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LINGUAGEM E MENTE

Prefácio..............................................................................................................................2
Primeira Palestra................................................................................................................3
Segunda Palestra..............................................................................................................10
Discussões.......................................................................................................................41
Primeira Palestra......................................................................................................41
Qual é o papel do contexto e da cultura na sua teoria?.......................................41
Como a gramática gerativa compreende o texto como unidade?........................41
O senhor acha que o sentido é anterior à palavra, ou é gerado por ela, ou a
pergunta não tem sentido?...................................................................................42
O legado do conhecimento, enquanto estrutura inata, leva o homem a uma
postura espiritualista diante da realidade. Essa postura espiritualista não deixa de
ser política. A pergunta é: O senhor vê algo de espiritual em sua teoria
linguística, em sua postura política?....................................................................42
Qual o seu julgamento sobre a teoria funcionalista da mente? Eu penso que tem
alguma relação com a sua abordagem anti-reducionista, não tem?.....................43
Supondo a existência de uma gramática universal, haveria, porém construtos
linguísticos mais aptos e adequados (ou línguas concretas) para expressar o
pensamento?........................................................................................................43
Segunda Palestra......................................................................................................44
Sendo que as línguas são transmitidas socialmente, e não biologicamente, e que
noções tão fundamentais da lógica humana, como noções espaciais e temporais,
que variam de uma cultura para outra, também se relacionam com o social, será
que não se deveriam levar em conta processos sociais para explicar não só a
estrutura, mas até mesmo a lógica gerativa de uma língua?................................44
Como o programa minimalista trabalha a questão dos traços fortes e fracos? Isto
é, quando um traço é fraco e, portanto, pode ser checado na Forma Lógica em
movimento coberto?............................................................................................45
Existem interpretações diversas sobre o processo de checagem de traços formais,
como a checagem de Caso, por exemplo. Alguns afirmam que essa checagem é
necessária porque a Forma Lógica não é capaz de interpretar esses traços. Dessa
forma, a checagem é interpretada como um processo que verifica esses traços e
depois os elimina. Há outra interpretação do processo, entendendo-se como
apenas uma verificação e não como eliminação. A pergunta não é muito simples,
mas o que é uma checagem de traços?................................................................46
Como lidar com adjunção no programa minimalista? Os advérbios possuiriam
traços formais ininterpretáveis, ou todos os seus traços já viriam do léxico?.....46
Nós, professores, estamos muito angustiados de perceber que, apesar dos
avanços na gramática gerativa, o ensino de gramática nas escolas de primeiro e
segundo graus continua sendo nos moldes da gramática tradicional. O professor
acha que é necessário “ensinar” gramática nas escolas? Caso afirmativo, como
abordá-la de forma que se aproxime do modelo gerativo?..................................46
Qual a relação existente entre as condições de legibilidade e a interpretação da
linguagem metafórica?........................................................................................47
Prefácio
Chomsky posiciona-se a favor da existência não só de ideias inatas, mas de toda uma
estrutura sintática inata, relativa à linguagem. Torna clara a hipótese de a gramática
universal corresponder a uma marcação genética na espécie humana. Vai além de
considerações filosóficas sobre o assunto e oferece uma proposta teórica, a Gramática
Gerativa, para o desenvolvimento de pesquisas sobre línguas dentro de uma linha de
aceitação da marcação genética relativa à linguagem. Torna clara sua divergência em
relação à teoria funcionalista.
Segundo Chomsky, a faculdade de linguagem se encaixa dentro da arquitetura mais
ampla da mente/cérebro, onde interage com outros sistemas, que impõem condições que
ela tem de satisfazer se ela é para ser utilizável de qualquer modo que seja. Essas
condições, chamadas condições de saída nuas (bare output conditions) na linguagem
técnica, são condições de legibilidade: os sistemas dentro dos quais a faculdade de
linguagem se encaixa têm de ser capazes de “ler” as expressões da língua e usá-las
como “instruções” para o pensamento e a ação. Os sistemas sensorimotores leem as
instruções e fornecem expressões com a representação fonética apropriada. O sistema
conceitual e outros que fazem uso dos recursos da faculdade de linguagem têm suas
propriedades intrínsecas, que requerem que as expressões geradas pela língua tenham
certos tipos de “representações semânticas” e não outros. Para cada expressão
linguística será gerada uma representação fonética, que é legível para os sistemas
sensorimotores, e uma representação semântica, que é legível para o sistema conceitual
e outros sistemas do pensamento e da ação.
Toma como pressupostos os fatos (i) de haver unidades do tipo palavras, (ii) de esses
itens lexicais se organizarem em expressões maiores e (iii) de esses itens terem
propriedades de som e significado, chamadas “traços”. Chega a uma divisão tripartite
entre traços: (i) traços semânticos, (ii) traços fonéticos e (iii) traços formais. Estes
últimos se distinguem dos traços fonéticos e semânticos intrínsecos aos itens: são
ininterpretáveis, sendo usados pelas operações computacionais que constroem a
derivação de uma expressão. Propõe a hipótese de que só os traços flexionais são traços
formais. Segundo sua visão, numa língua dada, montam-se itens lexicais com traços, e
então as operações computacionais, fixas e invariantes, constroem representações
semânticas a partir daqueles de maneira uniforme. Em algum ponto na derivação, o
componente fonológico acessa a derivação, despindo e retirando os traços fonéticos e
convertendo o objeto sintático em forma fonética, enquanto o resíduo prossegue para a
representação semântica por operações encobertas.
Voltando a se perguntar até que ponto a linguagem é bem-configurada, aponta duas
imperfeições aparentes. Uma é o próprio fato de haver traços ininterpretáveis. Outra é a
propriedade de deslocamento: os sintagmas são interpretados como se estivessem em
uma posição diferente na expressão, onde itens semelhantes algumas vezes efetivamente
aparecem e são interpretados em termos de relações locais naturais. Entre as operações
computacionais, pressupõe duas. Uma é a operação Confluir, que anexa dois objetos já
formados um ao outro, formando um objeto maior com exatamente as propriedades do
alvo da anexação. Denomina essa estrutura de estrutura sintagmática nua (bare phrase
structure), implicando essa expressão a total ausência de rótulos categoriais e
sintagmáticos. A outra operação é a envolvida na propriedade de deslocamento. Procura
chegar a uma unificação entre as duas imperfeições apontadas: os traços formais
ininterpretáveis seriam de fato o mecanismo que implementa a propriedade de
deslocamento. Como a propriedade de deslocamento pode ser motivada pelas condições
de legibilidade impostas pelos sistemas externos, conclui que as duas imperfeições são
eliminadas completamente e a linguagem acaba sendo, afinal, ótima: traços formais
ininterpretados são exigidos como um mecanismo para satisfazer as condições de
legibilidade impostas pela arquitetura geral da mente/cérebro, pelas propriedades do
aparato de processamento e pelos sistemas do pensamento. Explora a ideia de que,
numa relação de concordância, o elemento que determina a concordância contém traços
combinantes (matching features) e o que concorda contém traços infratores – traços que
são ininterpretáveis e têm, por isso, de ser apagados. Por sua vez, o apagamento exige
uma relação local entre o traço infrator e o traço combinante. Dadas essas conclusões,
uma língua particular é apresentada como consistindo em um léxico, um sistema
fonológico e duas operações computacionais: Confluir e Atrair. Apesar de somente os
traços das palavras serem atraídos, o movimento manifestamente visível ocorre (isto é, o
sintagma pleno se movimenta) em virtude da pobreza do sistema sensorimotor, que é
incapaz de “pronunciar” ou “ouvir” traços isolados separados das palavras das quais são
parte. No caso de movimento encoberto, só os traços se atraem, sem desencadearem o
movimento visível de sintagmas.

Primeira Palestra
Não há hoje nenhuma razão séria para se desafiar a visão cartesiana 1 de que a habilidade
de usar signos linguísticos para expressar pensamentos formados livremente marque a
verdadeira distinção entre o homem e o animal ou a máquina.
É razoável considerar a faculdade de linguagem como um “órgão da linguagem”, no
sentido em que os cientistas falam de um sistema visual ou sistema imunológico ou
sistema circulatório como órgãos do corpo. Compreendido desse modo, um órgão não é
algo que possa ser removido do corpo, deixando o resto intacto. É um subsistema de
uma estrutura mais complexa. Esperamos compreender a complexidade total
investigando partes que têm características distintivas e suas interações.
Pressupomos ainda que o órgão da linguagem é como outros, no sentido de que seu
caráter básico é uma expressão dos genes. Evidentemente, cada língua é o resultado da
atuação recíproca de dois fatores: o estado inicial e o curso da experiência. Podemos
imaginar o estado inicial como um “dispositivo de aquisição de língua” que toma a
experiência como “dado de entrada” e fornece a língua como um “dado de saída” – um
“dado de saída” que é internamente representado na mente/cérebro. Os dados de entrada
e os dados de saída estão ambos sujeitos a exame.
O que se aprende desse modo pode nos dizer muito sobre o estado inicial que medeia
entre eles. Há fortes razões para se acreditar que o estado inicial é comum à espécie: se
meus filhos tivessem crescido em Tóquio, eles falariam japonês.
A linguagem humana pode ser investigada do ponto de vista biológico e de inúmeros
outros. Cada abordagem define o objeto de sua investigação à luz de suas preocupações
especiais; e cada uma deveria tentar aprender o que pode com as outras.
A abordagem puramente internalista preocupa-se com a faculdade de linguagem: seu
estado inicial e os estados que ela assume. Suponhamos que o órgão de linguagem de
1
que ou o que apresenta os caracteres racionais rigorosos e metódicos do pensamento de Descartes.
Pedro esteja no estado L. Podemos imaginar L como a língua de Pedro (língua
compreendida aqui como “o modo como falamos e compreendemos” – uma concepção
tradicional). A teoria da língua de Pedro é frequentemente chamada de “gramática” de
sua língua e a teoria do estado inicial da faculdade de linguagem é chamada “gramática
universal”. A língua de Pedro determina um leque infinito de expressões, cada uma com
seu som e seu significado. Em termos técnicos, a língua de Pedro “gera” as expressões
da língua dele. A teoria da língua dele é então chamada uma gramática gerativa. Cada
expressão é um complexo de propriedades, que fornecem “instruções” para os sistemas
de desempenho de Pedro: seu aparato articulatório, seus modos de organizar os
pensamentos, e assim por diante. Com a sua língua e os sistemas de desempenho
associados nos seus devidos lugares, Pedro tem uma vasta quantidade de conhecimento
sobre o som e o significado de expressões e uma correspondente capacidade de
interpretar o que ouve, de expressar os seus pensamentos e de usar a sua língua de
inúmeras outras maneiras.
A perspectiva cognitiva2 vê o comportamento e seus produtos (textos, por exemplo) não
como o objeto de investigação, mas como dados que podem fornecer evidências sobre
os mecanismos internos da mente e os modos como esses mecanismos operam ao
executar ações e interpretar a experiência. As propriedades e padrões que eram o foco
de atenção na linguística estrutural encontram seu lugar, mas como fenômenos a serem
explicados juntamente com inúmeros outros, em termos dos mecanismos internos que
geram expressões.
A linguagem envolve o uso infinito de meios finitos. Os avanços nas ciências formais
fornecem conceitos apropriados e numa forma muito exata e clara, tornando possível
dar uma explicação precisa dos princípios computacionais que geram as expressões de
uma língua.
O objetivo de uma teoria da língua é trazer à luz alguns dos fatores que entram na
habilidade de produzir e entender “expressões livres” que são novas para o falante e o
ouvinte ou mesmo para a história da língua.
As propriedades básicas das línguas particulares e da faculdade geral de linguagem são
inconscientemente pressupostas por toda parte, sem serem reconhecidas nem serem
expressas.
A aquisição da língua se parece muito com o crescimento dos órgãos em geral; é algo
que acontece com a criança e não algo que a criança faz. E, embora o meio ambiente
importe claramente, o curso geral do desenvolvimento e os traços básicos do que
emerge são pré-determinados pelo estado inicial. Mas o estado inicial é uma posse
comum aos homens. Tem de ser então que, em suas propriedades essenciais, as línguas
são moldadas na mesma forma.

2
Perspectiva pensada a partir da Revolução Cognitiva. O advento de um novo modo de conceber e
investigar a mente ocorrido no final dos anos cinquenta é designado como Revolução Cognitiva. Nesse
contexto, o computador acaba servindo como uma metáfora promissora, vinculada a uma nova
compreensão ontológica da mente. Um crescente número de trabalhos experimentais, a partir de então,
encarrega-se de estudar os processos de memória, atenção, raciocínio, percepção, evidenciando que a
mente poderia ser investigada de um modo verdadeiramente científico. Diferentes áreas do conhecimento,
tais como Filosofia, Antropologia, Linguística, Psicologia e Neurociência acabaram por servir-se de uma
nova e promissora metáfora para estudar o psiquismo humano (conjunto dos processos psíquicos do ser
humano ou do animal tomado genericamente).
Eis o problema central do estudo moderno da linguagem: Como podemos mostrar que
todas as línguas são variações de um mesmo tema e, simultaneamente, registrar
fielmente suas intricadas propriedades de som e significado, superficialmente diversas?
Uma genuína teoria da linguagem humana tem de satisfazer duas condições:
“adequação descritiva” e “adequação explicativa”. A gramática satisfaz a condição de
adequação descritiva na medida em que dá uma explicação completa e exata das
propriedades da língua, daquilo que o falante da língua sabe. A teoria geral da
linguagem, a gramática universal, satisfaz a condição de adequação explicativa,
mostrando que cada língua particular é uma manifestação específica do estado inicial
uniforme, dele derivada sob as “condições de fronteira”, cujas opções são fixadas pela
experiência.
Há uma séria tensão entre essas duas tarefas de pesquisa. A procura da adequação
descritiva parece levar a uma complexidade e a uma variedade sempre maiores de
sistemas de regras, ao passo que a procura da adequação explicativa exige que a
estrutura da língua seja em grande parte, invariante. O modo natural de resolver a tensão
é desafiar o pressuposto tradicional de que a língua é um sistema complexo de regras,
cada regra sendo específica de línguas particulares e construções gramaticais
particulares.
Tentativas de encontrar propriedades gerais de sistemas de regras que podem ser
atribuídas à própria faculdade de linguagem, na esperança de o resíduo se mostrar mais
simples e uniforme, cristalizaram-se numa abordagem à linguagem chamada de
“Princípios-e-Parâmetros”, a qual rejeitou inteiramente o conceito de regra e construção
gramatical. As construções gramaticais familiares são consideradas artefatos
taxonômicos. E as regras são decompostas em princípios gerais da faculdade de
linguagem, que interagem para produzir as propriedades das expressões. Podemos
imaginar o estado inicial da faculdade de linguagem como uma rede de relações fixa
conectada a um painel de controle; a rede de relações é constituída pelos princípios da
linguagem, enquanto os controles são as opções a serem determinadas pela experiência.
Cada língua humana possível é identificada como uma fixação particular dos controles –
uma fixação de parâmetros, na terminologia técnica. Pequenas mudanças na fixação dos
controles podem levar a uma grande variedade aparente nos dados de saída, já que os
efeitos proliferam através do sistema.
Voltarei agora para alguns outros tópicos de natureza mais geral, que dizem respeito ao
modo pelo qual o estudo internalista da linguagem se relaciona com o mundo externo.
Essas questões se inserem em duas categorias: primeiro, relações entre mente e cérebro;
segundo, questões de uso da língua. Comecemos com a primeira.
O estudo internalista da linguagem tenta descobrir as propriedades do estado inicial da
faculdade de linguagem e os estados que este assume sob a influência da experiência.
Os estados inicial e atingido são estados do cérebro em primeiro lugar, mas descritos
abstratamente, não em termos de células, mas em termos de propriedades que os
mecanismos do cérebro têm de satisfazer de algum modo.
A faculdade da linguagem inata nos cérebros humanos não é explicada com base no
hardware (fato de que há células envolvidas na estrutura do dispositivo que é inato nos
seres humanos). Tomam-se as entidades e os princípios postulados como verdadeiros,
porque não temos outro conceito de realidade.
Com relação às ciências do cérebro, o estudo abstrato de estados do cérebro fornece
diretrizes para a pesquisa. Não se faz avançar as ciências do cérebro propondo-se parar
de tentar encontrar as propriedades dos estados do cérebro ou pressupondo-se,
dogmaticamente, que o pouco que se conhece sobre o cérebro tem de fornecer as
respostas, ou dizendo que podemos procurar as propriedades, mas não devemos ir
adiante e atribuí-las ao cérebro e seus estados – “regras inconscientes e profundas”, se
isso é o que a melhor teoria conclui.
O estudo abstrato da linguagem parece se situar no lado mental da partição. Ele põe em
dúvida a “premissa materialista básica” de que “Toda realidade é física”.
As ciências vieram a aceitar a conclusão de que uma física puramente materialista ou
mecanicista3 é impossível.
Temos de ver as propriedades “rotuladas mentais” como o resultado de uma “estrutura
orgânica tal como a do cérebro”, superadicionada a outras, nenhuma das quais precisa
ser compreensível no sentido buscado pela ciência de antes. Isso inclui o estudo da
linguagem, que tenta desenvolver corpos de doutrina com construtos e princípios que
podem ser apropriadamente “rotulados mentais” e tomados como “o resultado de
estrutura orgânica” – de que modo, ainda está por ser descoberto. A abordagem se
incumbe de estudar um objeto real no mundo natural – o cérebro, seus estados e funções
–, e então deslocar o estudo da mente em direção a uma eventual integração com as
ciências biológicas.
Uma outra questão da mesma categoria tem a ver com o modo como os genes 4
expressam as propriedades do estado inicial. As “leis epigenéticas5” que transformam os
genes em organismos desenvolvidos são, na sua maior parte, desconhecidas, uma
grande lacuna na teoria evolucionista, porque a teoria requer uma compreensão da
correspondência genótipo-fenótipo6, i.e., da gama de organismos que pode se
3
Relativo a mecanicismo – doutrina filosófica, também adotada como princípio heurístico (diz-se de
hipótese de trabalho que, a despeito de ser verdadeira ou falsa, é adotada a título provisório como idéia
diretriz na investigação dos fatos) na pesquisa científica, que concebe a natureza como uma máquina,
obedecendo a relações de causalidade necessárias, automáticas e previsíveis, constituídas pelo movimento
e interação de corpos materiais no espaço [A física do sXX, esp. a teoria quântica, tornou o mecanicismo
ultrapassado no âmbito científico.]
4
O gene é um segmento de uma molécula de DNA – que contém um código (instruções) para produzir
uma proteína que desempenha uma função específica no corpo –, responsável pelas características
herdadas geneticamente.
5
A epigenética (epi = ‘por cima de’; ‘somado a’) é o estudo de qualquer transformação na expressão de
genes que ocorre sem haver mudança na sequência do DNA. A expressão genética é o primeiro estágio
de um processo que descodifica a informação contida no DNA de uma célula. É a expressão de genes que
dá origem a uma proteína. Essas alterações, de ordem química, podem ocorrer na molécula de DNA e em
proteínas chamadas histonas (nas quais a molécula de DNA se enrola), podendo ser herdadas na divisão
celular. O fenômeno tem alto impacto na biologia do organismo e na definição de diferentes fenótipos,
isto é, da sua morfologia, do seu desenvolvimento e de aspectos do comportamento. Os genes não são os
únicos responsáveis por passar as características biológicas de uma geração à outra. Hoje os cientistas
sabem que variações não-genéticas (ou epigenéticas) adquiridas durante a vida de um organismo podem
frequentemente serem passadas aos seus descendentes. Existem evidências científicas mostrando que
hábitos da vida e o ambiente social em que uma pessoa está inserida podem modificar o funcionamento
de seus genes.
6
Genótipo é o conjunto formado pelos genes de um indivíduo, que não são modificados naturalmente. O
fenótipo refere-se às características (nem sempre visíveis e expressas externamente) que podem ser
modificadas. A constituição genética própria de um organismo (genótipo) mais a influência recebida do
meio ambiente será responsável pelo fenótipo, ou seja, pelas características observáveis do indivíduo. O
termo fenótipo serviria para atribuir características morfológicas, fisiológicas ou mesmo relacionadas ao
desenvolver a partir de algum complexo de genes. Há muito mais a dizer sobre esse
tópico, mas o deixarei de lado e passarei para a segunda categoria de questões, sobre o
emprego que a linguagem faz do mundo: questões de uso da língua.
Por uma questão de simplicidade, vamos nos ater a palavras, e palavras simples.
Suponhamos que “livro” seja uma palavra do léxico de Pedro. A palavra é um complexo
de propriedades: no jargão técnico, traços fonéticos e semânticos. Os sistemas
sensorimotores7 usam as propriedades fonéticas para a articulação e a percepção,
relacionando-as a eventos externos – movimentos de moléculas, por exemplo. Outros
sistemas da mente usam as propriedades semânticas da palavra quando Pedro fala sobre
o mundo e o interpreta o que os outros dizem sobre o mesmo.
Os estudos orientados empiricamente parecem abordas os problemas do significado
basicamente do mesmo modo como estudam o som. Tentam encontrar as propriedades
semânticas da palavra “livro” que são usadas pelos outros sistemas da mente/cérebro
(que não os sistemas articulatório e perceptual): que é nominal e não verbal, usada para
referência a um artefato e não uma substância como água ou a uma abstração como
saúde, e assim por diante. Pode-se perguntar se essas propriedades são parte do
significado da palavra “livro” ou do conceito associado à palavra: não está claro como
distinguir essas propriedades. Alguns traços do item lexical “livro”, que são internos a
ele, determinam os modos de interpretação do tipo que acabei de mencionar.
Ao investigar o uso da língua, descobrimos que as palavras são interpretadas em termos
de fatores tais como constituição material, configuração geral, uso característico e
pretendido, papel institucional, e assim por diante. As coisas são identificadas e
atribuídas a categorias em termos de tais propriedades, que estou tomando como traços
semânticos, em paridade com os traços fonéticos que determinam o seu som. O uso da
língua pode levar em consideração esses traços semânticos de vários modos.
Suponhamos que a biblioteca tenha dois exemplares de Guerra e Paz de Tolstoi e que
Pedro pegue emprestado um e João o outro. Pedro e João pegaram o mesmo livro ou
livros diferentes? Se atentamos para o fator material do item lexical, pegaram livros
diferentes; se focalizarmos seu componente abstrato, pegaram o mesmo livro. Podemos
atentar para ambos os fatores, material e abstrato, simultaneamente, como quando
dizemos que o livro dele está em todas as livrarias do país. De modo análogo, podemos
pintar a porta de branco e passar por ela, usando o pronome “ela” para nos referir
ambiguamente à figura e ao espaço. Podemos relatar que houve a quebra do banco
depois que ele aumentou a taxa de juros, ou que ele aumentou a taxa para evitar que
sofresse a quebra. Aqui o pronome “ele” e a “categoria vazia” que é sujeito de “sofresse
a queda”, simultaneamente, adotam ambos os fatores material e institucional.
Considere-se a cidade que é vista como sagrada pelas fés que remontam ao Antigo
Testamento. O mundo islâmico a chama “Al-Quds”; Israel usa um nome diferente,
como o faz o mundo cristão: “Jerusalém”, em português. Há muito conflito sobre essa
cidade. O New York Times acaba de oferecer o que chama de “solução promissora”.
Israel deveria ficar com Jerusalém inteira, mas “Al-Quds” seria reconstruída fora das
atuais fronteiras de Jerusalém. A proposta é perfeitamente inteligível – razão por que
desperta considerável indignação fora dos círculos nos quais a doutrina dos poderosos

