contra o frio. Centenas de
crianças pobres eram enviadas anualmente para localidades de férias no
interior. A crise econômica de 1929 aumentou ainda mais os desafios sociais
da sociedade sueca, que viu o Movimento pentecostal massivamente
empenhado na luta contra a pobreza e a marginalização.
Apesar dos méritos dessa obra social, os Pentecostais eram
recorrentemente tachados de doentes mentais e acusados de comportamentos
inadequados, tantos por teólogos do meio acadêmico como por expoentes das
denominações cristãs mais antigas. No campo literário, o Movimento
pentecostal era chamado de “obra de satanás”, evidenciando uma crescente
oposição. Em seguida à visita de Smith Wigglesworth em 1921, convidado por
Pethrus para uma serie de cultos na cidade de Estocolmo, a policia da capital
começou um inquérito por causa das curas realizadas durante as reuniões,
chegando a convocar Pethrus e Wigglesworth para serem interrogados.
Os membros do Movimento, porém, entendiam esses preconceitos como
algo positivo e validador do modelo de “Cristianismo primitivo” que eles,
supostamente, almejavam praticar. A chegada de Sven Lidman, famoso
escritor sueco, e G. E. Söderholm, da Igreja Oficial, a Luterana, forneceu ao
Movimento dois apologistas que enfrentaram, sobretudo das paginas do
Evangelii Härold35, as invectivas teológicas e doutrinárias. O resultado dessas
militâncias foi que uma parte da imprensa, entre ela o Svenska Morgonbladet44

34
Missão de resgate.
35
Arauto do Evangelho.
começou a moderar o tom ou saísse até em defesa dos Pentecostais contra os
ataques dos jornais seculares.
Referentemente ao relacionamento com a Igreja Luterana oficial, apesar
de sua posição cessacionista36, esta abriu, por exemplo, as portas a Pethrus
em suas pregações no ano de 1928 na região do Värmland, e ajudou com
cartas de recomendação para as autoridades do Congo belga em favor dos
missionários pentecostais suecos. A denominação batista, diferentemente,
depois das afinidades dos primeiros anos, se fechou para o Movimento
pentecostal.
No ano de 1929, porém, o apoio das organizações missionárias
luteranas e batistas a A. P. Franklin, em ocasião de sua exclusão da Igreja
Filadélfia de Estocolmo, seguida à luta de poder entre ele e Pethrus em
referimento à política missionária, foi percebida pelos Pentecostais como uma
hostilidade ao Movimento, o que contribuiu a piorar as relações entre este e as
demais denominações religiosas.

2.4.2 O conceito de educação no Movimento pentecostal sueco


O Movimento pentecostal da Suécia, como em muitos outros países,
tinha um ponto de vista ambivalente em relação à educação. Esta era
considerada uma oportunidade de crescimento e, contemporaneamente, uma
ameaça. Diante da necessidade dos evangelistas e missionários de freqüentar
escolas para se prepararem para o ministério, muitas vozes eram a favor.
Poucos, porém, apoiavam uma instrução de longa durada para os pregadores,
sendo preferida uma educação de poucos meses, pelo fato que, em geral, a
educação teológica era vista como algo que podia impedir a manifestação do
fervor espiritual e levar a algum tipo de orgulho que impedisse o agir do
Espírito.
Lewi Pethrus, por exemplo, nunca terminou seu curso pastoral no
seminário bíblico batista. Apesar disso, era inicialmente favorável a uma
instrução de longa durada para os pregadores pentecostais e apoiou a Escola
Bíblica fundada por Rikard Fris em Högby no fevereiro de 1922, como afirmou
em carta enviada a este no ano de 1925:

36
Acredita que os dons do Espírito só estiverem presentes durante o primeiro século da história da
igreja Cristã, para depois “cessar”, desaparecer.
Pelo que me concerne, sou da opinião que isso é a coisa mais
importante para o presente tempo no nosso país. Quando se viaja pelo país
afora e se observam as inauditas necessidades nas igrejas, onde as vagas
estão vazias e onde grandes feitos poderiam ser realizados se existissem
testemunhas preparadas na Bíblia, então arde o coração da gente. Eu acredito
que a escola deveria ter maior alcance e que mais importância deveria ser
colocada na instrução dos pregadores do Evangelho para o campo doméstico
(PETHRUS, 1925, tradução nossa).
O próprio Rikard Fris era da opinião que, apesar dos conceitos negativos
dentro do Movimento a respeito deste assunto, a educação podia ser utilizada
conforme a graça de Deus. A Conferência missionária de Kölingared, de 1926,
aprovou o apoio à educação para o aprofundamento linguístico e bíblico dos
missionários, continuando, porém, com reservas para os pregadores formados
e as escolas denominacionais, onde se ensinavam disciplinas consideradas
profanas. Estas eram tidas responsáveis por impedir a originalidade do Espírito
Santo e por dar lugar ao conhecimento e dons meramente humanos. Entendia-
se que a liderança eclesiástica era construída sobre a vocação e a capacitação
divina do escolhido, o que implicava que ninguém se tornava líder espiritual
através da educação. Esse conceito favoreceu a aversão à educação, tanto
teológica como secular, dentro do Movimento, que teve seu ápice no embate
conhecido como “conflito Franklin”, entre este e Pethrus.
O debate em volta da educação no Movimento pentecostal era
influenciado pela convicção da iminente volta de Cristo, portanto os pregadores
eram incentivados a serem somente bons "ganhadores de almas". De qualquer
jeito, a formação de pastores para as igrejas era considerada mais e mais
necessária, e a Escola Bíblica de Fris conseguiu interessar, sobretudo,
presidentes de campo que freqüentassem o curso pastoral. No outono de 1929,
porém, Pethrus publicou o livro Predikanten och hans utbildning 37, no qual
propunha um retorno a modelos “apostólicos” e condenava abertamente as
escolas teológicas de longa durada para pregadores do Evangelho, como a de
Fris (PETHRUS, 1929).

37
O pregador e sua instrução.
Isso deve ser analisado, porém, à luz do contexto do conflito entre
Pethrus e a Igreja Filadélfia, de um lado, e Franklin e a Svenska Fria
Missionen38, apoiado por Fris, do outro, pelo controle da atividade missionária
do Movimento pentecostal no exterior, que teve seu clímax exatamente no ano
de 1929. De qualquer jeito, os reflexos negativos que foram lançados sobre a
educação teológica foram profundos dentro do Movimento, continuando
arraigados até a década de 1990.

2.4.3 A posição teológica do Movimento e os fundamentos doutrinários


O Movimento pentecostal sueco adotou uma posição substancialmente
antitética à teologia liberal, comumente a outros cristãos avivados, defendendo
fervorosamente a fé na total inerrância e inspiração divina da Bíblia,
considerada a única autoridade em matéria de fé e conduta cristã. O próprio
Lewi Pethrus mergulhou no debate sobre o livro Präster och Profeter 39 do chefe
da Svenska Missionsförbundet40, Axel Andersson, de tendência liberal e que foi
um dos introdutores da crítica na Suécia.
A vivência da Palavra era, todavia, considerada mais importante pelos
Pentecostais do que a defesa de sua fidedignidade, com a experiência do
Espírito tida como a chave para a compreensão da inspiração divina nas
Escrituras, com a convicção de que ele opera para aprofundar o entendimento
da Palavra. Nesse sentido, a ciência bíblica e o conhecimento bíblico nunca
eram considerados definitivos (DJURFELDT, 2007).
A mensagem pentecostal pode ser resumida em quatro pontos: Jesus
salva, cura, batiza com o Espírito Santo e voltará para buscar seu povo. Essa
foi característica também do Movimento na Suécia, sendo o Cristo-centrismo
evidente e decisivo, sem, porém, nunca chegar a uma radical polarização que
originasse franjas ultra-cristocêntricas unitaristas, como aconteceu nos Estados
Unidos, na década de 1910.41
O Movimento pentecostal sueco também acreditava na efetiva e
completa salvação do crente em Jesus, possibilitada pela expiação dos
38
Missão Sueca Livre.
39
Sacerdotes e Profetas.
40
Associação Missionária Sueca.
41
Geralmente, estas têm em comum a crença de que Deus não subsiste como uma pluralidade de
pessoas distintas (conceito explicado pela doutrina da Trindade), mas que ele consiste de uma só
pessoa.
pecados proporcionada pelo sacrifício vicário de Cristo, necessário por causa
da justa ira de Deus contra o pecado humano, e na eterna perdição dos
incrédulos. No Movimento, o fato de ser membro e o batismo nas águas tinham
grande afinidade, sendo o batismo a condição necessária para se tornar
membro da congregação. Esta era uma possível herança metodista.
O batismo no Espírito Santo, esperança de todo batizado nas águas, era
visto como uma experiência especial e distinta da conversão, com o falar em
línguas como evidência e sinal legitimador do batismo. Essa coligação entre
batismo no Espírito e falar em línguas deriva do teólogo e apologista galês T.
B. Barratt, o qual foi influenciado por seus contatos epistolares com os
membros do avivamento da Azuza Street, e tem raízes nas ideias de Charles
Fox Parham.
A pregação do batismo pentecostal sempre foi importante no avivamento
e para o sucesso do mesmo, inclusive preparando sucessivamente setores das
igrejas tradicionais para o movimento carismático, com base na convicção de
que o Novo Testamento não fala explicitamente sobre um tempo em que os
dons espirituais deveriam desaparecer da Igreja, antes da vinda definitiva de
Cristo, quando não mais seriam necessários.
Outra característica era a crença nas curas divinas, também herdada a
partir dos ideais de Parham 42: aquele que tem uma fé realmente bíblica não
deveria procurar um médico. Isto era visto como falta de fé. Lewi Pethrus, em
seu livro Pingstväckelse och gudomlig helbrägdagörelse 43 (1926 apud WAERN;
ALVARSSON, 2007), defende o direito das pessoas de confiar somente em
Deus em casos de enfermidade, no caso de elas terem certeza que isso seja
correto, mas polemiza contra os que afirmam que toda doença seja causada
pelo diabo e que é suficiente expulsá-lo para a cura, colocando como exemplo
as enfermidades de Paulo, mostrando que Deus pode provar e fortalecer a fé
das pessoas através de situações de enfermidade.
A volta de Jesus era outro recorrente assunto da pregação pentecostal
sueca, possível influência do Cristianismo anglo-saxão do final do século XIX,
através das visitas do sueco-americano Fredrik Franson 44 (que chegou a

42
Originados da atividade de Frank Sandford.
43
O Avivamento pentecostal e as curas divinas.
44
Sueco, imigrou nos EUA, onde colaborou com D. L. Moody em Chicago. Fundou várias organizações
missionárias na Europa, ativas até o dia de hoje, entre elas a Svenska Alliansmissionen.
marcar a volta de Jesus para o dia de Páscoa do ano de 1898) à Suécia
(DJURFELDT, 2007). Essa compreensão da certa e iminente volta de Cristo
motivou o desejo de alcançar o mundo com o Evangelho, “antes de tudo
acabar”. Não foi mera coincidência que o primeiro livro de Lewi Pethrus se
intitulasse Jesus kommer45. Ele, porém, sucessivamente assumiu uma posição
crítica e hilária a respeito da inquietude dos crentes no país frente a este
acontecimento.
Em vez da ênfase sobre a volta de Jesus como Juiz e Senhor, Pethrus e
o Movimento pentecostal sueco foram influenciados pelo darbynismo 46 e sua
ideia de que Cristo vem buscar sua noiva, a Igreja, ao que seguirá um período
de tribulação para o mundo que verá a ascensão ao poder do anticristo. Este
será destruído por Cristo na batalha do Armageddon, à qual seguirá o milênio
de paz e governo divino, até o juízo final que dará início a eternidade futura. A
fé na volta iminente de Jesus impulsionava os seguidores do Movimento
pentecostal a uma forte evangelização, com raízes principalmente entre pobres
e marginalizados, ficando, portanto, conhecido por suas contribuições sociais e
missionárias.
Josefsson (2007) define essa posição do Movimento na Suécia como
restauracionista, porque o movimento tinha um olhar, contemporaneamente,
voltado para trás e para frente: para trás para o ideal bíblico, e para frente para
o completo restabelecimento dos ideais e da volta de Cristo, o que bem é
expresso pela definição “adiante para o Cristianismo primitivo”.

2.4.4 A organização eclesiástica


Foi a partir da exclusão da Igreja Filadélfia de Estocolmo pela
denominação dos batistas, que o conceito de igreja independente, inserida num
contexto congregacional, se expandiu no Movimento, com base na ausência no
Novo Testamento de suporte para autoridades superiores à igreja local. Os
seguidores do Movimento consideravam que o batismo no Espírito
proporcionasse uma vida espiritual mais rica, com os dons espirituais
45
Jesus vem.
46
John Nelson Darby, inglês (1800-1882), um dos mestres dos Irmãos de Plymouth, teórico da doutrina
chamada dispensacionalismo. Ensinava que Deus se relacionou, durante seis períodos da história, com a
humanidade através de alianças diferentes, e que haverá uma aliança futura durante o período do
reinado de Cristo na terra, o milênio. Rejeitava o propósito vicário da obediência de Cristo e sua justiça
imputada aos crentes. Na academia, é considerada teologia popular.
desempenhando um papel importante para a vida eclesiástica e na comunhão
entre indivíduos e igrejas. Djurfeldt afirma que:
A ideia de uma liderança hierárquica episcopal, que tem sua forma mais
desenvolvida na Igreja católica romana, foi considerada pelo Movimento
pentecostal sueco como um desvio do modelo neo-testamentário. A Igreja
apostólica tinha certamente líderes importantes, mas, sobretudo uma
cooperação entre os ministérios espirituais. Os primeiros discípulos de Cristo
tinham uma especial capacidade de transmitir o genuíno Evangelho e, nesse
sentido, nenhum dos atuais “apóstolos” pode ser comparado a eles. Mas, nem
ainda os primeiros apóstolos se apresentavam como lideres aos quais todos
deviam se submeter em tudo. Ninguém deles recebeu sozinho toda a
Revelação. [...] Atualmente, podemos ver o modelo hierárquico de liderança
difundido entre os Pentecostais pelo mundo afora, com muitos movimentos
pentecostais chamando seus líderes de bispos. Naturalmente, podem ser
vistos, no Movimento pentecostal sueco também, modelos de liderança
contrários ao padrão da Suécia, com seus movimentos populares
democráticos. Todavia, é apenas o modelo democrático que marca a visão de
liderança eclesiástica do Movimento pentecostal (DJURFELDT, 2007, p. 35,
tradução nossa).
O modelo congregacional, com igrejas livres e independentes se afirmou
como o padrão ideal oficial do avivamento na Suécia, por ser considerado mais
bíblico.
Outra característica é que, desde o começo do Movimento, existiu uma
aversão contra os títulos. Os que serviam pela expansão da Palavra evitavam
ser chamados de pastores ou pregadores e o uso do verbo “pregar”, preferindo
ser conhecidos como “testemunhas” e usar a expressão “testemunhar a
respeito de Deus”. Isso, como se deduz das cartas dos missionários suecos
publicadas no Evangelii Härold, se refletiu nas primeiras duas décadas da
Missão Sueca no Brasil, ao menos até a Conferência de Natal de 1930. O
próprio Lewi Pethrus se mostrou inicialmente contrário à introdução do título de
pastor na organização batista, para depois, aos poucos, ele mesmo aceitar
esse titulo como líder da Filadélfia de Estocolmo (DJURFELDT, 2007).

2.5 LEWI PETHRUS


O idealizador e atuador da ruptura com os ideais supra-denominacionais
do avivamento pentecostal sueco foi um jovem e desconhecido pastor da
sétima igreja batista de Estocolmo, Lewi Pethrus.

2.5.1 Da ilha dos lobos à ilhota dos troncos56


Lewi Pethrus nasceu na aldeia de Vargön, a mesma de Daniel Berg, do
qual era amigo de infância, na região do Västergötland, Suécia, em 1884.
Crescido numa família batista, o jovem Lewi foi para a Noruega para um
período como evangelista. Conforme relatou em sua autobiografia, em 1902
recebeu o batismo no Espírito Santo, com fala em línguas, sem, porém, ter
clara compreensão da experiência (PETHRUS, 2004). No ano de 1905, entrou
no Seminário Batista Betel em Estocolmo, mas interrompeu seus estudos para
assumir, dois anos depois, o pastoreado temporário na igreja batista da cidade
sueca de Lidköping. Apesar de ser um período difícil para ele, foi efetivado
como pastor daquela igreja.
Nessa época, meados de 1907, sob a influência de T. Barratt, vivenciou
o pleno entendimento do batismo pentecostal, sentindo "a plena experiência do
Pentecostes", com fala em línguas, à qual "seguiu-se uma maravilhosa certeza
de que [...] tinha recebido o batismo no Espírito Santo [...]. Isso não era nada
mais do que uma renovação da experiência que tive em 1902" (PETHRUS,
2004, p. 80). Esse acontecimento o levou a se considerar pertencente ao novo
avivamento pentecostal (BURGESS; MCGEE; ALEXANDER, 1988).
O próprio Pethrus (1912), em seu livro Urkristna kraftkällor 47, afirma que
ele nem depois de seu encontro com Barratt, em janeiro de 1907, reputou o
falar em línguas como uma necessária consequência do batismo no Espírito.
Em seguida, mudou de ideia ao experimentar o que ele mesmo descreveu
como a “plena experiência pentecostal” (PETHRUS, 2004, p. 80).
No ano de 1911, foi convidado para ser o novo pregador da Igreja
Filadélfia de Estocolmo. Apoiado por Barratt e Hedeen, então líderes do
avivamento, esse foi o ano em que a personalidade do futuro líder do
Movimento pentecostal sueco começou a emergir. Barratt começou a
evidenciar Pethrus em seus escritos, e Carl Hedeen convidou o jovem pregador

47
Fontes de poder do Cristianismo primitivo.
para ser co-fundador de um novo jornal do movimento, o Brudgummens Röst 48.
Interessado em imprimir suas pregações e diante da falta de apoio das editoras
por um jovem pastor quase desconhecido, no ano seguinte Pethrus começou
sua própria casa editora, evidenciando a capacidade visionária que marcaria
profundamente seu ministério como futuro líder da Filadélfia e do Pingströrelse,
o Movimento pentecostal sueco.
Consciente da importância da musica para a evangelização, imprimiu o
hinário Segersånger49 adaptado para a igreja Filadélfia, seguido posteriormente
pelo Segertoner50, em colaboração com Ongman, da Filadélfia da cidade de
Örebro. Este foi um período de perseguição por parte da polícia e da imprensa
sueca hostil ao Movimento, que, porém, não impediu o trabalho social no qual a
Filadélfia e Pethrus estavam envolvidos. A igreja cresceu de 74 para 400
membros até o ano de 1913. Os sucessos procuraram-lhe a admiração e inveja
dos líderes batistas. Apesar de não existir na denominação regras oficiais
contra a ceia aberta, praticada pela Filadélfia, a então sétima igreja batista de
Estocolmo foi excluída da comunhão denominacional. O motivo real era,
todavia, o endereço pentecostal tomado pela Filadélfia. A exclusão se tornou
um sinal para que outros grupos pentecostais no país deixassem suas igrejas e
constituíssem as próprias (STRUBLE, 2009).
Pethrus nunca achou que a prova de força com os líderes batistas
pudesse terminar na exclusão. Percebeu, porém, que essa era uma
oportunidade para seu nascente papel de líder do Movimento pentecostal,
frente à maior igreja carismática da Suécia, inclusive rejeitando a proposta de
reintegração à denominação batista mediada por Paul Ongman 51. Com este,
Pethrus rompeu por causa da Escola Bíblica Batista dirigida pelo próprio
Ongman e que não aceitara membros da Filadélfia sem cartão da denominação
dos batistas. Foi mais uma ocasião para Pethrus demonstrar seu espírito de
iniciativa e visão, fundando uma escola bíblica da Filadélfia, com ele próprio
como principal professor.
A seguir, a próxima etapa em direção a uma definitiva independência foi
a constituição de um jornal da igreja. Apesar das reticências do ministério da

48
A Voz do Noivo.
49
Hinos de vitória.
50
Tons de vitória.
51
Filho de John Ongman.
igreja, Pethrus impôs sua ideia e, no final de 1915, começou a publicação do
Evangelii Härold, deixando, contemporaneamente, seu lugar na redação do
Brudgummens Röst. No mesmo período, Carl Widmark foi enviado por Pethrus
em missão pela Suécia afora para arregimentar evangelistas do Movimento
pentecostal. Apesar dos ideais do avivamento contrários à constituição de uma
estrutura supra-eclesiástica, era o começo de uma visão de Pethrus de uma
denominação de facto, ainda que oficialmente informal, do Movimento
pentecostal da Suécia.
O passo sucessivo foi a organização da primeira semana de estudos
bíblicos, uma conferência nacional, e de um anuário do Movimento, chamado
Julens Härold52, no ano de 1916, com a colaboração de Johansson, Barratt,
Hedeen, Björk, Hane, Gunnar Vingren e outros, e cujo sucesso colocou a
pessoa de Pethrus entre os maiores expoentes do avivamento. Dois anos
depois, porém, Pethrus tinha rompido com quase toda a velha guarda
pentecostal, de modo que na conferência nacional de Kölingared em 1919
todos eles tinham se afastado de Pethrus.
Isso lhe permitiu dar começo, sem inconvenientes e respeitados
opositores, a uma estrutura para o Movimento, uma rede informal mais
orgânica do que organizacional. Esta estava baseada em relacionamentos
pessoais e na escolha de pessoas ligadas ao próprio Pethrus ou à Igreja
Filadélfia de Estocolmo, e cuja identidade estrutural, de acordo com Alvarsson
(2007), viesse a ser construída de dentro para fora e não vice-versa. O modelo
encontrava-se no livro de Atos dos Apóstolos, a assim chamada “Igreja
primitiva”, em direta oposição com as estruturas das denominações
eclesiásticas modernas.
Durante a década de 1920, Pethrus conseguiu arregimentar no rol da
Igreja algumas influentes personalidades do mundo literário e artístico, como o
famoso escritor Sven Lidman, o cantor Einar Ekberg, o musicista Oswald Lenti.
Da Igreja do Estado, veio o pastor luterano Gustav E. Söderholm. Estes
personagens contribuíram a dar legitimação e aceitação ao Movimento
pentecostal, majoritariamente fincado na classe operária, diante da sociedade
sueca. No ano de 1923, Anders Petter Franklin aceitou o convite de Pethrus,

52
Arauto do Natal.
saiu da Alliansmissionen53 e se estabeleceu na Filadélfia de Estocolmo. Ele
assumiria a direção da futura Svenska Fria Missionen 54. À frente desta
organização, Franklin ficou responsável pela atividade missionária do
Movimento pentecostal, inclusive no Brasil, até seu fechamento no ano de
1929, em seguida às desavenças entre o próprio Franklin e o pastor da
Filadélfia.
No ano de 1924, Pethrus viajou para os EUA, onde obteve ligações com
as igrejas do país e com o Movimento pentecostal internacional.
Contemporaneamente, os evangelistas pentecostais corriam toda a Suécia,
impulsionados pelo fervor e pela crença de que a volta de Cristo fosse
iminente, e Pethrus e seus colaboradores tomavam rapidamente contato com
as novas igrejas que surgiam, através de viagens de pregação. O inóspito e
pouco povoado norte da Suécia era visto como um campo missionário, com
muitos esforços do Movimento para alcançar a população da Lapônia.
Durante essa década, o Movimento pentecostal sueco conseguiu
organizar cerca de 400 igrejas. Muitas congregações das denominações
tradicionais, sobretudo batistas, passaram para o Movimento. Em 1° de janeiro
de 1929, o Movimento contava com cerca de 26.000 membros em todo o país,
a grande maioria mulheres, mas as igrejas eram dirigidas por homens. O nível
de educação mais comum era o primário, fazendo com que “talvez, somente
uma dezena de membros tivesse curso superior entre os Pentecostais em todo
o país” (GÄRESKOG; GÄRESKOG, 2010, p. 24, tradução nossa).
Sob a direção de Pethrus, o crescimento da igreja Filadélfia também foi
extraordinário neste período. O local de culto na Sveavägen, projetado em
1918 para 1400 pessoas, foi substituído pelo Auditorium na Norra Bantorget,
capaz de 2000 pessoas, até a compra do imóvel na Rörstrandsgatan, onde, no
ano de 1928, começou a construção do atual templo com capacidade para
2500 assentos.
2.6 CONFLITOS NO MOVIMENTO
O Movimento pentecostal na Suécia não foi livre de conflitos internos
durante as primeiras duas décadas de sua existência. A ascendente posição de
Lewi Pethrus no Movimento provocou, sobretudo na segunda metade da

53
Aliança Missionária.
54
Missão Sueca Livre.
década de 1920, vários confrontos. Apesar de serem formalmente motivados
pelo conflito de valores fundamentais, especialmente na compreensão
eclesiástica e missionária do Movimento, foram fundamentalmente lutas de
poder entre Pethrus e a igreja Filadélfia de Estocolmo, dum lado, e demais
lideres nacionais do outro. Em particular, o ano de 1929 marcou o ápice desses
conflitos, levando certo numero de igrejas dentro do Movimento a experimentar
cismas e divisões (GÄRESKOG; GÄRESKOG, 2006).
O sucesso da atividade missionária e da evangelização da Filadélfia
ajudou a amenizar as tensões. Porém, para muitas igrejas do país, as marcas
provocadas pelos conflitos foram mais evidentes, sobretudo no caso dos
líderes terem tomado posição contrária a Pethrus, pelas vitórias que este teve
em todos esses confrontos. O mais importante desses conflitos ficou conhecido
como Franklinstriden55, e envolveu a Svenska Fria Missionen56 e seu dirigente,
A. P. Franklin, em oposição a Lewi Pethrus e à igreja Filadélfia de Estocolmo,
no ano de 1929. Este embate se concluiu com a exclusão de Franklin da igreja
e a liquidação de sua organização missionária, inclusive com repercussões na
atividade da missão sueca no Brasil.
Conforme Gäreskog e Gäreskog (2006, p. 23, tradução nossa), “em volta
do ano 1919, Pethrus era bem estabelecido como líder informal das igrejas
livres na Suécia por causa de sua capacidade de liderança e do fato de ser o
pastor da Filadélfia de Estocolmo, a maior do país”. Como outras igrejas
suecas, a Filadélfia começou cedo sua atividade missionária, com seu primeiro
casal enviado ao Brasil, Samuel e Lina Nyström, no ano de 1916. Os ideais de
atividade missionária de William Taylor, veiculadas por T. Barratt, tinham
influenciado Pethrus e o Movimento pentecostal na Suécia, com o resultado
deste se tornar fortemente contrário a qualquer organização que estivesse
acima das igrejas, por não existir modelo bíblico para tais organizações.
Essas posições ideológicas concordavam com o modelo congregacional
de liderança do Movimento pentecostal, que via as igrejas como
fundamentalmente independentes e autogovernadas, avessas a estruturas
eclesiásticas denominacionais. O fundamento ideológico dessa visão de
liderança foi a declaração final da conferência de Kölingared 1919, sob o titulo:

