Este documento descreve um workshop de desenho etnográfico realizado por antropólogos com estudantes. Os alunos visitaram e desenharam dois mercados em Lisboa - o Mercado do Bairro de Santos e o Mercado 31 de Janeiro - para analisar as dinâmicas dos espaços e como têm vindo a mudar. O desenho mostrou-se uma ferramenta útil para interpretar e comparar os dois locais e refletir sobre temas como fluxos, consumo e contexto urbano.
Este documento descreve um workshop de desenho etnográfico realizado por antropólogos com estudantes. Os alunos visitaram e desenharam dois mercados em Lisboa - o Mercado do Bairro de Santos e o Mercado 31 de Janeiro - para analisar as dinâmicas dos espaços e como têm vindo a mudar. O desenho mostrou-se uma ferramenta útil para interpretar e comparar os dois locais e refletir sobre temas como fluxos, consumo e contexto urbano.
Este documento descreve um workshop de desenho etnográfico realizado por antropólogos com estudantes. Os alunos visitaram e desenharam dois mercados em Lisboa - o Mercado do Bairro de Santos e o Mercado 31 de Janeiro - para analisar as dinâmicas dos espaços e como têm vindo a mudar. O desenho mostrou-se uma ferramenta útil para interpretar e comparar os dois locais e refletir sobre temas como fluxos, consumo e contexto urbano.
Análise de Leitura: O gesto do desenho de Sónia Vespeira de Almeida e José Mapril
O desenho, indispensável para a representação das formas, é também uma
ferramenta fundamental para a interpretação da realidade. Apesar de ser um elemento imprescindível para a prática arquitetónica nem sempre terá sido considerado uma ferramenta essencial para a Antropologia, contudo, tem-se vindo a manifestar uma mais valia para a análise etnográfica. Sónia Vespeira de Almeida e José Mapril, antropólogos e professores, no desenvolvimento de O Gesto do Desenho, induzem o leitor para a importância do desenho como ferramenta metodológica no desenvolvimento etnográfico. Neste sentido, os autores realizaram workshops em desenho etnográfico no contexto da Escola de Verão da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Para a realização desta atividade foi escolhida a área envolvente do Bairro do Rego, em Lisboa. Esta escolha deveu-se essencialmente à proximidade geográfica com a faculdade de onde provinham os alunos, à especificidade urbana do bairro e à existência do Mercado do Bairro de Santos que fora um ponto de observação fulcral. O Bairro do Rego, em tempos terá sido uma zona de fixação de população, porém, em consequência do crescimento populacional, transformou-se progressivamente numa zona de imobilidade populacional. A sua população ter-se-á vindo a alterar até aos dias de hoje e, onde inicialmente este era um bairro ocupado por um povo operário, nos dias que correm é composto sobretudo por classes médias. Para a realização deste exercício, optou-se pela procura de temáticas que permitissem uma articulação coerente do desenho com problemáticas da antropologia contemporânea. Deste modo, foi essencial pensar sobre a relação do mercado com o bairro e paralelamente com o resto da cidade. Destacaram-se assim alguns temas que revelaram ser úteis para a reflexão do desenho etnográfico: A natureza do bairro como elemento periférico da cidade e o défice de transportes para o centro da cidade; a dinâmica do bairro em consequência ao impacto do programa de realojamento; os processos de gentrificação em alguns pontos e as medidas tomadas nesse sentido e, por fim, as consequências para a dinâmica do lugar perante a deslocalização de algumas empresas e serviços. A visita ao Mercado do Bairro de Santos foi essencial para esclarecer alguns destes aspetos. Desde a o primeiro momento, os alunos ficaram surpreendidos com a quantidade de bancadas e estabelecimentos encerrados. Este mercado, que habitualmente serviria a população residente do bairro e alguns trabalhadores das empresas ali localizadas, revelara uma decadência. Perante o confronto com esta realidade, os participantes do workshop, começaram por observar os gestos, interações, movimentos e diálogos de quem por lá passava e trabalhava. Ainda na conversa com alguns comerciantes, perceberam qual o conjunto de fatores que poderiam ter levado a esta decadência: a relocalização de várias empresas, a retirada da bolsa desta zona da cidade, o envelhecimento da população do bairro e, até mesmo, o processo de renovação do mercado. Após este estudo, consideraram essencial ter um olhar comparativo sobre outros mercados e as suas respetivas dinâmicas. Neste sentido, optaram também por visitar e desenhar o Mercado 31 Janeiro, situado na freguesia de Arroios, também em Lisboa. Os antropólogos desafiaram os alunos a partilhar os seus centros de interesse sobre as análises feitas, identificando conjuntamente as problemáticas decorrentes das visitas aos dois estabelecimentos de comércio. A partir de um debate que integrara a experiência dos estudantes e as possibilidades adquiridas pelo desenho etnográfico destacaram-se os pontos de análise mais comuns: Fluxos, mobilidades, escalas, mercadorias, consumos, espaço, trabalho, entre outros. Estes pontos permitiram retratar e comparar a complexidade do estudo antropológico. Neste sentido, o desenho foi uma ferramenta essencial de reflexão e esclarecimento de opiniões. Permitiu auxiliar no pensamento e retificar ideias sobre ambos os mercados assim como outros fatores adjacentes: economia, política e o contexto urbano. Esta forma de representação possibilitou ainda dar sentido, não só aos gestos das dinâmicas vividas nos campos de análise, mas também, à integração e interpretação do espaço por parte dos alunos e professores. O desenho revelou-se um instrumento de produção etnográfica que resultara de um processo de partilha, encontro e diálogo onde ter-se-á representado o visível e até mesmo o invisível, resultando de diferentes camadas de leitura, expressão e observação. A antropologia, como uma disciplina de observação sobre as diferentes formas de estar no mundo, procura um conhecimento a partir do ato participativo. Por sua vez, o desenho permite ao investigador complementar a sua análise sobre o espaço através do gesto. Desta forma, as duas disciplinas desempenham um papel colaborativo significante. Como formas de ver e conhecer o mundo, quando usados em simultâneo, possibilitam uma reflexão muito mais atenta e profunda sobre as vivências do espaço.
Departamento de Arquitetura da Universidade de Coimbra
Antropologia, Cultura e Arquitetura 2019/2020 Daniela Soares