comportamento do ser vivo estudado. Exemplos comuns para se compreender o que seria o fenótipo são a
cor de nossa pele e olhos, o tipo sanguíneo de uma pessoa, formato dos olhos, tipo de cabelo, etc.
7
sensório-motor: relativo à percepção de impulsos sensoriais e motores.
reina inconteste8. E o plano poderia ser implementado. A que cidade estaremos então
nos referindo ao dizer que ela foi deixada onde estava, embora deslocada para algum
outro lugar?
Os significados das palavras têm outras propriedades curiosas. Assim, se digo a você
que pintei minha casa de marrom, quero fazer você compreender que passei a tinta
sobre a superfície exterior, não a superfície interior. Se quero que você entenda que foi a
superfície interior, tenho de dizer que pintei a casa de marrom por dentro. Na
terminologia técnica, há um uso marcado e outro não marcado; sem indicações
específicas, damos às palavras a sua interpretação não marcada. Essas são propriedades
de casas, não somente da palavra “pintar”. Assim, se vejo a casa, vejo sua superfície
exterior. Se você e eu estamos fora da casa, você pode estar mais próximo dela do que
eu; mas se estamos ambos na casa, este não pode ser o caso. Nenhum de nós está mais
perto da casa. Logo, vemos a casa como uma superfície exterior, mas com um interior
também. Se decido usar minha casa para guardar meu carro, morando em outro lugar,
não é mais uma casa, é antes uma garagem, embora a constituição material não tenha
mudado. Tais propriedades vigoram de maneira bem geral, mesmo para objetos
inventados, mesmo objetos impossíveis.
Tais propriedades não se limitam a artefatos. As observações se estendem aos elementos
referenciais mais simples e aos dependentes referencialmente; e aos nomes próprios,
que têm propriedades semântico-conceituais complexas. Algo é designado como uma
pessoa, um rio, uma cidade, com a complexidade de compreensão que acompanha essas
categorias. A linguagem não tem logicamente nomes próprios, despidos de tais
propriedades.
Os fatos sobre tais assuntos são frequentemente claros, mas não triviais. Não há razão a
priori para se esperar que a linguagem humana tenha tais propriedades; a língua
marciana poderia ser diferente. Os sistemas simbólicos da ciência e da matemática
seguramente são.
Sabemos tudo isso sobre partes da nossa experiência que construímos como livros, ou
cidades, e assim por diante, em virtude da configuração geral de nossa língua e de nossa
organização mental. Tomando emprestada a terminologia da revolução cognitiva do
século XVII9, o que os sentidos veiculam dá à mente “uma ocasião de exercitar sua
própria atividade” para construir “ideias inteligíveis e concepções de coisas a partir dela
própria”, como “regras”, “padrões”, “exemplares” e “antecipações” que produzem
propriedades gestálticas10 e outras, e “uma ideia abrangente do todo”. Há boas razões
para se adotar o princípio de Hume 11 de que a “identidade que atribuímos” às coisas é
8
Ou seja: a proposta não desperta indignação onde a doutrina dos poderosos não reina inconteste, isto é,
dentro dos círculos; mas desperta indignação onde a doutrina dos poderosos reina inconteste, isto é, fora
dos círculos.
9
A revolução dos séculos XVI e XVII foi uma revolução cognitiva. Transformaram-se os modos de
pensar sobre a natureza, os tipos de perguntas formuladas e os métodos de buscar respostas (válidas).
Com essa revolução científica veio a formulação de teorias (idealmente expressas em termos
matemáticos) testáveis por observações empíricas (obtidas, onde possível, a partir de experimentos).
10
relativo a gestalt ou a gestaltismo: teoria psicológica que considera os fenômenos como conjuntos
constitutivos de unidades autônomas, dotadas de solidariedade interna e de leis próprias; teoria que
considera os fenômenos psicológicos como totalidades organizadas, indivisíveis, articuladas, isto é, como
configurações (arranjo de elementos interligados para operar como um todo ou um sistema).
11
David Hume foi um filósofo, historiador e ensaísta britânico nascido na Escócia que se tornou célebre
por seu empirismo radical e seu ceticismo filosófico. Hume procurou examinar a base psicológica da
natureza humana, esta posição o levou a concluir ser o comportamento humano governado pela paixão e
“apenas fictícia”, estabelecida pelo entendimento humano. As pessoas pensam e falam
sobre o mundo em termos de perspectivas tornadas disponíveis pelos recursos da mente,
incluindo os significados dos termos nos quais seus pensamentos são expressos. A
comparação com a interpretação fonética não é desarrazoada.
Uma grande parte da filosofia contemporânea da linguagem e da mente segue um curso
diferente. Ela pergunta a que uma palavra se refere, dando várias respostas. Mas a
pergunta não tem um significado claro. Faz pouco sentido perguntar a que coisa a
expressão “Guerra e Paz de Tolstoi” se refere. A resposta depende de como os traços
semânticos são usados quando pensamos e falamos, de um modo ou de outro. Em geral,
uma palavra, mesmo do tipo mais simples, não escolhe uma entidade do mundo, ou do
nosso “espaço de crença” – o que não significa negar, é claro, que não haja livros e
bancos. Mas deveríamos não tirar conclusões injustificadas do uso comum.
Podemos, se quisermos, dizer que a palavra “livro” se refere a livros, “céu” ao céu,
“saúde” a saúde, e assim por diante. Tais convenções expressam basicamente a falta de
interesse nas propriedades semânticas das palavras e na maneira como são usadas para
falar das coisas. Poderíamos igualmente evitar as questões de fonética acústica e
articulatória. Dizer isso não é criticar a decisão; qualquer investigação focaliza certas
questões e ignora outras. Um estudo das operações da faculdade de linguagem, parte da
mente. Os modos como a linguagem é usada para empregar o mundo se situam além.
A gramática gerativa procura descobrir os mecanismos que são usados, contribuindo,
assim, para o estudo de como são usados da maneira criativa da vida normal. Como são
usados é o problema que permanece misterioso, embora se saiba muito mais hoje sobre
os mecanismos que estão envolvidos.
Nesse aspecto, o estudo da linguagem é de novo tal como o dos outros órgãos. O estudo
dos sistemas visual e motor desvendou os mecanismos pelos quais o cérebro interpreta
estímulos esparsos como um cubo e pelos quais o braço se estende para pegar um livro
sobre a mesa. Mas esses ramos da ciência não levantam a questão de como as pessoas
decidem fazer tais coisas, e as especulações sobre o uso dos sistemas visual e motor, ou
outros, equivalem a muito pouco. São essas capacidades, manifestadas de forma mais
impressionante no uso da língua, que estão no âmago das preocupações tradicionais.
Essa “potência gerativa” da compreensão e da ação humanas ordinárias é somente uma
forma inferior de compreensão. Ela não alcança o nível do verdadeiro exercício da
imaginação criativa. Mesmo forma inferior está além de nosso alcance teórico,
excluindo-se o estudo dos mecanismos envolvidos.

Segunda Palestra
Discuti duas questões básicas sobre a linguagem, uma internalista e a outra externalista.
A questão internalista indaga que tipo de sistema é a linguagem. A questão externalista
indaga como a linguagem se relaciona com as outras partes da mente e com o mundo
externo, incluindo problemas de unificação e de uso da língua. A discussão ficou num
nível muito geral, tentando pôr em ordem os tipos de problemas que surgem e os modos
de lidar com eles que parecem corretos. Agora eu gostaria de examinar um pouco mais
de perto o pensamento atual sobre a questão internalista.
não pela razão, argumentando contra o racionalismo, ao qual o empirismo se opunha com veemência. O
desenvolvimento desta posição também o levou a afirmar uma ética sentimentalista, a qual seria baseada
nos sentimentos ou emoções humanas, em oposição a uma ética baseada em princípios morais abstratos.
O estudo da linguagem tomou um caminho um tanto diferente, como parte da chamada
“revolução cognitiva” dos anos 50. O programa de pesquisa que se desenvolveu
conduziu finalmente a um quadro da linguagem que representa uma considerável
divergência da longa e rica tradição: a abordagem de Princípios-e-Parâmetros 12, que se
baseia na ideia de que o estado inicial da faculdade de linguagem consiste em princípios
invariantes e em um leque finito de escolhas quanto ao funcionamento do sistema
inteiro. Uma língua particular é determinada fazendo-se essas escolhas de um modo
específico.
Estamos agora perguntando até que ponto a linguagem é bem-configurada. Até que
ponto a linguagem se parece com o que um engenheiro sumamente competente poderia
ter construído, dadas certas especificações da configuração geral. Para estudar essa
questão, temos de explicitar melhor essas especificações. Algumas são internas e gerais,
tendo a ver com a naturalidade conceitual e a simplicidade. Outras são externas e
específicas, tendo a ver com as condições impostas pelos sistemas da mente/cérebro
com que a faculdade de linguagem interage. Sugeri que a resposta a essa questão pode
vir a ser que a linguagem é muito bem-configurada, talvez quase “perfeita” quanto a
satisfazer condições externas.
Se há alguma verdade nesta conclusão, é bastante surpreendente, por diversas razões.
Primeiro, as línguas têm sido frequentemente pressupostas como objetos tão complexos
e defectivos que mal valeria a pena estudá-las sob uma perspectiva teórica rigorosa.
Segundo, não se pode esperar encontrar tais propriedades da configuração geral em
sistemas biológicos, que evoluíram no correr de longos períodos por meio de mudanças
progressivas, sob circunstâncias complicadas e acidentais, tirando o melhor possível de
contingências difíceis e obscuras.
Suponhamos, no entanto, que rejeitemos o ceticismo inicial e tentemos formular
algumas questões razoavelmente claras sobre a otimidade da configuração geral da
linguagem. O “programa minimalista13” é um esforço para examinar tais questões.
Do Big Bang às grandes moléculas, a configuração geral resulta da ação de lei física: as
propriedades do hélio ou dos flocos de neve, por exemplo. Os efeitos da seleção
começam a aparecer com formas orgânicas mais complexas, embora a compreensão
12
Elaborada por Chomsky, em 1984, a Teoria de princípios e parâmetros significou uma adequação dos
conceitos da gramática universal. “Postula-se que a criança nasce pré-programada com princípios
(universais) e um conjunto de parâmetros que deverão ser fixados ou marcados de acordo com os dados
da língua a que a criança está exposta.” Nessa teoria a função da criança é analisar todas as partes do
input e depois processá-lo a fim de atribuir o valor que cada parâmetro deve possuir. Para um melhor
esclarecimento: partindo da concepção de que todas as frases, indistintamente da língua, requerem um
sujeito, contudo esse sujeito não necessariamente tem que estar explícito, sendo esse parâmetro ou valor
que deve ser fixado. A resposta de Chomsky, quanto à explicação da aprendizagem da língua,
fundamenta-se exatamente na existência da gramática universal enquanto conjunto de “princípios inatos,
biologicamente determinados, que constituem o componente da mente humana – faculdade da
linguagem”. Os dispositivos de aquisição da linguagem não são obrigatoriamente atrelados aos outros
sistemas cognitivos, memória por exemplo, bem como a interação social.
13
O Programa Minimalista é a linha de investigação que tomou a gramática gerativa a princípio dos anos
noventa. Apresenta-se como programa, e não como teoria, porque pretende ser um modo de investigação,
ou seja, um programa de pesquisa, cujo principal objetivo passa a ser construir uma teoria da gramática
fundada sobre conceitos naturais exclusivamente, baseando-se em um conceito de economia que implica
noções de que nenhuma teoria da gramática possa prescindir e apenas essas. Assim, ao se falar de
Minimalismo ou de análises minimalistas, continua-se a adotar os postulados básicos representados pelas
noções de princípios e parâmetros, embora se busquem propostas mais simples, elegantes e parcimoniosas
que dêem conta dos fenômenos linguísticos sob investigação.
decline à medida que aumenta a complexidade, e tem-se de estar precavido para o que
os biólogos evolucionistas Richard Lewontin, Stuart Kauffman, e outros, chamaram de
“Histórias Assim, Assim” (Just So Stories) – histórias sobre como as coisas poderiam
ter acontecido, ou não. Indiscutivelmente, para qualquer caso que se estude, tem-se de
determinar como o canal físico restringe os resultados e que opções ele permite.
Além disso, o que aparenta ser uma configuração geral maravilhosa pode ser bem um
exemplo paradigmático14 de gradualismo que independe da função em questão. O uso
ordinário da língua, por exemplo, depende dos ossos do ouvido interno que migraram
dos maxilares dos répteis. Acredita-se atualmente que o processo é consequência do
crescimento do neocórtex nos mamíferos e “separa os verdadeiros mamíferos de todos
os outros vertebrados”. Um engenheiro acharia que esse “delicado sistema de
amplificação do som” é esplendidamente projetado para a função da linguagem, mas a
mãe natureza não teve isso em mente quando o processo começou há 160 milhões de
anos, nem há qualquer efeito selecional conhecido do empréstimo do sistema para uso
pela linguagem.
A linguagem humana situa-se bem além dos limites do entendimento sério dos
processos evolucionistas, embora haja especulações sugestivas. Acrescentemos outra.
Suponhamos que criemos uma “História Assim, Assim” com imagens derivadas dos
flocos de neve e não dos pescoços das girafas, e com configuração geral determinada
por lei natural e não por bricolagem 15 por meio da seleção. Suponhamos que existiu um
antigo primata com toda a arquitetura mental humana no lugar, mas sem faculdade de
linguagem. A criatura compartilhou nossos modos de organização perceptual, nossas
crenças e desejos, nossas esperanças e temores, na medida em que esses não são
formados e mediados pela linguagem. Talvez tenha tido uma “linguagem do
pensamento”, no sentido de Jerry Fodor16 e outros, mas não um meio de formar
expressões linguísticas associadas com os pensamentos que essa Lingua Mentis torna
disponíveis.
Suponhamos que uma mutação tenha ocorrido nas instruções genéticas para o cérebro,
que foi então reorganizado de acordo com as leis da física e da química para instalar a
faculdade de linguagem. Suponhamos que o novo sistema era, além do mais,
belissimamente configurado, uma solução quase perfeita para as condições impostas
pela arquitetura da mente/cérebro na qual se insere, uma ilustração de como as leis
naturais trabalham de modo maravilhoso; ou, se se prefere, uma ilustração de como o
funileiro evolucionário poderia satisfazer condições complexas da configuração geral
com ferramentas muito simples.
Sejamos claros: trata-se de fábulas. As imagens cumprem sua função se nos ajudam a
formular um problema que no fim poderia ter sentido e ser até significativo:
basicamente, o problema que motiva o programa minimalista, que explora a intuição de
que o resultado da fábula pode ser exato de maneiras interessantes.