55
“O conflito Franklin”.
56
Missão Sueca Livre.
“Porque tomamos distancia das organizações denominacionais”, assinado por
todos os 103 participantes, a maioria pastores pentecostais. Em seguida à
proposta de Pethrus, o resultado da conferência foi a criação de uma estrutura
mais orgânica do que jurídica, encarregada somente de ajudar as igrejas na
obra missionária no exterior, sem poder efetivo sobre as igrejas. Tida como
mais bíblica pelos membros do Movimento, essa organização informal
forneceu, porém, apoio ao seu mentor, Lewi Pethrus, e aos colaboradores
deste, tornando essa conferência uma pedra milhar na história do jovem
Movimento pentecostal sueco.
Se, no começo do avivamento na Suécia e da Igreja Filadélfia de
Estocolmo, o patrimônio humano, tanto de base como efetivo na direção do
movimento, era preponderantemente composto de pessoas do sexo feminino,
Kölingared marcou uma profunda mudança na liderança. No final da
conferência, 98 das 103 pessoas que assinaram a declaração ideológica em
1919 eram homens. Surgia assim uma nova seara de líderes a partir do novo
endereço traçado por Pethrus e seus fieis cooperadores, a maioria destes
ligados à Igreja Filadélfia da capital sueca.
Nesse assunto, um parêntese faz-se necessário para uma visão geral do
Movimento. Alvarsson (2007) divide os primeiros 15 anos deste em época
pioneira, de 1906 a 1916, e época formativa, a partir da constituição da casa
editora Filadélfia até a conferência de Kölingared, de 1912 a 1919. Houve,
também, uma mudança significativa do caráter do Movimento: o primeiro
período, com ideias ecumênicas, pregava uma mensagem de boas novas e
batismo no Espírito, vida espiritual mais profunda e abertura teológica em
muitas questões secundárias; o segundo período foi caracterizado por maior
finalização e ênfase teológica em volta da salvação, do batismo nas águas, das
curas e da visão denominacional. Elementos em comum desses dois períodos
foram o Cristo-centrismo, o modelo espiritual da Azuza Street, a experiência do
batismo no Espírito Santo e a pregação das curas divinas.
As personalidades mais importantes do período pioneiro foram Anders
G. Johansson, John Ongman, Björk e, sobretudo, T. Barratt, por sua atuação
internacional. Somente o primeiro sobreviveu na liderança do segundo período,
em posição secundária como cooperador, com a ascendente liderança de Lewi
Pethrus, que dirigiu a saída do movimento da denominação batista e fundou o
Pingströrelsen57, no ano de 1919.
Referentemente ao assunto missionário, Pethrus encontrava apoio na
Bíblia para que a igreja local fosse a responsável para enviar e sustentar
missionários no exterior, sem a ajuda de uma organização centralizada, e essa
era, também, a opinião dos demais líderes do Movimento. Rapidamente,
porém, a missão não se mostrou fácil, sobretudo para as igrejas menores que
não podiam manter integralmente um missionário, e nem prepará-lo do ponto
de vista lingüístico, além de parecer estranho não ter colaboração com outros
missionários no campo.
Diante destas problemáticas, no ano de 1923, Pethrus contatou Franklin,
então responsável pela atividade missionária no exterior da Svenska
Alliansmissionen58 e o convidou para colaborar na Filadélfia de Estocolmo. No
janeiro de 1924 nasceu a Svenska Filadelfiamissionen 59, então conselho
missionário da igreja Filadélfia para a atividade no exterior, com o declarado
propósito futuro de “servir de boa vontade como diretório missionário para todo
o Movimento pentecostal, responsável por assumir os custos pelo local da sede
e dos funcionários dessa necessária secretária de missão” (Protocolo da
diretoria da Igreja Filadélfia, 8/1/1924, parágrafo 1 apud GÄRESKOG;
GÄRESKOG, 2006, tradução nossa). No mês de abril do mesmo ano, a
organização tomou, definitivamente, o nome de Svenka Fria Missionen 60.
Fica aqui evidente o conflito de valores fundamentais entre teoria e
prática da atividade missionária sueca daqueles anos. Carlsson (2008) afirma
que existia uma contradição entre a retórica das igrejas pentecostais suecas,
que repudiavam organizações, e as decisões de estruturas cuidadosamente
elaboradas em produzir processos que permitiam a atividade cooperativa a
respeito de uma multidão de questões.
Na verdade, a organização se tornou útil e necessária à atividade
missionária no exterior, sobretudo diante dos obstáculos colocados por
algumas administrações coloniais européias em seus territórios de
competência. No Congo belga, por exemplo, era requerida a responsabilidade

57
Movimento pentecostal da Suécia.
58
Aliança Missionária Sueca.
59
Missão Sueca Filadélfia.
60
Missão Sueca Livre.
de uma pessoa jurídica que assumisse a missão. Por muitas igrejas locais
menores, a Svenska Fria Missionen era, porém, percebida como uma
organização centralizadora anti-bíblica e autoritária, controlada
substancialmente por Pethrus e sua igreja. Já naquele mesmo ano, houve
tentativas de invalidar o plano de Pethrus de controle da atividade missionária
do Pingströrelse61. Para resolver esse impasse, Pethrus propôs a criação de
uma diretoria de três pessoas, diretamente “chamadas por Deus” e não pelas
igrejas, que assumiriam a responsabilidade e direção da organização, frisando
que, segundo o modelo dos Estados Unidos, de onde acabara de regressar de
uma viagem62:
Existe a possibilidade de conduzir a missão juntos, sem que as igrejas, a
qualquer título, precisem se fundir. A absoluta liberdade das igrejas é uma
condição vital indispensável para salvaguarda do glorioso avivamento
pentecostal (PETHRUS, 1924, p. tradução nossa).
Essa “escolha divina” garantia aos candidatos uma liberdade diante das
igrejas, pois eles ficariam responsáveis somente diante de Deus em sua
atividade na direção da Svenska Fria Missionen, evitando assim as críticas a
Pethrus e à Filadélfia. As igrejas aceitaram essa proposta e, numa oração
durante a conferência missionária convocada para escolha dos três membros
da diretoria:
O irmão Pethrus achou que o Espírito Santo
tivesse derramado uma unânime certeza sobre
quais irmãos o Senhor tinha escolhido, sendo do
aviso que agora se deveria proceder sem votação
ou outra intervenção de ordem meramente humana.
O irmão Lidman contou que ele ontem ficou
sabendo, através de uma revelação, quem deveriam
ser os três irmãos, cujos nomes ele recebeu. São:
Fris, Franklin e Claesson [...] e os participantes
reunidos deram um poderoso “amem”. [...] Uma
irmã presente no culto contou de uma visão que
recebeu a respeito desses irmãos. Ela viu, pelo
Espírito, uma capa carmesim sendo colocada sobre
o irmão Fris; um anjo avançou até o irmão Franklin
e o cobriu com uma de suas asas, e um ser divino
se chegou ao irmão Claesson com um pequeno
livro luminoso e lho entregou. Eles foram
circundados também por uma multidão de anjos,
que ela viu no começo do culto. [...] Foi uma geral
alegria e ação de graça a Deus
(REDOGÖRELSE...,1924, tradução nossa).

61
Movimento pentecostal da Suécia.
62
Era o ano de 1924.
Essa “intervenção divina” foi um sucesso para Pethrus e seu projeto de
liderança missionária do Movimento pentecostal sueco. Todavia, a atividade da
organização era dirigida por Franklin, o qual entendia que o conselho
missionário se colocava acima das igrejas e, portanto, podia rejeitar candidatos
propostos pelas mesmas. Bundy (1997) é da opinião que Franklin quisesse
repetir, na Svenska Fria Missionen 63, a tentativa de adquirir poder pessoal
através da organização, como anteriormente tentara, sem sucesso, na Svenska
Alliansmissionen64. A aquisição de alguns imóveis na Suécia da parte da
Svenka Fria Missionen acirrou ulteriormente os ânimos no Movimento, mas a
competência de Franklin e os resultados nos campos missionários permitiram-
lhe de transformar a Missão Sueca Livre em uma organização forte e com
ambições de independência.
A viagem de inspeção das missões na América do sul, começada em
1926, forneceu a Franklin ocasião para elogiar os missionários, que retribuíram
com artigos entusiásticos no Evangelii Härold 65 (que, lembra-se aqui, era
publicado pela Igreja Filadélfia de Pethrus) sobre o próprio Franklin e a
Svenska Fria Missionen66. Isso alertou o inteiro Movimento pentecostal sueco
sobre as mudanças na linha da igreja dirigida por Pethrus. Até então, este
defendia a organização de Franklin como parte do desenvolvimento missionário
do Movimento, afirmando que a Svenska Fria Missionen não era uma ameaça
aos valores tradicionais congregacionais.
A transferência do Fria Bibelinstitutet 67 de Rikard Fris do imóvel da
Filadélfia de Estocolmo para o imóvel da Svenska Fria Missionen, todavia,
deixou claro para os dirigentes pentecostais, inclusive Pethrus, que Franklin
estava instaurando um estilo burocrático independente, que refletia uma
profunda mudança respeito aos valores originais do Movimento pentecostal
escandinavo. Os dirigentes do Movimento, consequentemente, mudaram suas
decisões e motivações. Eles suspeitaram que os burocratas estavam se
substituindo ao poder e influência dos pastores e das congregações locais. A

63
Missão Sueca Livre.
64
Aliança Missionária Sueca.
65
Arauto do Evangelho.
66
Missão Sueca Livre.
67
Instituto Bíblico Livre (Pentecostal).
conferência missionária de Kölingared, em 1929, se tornou, na prática, um
referendum sobre a atividade da Svenska Fria Missionen (BUNDY, 1997).
Pethrus e os outros dirigentes ficaram, então, convencidos de que
Franklin estivesse repetindo sua anterior trajetória na Svenska
Alliansmissionen68 e tentasse influenciar o Pingströrelse69, na hipótese que a
Svenska Fria Missionen, no lugar de servir as igrejas, começasse a “não mais
ter responsabilidade diante delas e operasse para determinar as doutrinas e o
ethos do Movimento” (BUNDY, 1997, p. 22, tradução nossa). Aproveitando uma
falha de Franklin (ele fez traduções não autorizadas de obras de escritores
alemães e publicou para a venda na Suécia, sendo acusado de plágio),
Pethrus propôs a dissolução da Svenska Fria Missionen e a retomada, da parte
da Filadélfia de Estocolmo, de sua própria atividade missionária. Isso foi
definitivamente decidido na Conferência missionária de Estocolmo, nos dias 30
de julho a 1° de agosto de 1929. Franklin, em seguida à proposta de Pethrus
ao ministério, foi excluído da igreja Filadélfia.
Esses acontecimentos marcaram a volta aos valores precedentemente
propagados pelo Movimento pentecostal sueco, oriundos de W. Taylor e
dominados pela “compreensão da igreja como radicalmente congregacional,
autossustentável, autogovernada e autopropagadora” (BUNDY, 1997, p. 22,
tradução nossa) do Evangelho, mas, paradoxalmente, colocaram Lewi Pethrus
na posição de líder de facto do Movimento pentecostal na Suécia e no controle
de sua atividade missionária. O avivamento sueco encontrou, então, na pessoa
do jovem e visionário pastor de Vargön, seu primeiro e maior líder, cujo papel
foi fortalecido pelo desenvolvimento precoce da igreja Filadélfia de Estocolmo,
e pelo engajamento social, político e missionário desta igreja e de seu pastor.

3 A ATIVIDADE MISSIONÁRIA SUECA NO BRASIL


As relações diplomáticas entre Brasil, então Império, e o Reino da
Suécia foram estabelecidas em 1826. Os primeiros contingentes de imigrantes
suecos chegaram ao Brasil em 1890. Em 1891, a Ericsson 70 fechou o contrato
com o governo brasileiro para fornecimento do sistema telefônico do país. Em

68
Aliança Missionária Sueca.
69
Movimento pentecostal da Suécia.
70
Empresa multinacional sueca do setor elétrico e afins.
1909 foi criada a primeira linha de transporte marítimo regular entre os dois
países.

3.1 O COMEÇO NO PARÁ


A atividade missionária pentecostal sueca começou no Brasil com a
chegada de Daniel Berg e Gunnar Vingren ao Pará, no dia 19 de novembro de
1910. Os dois eram jovens imigrados suecos nos EUA e se conheceram em
Chicago durante uma conferência missionária. Influenciados pelas pregações
de William H. Durham em volta do batismo no Espírito, viajaram para implantar
uma base missionária no norte do Brasil, onde desembarcaram no porto de
Belém, naqueles anos cidade cosmopolita e afetada pelo fim do ciclo da
borracha. Gunnar Vingren era pastor batista formado no Seminário Batista
Sueco de Chicago, Daniel Berg era operário siderúrgico.

3.1.1 Gunnar Vingren, o líder carismático


Gunnar Vingren nasceu num lar batista na cidade de Östra Husby, na
Suécia, no ano de 1879. Aos 24 anos, emigrou para os EUA, onde encontrou
emprego como jardineiro. No ano de 1904, entrou no Seminário Teológico
Batista Sueco de Chicago, Illinois, para um curso de quatro anos, ao termino do
qual, exerceu o pastorado em igrejas batistas da comunidade sueca do país.
Com a difusão dos ideais do avivamento da Azuza Street, Vingren se
interessou pela experiência pentecostal e, durante um congresso batista em
Chicago no verão de 1909, recebeu o batismo no Espírito Santo. Por pregar a
nova doutrina na igreja sob seus cuidados, foi obrigado a deixar o pastoreado
em Menominee, Michigan, e se dirigiu para a igreja de South Bend, Indiana,
que, sob sua direção, foi transformada numa comunidade pentecostal.
Vingren conheceu Berg provavelmente em Chicago, durante uma
conferência, no ano de 1909. Ambos interessados em fazer missões,
receberam uma revelação dum imigrado sueco, Adolf Ulldin, de que seu
destino missionário devia ser o Pará (ALMEIDA, 1982). Posteriormente,
visitaram, em Chicago, o pastor William Durham, conhecido de Daniel Berg, o
qual freqüentava seus cultos (CAUCHI, 2004), provavelmente para receber
ajuda financeira para a viagem e missão ao Brasil. A resposta, como também
anteriormente na igreja de South Bend pastoreada por Gunnar Vingren, foi
negativa, recebendo somente apoio moral.
Ao contrário, alguns dias depois o próprio Durham não recusou receber
dos dois suecos uma oferta de 90 dólares como ajuda para seu jornal
pentecostal (BERG, David, 1995,). Graças a uma oferta da igreja em Chicago
de B. M. Johnson, que, nos anos a seguir até o ano de 1929 contribuiria
financeiramente com a missão no Brasil, Vingren e Berg embarcaram para o
Pará, aonde chegaram no dia 19 de novembro de 1910, na cidade de Belém.
Apesar de Almeida (1982, p. 23) considerar essa data como “o dia marcado por
Deus para o início do Movimento Pentecostal no Brasil”, alguns meses antes, o
italiano Luigi Francescon, originário do mesmo ambiente de ideias
pentecostais, o círculo eclesiástico liderado por Durham em Chicago, já tinha
dado começo a sua obra de evangelização no país, no mês de março do ano
de 1910, de onde surgiria a Congregação Cristã no Brasil (FRANCESCON,
1958 apud REILY, 1984).
Os dois jovens suecos não conheciam ninguém na cidade de Belém.
Encontraram o comandante de um navio da companhia fluvial Port of Pará,
Adriano Nobre, que falava inglês e os encaminhou para a igreja batista da
cidade. Algum tempo depois, Berg conseguiu serviço na companhia marítima
como fundidor, o que lhe permitiu manter-se e custear o estudo da língua
portuguesa de Vingren, que a ensinava a Berg às noites, depois do trabalho.
Congregando na igreja batista da cidade de Belém, fundada e dirigida pelo
pastor Erik Nelson, missionário batista sueco, (REILY, 1984), os dois pioneiros
recebiam oportunidade para testemunhar e começaram a falar a respeito das
doutrinas do batismo no Espírito Santo e das curas divinas, conseguindo que
alguns membros aceitassem os novos ensinos.
Conforme a historiografia oficial da denominação das Assembleias de
Deus no Brasil (ALMEIDA, 1982), alguns meses depois, no junho de 1911,
alguns membros receberam o batismo no Espírito, entre eles Celina
Albuquerque e Maria de Nazaré. Esses acontecimentos provocaram uma
divisão na igreja batista, entre os que criam no ensino pentecostal e os que,
conforme a posição oficial da denominação, o rejeitavam.
Na ausência do pastor Nelson, em viagem com a esposa, o seminarista
batista Raimundo Nobre convocou uma reunião para o dia 13 de junho, no
curso da qual, 19 membros da congregação foram excluídos, justamente os
que aceitaram a nova doutrina. Estes começaram a se reunir, juntos aos dois
imigrantes suecos, na casa de Celina Albuquerque e esposo, e, no dia 18 de
junho se organizaram com o nome Missão da Fé Apostólica, do nome do
movimento de Charles Fox Parham, a cujo avivamento reputavam pertencer.
Existem versões diferentes a respeito desses acontecimentos da parte
das duas denominações, a assembleiana e a batista, que reciprocamente se
acusam de leviandade. Analisando os documentos redigidos pelas duas partes,
podemos ter uma ideia desse conflito. Reily (1984) reproduz as versões de
Vingren e Berg, dum lado, e dos batistas, do outro, sobre o que aconteceu.
Vingren relata a aceitação das doutrinas pentecostais pela maioria dos
membros da congregação e a manifestação de curas divinas e batismo no
Espírito. Diante da situação, um evangelista, cujo nome ele não cita e que seria
“orgulhoso e [...] debaixo do poder do diabo” e “tomado de um poder estranho”,
convocou uma reunião extraordinária na igreja para discutir a situação
(VINGREN, I., 1973, p. 32-33). Durante essa assembleia, o obreiro batista teria
condenado as novas doutrinas e perguntado aos membros presentes que as
apoiavam de se manifestar, ao que dezoito deles se levantaram, representando
a maioria da congregação. A seguir, o obreiro, declarou cortados da comunhão
os dezoito, inclusive contra a vontade do pastor da igreja, que parecia apoiar os
suecos.
Berg, por sua parte, frisa que, diante das acusações do obreiro batista
de os dois suecos planejarem dividir a igreja, ele e seu companheiro somente
tinham a intenção de pregar o verdadeiro Evangelho do Espírito, que
verdadeiramente uniria o Corpo de Cristo. A esse ponto, a versão de Berg
(BERG, David, 1973) discorda da do Vingren, por relatar que foi o pastor da
igreja, sem dar o nome deste, que tomou a palavra e expulsou os dois suecos
e os dezoitos membros que se manifestaram a favor destes.
Conforme Reily (1984), essas diferenças nos relatos se explicam pelo
fato que o missionário batista sueco Erik (Eurico) Nelson, fundador daquela
igreja batista, visitava-a de vez em quando, tendo ainda alguma influência
sobre ela. Havia, porém, mais duas pessoas que exerciam o ministério
pastoral, o pastor Jerônimo Teixeira de Souza, aparentemente favorável aos
suecos, e o evangelista Raimundo Nobre, contrário às novas doutrinas. É de
supor que Berg esteja se referindo ao evangelista, designando-o de pastor, no
lugar de se referir ao seu compatriota Nelson, que estava viajando, ou ao
pastor Jerônimo. Ambos, Vingren e Berg, concordam que foi a última vez que o
grupo dos pentecostais pisou naquela igreja batista, passando a congregar na
casa de Celina Albuquerque, a primeira a ser supostamente batizada com o
Espírito Santo e esposa de um dos diáconos daquela congregação batista.
Reproduzimos aqui uma das versões batistas do acontecimento:
Em abril de 1911 aportavam a Belém dois senhores suecos
Gunnar Vingren e Daniel Berg dizendo-se batista e chegaram a
mandar buscar suas cartas. Logo procuraram [ o pastor Eurico]
Nelson seu compatriota para pedirem abrigo algures. O porão do
templo foi oferecido e lá ficaram aprendendo a língua para então
ajudarem Nelson na evangelização. Esse bom missionário fez uma
de suas muitas viagens ao Piauí, deixando esses homens na
igreja na doce esperança de que, mesmo sem saberem falar,
ajudariam o trabalho. Eis que pouco depois, por ocasião das
reuniões, começavam esses batistas a tremer e a gritar sendo já, a
esta altura, imitados por alguns brasileiros. [...] eles deram para
responder que era batismo do Espírito Santo. Línguas e balelas
tornaram os cultos um horror. Nelson estava fora e à frente dos
trabalhos estava o jovem inexperiente, Raimundo Nobre. Toda a
igreja estava sendo contaminada, pois já muitos falavam as tais
línguas, menos os diáconos que não chegaram a fazer este
“progresso”. [...]. O evangelista, ajudado por Feli de Barros
Rocha, organista da igreja, convocou uma sessão extraordinária,
declarou fora de ordem os pentecostais que já constituíam a
maioria, e com a minoria excluiu os que se tinham desviado das
doutrinas. Eles procuravam fazer valer os seus direitos de
maioria, mas ficaram excluídos mesmo. Ficou dizimada a igreja.
Sem diáconos, uma desolação, este fim de 1911. Foi o começo do
pentecostalismo no Brasil (MESQUITA, 1940 p. 136-137 apud
REILY, 1984, p. 387-388).

A ata número 222 da Igreja Batista de Belém, do dia 13/06/1911 (apud


ARAÚJO, 2007), relata treze membros excluídos, além dos nomes de Gunnar
Vingren e Daniel Berg. Almeida (1982, p. 27) afirma que “o seminarista, sem
autoridade para isso, excluiu 19 pessoas e expulsou os missionários do templo
da igreja”, em cujo porão estavam hospedados. Não se sabe de onde venham
essas diferenças numéricas dos excluídos.
As Assembleias de Deus sempre colocaram o acento sobre a ilegalidade
das decisões tomadas na reunião pelo dirigente batista, exercidas contra a
maioria dos membros da congregação, isso com o intuito de se livrarem da
acusação de separatismo, desvio doutrinário e leviandade dirigida aos
pioneiros da denominação pelos batistas.
As reuniões de culto do grupo liderado pelos dois pioneiros suecos
continuaram nas casas dos membros batistas excluídos, em particular na casa
de Henrique e Celina Albuquerque, na Rua Siqueira Mendes 67, Cidade Velha,
em Belém. Tais cultos eram realizados sob o nome de Missão da Fé
Apostólica. As várias igrejas que surgiram em seguida à evangelização dos
missionários suecos e de seu grupo recebiam esse mesmo nome, até o final do
ano de 1914, quando começaram a usar paralelamente o nome Assembléia de
Deus.
A versão inglesa deste nome (Assembly of God) já estava sendo usado
nos Estados Unidos desde o ano de 1912, pela igreja pentecostal do pastor
Thomas King Leonard, de Findlay, no Estado de Ohio. No dia 2 de abril de
1914, esse nome foi adotado pelo Concílio Geral da Assembleia de Deus nos
Estados Unidos, do qual a igreja de Leonard fazia parte. A respeito do uso
deste nome pela missão sueca no Brasil, reporta Araújo (2007, p. 40-41) que
“em 3 de julho de 1917, Frida Vingren chegou a Belém [...] em 5 de julho,
escreveu sua primeira carta para a Suécia. Por meio dessa carta, descobre-se
que o nome ‘Assembléia de Deus’ já era utilizado” pelas congregações
pentecostais oriundas do trabalho dos nórdicos no Brasil”.
A análise atenta desta carta, publicada na Suécia nas paginas do
Evangelii Härold71, e que provavelmente foi a primeira de Frida Strandberg do
Brasil, confirma o uso do nome Assembleia de Deus, mas não concorda com
Araújo (2007) a respeito das datas, mostrando que Frida desembarcou em
Belém no dia 4 de julho, e escreveu a carta no dia 7:
Glória a Jesus! Agora, dia 7 de julho, estou finalmente no Pará. [...] Na
terça-feira, dia 3 de julho, chegamos ao porto. Uma noite escura com temporal
e chuva. Na manhã seguinte, pudemos descer e andar [...] Na noite do mesmo
dia, tivemos um culto. Era escuro, mas nós fomos. As reuniões começam
sempre ás 19.00 horas. Ás 18.00 horas, quando o sol desce, aqui é já escuro.
A casa é situada numa rua bonita, plantada de árvores dos dois lados. Sobre a
entrada está escrito: Assemblea (sic) de Deus. Eles já tinham começado a
cantar. O irmão Adriano e o irmão Nyström falaram, e depois houve um período
de oração (STRANDBERG, 1917, p. 145, tradução nossa).

71
Arauto do Evangelho.
Foi, todavia, somente no dia 11 de janeiro de 1918, que Gunnar Vingren
registrou o Estatuto da Sociedade Evangélica Assembléia de Deus no Cartório
do primeiro ofício de Belém. No Estatuto são citados os nomes de dois
membros fundadores, Gunnar Vingren e Daniel Berg, que, junto com Samuel
Nyström, foram investidos da administração societária. Em caso de dissolução,
o patrimônio da associação seria destinado aos três gestores e seus
descendentes. Esse passo foi a necessária adequação jurídica aos artigos 16 e
18 do Código Civil Brasileiro de 1917 (ARAÚJO, 2007).
Depois da expulsão da igreja batista, Vingren e seu companheiro Berg
começaram o trabalho de evangelização em vários lugares, agregando mais
membros ao grupo inicial, tanto na cidade de Belém, como no interior do
Estado do Pará. Curas e batismo no Espírito, com evidencia de falar em
línguas, eram comuns durante esse período, conforme relata em seu diário
(VINGREN, I.,1973). O campo de ação de Vingren era, preferencialmente, na
cidade e seus arredores, no então que Berg evangelizava ao longo do rio
Amazonas e no interior do Pará.
No ano seguinte, Vingren começava uma viagem de volta à Suécia, via
EUA, que se fazia necessária pelo seu estado de saúde, debilitado pelas
condições climáticas e pelas doenças da região amazônica. A jornada
começou no dia 1 de agosto de 1915, de Belém, rumo a New York, aonde
chegou no dia 12 de agosto. Outro autor, o filho do pioneiro, relata que a
chegada à terra norte-americana foi no dia 8 de agosto, aniversário do próprio
Gunnar (VINGREN, I., 1973). Gunnar Vingren, em carta enviada a e publicada
pelo Evangelii Härold, escreve de seu próprio punho as palavras que podem
dirimir essa dúvida:
Querido irmão Lewi Pethrus! A paz de Deus! Quero agora para glória de
Jesus contar algo referente às minhas viagens na América e à obra do Senhor
no Brasil. Cheguei à América no dia 12 de agosto do ano passado e tive o
privilégio de visitar as diversas congregações pentecostais desde
Massachusetts até Minnesota e pude assim me alegrar em Jesus junto com
aqueles simples filhos de Deus que não se deixaram contagiar pela ilusão
russelliana (VINGREN, G., 1916b, p. 11, tradução nossa).
Percebe-se, a partir deste texto, a preocupação de Vingren com a
influência das ideias de Charles Taze Russell 72 sobre os rebanhos de seu
primeiro campo missionário, depois que saiu do seminário batista em Chicago.
Essas ideias eram veiculadas, entre as igrejas de imigrados nórdicos, pelo
pregador de origem sueca A. Ödman e outros. Mas já existiam apologistas,
entre a comunidade protestante sueca, que refutavam as ideias destes:
Um importante seguidor das doutrinas de Ödman, um irmão pregador,
me disse logo antes de eu deixar a América: “Agora não prego mais as
doutrinas de Ödman”. Agora, ele também, quer somente saber de Cristo, e Ele
crucificado. Aleluia! Alegrei-me, também, em ver a posição que o irmão A. A.
Holmgren, redator do jornal “A testemunha da verdade” na América, assumiu.
Ele tem claramente se colocado contra os erros de Ödman. Deus abençoe o ir.
Holmgren e seu jornal. A verdade sempre há de triunfar. Graça e louvor!
(VINGREN, G., 1916b, p. 11, tradução nossa).
Considerando que esta carta foi enviada a Lewi Pethrus, e aos leitores
do Evangelii Härold73, publicação oficial da igreja deste, transparece uma
consistente afinidade entre as igrejas na Suécia e as co-irmãs americanas. Isso
não pode ser dado como obvio, à luz de que o Pingströrelse 74 do país
escandinavo é posterior à aceitação dos ideais da Azuza Street pelas
comunidades de imigrados suecos na América, das e pelas quais os dois
pioneiros suecos no Brasil, Berg e Vingren, vieram, no ano de 1910, e foram
ajudados, ainda que não regularmente, em sua epopeia ao sul da linha do
equador, como pode-se argüir de carta enviada a A. P. Franklin, chefe da
Svenska Fria Missionen75, datada de 18 de junho de 1929:
[...] precisaríamos de cerca de 40.000 coroas para
poder comprar um terreno e começar a construir [...]
portanto, quero te perguntar se tu podes fazer algo por
essa questão. Envia-me ao menos uma resposta, porque
se os amigos em casa e na América não puderem nos
ajudar [...] (VINGREN, G., 1929a, p. 472, tradução nossa).

Nos Estados Unidos, Vingren demorou até dezembro daquele ano,


quando partiu para a Suécia. Os relatos de sua permanência nesse país
contam de vários cultos nas cidades do nordeste americano, chegando até
72
Americano, fundador dos Testemunhas de Jeová, nos EUA.
73
Arauto do Evangelho.
74
Movimento pentecostal da Suécia.
75
Missão Sueca Livre.
Chicago. Na igreja de seu amigo, o pastor B. M. Johnson, participou de e
pregou numa conferencia missionária, com o resultado de despertar os
presentes para a missão no Brasil e receber ofertas para a compra do barco a
motor para Daniel Berg prosseguir em suas viagens evangelísticas ao longo
dos rios da bacia amazônica (Vingren, I., 1973).
No dia 15 de dezembro de 1915, Vingren embarcou para a Noruega, de
onde continuaria a viagem para a casa de seus pais, na cidade sueca de
Rönninge, na província de Estocolmo, no dia 24 de dezembro (VINGREN, I.,
1973). Na tarde do mesmo dia, Pethrus e outro pastor o visitaram, como
relatado em artigo no Evangelii Härold:
O irmão Gunnar Vingren, do Brasil, chegou, na
noite de Natal, à casa de seus pais em Rönninge. Pois que
o irmão Alfr. Gustafsson e eu, o mesmo dia, estávamos
visitando a creche em Rönninge, demos uma esticada para
ver e saudar o nosso irmão. Não é necessário dizer que a
alegria do reencontro chegou ao ponto mais alto já fora da
casa. O irmão Vingren nos disse que passaram doze anos
desde que tinha visto seus familiares aqui na Suécia, e que
ele passou cinco desses anos no longínquo campo
missionário do Brasil e que agora o Senhor o abençoou e
protegeu durante a perigosa viagem marítima, pelo que de
coração louva a Deus. Nós o achamos com saúde melhor
de quanto esperássemos, considerando as privações e
fadigas que ele enfrentou no Brasil. Louvado seja Deus!
Comunicaremos, o mais breve possível, através desse
jornal, pelo próprio irmão Vingren, a respeito de suas
viagens à América e sobre as maravilhosas obras
realizadas por Deus no Brasil (PETHRUS, 1916, p. 3,
tradução nossa).

Percebe-se aqui o cuidado de Pethrus em apresentar o missionário


pioneiro no Brasil como alguém próximo e relacionado à igreja Filadélfia, a qual
foi fundada somente no agosto de 1910, sob sua direção a começar do ano de
1911. Em 1903, ano em que Vingren emigrou para os Estados Unidos, Pethrus
ainda não conhecia os ideais pentecostais e, muito provavelmente, nunca tinha
encontrado Vingren. Isso reforça o papel do outro pioneiro, Berg, em cultivar a
amizade com o pastor da Filadélfia de Estocolmo e tecer os contatos que
permitiriam aos dois pioneiros suecos no Brasil de receber apoio e recursos da
parte desta igreja, o que aconteceu, provavelmente, durante sua viagem de
1914.
Em suas pregações na Suécia, Vingren apresentava às igrejas a
aquisição do barco a motor e a compra de uma casa adequada para destinar a
base missionária e morada dos missionários. De origem europeia e depois de
ter vivido nos Estados Unidos, ele não se acostumava com a baixa qualidade e
os alugueis elevados das casas nas quais a situação contingente o constrangia
a morar no Brasil:
Outro fato é que, se pudéssemos comprar a casa,
os missionários teriam uma morada onde poder habitar e
todas as despesas, hoje gastas pelos elevados alugueis,
seriam economizadas e usadas melhor na obra do Senhor.
Uma casa de barro, com muros de barro, coberta com
folhas de palmeira, costa cerca entre 30 e 40 coroas de
aluguel mensal. Uma casa, como um estrangeiro é
costumado a morar, costa entre 100 e 200 coroas por mês
ou mais. Durante esse tempo passado aqui, nós temos
morado aqui e acolá, nas casas dos crentes membros, do
jeito que os brasileiros pobres vivem (VINGREN, G., 1916a,
p. 175, tradução nossa).

Em sua viagem de volta ao Brasil, Vingren passou por New York. A essa
altura, ele já tinha se naturalizado americano e estava esperando a emissão de
seu passaporte pelas autoridades dos EUA, como ele mesmo informa:
“Anteriormente, eu fui a uma conferencia pentecostal em Hartford, Connecticut,
no então que esperava o meu passaporte americano [...]” (VINGREN, G.,
1917a, p. 146, tradução nossa). Essa segunda nacionalidade pode ter tido uma
influência sobre Vingren, apontando para uma maior afinidade com o padrão
norte-americano de sua compreensão missionária, eclesiástica e ministerial,
diferente da do Movimento pentecostal sueco.
Sua noiva, Frida Strandberg, o precedeu na chegada ao Brasil, onde
desembarcou no dia 4 de julho, em Belém, Pará. Vingren chegou de volta ao
Brasil no dia 6 de agosto de 1917. No dia 16 de outubro daquele ano, Gunnar
Vingren e Frida Strandberg casaram-se em Belém. Em janeiro de 1919,
Gunnar fundou o jornal “Boa Semente”, tendo como um de seus colaboradores
Samuel Nyström. Araújo (2007) informa que foi fundado em dezembro de 1918.
A primeira viagem de Vingren ao sul do Brasil aconteceu no ano de 1920,
quando visitou alguns estados litorâneos, até Santa Catarina, onde participou
de cultos entre as comunidades de imigrados russos e lituanos. Em seu diário,
ele destaca o clima agradável para os europeus, e a liturgia dos imigrados, e
sua reprovação, porém, à prática da dança na adoração, ao que foi expulso de
entre os lituanos (VINGREN, I., 1973).
Na viagem de volta a Belém, conheceu a igreja pentecostal italiana de São
Bernardo, São Paulo, dirigida por Luigi Francescon. Vingren e Francescon
participaram, como também Berg, no ano de 1909, do avivamento na cidade de
Chicago, EUA, que tinha como maior protagonista o pastor William H. Durham
e seus conceitos do “Finished Work” 76 de Cristo e da “Terceira benção”77. A
respeito dessa igreja de São Paulo, escrevia Franklin alguns anos mais tarde,
no relatório de sua viagem ao Brasil de 1926:
O trem corria para São Paulo, atravessando
as grandes plantações de café, e na cidade tivemos
a ocasião de visitar uma igreja pentecostal italiana.
Cerca de doze anos atrás, um irmão italiano foi
enviado para São Paulo de Chicago e tem
experimentado o poder de Deus para salvação, e
uma igreja veio à existência, com mais de dois mil e
quinhentos membros (FRANKLIN, 1926b, p. 496,
tradução nossa).

No final de 1920, Vingren relatava que existiam igrejas em oito Estados


do norte do Brasil. Seu estado de saúde, porém, continuava a se agravar.
Escrevera a redação do Evangelii Härold sobre esse assunto:
Durante os últimos tempos, os amigos Wingren
(sic) tiveram sua saúde muito abalada. Em particular, o
irmão ficou um tempo de cama antes da viagem, e até tão
fraco, em certos momentos, que os irmãos acreditaram ele
partiria para uma pátria melhor do que a terrestre.
Portanto, foi concordado com os outros irmãos lá fora que
nosso irmão viajasse para a Suécia, para durante um
período evitar o clima mortificante do Brasil. No dia 8 de
maio, os irmãos carregaram o irmão Wingren de cama até
o navio (HEMKOMNA..., 1921, p. 106, tradução nossa).

No dia 8 de março de 1921, portanto, Vingren e família viajaram para a


Suécia, aonde chegaram no dia 5 do mês de junho. Nesse ano, o casal Vingren
teve uma participação marcante na conferência missionária de Kölingared,
onde deixaram muitos testemunhos da missão no Brasil. Deixou o país natal,
para as terras brasileiras, no dia 17 de agosto de 1922, via EUA, acompanhado
por dois casais de novos missionários para o Brasil, Hedvig e Gustaf Nordlund,
e Anna e Viktor Jansson (LIDMAN, 1922). Durante a permanência nos Estados
Unidos, Gunnar viajou para os estados ocidentais do país, com a intenção de
alcançar a Califórnia, como se lê numa carta do casal Nordlund publicada no
E.H: “O irmão Vingren viajou para os estados ocidentais e, se Deus quiser,

76
“Obra Consumada”.
77
As três bênçãos eram consideradas ser: a salvação, a santificação e o batismo no Espírito Santo.
pensa alcançar a Califórnia” (NORDLUND, G.; NORDLUND, H., 1922, p. 187,
tradução nossa). A família Vingren chegou de volta ao Pará no dia 1 de
fevereiro de 1923.
Sua definitiva mudança para o Rio de Janeiro aconteceu no ano de
1924, substituído pelo casal missionário sueco Lina e Samuel Nyström na
direção do trabalho no Pará e do jornal pentecostal “Boa Semente”. Em carta
publicada no Evangelii Härold, assinada por Gunnar e Frida, o casal Vingren
deixou suas impressões sobre a “cidade maravilhosa”:
Deixamos o Pará no dia 21 de maio, e
chegamos aqui no dia 3 de junho. [...] Rio de
Janeiro, a cidade da luz, como é chamada, é
propriamente uma cidade dos vícios e da vaidade,
no mais alto grau. A natureza aqui é muito bonita, e
o clima bastante bom. A cidade é situada em parte
entre e em parte sobre os declives de altas
montanhas. Na cima de uma das montanhas mais
altas, os católicos planejam a construção de uma
imagem de Cristo, e para esse fim, eles têm juntado
mais de um milhão de milreis. Além dos católicos,
existe aqui um grande numero de igrejas
evangélicas, mas nenhuma que pregue o
Evangelho pleno, ao contrário: aqui, como nos
outros lugares do Brasil, elas, na grande totalidade,
são inimigas. O Exército da Salvação trabalha aqui
seguindo seus princípios costumeiros. Entre seus
oficiais existem suecos. Aqui nessa cidade, pode-
se ver que as pessoas em geral vivem para juntar
bens desse mundo, e para alcançar esse alvo, não
poupam nenhum meio. A falta de sinceridade e de
honestidade é aqui um traço característico, tão
forte que surpreende desde o primeiro instante
(VINGREN, F.; VINGREN, G., 1925c, p. 32, tradução
nossa).

O sustento do casal no Rio, enviado pela igreja Filadélfia de Estocolmo,


era, naquele período, de 600 coroas suecas. Ao que parece, esse era o único
sustento regular que recebia naquele período, e que rendia “possível [...] o
trabalho no Rio de Janeiro” (VINGREN, F.; VINGREN, G., 1925a, p. 184,
tradução nossa).
É nesse período carioca que, entre seus colaboradores brasileiros,
aparece, pela primeira vez, o nome de Paulo Leivas Macalão: “Aqui no Rio,
temos um jovem irmão batizado no Espírito Santo, de nome Paul (sic), filho de
um general. Ele é muito zeloso em seu trabalho para Jesus” (VINGREN, F.;
VINGREN, G., 1925b, p. 638, tradução nossa). Cinco anos após, Vingren o
apresentaria para ordenação a pastor pelas mãos de Lewi Pethrus, durante a
Conferência de Natal, no setembro de 1930.
Com a dedicação germânica do casal e a ajuda dos colaboradores, a
obra na capital federal crescia. Em meados do ano de 1926, Gunnar relatava
que os Pentecostais no Estado do Rio de Janeiro eram cerca de 700
(VINGREN, G.,1926). Foi neste ano que A. P. Franklin visitou as missões
pentecostais suecas na América Latina. Para aproveitar a presença do
dirigente da Svenska Fria Missionen78, Vingren convocou uma conferência
internacional no Rio de Janeiro, que aconteceu de 17 a 25 de julho. Além do
corpo missionário sueco no Brasil, participara das reuniões um missionário
sueco na Argentina, Gunnar Svensson. Nas reuniões deliberativas, não houve
participação de obreiros nacionais. Os temas tratados foram a equiparação dos
missionários para com a Svenska Fria Missionen, independentemente de suas
procedências, e a responsabilidade jurídica do patrimônio da missão brasileira,
temas que serão tratados mais amplamente no próximo capítulo.
Com o crescimento da igreja no Rio, houve a necessidade de um reforço
à obra naquela cidade. No dia 12 de janeiro de 1927, Vingren recebeu os
obreiros José Teixeira Rego e Bruno Skolimowsky, vindos do norte para ajudar.
A posição de liderança de Gunnar Vingren, dentro da missão sueca do Brasil,
parece ainda intacta nos meados do ano 1928. Depois das viagens ao sul do
país nos anos de 1920 e 1923, no dia 10 de abril de 1928, começa uma
viagem, ao que parece, de supervisão, para Recife, no Pernambuco, a Paraíba,
Natal, no Rio Grande do Norte, Maceió, no Alagoas. Na Paraíba, ficou
impressionado pela condição de miséria da população:
O nome do irmão é Cícero Lima. Pergunte
ao Senhor o que Ele quer que tu faças por esse
irmão e pela obra nessa cidade! Nunca tínhamos
visto nesse país tamanha miséria, casa que não
são dignas do nome de moradas para seres
humanos; os animais na Suécia passam melhor. O
povo vive de “plantar batata doce e fazer bonecas”,
nos disse um homem no trem. Em cada estação, o
trem é circundado por cegos e cochos em multidão
(VINGREN, G., 1928b, p. 408, tradução nossa).

Nesse mesmo ano, Vingren recebeu um carro da América e fez um


pedido a A. P. Franklin, para que ajudasse na construção de uma garagem,

78
Missão Sueca Livre.
cujo recurso agradecerá em carta seguinte (VINGREN, G., 1928a, p. 520).
Com a piora de suas condições de saúde, se tornaram frequentes as
reclamações do casal Vingren a respeito da alimentação, escassa e de má
qualidade, por causa dos recursos insuficientes, cuja maior parte era destinada
ao aluguel, muito elevado na capital federal do Brasil da época, e pela pressão
emocional e espiritual:
Seria uma grande economia, se conseguíssemos encontrar uma
pequena casa na periferia da cidade, com lugar para guardar o carro. Então,
poderíamos comprar uma alimentação melhor para podermos aguentar aqui
fora por mais tempo. Sentimo-nos bastante cansados e desgastados [...] Minha
esposa pede oração especial. Seu coração e seus nervos estão
sobrecarregados pela muitas campanhas de oração e pelo trabalho (VINGREN,
F.; VINGREN, G., 1929a, p. 166, tradução nossa).
Existem muitas suposições sobre o que Vingren pensava a respeito da
direção do trabalho missionário no Brasil, e sobre o que ele pensava a respeito
dos obreiros nacionais que colaboravam na obra, sobretudo no Nordeste. Vale
lembrar que ele era o único missionário pentecostal sueco, presente em terras
brasileiras, regularmente formado num curso de teologia de quatro anos, o que
determinava sua particular compreensão eclesiástica e ministerial. Foi ele,
também, que viajou para a Suécia, às vésperas da Conferência de Natal, em
1930, para trazer Lewi Pethrus, numa tentativa de mediação entre os pastores
nordestinos e os missionários suecos, com referimento à direção da obra. A
respeito de sua compreensão, podem ser esclarecedoras algumas palavras
que o casal Vingren escreveu numa carta enviada às igrejas na sua pátria,
publicada no Evangelii Härold79·, através da qual pede reforços para a missão
no Brasil:
Digam, eles não precisariam de novos
reforços para ajudar no trabalho? Mas vós, alguém
pode dizer, tendes os obreiros nativos. Mas o fato é
que eles não têm a maturidade e força necessárias
para esse trabalho. Em geral, eles são bons
evangelistas, mas os pastores são poucos
(VINGREN, F.; VINGREN, G., 1929b, p. 505-506,
tradução nossa).80
79
Arauto do Evangelho.
80
Deve-se ter alguma restrição sobre a atribuição desse pensamento a Gunnar Vingren, considerando
que essa carta foi assinada em conjunto com sua esposa Frida, cuja contribuição à escrita é patente na
frase: “Sim, o que direi mais, eu, uma humilde serva do Senhor?”, e no estilo literário presente no corpo
da carta.
Segundo Vingren, portanto, os obreiros nacionais, salvo poucas
exceções, não tinham maturidade e força necessária para o ministério pastoral.
Em outras palavras, não tinham capacidade de liderança.
No dia 22 do mês de maio do ano seguinte, Gunnar Vingren deixou a
família no Rio de Janeiro e viajou para a Suécia para se encontrar com Lewi
Pethrus e convencê-lo da necessidade de sua presença na Conferência
convocada pelos obreiros nacionais em Natal, no mês de setembro de 1930.
Vingren esperava que a mediação de Pethrus pudesse resolver o impasse
entre os missionários suecos e os pastores nativos, referentemente à questão
da liderança na obra no Norte e Nordeste.
Os dois desembarcaram no Rio de Janeiro no dia 12 de agosto. Pelo
relato de Pethrus (1930c), sabemos que a missão sueca dirigida por Vingren no
Estado fluminense contava com cerca de 1.500 crentes, divididos em doze
congregações pentecostais. Um grande avanço na capital do Brasil, num
tempo relativamente curto, como o próprio pastor da Filadélfia admitiu. Os
Vingren deixaram definitivamente o Brasil no ano de 1932, sendo sucedidos na
direção da obra pelo casal Samuel e Lina Nyström.

3.1.2 Daniel Berg, o siderúrgico missionário


Daniel Högberg, mais conhecido como Daniel Berg, nasceu no ano de
1884, num lar batista da cidade de Vargön, na Suécia, a mesma onde nasceu
Lewi Pethrus, do qual era amigo de infância. No ano de 1902, emigrou para os
EUA, onde trabalhou como siderúrgico. Alguns anos depois visitou a pátria
natal, e se interessou à doutrina do batismo no Espírito Santo, influenciado por
Pethrus. De retorno à América, recebeu a experiência pentecostal durante a
travessia do Atlântico (REILY, 1984), no ano de 1909. Em companhia de
Gunnar Vingren, chegou ao Brasil no novembro de 1910.
Depois dos acontecimentos relacionados à saída da igreja batista de
Belém, Berg, por sua constituição física forte, se dedicou, especialmente, à
obra de evangelização nas ilhas e outras localidades ao longo do rio Amazonas
e da ferrovia Belém-Bragança, nessa última fazendo às vezes o trajeto de 400
quilômetros a pé. Ele visitava as casas e vendia Bíblias e outra literatura. As
principais localidades alcançadas por ele nos primeiros anos foram: Soure,
Mosqueiro e Bragança, no ano de 1912; Xarapucu e Catipuru em 1913; a Ilha
Caviana, Afuá, no ano de 1914.
Nesse ano, o de 1914, Berg voltou à Suécia para visitar sua família.
Durante a estadia no país natal, ele restabeleceu o contato com o pastor Lewi
Pethrus, que estava trabalhando à frente da Igreja Filadélfia de Estocolmo. Os
dois aldeões de Vargön eram amigos de infância e já tinham se reencontrado
na ocasião da volta de Berg dos EUA, no ano de 1909, quando Pethrus
despertou em Berg o desejo para a experiência pentecostal. É a partir desse
período, que Vingren e Berg passam a aparecer nos registros da Filadélfia
como missionários dessa igreja (ARAÚJO, 2007) e, provavelmente, a serem
sustentados financeiramente por ela, como se pode supor de cartas posteriores
dos missionários enviadas a e publicadas no órgão da igreja de Estocolmo, o
Evangelii Härold:
Pará, Brasil, 23 de dezembro de
1915. Meu amado irmão Lewi Pethrus!
Graça seja contigo, e paz de Deus! O
Senhor é a nossa parte e o nosso refúgio.
Aleluia! Obrigado pela tua preciosa carta do
dia 9 de setembro e pelo cheque incluído
em libras esterlinas 11-10-8. Deus abençoe
a ti e à congregação pela vossa solicitude a
nosso respeito, não somente pelas vossas
orações, mas também pelos vossos
recursos (BERG, Daniel, 1916a, p. 18,
tradução nossa).

Como se pode notar, durante sua viagem ao país nórdico no ano de


1914, Berg foi a pessoa que teceu o relacionamento com Pethrus e a igreja
Filadélfia de Estocolmo, permitindo a ele mesmo e a Vingren de serem listados
na secretaria de missões desta e começarem a receber recursos da Suécia,
inclusive a favor de obreiros nativos, entre os quais Adriano Nobre:
Pará, Brasil, 24 de dezembro de
1915. Amado irmão Lewi Pethrus! O meu
intimo desejo é que o Senhor te abençoe em
tudo que fizer. Tenho recebido o dinheiro
das duas vezes que me enviaste, pelo qual
te agradeço de coração. O irmão Wingren
(sic) está agora nos EUA. O trabalho tem
sido muito e muito esparramado para mim,
pelo fato de eu ter que cuidar de uma família
de oito pessoas, mas até aqui me ajudou o
Senhor. Glória seja dada a Jesus! O irmão
Daniel está fora no interior desse estado. De
vez em quando fica fora por um ou dois
meses seguidos. Quero te pedir que, se for
me mandar algo para o meu mantimento, o
envie diretamente a mim, para que fique
mais fácil para mim o receber, se Daniel
estiver fora viajando. Por gentileza, escreve
tuas cartas também em inglês. Teu no amor
e na comunhão do Senhor Jesus Cristo.
Adriano Nobre Caixa 653, Pará, Brasil
(NOBRE, 1916, p.18, tradução nossa).

A amizade e consideração de Berg para com o amigo de infância


reverberaram no fato de o primeiro número do Evangelii Härold, órgão oficial da
Filadélfia, publicar uma carta do pioneiro no Brasil, endereçada ao amigo
pastor, no dezembro de 1915. Essa relação entre os dois aldeões de Vargön
veio colocar um termino ao hiato entre os anos 1911 e 1914, durante o qual
não existem claros indícios de um relacionamento efetivo entre as igrejas da
Suécia e os dois pioneiros no Brasil. Estes vieram e recebiam, no começo,
sustento financeiro das igrejas de imigrados suecos nos Estados Unidos:
2 de junho 1916. [...] Obrigado pelo cheque
de 236 coroas, que estava incluído na carta. [...]
Alegrai-vos em saber que aquela parte dos
recursos a mi destinada chegou no tempo certo,
porque da parte dos amigos em América não
recebo nem uma ajuda faz dois meses (BERG,
Daniel, 1916b, p. 117, tradução nossa).