14
paradigmático /‘próprio para servir de exemplo’/: relativo ou pertencente a paradigma (um exemplo
que serve como modelo; padrão)
15
montagem ou instalação (de qualquer coisa), feita por pessoa não especializada; fig. montagem ou
combinação (de elementos diversos). Bricolagem vem do francês “Bricolage”, termo usado para definir a
prática de pequenos trabalhos sem ajuda de um profissional.
16
Jerry Fodor propõe que todo ser humano dispõe de uma “linguagem residente” inata, que ele nomeia de
linguagem do pensamento, que tem como função a manipulação de símbolos mentais, propiciando assim
a “geração” de significados, questão fundamental para a aquisição de uma linguagem natural.
Observe-se uma certa semelhança com o problema lógico da aquisição de língua, uma
reformulação da condição de adequação explicativa como um dispositivo que converte a
experiência em uma língua, tomada como um estado de um componente do cérebro. A
operação é instantânea, embora o processo claramente não o seja. A questão empírica
séria é quanta distorção é introduzida pela abstração 17. Um tanto surpreendente, talvez,
parece que pouca distorção é introduzida, caso alguma o seja: é como se a língua
aparecesse instantaneamente, pela seleção das opções disponíveis no estado inicial.
Apesar da grande variação na experiência, os resultados parecem ser notavelmente
semelhantes, com interpretações compartilhadas, frequentemente de sutileza extrema,
para expressões linguísticas de tipos que possuem pouca semelhança com qualquer
coisa experienciada18. Isso não é o que esperaríamos se a abstração para a aquisição
instantânea introduzisse severas distorções. Na medida em que tem sido possível
explicar propriedades de línguas individuais em termos da abstração, temos evidência
adicional de que a abstração, de fato, capta propriedades reais de uma realidade
complexa.
Certamente, a faculdade de linguagem não foi instantaneamente inserida na
mente/cérebro com o resto da arquitetura totalmente intacta. Mas estamos perguntado
agora até que ponto é bem-configurada, com base nesse pressuposto contrafactual19. Em
que medida a abstração distorce uma realidade amplamente mais complexa?
A faculdade de linguagem se encaixa dentro da arquitetura mais ampla da
mente/cérebro. Ela interage com outros sistemas, que impõem condições que a
linguagem tem de satisfazer se ela é para ser utilizável de qualquer modo que seja. Estas
poderiam ser consideradas “condições de legibilidade”, chamadas “condições de saída
nuas” (bare output conditions) na literatura técnica. Os sistemas dentro dos quais a
faculdade de linguagem se encaixa têm de ser capazes de “ler” as expressões da língua e
usá-las como “instruções” para o pensamento e a ação. Os sistemas sensorimotores, por
exemplo, têm de ser capazes de ler as instruções que têm a ver com o som. Os aparatos
articulatório e perceptual têm uma configuração geral específica que os capacita a
interpretar certas propriedades, e não outras. Esses sistemas então impõem condições de
legibilidade aos processos gerativos da faculdade de linguagem, que têm de fornecer
expressões com a “representação fonética” apropriada.
O mesmo vale para o sistema conceitual e outros que fazem uso dos recursos da
faculdade de linguagem. Eles têm suas propriedades intrínsecas, que requerem que as

17
ato ou efeito de abstrair(-se): observar (um ou mais elementos de um todo, de uma estrutura), avaliando
características e propriedades em separado. Processo mental que consiste em escolher ou isolar um
aspecto determinado de um estado de coisas relativamente complexo, a fim de simplificar a sua avaliação,
classificação ou para permitir a comunicação do mesmo. A abstração distingue-se da análise, porque
nesta a totalidade é (mentalmente) cindida em todas as suas partes, enquanto a abstração lida com o
isolamento de apenas uma das partes.
18
experimentada
19
Contrafactuais são declarações condicionais no modo subjuntivo que têm uma lógica própria. São assim
chamados porque o antecedente e o consequente do condicional são contrários ao fato: 1 – “Oswald não
atirou em Kennedy, então outra pessoa o fez”; 2 – “Se Oswald não tivesse atirado em Kennedy, então
alguém o teria feito”. Mas nem todos os subjuntivos condicionais são estritamente contrafactuais. Nos
deliberativos condicionais, por exemplo, tomamos em consideração algum antecedente com a finalidade
de distinguir suas consequências e, como resultado, podemos realizar o curso da ação descrita no
antecedente, de forma que o consequente se torne verdadeiro: “Se eu deixasse de fumar, meu hálito seria
melhor”. No entanto, o termo “contrafactual” é largamente usado para abranger todos os condicionais
subjuntivos.
expressões geradas pela língua tenham certos tipos de “representações semânticas”, e
não outros.
Podemos então expressar a pergunta inicial em outros termos e de uma forma algo mais
explícita. Agora perguntamos em que medida a linguagem é uma “boa solução” para as
condições de legibilidade impostas pelos sistemas externos com que ela interage.
O programa minimalista exige que submetamos os pressupostos convencionais a um
cuidadoso escrutínio20. O mais respeitável desses pressupostos é o de que a linguagem
tem som e significado. Em termos atuais, isso traduz a tese de que a faculdade de
linguagem emprega outros sistemas da mente/cérebro em dois “níveis de interface 21”,
um relacionado com o som, o outro com o significado. Uma dada expressão gerada pela
língua contém uma representação fonética, que é legível para os sistemas
sensorimotores, e uma representação semântica, que é legível para o sistema conceitual
e outros sistemas do pensamento e da ação, e pode consistir somente nesses objetos
emparelhados.
Se isto está correto, em seguida temos de perguntar exatamente onde a interface se
localiza. No lado do som, tem de ser determinado em que medida, se é que há alguma,
os sistemas sensorimotores são específicos da linguagem. No lado do sentido, as
questões têm a ver com as relações entre a faculdade de linguagem e outros sistemas
cognitivos – as relações entre linguagem e pensamento. Há uma quantidade enorme de
informação sobre como as expressões são usadas e entendidas em circunstâncias
específicas, o suficiente para fazer pelo menos algumas conjecturas a respeito da
natureza do nível de interface e das condições de legibilidade que ele deve satisfazer.
Uma questão é se há níveis que não sejam os de interface: Existem níveis “internos” à
linguagem? O programa minimalista procura mostrar que tudo o que foi explicado até
agora em termos desses níveis foi mal descrito, e é compreendido igualmente ou melhor
em termos de condições de legibilidade na interface: isso significa o princípio de
projeção, a teoria da ligação, a teoria do Caso, a condição sobre cadeias, e assim por
diante22.
20
exame que se faz minuciosamente; processo de votação que utiliza urna; processo de apuração dos
votos.
21
elemento que proporciona uma ligação física ou lógica entre dois sistemas ou partes de um sistema que
não poderiam ser conectados diretamente.
22
Na teoria gerativista, em sua vertente chomskyana, a língua é vista como um sistema de base biológica
adaptado à tarefa de gerar expressões linguísticas correspondentes a enunciados verbais que possam ser
produzidos e compreendidos em relações interpessoais.
Chomsky propõe um modelo formal de língua que se apresenta independente dos sistemas de
desempenho, o chamado Modelo Padrão. Na perspectiva desse modelo, a língua é concebida como um
conjunto finito de regras e um léxico, conhecimentos internalizados. A tarefa da criança ao adquirir uma
língua seria adquirir as regras da sua língua a partir de enunciados linguísticos com os quais está em
contato e adquirir o léxico dessa língua.
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Em 1981, nasce a Teoria da Regência e Ligação (Government and Binding Theory – GB Theory), que
apresenta uma arquitetura e concepção de língua que difere ainda mais da visão tradicional de língua do
que a gramática gerativa anterior. Chomsky acha que o referido termo não é o mais apropriado para
nomear tal arquitetura de língua, e rebatizou a GB como Teoria dos Princípios e Parâmetros.
Com o Modelo de Princípios e Parâmetros (doravante modelo P&P), a teoria linguística abandona a
concepção de aquisição da linguagem em termos de aquisição de um sistema particular de regras da
língua para adotar a ideia de fixação de parâmetros de variação mediante a obediência a princípios
universais. Nesse modelo, a função da criança na aquisição de uma língua é fixar o valor desses
parâmetros a partir do material linguístico de que dispõe, obedecendo aos princípios da Gramática
Universal (GU). A GU é concebida como um estado inicial da aquisição da linguagem sendo constituída
As únicas operações computacionais são aquelas que são inevitáveis sob os
pressupostos mais fracos relativos às propriedades de interface. Um desses pressupostos
é que há unidades do tipo de palavras: os sistemas externos têm de ser capazes de
interpretar itens, tais como “mulher” e “alta”. Outro é que esses itens se organizam em
expressões maiores, tais como “mulher alta”. Um terceiro é que os itens têm
propriedades de som e significado: a palavra “mulher” começa com oclusão dos lábios e
é usada para referência a pessoas. Logo, a linguagem envolve três tipos de elementos: as
propriedades de som e significado, chamadas “traços”; os itens que são montados a
partir dessas propriedades, chamados “itens lexicais”; e as expressões complexas
construídas a partir dessas unidades “atômicas”. Segue-se que o sistema computacional
que gera expressões tem duas operações básicas: uma monta itens lexicais com os

de princípios inatos e parâmetros, estes sem os valores fixados. O estado final que caracteriza os
conhecimentos linguísticos do falante adulto é denominado língua I. Esta é constituída pelos parâmetros
de GU com seus valores fixados e pelo léxico da língua em questão. O modelo P&P apresenta
submódulos, ou subteorias, que objetivavam caracterizar adequadamente diferentes aspectos da língua
(entre as quais, a Teoria X-Barra e a Teoria Temática. A Teoria X-Barra explica a natureza do
constituinte, as relações entre os seus elementos e o modo como os constituintes se hierarquizam
formando as orações; e ainda, aborda as características universais das línguas, bem como, as
particularidades das diferentes línguas). Esses avanços não são suficientes, no entanto, para
compatibilizar a adequação descritiva (explicando o que é particular da língua) e explicativa (explicitando
as propriedades que tornariam a língua em questão passível de aquisição) dos modelos propostos pela
teoria linguística.
O modelo P&P assume que a estrutura da língua apresenta níveis de representação estruturados
hierarquicamente. O mais alto nível de representação é a Estrutura-D (Estrutura Profunda, do inglês
Deep-structure) que relaciona as regras sintagmáticas com o léxico. Essa estrutura é projetada na
Estrutura-S (Estrutura Superficial, do inglês Surface-structure), que se apresenta como uma estrutura
intermediária entre a Estrutura-D e os níveis PF (forma fonética do inglês Phonetic Form) e LF (forma
lógica, do inglês Logical Form). A estrutura-D é a estrutura de organização sintática subjacente, que
antecede qualquer operação ou derivação sintática (ou a interface entre a derivação sintática e o léxico);
é o nível que “codifica as propriedades lexicais dos constituintes da sentença, que representa as relações
argumentais básicas na sentença”. A estrutura-S é o nível de representação sintática resultante dos
processos de movimento e derivação sintática (ou que trabalha com as operações do sistema
computacional que repercutem foneticamente), é o nível que “reflete as estruturas mais superficiais da
sentença; a ordem final dos elementos na sequência de superfície”. Para construirmos uma sentença,
devemos recorrer ao léxico da língua (isto é, ao nosso “dicionário mental”, o conjunto de palavras
pertencentes à nossa língua) e, fazendo uso das informações aí presentes, construir uma primeira
estrutura, a estrutura-D. A estrutura-S é uma representação sintática da sentença que vai ser interpretada
fonologicamente por PF, isto é, PF vai dizer como aquela estrutura é pronunciada; e vai ser interpretada
semanticamente por LF, isto é, LF vai dizer qual é o sentido da estrutura.
Derivação é o conjunto dos estágios que ocorrem na geração de uma sentença, iniciada com a aplicação
das regras do componente de base que formam uma estrutura subjacente, seguindo-se a aplicação de
regras transformacionais que conduzem à estrutura superficial da sentença.
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A Teoria X-barra é o módulo da gramática que permite representar um constituinte. Ela é necessária para
explicitar a natureza do constituinte, as relações que se estabelecem dentro dele e o modo como os
constituintes se hierarquizam para formar a sentença.
Um constituinte é uma unidade sintática construída hierarquicamente. Em vez de procurar estabelecer a
extensão de um constituinte, a sintaxe procura delimitá-lo a partir de um núcleo. Como o núcleo
determina certas funções, sabemos que o constituinte compreende, além do próprio núcleo, o conjunto de
itens que desempenham aquelas funções. Um constituinte sintático recebe o nome de sintagma.
Para representá-lo vamos recorrer a uma variável X que vai tomar seu valor dependendo da categoria do
núcleo do constituinte. Se a categoria for um nome, o valor de X será N; se for um verbo, será V; se for
preposição será P e assim por diante. Este núcleo X vai determinar as relações internas ao constituinte que
são marcadas em dois níveis: o nível X’ (que se lê “X linha”) e o nível XP (onde P abrevia Phrase do
inglês).
X é uma categoria mínima. Chamamos X’ ao nível intermediário ou à projeção intermediária de X; e XP
ao nível sintagmático ou à projeção máxima de X.
traços, a outra forma objetos sintáticos maiores a partir dos já construídos, começando
pelos itens lexicais.
Podemos imaginar a primeira operação como essencialmente uma lista de itens lexicais.
Em termos tradicionais, essa lista, chamada léxico, é a lista das “exceções”, associações
arbitrárias de som e significado e escolhas específicas entre as propriedades
morfológicas tornadas disponíveis pela faculdade de linguagem. Os traços flexionais
(plural/singular, nominativo/acusativo, tempo/aspecto) acabam desempenhando um
papel central na computação.

Na projeção intermediária o núcleo pode estar relacionado com complementos (Compl) e na projeção
máxima pode estar relacionado com um especificador (Spec). Com um Compl e o Spec o esquema X-
barra será uma árvore como:

O esquema X-barra capta uma propriedade importante dos sintagmas que é o fato de eles serem
endocêntricos (voltado para o centro ou que está no centro). Isto significa que uma categoria XP só pode
ter como núcleo uma categoria mínima X: as propriedades do núcleo são preservadas em cada projeção.
Observe que a endocentricidade não é uma propriedade necessária dos constituintes formados pela
morfologia. Tome, por exemplo, o processo morfológico da composição que põe juntas duas ocorrências
de um mesmo elemento com propriedades verbais como corre, para produzir corre-corre, um constituinte
que perdeu as propriedades verbais e ganhou propriedades nominais.
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A concepção do modelo P&P será radicalmente revista, dando origem ao Programa Minimalista (PM),
mantendo-se, não obstante, a ideia de que a aquisição da língua se faz com a fixação de parâmetros de
variação. Agora, diferentemente do modelo anterior, os parâmetros de variação ficam restritos ao léxico e
a derivação linguística subordinada a princípios que transcendem o domínio da língua – o de Economia
e o da Interpretabilidade Plena (PIP) nas interfaces da língua com sistemas cognitivos.
No PM, a Faculdade da Linguagem (FL) interage com sistemas de performance, satisfazendo condições
gerais externas impostas por eles.
Na visão minimalista, a FL tem dois componentes: um sistema cognitivo e dois sistemas de
performance: o articulatório-perceptual (A-P) e o conceitual-intencional (C-I). O sistema cognitivo da
FL é formado pelo léxico e por um componente computacional (CHL –  Computation in Human
Language). O léxico especifica os itens que entram no sistema computacional, e especifica suas
propriedades idiossincráticas. O CHL organiza esses itens de forma a conseguir um par (π – pi, λ –
lambda), onde π é um objeto da Forma Fonética (PF), e λ um objeto da Forma Lógica (LF). Aos objetos
de PF e LF se aplica um princípio de economia representacional, o Princípio da Interpretação Plena (Full
Interpretation), que pede que apenas os traços legíveis pelos sistemas interpretativos relevantes estejam
presentes em PF e LF. Se isso ocorrer nesses dois níveis de representação, a estrutura é bem formada, ou
seja, ela converge (converge) em PF e LF, respectivamente. Se π ou λ não satisfizeram a Interpretação
Plena, a derivação fracassa (crash). Uma derivação só converge se convergir em ambas PF e LF.
Os dois sistemas de performance interagem com a Faculdade de linguagem através de dois níveis de
representação, a PF e a LF, impondo condições sobre ela (bare output conditions). As condições são
condições gerais de economia, simplicidade, simetria, não redundância, etc., que fazem da linguagem um
sistema perfeito, otimizado, diferente, portanto, dos demais sistemas naturais.
O sistema computacional trabalha com duas operações básicas: Compor (Merge) e Mover (Move).
Compor combina os itens lexicais que entram no sistema computacional. Mover alça itens lexicais e/ou
traços para checagem de suas propriedades. A aplicação de ambas essas operações forma expressões
linguísticas Σ (sigma).
Dentro do sistema computacional há dois subsistemas. Um é o componente fonológico, que mapeia Σ
para o nível representacional da Forma Fonética, obtendo-se π. O outro é o componente não-visível, ou
encoberto (covert component) que mapeia o resíduo de Σ, Σ’, até a Forma Lógica, obtendo-se λ. A
operação responsável pela bifurcação das derivações, possibilitando seu envio para PF e LF, é chamada
Uma configuração geral ótima não introduziria novos traços no curso da computação.
Não haveria unidades sintagmáticas, nem níveis de barras, e por isso nem regras de
estrutura sintagmática nem teoria X-barra; e tampouco índices, e por isso nem teoria da
ligação usando índices. Nenhuma relação estrutural é invocada, além das forçadas pelas
condições de legibilidade ou induzidas, de algum modo natural, pela própria
computação. Na primeira categoria, temos propriedades, tais como a adjacência no
plano fonético, e, no nível semântico, a estrutura argumental e as relações quantificador-
variável. Na segunda categoria, temos relações elementares entre dois objetos sintáticos
montados juntos no curso da computação: a relação que vigora entre um desses e as
partes do outro; em essência, a relação de c-comando. De forma semelhante, podemos