De retorno da pátria, Berg recomeçou seu trabalho de evangelização da


bacia amazônica. Suas viagens costumavam durar por cerca de dois a três
meses, inicialmente num barco a remos, sucessivamente e graças às ofertas
vindo do país natal e da América, num barco a vela, chamado “Boas Novas”,
em companhia de três irmãos:
Envio aqui uma fotografia do barco a vela
do irmão Daniel Berg, que se chama “Boas novas”,
com o qual ele transporta boas novas. A bordo,
pode-se ver o irmão Daniel, e os três homens que
são a sua tripulação. O irmão Daniel viaja ao longo
da costa do Atlântico e, às vezes, visita as ilhas
entre o Pará e o rio Amazonas (VINGREN, G., 1919,
p. 54, tradução nossa).

Por sua experiência e resistência nas viagens ao longo do rio


Amazonas, Berg se tornou o instrutor dos demais missionários que,
sucessivamente, chegaram da Suécia no período em que ele esteve na obra
no Pará, entre eles Samuel Nyström e Joel Carlson. Estes o acompanhavam
em sua odisseia fluvial, aproveitando para apreenderem a língua e dar
testemunhos nos vários pontos de pregação.
Privações, perigos e doenças eram à ordem do dia em suas vicissitudes
missionárias. No mês de novembro de 1917, Daniel contraiu a malária, como
relata em carta do dia 21 de dezembro daquele ano. Por causa de suas longas
viagens, e da dificuldade de tratar a doença rios adentro, era comum Berg
sofrer dela por meses em seguida. Essa situação o impulsionou, no começo de
1918, a pedir seu passaporte ao Consulado Geral Sueco no Rio de Janeiro,
para poder voltar para Suécia, para o tratamento e um período de repouso.
A Europa, no então, estava mergulhada na Primeira guerra mundial, e as
relações entre os países estavam geralmente permeadas de suspeitas. Apesar
de sua neutralidade no conflito, os suecos, com seu aspecto e língua
germânicos, eram visto com muita desconfiança pelas autoridades brasileiras,
que herdaram da coroa portuguesa a proximidade política com o Reino Unido,
inimigo dos impérios germânicos centro-europeus da Áustria e Alemanha. Esse
sentimento refletiu na proibição do governo brasileiro do uso da escrita sueca
nas cartas que circulavam entre os missionários nórdicos no Brasil. Berg
testemunha esse fato em carta do começo de 1918: “Estamos autorizados a
escrever entre nós somente em inglês” (BERG, Daniel, 1918, p. 71, tradução
nossa).
O impasse diplomático somente permitiu a emissão do passaporte de
Daniel Berg no final de 1919, possibilitando ao missionário de chegar à sua
pátria no começo de 1920. No seu país, Daniel casou com Sara, no mês de
junho. Em sua viagem de volta ao Brasil, passando pelos Estados Unidos, sua
terceira, foi acompanhado por novos missionários suecos, com destino ao
campo brasileiro. São estes: sua esposa Sara, Samuel e Tora Hedlund,
Elisabet Johansson, Anna Carlson, Ingrid Andersson, Augusta Andersson, e o
“sueco-americano, enviado pelos pentecostais na América, Nels J. Nelson”
(TALLBACKA, 1920, p. 188-189). A saída da Suécia aconteceu no dia 20 de
novembro de 1920, com chegada ao Brasil no dia 21 de março de 1921, depois
de um período nos EUA. Em carta posterior, é confirmada também a presença
de Ester Andersson, perfazendo o total de nove novos missionários (BERG,
Daniel et al., 1921, p. 131).
Torna-se oportuna aqui uma reflexão sobre o papel de Berg na missão
sueca. Apesar de não ter dirigido grandes igrejas durante sua permanência no
Brasil, dois dos eventos que alavancaram a expansão do empenho missionário
sueco no Brasil estão ligados às suas duas viagens à terra pátria. Na primeira
destas, Berg conseguiu a inscrição no livro dos missionários da igreja Filadélfia
para si e seu colega Vingren. Isto aconteceu, como já visto, no ano de 1914, e
proporcionou recursos financeiros e humanos indispensáveis ao trabalho na
missão de evangelização do norte do Brasil.
Na segunda viagem, ele retornou acompanhado por um contingente de
nove novos missionários, o maior na história da missão pentecostal daquele
país. Lembra-se que o outro pioneiro, Gunnar Vingren, somente tinha efetuado
uma viagem à Suécia, entre os anos 1915-1917, quando era desconhecido, do
ponto de vista pessoal, de Lewi Pethrus e sua igreja. Parece evidente, portanto,
que a grande amizade com Pethrus, nascente líder do Movimento pentecostal
sueco, efetivou uma relação privilegiada para Berg e proporcionaria à nascente
missão pentecostal sueca no Brasil o diferencial, em recursos humanos e
financeiros, que a tornaria o maior campo de atuação do Pingströrelse 81.
Retornado ao Pará, Daniel e Sara foram morar durante um tempo em
Afuá, na ilha do Marajó. Como para seus colegas, no trabalho missionário
alcançava, sobretudo, a população pobre e marginalizada, que mais sofreu o
fim do ciclo da borracha: “O povo daqui está em um nível muito baixo, a maioria
não sabe ler nem escrever, muitos não sabem quando começa ou termina o
ano, nem quando nasceram” (BERG, S.; BERG, Daniel, 1921, p. 199-200,
tradução nossa).
No ano de 1922, Berg e sua esposa Sara deixaram o trabalho ao longo
do rio Amazonas, sendo substituídos por Nels J. Nelson, e se dirigiram para a
cidade de Vitória, no Espírito Santo, aonde chegou no dia 16 de maio. Estava
acompanhado pelo evangelista Almeida Sobrinho e família. Dois anos depois,
em 1924, fez uma viagem ao Rio de Janeiro e Santos. Nessa última cidade
encontrou boa recepção ao Evangelho. Decidiu mudar para lá. Em carta ao
Evangelii Härold, especifica o motivo de sua decisão:

81
Movimento pentecostal da Suécia.
Agora, estamos sentindo que será
impossível ficar mais aqui em Vitória, porque o
povo não quer escutar a Palavra de Deus. Muitos
dos missionários nos têm visitado, e todos
sentiram a dificuldade. Não importa quem seja que
pregar, é igualmente difícil o povo chegar ao
auditório. Cremos, todavia, que a Palavra do
Senhor que tem sido exposta aqui não voltará
vazia, mas que operou não importa onde fosse
pregada (BERG, S.; BERG, Daniel, 1924, p. 235,
tradução nossa).

Nessa cidade, a obra prosperou, apesar das dificuldades. Foi de Santos


que o casal Berg viajaria, no começo do ano de 1926, para a Suécia, onde
desembarcou no dia 10 de março, para um período de repouso. Berg e esposa
retornaram ao Brasil, desembarcando no Rio de Janeiro, onde se encontraram
com o casal Vingren, no dia 18 de setembro de 1927.
Em comunicação à redação do Evangelii Härold, Berg informou sua
mudança para São Paulo: “O irmão Berg comunica, do Brasil, que ele tem se
transferido de Santos para São Paulo. O seu endereço agora é: Daniel Berg,
Caixa 1786, São Paulo, Brasil” (MEDDELANDE..., 1928, p. 117, tradução
nossa). Essa mudança aconteceu no dia 15 de dezembro de 1928. Nessa
cidade, ele reencontrou Adriano Nobre, seu antigo colaborador da obra no
Pará, que estava trabalhando secularmente, mas que exprimiu o desejo de
voltar à ativa na missão. Por ele, Berg pediu recursos financeiros às igrejas da
Suécia, para que Adriano pudesse voltar a cooperar na evangelização da
capital paulistana. Com a colaboração do amigo e de outros, a obra expande
no Estado, alcançando Campinas, Nazaret, Jundaí, Mairinque.
Chega o ano de 1929, e a missão sueca é marcada por uma importante
mudança, que aconteceu no país nórdico. A Svenska Fria Missionen, dirigida
por A. P. Franklin e responsável pelas missões do Movimento pentecostal
sueco no exterior, fora liquidada. Depois de cinco anos de atuação, essa
organização centralizadora e com aspirações de independência, fruto de um
projeto de Pethrus, sucumbe diante da compreensão missionária da maioria
das igrejas do Pingströrelse82, oriunda dos ideais de William Taylor. O resultado
foi que a responsabilidade e os recursos pelos missionários no Brasil voltaram
a ser das igrejas locais da Suécia. Essa mudança foi geralmente bem recebida

82
Movimento pentecostal da Suécia.
entre os missionários, que ficavam livres das exigências centralizadoras e
autoritárias da Svenska Fria Missionen83 e de seu chefe.
O próprio Berg escreveu mais de uma carta, parabenizando pelas
decisões tomadas na conferência missionária de Kölingared de 1929. Na
primeira carta, assinada em colaboração com Gunnar Vingren, comunica:
Como resposta à comunicação referente à
Missão Sueca Livre, queremos aqui em comum
exprimir nossa grande alegria pelas felizes
mudanças a respeito da questão missionária. Pela
nossa parte, nunca simpatizamos com os
princípios da Missão Sueca Livre, mas tínhamos
decidido que, até nenhum embaraço fosse
colocado sobre nossa liberdade pessoal, teríamos
aceitado as suas disposições, mas que, no
momento em que a liberdade de trabalhar na
direção do Espírito nos fosse impedida, então
protestaríamos, no nome de Jesus (VINGREN, G.;
BERG, Daniel, 1929, p. 682-683, tradução nossa).

Na segunda, o tom é de júbilo:


São Paulo, dia 24 de setembro de 1929.
Graça e paz em Jesus! “Assim diz o Senhor, Deus
de Israel: Deixa o meu povo ir, para que me sirva no
deserto” (Ex 5.1b). Essas palavras do Senhor foram
ditas a faraó e se referiam à libertação material e
física de Israel da escravidão no Egito. Também, é
uma figura magnífica do Israel espiritual de Deus, a
igreja de Deus, que Ele está para libertar das
correntes e cordas do formalismo. Como estamos
alegres, que a assim chamada Missão Sueca Livre
tenha sido suprimida e que as próprias igrejas
livres possam cuidar por si mesmas de seus
obreiros na vinha do Senhor. Isso é de acordo com
a Palavra do Senhor, conforme At 13.2-4 (BERG,
Daniel, 1929, p. 682-683, tradução nossa).

O motivo de tanta alegria da parte de Daniel Berg é explicado por Pethrus no


seu relatório sobre a Conferência de Natal, publicado na Suécia no ano
seguinte:
Durante os últimos anos, uma parte dos nossos
missionários, e, especialmente, os dois fundadores da
missão, tem sido exposta a reclamações da parte de uma
pessoa que, na verdade, deveria ajudá-los a carregar seus
fardos. A coisa foi tão longe, que um de nossos irmãos, na
primavera de 1929, com risco de perder seu sustento
econômico da pátria, teve que rejeitar as cartas que de
volta em volta recebia da direção da missão aqui na
Suécia. Ele não podia suportar todo esse equívoco, do
qual as cartas da Suécia transbordavam. Esse missionário,
que tomou essa atitude, é um irmão que por Deus foi
83
Missão Sueca Livre.
dotado, de uma maneira especial, de um espírito humilde e
passivo. É o irmão Daniel Berg (PETHRUS, 1930b, p. 723,
tradução nossa).

As reclamações, às quais Pethrus se refere, vinham de A. P. Franklin, e


vertiam em volta do projeto deste de transformar a Sociedade Evangélica
Assembléia de Deus, registrada em Belém no ano de 1918, por Vingren, Berg e
Nyström, sob o número de ordem 131.448 do Cartório da cidade, numa
organização que abrangesse os direitos patrimoniais e imobiliários da missão
em todo o Brasil, o que era contrário ao ethos das igrejas do Pingströrelse 84.
No ano seguinte, a piora das condições de saúde de sua esposa Sara,
constrangeram Berg a viajar para a Suécia com a família. Antes, porém,
participara da Conferência de Natal, de 5 a 10 de setembro, que será tratada
mais amplamente no próximo capítulo.

3.1.3 Otto Nelson, paixão por missões


O sueco Otto Nelson era um imigrado nos EUA, onde era membro da
igreja batista de Providence, no Estado de Rhode Island. Foi separado como
missionário ao Brasil pela igreja presidida pelo pastor B. M. Johnson, em
Chicago. Com sua esposa Adina, chegou ao Pará no dia 25 de outubro de
1914 (GUSTAFSSON, 1921). Eles foram os primeiros missionários
pentecostais que seguiram os dois pioneiros, Vingren e Berg, no Brasil. Seu
começo na missão foi cooperando na evangelização em Belém, Pará. No dia
21 de agosto de 1915, se dirigiu ao Estado de Alagoas, para a capital Maceió,
onde, no dia 22 de outubro de 1922, inaugurou o então maior templo das
Assembleias de Deus no Brasil, com grande repercussão a nível nacional
(ARAÚJO, 2007).
Precedentemente, no ano de 1920, tinha visitado sua pátria, que deixou
novamente no dia 24 de setembro de 1921, direto a New York, de onde
continuaria, depois de um período, para o Pará, onde atracou no dia 7 de
fevereiro de 1922, acompanhado por reforços à missão brasileira, o casal
Agnes e Simon Sjögren. Alguns dias depois, embarcou novamente e visitou o
Maranhão, Pernambuco, até chegar ao Alagoas. Existe uma particularidade em
seu relato da chegada a Maceió:

84
Movimento pentecostal da Suécia.
“Chegamos e todos nós ocupamos nossa
pequena casa de barro, oito pessoas em tudo,
muitos espremidos até agora, mas o irmão Sjögren
e esposa e a irmã Nina Englund da América acabam
de alugar uma casa para eles e irão mudar”
(NELSON, A.; NELSON, O., 1922a, p. 99, tradução
nossa).

Essa “irmã Nina Englund” (sobrenome tipicamente nórdico) parece ser


mais uma missionária solteira sueco-americana que procedeu dos EUA. Seu
nome não aparece no artigo de Gustafsson (1921), no Evangelii Härold, que
relata a partida dos casais Nelson e Sjögren da Suécia no ano de 1921,
portanto, ela deve se ter juntado ao casal Nelson durante a permanência deste
nos EUA, para acompanhá-lo ao campo missionário brasileiro. Nina Englund foi
morar junto com o casal Nelson, antes, e Sjögren, depois, para apreender a
língua e treinar para a obra de evangelização no Brasil. Essa suposição é
reforçada pelo fato de ela assinar uma carta posteriormente enviada à Suécia e
publicada no mesmo jornal, que reporta, como palavras finais: “Preciosas
saudações de paz dos vossos irmãos e irmãs na luta por Jesus e pelo Brasil:
Otto Nelson, Adina Nelson, Nina Englund, Simon Sjögren e Agnes Sjögren”
(NELSON, O. et al., 1922, p. 115, tradução nossa). Araújo (2007) a insere em
seu quadro de missionários americanos que trabalharam na missão
pentecostal sueca do Brasil, sem fornecer a data de chegada ao Brasil e o
lugar de trabalho.
No ano de 1924, Otto Nelson começou a evangelização da capital da
Bahia, Salvador. As dificuldades e as perseguições eram à ordem do dia. No
começo de 1927, Adina, sua esposa, viajou para o sul baiano, onde um
evangelista estava trabalhando na cidade de Canavieiras. O ano de 1928 foi
transcorrido na Suécia, para um período de repouso. O casal Nelson deixou a
Escandinávia em volta do dia 19 de setembro daquele ano, com a saída da
capital da Noruega, rumo à América do Norte, como informado numa carta ao
jornal da Filadélfia de Estocolmo:
Oslo, dia 19 de setembro de 1928. A pátria, os pais
e muitos irmãos e irmãs na fé estão sendo deixados para
trás, mas ainda guardamos uma luminosa lembrança, que
com certeza nos acompanhará em nossa jornada por mar e
por terra. [...] Nosso endereço na América, durante o
tempo que estaremos por lá, é: c/o B. M. Johnson, 1331
Newport Avenue, Chicago, Illinois, U.S.A (NELSON, A.;
NELSON, O., 1928, p. 648, tradução nossa).
Depois de uma temporada na igreja que o tinha enviado ao Brasil,
situada em Chicago, Illinois, e presidida pelo pastor B. M. Johnson, no dia 7 de
maio deixaram o porto de New York e, passando por Belém no dia 25 de maio,
onde ficaram seis dias, desembarcaram em Maceió no dia 8 de junho. O desejo
de transferir-se para a Bahia começa a impulsionar o casal Nelson no ano de
1929, mas necessitava-se de alguém que assumisse o trabalho no Alagoas e
Sergipe, como ele expõe em carta à Suécia:
O que vamos fazer com a Bahia? Aquela grande
cidade pesa constantemente sobre os nossos corações, e
eu creio verdadeiramente que, se Deus quiser, iremos nos
mudar para lá assim que for possível. Todavia, é
impossível para nos deixarmos esse lugar antes de um
novo missionário chegar aqui (NELSON, A.; NELSON, O.,
1929, p. 602, tradução nossa).

A questão foi resolvida com a chegada a Maceió do casal Algot e Rosa


Svensson:
Maceió, Alagoas, Brasil, dia 26 de abril de
1930. [...] Louvado seja Deus, porque vale a pena
orar ao Senhor, pois Ele enviou os missionários
Algot e Rosa Svensson para trabalhar aqui no
Alagoas, e agradecemos a Deus por esses queridos
irmãos que o Senhor conduziu até aqui. Agora
sabemos que podemos tranquilamente entregar
esse trabalho aqui. [...] Eu fui à Bahia na semana
passada e aluguei uma casa e agora pensamos de
mudar em umas três semanas, com a direção e
ajuda de Deus (NELSON, A.; NELSON, O., 1930, p.
396, tradução nossa).

Otto Nelson foi um dos missionários suecos que participaram da


Conferência de Natal de 1930.

3.1.4 Samuel Nyström, o arquiteto das Escolas Bíblicas


Originário da cidade sueca de Årsta, onde nasceu em 1891, Samuel
Nyström teve a oportunidade de ouvir Daniel Berg pregar sobre o Brasil,
durante a visita deste à Suécia, no ano de 1914. Paixão (2011) afirma, em seu
esforço apologético contra a acusação de marginalidade intelectual da teologia
pentecostal assembleiana, que Nyström era formado em curso superior, mas
não fornece a fonte dessa informação. Vingren (I., 1994b, p. 28) assevera que
Nyström tinha formação universitária, conforme sua citação de carta de
Nyström, em obra publicada na Suécia: “No ano de 1907, passei no exame do
ensino secundário. Eu tinha decidido me tornar arquiteto paisagista e estudei
para isso por seis anos. Contemporaneamente, me afastei mais e mais do
Senhor” (NYSTROM, S., 1916, p. 81 apud VINGREN, I., 1994b, p. 28, tradução
nossa).

O texto sueco citado por Vingren (1994b, p. 28), porém, não concorda
com o texto sueco de Nyström, inserido numa carta de Pethrus, publicada no
jornal Evangelii Härold. Este último reporta:
No ano de 1907, passei no exame do
ensino secundário, depois do que a questão
da escolha de que carreira tomar na vida
ficou em primeiro plano. Comecei,
primeiramente, a carreira de engenheiro,
mas não demorou muito para eu me voltar
para a carreira de contabilista, que também
abandonei logo, e comecei a profissão na
área da paisagística de jardins, que,
posteriormente, pensei continuar a estudar
no exterior. Trabalhei nesse ramo durante
seis anos, e os meus planos eram bem
ambiciosos, mas, ao mesmo tempo,
mergulhei mais e mais no pecado
(NYSTROM, Samuel, 1916 in PETHRUS,
1916, n. 20, p. 81, tradução nossa)85.

A versão citada por Ivar Vingren parece ser um resumo do texto original,
com uma atualização linguística86. A discrepância entre os dois textos é
evidente, por o primeiro reproduzir, supostamente, o texto de Nyström extraído
do mesmo artigo de Lewi Pethrus publicado no Evangelii Härold, cujo texto
traduzido é reproduzido aqui acima. O autor dessa monografia não está em
posse de informações que possam explicar essas diferenças. Uma coisa,
todavia, parece certa, e é que se Nyström possuía alguma formação superior,
esta era de engenheiro ou arquiteto paisagista, nada que fosse relacionado

85
O texto de Nyström, inserido numa carta de Pethrus e publicada no jornal sueco Evangelii Härold (ano
1916, n. 20, p. 81), diz: “År 1907 tog jag realskolexamen, varefter frågan om val av livsbana kom i
förgrunden. Jag började först på ingeniörsbanan, men det dröjde ej länge, förrän jag var inne på
kontorsbanan och lämnade även den rätt snart och begynte i trädgårdsyrket, vilket jag sedan tänkte
fortsätta att studera i utlandet. Jag arbetade i detta fack i 6 år, och mina planer voro rätt höga, men på
samma gång gick jag även längre och längre bort i synden.”
86
Ivar Vingren cita que Nyström escreveu, no jornal sueco Evangelii Härold (ano 1916, n. 20, p. 81): “År
1907 tog jag realskolexamen. Jag beslöt att bli trädgårdsarkitekt och studerade för detta i 6 år. Samtidigt
kom jag allt längre bort från Herren.”
com a área teológica ou o ministério pastoral (ao menos conforme os padrões
hodiernos).

Depois de ter frequentado a Escola missionária de John Ongman em


Örebro, Nyström foi escolhido pela igreja Filadélfia de Estocolmo, presidida por
Lewi Pethrus, para ser missionário ao Brasil. Antes de sua saída para o país
tropical, Nyström trabalhou como evangelista na Suécia, e foi um dos
fundadores e o primeiro pastor presidente da igreja Filadélfia da cidade de
Borås, no dia de ano novo de 1916. No dia 28 de junho de 1916, Samuel e sua
esposa Lina deixaram o porto de Bergen, na Noruega, rumo à New York, de
onde partiram, depois de uma breve permanência, para o Pará, com chegada
no dia 18 de agosto.
Nos primeiros meses no Brasil, Nyström se aplicou a estudar a língua
portuguesa. Acompanhava Adriano Nobre, em cuja casa se hospedou dois
meses, em suas viagens evangelísticas e visitas às congregações na região da
mata paraense. Durante esse processo, Nyström chegou a preparar algumas
listas de vocábulos e normas gramaticais do português, que traduzia para o
sueco, com a intenção de colocá-las a disposição dos demais missionários
que, eventualmente, deviam chegar ao Brasil. Evidenciava-se, assim, a
capacidade literária e pedagógica que devia marcar seu ministério nas
Assembleias de Deus no Brasil. Evangelizava, também, ao longo do trecho da
ferrovia desbravado por Daniel Berg.
Em sua carta de 1917, é evidenciada a importância que as igrejas de
imigrados suecos nos EUA tinham para o sustento inicial da missão no Brasil.
A importância dessas contribuições foi, sobretudo, notável diante dos
problemas de comunicação com a Europa, em seguida aos acontecimentos
bélicos no Velho Continente, como informado à Suécia: “Durante o tempo em
que não chegou nada da Suécia, o Senhor nos tem sustentado através dos
seus ‘corpos’ nos EUA” (NYSTRÖM, L.; NYSTRÖM, S., 1917, p. 126, tradução
nossa).
No outubro de 1918, Nyström foi enviado por Gunnar Vingren a Manaus,
onde existia um grupo de Pentecostais. De uma das cartas de Nyström, pode-
se extrair uma particularidade interessante sobre as perseguições que as
outras igrejas protestantes levantavam contra os pentecostais. Nela se afirma
que a única denominação que não atacava o trabalho da missão sueca em
Manaus era a Igreja Episcopal Inglesa, por causa da esposa do pastor ter sido
batizada no Espírito Santo. Inclusive, esta igreja permitiu a Samuel Nyström de
pregar diversas vezes em seu templo (NYSTRÖM, L.; NYSTRÖM, S., 1918).
As igrejas batistas e presbiterianas, ao contrário, levantaram fortes campanhas
de descrédito, chamando os Pentecostais de “nova seita de espíritas” e ao
sueco de “falso profeta” (NYSTRÖM, L.; NYSTRÖM, S., 1919, p. 19, tradução
nossa). Nessa mesma carta, são evidenciados os problemas relacionados ao
fim do ciclo da borracha e as dificuldades econômicas enfrentadas pelo povo
da cidade e região.
Chamado de volta para substituir Daniel Berg, se dedicou ao trabalho
com o “Boas Novas”, o barco da missão, às vezes acompanhado por sua
própria esposa. Esse trabalho nas margens do grande rio durou até a volta de
Berg da Suécia, quando, a bordo de novo barco, enfrentou as viagens na
companhia do pioneiro e de Nels J. Nelson, pelo qual foi posteriormente
substituído.
Um dos fatos marcantes do ministério de Nyström é o envio de um
missionário da igreja de Belém, decisão esta tomada em colaboração com
Gunnar Vingren. O nome do enviado era José de Mattos, português imigrado
ao Brasil que trabalhava na obra paraense há quatro anos. Foi enviado ao seu
país de origem, o Portugal, no dia 21 de junho de 1921.
As perseguições durante o trabalho no Pará eram comuns, sobretudo da
parte das igrejas presbiteriana e batista. A mensagem pentecostal, porém,
atraia mais e mais pessoas: uma inteira igreja de presbiterianos independentes
da cidade estava à busca da experiência do batismo no Espírito.
Samuel Nyström era muito preocupado com o ensino da Bíblia. Para
isso, organizou a primeira Escola bíblica para obreiros em Belém, conforme o
modelo das escolas bíblicas de curta duração do Movimento Pentecostal na
Suécia. O próprio Nyström era o ensinador principal do evento:
Se Deus quiser, do dia 4 de março ao dia 2 de abril teremos uma escola
bíblica aqui. Orai por mim, para que o Senhor abençoe a palavra, para que nós
que fomos chamados ao serviço do Evangelho e os outros obreiros mais
velhos possamos nos aprofundar mais na Palavra e no Espírito; para que o
Senhor possa vencer ainda maiores batalhas através de nos (NYSTRÖM, S.,
1922, p. 54-55, tradução nossa).
Araújo (2007) informa que a escola durou de 4 de março a 4 de abril. No
mês de maio, Samuel e Lina Nyström viajaram para o país natal. A viagem
começou dia 17 de maio de 1922, passando pela Inglaterra, com a chegada a
Göteborg, na Suécia, no dia depois de Pentecostes daquele ano. Foi um
período de muitas viagens e visitas às igrejas livres da Suécia, testemunhando
a respeito da obra no Brasil. Sua volta ao país tropical começou no dia 24 de
fevereiro de 1923, passando pelos EUA, onde ficou um tempo hospedado
numa casa anexa ao templo de uma comunidade pentecostal na 56° Avenue,
em New York. A chegada em terras brasileiras do casal Nyström aconteceu no
dia 3 de agosto de 1923, como ele mesmo informa em carta ao Evangelii
Härold87: “Chegamos de volta ao nosso campo de trabalho no dia 3 de agosto,
depois de uma navegação muito feliz, pela qual estamos gratos ao Senhor”
(NYSTRÖM, L.; NYSTRÖM, S., 1923, p. 537, tradução nossa). Araújo (2007),
diferentemente, reporta que a chegada do casal Nyström ao Brasil foi em 21 de
janeiro de 1923.
Com a viagem do casal Vingren à Suécia, Nyström tomou conta da
igreja e do jornal “Boa Semente”, do qual era um dos redatores, tornando-o
uma publicação mensal. O seu empenho editorial, organizativo e financeiro a
favor do jornal sempre foi muito intenso, em colaboração, especialmente, com
Nels J. Nelson (ARAÚJO, 2007). Relata o sueco em uma de suas cartas:
Na mesma ocasião, comprei uma nova
maquina para imprimir com material. Depois,
passei quatorze dias em casa, no Pará, e organizei
dois números do nosso jornal. [...] A seguir, viajei
com Vingren para Alagoas, para visitar a
conferência [...] Cheguei em casa bem a tempo para
o Natal e, então, foi completamente submerso pelo
trabalho, porque a edição do jornal estava atrasada
por causa da minha ausência e eu percebi a
necessidade de imprimir os textos da escola
dominical junto com o texto do jornal, e então
comecei essa tarefa também, e trabalhei todos os
dias e uma grande parte das noites também para
isso, e foi somente pela graça de Deus que não
sucumbi. Na mesma ocasião, uma prensa foi
colocada a venda por um preço barato, assim a
comprei e nossa pequena gráfica foi aumentada,
podendo agora trabalhar com folga. Custou, com
uma pequena casa incluída no negócio, menos de

87
Arauto do Evangelho.
2000 coroas suecas (NYSTRÖM, L.; NYSTRÖM, S.,
1924, p. 340, tradução nossa).

O alcance de sua responsabilidade missionária, depois da ida ao sul do


Brasil de Berg e Vingren, era, geograficamente, imenso, chegando até a divisa
com a Bolívia, com viagens de 18 dias de navio a vapor, sobre o rio Amazonas
e seus afluentes (rio Madeira). Sabe-se, de suas cartas, que visitou igrejas
pentecostais na Rondônia e em Porto Velho:

Onde eu fui, durante muitos anos construíram um


curto trecho de uma ferrovia, e durante esse tempo se
calcula que entre 20.000 e 30.000 pessoas morreram de
malária, a maioria entre os trabalhadores da linha férrea.
Existiam oito médicos que trabalhavam no hospital,
durante a construção da ferrovia, e entre 15 e 20 pessoas
morriam cada dia (NYSTRÖM, L.; NYSTRÖM, S., 1924, p.
340, tradução nossa).