de Spell-Out (decifrar). Spell-Out pode ser assim considerado como um momento da derivação em que a
uniformidade do objeto sintático é afetada. A assunção é que Spell-Out pode se aplicar em qualquer ponto
da derivação; a escolha errada faz a derivação ser cancelada em um dos níveis de interface. A computação
de Spell-Out a PF é chamada de componente fonológico, a computação anterior a Spell-Out é chamada de
componente visível (overt component), e a computação de Spell-Out a LF, de componente não-visível.
O processo de derivação linguística em PM parte de um conjunto de itens lexicais (Numeração).
A numeração nasceu da necessidade de se ter um ponto de partida para a derivação. Em GB, esse ponto
era a estrutura-D, mas como esse nível de representação não se justifica em uma abordagem minimalista
da linguagem, era preciso encontrar um meio de fazer com que se tivesse uma lista de itens lexicais
(lexical array) destituída de propriedades substantivas, para que ela não se constituísse em um novo nível
de representação. A numeração (N) é essa lista.
A numeração é formada com itens lexicais (lexical items, LI) tirados do léxico. Ela é, portanto, um
conjunto de pares (LI, i), em que LI é um item extraído aleatoriamente do léxico, e i é o seu índice, o qual
indica o número de vezes que o LI é acessado pela operação Selecionar (Select), uma operação do sistema
computacional, que dá início ao processo de derivação de uma estrutura. O processo de formação da
numeração é regido pela Faculdade da Linguagem, e exige uma escolha de traços e índices para cada item
lexical. Assim, dada uma numeração, aplica-se a operação Selecionar sobre um item lexical, reduzindo
seu índice em um a cada aplicação, deixando-o disponível para as outras operações do sistema
computacional. Selecionar se aplica a todos os itens lexicais e categorias funcionais de uma Numeração,
até que seus índices cheguem a zero. Para exemplificarmos o que foi dito, tomemos a seguinte
numeração: N = {C1, T1, João1, beijou1, v1, Maria1}. Selecionar seleciona Maria, por exemplo, e reduz seu
índice em um, resultando na numeração N= {C1, T1, João1, beijou1, v1, Maria0}.
Uma vez selecionados (operação Select – selecionar) para a computação linguística, os elementos são
combinados, por meio da operação Merge (Fundir/ Compor), e formam um objeto sintático
hierarquicamente superior aos itens lexicais. Uma outra operação disponível denomina-se Agree
(concordar, combinar), cujo processo remete ao princípio da Interpretação Plena. Essa operação consiste
no pareamento de traços interpretáveis e não interpretáveis em determinadas configurações sintáticas,
com a consequente eliminação desses últimos. Após a eliminação de traços não interpretáveis realiza-se a
operação de Spell-out (decifrar).
Spell-Out retira da derivação somente os elementos relevantes para o componente fonológico (π) e a
derivação é em seguida mapeada à LF (λ). Mais especificamente, a derivação é filtrada pelo componente
Morfologia, onde regras morfofonológicas a reajustam de acordo com as exigências do sistema
articulatório-perceptual do ser humano, e mapeado finalmente à PF, pelo componente fonológico. O
resíduo da derivação é projetado na LF pelo componente não-visível. O mapeamento da Numeração à λ
está sujeito a duas condições: a Condição de Uniformidade (Uniformity Condition) e a Condição de
Inclusividade (Inclusiveness Condition). A Condição de Uniformidade diz que as operações que
acontecem na sintaxe visível também ocorrem no componente encoberto, e a Condição de Inclusividade
requer que λ seja construído apenas com os traços dos itens lexicais da numeração. Vemos então que as
computações do sistema fonológico têm natureza diferente das do componente encoberto, pois ao
primeiro podem ser acrescentadas informações que não estavam presentes na numeração, como a
entonação, por exemplo. Nesse sentido, as computações do componente fonológico se afastam da
optimalidade (optimality).
A derivação linguística inclui ainda a operação Move (mexer, mover) que deve ser entendida como cópia
de elementos (categorias e/ou traços). Em outras palavras, Move é uma operação que, ao se aplicar a um
determinado elemento, gera uma cópia desse elemento formando uma cadeia de termos idênticos, embora
sejam sintaticamente distintos pela posição que ocupam na estrutura. A operação Move permite que um
dos elementos da cadeia seja realizado foneticamente, enquanto sua cópia será apagada no componente
usar relações muito locais entre traços; as mais locais, daí as melhores, são as que são
internas a unidades do tipo da palavra, construídas a partir de itens lexicais. Mas
excluímos regência e regência apropriada23, relações de ligação interna à derivação de
expressões e uma variedade de outras relações e interações.
Em toda parte há ampla evidência empírica para apoiar a conclusão oposta. Pior ainda,
um pressuposto nuclear do trabalho dentro do arcabouço de Princípios-e-Parâmetros e
de suas bem impressionantes realizações é que tudo que acabei de propor é falso – que a
linguagem é altamente “imperfeita” nesses aspectos, como se poderia esperar. No
entanto, penso que a pesquisa dos últimos anos sugere que essas conclusões, que
pareciam despropositadas uns poucos anos atrás, são pelo menos plausíveis, e bem
possivelmente corretas.
fonológico. Move é, portanto, uma combinação de Agree e Merge, o que implica em maior complexidade,
devendo ser acionada apenas quando necessária.
Resumindo, a partir da Numeração, o sistema computacional bifurca a derivação e constrói pares (π, λ),
objetos dos níveis de representação PF e LF, respectivamente, os quais devem ser interpretados nas
interfaces como instruções para os sistemas de performance A-P e C-I. Se os pares forem interpretados,
estarão satisfazendo à Condição de Interpretação Plena, e a expressão converge. Se não forem
interpretados, a expressão fracassa.
Além de precisar convergir, uma expressão também precisa ser otimizada. Uma expressão otimizada
observa condições de economia inerentes ao sistema computacional. Assim, dentre o conjunto das
derivações que convergem, são as condições de economia que selecionam as ótimas, sendo as outras
canceladas. As expressões linguísticas portanto podem ser impedidas de se formar por duas razões
diversas: ou por fracassarem, nos níveis de representação, ou por cancelamento, durante o processo de
derivação.
O PM tem favorecido a aproximação entre a linguística e a psicolinguística. Um dos focos da
Psicolinguística é a aquisição da linguagem. Nesse âmbito, esse campo de estudo tem como objetivo gerar
um modelo procedimental que seja capaz de explicar como a criança extrai informação linguística
relevante da fala, com a qual está em contato, e a partir dessa informação identifica uma língua. Para
atingir esse objetivo, a Psicolinguística deve articular-se com uma teoria linguística e a proposta do PM
vem favorecer essa articulação.
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De acordo com o PIP, a interpretabilidade caracteriza-se como uma propriedade da interface semântica
do sistema da língua com sistemas de desempenho. Traços do léxico podem ser interpretáveis ou não. O
léxico é composto por traços semânticos (interpretados na interface semântica), traços fonéticos
(interpretados na interface fonética) e traços formais. Os traços formais incluem os chamados traços phi
(ou fi – φ = gênero, número e pessoa), assim como, Caso. Os traços formais podem ser [+/–
interpretáveis]. Os traços formais [+ interpretáveis] já entram na derivação com seu valor especificado.
Os traços formais [– interpretáveis] entram na derivação sem valor e serão valorados por meio da
operação Agree, o que se convencionou denominar concordância sintática. No contexto do modelo P&P,
o Caso abstrato permite a associação entre os sintagmas de uma sentença e os seus papéis temáticos. Ou
seja, um sintagma nominal marcado por nominativo pode ser o agente, o marcado por acusativo pode ser
o tema e o marcado por oblíquo pode ser a fonte. Esses são os três Casos do português. Na sentença
“João viu a Maria no cinema” podemos observar a marcação desses Casos. João recebe nominativo do
núcleo funcional I (de Inflection, ou flexão verbal). A Maria recebe acusativo do verbo ver. E o cinema
recebe oblíquo da preposição em. Na versão atual do modelo, Caso é consequência da concordância entre
os traços não interpretáveis de categorias funcionais com os traços interpretáveis de DPs (sintagmas
determinantes) em que o núcleo funcional D (determinante) tem como complemento um NP (sintagma
nominal). Nesse contexto, o núcleo funcional Agr (Agreement = acordo, concordância) é eliminado e é da
concordância dos traços da categoria funcional T (tempo) com os traços de um DP que decorre a
atribuição de Caso nominativo.
O critério metodológico geral de Economia exige que as derivações linguísticas envolvam o mínimo de
operações possível. Dessa forma, vários princípios do modelo P&P são reformulados no contexto do PM
como expressões do princípio geral de Economia.
No modelo P&P não havia uma caracterização precisa dos princípios e parâmetros. O PM restringe os
princípios ao de Economia e ao de Interpretabilidade Plena. A função da criança na aquisição de uma
língua em PM é, a mesma que em P&P, fixar o valor dos parâmetros a partir do material linguístico de
que dispõe. Em PM, no entanto, os parâmetros estão restritos ao léxico.
As línguas claramente diferem entre si, e queremos saber como. Um aspecto é a escolha
de sons, que variam dentro de uma certa gama. Outro é a associação de som e
significado, essencialmente arbitrária. Mais interessante é o fato de que as línguas
diferem nos sistemas flexionais: sistemas de caso, por exemplo. Vemos que esses são
bastante ricos em latim, mais ainda no sânscrito, mas mínimos no inglês e invisíveis no
chinês. Pesquisa recente indica que esses sistemas variam muito menos do que as
formas superficiais sugerem. O chinês e o inglês, por exemplo, podem ter o mesmo
sistema de caso que o latim, mas uma realização fonética diferente, embora os efeitos se
manifestem de outras maneiras24. Além do mais, parece que grande parte da variedade

A simplificação do PM em relação ao modelo P&P pode ser observada também na eliminação dos níveis
de representação Estrutura-D e Estrutura-S. Isto ocorre pois esses níveis não estabelecem interface com os
sistemas de performance sendo, assim, considerados conceitualmente desnecessários. A partir dessa
mudança, as expressões linguísticas geradas pelo sistema computacional apresentam-se como um par,
constituído pelos níveis de interface PF (forma fonética) e LF (forma lógica), que se tornam acessíveis
aos sistemas de performance. O nível de representação da forma fonética (PF) estabelece interface com o
sistema de performance articulatório-perceptual (A-P) e o nível de representação da forma lógica (LF)
com o sistema de performance conceitual-intencional (C-I). Dessa forma, a Faculdade da Linguagem
interage diretamente com sistemas externos e satisfaz a condições impostas por esses sistemas, seguindo o
Princípio da Interpretabilidade Plena.
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Os elementos do léxico podem ser classificados em categorias lexicais e funcionais. Segundo Chomsky,
as categorias lexicais, verbo (V), nome (N), adjetivo (A) e preposição (P), devem ser vistas como o
produto de uma combinação de traços binários distintivos. Ou seja, os traços categoriais [+/-N] e [+/-V]
podem distinguir as quatro categorias lexicais relacionadas acima. Dessa forma, as categorias lexicais
podem ser assim agrupadas: Nome [+N,-V], Verbo [-N,+V], Adjetivo [+N,+V], e Preposição [-N,-V].
Cada uma das categorias lexicais é o núcleo de uma categoria hierarquicamente superior na estrutura das
frases. Isto é, a categoria N é a categoria lexical central da categoria hierarquicamente superior sintagma
nominal (NP – noun phrase). Assim tem-se sintagma verbal (VP), sintagma adjetival (AP) e sintagma
preposicional (PP). Essas categorias superiores são denominadas Categorias Sintagmáticas. As
categorias funcionais apresentam função eminentemente gramatical. Essas categorias caracterizam-se por
gerar posições estruturais importantes para o comportamento sintático de categorias lexicais e delimitar os
domínios nominal, verbal e oracional com suas categorias D (determinante), I (flexão) e C
(complementizador). D tem como complemento um NP; I caracteriza-se como uma categoria funcional e
encabeça o sintagma flexional (IP – Inflexional Phrase). Em muitas línguas a flexão verbal é composta de
flexão de modo, tempo, número e pessoa, sendo que IP engloba todas essas flexões; C introduz orações
subordinadas (que, se) e está fora de IP, é considerado o núcleo de uma categoria CP.
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De acordo com a teoria linguística, a gramática gerativa de uma língua é vista como modelo formal da
competência linguística do falante/ouvinte da língua. Como a competência linguística é o conhecimento
de uma língua particular pelo falante/ouvinte, a gramática gerativa pode ser vista como um conhecimento
inconsciente, que não é aprendido nas escolas. Segundo a gramática gerativa, os termos da oração têm
suas funções definidas a partir das posições estruturais que ocupam na frase. Isto é, as categorias
gramaticais NP, VP, PP, entre outras, têm suas funções gramaticais definidas em termos da categoria que
as domina.
Em um modelo formal de gramática, o conceito de estrutura argumental representa a estreita relação
entre sintaxe e semântica lexical. Na teoria linguística, inicialmente, esse conceito refere-se ao de
subcategorização que foi incorporado com o objetivo de descrever os contextos sintáticos em que
elementos de uma dada categoria lexical são passíveis de ocorrer devido às exigências fixadas por seu
significado. Em período posterior, a representação lexical das categorias lexicais incorpora informação
relativa às suas exigências semânticas que estão em seus argumentos.
De acordo com o Modelo P&P, no processo de estruturação das orações, o núcleo lexical (nome, verbo,
adjetivo e preposição), ou predicador (diz-se de palavra que atribui propriedades ou qualidades ao
argumento a que se refere), seleciona outros itens, os argumentos, para formar a oração. Os argumentos
podem assumir papéis ou desempenhar funções (de natureza semântica, também denominados papéis
temáticos – θ, teta – na teoria gerativa) que podem variar de acordo com a relação que estabelecem com o
predicador. Essa relação possibilita a explicitação dos papéis temáticos pelo componente sintático da
das línguas pode ser reduzida a propriedades dos sistemas flexionais. Se isso está
correto, então a variação entre as línguas se localiza numa parte reduzida do léxico.
Os traços flexionais diferem dos que constituem os itens lexicais. Considere-se qualquer
palavra, digamos, o verbo “ver”. Suas propriedades fonéticas e semânticas são
intrínsecas a ele, como o é a sua categoria lexical de verbo. Mas ele pode aparecer com
flexão singular ou plural. Tipicamente, um verbo tem um valor ao longo de sua
dimensão flexional, mas isso não é parte de sua natureza intrínseca. Podemos adotar
uma idealização que distingue nitidamente entre itens lexicais substantivos como “ver”
e “casa” e os traços flexionais que se associam a eles, mas não são parte de sua natureza
intrínseca.
língua.
No nível da oração o predicador mais importante é o verbo e esse pode apresentar 0, 1, 2 ou 3
argumentos. Teoricamente não existe um número limite de argumentos mas, provavelmente, não existem
predicadores com mais de quatro ou cinco argumentos. O verbo atirar admite quatro argumentos: O
menino atirou a chave da janela para a rua.
A noção de papel temático foi incorporada à gramática gerativa no P&P. No Modelo Padrão, as questões
que remetem à teoria temática eram vistas como subcategorizações. A subcategorização correspondia à
noção de restrição de seleção. De acordo com essa noção, o verbo comer, por exemplo, impõe a seleção
de [animado] ao seu sujeito e de [comestível] ao seu objeto. A partir do Modelo P&P, a noção de restrição
de seleção passa a expressar-se através da atribuição de papéis temáticos que determina apenas que o
elemento que ocupa a posição de sujeito deve ser o agente e o elemento que ocupa a posição de objeto o
tema, em grande parte dos verbos, o que diminui em muito as restrições impostas pela língua.
Nas sentenças abaixo, essa relação (dos argumentos com o predicador) é exemplificada ao se considerar
um verbo como predicador:
1- a. O médico cuidou do menino. / b. O menino cuidou do médico. / c. O menino teme o médico.
Nas sentenças 1-a e 1-b os DPs o médico e o menino ocupam posições diferentes nas orações e
desempenham papéis θ distintos. O DP o menino ocupa a posição de complemento de preposição em 1-a
e a posição de sujeito em 1-b, exercendo os papéis θ de paciente e de agente, respectivamente. Já em 1-c,
o médico, complemento do verbo, tem o papel de tema e o menino, como sujeito, exerce o papel de
experenciador.
A categoria lexical NP (sintagma nominal), com núcleo N (nome) passou a ser caracterizada como DP
(sintagma determinante) para atender a questões relativas ao paralelismo formal entre uma estrutura
nominal (DP) e uma estrutura verbal (IP).
As informações referentes às diferentes funções semânticas, ou papéis θ, satisfazem ao que a teoria
linguística caracteriza formalmente como s-seleção (seleção semântica). Um predicador atribui um papel
θ a cada um dos seus argumentos. Jackendoff propõe uma organização hierárquica dos papéis θ que
inclui: Agente, Locativo, Fonte, Meta (os três últimos no mesmo nível hierárquico) e Tema ou Paciente.
Nas orações abaixo, são expostas essas funções θ.
2- a. Os ladrões atacaram o supermercado. (Agente)
b. A criança ficou em casa. (Locativo)
c. Os alunos foram à escola. (Meta)
d. A Ana veio de Brasília. (Fonte)
e. O Luís tirou o livro da estante. (Tema)
Além da s-seleção, cada verbo determina a categoria gramatical dos constituintes com os quais pode ou
não ocorrer no interior do VP. Esse processo de seleção denomina-se c-seleção (seleção categorial) ou
subcategorização.
Segundo Williams, o verbo possui um argumento externo e argumentos internos. O argumento externo é
assim denominado pois se realiza fora da projeção máxima VP do verbo, ou seja, na posição de sujeito da
oração. Dessa forma, como só existe uma posição de sujeito fora do VP, os verbos só podem selecionar
um argumento externo. Já os argumentos internos são realizados dentro da projeção VP do verbo. Os
argumentos internos são subcategorizados e selecionados semanticamente. O argumento externo é apenas
selecionado semanticamente. Isto ocorre porque os verbos não escolhem a presença ou ausência de um
DP sujeito, pois este é obrigatório. Cada verbo escolhe apenas a função θ que se realiza na posição de
sujeito.
Nas orações abaixo (3-a, 3-b, 3-c, 4-a, 4-b, 4-c) é possível observar como se processa a c-seleção nos
verbos arrumar e pôr. Esses verbos possuem significado e comportamento sintático semelhante, mas com
algumas particularidades. Ambos os verbos ocorrem, obrigatoriamente, num VP com um objeto direto. O
As condições de legibilidade impõem uma divisão tripartite entre os traços montados
como itens lexicais: (1) traços semânticos, interpretados na interface semântica, (2)
traços fonéticos, interpretados na interface fonética, (3) traços que não são interpretados
em nenhuma das duas interfaces.
Pressupomos que os traços fonéticos e semânticos são interpretáveis uniformemente em
todas as línguas: os sistemas externos situados na interface são invariantes.
Os traços se subdividem em “traços formais”, que são usados pelas operações
computacionais que constroem a derivação de uma expressão, e outros que não são
acessados diretamente, mas somente “carregados juntos”.

verbo pôr ocorre, obrigatoriamente, num VP com um constituinte de categoria PP. O verbo arrumar, no
entanto, admite, mas não exige, tal constituinte. A entrada lexical do verbo pôr deve especificar que esse
item ocorre, obrigatoriamente, com um DP e com um PP.
3- a. Luís pôs a comida na mesa. / b.* O Luís pôs a comida. / c.* O Luís pôs.
A entrada lexical do verbo arrumar deve especificar que este ocorre, obrigatoriamente, com um DP e,
opcionalmente, com um PP.
4- a. Ana arrumou a colcha na cama. / b. Ana arrumou a colcha. / c.* Ana arrumou.
A associação das informações relativas à s-seleção e à c-seleção é denominada estrutura argumental. As
sentenças abaixo exemplificam como se processa essa associação.
5- a. O João comeu a maçã. / b.* O livro comeu a maçã. / c.* O João comeu que a maçã caiu.
A oração 5-b é anômala, pois o predicador comer exige que seu argumento externo seja um DP com
traços semânticos [+ animado], o que não ocorre com o livro. Essa s-seleção é executada pelo predicador
para a posição de argumento externo. Mas o predicador ainda s-seleciona e c-seleciona seus argumentos
internos. O predicador atribui (s-seleciona) ao argumento interno o papel θ de tema e este deve se referir a
algo comestível. O predicador determina (c-seleciona), ainda, que o argumento interno possa ser um PP
ou DP, mas não “admite” que este seja um CP, o que torna 5-c anômala.
Este conjunto de observações sobre posições de atribuição temática nos permite distinguir entre posições
temáticas (θ) e não temáticas (não-θ). Para efeitos da marcação θ por um núcleo lexical, as posições
não-θ são as que não são selecionadas por ele. Lembremos que a marcação θ pode se realizar somente no
âmbito da projeção máxima XP do núcleo X atribuidor de papel θ.
Além de posições θ e não-θ, outra distinção pode ser estabelecida: entre posições argumentais – posições
A – e posições não argumentais – posições A-barra. As primeiras se caracterizam por serem
identificadas com uma função gramatical – sujeito, objeto direto, objeto indireto –, o que não ocorre com
as últimas.
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Um dos princípios mais importantes do modelo P&P, diretamente relevante para caracterização da
estrutura argumental, é o Princípio de Projeção. Esse princípio estabelece que a estrutura-D é projetada
do léxico, ou seja, observa as propriedades temáticas e de subcategorização dos itens lexicais. O Princípio
de Projeção determina ainda que só argumentos selecionados por um núcleo lexical podem ser projetados
na sintaxe. Essa questão cria um impasse em línguas como o inglês e o francês que apresentam sentenças
como 6-b em que o pronome it é expletivo, ou seja, não é selecionado por um núcleo lexical. O Princípio
de Projeção Estendido foi, então, formulado para resolver essa questão. Segundo esse princípio, as
estruturas sintáticas são a projeção da estrutura temática e de subcategorizações dos predicadores e a
posição de sujeito é obrigatória.
Para se compreender a exigência da obrigatoriedade de sujeito, a realização desse argumento será
exemplificada em português e inglês. Em português é aceitável oração sem sujeito (6-a) e em inglês não.
Dessa forma, a realização fonética do sujeito it em 6-b é obrigatória, o que implica dizer que a posição de
sujeito existe independentemente da seleção de um argumento externo pelos verbos.
6- a. Chove. / b. It rains. / c.* Rains.
De acordo com o Princípio de Projeção Estendido, em português, a posição de sujeito contém um
pronome “nulo” (pro = categoria vazia) que é uma forma pronominal com traço de pessoa e número que
não possui matriz fonológica, o que justifica a obrigatoriedade da posição de sujeito. Para o parâmetro são
considerados dois valores: o inglês apresenta o valor negativo do parâmetro (não apresenta sujeito nulo) e
o português o valor positivo (apresenta sujeito nulo). Para certas línguas como o Inglês, este sujeito tem
que ser pronunciado sempre; para outras como o português nem sempre o sujeito é pronunciado.
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Um pressuposto clássico e compartilhado, que parece correto e fundamentado, é que os
traços fonéticos não são nem semânticos nem formais: eles não recebem nenhuma
interpretação na interface semântica e não são acessados pelas operações
computacionais. Podemos imaginar os traços fonéticos como sendo despidos e retirados
(stripped away) da derivação por uma operação que se aplica ao objeto sintático já
formado. Essa operação ativa o componente fonológico da gramática, que converte o
objeto sintático em uma forma fonética. Com os traços fonéticos despidos e retirados, a
derivação continua, mas usando o resíduo despido deixado dentro, desprovido de traços
fonéticos, e que é convertido em representação semântica. Um princípio natural da
configuração geral ótima é que as operações podem se aplicar em qualquer lugar,

Chomsky afirma que as “propriedades das categorias vazias (ou ec – empty category) dificilmente podem
ser determinadas indutivamente a partir de fenômenos visíveis observados, e portanto refletem
presumivelmente recursos internos da mente”.
A presença de PRO em nossa língua é mais restrita do que em outras línguas porque temos o infinitivo
pessoal. Este autoriza, na posição sujeito da oração infinitiva, pro.
No português brasileiro (PB), assim como nas outras línguas de sujeito nulo, temos uma ec na posição
sujeito de orações infinitivas que se chama PRO:
7- João quer PRO sair.
Este mesmo tipo de ec também é encontrada, no mesmo contexto, nas línguas que não admitem sujeito
nulo, como o inglês, o alemão e o francês:
8- I tried PRO to go – (Eu tentei PRO partir).
Esta ec apresenta propriedades diferentes daquelas da ec que ocorre na posição sujeito das orações finitas,
chamada de pro: “Chove”. Enquanto PRO ocorre em todas as línguas, pro é parametrizado; apenas
línguas como as do primeiro grupo toleram esta última categoria vazia.
As orações infinitivas em 7 e 8 apresentam algo em comum: a impossibilidade de um DP lexical na
posição sujeito:
9- a.* João quer Maria sair. / b.* I tried Mary to go.
As orações em (9) são agramaticais devido à presença do DP em negrito. A presença de um DP lexical
não é possível porque o verbo no infinitivo (sem flexão adequada) não o licencia.
Assim, o sujeito destas construções infinitivas não pode ter realização fonética. PRO é um elemento
foneticamente nulo conhecido como anáfora pronominal.
A ele são atribuídas as seguintes propriedades no modelo de GB clássico: (i) Não é regido; (ii) Não
recebe Caso; (iii) Possui papel temático independente do antecedente.
O PB possui dois infinitivos: o infinitivo e o infinitivo pessoal. Este último apresenta flexão número-
pessoal. Assim podemos ter:
10- a. É importante — assinarem o documento. / b. É importante eles assinarem o documento.
A posição sujeito vazia do infinitivo pessoal pode ser ocupada por um DP lexical. Mas não podemos ter o
correspondente em inglês, por exemplo:
11- * It is important they to sign the document.
O que podemos ter em tal posição é o elemento PRO, que pode ocorrer nesta posição, porque de acordo
com a teoria GB clássica, ela não é regida.
No PB, a presença da concordância licencia o DP lexical em 10-b. Se um DP lexical é licenciado numa tal
posição, temos de admitir que ele tem Caso e que, portanto, é regido. As propriedades desta posição são
incompatíveis com PRO; são, por outro lado, compatíveis com pro. A ec pro tem os traços [-anáfora,
+pronome] e apresenta as seguintes características: (i) é regida; (ii) recebe Caso; (iii) possui papel
temático independente.
A posição sujeito da oração infinitiva que não tem um DP lexical pode ter uma interpretação genérica,
quando não há um controlador. O elemento que ocupa esta posição é chamado PRO arbitrário:
12- PROarb Ir na praia é agradável.
Dizemos que em 12, na posição vazia, temos PRO arbitrário, já que esta ec pode ser interpretada em um
sentido genérico, referindo-se a “qualquer pessoa”. Entretanto, no PB, tal posição pode ser ocupada por
um DP lexical pelo fato de termos o infinitivo pessoal:
13- Eles irem na praia é agradável.
Assim, no PB, possivelmente não existe PRO arbitrário, uma vez que a presença de um sujeito lexical é
permitida, mostrando que tal posição é regida. O que podemos ter é pro arbitrário, dado que o infinitivo
pode ter morfema flexional realizado ou não, licenciando um Caso para ele.
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inclusive em lugar nenhum. Assim pressupondo, podemos fazer uma distinção entre as
operações abertas, que se aplicam antes de os traços fonéticos serem despidos e
retirados, e operações encobertas, que carregam o resíduo adiante, para a representação
semântica. Operações encobertas não têm efeito sobre o som de uma expressão,
somente sobre o que ela significa.
Outra propriedade da configuração geral ótima é que a computação, desde os itens
lexicais até a representação semântica, é uniforme: as mesmas operações, quer abertas
ou encobertas, devem se aplicar em toda parte.

Chomsky desenvolveu a Teoria da Ligação a fim de procurar regular como se dá a relação de


dependência entre sintagmas nominais (SNs). A teoria da ligação é a responsável por regular a
interpretação de expressões nominais definindo que expressões podem ou não receber referência de outra
entidade discursiva.
A teoria da ligação descreve algumas restrições de ligação das expressões nominais. Ao perceber a
existência dessas restrições Chomsky propõe que haja um conjunto de regras que permita ou não a
ligação de um SN com seu antecedente. Esse conjunto de regras é sistematizado pelos Princípios A, B e C
da Teoria da Ligação.
Não é bem o nome (ou o substantivo) que o pronome pode substituir, mas todo o DP. E é muito
surpreendente o fato de que elementos como se, mesmo “substituindo” nomes, não possam ser trocados
pelo nome correspondente em português, como vemos abaixo:
14- * A Anai viu a Anai no espelho.
Em sentenças como 15-b, o argumento externo e o argumento interno de ver terão necessariamente
índices diferentes, ao passo que eles portarão necessariamente o mesmo índice na sentença 15-c.
15- a. A Anai viu a Mariak. / b. A Anai ak viu. / c. A Anai sei viu no espelho.
Introduzindo a terminologia técnica, aos elementos como a ou ela chamaremos pronome e para
elementos como se reservaremos o termo anáfora. Mais: o que chamamos de anáfora também inclui a
expressão um P o outro (como um com o outro ou um no outro, onde P vale pela preposição), que têm
interpretação recíproca.
As anáforas, como se (e seu equivalente tônico si) ou expressões como um P o outro, não podem jamais
aparecer sem que o elemento com o qual se identificam referencialmente também esteja presente.
Chamaremos antecedente a este elemento.
16-b e 16-d são agramaticais porque a anáfora não tem antecedente: os únicos DPs presentes na
construção não portam o mesmo índice da anáfora. Portanto, concluímos que as anáforas são
referencialmente dependentes.
16- a. A Mariai sei adora. / b.* A Mariai sek adora.
c. Os meninosi atiraram [um no outro]i / d.* Os meninosi atiraram [um no outro]k
Todavia, exigir simplesmente a presença do antecedente não é formulação completa da restrição que pesa
sobre as anáforas, porque 17-b é agramatical:
17- a. [A mãe do Pedro]i sei adora. / b.* A mãe d[o Pedro]i sei adora.
Precisamos de uma noção que dê conta das relações hierárquicas entre os constituintes. Mais adequado é
lançar mão da noção de c-comando: só um DP que c-comande a anáfora pode ser seu antecedente.
À combinação de fatores – ser c-comandado por um elemento que porta o mesmo índice referencial na
representação da sentença em árvore – chamamos vinculação. Assim dizemos que as anáforas têm que
ser vinculadas.
O contraste de gramaticalidade em 18 diz que o antecedente deve estar “bastante próximo” da anáfora:
18- a.[O João e o Pedro]i disseram que os meninosk atiraram [um no outro]k
b. *[O João e o Pedro]i disseram que os meninosk atiraram [um no outro]i
Nas sentenças acima o requisito da vinculação é cumprido. Aparentemente, “bastante próximo” quer dizer
que o antecedente deve estar presente na mesma sentença finita em que se encontra a anáfora Este seria
então o seu domínio de vinculação.
Em 19-a estamos frente a uma sentença encaixada infinitiva, no contexto de ECM (do inglês Exceptional
Case Marking – marcação excepcional de caso): se é na verdade o argumento de desfilar e não argumento
de ver. O se deve se mover para o I onde se encontra o verbo matriz porque é um clítico. A anáfora não
encontra o seu antecedente dentro da sentença infinitiva, mas na sentença matriz. Note, contudo, que não
é qualquer sentença infinitiva que permite a vinculação de uma anáfora fora de sua projeção. A tentativa
de vinculação da anáfora ao sujeito matriz, em 19-b, não dá bom resultado.
Pressupomos, então, que, numa língua dada, montam-se itens lexicais com traços, e
então as operações computacionais, fixas e invariantes, constroem representações
semânticas a partir daqueles de maneira uniforme. Em algum ponto da derivação, o
componente fonológico acessa a derivação, despindo e retirando os traços fonéticos e
convertendo o objeto sintático em forma fonética, enquanto o resíduo prossegue para a
representação semântica por operações encobertas. Também pressupomos que os traços
formais são flexionais, não-substantivos, de modo que não somente os traços fonéticos
mas também os traços semânticos substantivos são inacessíveis à computação. As
operações computacionais são, portanto, muito restritas e elementares, e a aparente
complexidade e variedade das línguas deveria reduzir-se, essencialmente, às
propriedades flexionais.

19- a. A Mariai sei viu desfilar na televisão.


b.* Os meninosi ouviram [o João e o Pedro sei elogiarem].
O DP o João e o Pedro é o argumento externo do verbo elogiarem e é ele que ocupa a posição sujeito da
infinitiva encaixada.
Se há um sujeito independente dentro do domínio onde está a anáfora, é aí que ela deve ser vinculada,
como está representado em 20-a; tentar vinculá-la fora dos colchetes, quando existe um sujeito dentro dos
colchetes, produz resultado agramatical (20-b). Se, por outro lado, é a própria anáfora que é o sujeito
dessa sentença, a anáfora pode procurar seu antecedente na sentença mais alta, como em 20-c.
20 – a. A Ana acha [a Mariai orgulhosa de sii].
b.* A Anai acha [a Maria orgulhosa de sii].
c. O Joãoi acha-[sei inteligente].
O que estamos chamando de pronome em nossa teoria é aquilo que a Gramática Tradicional chama de
“pronomes pessoais”, exceto os reflexivos e os recíprocos, que aqui recebem o nome de anáfora.
O pronome ela pode se referir a qualquer DP do gênero feminino, como mostra o índice k em 21-a, menos
ao DP a Maria, como mostra o índice i em 21-b. Pronomes não podem encontrar seu antecedente num
domínio muito estrito, devendo ser contra-indexados aos DPs que pertencem a este domínio.
21- a. A Mariai adora elak / b. *A Mariai adora elai
Assim, contrariamente às anáforas, os pronomes não necessitam de antecedentes mas, se os têm, eles não
podem estar ‘perto’ demais.
Em 22-a o antecedente c-comanda o pronome. Mas, se o pronome estiver co-indexado com um DP num
domínio muito estrito, o ideal é que ele não seja c-comandado por este DP, como atesta a gramaticalidade
de 22-b:
22- a. O namorado da Mariai pensa que o Pedro gosta delai
b. O namorado da Mariai gosta delai
Se reproduzirmos todos os contextos que examinamos ao tratar das anáforas, as sentenças com pronomes
fornecem sistematicamente resultados de gramaticalidade inversos aos fornecidos pelas anáforas.
Se as anáforas devem ser vinculadas em um certo domínio, os pronomes devem ser livres nesse mesmo
domínio de vinculação.
O terceiro tipo de DP, as chamadas expressões referenciais (expressões-R), são DPs que têm autonomia
referencial: nomes (próprios ou comuns). Como os pronomes, as expressões-R não necessitam de
antecedente.
Em 23 é mostrado que se não houver c-comando entre o antecedente e a expressão-R e, portanto, não
houver vinculação, a sentença é gramatical:
23- Quando elei foi preso, o Joãoi estava completamente bêbado.
Apesar de preceder a expressão-R o João, com a qual está co-indexado, ele não c-comanda o João já que
esta expressão não é irmão de ele, nem filho do irmão de ele. Se ele não c-comanda o João, então este não
é vinculado por aquele.
Diferentemente dos pronomes, as expressões-R não podem ser vinculadas nunca, em qualquer que seja o
domínio.
Chegamos assim ao ponto de apresentar os princípios da Teoria da Vinculação, que enunciam as
possibilidades que os DPs têm de serem co-referentes. São eles:
A = Uma anáfora tem que estar vinculada em seu domínio de vinculação (ou GC do inglês Governing
Category, isto é, o domínio de localidade no qual uma anáfora deve encontrar seu antecedente);
B = Um pronome tem que estar livre em seu domínio de vinculação (ou de regência), mas pode ser co-
indexado (usamos a co-indexação para indicar que dois elementos têm o mesmo referente) a um
elemento que esteja fora dele e não pode haver relação de c-comando entre os elementos vinculados;
Embora os traços semânticos substantivos não sejam formais, traços formais podem ser
semânticos, com um significado intrínseco. Tome-se a propriedade flexional de número.
Um nome ou um verbo pode ser ou singular ou plural. Para os nomes, o número
atribuído tem uma interpretação semântica: as sentenças “Ele vê o livro” e “Ele vê os
livros” têm significados diferentes. Para o verbo, entretanto, o número não tem
interpretação semântica; ele não acrescenta nada que já não esteja determinado pela
expressão na qual aparece, neste caso, seu sujeito gramatical “Ele”.
A importância da distinção entre traços formais interpretáveis e ininterpretáveis parece
ser central à configuração geral da linguagem.

C = Uma expressão-R tem que estar livre, ou seja, não pode estar vinculado a nenhum antecedente por
que tem referência própria.
“Estar vinculada” quer dizer ser c-comandada por um elemento que porte o mesmo índice referencial, ou
seja, é uma condição dupla, por assim dizer: o elemento deve ser c-comandado por algum DP e além
disso deve portar o mesmo índice que este DP. Portanto, para estar livre, basta que o elemento desrespeite
uma das condições.
O domínio de vinculação de α é o XP mínimo que contém α, o regente de α e (i) um sujeito que é distinto
de α e que não contém α; ou (ii) a flexão que atribui Caso Nominativo para α.
Esta definição com duas cláusulas disjuntivas – observe o “ou” – deve ser entendida da seguinte forma:
para estabelecer o domínio de vinculação de qualquer DP α, devemos buscar o primeiro XP que contenha
α, seu regente e um sujeito distinto de α; se o sujeito não é distinto de α, então devemos aplicar a cláusula
(ii) para ver se está presente um I capaz de atribuir Nominativo. Se a segunda cláusula também não é
satisfeita, devemos buscar o próximo XP e repetir o procedimento.
A linha (ii) resolve o problema das anáforas em posição de sujeito em sentenças finitas:
24- *[O João e o Pedro]i disseram que [um no outro]i atiraram.
Ora, se só tivéssemos a cláusula (i), a anáfora estaria autorizada a ir buscar na sentença matriz o seu
antecedente, posto que a sentença matriz conteria o XP mínimo em que há um sujeito distinto da anáfora
e que não a contém. Se isso fosse possível, 24 deveria ser gramatical, contrariamente aos fatos. Assim,
precisamos garantir que é dentro da própria sentença encaixada, uma sentença com flexão capaz de
atribuir Nominativo, que a anáfora deve buscar seu antecedente. Como a cláusula (i) não pode ser
satisfeita em 24, então a anáfora deve averiguar primeiro se a cláusula (ii) pode ser satisfeita antes de
poder ir buscar na sentença matriz o seu antecedente. E como este é um caso em que há flexão capaz de
atribuir Caso Nominativo para a anáfora, então é neste XP mínimo (a oração encaixada) que a anáfora
deve ser vinculada.
A Teoria da Vinculação, portanto, consegue explicar as possibilidades de correferência de anáforas, de
pronomes e de expressões-R. Podemos tentar derivá-los da combinação dos traços básicos [+/-
pronominal], decorrente do Princípio B, e [+/-anafórico], decorrente do Princípio A:
25- a. [+a, -p] = anáforas; / b. [-a, +p] = pronomes;
c. [-a, -p] = expressão-R; / d. [+a,+p] = *
Por que a combinação em 25-d é impossível? Note que, se um elemento é [+anafórico], ele deve respeitar
o Princípio A, isto é, deve ser vinculado no seu domínio de vinculação; por outro lado, se é
[+pronominal], ele deve respeitar o Princípio B, o que equivale a dizer que deve ser livre no seu domínio
de vinculação. Temos aqui uma contradição: um elemento deve ser vinculado e livre no mesmo domínio,
e por isso a nossa teoria nos faz prever que não existe um DP deste tipo. Ou, por outra, se um tal DP
existe, a teoria nos faz prever que ele não tem domínio de vinculação para não ter que atender
simultaneamente às duas exigências conflitantes em 25-d.
Em 26, temos sentenças gramaticais exibindo ou uma anáfora ou um pronome. Os PPs nos deixam
utilizar seja a anáfora, seja o pronome no mesmo contexto sintático: dada a ausência do sujeito dentro do
PP, a anáfora pode ir buscar o seu antecedente no VP (ou IP) que contém esse PP, e assim novamente o
nosso DP, aqui recebendo Caso Oblíquo, deve ter um domínio de vinculação.
26- a. O Joãoi comprou um carro para sii. / b. O Joãoi comprou um carro para elei.
c. O Joãoi falou de sii. / d. O Joãoi falou delei.
Portanto, se todo DP lexicalmente realizado deve ter Caso e se qualquer das configurações de atribuição
de Caso acaba por formar um domínio de vinculação, é fatal de todo DP com Caso tenha um domínio de
vinculação. E é inescapável a conclusão de que todos os DPs que têm um domínio de vinculação são
regidos.
Podemos, portanto, considerar uma exigência concernente à configuração geral ótima:
cada traço é ou semântico ou acessível ao componente fonológico, que pode usar (e
algumas vezes usa) o traço em questão para determinar a representação fonética. Em
especial, os traços formais são ou interpretáveis ou acessíveis ao componente
fonológico. Os traços de caso são ininterpretáveis, mas podem ter efeitos fonéticos,
embora não precisem, como no chinês e geralmente no inglês, ou mesmo às vezes em
línguas com flexão mais visível, como o latim. Pressupomos que essa condição vigore.
Ficamos ainda com uma imperfeição da configuração geral da linguagem: a existência
de traços formais ininterpretáveis, que agora pressupomos serem somente traços
flexionais.