Esta ferrovia parece ser a linha férrea Madeira-Mamoré, construída


durante o ciclo da borracha para escoar a produção para o mercado
internacional. A. P. Franklin, em relatório à Suécia de sua viagem na América
do Sul, confirma que “na região da malária entre Porto Velho e Guajará-mirim,
existem muitos novos lugares abertos e muitas pessoas foram batizadas nas
águas” (FRANKLIN, 1927, p. 251, tradução nossa).
Outra grande preocupação de Samuel Nyström era a situação política do
Brasil. Durante o ano de 1925, escreveu sobre as dificuldades criadas pelas
perspectivas de mudanças constitucionais, projetadas pelo “atual presidente”
que “ [...] é um devoto católico, e o que muitos de nossos opositores esperam é
que [...] possam nos perseguir pelo braço da lei” (NYSTRÖM, S., 1925b, p.
289, tradução nossa). Este é um referimento à tentativa da Igreja Católica
Romana de ser reconhecida como igreja oficial do Estado. Na mesma carta,
encontra-se o relato do problema com o barco missionário, depois de uma lei
ter vedado a propriedade de material náutico aos estrangeiros, o que
constrangeu os missionários à venda do barco.
Em carta posterior, as suspeitas de Nyström se realizam, com a
aprovação de leis discriminatórias:
Os velhos métodos violentos ainda são praticados
pela igreja católica, foi suficiente apenas que as leis do
país fossem mudadas em seu favor, para que não
demorasse muito para o tribunal da inquisição e a fogueira
serem restaurados, porque o mesmo espírito de
perseguição está arrasando agora, quando o fanatismo do
povo e as sanções da igreja o rendem possível (NYSTRÖM,
S., 1927, p. 239, tradução nossa).

No ano de 1925, Nyström começou uma jornada ao sul do Brasil,


passando por Recife, Rio Grande do Norte, Ceará, Rio de Janeiro e Santos.
Nestas duas últimas localidades, encontrou-se, respectivamente, com Gunnar
Vingren e Daniel Berg.

Diante da grande expansão da obra no Pará, Samuel começou, no mês


de fevereiro de 1926, a construção de um templo maior, que foi inaugurado no
dia 30 de outubro, com a presença de mais de 1000 pessoas. A despesa final
foi entorno dos 80.000,00 milreis, mas teve a colaboração maciça da igreja e
da sociedade, inclusive das autoridades públicas. No ano de 1927, Nyström
comprou um carro, um Ford, em cooperação com Nels J. Nelson, que recebeu
uma oferta para isso de uma crente americana. O automóvel lhe facilitou o
trabalho, reduzindo os tempos para as distâncias a serem percorridas na
cidade e no interior. Nesse ano, deu início ao movimento beneficente para
viúvas de pastores (ARAÚJO, 2007). Naquela altura, o contingente missionário
sueco já contava com uma viúva, a missionária sueca Anna Viktoria Jansson,
em seguida à morte do missionário Viktor Jansson, falecido de malária no dia 2
de dezembro de 1924, e sepultado na base missionária de Afuá, na ilha de
Marajó.
Por causa do esgotamento das condições de saúde de Lina, o casal
Nyström viajou no mês de abril de 1928 para a Suécia. Samuel, porém,
desembarcou no Portugal, onde visitou o missionário, sustentado pela igreja de
Belém, José de Mattos. Lina, sua esposa, continuou para o país nórdico, junto
com as missionárias solteiras Augusta Andersson e Elisabeth Johansson.
Samuel chegou à Suécia no começo do mês de junho. Na viagem de retorno
ao campo brasileiro, que começou no dia 9 de março de 1929, os Nyström
visitaram a Inglaterra, onde pararam cinco dias e pregaram em cultos das
Assembleias de Deus do país. Na continuação da viagem, desembarcaram
novamente no Portugal, aonde chegaram no dia 20 de março. Samuel
aproveitou esse período para visitar Madri, na Espanha, onde trabalhava um de
seus colegas da Escola Bíblica de Örebro. A viagem para o Brasil recomeçou
no dia 18 de abril (NYSTRÖM, L.; NYSTRÖM, S., 1929).
No fim de maio e inicio de junho do ano de 1930, Nyström deu início à
outra viagem ao sul do Brasil, convidado pelo missionário Gustaf Nordlund, que
dirigia a Assembleia de Deus em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. A essa
altura, Samuel já tinha se despedido da igreja de Belém, por ele dirigida desde
1924, para assumir o trabalho na cidade de São Paulo. Na viagem de ida,
visitou o casal Vingren no Rio de Janeiro.

Depois do pioneiro Gunnar Vingren, Nyström foi a personalidade mais


marcante da missão sueca no Brasil. Escreveu Ivar Vingren a respeito dele:

Descrever a obra de Samuel Nyström dos


anos de 1924 a 1930 não é fácil. Ele era um líder
dedicado que tinha a supervisão sobre tudo e
todos, sempre onipresente através de suas
inúmeras viagens, mas contemporaneamente, era o
incontestável dirigente e pastor da igreja local, que
com solicitude cuidava pessoalmente das
necessidades do rebanho. Era, também, um
evangelista dedicado que se esmerava até o
extremo para que as pessoas pudessem ouvir, ver
e experimentar o poder do glorioso Evangelho de
Cristo (VINGREN, I., 1994b, p. 31, tradução nossa).

Samuel Nyström participou, junto aos outros missionários suecos, da


Conferência de Natal, no mês de setembro de 1930.

3.1.5 Frida (Strandberg) Vingren, devoção e perseverância


A missionária sueca Frida Strandberg, enfermeira com formação
universitária, originária de família luterana do norte da Suécia, conheceu a
experiência pentecostal na igreja Filadélfia de Estocolmo, dirigida por Lewi
Pethrus (VINGREN, I., 1994b). Araújo (2007) a descreve como poetisa,
compositora, musicista, redatora, pesquisadora, pregadora e ensinadora.
Frequentou o Instituto Bíblico em Götabro, em seu país natal. Participou sua
chamada missionária ao pastor Lewi Pethrus, que a apresentou a Gunnar
Vingren, naqueles dias na Suécia para um período de descanso e que fora
convidado para cooperar de grupos de oração nas casas de Pethrus e de certo
irmão Väster, em Estocolmo. O assunto das orações era a chamada
missionária de Frida. Foi durante essas orações, que Gunnar e Frida vieram a
se conhecer (VINGREN, I., 1994b).
Araújo (2007) relata que Strandberg partiu a bordo do navio
“Bergensfjord” no dia 12 de junho de 1917, rumo ao Brasil via New York, onde
encontrou Vingren, que esperava seu passaporte americano das autoridades, e
que ela partiu da cidade americana para o Brasil no dia 21 de junho. Em uma
de suas cartas, porém, Frida informa que “na quinta-feira, dia 31 de maio, às
4h00, deixamos Kristiania88” e “a viagem no Atlântico foi boa, com tempo calmo
e silencioso” e que, “no dia 20 de junho, o navio saiu de Nova Iorque para o
Brasil” (STRANDBERG, 1917, p. 145, tradução nossa). Strandberg prosseguiu
até o Brasil, onde desembarcou no dia 4 de julho de 1917, em Belém, Pará.
Era a primeira missionária sueca solteira enviada ao Brasil pelo Movimento
pentecostal de seu país. Vingren a encontrou nesta cidade no mês seguinte.
Em 16 de outubro de 1917, Gunnar e Frida casaram-se, em cerimônia oficiada
pelo missionário Samuel Nyström.
Intelectualmente refinada, Frida refletia sobre a situação paupérrima da
mulher na sociedade brasileira, sobretudo a das mais marginalizadas,
excluídas da educação. Temos suas impressões a respeito deste assunto
numa de suas cartas à Suécia:
Pelo jeito, esse povo está num ponto
inferior, tanto intelectual como praticamente, e
essas mulheres não podem, por exemplo, ser
comparadas às ativas e inteligentes mulheres da
Europa. A mulher instruída aqui é uma exceção,
quando ela, por viajar ou pelos estudos, adquire
mais conhecimento e cultura. As pobres vivem na
maior ignorância. A maioria não sabe ler nem
escrever. A apatia é um traço marcante. A atividade
principal delas é, pintadas e vestidas como uma
boneca, ficar penduradas à janela. Se estivermos
percorrendo uma rua, pode ser num bairro pobre o
entre os mais ricos, encontramos o mesmo
panorama (VINGREN, F., 1918, p. 165, tradução
nossa).

Características eram, também, suas impressões sobre o ritmo de vida


brasileiro: “Aqui em casa tem vida e movimento. Neste país, não tem muito o
costume de pegar no pesado como na Suécia” (VINGREN, F., 1919, p. 51,
tradução nossa).

88
Atual Oslo, capital da Noruega.
Sobre a relação social entre os dois sexos, escrevia:
Para uma mulher evangelizar, aqui
existe muito mais dificuldades do que ali na
Suécia. Aqui, uma irmã não pode sair em
uma assim chamada viagem missionária,
viajar sozinha no interior do país com um
irmão ainda muito menos. Só pode viajar
com um missionário casado se a esposa
dele estiver junta. Qualquer outra hipótese
despertaria reprovação e seria puramente
impossível. Aqui não existe a mesma
liberdade que temos em nosso país
(VINGREN, F., 1921, p. 89-90, tradução
nossa).

Esgotados pelo muito trabalho, as doenças e o clima proibitivo para os


nórdicos, o casal Vingren viajou para a Suécia no dia 8 de maio de 1921, para
um período de tratamento e descanso. Sua volta a Belém, Pará, aconteceu no
dia 1 de fevereiro de 1923. No ano seguinte, a família Vingren mudou-se para a
capital brasileira, Rio de Janeiro, começando a trabalhar em São Cristóvão.
Aqui, Frida estava empenhada na direção da obra social da igreja, da escola
dominical, dos grupos de visita e de evangelização. Substituía o marido na
direção dos cultos, quando ele estava ausente, viajando ou doente. Enérgica e
eficiente, suas atitudes não agradavam a todos e levantavam mal-entendidos e
incompreensões (ARAÚJO, 2007).
Frida Vingren tinha uma grande capacidade de ensinar e pregar. Como
muitas de suas cartas mostram, ela tinha um refinado senso literário, o que lhe
proporcionou a possibilidade de colaborar com a nascente imprensa
pentecostal. Entre outros, os três jornais editados pelas Assembleias de Deus
até a definitiva saída dos Vingren do Brasil, o “Boa Semente”, o “Som Alegre” e
o “Mensageiro da Paz”, além das “Lições Bíblicas”.
No Rio, Frida e família enfrentaram muitas dificuldades materiais, devida
à insuficiência dos recursos financeiros para a manutenção daquela que estava
se tornando a maior obra missionária pentecostal no país. A crise financeira
mundial de 1929 intensificou o problema. Relata em uma de suas cartas:
Queremos aqui expor a gratidão do nosso
coração pelo sustento trimestral. Estávamos
completamente sem recursos, sim, endividados, e
não tínhamos como pagar as dívidas e o aluguel do
mês de abril. Agora, podemos olhar para cima, para
o Senhor, por tudo que é mais necessário. Durante
os últimos meses, temos recebido menos recursos
da América, pelo fato que um irmão, que antes
sempre ofertava, tem quase parado por causa de
seus problemas financeiros. Isso vale também pelo
lado material da obra aqui na cidade (VINGREN, F.,
1929, p. 310, tradução nossa).

Em fotografias da época, Frida Vingren aparece como uma das duas


mulheres que participaram da Conferência de Natal de 193099, entre os
missionários suecos e os pastores nacionais. Nas reuniões da conferência, um
dos assuntos foi o trabalho possibilitado às mulheres, dentro das Assembleias
de Deus. Esse assunto será mais amplamente tratado no próximo capítulo.

3.1.6 Breve panorâmica dos demais missionários suecos e sueco-


americanos que trabalharam no Brasil nos anos de 1910 a 1930
Além dos oito missionários mencionados nos tópicos precedentes deste
capítulo, mais vinte e oito missionários suecos ou sueco-americanos
desembarcaram no Brasil, para ingressar nos trabalhos da missão pentecostal.
Isso dá um total de trinta e quatro, dos quais quatorze homens e vinte
mulheres. Entre estas últimas, oito vieram solteiras de seu país. São elas: Frida
Strandberg, Anna Carlsson, Augusta Andersson, Ester Andersson, Ingrid
Andersson, Elisabet Johansson, Nina Englund e Beda Palm.
Na tabela que segue, são listados os missionários e as missionárias
suecas que chegaram ao Brasil entre os anos 1910 a 1930:
Ano Nome
Procedência
1910 Daniel Berg
1910 Gunnar Vingren
1914 Adina e Otto Nelson
1916 Lina e Samuel Nyström
1917 Frida Strandberg
1918 Signe e Joel Carlson
1921 Sara Berg
1921 Nels Julius Nelson
1921 Tora e Samuel Hedlund
1921 Anna Carlsson
1921 Augusta Andersson
1921 Ester Andersson
1921 Ingrid Andersson
1921 Elisabet Johansson
1922 Nina Englund
1922 Agnes e Simon Sjögren100
1922 Anna e Viktor Jansson
1923 Hedvig e Gustav Nordlund101
1924 Linnea e Simon Lundgren
1927 Beda Palm
1928 Eufrosyne e Nils Kastberg102
1928 Rosali e Algot Svensson
1930 Cecilia e Anders Johansson
EUA
EUA
EUA
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
EUA
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
EUA
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
Suécia
Fonte: Evangelii Härold

100 O casal Sjögren saiu para o Brasil no dia 24 de setembro de 1921, via New
York, acompanhando Otto e Adina Nelson e chegando ao Pará no dia 7 de
fevereiro de 1922 (NELSON, A.; NELSON, O.,1922, p. 99). Araújo (2007, p.
472) afirma que Simon e Agnes Sjögren chegaram ao Brasil no ano de 1921.

101 Araújo (2007, p. 472) chama Hedvig, a esposa de Gustav Nordlund, de


Elisabeth e afirma que o casal sueco chegou às terras brasileiras no ano de
1924. Em carta publicada no Evangelii Härold, porém, o casal de missionários
informa que, no dia 2 de fevereiro [de 1923], o navio atracou no Pará
(NORDLUND, G.; NORDLUND, H., 1923, p. 269-270).

102Não são listados entre os missionários suecos por Araújo (2007, p. 472),
mas em carta publicada na Suécia, o casal Kastberg comunica sua separação
para a missão brasileira durante o culto da Filadélfia de Estocolmo do dia 20 de
maio de 1928 e sua viagem marítima para o Brasil, saindo de Amsterdã na
Holanda, que aconteceu no dia 23 de maio (KASTBERG, E.; KASTBERG, N.,
1928, p. 409). Em Paixão (2011, p. 10, negrito nosso), podemos ler: “Se
conferirmos uma fotografia do templo da AD de São Cristóvão no Rio de
Janeiro, construído pelo missionário Nils Kastberg e inaugurado em 1938 [...]”,
confirmando sua presença e atividade na missão sueca no Brasil.

4 A INFLUÊNCIA SUECA NA IDENTIDADE DAS ASSEMBLEIAS DE DEUS


NO BRASIL
As Assembleias de Deus no Brasil carregam, em seu DNA, duas
matrizes principais: a matriz escandinava, especificamente a sueca, e a norte-
americana. O contingente missionário pentecostal presente no país nas
décadas de 1910 e 1920 era composto em grande maioria por nórdicos,
inclusive os dois pioneiros. Essa composição fez com que a identidade da
denominação fosse marcada, nestas duas primeiras décadas cruciais, pela
influência do Movimento pentecostal da Suécia, o Pingströrelse, representado
por sua personalidade mais importante, Lewi Pethrus, pastor da maior igreja
livre da Suécia, a Filadélfia de Estocolmo. Através do engajamento missionário
desta igreja, muitos dos traços característicos do avivamento pentecostal sueco
foram reproduzidos na missão sueca no Brasil, sendo ainda hoje encontrados
na denominação que surgiu de seu trabalho. Foi somente a começar da
década de 1940, que as influências da segunda matriz, a americana, foram
gradativamente se tornando mais perceptíveis.

4.1 AS ASSEMBLEIAS DE DEUS, UMA IGREJA DO POVO PARA O POVO


Comparada com as precedentes atividades missionárias protestantes
estrangeiras no Brasil, a missão sueca quebrou os paradigmas então
praticados. As missões das primeiras igrejas que chegaram ao Brasil eram
substancialmente missões étnicas, de apoio às comunidades de imigrantes de
origem norte-europeia presentes no país a partir do começo do século XIX. A
liturgia desenvolveu-se nas respectivas línguas das comunidades de
imigrantes. Nessas condições, a grande maioria da população brasileira,
composta pela classe proletária e camponesa mergulhadas no analfabetismo,
era impossibilitada, praticamente, de participar das reuniões. Estas igrejas
eram percebidas com distância pelas pessoas que não pertencessem a
determinado grupo étnico, “igrejas de estrangeiros” sem muita penetração no
tecido social brasileiro.
A começar da metade do século XIX, chegou ao país um segundo grupo
de denominações, composto pelas igrejas presbiteriana, metodista e batista,
que começaram a evangelização das massas populares ligadas a e
manipuladas pelas estruturas religiosas e culturais da religião oficial do então
Império tropical, a Igreja Católica Romana. Essas igrejas tinham, geralmente,
uma liderança de clérigos profissionais, que monopolizava as pregações e os
demais aspectos litúrgicos e eclesiásticos. O povo inculto podia,
substancialmente, somente aceitar as decisões dos líderes, não muito
diferentemente de como acontecia na igreja Católica. As mudanças trazidas
pela constituição positivista de 1891, com a, ao menos formalmente, laicização
do Estado republicano, ofereceram uma abertura religiosa que proporcionou e
favoreceu a inserção dos ideais pentecostais do começo do século XX no seio
das igrejas protestantes tradicionais. Esse processo foi determinante,
sobretudo, no seio da igreja batista, que era a igreja de procedência, nos EUA,
dos dois pioneiros suecos, Berg e Vingren.
O primeiro missionário a começar uma atividade da vertente pentecostal
no Brasil, todavia, foi um imigrante italiano nos EUA, Luigi Francescon.
Procedente do círculo eclesiástico protagonizado por William H. Durham em
Chicago e influenciado pela vertente teológica calvinista, se dedicou à
evangelização, exclusiva, da comunidade italiana, fundando a Congregação
Cristã no Brasil. Esta também, nas suas três primeiras décadas, operou como
igreja étnica com liturgia em língua italiana. Por causa da difusão e importância
dessa comunidade no contexto brasileiro, sobretudo no sudeste e no sul do
país, essa igreja conseguiu satisfatoriamente fincar as raízes numa fatia maior
da população.
Os suecos, notadamente os pioneiros Vingren e Berg, também de
extração operária, quebraram esse paradigma, e se enveredaram na
evangelização da região mais inóspita do país, a bacia amazônica,
aproveitando os fluxos migratórios do fim do ciclo da borracha. Sua penetração
era alicerçada na disposição para viver nas mesmas condições e falar a
mesma língua do povo brasileiro, o português. Esse novo paradigma permitiu à
missão sueca de se inserir amplamente na sociedade do Brasil da época,
sobretudo entre as classes mais populares. Não mais era requerida uma
educação teológica formal para participar da liturgia. Todos podiam pregar,
testemunhar, orar, ler a Palavra. O crente podia se sentir, finalmente,
protagonista do culto. Consoante ao espírito dos tempos, era uma
revolução103: a religião nas mãos do povo e para o povo.

103 Na década de chegada dos pioneiros pentecostais suecos ao Brasil, no


outubro do ano de 1917, Lenin dava início à revolução comunista na Rússia.

Apesar de procederem dos EUA, para onde tinham imigrados no começo do


século XX, os dois fundadores das Assembleias de Deus no Brasil, Daniel Berg
e Gunnar Vingren, eram suecos. Como precedentemente visto, eles foram
inicialmente ajudados pelas igrejas americanas, sobretudo da comunidade de
imigrantes escandinavos. A partir de 1914, com a ida de Berg a seu país natal
e o contato com Pethrus, então pastor da Igreja Filadélfia de Estocolmo, a
influência das igrejas do Movimento pentecostal da Suécia foi aumentando, até
se tornar preponderante na missão pentecostal no Brasil.

Intrínseca à sua nacionalidade nórdica, a compreensão missionária dos


suecos, baseada na preparação informal dos obreiros, no autogoverno das
igrejas, no evangelismo pessoal e numa escatologia iminente, influenciou
muitos dos aspectos da identidade da denominação que nasceu de seu
trabalho de evangelização e implantação de igrejas. Essa influência está
presente, sobretudo, nas estratégias de evangelismo, na estrutura
administrativa, na ação social, na imprensa, na compreensão do ministério da
mulher, na teologia, no conceito de educação, entre outros. Estes são os temas
que serão analisados neste capítulo.

4.1.1 As estratégias e os métodos de evangelização


É somente a partir da década de 1940, que o contingente de
missionários americanos, até então alinhado com as diretrizes dos suecos,
começa a se destacar na missão no Brasil, com sua ênfase na preparação
teológica e ministerial formal de longa durada. Com um nível de instrução de
muito superior à media dos brasileiros e disponibilidade de recursos
financeiros, os missionários norte-americanos se dedicaram mais a
organização de cruzadas e trabalhos evangelísticos de grande porte e, a partir
da década de 1950, à expansão do ensino teológico, com a fundação de
seminários bíblicos. Mídia de massa, como a radiodifusão, foram instrumentos
muito usados por eles.
Poucas, porém, foram as igrejas por eles dirigidas ou fundadas
(ARAÚJO, 2007). Poucos crentes experimentaram ser por eles pastoreados.
De qualquer maneira, menos do que pelos suecos, grandes fundadores e
pastores de igrejas em solo brasileiro. Pastoreio quer dizer contato pessoal,
mentoria. Quer dizer hospedar, alimentar, muitas vezes não só espiritualmente,
as ovelhas, cuidá-las e curá-las. Escrevia Frida Vingren sobre esse aspecto:
Temos um cômodo na frente do
templo, com telhado, mas aberto dum lado,
onde as pessoas penduram as suas redes, e
temos um lugar para isso também no quarto
onde moramos. Quando são muitos, eles
mesmos preparam a sua comida, e quando
são poucos, comem junto conosco. São
pobres, muitos nem têm roupa para vestir, e
muitos chegam aqui doentes (VINGREN, F.,
1919, p. 51, tradução nossa).

O pastor, afinal, acaba absorvendo o cheiro de ovelha. Isso fala de


contato pessoal, de vivência horizontal. Quer dizer experimentar os sucessos e
decepções da vida do rebanho. Quer dizer caminhar junto nas matas, comer
farinha com peixe salgado, dormir no chão etc. A extração operária dos suecos
permitiu-lhes maior proximidade no processo de evangelização. Estratégias de
evangelismo baseadas, sobretudo, no contato pessoal, porta a porta, que
permitiam conversar e a entrega de Bíblias e literatura e, a seguir, convidar as
pessoas para o culto.
As técnicas de evangelização usadas pelas Assembleias de Deus no
Brasil, que permitiram à denominação se tornar a maior do país, descendem,
portanto, dessas estratégias de evangelismo colocadas em práticas pelos
pioneiros da missão sueca no Brasil e seus cooperadores que trabalharam no
país nas primeiras décadas da denominação. Vingren se dedicava
principalmente ao trabalho missionário na capital do Estado. Frequentou um
curso de língua portuguesa e tinha estudo formal como pastor, por isso se
dedicou, principalmente, a pregação na cidade e ao cuidado pastoral,
assumindo a liderança da nascente missão.
Berg, por sua constituição física mais resistente, assumiu a tarefa de
evangelizar as margens do rio Amazonas e o interior do Pará, e ao longo da
estrada de ferro Belém-Bragança. Ele aliou a prática da colportagem ao
evangelismo pessoal. Para isso, carregava certa quantidade de Bíblias,
folhetos e outra literatura evangélica, que eram geralmente vendidas para
custear o sustento dos missionários e as despesas da viagem. Aproveitava
toda abertura pessoal dos eventuais compradores para apresentar a
mensagem evangelística, geralmente acompanhada de um convite a participar
do culto marcado no lugar mais próximo.
Esse método mostrou sua eficácia ao permitir que, em quase todas as
localidades visitadas, começassem a surgir pequenos grupos de crentes, os
quais eram encarregados de continuar a obra de evangelização do lugar,
espalhando a Evangelho e ganhando novos adeptos. Berg, sucessivamente e
com a multiplicação dos pontos de culto, se dedicava à assistência pastoral,
que ele proporcionava às diversas comunidades evangélicas durante suas
viagens missionárias no barco, ao longo dos rios da bacia amazônica, de pé ou
de trem, na região da selva e ao longo da ferrovia paraense (BERG, I., 1987).
Muitas foram, na Amazônia do começo do século XX, as dificuldades e
privações enfrentadas pelos pioneiros em sua obra de evangelização. Fome,
doenças, perigos eram situações do dia-a-dia dos pioneiros em um país
estrangeiro. Provavelmente, sua extração operaria e sua precedente
experiência como imigrados na América foi de fundamental importância para
enfrentar positivamente a obra que (eles eram convencidos) Deus lhe confiara.

Geralmente, as camadas mais pobres e marginalizadas da população


eram o alvo preferencial da obra de evangelização dos suecos e de seus
colaboradores nacionais. Historicamente, estes segmentos sociais sempre
foram os mais receptivos à mensagem do Evangelho. O contexto social,
marcado pelas dificuldades econômicas do fim do ciclo da borracha favoreceu
tanto a aceitação da mensagem, portadora de esperança e boas novas para os
deserdados, como a dispersão geográfica da mesma. A mensagem foi
carregada para muitos lugares do Brasil pelos trabalhadores de retorno as suas
localidades de origem ou em busca de novas oportunidades de vida
(ALENCAR, 2011). Estas estratégias, oriundas das técnicas de evangelização
da missão sueca, permitiram que as Assembleias de Deus estivessem
presentes em todos os mais longínquos redutos da sociedade brasileira e se
tornassem a maior denominação pentecostal do país e do planeta.

4.1.2 O paradigma sueco na estrutura administrativa assembleiana


O primeiro nome sob o qual foram organizadas as igrejas oriundas do
trabalho missionário dos dois pioneiros suecos no Brasil foi Missão da Fé
Apostólica, por eles se reconhecerem como parte do avivamento que começou
com Parham, em Topeka, EUA. Conforme os ideais deste, isso implicava na
completa e total aversão a organizações que tomassem decisões referentes à
direção da igreja local. Essas estruturas supra-eclesiásticas eram tidas como
autoritárias e consideradas obstáculos à manifestação do Espírito Santo, em
sua posição de direcionador da atividade do corpo de Cristo.
Apesar de Berg e Vingren, sobretudo no começo, receberem algum
apoio financeiro das igrejas dos EUA, estas nunca tiveram uma efetiva
influência sobre as igrejas por eles fundadas no Brasil. Isso coaduna com a
tendência de governo congregacional, típico da maioria dos segmentos
denominacionais oriundos do avivamento pentecostal. Os ideais
congregacionais marcaram, também, o Movimento pentecostal na Suécia, o
Pingströrelse, baseado no modelo das igrejas livres, não submetidas a
estruturas religiosas e/ou seculares, como a Igreja oficial do Estado, a
Luterana. A defesa dessa independência da parte das igrejas pentecostais
suecas comportou em perseguições, através de entraves jurídicos, financeiros,
culturais e administrativos da parte do Estado sueco e da Igreja oficial, ao
menos até o fim da década de 1920, como foi visto precedentemente no
capítulo dois.
A concepção congregacional era, também, presente entre os batistas, a
denominação de procedência dos dois pioneiros suecos e no meio da qual a
missão pentecostal sueca no Brasil começou (MESQUITA, 1940 apud REILY,
1984). Conforme Araújo (2007), em volta do fim do ano 1914, o nome
Assembléia de Deus, que acabara de ser adotado pelo Concílio nacional das
igrejas pentecostais de maioria branca dos EUA, começou a ser usado pelas
congregações da missão sueca em terras brasileiras. Strandberg (1917), em
carta escrita em ocasião de sua chegada a Belém, no Pará, em julho de 1917,
testemunhou sobre o uso do nome Assembléia de Deus.
Foi, porém, somente no dia 11 de janeiro de 1918, que uma pessoa
jurídica com o nome Assembléia de Deus foi registrada no cartório da cidade
de Belém, sob o número de ordem 131.448, sob o nome “Sociedade
Evangélica Assembléia de Deus”, tendo como sócios fundadores Gunnar
Vingren e Daniel Berg, e como co-administrador Samuel Nyström. Este, junto
com sua esposa Lina, chegara ao Pará em 1916, enviado pela igreja de Lewi
Pethrus, e cooperava com os dois pioneiros na expansão do trabalho nos
estados amazônicos. A partir da viagem de Berg à Suécia, em 1914, os
pioneiros tinham sido inscritos na secretaria de missões dessa igreja, a
Filadélfia de Estocolmo, dirigida por Pethrus, começando a receber sustento
regular para si mesmo e a obra no Brasil.
Naqueles anos na Suécia, a aversão do Pingströrelse 89 às organizações
formais impediu a existência de uma pessoa jurídica centralizada encarregada
de assumir o patrimônio nos campos missionários, e o registro feito por Vingren
no cartório em Belém parece ser uma estratégia para garantir a propriedade
imobiliária dos templos e casas que iam sendo construídas com a ajuda
recebida do exterior. Paixão (2011) realça a importância, nos termos do
Estatuto da Sociedade, do nome de Nyström, emissário da Igreja Filadélfia de
Estocolmo. Pethrus, no ano de 1917, já começava a se destacar como líder no
panorama pentecostal de seu país, com aspirações de proeminência de facto
no Movimento das igrejas suecas livres, e, provavelmente, inspirou a
constituição da pessoa jurídica no Brasil, através de seu enviado, Nyström.
O teor do Estatuto recitava que, em caso de dissolução da sociedade, o
patrimônio seria destinado a Vingren, Berg e Nyström ou seus sucessores. Foi
um meio de garantir a propriedade dos imóveis, colocando-os fora do alcance
de eventuais “lobos” (VINGREN, G., 1917b, p. 195, tradução nossa). Pelo fato
de os missionários, mais e mais, se dedicarem à abertura de novos trabalhos e
a dar assistência, num esforço de coordenação e expansão da missão,
reservando para si a direção do trabalho a nível estadual, a partir da capital, as
congregações abertas eram entregue, geralmente, a obreiros locais
encarregados de dirigi-las na ausência dos missionários.
No ano precedente, muitas das acusações dos dirigentes das igrejas
livres suecas, na conferência missionária de Kölingared na Suécia, contra a
Svenska Fria Missionen90de A. P. Franklin eram indiretamente dirigidas contra
as aspirações centralizadoras, dentro do Pingströrelse, do próprio Pethrus,
idealizador desta organização missionária. Pethrus se livrou das acusações
tirando seu apoio ao comitê diretivo da organização missionária e permitindo
que esta fosse liquidada. Esses acontecimentos refletiram nas decisões
tomadas na conferência de Natal, no ano de 1930.
Quatro anos antes, em 1926, a missão pentecostal sueca, sob direção
de Gunnar Vingren, organizou uma conferência missionária internacional, com
a presença dos missionários no Brasil, na Argentina e do dirigente da Svenska
Fria Missionen, no Rio de Janeiro. Foi propositalmente organizada para tratar

89
Movimento pentecostal da Suécia.
90
Missão Sueca Livre.
dos assuntos da estrutura missionária no Brasil. A partir da analise das cartas
de Franklin e dos missionários que participaram, emerge uma substancial
convergência de ideias dos participantes. Duas foram as questões principais
tratadas:
• a relação entre os missionários que foram enviados pelas igrejas americanas
e os que vieram da Suécia, e sua respectiva posição ao interior da missão no
Brasil;
• a propriedade jurídica do patrimônio da missão.

O primeiro ponto foi resolvido garantindo, a todos os missionários,


igualdade e equiparação dentro da estrutura da missão:
Primeiramente, a respeito das relações dos missionários com a América,
e dos americanos com a Suécia. Nessa questão, a decisão da conferência foi a
seguinte: que os missionários suecos recebam suas recomendações da Suécia
e os americanos da América, mas que, contemporaneamente, por causa da
cooperação que já foi definida, os missionários suecos, que assim desejarem,
possam ter seu nome inscrito na lista nominativa em inglês existente com o
titulo “Missionaries in good standing”, e que os enviados da América possam
ter seu nome colocado na lista nominativa sueca, sob o titulo “Missionários que
cooperam com a Missão Sueca Livre”. Essa última qualificação parece
oportuna também para os missionários que pertencem a diversas igrejas na
Suécia e estão coligados com a Missão Sueca Livre (FRANKLIN, 1926a, p.
436, tradução nossa).
Era o ano de 1926. Por “missionários americanos”, entende-se, portanto,
os suecos imigrados nos EUA e que deste país tinham vindo para o Brasil,
como, por exemplo, Daniel Berg, Gunnar Vingren, Otto Nelson e Nels J.
Nelson. Pode, porém, apontar para a definição da decisão da missão
pentecostal sueca de permitir a colaboração de futuros missionários
americanos no Brasil, a pacto de estes se inserirem na estrutura administrativa
dos nórdicos, o que efetivamente aconteceu alguns anos mais tarde.
O segundo ponto, referente à garantia da propriedade dos imóveis da
missão, era a questão crucial, que mais desafiava a compreensão missionária
das igrejas livres da Suécia e os valores propagados pelo Movimento
pentecostal sueco, oriundos dos ideais de W. Taylor, dominados pela
“compreensão da igreja como radicalmente congregacional, autossustentável,
autogovernada e autopropagadora” do Evangelho (BUNDY, 1997, p. 22,
tradução nossa). Os missionários presentes e Franklin encontraram um acordo,
que previa a utilização da Sociedade Evangélica Assembléia de Deus, fundada
por Vingren, Berg e Nyström em 1918 em Belém, como pessoa jurídica
responsável pelos imóveis no Brasil. Escrevera o chefe da Svenska Fria
Missionen em relatório a seu país:
Referentemente aos direitos de
propriedade dos imóveis da missão, eu
creio que uma solução especialmente boa
foi alcançada, e que, para o futuro, vai
poupar muitas dificuldades, tanto aos
amigos da missão em casa, como aos
missionários aqui. Desde o ano 1918, foi
aqui constituída, pelos missionários, uma
entidade jurídica, a Assembleia de Deus,
com direito de administrar os imóveis. Essa
instituição já está registrada, conforme as
leis brasileiras. A conferência foi da opinião
que alguns irmãos brasileiros sejam
chamados a servir nessa associação, e que
ela expanda sua atividade sobre todo o
campo e, onde as igrejas ainda não estejam
prontas para administrar o patrimônio, essa
administradora tome conta. Isso vale
também para as bases missionárias. Uma
comissão foi nomeada para aperfeiçoar a
questão e propor projetos para uma boa
solução. Dessa maneira, a questão foi
definida, assim os amigos da missão não
precisam ficar preocupados de estar
enviando seus recursos para as bases
missionárias e as capelas e, possivelmente,
arriscar que pessoas particulares possam
se assenhorear do patrimônio e, talvez,
manipular os crentes.
Contemporaneamente, a Missão Sueca
Livre e o Conselho Missionário em Chicago
são exonerados de responder como
proprietários, pelo que der ou vier, do
patrimônio no Brasil. A respeito da
cooperação entre Suécia e América, através
disso, ela será significativamente facilitada,
porque ninguém precisará falar “do meu e
do teu”, mas da obra de Deus no Brasil.
Aleluia! Isso facilitará a passagem do
patrimônio, uma vez que estará disponível
nas mãos dos brasileiros. As atuais
propriedades particulares existentes
atualmente no campo serão paulatinamente
transferidas para a nomeada entidade
(FRANKLIN, 1926, p. 436a, tradução nossa).
Pode-se notar, a partir dos termos deste acordo, a capacidade de visão
de Franklin em relação à atuação de uma missão em país estrangeiro. Ele já
previa a estratégia que seria utilizada, poucos anos depois, para entrega do
patrimônio às igrejas locais e da direção do trabalho aos pastores nacionais,
que aconteceu em ocasião da conferência de Natal, em setembro de 1930.
Para isso, ele tentou resguardar a missão de eventuais cisões, querendo
utilizar a sociedade constituída em Belém pelos pioneiros e encontrando a
opinião favorável do contingente missionário sueco no Brasil.

Era uma solução particularmente vantajosa para ambos os lados.


Franklin evitava a responsabilidade jurídica da Svenska Fria Missionen sobre o
patrimônio no Brasil, conforme os ideais das igrejas livres na Suécia, e os
missionários ficavam independentes em sua responsabilidade e direção da
obra no Brasil. Em carta conjunta à Suécia, os missionários suecos
confirmaram a satisfação pela solução encontrada:
Os missionários que assinaram embaixo, reunidos para a conferência no
Rio de Janeiro, conversaram sobre a posição dos missionários no Brasil com a
organização para a obra missionária, que foi instituída na Suécia com o nome
de Missão Sueca Livre, e, na base do acordo alcançado em seguida à visita do
irmão A. P. Franklin ao Brasil, depois de madura consideração e oração, têm
feito o seguinte pronunciamento: Estamos alegres e agradecidos pela
cooperação com os irmãos que servem a Deus na Missão Sueca Livre, e
reconhecemos unanimemente a eles o direito de servir, na Suécia, aos
interesses da missão no Brasil, no mesmo tempo que nós naturalmente
desejamos manter nossa posição como missionários e membros nas
respectivas denominações. Nossa carta à Missão Sueca Livre no ano passado
foi motivada pela nossa compreensão de que a Missão Sueca Livre quisesse
tomar uma posição de força na obra e que, através disso, chegasse a surgir
uma sociedade missionária, e pelo fato que nós teríamos que voltar às
condições das quais tínhamos partido. Nossa compreensão já tinha sido
inserida no protocolo do encontro missionário na Filadélfia, em Estocolmo, nos
dias 9 a 10 de dezembro de 1921, no qual está escrito que “a comissão deve
estabelecer a organização do trabalho para os campos e deve dirigir o trabalho
por lá”, e também que devia administrar o patrimônio. Essa questão podia ter
provocado grandes dificuldades e divisões do lado dos brasileiros aqui. Mas,
depois do irmão Franklin ter visionado o trabalho, explicou que nenhuma
restrição deve ser colocada sobre a direção da atividade aqui no Brasil, e
também que os imóveis que devem ser inscritos, sejam-no nas igrejas
registradas sob o nome “Assembleia de Deus”. Nessas condições, estamos
alegres e agradecidos por oferecer colaboração aos irmãos da Missão Sueca
Livre. Referentemente aos irmãos da mesma preciosa fé nos Estados Unidos,
que desde o começo tiveram uma grande participação nessa obra do Senhor,
desejamos admiti-los nas mesmas condições. Exprimimos nossa gratidão a
Deus e aos irmãos pela visita do irmão Franklin nesse país, que já tem sido
uma grande benção e que esperamos continue a ser uma benção ainda maior
para a causa da obra missionária aqui. Nosso desejo é de sermos
continuamente carregados nos braços da oração e de sermos lembrados pelos
irmãos na Suécia e na América, pelo tempo que estaremos empenhados pela
salvação das almas no Brasil e pelo aperfeiçoamento do povo de Deus, até a
volta do Senhor, e para aproveitarmos as muitas portas que agora estão
abertas para o Evangelho nesse país. “Porque agora vivemos, se estais firmes
no Senhor” (1Ts 3.8). “O amor de Cristo nos constrange”, e com esse amor que
nos impele queremos continuar a trabalhar, até que Deus nos conceder a
graça. Com fraternais saudações de paz! Rio de Janeiro, Brasil, dia 22 de julho
de 1926. Samuel Nystrom, Otto Nelson, Gunnar Vingren, Joel Carlson, Gustav
Nordlund, Simon Lundgren, Nels J. Nelson (NYSTRÖM, S. et al., 1926, p. 440,
tradução nossa).

Nota-se a ausência da assinatura de Berg, que estava na Suécia para


um período de repouso. Reforçava o sentimento de satisfação o casal Vingren:
Foi bom poder encontrar o querido irmão Franklin, no qual todos nós e a
obra entendemos ter um amigo. Sim, na verdade, foi bom e precioso termos
juntos conselho e conversar da grande causa missionária, e também chegar a
um acordo em todas as questões. Gloria a Jesus! Assim, somos gratos ao
Senhor por Ele ter tocado o irmão Franklin para fazer essa visita (VINGREN,
F.; VINGREN, G., 1926, p. 461, tradução nossa).
A questão é se realmente os missionários cumpriram os termos do
acordo da conferência de 1926 no Rio de Janeiro, colocando os imóveis no
nome da Sociedade Evangélica Assembléia de Deus e permitindo aos obreiros
nacionais de participarem da direção da sociedade. Pode-se ter uma razoável
certeza de que o patrimônio da maior e mais antiga igreja da missão sueca, a
de Belém no Pará, estivesse registrado no nome da sociedade, que fora
propositalmente constituída para esse fim específico, no ano de 1918.
Referentemente aos outros campos, as informações disponíveis são escassas.
Existe, porém, um relato do missionário Joel Carlson, do Pernambuco, ainda no
ano de 1920, que permite uma suposição nesse sentido:

Posso adquirir uma boa casa por 3000 a


4000 coroas, o que seria muito melhor do que
pagar 90 coroas ao mês, quer dizer 1080 ao ano,
porque com três anos de aluguel poderíamos ter
uma casa própria aqui, no meio do Brasil também.
É uma sensação difícil quando o dia de pagar o
aluguel está perto e, às vezes, não temos o dinheiro
necessário. Seria melhor que tudo fosse da missão.
Talvez, o Senhor quer nos dar uma casa aqui no
Brasil central. Deus é poderoso (CARLSON, 1920,
p. 14, negrito nosso, tradução nossa).

É possível, portanto, que Belém respondesse juridicamente pelo


patrimônio imobiliário da missão sueca no Norte do Brasil. Araújo informa que:

[...] Samuel Nyström assumiu, em 21 de


maio de 1924, o pastorado da igreja de Belém.
Nessa ocasião, essa Assembléia de Deus liderava
todos os Estados do Norte, Maranhão, Piauí, Ceará
e a região nordeste do Mato Grosso (ARAÚJO,
2007, p. 510).

Parece, então, que a situação imobiliária já fora predisposta por Franklin


e os missionários para a futura e previsível entrega às igrejas locais brasileiras.
Essa estratégia era de conformidade com os ideais e o ethos do Movimento
pentecostal sueco, como visto precedentemente. Segundo Pethrus, porém, em
seu relatório à Suécia dos trabalhos da Conferência de Natal em 1930, essa
pessoa jurídica somente atuou no Pará, e somente nos primeiros anos da
missão de seu país no Brasil:
Durante os últimos anos, nós na Suécia
temos sido ensinados sobre a necessidade de que
a missão no Brasil deveria ser estruturada numa
grande e comum organização. Os que têm levado
adiante isso nos têm contado que essa organização
tinha sua sede no Pará, e que desde o início era
composta de somente três missionários, mas que
depois se expandiu para englobar a obra
missionária no inteiro Brasil. Também foi dito que
essa organização seria a proprietária de um grande
numero de bases missionárias. O contingente
missionário reunido me pediu que, se eu puder, ao
escrever sobre a missão no Brasil, na maneira mais
resoluta possível refutasse todas essas afirmações
e comunicasse aos amigos na Suécia como esta
coisa na verdade se encontra. A situação é que,
quando a primeira casa da igreja no Pará foi
adquirida, três dos missionários constituíram uma
sociedade conforme as leis, algo correspondente a
uma secretaria de obras, para permitir à igreja do
lugar possuir a casa, enquanto as condições não
permitir registrar o imóvel no nome da igreja. Esse
comitê foi somente subscrito para a congregação
no Pará, e, portanto, tem servido somente uma
única igreja. Quando A. P. Franklin, alguns anos
atrás, visitou o Brasil, ele insistiu muito para que
esse pequeno comitê de obras fosse expandido até
se tornar uma organização que compreendesse a
missão no inteiro Brasil. Mas esse projeto nunca foi
realizado pelos missionários, pelo fato da suposta
organização nunca ter existido. Assim, a conversa
sobre a organização missionária brasileira é uma
verdadeira história fantasiosa, para a qual se tem
astutamente tomado como base o pequeno comitê
de construção da igreja no Pará, para a história
parecer verdadeira. Os missionários no Brasil
estão, referentemente à questão da organização,
completamente e totalmente na mesma situação
das igrejas livres na Suécia. Eles expressaram
unanimemente sua aprovação para o pensamento
bíblico das igrejas livres, entre as quais, com
certeza, uma cooperação espiritual e não
organizada deve existir, mas sem uma organização
formal e institucionalizada, pela qual eles agora
estão sendo acusados de ter aprovado ou até
praticado (PETHRUS, 1930b, p. 722-723).

Pode-se perceber um tom de ataque pessoal entre as linhas dessa carta


de Pethrus, remontante aos acontecimentos do Franklinstriden 91, e à pressão
das decisões tomadas pelas igrejas pentecostais da Suécia na conferência
missionária de Kölingared, em 1929, diante das quais Pethrus queria se
justificar.
No Brasil, as reservas dos missionários suecos, referentemente à
passagem da direção dos trabalhos, eram, provavelmente, relacionadas à
preparação dos obreiros nacionais para o pastoreado. O pioneiro Vingren,
considerado o líder da missão no Brasil, que viajou e trouxe Pethrus para uma
tentativa de mediação na conferência de Natal, em 1930, não considerava a
91
O “Conflito Franklin”.
maioria dos dirigentes nacionais aptos para o pastoreado (VINGREN, F.;
VINGREN, G., 1929b). Ele era o único missionário pentecostal sueco no Brasil
com curso formal de teologia de quatro anos. Não é de estranhar, portanto, que
os parâmetros de seu padrão de avaliação ministerial fossem mais exigentes.
Não se sabe a respeito da inserção de líderes nacionais no comitê
administrativo da sociedade fundada em Belém.
De qualquer jeito, a realidade é que, com a aprovação dos suecos, o
trabalho e o patrimônio foi entregue aos pastores nordestinos, conforme as
decisões tomadas em Natal, sem maiores reticências da parte dos missionários
e de Pethrus. Este considerava chegado o tempo para a mudança de liderança
e queria blindar sua posição diante dos questionamentos de outros líderes do
Movimento pentecostal na Suécia:
Quando essa questão foi colocada em discussão,
eu tomei a palavra e me dirigi aos participantes,
explicando que era tempo que as igrejas brasileiras e os
obreiros nativos assumissem a direção e a
responsabilidade pela obra nos estados setentrionais do
país. [...] a missão deve ter como um de seus alvos
preparar obreiros locais para que estes possam, o mais
cedo possível, assumir a atividade. Através disso, os
membros da igreja local são levados a ter um diferente
senso de responsabilidade para com a obra, com um maior
espírito de sacrifício [...] Durante a guerra mundial,
mostrou-se que grandes dificuldades surgiram nos
campos missionários, quando eles foram expulsos de
seus campos de trabalho por serem cidadãos
estrangeiros, deixando dessa maneira a obra sem direção
e cuidado. Essas dificuldades poderiam ser evitadas ou ao
menos amenizadas, se, no tempo certo, se tivesse tentado
entregar os trabalhos aos obreiros locais. Portanto, desse
ponto de vista a passagem de liderança é desejável. [...]
essa passagem de direção, acima apresentada, fosse
oportuna e que as igrejas e os obreiros locais estão
prontos para tal passo. Foi também evidenciado pelos
missionários que, referentemente aos locais de culto e às
outras propriedades da missão, estes serão entregues às
respectivas igrejas brasileiras sem algum custo, onde isso
já não tenha acontecido, e que isso deve acontecer logo
que for possível, para que a questão seja encerrada até o
dia 1 de julho de 1931 (PETHRUS, 1930a, p. 708-709,
tradução nossa).

A questão principal da crise entre os missionários suecos e os pastores


nordestinos, portanto, não parece ser a do patrimônio imobiliário. Apesar de
este estar na mão dos suecos, foi entregue sem custos. Ainda considerando
que entregar a direção, mas não entregar os templos podia obstaculizar, e
muito, os projetos dos dirigentes nacionais. Existe a possibilidade que a
questão tivesse nuances mais radicais. Uma testemunha ocular daqueles
acontecimentos, Ivar Vingren, o filho do pioneiro, nos dá algumas indicações:
Devido ao fato que a experiência dos
pastores brasileiros tinha aumentado, surgiram
atritos a respeito da liderança, tanto local como
nacional. Agora, foi formulado o pedido que os
missionários deixassem toda responsabilidade.
Entre o grupo dos pastores, existiam duas
opiniões. Uma parte pedia que os missionários,
concomitantemente com a entrega dos trabalhos,
deixassem o país. A crise se fez aguda e algo devia
ser feito. Por isso, pastores e missionários
concordaram em participar da conferência de Natal,
em 1930 (VINGREN, I., 1994a, p. 74, tradução
nossa).