O inventário de categorias vazias é paralelo ao inventário das categorias pronunciadas (ou plenas).
Assim, as subdivisões encontradas em uma categoria pronunciada refletem na ec correspondente.
Temos diferentes tipos de DPs não realizados foneticamente. Examinemos os exemplos em:
27- a. O Joãoi parece eci amar a Maria.
b. A Mariai disse que eci viajou.
c. Quemi que a Maria disse que o Pedro beijou eci na festa?
d. Eu quero ec comer camarão.
Assim, as ecs são postuladas em cada uma das sentenças de 27 porque a sua inexistência levaria à
violação de algum princípio da gramática.
As ecs que equivalem a DPs se deixam classificar à luz da Teoria da Vinculação. Em 27-a, temos uma
estrutura inacusativa, em que o DP o João se move da sua posição de base (de argumento externo do
verbo amar) para o Spec IP da sentença matriz a fim de obter Caso. Um DP realizado foneticamente
precisa receber Caso. Assim, não parece descabido identificar a ec resultante do movimento de DPs como
anáfora. Chamamos esta ec de vestígio (t, do inglês trace).
Por seu turno, a ec em 27-b leva todo o jeito de pronome. O pronome ela no lugar da ec forneceria os
mesmos resultados com respeito à gramaticalidade das estruturas. Então, parece razoável pensar que
temos a versão sem matriz fonética de um verdadeiro pronome, com propriedades de distribuição muito
semelhantes. Chamaremos esse elemento de pro (prozinho).
Na ec de 27-c: essa ec parece ter as propriedades de distribuição das expressões-R. Ela não pode ser uma
anáfora porque, se fosse, deveria estar vinculada a o Pedro, sujeito da sentença encaixada. Também não
pode ser um pronome porque, se fosse, deveria poder ser vinculada a a Maria, sujeito da sentença matriz.
Na verdade, a ec em 27-c só pode ser vinculada por quem. Note, entretanto, que está descartada a
possibilidade de uma expressão-R ser vinculada por quem. Será que, apesar disto, podemos afirmar que a
ec de 27-c e uma expressão-R têm propriedades semelhantes no que diz respeito à vinculação? A resposta
é positiva se observamos que quem se encontra numa posição A-barra e que os traços [pronominal] e
[anafórico] se aplicam somente quando os antecedentes estão em posição A, por força da noção de
Domínio de Vinculação. Estas observações, então, valem tanto para uma expressão-R quanto para uma ec
como a de 27-c. Portanto, podemos dizer que a ec de 27-c e uma expressão-R têm propriedades comuns
que derivam do fato de elas serem imunes aos princípios A e B. A ec presente em 27-c chamamos de
variável (vbl, do inglês variable) ou vestígio de WH (de what/ who).
Finalmente, observemos a ec de 27-d. O Critério θ nos obriga a postular uma ec antes de comer, já que o
verbo comer tem dois papéis θ para atribuir: um deles é atribuído ao argumento interno camarão e o outro
à ec na posição de argumento externo de comer. Ao considerarmos a interpretação referencial desta
categoria, vemos que ela só pode ser co-referencial com eu: isto é, por ser referencialmente dependente, a
ec de 27-d tem propriedades de anáfora. Entretanto, esta ec não pode ser totalmente identificada com o
vestígio de 27-a. Por isso, a ela é atribuído um nome diferente – PRO (prozão) – e à relação de co-
referência entre ele e o antecedente o nome de controle. Assim, o exemplo em 27-d ilustra um caso de
PRO obrigatoriamente controlado.
Para entender as diferenças entre t e PRO, vamos partir da comparação entre 27-a e 27-d para observar
que:
• t ocorre em uma estrutura em que o verbo matriz é inacusativo e PRO em uma em que o verbo matriz é
transitivo. A conseqüência imediata disso é que o sujeito de parecer em 27-a não é seu argumento
externo, enquanto o sujeito de querer o é;
• por não ser argumento de parecer, o antecedente de t não tem papel θ independente, enquanto o
antecedente de PRO o tem;
• se o sujeito de parecer não é seu argumento, então ele é argumento do verbo amar e foi movido para
Spec IP deixando um t na posição de origem; por outro lado, se o sujeito de querer é o argumento externo
Parece haver uma segunda e mais dramática imperfeição na configuração geral da
linguagem: a “propriedade de deslocamento”: os sintagmas são interpretados como se
estivessem em uma posição diferente na expressão, onde itens semelhantes algumas
vezes efetivamente aparecem e são interpretados em termos de relações locais naturais.
Seja a sentença Clinton seems to have been elected (“Clinton parece ter sido eleito”).
Compreendemos a relação de elect (“eleger”) e “Clinton” do mesmo modo que quando
estão relacionados localizadamente na sentença It seems that they elected Clinton
(Parece que eles elegeram Clinton): “Clinton” é o objeto direto de elect, em termos
tradicionais, embora “deslocado” para a posição de sujeito de seems (parece). O sujeito

dele, então o PRO não pode ser resultado de movimento.


Além dos contextos de controle obrigatório, existem outros em que a ec, que pode ser identificada como
PRO, não é obrigatoriamente controlada. Tal tipo de contexto se verifica em 28, por exemplo:
28 - Eu me pergunto como [ec enriquecer neste país]
Neste caso, dizemos que a interpretação é arbitrária, e a sentença pode ser grosseiramente parafraseada
por alguma coisa do tipo: eu me pergunto como qualquer um pode enriquecer neste país. Agora, estamos
frente a um fenômeno que se parece muito com o que se passa com os pronomes, já que a ec não tem
antecedente na sentença. Imediatamente, nos ocorre que a ec deveria ser um pro. Mas, assim como a ec
em 27-d não é um t, a de 28 também não se deixa analisar como um pro, já que, para dizer o mínimo, esta
ec não se deixa substituir por um pronome. Vemos, assim, que o contexto de infinitivo impessoal é
diferente daquele de flexão pessoal de 27-b que abriga um pro. Em suma, estamos diante de uma ec que
sintetiza um paradoxo: tem traços de anáfora, mas não é um t; tem traços de pronome, mas não é um pro.
Portanto, as quatro categorias vazias correspondentes às categorias plenas são:
29- a. [+a, -p] = vestígio de DP (t) / b. [-a,+p] = pro
c. [-a, -p] = vestígio de WH (vbl) / d. [+a, +p] = PRO
Os vestígios de DP são anáforas obedecendo ao Princípio A. Os vestígios de WH comportam-se como
expressão-R, obedecendo ao Princípio C. A ec pro é o elemento que encontramos na posição sujeito das
línguas de sujeito nulo. Esta categoria, tal como sua contraparte fonética, apresenta duas possibilidades:
os pronomes pessoais e os expletivos. A ec PRO caracteriza-se por uma combinação de propriedades
anafóricas e pronominais. Logo, PRO comporta-se ora como anáfora ora como pronome.
Chomsky argumenta que o fator crucial que determina a distribuição de PRO é a regência. Segundo a
Teoria de Ligação, PRO tem que ser ligado e livre simultaneamente em sua GC. Esta contradição pode
ser resolvida somente se PRO não tem GC. A solução para esta contradição é conhecida como o Teorema
(proposição que pode ser demonstrada por meio de um processo lógico) de PRO. Vejamos:
30- Jorge quer PRO vender o carro.
Para que PRO não tenha categoria de regência, ele não pode satisfazer uma destas condições: ter um
regente ou um sujeito acessível. O sujeito acessível é possível encontrarmos. Em 30, o sujeito acessível é
Jorge, que está em [Spec, IP] ou [+Agr]. Porém, em IP não encontramos o regente de PRO.
Os regentes potenciais seriam os verbos querer e vender; porém, eles não têm capacidade de reger PRO,
neste contexto. O verbo da oração matriz, querer, não rege PRO porque há CP que impede a regência. Na
oração encaixada, vender não apresenta [+Agr], elemento que pode reger a posição sujeito através do m-
comando. Portanto, IP não pode ser a GC de PRO, em 30, porque PRO não tem um regente.
Sob a hipótese de que a marcação Casual exige regência, conclui-se que PRO não é marcado por Caso.
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Todas as línguas têm que dar visibilidade aos DPs para que eles tenham sua interpretação θ garantida.
Todas as línguas são idênticas por disporem da categoria gramatical Caso. O que pode ser diferente de
uma língua para outra é a forma como esta categoria se expressa: em algumas, concretamente, por meio
de um paradigma mais ou menos rico de morfemas; em outras, mais abstratamente, por meio de recursos
tais como a ordem dos DPs em relação aos núcleos que os selecionaram.
Daí a noção de Caso abstrato, uma noção mais geral do que caso morfológico, e universal já que sua
existência é postulada para qualquer língua natural.
O português é uma língua em que os DPs, apesar de se submeterem à condição de visibilidade, não são
marcados morfologicamente por caso. Entretanto, resíduos de marcas casuais persistem no sistema dos
pronomes pessoais, como vemos em 31:
31- a. Eu vi a Maria.
b. A Maria me viu.
c. A Maria olhou para mim.
“Clinton” e o verbo seems concordam em traços flexionais neste caso, mas não têm
relação semântica; a relação semântica do sujeito é com o verbo distante elect.
Com o pressuposto da configuração geral ótima, podemos esperar que essas duas
imperfeições sejam reduzidas à mesma causa, e este parece ser o caso: traços formais
ininterpretáveis fornecem o mecanismo que implementa a propriedade de deslocamento.
Desde as origens da gramática gerativa, pressupôs-se que as operações computacionais
eram de dois tipos: regras sintagmáticas, que formam objetos sintáticos maiores a partir
dos itens lexicais, e regras transformacionais, que expressam a propriedade de
deslocamento. Mas logo se viu que as operações diferem substancialmente do que tinha

Independentemente de me ser um clítico, isto é, um elemento fonologicamente dependente do verbo, os


pronomes de primeira pessoa assumem formas diferentes como reflexos de Casos diferentes: eu é a forma
do NOMINATIVO, me a do ACUSATIVO e mim a do OBLÍQUO – este último associado a
complementos de preposições. O fato de os pronomes terem Caso explícito pode ser tomado como indício
de que existe marcação casual no português.
Sem o Caso, não seria possível recuperar qual o papel temático do DP, e isso é feito por meio do Caso
abstrato.
A Teoria do Caso deve ser formulada de modo a estabelecer:
• quantos e quais são os Casos abstratos;
• quais são os elementos que atribuem os Casos abstratos;
• quais são os constituintes que os recebem;
• quais as formas de atribuição de Caso;
• quais os princípios que regulam a atribuição de Caso.
Comecemos pelos princípios que regulam a atribuição de Caso. A teoria do Caso compreende um único
princípio. Vamos enunciar o Filtro do Caso, que é um princípio que garante que um DP pronunciado
tenha Caso. O Filtro do Caso não tem nada a dizer com respeito aos DPs fonologicamente vazios. Este
princípio provoca vários tipos de arranjo na sentença para que lhes seja garantido um Caso.
FILTRO DO CASO: *[DP] se DP é pronunciado e não pertence a uma cadeia marcada com Caso.
Sendo assim, pode-se dizer que o caso é uma condição necessária para a interpretação fonológica dos
DPs.
32- a. * Paulo quer João estudar. / b. * A pedra tentou fugir.
Na frase 32-a, o verbo [estudar], encontra-se em forma infinita e, assim, não é capaz de atribuir Caso a
seu sujeito. Note-se que não há nessa frase nenhuma outra posição para onde o sintagma [João] pudesse
ser deslocado, a fim de ser licenciado. Como consequência, temos uma construção agramatical. Já em 32-
b, o argumento pedra recebe caso nominativo devido a sua posição argumental, obedecendo assim o
princípio do filtro do caso, porém, a sentença é agramatical, pois o mesmo argumento não satisfaz o papel
temático de sujeito agente.
Ainda considerando o princípio do filtro do caso, é necessário chamar atenção para o fato de que existem
lacunas em seu rigor. Na língua inglesa, por exemplo, o parâmetro Pro-drop (é o fenômeno pelo qual uma
certa classe de pronomes pode ser omitida – línguas em que existe isso são chamadas pro-drop, redução
de pronoun-dropping, ‘supressão de pronome’) não admite a ocorrência de sujeito oculto, o que obriga
todo sujeito ser foneticamente pronunciado. Tal fato corrobora a dificuldade em atribuir caso a certos
DPs. Na sentença 33-b, é possível notar esse fato com clareza:
33- a. It falls. (Cai.)
b. It is clear that John works. (Está claro que João trabalha.)
Na sentença 33-a, o argumento it tem papel temático de sujeito e, portanto, recebe caso nominativo.
Todavia, em 33-b, embora o argumento it esteja lexicalizado, ele não recebe caso, pois não tem papel
temático. O argumento que recebe papel temático de sujeito é that John works. It, na sentença 33-b, é um
argumento lexicalizado rotulado como “dummy subject” (sujeito manequim/falso), na gramática inglesa,
e não possui significado algum.
O princípio do Caso é formulado em termos de cadeia. Desta forma, são recobertas as situações em que o
DP não consegue seu Caso se pertence a uma cadeia trivial, isto é, uma cadeia com uma única posição
que não é marcada por Caso. Nesta situação, forma-se uma cadeia A(rgumental) não trivial (isto é, com
pelo menos duas posições). De qualquer maneira, é importante salientar que uma cadeia só pode ser
marcada por um único Caso.
Para marcação θ devemos olhar tanto para constituintes como para posições. Melhor dizendo, os
constituintes recebem seu papel θ unicamente em determinadas posições. Este esclarecimento é útil na
sido suposto, com variedade e complexidade insuspeitadas. O programa de pesquisa
buscou mostrar que a complexidade e a variedade eram somente aparentes e que os dois
tipos de regras podem ser reduzidos a uma forma mais simples. Uma solução “perfeita”
para o problema das regras sintagmáticas seria eliminá-las inteiramente, em favor da
operação irredutível que toma dois objetos já formados e anexa um ao outro, formando
um objeto maior com exatamente as propriedades do alvo da anexação: a operação que
podemos chamar de Confluir. Esse objetivo pode ser atingível num sistema chamado
“estrutura sintagmática nua” (bare phrase structure).
Quanto às operações transformacionais, buscava-se reduzir estas à forma mais simples
possível, embora, diferentemente das regras sintagmáticas, elas pareçam ser não-
medida em que identificamos o papel θ de um constituinte deslocado pelo fato de estar conectado com a
posição onde recebe aquele papel θ. Em outras palavras, uma das características das línguas naturais é
que pronunciamos determinados elementos em uma posição, porém eles são interpretados
semanticamente em outra. Observe a sentença: “Que livro i ela comprou ti?” O sintagma que livro foi
gerado originalmente, em DS (Deep-structure), onde está o vestígio (t, do inglês trace) e posteriormente
movido, em SS (Surface-structure), para a periferia esquerda da sentença, conforme nos asseguram os
índices subscritos que conectam as duas posições. Mas a despeito de ser pronunciado no início da
sentença, é interpretado como argumento interno do verbo comprar. Podemos supor, então, que é na
conexão com a posição θ, representada por ti, que que livro recebe seu papel θ. O fato de a atribuição dos
papeis θ se dar nas posições de base em que os argumentos se combinam com os núcleos que os
selecionaram revela que esse módulo da teoria se aplica em DS, portanto, antes de os elementos se
moverem para suas posições de SS, isto é, para as posições em que serão pronunciados.
Então, como há movimento de uma categoria de sua posição original para outra, podemos entender que
estes elementos, por terem o mesmo índice no âmbito da sentença, formam uma cadeia. Esta noção pode
ser intuitivamente concebida como uma sequência de posições que portam o mesmo índice de tal modo
que a posição mais alta, a cabeça da cadeia, contém o sintagma movido e as outras posições contêm seus
vestígios. À mais baixa destas posições, a única que pode ser uma posição θ, chamamos cauda da cadeia.
Os atribuidores de Caso são os dois núcleos lexicais [-N] e o núcleo funcional I finito. O núcleo lexical [-
N,+V], o verbo, atribui Caso Acusativo; o núcleo [-N,-V], a preposição, atribui Caso Oblíquo. Por sua
vez, o núcleo funcional I atribui Nominativo. Cada um dos atribuidores de Caso tem um único Caso para
descarregar.
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Os núcleos lexicais se identificam com as categorias lexicais que são definidas pela combinação de
apenas dois traços distintivos fundamentais: nominal [N] e verbal [V]. A esses traços são associados dois
valores: + ou –. Vamos separar as categorias em dois grupos: o grupo daquelas que têm pelo menos um
valor positivo para os traços, ou seja, o nome, o adjetivo e o verbo, e o grupo unitário da preposição, que
só tem valor negativo. O primeiro grupo contém as classes abertas, que se caracterizam por ter um
número indefinido de membros no dicionário mental e por permitir a cunhagem consciente pelos falantes
de novas expressões. O grupo unitário das preposições constitui uma classe fechada.
Tomemos um radical como /am-/ do qual podemos derivar um nome amor, um adjetivo amado e um
verbo amar. O radical em si se presta a estabelecer o sentido lexical da palavra (a famosa relação de
amor) e em princípio não é associado a ele nem o traço [±V], nem [±N], A palavra amar pode ser
definida pelos traços [-N,+V] e identificada como um verbo: não tem traços nominais como gênero e
número e tem traços [+V] que podem ser reconhecidos nos morfemas verbais. A palavra amor pode ser
definida pelos traços [+N,-V] e identificada como um nome: tem traços nominais de gênero e número e
não tem traços verbais. E a palavra amado? Sem dúvida pode ter traços nominais de gênero e número
quando é combinada com o verbo ser (A Maria foi amada), mas não porta tais traços quando combinada
com o verbo ter (A Maria tinha amado). Por isso, a palavra amado é definida pelos traços [+N,+V].
As preposições constituem uma classe fechada, no sentido de que a classe resiste à criação de um novo
item. Como estas são características de classes funcionais, devemos admitir que as preposições não são
puramente uma classe lexical, ao mesmo tempo em que devemos explicitar qual a propriedade que
possibilita mantê-las na classe das categorias lexicais.
Uma propriedade definitória das classes lexicais é a capacidade que seus membros têm de selecionar
semanticamente (s-selecionar) seus argumentos. Assim, por exemplo, tomemos o verbo beber para
mostrar que, como núcleo lexical, ele s-seleciona seus argumentos. Se beber toma como argumento João,
o que bebe, e o suco, o que é bebido, a seleção destes argumentos é apropriada para este verbo; porém, se
ele toma como argumento o suco, como o que bebe, e o carro, como o que é bebido, vamos ter uma
elimináveis. O resultado final foi a tese de que, para um conjunto nuclear de fenômenos,
há só uma única operação Mover – basicamente, mover qualquer coisa para qualquer
lugar, sem propriedades específicas de línguas ou de certas construções. Como a
operação Mover se aplica, é determinado pelos princípios gerais da linguagem em
interação com as escolhas paramétricas específicas que determinam uma língua
particular.
A operação Confluir toma dois objetos distintos X e Y e anexa Y a X. A operação
Mover toma um único objeto X e um objeto Y que é parte de X, e faz Y convergir para
X. Em ambos os casos, a nova unidade tem as propriedades do alvo, X. O objeto
formado pela operação Mover inclui duas ocorrências do elemento movido Y: em
termos técnicos, a cadeia consistindo nessas duas ocorrências de Y. A ocorrência na
posição original é chamada o vestígio. Há fortes evidências de que ambas as posições
entram na interpretação semântica de muitas maneiras. Ambas, por exemplo, entram em