Havia pastores que viam nos suecos uma ameaça à suas ambições de
liderança e queriam, radicalmente, que sumissem do Brasil. Essa consideração
pode explicar a necessidade de Gunnar Vingren e dos demais missionários de
buscar a ajuda de Pethrus, cuja igreja era a maior mantenedora da missão
sueca no Brasil. A radicalização foi confirmada pelo próprio Pethrus, que
considerava "que, se não houvesse um entendimento, todo o trabalho seria
dividido" (PETHRUS, 2004, p. 221).
Nesse sentido, pode-se entender, entre as linhas da ata final das
reuniões de Natal, a ênfase sobre o vínculo fraternal entre missionários e
pastores e o desejo destes que aqueles continuassem, ainda que em outras
regiões, no Brasil, num amoroso trabalho em conjunto. Foi uma obra prima de
mediação e costura de Pethrus, que conseguiu abafar a crise. Os termos e o
resultado do sigilo continuam ainda nos dias de hoje.
Naturalmente, a solução proposta pelo pastor da Filadélfia de Estocolmo
foi a esperada pelos obreiros nacionais, que recebiam em suas mãos a
liderança dos trabalhos mais desenvolvidos e antigos do país, como se pode
perceber entre as linhas do relatório de Pethrus:
Quando a questão foi
suficientemente exposta e ficou clara para
os obreiros locais de que se tratava, a
maioria deles foi tomada pela emoção. Eles
não podiam entender, disseram, como os
queridos missionários pudessem se separar
deles e deixar as igrejas organizadas, os
belos locais de culto e uma obra
estabelecida aos obreiros nativos para ir
para novos e não trabalhados campos. Mas
eles entenderam que os missionários
tomaram essa decisão por causa do amor a
Jesus e aos seus compatriotas, e que da
mesma maneira eles amariam os
missionários. Eles não colocaram objeções,
ao contrario, concordaram com o projeto
dos missionários (PETHRUS, 1930a, p. 708-
709, negrito nosso, tradução nossa).

Existem autores que consideram as decisões tomadas em Natal como a


efetivação de um “golpe”, uma tomada à força da direção da obra no Norte e
Nordeste pelos obreiros nacionais (ALENCAR, 2010). Bundy é, ao contrário,
convencido que:

[...] Pethrus fez a histórica peregrinação à


América do Sul, em 1930, para discutir os assuntos
com os missionários por lá e, de maneira
importante, informar os pastores brasileiros que
suas igrejas não eram igrejas dependentes da
missão, mas igrejas em posição igualitária às de
Estocolmo, empoderadas pelo Espírito Santo para
encontrar seu próprio ministério em seu próprio
contexto. As igrejas suecas deviam ajudar, mas
não dominar as igrejas brasileiras, e Pethrus
evidenciou como o oposto fosse também
verdadeiro, que as igrejas brasileiras podiam,
também, se engajar na atividade missionária. Mais
uma vez, o Evangelii Härold publicou os relatórios
da viagem e os sermões pregados. Esta foi uma
conclusão para a questão que poderia deixar Taylor
e Barratt contentes, apesar do processo de
solução, a respeito do qual eles não se sentiriam
orgulhosos. O Pentecostalismo sueco tinha
retornado às suas raízes teóricas (BUNDY, 1997, p.
16, tradução nossa).

O ethos das igrejas suecas livres sobrepujou os outros aspectos nas


decisões da conferência de Natal. Os missionários suecos entregaram o
trabalho no Norte e Nordeste e se dirigiram para o Sul do Brasil, onde a obra
estava começando. Conforme o pedido dos pastores nacionais, os dois
trabalhos continuaram unidos. A partir de Natal 1930, as Assembleias de Deus
vem expandindo grandemente sua presença no território nacional, se tornando
a maior denominação pentecostal do país. Sua estrutura administrativa é uma
mistura do modelo congregacional com o episcopal. As influências suecas
nesse sistema são inegáveis. Referentemente à influência do Movimento
pentecostal sueco, deve-se considerar que:
Formou-se bastante precocemente
certa cultura de liderança unitária nas
igrejas pentecostais. O traço democrático
não era, em muitas igrejas, tão significativo
como a nível denominacional, onde os
membros frequentemente se expressavam a
favor ou contra os projetos que os
dirigentes apresentavam. Os líderes das
igrejas pentecostais, sobretudo os
presidentes, tinham, em força de sua
posição, uma autoridade que intimidava os
membros na eventualidade que estes
tivessem pontos de vista críticos aos
projetos sobre os quais eles tinham que
tomar uma posição. Muitos reagiram contra
essa situação, mas, simplesmente, não
ousaram se exprimir. Outros pensavam que
o fato do assunto ter sido colocado em
discussão pelos irmãos garantia que o
projeto estivesse conforme a vontade de
Deus. Ivar Ramström escreveu, no ano de
1947, que “é motivo de ação de graças,
quando a situação dentro da igreja é tal que
qualquer dos projetos planejados pelo
ministério é recebido pela inteira
assembleia com um amém de coração, sem
nenhuma discussão ou contraproposta, que
não sempre são muito úteis” (GÄRESKOG;
GÄRESKOG, 2010, p. 23 , tradução nossa).

Ribeiro (2006) descreveu o sistema da sociedade rural do período dos


senhores dos engenhos de açucar, o sistema das fazendas, com sua elite
praticando uma liderança de cunho caudilhista, no qual poder político, religioso
e econômico se entrelaçavam, sobre o substrato étnico indígena, luso e
africano, e cooperavam na construção de uma nova sociedade, brasileira e
católica. Esta era uma herança do sistema das capitanias hereditárias,
caracterizadas pela centralidade do chefe: homem, absoluto e vitalício
(ALENCAR, 2010). O sistema unitário de liderança das igrejas pentecostais
suecas, descrito acima, se amalgamou com a concepção da liderança
coronelística das regiões do Nordeste. Essa simbiose deu origem ao sistema
de liderança mais presente nas Assembleias de Deus no Brasil, descrito por
Freston (1992) como conceito de liderança sueco-nordestino.
Na Assembleia de Deus no Brasil, as igrejas locais têm, geralmente,
seus pastores filiados a uma convenção estadual, que tem poder de nomear e
transferir os líderes das igrejas, sem previa consulta das assembleias dos
membros da igreja local. Essas organizações estaduais confluem na
Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil, a CGADB 92. Pode
acontecer que, em vários estados, existam várias organizações estaduais, os
assim chamados “ministérios”. Tratam-se, substancialmente, de reservas de
território, ou, como os definiu Alencar (2010, p. 128), “reservas de mercados”
impostas a outros trabalhos de missão, que passam a serem vistos como
competidores na obra de evangelização e, sobretudo, de implantação de
igrejas e arrebanhamento dos crentes. Neste aspecto, os suecos tinham
traçado o caminho, impondo aos missionários americanos, que chegaram
posteriormente aos nórdicos, restrições na América do sul.
Este sistema se difundiu, também, ao interior das Assembleias de Deus
no Brasil. O melhor aluno dos suecos foi, nesse sentido, Paulo Leivas Macalão.
Originário da classe alta, nacionalista e não disposto a se submeter aos
suecos, estabeleceu seu próprio estilo e domínio. Para isso, fundou,
inicialmente, sua obra de evangelização num bairro, o da Madureira, da então
capital federal, Rio de Janeiro, obtendo um crescimento notável.
Posteriormente, expandiu a atividade ao restante do país, sobretudo nas
regiões sul, sudeste e no centro. Isso fez que seu ministério, as Assembleias
de Deus de Madureira, chegasse a ter cerca de 30% dos membros a nível
nacional de toda a denominação. A competição entre os lideres dos ministérios
levou ao conflito de poder com os outros ministérios constituintes a CGADB,
com a exclusão do ministério Madureira do rol de membros da convenção
nacional, que aconteceu definitivamente no ano de 1988.
O poder de escolha da liderança local, delegado aos líderes das
convenções estaduais, substancialmente com poderes de “bispos”, deu origem
a muitas lideranças familiares, nas quais o cargo bispal é passado aos
descendentes. Atualmente, em muitos casos, a denominação transformou-se
numa substancial dominação dos “bispos” e seus afiliados sobre a massa dos
fieis, incentivados a abandonar qualquer posição crítica à liderança (READ,
1967 apud ALENCAR, 2010). Essa prática implica no surgimento de
personalidades investidas de fama e poder sobrenatural, supostamente
derivado da “unção divina” sobre a pessoa do líder, que se torna mais
importante do que a mesma organização. Aliás, este é favorecido pelo ethos

92
Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil, que reúne os ministérios ligados à e/ou
originados a partir da missão sueca.
congregacional, vital para o Pingströrelse 93, que aborrecia eventuais
organizações fiscalizadoras acima da igreja local. Nesse sentido:
O ministério pastoral relaciona-se ao
trabalho religioso prestado à comunidade. Por meio
da socialização, as crenças e as práticas sugeridas
pelo agente religioso ou sacerdote são
incorporadas pelo grupo. Tornar-se um agente
religioso é tornar-se dominante de um conjunto de
esquemas de pensamento e de ação referentes ao
sagrado (BANDINI, 2009, p. 14).

É um retorno à fase carismática, onde a figura do líder é tudo para todos


(WEBER, 2009). Em muitos casos, nas Assembleias de Deus a
institucionalização não é consequência do desaparecimento do líder, antes,
este convive com a nascente instituição, personificando-a, por meio da
autoridade mística à qual ele reivindica seu cargo, e dominado-a no nível
administrativo, financeiro, religioso e humano (ALENCAR, 2010). No líder
assembleiano, em geral, a figura do profeta não dá lugar à do sacerdote. As
duas encontram-se juntas na mesma pessoa. Esse paradigma espelha,
atualmente, a maioria das lideranças da denominação.

4.1.3 Os modelos da imprensa assembleiana


A começar de novembro de 1917, foram publicadas duas edições do
jornal “Voz da Verdade”, editadas pelos brasileiros Almeida Sobrinho e João
Trigueiro da Silva. No janeiro do ano seguinte, Vingren iniciou a publicar o “Boa
Semente”, então órgão oficial da igreja de Belém, Pará, contando com a
colaboração de Nyström. Já no Rio de Janeiro, no ano de 1929, Vingren
começou a publicação do “Som Alegre”, em colaboração com sua esposa
Frida, com fins evangelísticos e apologéticos. Os modelos encontravam-se no
jornal pentecostal sueco-americano de A. A. Holmgren “Sanningens Vittne” 94
(VINGREN, G., 1916b), e, na Suécia, no “Brudgummens Röst” 95, no
“Månadskriften”96 e no “Evangelii Härold”97, este segundo fundado por Pethrus,
em 1916, para ser o órgão oficial da Igreja Filadélfia de Estocolmo e para servir

93
Movimento pentecostal da Suécia.
94
Testemunha da Verdade.
95
A Voz do Noivo.
96
O Escrito Mensal.
97
Arauto do Evangelho.
o Movimento pentecostal do país, e que já publicara diversas cartas e relatórios
dos missionários suecos do Brasil.
O “Boa Semente” e o “Som Alegre” foram publicados paralelamente até
a decisão tomada na conferência de Natal de 1930, quando foi decidida a
supressão de ambos e a constituição de um novo e único órgão oficial das
Assembleias de Deus no Brasil, o jornal “Mensageiro da Paz”, no Rio de
Janeiro, publicado até o dia de hoje. Envolvido no trabalho de redação do “Boa
Semente”, Nyström muito se esforçou, durante sua gestão em Belém, para
potenciar a abrangência e capacidade produtiva da tipografia que servia a
igreja do Pará, em colaboração com Nels J. Nelson. Em carta à Suécia,
comunicou:

A primeira viagem que fiz, foi até as ilhas,


onde eu visitei as igrejas durante um mês. Na
mesma ocasião, comprei uma nova maquina para
imprimir com material. Depois, passei quatorze dias
em casa, no Pará, e organizei dois números do
nosso jornal. [...] Cheguei a casa bem a tempo para
o Natal e, então, foi completamente submerso pelo
trabalho, porque a edição do jornal estava atrasada
por causa da minha ausência e eu percebi a
necessidade de imprimir os textos da escola
dominical junto com o texto do jornal, e então
comecei essa tarefa também, e trabalhei todos os
dias e uma grande parte das noites também para
isso, e foi somente pela graça de Deus que não
sucumbi. Na mesma ocasião, uma prensa foi
colocada a venda por um preço barato, assim a
comprei e nossa pequena gráfica foi aumentada,
podendo agora trabalhar com folga. Custou, com
uma pequena casa incluída no negócio, menos de
2000 coroas suecas (NYSTRÖM, L.; NYSTRÖM, S.,
1924, p. 340, tradução nossa).

As aquisições de material tipográfico permitiram a Nyström a publicação


de uma gama de literatura, como lições bíblicas, opúsculos, panfletos,
calendários e hinários, além do jornal. Esse trabalho, junto a sua liderança na
obra no Pará, o campo maior e mais antigo, colocou as bases para a reputação
de ensinador e doutrinador de Nyström nas Assembleias de Deus, tornando-o o
natural substituto de Vingren na liderança da missão sueca no Brasil.

4.1.4 A herança sueca na ação social


A ação social foi outra iniciativa do contingente sueco. O modelo era a
obra de engajamento social do Movimento pentecostal sueco e, em particular,
da Igreja Filadélfia de Estocolmo, a capital do país nórdico, que mantinha a
assim chamada “räddningsmission”98, um conjunto de ações sociais para a
população necessitada e marginalizada. Alimentação para os desempregados,
abrigo noturno e nos invernos para os desabrigados, assistência medica às
faixa de baixa renda, recolhimento de crianças órfãs ou abandonadas,
acolhimento dos imigrados das zonas rurais etc.
Essas iniciativas proporcionaram sentimentos de pertencimento às
pessoas que deixaram seus lares no interior, sobretudo durante a depressão
econômica de 1929, e permitiram ao Movimento pentecostal na Suécia de
adquirir aceitação dentro da sociedade. A missão sueca no Brasil seguiu esse
exemplo, se dedicando às obras de assistência social. A maioria das pessoas
alcançadas pela mensagem pentecostal nas primeiras duas décadas do século
XX eram de extração social baixa ou muito baixa. Muitos eram analfabetos. O
fim do ciclo da borracha deixou muitos trabalhadores desempregados. Era
comum que as bases missionárias abrigassem pessoas doentes, pobres e sem
meios de sustento (VINGREN, F., 1919).
Primeiramente, a igreja de Belém, impulsionada por Nyström, em
colaboração com Nels J. Nelson, fundou alguns entes caritativos, como a Caixa
mortuária, a Caixa Beneficente e a Caixa das viúvas. Uma das mais
impactantes pragas sociais era o abandono de criança, comum nas cidades
brasileiras. Os missionários tentaram, apesar da exiguidade dos recursos que
recebiam, amenizar o problema com iniciativas várias, como, por exemplo, Joel
Carlson, no Recife:
Estamos preparando a roupa para vestir um
grupo de crianças. A pobreza é grande e as pobres
crianças órfãs perambulam pelas ruas, sem ter uma
casa nem um abrigo. Temos conduzido a missão de
resgate desse jeito, vestindo as que precisam de
roupa e dando farinha, feijão e arroz para as
famintas etc. É comovente a alegria com a qual elas
manifestam sua gratidão (CARLSON, 1922, p. 99,
tradução nossa).

Carlson começou a atividade no final do ano de 1922, com cinco ou seis


crianças abandonadas, recolhendo-as num orfanato. Contava com a
98
Missão de resgate.
colaboração das missionárias que vieram solteiras da Suécia, entre elas Ester
e Augusta Andersson, Elisabeth Johansson, Anna Carlson. Em 21 de março de
1927, esse orfanato hospedava dezoito crianças (JOHANSSON, E.;
ANDERSSON, A., 1927).
A assistência aos casais não casados no âmbito civil, para que
pudessem regularizar sua situação, era outro campo de atuação da missão,
como relatado pelas missionárias no Pernambuco:
Um casamento custa, geralmente, 20 ou 25
coroas e essa é uma grande quantia para os irmãos
e irmãs pobres, que frequentemente têm uma
multidão de crianças para cuidar. Agora, não são
menos de que três, os casais aos quais tivemos
que negar o batismo, até que eles sejam
regularmente casados. Quando os outros sete
desceram ao rio, esses ficaram a distancia,
chorando amargamente. Se alguém sentir a direção
de Deus para ajudar esses irmãos e irmãs com
recursos, então não demore, mas envie o que
puder! (ANDERSSON, I., 1927, p. 590, tradução
nossa).

Muitos dos recursos financeiros iniciais empregados nas obras de


assistência social levadas adiante pela missão pentecostal sueca vieram da
Escandinávia, apesar da Suécia não ter, naqueles anos, a desenvolvida
economia de hoje. O espírito do wellfare state 99 fez e ainda faz parte dos ideais
social-democráticos dos países escandinavos, e influenciou os protagonistas
da missão pentecostal no Brasil, passando à cotidianidade das atividades das
igrejas que dela descenderam. Apesar de que alguns setores da denominação
sejam propensos a um discurso platônico, referentemente à missão da Igreja
Cristã, as Assembleias de Deus no Brasil são hoje protagonistas de uma ampla
variedade de iniciativas sociais, a nível local, regional e nacional.

4.1.5 A influência sueca na compreensão do ministério da mulher


Um dos traços peculiares do avivamento pentecostal, desde seu
surgimento nos EUA, era a marcante presença feminina. Agnes Ozman foi a
primeira a receber o batismo no Espírito na escola bíblica de Parham. A
pastora Lucy Farrow foi uma das protagonistas dos acontecimentos na Azuza
Street. O Movimento na Suécia herdou essa característica. Samuelsson (1997
apud SWANDE, 2010)), é da opinião que a grande presença feminina no
99
Estado do bem-estar.
Movimento dependia da ênfase na compreensão carismática, que dava às
mulheres um novo status, não relegado somente ao lar. O entendimento de
que o Espírito seria derramado sobre “filhos e filhas” permitia-lhes profetizar,
testemunhar, pregar e ensinar. As possibilidades abertas às mulheres, de
pregar e testemunhar em lugares fechados aos homens, favoreceram a
expansão do Movimento (NILSSON, 1996 apud SWANDE, 2010).
Na Suécia, a igreja Filadélfia, no começo da década de 1920, contava
com uma membresia composta por cerca de 80% pelo sexo feminino, a maioria
mulheres solteiras (GÄRESKOG; GÄRESKOG, 2010). Essa proporção, porém,
não se refletia na liderança eclesiástica. Dos 103 signatários da declaração de
Kölingared de 1919, que reuniu as lideranças das igrejas pentecostais e
espelhava os ideais do nascente Pingströrelse 100, somente cinco eram
mulheres.

A interpretação literal dos textos bíblicos, influência da corrente fundamentalista


e conservadora, via a mulher e, consequentemente, sua posição e
possibilidade de trabalho, como “diferentes”, por causa dos dons e capacidades
que Deus teria infundido nas pessoas de sexo feminino. Uma das causas
predominantes para o desenvolvimento desta hermenêutica

114

115

94

conservadora se encontra na influência recebida dos movimentos batistas


fundamentalistas dos EUA, em lugar da influência das denominações mais
evangélicas e carismáticas, como, por exemplo, as Assemblies of God
americanas (NILSSON, 1996 apud SWANDE, 2010). Esta denominação
ordenou pastoras precocemente em sua história.

100
Movimento pentecostal da Suécia.
Esse entendimento teológico foi ratificado pela conferencia de Berlim, no ano
de 1917, cujos ideais programáticos foram transcritos, na Suécia, no livro
Pingstväckelsens riktlinjer101. Suas diretrizes referentes à posição da mulher
seriam, sucessivamente, um dos modelos das decisões que foram tomadas
sobre o assunto em Natal, no ano de 1930. Para maior facilidade, são
reproduzidos aqui os parágrafos da obra acima citada que recitam a respeito
da questão feminina na igreja:
Aqui não é lugar para tratar principalmente
da questão do trabalho das irmãs. Desejamos
somente expressar nossa convicção que, para a
edificação da igreja, uma peculiar tarefa tem sido
destinada às irmãs, através das Escrituras que
tocam a respeito de seu gênero. Queremos lembrar
aqui, de muitas maneiras, a respeito dos falsos
entendimentos que penetraram no Cristianismo. De
um lado, os homens têm limitado, por muito tempo,
o serviço da mulher na igreja, restringindo sua
vocação somente ao ambiente familiar. Pois que
um excesso chama o outro, do outro lado não têm
faltado tentativas de equipar, dentro da igreja, o
trabalho das irmãs com o dos irmãos. Ambos esses
extremos são não naturais e antibíblicos. Possa,
portanto, o Espírito Santo nos dar as oportunas
diretrizes que foram propriamente definidas para o
sexo feminino e, contemporaneamente, deixar que
a multiforme vocação para o serviço no Evangelho,
“a obra do Senhor”, possa se tornar plenamente
em benção para o corpo de Cristo. De qualquer
jeito, não queremos errar a respeito do abençoado
trabalho feminino, que santas irmãs desempenham,
nesse tempo, entre nós. Nós, porém, refletimos
sobre as seguintes passagens bíblicas: Lc 8.1-3;
Mc 15.41; 16.7-11; Jo 26.17,18; Ap 1.14; 9.36-41;
18.26; 21.8-9; 1 Co 11.1a; 14.34, 35; Rm 16.1-4, 6, 12;
1 Tim. 2.8a; 5.3a; Tt 2.3-5; Êx 15: 20, 21; Jz 4 e 5.
Considerando esses textos, pode-se ver que
grande tarefa as nossas irmãs receberam para a
edificação da igreja de Deus na terra. De que forma
o trabalho das irmãs deva ser efetuado, em todas
as ocasiões, em referimento as diretrizes dadas,
uma vez por todas, pelo Espírito Santo, o Senhor
há de mostrar à sua igreja através da unção em
varias circunstâncias (PINGSTVÄCKELSENS
RIKTLINJER, 2009, p. 53-54, tradução nossa).

A ideia de que Deus tivesse dado à mulher capacidades e dons


diferentes dos que deu ao homem gerou o conceito do “Genuskontrakt 102”, que
estabelecia tarefas e vocações diferentes para os dois sexos, tanto no âmbito
secular e familiar, como no ambiente eclesiástico (HIRDMAN, 2003 apud
101
Diretrizes do Avivamento pentecostal.
102
“Contrato de gêneros”, em sueco.
SWANDE 2010). No ano de 1923, a Suécia concedeu a maioridade jurídica e
política às mulheres. Isso reverberou num aumento de oportunidade para o
sexo feminino na sociedade sueca, que provocou sentimentos de medo na
população masculina, sobretudo na classe operária, que era a base majoritária
da membresia masculina das igrejas pentecostais.
A mudança colocava no mercado do trabalho um enorme contingente de
possíveis e temidas concorrentes. Esses sentimentos se traduziram, dentro do
Movimento pentecostal sueco, numa aversão da parte dos pastores e líderes
conservadores à expansão do trabalho das mulheres na igreja. A possibilidade
dos homens de perder sua influência como cabeça da mulher os levou a
valorizar, dentro do âmbito eclesiástico, as posições conservadoras (SWANDE,
2010).
Confrontando o desenvolvimento da sociedade sueca pelas reformas
que possibilitaram às mulheres se tornar independentes e em posição
igualitária aos homens, com a posição dos líderes eclesiásticos conservadores,
então se pode entender o tamanho da revolução social. Na tentativa de serem
bíblicas e conservar a “ordem natural”, a lideranças masculinas se opuseram a
equiparação dos sexos nas igrejas. Existia, todavia, quem refletisse sobre a
posição e vocação das mulheres, dentro do Movimento pentecostal e nas
igrejas. As dificuldades vinham do fato que foram os homens que se
encarregaram de interpretar a questão, influenciados por seus pressupostos
patriarcais e sem a mediação de uma hermenêutica que pudesse corrigir
eventuais interpretações erradas, advindas da leitura literal da Bíblia.
A atuação pública da mulher só era aceita em casos de absoluta
necessidade, ficando, pelo restante, restrita ao ambiente familiar. Tudo isso foi
reforçado pela separação do Pentecostalismo do contexto social, que produziu
uma estagnação na teologia e na questão feminina A única abertura em
relação à posição das mulheres dentro do Movimento pentecostal sueco houve
na igreja de Örebro, dirigida por John Ongman. Esta, porém foi sobrepujada
precocemente pela influência de Lewi Pethrus e sua igreja, a Filadélfia de
Estocolmo, a nível nacional.
O Movimento pentecostal sueco, então, cristalizou com características
sectárias e uma forte liderança nacional, com Pethrus á sua frente, que, no
debate entre os anos de 1925 a 1930, sancionou os ideais conservadores, de
que a mulher é dependente do homem e deve a este submissão. Somente no
ano de 1995 é que foi ordenada a primeira pastora dentro do Movimento
pentecostal na Suécia. Essa compreensão a respeito da questão feminina se
reproduziu, sucessivamente e através da missão sueca, nas Assembleias de
Deus no Brasil (SWANDE, 2010).
Como visto no capitulo três, a componente feminina era majoritária no
contingente missionário pentecostal sueco no Brasil, representada pelas
esposas dos missionários e pelas missionárias solteiras. Todas elas se
dedicaram ativamente à obra missionária. Acompanhavam, por exemplo, o
casal Berg no barco na evangelização ao longo do rio Amazonas, sem se
escusar, antes enfrentando as dificuldades da região (ANDERSSON, I., 1922).
Participavam de viagem de evangelização no interior dos Estados, como
Elisabeth Johansson, que fazia dupla com Lily Johnson, uma missionária
inglesa que se juntou por um tempo ao contingente sueco (JOHANSSON, E.,
1922).
Elas abriram trabalhos e começaram igrejas, como testificava Anna
Carlson em carta:
As irmãs Ingrid e Ester Andersson estão,
desde o começo de outubro, no Ceará, um estado
longe em direção sul. O Senhor as tem
maravilhosamente ajudado e, agora, elas têm uma
casa, com um salão para os cultos. Possa o Senhor
abençoá-las ricamente na obra (CARLSON, A.,
1923, p. 56, tradução nossa).

Muitas mulheres, dentro da missão no Brasil, se entregaram à obra


eclesiástica com todas suas forças (VINGREN, I., 1994a). Praticamente,
enfrentavam os mesmos desafios que seus colegas masculinos. Como nos
outros campos da missão do Movimento pentecostal sueco ao redor do
planeta, desempenhavam o mesmo trabalho dos missionários (SWANDE,
2010). Não todas se sentiam chamadas para ser simplesmente dona do lar e
ajudar seus maridos. Segundo Bandini:
A lógica social da ideologia dominante
assumida pelas instituições religiosas reforça a
noção de "ordem eterna da natureza" (HUBBARD,
1999) ao identificar como vontade divina uma
"vocação específica" para as mulheres: o cuidado
com a família. Neste sentido, o 'enovelamento' das
categorias sociais (gênero, idade, classe, raça e
estado civil) permite evidenciar os diferentes
modos de subjetivação e de sujeição a que as
mulheres pentecostais estão submetidas (BANDINI,
2009, p. 1).

Entre as que lutaram para quebrar esse paradigma conservador


restritivo, estava Frida Vingren. Era uma mulher de inteligência superior, com
curso universitário, decidida e resoluta, dotada de acentuada capacidade
literária e musical, e de uma oratória invejável. Com as frequentes viagens e
doenças do marido, Frida se esmerava na direção dos trabalhos na igreja,
pregando e pastoreando. A firmeza de suas atitudes, porém, não agradava a
todos (ARAÚJO, 2007). Adina Nelson era uma exîmia pregadora e
frequentemente ensinava na igreja dirigida pelo marido, além de efetuar
viagens evangelísticas, Ester Andersson e Beda Palm eram fundadoras de
igrejas, e as missionárias solteiras no Pernambuco dirigiam um orfanato
(VINGREN, I., 1994).
Não todos os colegas viam favoravelmente essa liberdade. Existia uma
divisão na direção da missão sueca no Brasil a respeito do trabalho permitido
as missionárias. Escrevia Ingrid Andersson logo antes da conferência de Natal:
Nós irmãs temos nos visto constrangidas a
nos retirar de todas as atividades, exceto as
domesticas. É difícil, mas o Senhor nos tem
sustentado e permitido, durante esses tempos,
participar de sua obra em muitas maneiras
(ANDERSSON, I., 1930 apud VINGREN, I., 1994a, p.
80, tradução nossa).

Gunnar Vingren era a favor de um amplo ministério feminino, Samuel


Nyström era contrário. O pioneiro, na convivência cotidiana com sua esposa,
podia ver nela a capacitação de uma verdadeira missionária e pastora,
completamente dedicada á vocação ministerial. Vingren era, portanto, favorável
ao pastoreado feminino. Fortalece essa afirmação o pastoreado de facto que
sua esposa Frida estava exercendo. A contingência da situação, à luz da piora
das condições de saúde do Gunnar, e a abrangência da responsabilidade
deste em referimento à missão sueca, em seu papel de coordenador nacional,
rendia necessária uma maior presença e envolvimento ministerial de sua
esposa.
Vingren, por isso, via as mulheres como perfeitamente capacitadas para
assumir todos os cargos eclesiásticos. Coerentemente com sua posição sobre
os dons ministeriais femininos, ele foi o primeiro missionário sueco (e único) a
separar para o Evangelho uma mulher evangelista:
Um casal de evangelistas, marido e mulher, foram separados, e também
outro irmão. Os primeiros tinham assumido a atividade num novo lugar e, com
um ano de tempo, uma igreja com duzentos membros surgiu no lugar. Ambos
trabalham. Cada um deles tem um cavalo e, às vezes, rodeiam até montanhas
para testemunhar do Senhor. A esposa foi a primeira mulher brasileira
separada para o Evangelho. Não podemos deixar de lembrar uma Ceia tão
maravilhosa, como aquela em que aconteceu a separação desses obreiros. Foi
uma maravilhosa decisão do Espírito. O poder de Deus caiu, alguns riam,
outros choravam, outros ainda caíram debaixo do poder de Deus. Sim, nunca
vimos algo parecido no Rio de Janeiro. É bom, quando o Espírito Santo pode
agir como Ele quiser. Alguns crêem que o Espírito Santo vai se conformar com
a tradição de seus pais, mas é errado (VINGREN, G., 1929b, p. 615-617,
tradução nossa).
Percebe-se, pela dinâmica das palavras dessa carta, que foi uma formal
consagração ministerial, e não simplesmente uma assunção de facto do cargo,
pelo fato de ser esposa de um evangelista. Essa compreensão é reforçada
pelas críticas que o sueco endereçou aos que querem que o Espírito Santo se
conforme, em suas decisões, com a tradição de seus pais (a linha
conservadora). Isso indica uma ruptura com o paradigma então vigente (até o
dia de hoje), que via somente os homens destinados aos cargos ministeriais
formais. Infelizmente, ele não cita o nome da evangelista em sua carta. Não
parece se referir, porém, a “Emília Costa”, separada “para diaconisa, a única
que ocupou esse cargo na igreja” nos ministérios ligados à CGADB e
consagrada por Vingren à sua chegada ao Rio, provavelmente em 1925”
(CONDE, 1960a, p. 229).
Otto Nelson concordava com a concepção do pioneiro. Em carta a Paul
Ongman103, respondeu às reticências deste sobre o ministério feminino:
Pode ser que tenhais essa
compreensão na teoria, mas não na prática,
porque se a tivésseis não enviaríeis irmãs
solteiras para o campo missionário, pois
acontece frequentemente [...] que as irmãs
fiquem sozinhas nas bases missionárias
para trabalhar segundo a graça que Deus
103
Era filho de John Ongman, da igreja Filadélfia de Örebro.
lhes deu, e o Senhor abençoa o trabalho
delas, mas se, então, elas não deveriam
ensinar os crentes ou se ocupar com a
direção, como deveria ser? (NELSON, O.,
1930 apud VINGREN, I., 1994a, p. 80-81,
tradução nossa).

Percebe-se um teor pessoal na sua declaração acima. Como já


mostrado, a esposa dele, Adina, dirigia cultos e doutrinava os membros.
Samuel Nyström, enviado por Pethrus ao campo missionário, ao contrário,
refletia exatamente a compreensão deste e do Pingströrelse, o Movimento
Pentecostal na Suécia, referentemente ao ministério feminino.
O assunto foi um dos temas debatidos na conferência de Natal, em
setembro de 1930. Pethrus propôs um estudo escriturístico para dirimir a
questão. Em seu relatório à Filadélfia, informou:

Durante os últimos tempos, um assunto referente à participação da


mulher na atividade ministerial pública tem levantado algumas diferências de
opinião entre nossos amigos no Brasil. Depois de um período de estudo na
Bíblia sobre essa questão, todos chegaram a uma geral compreensão nesse
problema. O protocolo, escrito por um evangelista local, exprime de maneira
concisa a decisão que foi tomada nesse assunto, conforme o seguinte: “Uma
moção foi proposta para que se tomasse uma decisão a respeito do trabalho
que as mulheres são permitidas de desempenhar em suas igrejas. Os
participantes decidiram que as irmãs têm direito de participar do trabalho de
evangelização, pregando sobre Jesus e Sua salvação, e também a fazer
pregações que contenham ensinos, se for necessário. Ao contrário, foi decidido
que o dever da mulher não é ter a função do doutrinador e pastor da igreja,
mas que naturalmente podem ser feitas exceções a essa, como outras regras,
conforme a Bíblia nos dá exemplo (Mt 12.3-8). Isso especialmente em lugares
onde faltar um irmão apto a ser dirigente e ensinador” (PETHRUS, 1930b,
p.722-723, tradução nossa).
Desde então, a diretriz de Natal 1930 sobre o trabalho permitido às
mulheres dentro da denominação tem sido mantida até hoje. Do ponto de vista
sociológico, o matrimônio, em muitos casos, elimina a autonomia pessoal da
mulher em favor da unidade familiar e das aspirações do marido à carreira
pastoral, influenciando diretamente a mobilidade social, a consolidação do
status e a posição das esposas pentecostais no âmbito ministerial e na
sociedade. Geralmente, nas Assembleias de Deus a esposa do obreiro pode
exercer alguma atividade desde que não tenha problemas em sua vida
conjugal e que seja submissa ao esposo. O primeiro campo ministerial das
mulheres é considerado ser o espaço doméstico. A aprovação nesse âmbito
permite a atividade feminina no campo religioso (BANDINI, 2009).
A posição de Pethrus e do Pingströrelse 104 influenciou diretamente,
através da missão sueca no Brasil, a compreensão das Assembleias de Deus
sobre o assunto do ministério feminino. Uma opinião negativa da mulher como
pregadora, pastora e ensinadora tem sobrevivido na grande maioria dos
ambientes pentecostais brasileiros, operando para que fosse comumente difícil
para uma mulher no Brasil exercer um papel diretivo nas igrejas. Elas têm
majoritariamente se dedicadas às atividades das escolas bíblicas dominicais,
aos orfanatos, ao trabalho social, ao louvor e aos círculos de oração, entre
outros (VINGREN, I., 1994a).

4.1.6 A influência da missão sueca na teologia das Assembleias de Deus


As Assembleias de Deus esposam, quase que em maneira
generalizada, uma teologia pentecostal fundamentalista baseada numa
hermenêutica literalista da Bíblia que, paradoxalmente, permitiu interpretações
alegóricas dos textos.
Araújo (2007) é da opinião que a identidade teológica das Assembleias
de Deus teve a influência direta e exclusiva dos escandinavos desde sua
fundação até a década de 1940, sendo eles soberanos na orientação
doutrinária. Junto aos ensinos nas igrejas, o meio privilegiado de difusão das
doutrinas pentecostais era a imprensa, com os jornais Boa Semente, Som
Alegre, e as lições bíblicas. Os suecos monopolizavam os artigos e
comentários publicados, cuidadosamente fiscalizando o teor dos poucos artigos
de obreiros nacionais ou norte-americanos que aparecem nas publicações da
época. É indicativa, nesse sentido, a declaração de Nyström em uma de suas
cartas à Suécia:

104
Movimento Pentecostal da Suécia.
A gráfica me dá um pouco de trabalho; tenho dois cooperadores fixos. O
jornal (o texto para a escola dominical está sendo autorizado agora para a
impressão, porque o tempo não permite fazer uma edição aprofundada dos
textos para a escola dominical, mas tenho que fazer uma forma mais fácil
desses textos, como fazemos na Suécia), a impressão de tratados e outros
escritos menores, tudo precisa ser lido por mim, para correção, porque não
tenho nenhuma pessoa competente à qual confiar esse trabalho. O cuidado
pastoral, numa igreja com cerca de 1.000 membros, fora as viagens e a
supervisão das muitas igrejas, cujos obreiros nativos esperam por conselhos e
direção. Além disso, a publicação de livros, bíblias, hinários e outros livros de
teor espiritual (NYSTRÖM, S., 1925a, p. 17, tradução nossa).
A ênfase pentecostal, importada do Movimento pentecostal da Suécia,
gira em volta da contemporaneidade dos dons do Espírito, do batismo no
Espírito Santo, com evidência do falar em línguas, das curas divinas
(VINGREN, F.; VINGREN, G., 1925c, p. 32). Vingren, que foi o único
missionário sueco das primeiras duas décadas a ter formal educação
ministerial de quatro anos, condensou sua compreensão teológica na
expressão “Evangelho pleno”, em carta à Suécia:
[...] pude assim me alegrar em Jesus junto
com aqueles simples filhos de Deus que não se
deixaram contagiar pela ilusão russelliana 105. Eu
acho que aqueles que têm vivido Jesus de perto
são os mesmos que creram nas velhas verdades
bíblicas: não somente na deidade de Cristo, mas
também no inferno eterno, não esquecendo o
batismo espiritual, o falar em línguas, a profecia e
sua expressão em línguas, e da cura física
mediante a oração, etc., em uma palavra o
Evangelho pleno. Vi mais que, onde a plena
verdade é exposta, lá opera Deus com os sinais
que acompanham. Sim, pelo poder de sinais e
maravilhas (VINGREN, 1916b, p. 11, tradução
nossa).

105
Charles Taze Russell, americano, foi o fundador das Testemunhas de Jeová. Sua doutrina apresenta a
Jesus Cristo como um ser criado, e não como o próprio Deus Eterno e Criador, e ao Espírito Santo como
uma força impessoal, e não como a terceira pessoa da Trindade.
O dispensacionalismo e o darbynismo pré-milenista 106 eram e ainda são
os paradigmas mais presentes na escatologia assembleiana brasileira 107. A
volta de Jesus era tida como iminente. Isso impulsionava os crentes
pentecostais à conquista das “almas 108”, antes da porta da graça se fechar.
Cristo não era visto, em sua volta, como Senhor e Juiz, implantador do reino de
Deus em sua definitiva plenitude, mas como o Noivo celestial que vem
arrebatar sua noiva, a Igreja, para levá-la às bodas do Cordeiro, no céu.
Escrevia o casal Vingren (1922, p. 138-139), aludindo ao arrebatamento da
igreja: “[...] a alegre mensagem de que Jesus morreu por causa de nossos
pecados e ressurgiu para nos justificar, e que Ele está voltando para levar os
que o amarem na hora de sua vinda.” Novamente, com alusão ao tribunal de
Cristo, depois do arrebatamento e antes das bodas do Cordeiro: “Logo, o dia
de trabalho se finda e Jesus volta para levar para casa os seus. Então, os
galardões serão distribuídos, segundo a fidelidade com a qual temos servido ao
Senhor Jesus” (VINGREN, F.: VINGREN, G., 1923, p. 285).

Nyström foi o primeiro a ensinar sobre o dispensacionalismo na missão do


Brasil. Para isso, ele viajava pelo país, muito requisitado para dar estudos
bíblicos (ARAÚJO, 2007). Fora ele que organizara a primeira escola bíblica
para obreiros nacionais em Belém, no ano de 1922. Nyström e Gunnar Vingren
foram os dois maiores ensinadores da missão nos anos de 1910 a 1930, mas
outros missionários suecos também se revezavam no ensino doutrinário, entre
eles Joel Carlson, Otto Nelson, Nils Kastberg e Nels J. Nelson. Os suecos não
estavam muito preocupados com a sistematização da teologia pentecostal.
Privilegiavam a compreensão prática das doutrinas fundamentais pelos
membros e obreiros, e o aspecto apologético, frente aos ataques e invectivas
das igrejas tradicionais contra as doutrinas da denominação.
A maioria dos ensinos vertia em volta das doutrinas da salvação pela
graça, da justificação pela fé e da santificação. Esta última era particularmente
106
John Nelson Darby, inglês (1800-1882), um dos mestres dos Irmãos de Plymouth, teórico da doutrina
chamada dispensacionalismo. Ensinava que Deus se relacionou, durante seis períodos da história,
chamadas dispensações, com a humanidade através de alianças diferentes, e que haverá uma aliança
futura durante o período do reinado de Cristo na terra, o milênio. Rejeitava o propósito vicário da
obediência de Cristo e sua justiça imputada aos crentes. Na academia, é considerada teologia popular.
107
Ao contrário, depois das primeiras décadas de existência da denominação, as Assemblies of God
americanas têm rejeitado essas crenças e não mais ensinam essas doutrinas (ARAÚJO, 2007).
108
Clara influência da filosofia pagã grega, especialmente do platonismo.
prezada, e os crentes eram incentivados a se separarem de toda atividade
considerada mundana. Neste aspecto, as influências do Puritanismo e dos
movimentos wesleyano e Holiness são patentes. A ênfase nesse conceito da
santificação levou precocemente as Assembleias de Deus a um discurso
permeado de platonismo, que via o engajamento do crente na sociedade como
algo antibíblico. Em fundo, não valia a pena, na compreensão dos missionários
suecos, arriscar de se contaminar com práticas consideradas mundanas, à luz
de que a iminente volta de Jesus ia desencadeiar, breve, o fim dessa
sociedade corrupta, perversa e perseguidora.
Referentemente à salvação, o arminianismo 109 foi o conceito aceito no
Movimento pentecostal do país nórdico, revertendo na missão sueca no Brasil
e nas igrejas por elas fundadas. Foi somente depois do ano de 1930, que
apareceu na denominação uma vertente do calvinismo 110, que deu origem à
Assembleia de Cristo, na região nordestina, numa cisão liderada pelo obreiro
nacional Manoel Hygino de Souza.
À luz de todos estes fatos, pode-se dizer que a identidade teológica
assembleiana das primeiras duas décadas de sua história tem uma profunda e
indelével marca escandinava, fruto da influência quase que exclusiva dos
missionários suecos no Brasil.

4.1.7 As marcas do Pingströrelse no conceito assembleiano de educação


O conceito da educação nas Assembleias de Deus no Brasil foi
fortemente influenciado pela concepção do Pingströrelse 111 da Suécia sobre o
assunto, tanto no âmbito secular como teológico. Como visto precedentemente,
o avivamento pentecostal na Suécia se expandiu, majoritariamente, na classe
operária, com poucas pessoas que possuíam uma educação formal de nível
universitário (GÄRESKOG; GÄRESKOG, 2010). A educação secular era vista
como uma possibilidade de ascensão social e, em modo ambivalente, como
uma ameaça, por, supostamente, gerar um orgulho que podia impedir a
comunhão dos membros e a operação do Espírito.
109
Derivado do nome de Jacopus Arminius, teólogo protestante holandês do século XVII. Pregava que a
salvação é fruto da cooperação entre vontade humana e a divina, num conceito chamado de sinergismo.
110
Doutrina derivada dos ensinos de Jean Calvin (Calvino), que afirmava que a salvação dependia
somente do decreto soberano e incondicional de Deus, e não da vontade humana. Chamado também de
monergismo, encontra-se difundida, sobretudo, na igreja presbiteriana.
111
Movimento pentecostal da Suécia.
No começo do Movimento na Suécia, a resistência dos pentecostais
contra instituições denominacionais organizadas impulsionou o surgimento de
grupos de oração nas casas e, sucessivamente, em outros locais. Geralmente,
essas “igrejas livres” ofereciam estudos bíblicos ou missionários, que duravam
dois ou três dias, com reuniões três vezes ao dia, da durada de duas horas. As
pessoas que chegavam para essas reuniões, algumas vindas de grandes
distâncias, sobretudo no vasto e pouco povoado Norrland 112, eram hospedadas
em estruturas provisórias e precárias. Muitos tinham que dormir em colchões
colocados no chão. Existiam, porém, privilégios hierárquicos: os pregadores
podiam, mas não sempre, dispor de uma cama para seu descanso
(OSKARSSON, 2007).
Durante a década de 1920, os evangelistas pentecostais que corriam a
Suécia, muitos deles provenientes do movimento Holiness sueco, participavam,
ao menos uma vez por ano, de uma escola bíblica de quatro semanas. Eram
escolas ideológicas, onde os participantes recebiam uma base de fé comum e
compartilhavam relacionamentos e amizades. O número dos alunos era,
geralmente, entre quinze e trinta. Algumas igrejas pentecostais maiores
começaram a se interessar a essas escolas, em Estocolmo, Göteborg, Malmö
e outras cidades no sul do país. A Filadélfia de Estocolmo, que Lewi Pethrus
pastoreava, começou seu interesse nesse campo no ano de 1917.
Eram os pastores das igrejas que, geralmente, se improvisam
professores desses cursos bíblicos. Alguns se transformavam em professores
itinerantes. As igrejas ofereciam, em muitos casos, uma mediação extra-oficial:
quem quisesse um evangelista para sua cidade ou região, entrava em contato
com os responsáveis das igrejas que apoiavam determinada escola bíblica. O
posterior surgimento das “semanas bíblicas” ofereceu aos membros comuns
das igrejas a possibilidade de participarem das reuniões, para as quais algum
“irmão capacitado para ensinar a Palavra” era chamado (OSKARSSON, 2007,
p. 51, tradução nossa).
A participação podia alcançar entre cem e duzentos crentes. As
semanas bíblicas eram, também, um meio de alcançar as pessoas externas ao
Movimento pentecostal. À noite, eram celebrados, portanto, cultos públicos,
nos quais as pessoas podiam pedir oração por suas famílias, por curas e por
112
Região da Suécia, próxima ao circulo polar ártico. Era a região natal de Frida Vingren.
batismo no Espírito. No julho de 1922, Rikard Fris instalou seu Instituto Bíblico
em Högsby, nos arredores de Estocolmo. Era uma escola de alguns meses
para pregadores e missionários. As igrejas do Movimento pentecostal
entendiam que os pregadores e evangelistas deviam ser simplesmente bons
ganhadores de almas, influenciados por uma escatologia que enfatizava a
iminente volta de Jesus.
Esses modelos educativos foram transmitidos à atividade da missão
pentecostal sueca no Brasil. Apesar do pioneiro Vingren ter uma regular
formação teológica e ministerial, nunca houve interesse da parte dos
missionários suecos para uma educação teológica de longo curso. O primeiro
Instituto Bíblico da denominação seria fundado somente no ano de 1958, pelos
missionários João e Dorris Kolenda, provenientes dos EUA.
Apoiada na crença dispensacionalista da iminência da volta de Cristo
para arrebatar sua noiva, a Igreja, a educação secular não tinha grande apelo
para os crentes da denominação. Concorria para reforçar essa visão o fato de
que a grande maioria dos Pentecostais da primeira geração, nas décadas de
1910 e 1920, era de extração camponesa e operária e via a educação formal
como exclusiva e classista. Para essa massa proletária, excluída da maioria
dos benefícios sociais, a educação era uma ferramenta de reprodução e
manutenção da elite dominante, perseguidora e exploradora, tanto no plano
secular como eclesiástico.
A missão sueca reproduziu integralmente no Brasil o paradigma
educativo próprio do Movimento pentecostal nórdico. No agosto de 1911, logo
depois da saída da denominação batista, foi organizada a escola dominical,
ainda hoje o único momento educativo teológico para os membros de muitas
Assembleias. As primeiras lições impressas para a escola dominical foram
publicadas no ano de 1919, no jornal Boa Semente (ARAÚJO, 2007).
A preparação teológica e ministerial dos cooperadores nacionais era
realizada através das escolas bíblicas para obreiros. A primeira da qual se
tenha notícia foi realizada entre os meses de março e abril de 1922, em Belém
do Pará. Belém era a mais antiga e maior igreja da missão sueca da época e
tinha a responsabilidade dos outros campos no território brasileiro. Em Belém,
estava a sede da missão, onde ficavam Vingren e Nyström, os líderes
nacionais da obra. Vingren passou todo o ano de 1922 na Suécia. A
organização da escola bíblica foi, portanto, uma iniciativa de Nyström, que
assumiu a tarefa de ensinador (NYSTRÖM, S., 1922).
A segunda escola bíblica para obreiros aconteceu no ano de 1924, em
Belém, com a presença de Vingren, antes de sua definitiva mudança para o Rio
de Janeiro. Participaram dela obreiros dos trabalhos paraense, cearense e
potiguar. Vingren organizaria, sucessivamente, a primeira escola bíblica da
igreja no Rio de Janeiro, de 5 a 11 de agosto de 1926. Esse modelo educativo
para formação e atualização dos obreiros, o das escolas bíblicas semanais e
de breve durada, ideado por Nyström e derivado do padrão da Suécia, ainda
hoje é praticado pela denominação ao redor do Brasil, permanecendo um
marco da influência sueca na identidade das Assembleias de Deus.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maioria dos membros das Assembleias de Deus no Brasil não teria
alguma dificuldade a defender a idéia que o surgimento e a expansão da
denominação fora e está sendo uma obra de Deus. Estes crentes têm por
causa e matriz de sua identidade religiosa a vontade do Espírito Santo, e por
modelo a "igreja primitiva", como apresentada no livro de Atos dos Apóstolos.
Para muitos de fora da denominação, entre as igrejas tradicionais, ela foi e/ou é
uma obra do diabo. O mundo secular e relativista a vê, entretanto, como mais
um movimento de fanatismo religioso.
Deixando de lado as implicações espirituais, a análise científica da
questão mostra que as Assembleias de Deus têm apresentado, ao longo de
mais de cem anos de história, duas matrizes principais que influenciaram a
construção de sua identidade: a escandinava e a norte-americana. Essa
pesquisa socio-historiográfica evidenciou que, durante as duas primeiras e
cruciais décadas de existência da denominação, a influência escandinava,
particularmente a sueca, foi praticamente exclusiva e determinante na
formação do ethos das Assembleias de Deus no Brasil. Os paradigmas elitários
das missões protestantes estrangeiras presentes em solo brasileiro foram
substituídos pelo projeto simples e popular dos missionários pentecostais
suecos: viver e falar como o povo, para levar o Evangelho, sobretudo, aos
pobres do povo.
Nesse projeto, ou, como alguém afirmou, "acidente" (ALENCAR, 2010,
p. 156), os modelos nórdicos, presentes no Pingströrelse 113 da Suécia, foram
reproduzidos quase que integralmente na obra deste no Brasil, através da
missão pentecostal sueca. O corpo missionário sueco foi o veículo privilegiado
pelo qual o ethos do Movimento Pentecostal do Reino dos Sveas 114 foi
transmitido e reproduzido no produto de seu trabalho no maior país da América
Latina, as Assembleias de Deus no Brasil.
Evidenciou-se, também, que os ideais do ethos pentecostal sueco foram
mediados e, ao menos parcialmente, adaptados pelo contexto social, cultural,
religioso e econômico brasileiro. O agente mais importante dessa reformulação
foi o corpo dos obreiros nordestinos que foram preparados pelos suecos e
cooperaram com estes nos trabalhos nas regiões, sobretudo, do Norte e
Nordeste. Eles assumiram a direção da obra no ano de 1930, graças às
decisões tomadas na conferência de Natal, mas trabalharam lado a lado com
os escandinavos desde, praticamente, o começo da missão.
O resultado desse processo de construção da identidade assembleiana,
em parte forçoso e em parte forçado, talvez não tenha agradado inteiramente
aos missionários nórdicos. A síntese dos ideais suecos e nordestinos, todavia,
sinergizou os esforços missionários do Movimento das igrejas livres da Suécia.
Esse processo permitiu à obra missionária pentecostal no Brasil de se tornar o
maior e mais importante campo de atuação do Pingströrelse 115 fora de seu
país.
Pode-se afirmar, portanto, que a identidade assembleiana, peculiar e
persistente ao longo de um século de história, tem suas raízes no processo de
amalgamação da influência sueca e do ethos nordestino, que aconteceu
especialmente durante os anos de 1910 a 1930 (FRESTON, 1992). Essa
identidade hibrida permitiu às Assembleias de Deus de se tornar a maior
denominação pentecostal do planeta. Soli Deo gloria.

REFERÊNCIAS
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(1911-1946). 1 ed. São Paulo: Arte Editorial, 2010.
113
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114
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