completa inadequação: o suco não tem propriedades compatíveis com a semântica do bebedor; também o
carro não tem propriedades semânticas compatíveis com aquilo que pode ser bebido.
Em 34, sobre estabelece que o DP a mesa deve ser interpretado como um lugar. Se isto é verdade, então
sobre s-seleciona o DP a mesa. Já isso não é possível com a esperança porque este DP não tem as
propriedades compatíveis com as de um lugar. Portanto, podemos dizer que há preposições que são
núcleos lexicais porque são capazes de s-selecionar argumentos de modo paralelo ao que fazem nomes,
verbos ou adjetivos.
34- a. A Maria desmaiou sobre a mesa. / b. *A Maria desmaiou sobre a esperança.
Observe que os advérbios não têm um lugar claro no conjunto das categorias lexicais. Talvez eles não
constituam de fato uma categoria independente, mas sejam uma classe especial de adjetivos. Vemos que
existe uma relação morfológica consistente entre adjetivos e os advérbios formados em -mente. Aliás,
algumas vezes o advérbio tem a mesma forma do adjetivo. Adicionalmente, advérbios e adjetivos
permitem basicamente o mesmo elenco de ‘intensificadores’ ou ‘modificadores’, como muito ou bastante,
e de complementos – independente de mim ou independentemente de mim. Advérbios e adjetivos estão
em distribuição complementar, no sentido de que os últimos modificam nominais, enquanto os primeiros
modificam constituintes não nominais (verbais, adjetivais, preposicionais etc).
O problema estaria resolvido se advérbios em -mente fossem os únicos elementos chamados advérbios
nas línguas. Mas o fato concreto é, que ontem ou mesmo muito são também chamados de advérbios e
mesmo os advérbios em -mente são em muitos casos diferentes entre si no que diz respeito à sua
distribuição, razão pela qual imaginaremos simplesmente que se trata de uma categoria lexical, Adv, que
projeta como todas as outras categorias o nível intermediário, Adv’, e o nível máximo, AdvP.
Além dos núcleos lexicais, o dicionário mental contém os núcleos funcionais, que se distinguem dos
primeiros pela sua incapacidade de s-selecionar argumentos, e por isso se diz que o núcleo apenas c-
seleciona seu complemento, isto é, ao selecionar o complemento, tem em vista apenas a categoria (c-) à
qual ele deve pertencer. Neste caso, por exemplo, se considerarmos a flexão verbal (tempo-modo e
número-pessoa) como um núcleo funcional, então ela vai c-selecionar um constituinte da categoria dos
verbos como complemento, ou seja, um VP. Esta é uma forma de traduzir a seguinte ideia: como a flexão
de tempo-modo e de número-pessoa é um afixo verbal, ela só se combina com (c-seleciona) verbos; e faz
isso sem levar em consideração o tipo semântico do verbo. Também o especificador dos núcleos
funcionais não pode ser s-selecionado e se constitui numa posição a ser ocupada por constituintes dotados
de traços compatíveis com o núcleo. Suponhamos, por exemplo, que em uma sentença existe o núcleo
funcional que com o traço [+ interrogativo] e uma expressão que é utilizada para fazer pergunta, como
quando. Então, o especificador deste núcleo só pode ser ocupado pela expressão quando e vamos ter a
sentença Quando que o João chegou? com o quando ao lado do que. Veja que isto acontece independente
do fato de quando significar ‘tempo’.
Os núcleos funcionais têm função eminentemente gramatical e em muitas línguas não raro podem se
apresentar como afixos. Tal é o caso da flexão verbal.
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Caso é atribuído sob regência. A definição de regência engloba o conceito de m-comando.
REGÊNCIA: α rege β se e somente se: (i) α = Xº (ou seja, α é um núcleo lexical N, A, V, P ou α é o
núcleo funcional I); (ii) α m-comanda β e β não está protegido de α por uma barreira (= uma projeção
máxima).
relações de escopo e relações de ligação com elementos anafóricos, reflexivos e
pronomes.
O próximo problema é mostrar que traços formais ininterpretáveis são de fato o
mecanismo que implementa a propriedade de deslocamento, de modo que as duas
imperfeições básicas do sistema computacional se reduzem a uma. Se ocorrer, além
disso, que a propriedade de deslocamento seja motivada pelas condições de legibilidade
impostas pelos sistemas externo, então as duas imperfeições são eliminadas
completamente e a linguagem acaba sendo, afinal, ótima: traços formais ininterpretados
são exigidos como um mecanismo para satisfazer as condições de legibilidade impostas

– DP1 rege I? Não, porque DP1 não é um núcleo.


– I rege DP1? Sim, porque I é um núcleo definido como um núcleo regente em português; I m-comanda
DP1; e não existe barreira (= nenhuma projeção máxima) protegendo DP1 de I.
– I rege VP? Sim, porque I é um núcleo regente que m-comanda VP; e não existe barreira protegendo VP
de I.
– I rege DP2? Não, porque existe uma barreira que protege DP2 de I que é VP.
– V rege DP2? Sim, porque V é um núcleo regente (= Xº); V m-comanda DP 2; e não existe barreira (=
nenhuma projeção máxima) protegendo DP2 de V.
Em tais condições, I rege DP1 podendo atribuir a ele NOMINATIVO e V rege DP 2 podendo atribuir a ele
ACUSATIVO.
Passemos agora a uma estrutura de marcação excepcional.

— DP1 rege Inf? Não, porque DP1 não é um núcleo.


— Inf rege DP1? Sim, porque Inf é um núcleo definido como um núcleo regente em português; Inf m-
comanda DP1; e não existe barreira (= nenhuma projeção máxima) protegendo DP1 de I.
— Inf rege VP? Sim, porque Inf é um núcleo regente que m-comanda VP; e não existe barreira
protegendo VP de Inf.
— Inf rege DP2? Não, porque existe uma barreira que protege DP2 de Inf que é VP.
— P rege InfP? Sim, porque P é um núcleo regente que m-comanda InfP; e não existe barreira protegendo
InfP de P.
— P rege DP1? Esta questão é crucial para a atribuição de Caso porque afirmamos que P atribui
excepcionalmente OBLÍQUO para a Maria e que Caso é atribuído sob regência. A resposta à pergunta é
pela arquitetura geral da mente/cérebro, pelas propriedades do aparato de
processamento e pelos sistemas do pensamento.
A intuição básica da unificação dos traços formais ininterpretáveis e da propriedade de
deslocamento fundamenta-se num fato empírico acoplado a um princípio da
configuração geral. O fato é que traços formais ininterpretáveis têm de ser apagados
para a expressão ser legível na interface semântica; o princípio da configuração geral é
que o apagamento exige uma relação local entre o traço infrator e um traço que combine
com ele – um traço combinante (a matching feature). Tipicamente, esses dois traços
ficam distantes um do outro, por razões que têm a ver com a interpretação semântica.
Por exemplo, na sentença Clinton seems to have been elected, a interpretação semântica
exige que elect e “Clinton” estejam relacionados localizadamente no sintagma “elect
Clinton” para a construção ser interpretada apropriadamente, como se a sentença fosse
realmente seems to have been elected Clinton (parece ter sido eleito Clinton). O verbo
principal da sentença, seems, tem traços flexionais que são ininterpretáveis, como
vimos: seu número e pessoa, por exemplo. Esses traços infratores de seems têm,
não: existe a barreira InfP protegendo DP 1 de P. Entretanto, devemos considerar que existe regência nesta
situação, porque ECM se realiza exatamente neste tipo de configuração. Como sair desta contradição?
Note primeiramente que onde se pressupõe que existe um CP, como em 35 (Ø = conjunto vazio), este sim
protege o DP em questão de ser regido (e marcado por Caso) pelo verbo viu e pela preposição para:
35- a. A Maria [viu [CP Ø [InfP os amigos rirem]]]
b. A Maria fez palhaçadas [para [CP Ø [InfP os amigos rirem]]]
Logo, seremos obrigados a concluir que um InfP, mesmo sendo projeção máxima, tem comportamento
especial, não atuando como barreira para a regência e atribuição de Caso por um núcleo superior na
estrutura. E se consideramos as SCs como projeções máximas, também a elas devemos atribuir esta
propriedade especial de não se configurarem como barreiras para a regência e a atribuição de Caso por
parte de um núcleo que as domina imediatamente.
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Em 36-b, o pronome argumento externo do verbo rir aparece na forma oblíqua mim. Há uma atribuição
de Caso que envolve a preposição como núcleo atribuidor e o DP preenchido pelo pronome como
receptor. O pronome não consegue disfarçar que se trata do Caso OBLÍQUO e que se trata de ECM.
36-a evidencia uma marcação canônica de Caso: o núcleo Agr presente no contexto do infinitivo pessoal
marca casualmente o pronome cuja forma deixa ver o Caso NOMINATIVO. Em 36-b, temos em mãos
uma marcação casual que não é canônica, no sentido de que ela não acontece na configuração núcleo-
complemento, como fazem normalmente as preposições e os verbos. Observe que não é exatamente o
complemento que está recebendo o Caso da preposição em 36-b; o complemento da preposição não é o
pronome mim mas uma sentença infinitiva, que em princípio não necessita de marcação casual. Na
verdade, é o pronome mim, argumento externo de rir, que está sendo marcado por Caso pela preposição.
Esta é a razão pela qual dizemos que a marcação é excepcional: não é o complemento que recebe o Caso,
mas o ‘filho’ do complemento, digamos assim.
36- a. A Maria fez palhaçadas para eu rir. / b. A Maria fez palhaçadas para mim rir.
Na sentença 37-a se verifica a marcação canônica de Caso: o NOMINATIVO refletido no pronome eu é
atribuído pelo núcleo Agr do infinitivo pessoal. Em 37-b, o argumento externo do verbo rir exibe o Caso
ACUSATIVO, e está em ação uma marcação de Caso excepcional, paralela à que se verifica em 37-b.
37- a. A Maria viu eu rir. / b. A Maria viu-me rir.
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Uma small clause (SC), às vezes traduzida como mini-oração. Uma SC é uma predicação que se
estabelece entre um constituinte que é sujeito e um outro que é predicado sem que o núcleo desse
predicado seja um verbo (ou uma flexão verbal). Exemplos de SC:
38- a. A Joana acha [SC o João lindo].
b. A Joana acha [SC o João capaz de dirigir motos].
c. A Joana acha [SC o João um gato].
d. A Joana quer [SC o João de terno].
Nas SCs de 38, o João é o sujeito e os APs lindo e capaz de dirigir motos, o DP um gato e o PP de terno
são predicações que se fazem sobre o João. Como estas predicações não têm verbo como seu núcleo, elas
não podem ser encabeçadas por nenhuma das categorias que têm VP como complemento tal como IP,
InfP, GerP.
portanto, de ser apagados numa relação local com os traços combinantes do sintagma
“Clinton”. Os traços combinantes são atraídos pelos traços infratores do verbo principal
seems, que são então apagados sob combinação local. O termo descritivo tradicional
para o fenômeno que estamos examinando é “concordância”.
Se isso puder funcionar apropriadamente, concluímos que uma língua particular
consiste num léxico, num sistema fonológico e em duas operações computacionais:
Confluir e Atrair. Atrair é forçada pelo princípio de que os traços formais
ininterpretáveis têm de ser apagados numa relação local, e algo semelhante se estende a
Confluir.
Observe-se que somente os traços de “Clinton” são atraídos; ainda não tratamos da
propriedade de deslocamento manifestamente visível – o fato de que o sintagma pleno

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C-comando é uma abreviatura convencional da expressão “comando de constituinte”. A relação c-
comando é definida em termos da posição de constituintes numa determinada frase. A estrutura de
constituintes de uma frase pode ser representada esquematicamente por Indicadores Sintagmáticos
(esquema em árvore ou parentetização). Numa representação em árvore, cada constituinte corresponde a
um nó, cada nó, por sua vez, corresponde a uma categoria sintagmática: F (frase), SN (sintagma nominal),
SV (sintagma verbal), SA (sintagma adjetival), SP (sintagma preposicional), SAdv (sintagma adverbial).
Vejamos a noção de c-comando:
Um nó α c-comanda um nó β se: (i) α não domina β e β não domina α; (ii) cada nódulo ramificante γ
(gama) que domina α também domina β.
Vejamos o seguinte exemplo: [[A Ana]SN [fugiu]SV] F
Neste exemplo, o sintagma nominal c-comanda o sintagma verbal, e ambos são dominados igualmente
pela frase. SN e SV são, numa estrutura em árvore, nós irmãos, e F é o nó que os domina.
Como ilustração em árvore de c-comando, consideremos a seguinte configuração:

XP domina Spec, X e YP, porque é o nódulo ramificante superior da árvore. O Spec c-comanda todas as
categorias restantes, uma vez que o único nó ramificado que o domina (XP), domina todas as outras
categorias. X c-comanda YP, já que os nós ramificados que dominam X (X’ e XP) dominam YP.
Todavia, X não c-comanda Spec porque há um nó ramificado que o domina (X’), mas que não domina
Spec. A noção de c-comando então implica que dois nós irmãos se c-comandam mutuamente.
A relação de m-comando é semelhante à relação de c-comando, com uma diferença: onde a relação de c-
comando menciona ‘nó ramificado’, a relação de m-comando menciona ‘projeção máxima’.
Consideremos a noção de m-comando:
Um nó α m-comanda um nó β se: (i) α não domina β e β não domina α; (ii) cada projeção máxima γ que
domina α também domina β.
Vejamos as relações de m-comando entre os elementos:
no qual os traços aparecem, a palavra “Clinton” neste caso, é levado junto com os traços
formais de flexão, que apagam os traços alvo. Por que o sintagma pleno se movimenta e
não somente os traços? A ideia natural é que as razões têm a ver com a pobreza do
sistema sensorimotor, que é incapaz de “pronunciar” ou “ouvir” traços isolados
separados das palavras das quais são parte. Daí que, em sentenças tais como Clinton
seems to have been elected, o sintagma pleno “Clinton” se move junto, como um reflexo
da abstração dos traços formais de “Clinton”. Na sentença an unpopular candidate
seems to have been elected (um candidato impopular parece ter sido eleito), o sintagma
pleno an unpopular candidate é levado junto, como um reflexo da atração dos traços
formais de candidate.

Tomemos a categoria funcional X. X m-comanda Spec, uma vez que ele não domina Spec e Spec não o
domina; além disso, o Spec é dominado pela projeção máxima que domina X, ou seja, XP. Como
podemos perceber o m-comando é mais liberal que o c-comando, pois permite escapar ao domínio do
primeiro nó ramificado e estabelecer relações no domínio da primeira projeção máxima.
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Como o sistema X-barra se aplica a qualquer constituinte lexical ou funcional, I deve ser o núcleo do
constituinte IP, com um complemento e uma posição de especificador. O complemento de I só pode ser
uma categoria de natureza verbal, isto é, I só pode ser combinado com verbos, o que equivale a dizer que
I c-seleciona VP.

Consideremos, agora, uma nova categoria funcional que pode ser deduzida de uma sentença como 39-a.
Já sabemos que [eles chegaram] constitui uma sentença finita IP (39-b).
Vemos em 39-b que o complementizador que está fora do IP. Dizemos que ele é o núcleo de uma
categoria CP (C vale por complementizer do inglês). Assim, reescrevemos 39-b como 39-c:
39- a. A Maria viu [que eles chegaram].
b. A Maria viu [que [IP eles chegaram]].
c. A Maria viu [CP que [IP eles chegaram]].
A árvore das categorias funcionais apresentadas até agora, com IP cindido em duas categorias seria:

Vamos acrescentar ainda um não à sentença encaixada de 39, de modo que tenhamos a sentença em 39-d:
39- d. A Maria viu [CP que [IP eles não chegaram]].
Suponhamos que não encabeça uma projeção responsável pela negação sentencial. Postulemos que ela
deve estar entre AgrP e TP, sendo inserida como complemento de Agr. Assim chegamos à seguinte
Suponhamos que o componente fonológico esteja desativado. Então os traços sozinhos
são alçados, e, juntamente com a sentença an unpopular candidate seems to have been
elected, com deslocamento aberto, temos a expressão correspondente seems to have
been elected an unpopular candidate (parece ter sido eleito um candidato impopular).
Aqui, o sintagma distante an unpopular candidate concorda com o verbo seems, o que
significa que seus traços foram atraídos para uma relação local com seem, embora
deixando o resto do sintagma para trás.
Por outras razões, não vemos exatamente esse padrão com sintagmas nominais
definidos como “Clinton”, mas é comum com indefinidos. No inglês, é necessário, por
outras razões, introduzir um elemento semanticamente vazio como sujeito aparente; em

árvore:

Com Neg completamos o conjunto das principais categorias funcionais com que se constrói o constituinte
sentencial. Estas categorias dominam o constituinte verbal e correspondem a um feixe de propriedades
que gravitam em torno dele. Em especial, existe a categoria IP que dá ao constituinte verbal o estatuto de
sentença.
O núcleo D (do inglês Determiner) encabeça o constituinte DP – o qual domina o NP atuando sobre ele
de modo paralelo ao que faz o IP com o VP: o D constrói a referencialidade do NP, conferindo-lhe
estatuto de argumento. Esta é a razão pela qual chamamos os argumentos de DP em vez de NP. A
representação de um DP como o menino fica:

Portanto, categorias não lexicais como DP, IP e CP também se conformam ao esquema X-barra, ainda
que elas tenham um caráter bastante particular: são elementos com função sintática, incapazes de s-
selecionar e por isso mesmo são chamadas de categorias funcionais.
Para atingir a projeção máxima o núcleo pode selecionar complemento e especificador. Quanto ao
complemento, ele é irmão do núcleo X, ambos imediatamente dominados por X’. Neste caso, dizemos
que o núcleo subcategoriza o complemento.
inglês, a palavra there. É também necessário executar uma inversão da ordem; por isso,
o que efetivamente dizemos em inglês é a sentença there seems to have been an
unpopular candidate elected.
Examinando um pouco mais de perto, suponhamos que X seja um traço que é
ininterpretável e, portanto, tenha de ser apagado. Ele então atrai o traço Y mais próximo
que com ele combina. Y se anexa a X e o atraidor X se apaga.Y também se apagará caso
seja ininterpretável, e permanecerá caso seja interpretável. Esta é a fonte do movimento
cíclico sucessivo, entre outras propriedades.
Para movimentos encobertos, isso é tudo o que há dizer: os traços atraem, e se apagam
quando necessário. As operações encobertas deveriam ser pura atração de traços, sem
Entretanto, não se pode dizer que o núcleo subcategoriza o especificador, já que a relação entre os dois
não é de irmandade, estando o especificador mais alto na estrutura. Na verdade, o irmão do especificador
é X’. Assim, seleção é um conceito mais amplo do que subcategorização e se aplica tanto à relação que o
núcleo tem com o especificador como com o complemento; por outro lado, subcategorização só se aplica
à relação que o núcleo tem com seu complemento. A relação entre o especificador e o núcleo é indireta,
X’ fazendo a mediação entre eles.
Um constituinte se completa quando sua projeção máxima contém os complementos e o especificador que
o núcleo seleciona.
Existem ainda constituintes que são licenciados numa sentença sem serem complemento ou especificador
de um núcleo. São os chamados adjuntos.
Para explicar em que consiste um adjunto precisamos definir duas noções adicionais:
INCLUSÃO: α inclui β se e somente se todos os segmentos de α dominam β.
CONTINÊNCIA: α contém β se nem todos os segmentos de α dominam β.
Observemos a representação onde vamos jogar com o CP como o constituinte que é adjunto:

Dizemos que CP2 está incluído em XP, dado que é dominado por cada segmento de XP que são XP 1 e
XP2. Um argumento é, portanto, um constituinte incluído na projeção máxima do núcleo com o qual está
relacionado.
Um adjunto, por sua vez, é um constituinte que está apenas contido na projeção máxima de um núcleo.
Na representação, CP1 está contido, mas não incluído, em XP, uma vez que é dominado apenas por XP 1,
mas não por XP2.
Uma forma de diagnosticar se um CP à direita é adjunto ou complemento é aplicar o teste da extração.
Um adjunto é um domínio de onde não é possível extrair nenhum item. Vamos observar os CPs entre
colchetes em 40 e 41:
40- a. Você acha [que a Maria leu quais livros]?
b. Quais livros você acha [que a Maria leu –]?
41- a. Ele está chorando [porque a Maria leu quais livros]?
b. *Quais livros ele está chorando [porque a Maria leu –]?
Em 40-a, a extração da expressão interrogativa quais livros da sentença subordinada produz 40-b, uma
sentença gramatical. Então, a sentença subordinada é um complemento. Por outro lado, a extração de
quais livros da sentença subordinada em 41-a produz 41-b, uma sentença agramatical. Então, a sentença
subordinada é um adjunto.
O adjunto vai ser dominado apenas pelo segmento de cima da categoria duplicada. Esta é uma
necessidade que decorre do fato de ele estar apenas contido em uma categoria.
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A estrutura temática seria responsável por fornecer a informação sobre o número de argumentos que um
predicado seleciona e sobre a natureza semântica dos argumentos, isto é, o papel θ que recebem os
argumentos (se tema, agente, etc.).
movimento visível de sintagmas, embora com efeitos sobre temas como concordância,
controle e ligação. Se o sistema sonoro não foi desativado, temos o reflexo que alça o
sintagma pleno, colocando-o tão perto quanto possível do traço atraído Y; em termos
técnicos, isso se traduz em movimento de um sintagma para o especificador de um
núcleo no qual Y se anexou. O problema básico é mostrar que a escolha do sintagma
que se move é determinada por outras propriedades da língua, dentro de pressupostos
minimalistas.
Os traços formais ininterpretáveis têm de ser apagados, e, de acordo com os
pressupostos da configuração geral ótima, apagados numa relação local com um traço
combinante. A propriedade de deslocamento que se exige para a interpretação semântica
Para Chomsky, a assunção de que há informação temática na entrada lexical dos verbos está ancorada à
idéia de que noções tais como agente, tema, alvo, etc., desempenham um papel crucial na interpretação
das estruturas sintáticas em LF (Logical Form). Os papéis θ seriam atribuídos em consonância com o
Critério θ que diz que: (i) a cada argumento se atribui somente um papel θ e (ii) cada papel θ deve ser
atribuído a apenas um argumento. São os rótulos – agente, tema, alvo, etc. – que permitem aos
argumentos serem rastreados na derivação.
No entanto, o Critério temático, tal como formulado, não dava conta de construções de predicação
secundária, conforme ilustrado em
42- Maria partiu cansada.
Veja que em 42, Maria recebe dois papéis θ: um papel θ proveniente de partir e um de cansada. A saída
encontrada por Chomsky para solucionar o problema de predicação secundária foi reformular o Critério θ
como uma propriedade de cadeias.
Se C = (α1,…, αn) é uma CADEIA máxima, então α n ocupa uma única posição θ e α 1 é uma única posição
marcada com Caso. De acordo com a Condição sobre Cadeias, um argumento pode receber mais que um
papel θ desde que não haja movimento em posição θ.
Adicionalmente, os papéis θ têm função importante na projeção dos itens lexicais do léxico para a
sintaxe. Graças a esse mapeamento do léxico para sintaxe é que se atribui, por meio do Princípio de
Projeção (que estabelece que a informação θ de um núcleo lexical deve ser preservada em todos os níveis
de representação DS, SS e LF), uma representação sintática à representação semântica; isso ocorre em
consonância com princípios mais gerais.
Em Chomsky, as categorias gramaticais, capazes de selecionar semanticamente os argumentos, a saber, os
predicados, são verbos, adjetivos, nomes e preposições.
Segundo Chomsky, as funções θ não são reduzidas a traços formais, nem tampouco são atribuídas no
domínio de checagem, mas no domínio interno. A teoria θ é complementar a de checagem, isso é
expresso “em parte como uma generalização descritiva na Condição sobre Cadeias: na Cadeia (chain) CH
= (α1... αn), αn recebe uma função θ e α1 participa de uma relação de checagem”. Segundo Chomsky,
somente αn pode atribuir uma função θ, assim, apenas a posição de base pode receber ou atribuir uma
função θ. Se a relação θ é uma propriedade de base, quando um elemento é movido, ele não pode receber
ou atribuir uma função θ. Em suma, papéis θ são atribuídos no primeiro merge (compor) dos elementos,
complementarmente à checagem que é, em Chomsky, uma propriedade do movimento. A ideia de
complementariedade entre checagem e atribuição θ não é mais relevante nos trabalhos subsequentes, já
que a valoração dos traços não é necessariamente uma propriedade de movimento. Também se mantêm os
elementos lexicais com suas propriedades de atribuição.
Dentro da abordagem minimalista, a motivação para o movimento é a checagem morfológica. Como todo
item lexical é um conjunto de traços semânticos, fonológicos e formais, os formais têm que entrar em
relação com o mesmo tipo de traço de outro item lexical, a fim de que o sistema verifique se esses traços
combinam entre si. Essa é a relação de checagem, que, em outras palavras, licencia os traços dos itens
lexicais.
A checagem pode ser feita em dois momentos da computação: na sintaxe visível e no componente não-
visível. A checagem feita na sintaxe visível é a checagem de traço forte. Quando um item lexical não
substantivo possui um traço forte, esse traço tem que ser imediatamente eliminado do sistema, para evitar
o fracasso (crash) da derivação em PF. A checagem do traço forte é sempre feita por movimento aberto
(ou visível), ou seja, a categoria toda se move. Em termos de economia, o movimento aberto é custoso, e
ele só pode acontecer como uma operação de Último Recurso (Last Resort), quando a checagem através
da operação Compor não é suficiente para a checagem do traço relevante. A checagem no componente
não visível envolve apenas o movimento dos traços relevantes, e é portanto, uma operação mais
econômica que o movimento aberto. É a checagem de traços que motiva o movimento no PM.
na interface segue-se como um reflexo, induzido pelo caráter primitivo dos modos de
interpretação sensorial.
Combinando essas várias ideias, algumas ainda altamente especulativas, podemos
visualizar tanto uma motivação quanto um gatilho para a propriedade de deslocamento.
Observe-se que os dois têm de ser distinguidos. Um embriologista 25 estudando o
desenvolvimento dos olhos pode notar o fato de que, para um organismo sobreviver,
seria útil que o cristalino 26 contivesse algo que o protegesse contra danos e algo que
refratasse a luz; e examinando mais, descobriria que as proteínas cristalinas têm ambas
essas propriedades e também parecem ser componentes ubíquos27 do cristalino do olho,
manifestando-se em caminhos evolucionistas independentes. A primeira propriedade
tem a ver com a “motivação” ou a “configuração geral funcional”, a segunda28 com o
gatilho que produz a configuração geral funcional certa. Existe uma relação indireta e
importante entre elas, mas seria um erro confundi-las. Então um biólogo aceitando tudo

Chomsky defende que a teoria do papel θ e a teoria de checagem estão em distribuição complementar: no
domínio onde é atribuído papel θ, o domínio interno, não pode haver checagem de traço.
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Concluindo, um dos pontos que diferencia o programa PM do P&P é que, de acordo com o PM, a forma
das línguas sofre influência do sistema de desempenho, o que não ocorria no P&P. E ainda, no PM os
princípios deixam de ser especificamente linguísticos (de GU) e passam a ser reduzidos a um princípio
geral de economia e a um princípio que garante o estabelecimento de relações de interface da língua com
sistemas de desempenho.
Mudanças no tratamento teórico da estrutura argumental, portanto, são necessários a partir do
desenvolvimento do PM. Nesse programa, o Princípio de Projeção Estendido, a Estrutura-D e a Estrutura-
S que estão associados à c-seleção e à s-seleção, em P&P, são abandonados. De acordo com o Programa
Minimalista, o primeiro Merge é direcionado por critérios de s-seleção e c-seleção.
Adger propõe que a noção de valoração, em que traços não-interpretáveis são relacionados a traços
interpretáveis de mesmo tipo e valorados para poderem ser eliminados (conforme o Princípio de
Interpretação Plena), seja estendida para a c-seleção. O verbo caracteriza-se como um núcleo lexical e
possui traço V e pelo menos um traço N que c-seleciona um argumento da categoria N por meio da
operação Merge. No processo de geração da estrutura sintática, a primeira aplicação de Merge dá origem,
então, à estrutura núcleo-complemento (o primeiro Merge s-seleciona o sujeito). A segunda aplicação de
Merge dá origem, então, à estrutura especificador-núcleo. O verbo cria ainda uma relação entre a c-
seleção, a valoração e a atribuição de papéis temáticos. Em outras palavras, um item lexical com traços
de c-seleção (traços não interpretáveis) atribui papel temático ao item c-selecionado após a valoração de
traços. O número de argumentos de um predicador, ou núcleo, pode variar e, uma vez que esse seleciona
itens lexicais por meio da operação Merge, quanto maior o número de argumentos maior o número de
operações Merge, de valorações e de atribuições de papéis temáticos.
Análises de orientação minimalista propõem a explicitação de um elemento de natureza híbrida lexical e
funcional (vP). Essa dualidade deve-se, por um lado, à presença de um traço de causatividade, que requer
um argumento com papel temático de agente, por outro, à necessidade do elemento de natureza verbal
que se posiciona como complemento do núcleo funcional T (se analisarmos os componentes da flexão
verbal, vamos ver que em muitas línguas ela é composta de flexão de modo e tempo [abreviada por T, do
inglês tense] e flexão de número e pessoa [abreviada por Agr, do inglês agreement]; por isso, podemos ir
além e supor que I (Inflexional = flexão) na verdade compreende dois núcleos T e Agr, cada um
encabeçando sua projeção máxima TP e AgrP, respectivamente) para a constituição da estrutura
argumental. Assim, todos os verbos que requerem um agente passam a demandar a postulação de um
elemento v. Segundo a Hierarquia de Projeção Universal, sempre que houver v haverá um complemento
VP. Assim sendo, vP é uma extensão de VP, uma vez que é verbal e adiciona informação relativa a
causalidade. Os verbos inacusativos (os verbos monoargumentais podem ser divididos em: inacusativos:
contém apenas um argumento interno e não atribuem caso acusativo a esse argumento – o que faz com
que esse argumento mova-se para a posição pré-verbal onde “recebe” caso nominativo – e geralmente
atribuem o papel de tema para seu argumento: “A vela apagou.”; inergativos: não admitem seu argumento
único na posição pós-verbal e geralmente atribuem o papel de agente para seu argumento: “A Maria
correu.”), no entanto, por não requererem agente, não demandam a explicitação de um elemento desse
tipo.
43- A tartaruga nadou.
isso não proporia a propriedade funcional da configuração geral como o mecanismo do
desenvolvimento embriológico do olho.
Do mesmo modo, não queremos confundir motivações funcionais para propriedades da
linguagem com mecanismo específicos que as implementam. Não queremos confundir o
fato de que a propriedade de deslocamento é exigida pelos sistemas externo com os
mecanismos das operações Atrair e seu reflexo.
O componente fonológico é responsável por outros aspectos nos quais a configuração
geral da linguagem é “imperfeita”. Ele inclui operações além daquelas que são exigidas
por qualquer sistema parecido com a linguagem, e essas operações introduzem novos
traços e elementos que não estão em itens lexicais; traços entoacionais, fonética estrita.
“Imperfeições” nesse componente da linguagem não seriam surpreendentes: de um lado,
porque o aprendiz de uma língua dispõe de evidência direta; de outro, por causa de
propriedades especiais dos sistemas sensorimotores. Se a manifestação aberta da
propriedade de deslocamento também se reduz a traços especiais do sistema
sensorimotor, então uma grande gama de imperfeições pode ter a ver com a necessidade
de “externalizar” a linguagem. Se pudéssemos nos comunicar por telepatia, elas não
surgiriam. O componente fonológico é, em certo sentido, “extrínseco” à linguagem, e é
o local onde se situa boa parte de sua imperfeição, assim se pode especular.

44- O barco afundou.

45- O palhaço deu o livro para a bailarina.


Na medida em que os vários problemas encontrem seu devido lugar, resultará que a
linguagem é uma boa, talvez até muito boa, solução para as condições impostas pela
arquitetura geral da mente/cérebro.

Segundo o Princípio de Projeção Estendido (EPP), as estruturas sintáticas são a projeção da estrutura
temática e de subcategorização dos predicadores e a posição de sujeito é obrigatória. No minimalismo,
essa obrigatoriedade é codificada como um traço EPP em T, que disponibiliza a posição de especificador
(o especificador de IP representa o argumento externo do verbo. As categorias lexicais apresentam
posições estruturais, ou modificadores, que são especificadores e os complementos) a ser preenchida. Isto
é, T é uma categoria funcional que apresenta traços não-interpretáveis que atuam como sonda. O traço
EPP determina se a sonda oferece uma posição de especificador para receber um elemento movido. Dessa
forma, o especificador do verbo (Spec, V) se move para a posição de especificador de T (Spec, T), que é a
posição de sujeito.
Em síntese, as principais diferenças entre a concepção de estrutura argumental no P&P e no PM são, em
primeiro lugar, o abandono do Princípio de Projeção Estendido, da Estrutura-D e da Estrutura-S, que
estão associados à c-seleção e à s-seleção, em P&P. No PM, o primeiro Merge passa a ser responsável
pela c-seleção e s-seleção. Em segundo lugar, a orientação minimalista propõe a explicitação de um
elemento de natureza híbrida lexical e funcional v.
23
O princípio das categorias vazias (ECP) define o conceito de regência apropriada e estipula que
categorias vazias precisam ser apropriadamente regidas. A regência apropriada ocorre em duas situações:
(i) regência lexical, que é a regência por um núcleo; e (ii) regência por antecedente, em que o vestígio é c-
comandado por um antecedente, e não está “muito longe” dele.
24
Comentário posterior do autor sobre o fato de os efeitos do sistema de caso terem manifestações que
independem do tipo de realização fonética. (N. do T.)
Suponha que o chinês e o latim tenham o mesmo sistema de caso (nominativo, acusativo, oblíquo, talvez
outras diferenciações). Em latim há várias realizações fonéticas. Em chinês não há nenhuma. Mas a teoria
do caso tem outros efeitos, e em grande número. Um é que, a menos que a língua tenha um default (o que
também tem consequências), sintagmas nominais não podem aparecer em posições que não sejam
marcadas por caso (digamos, sujeito de oração não-flexionada). Suponha que encontremos tais lacunas
em chinês. Então haveria um efeito do sistema de caso, independente do tipo de realização fonética
(relativamente rica em latim, zero em chinês). Default, em informática, é um parâmetro ou um valor
padrão, ou seja, um parâmetro adotado por um aplicativo, quando o usuário se abstém de selecionar o
parâmetro a ser utilizado.
Discussões

Primeira Palestra

Qual é o papel do contexto e da cultura na sua teoria?


O contexto e a cultura desempenham o mesmo papel que exerceram no estudo de
qualquer outro aspecto da biologia humana. Se você quiser estudar como se dá o
desenvolvimento da criança de embrião a adulto, você vai querer saber qual é a natureza
biológica do ser humano, por que ele tem braços e não asas, por que ele passa pela
puberdade numa certa idade... E você vai querer saber também qual é o efeito do
contato entre mãe e filho – acontece que ele tem grande efeito. Mesmo para ovelhas, o
contato entre a mãe e o cordeiro afeta a habilidade de perceber profundidade – apenas
uma simples capacidade visual. Assim, há alguma interação emocional entre a mãe e o
cordeiro que afeta o sistema visual. Assim, a cultura e o contexto entram na medida em
que você tenta construir um entendimento mais completo de como é a vida humana.
Essas abordagens não estão em conflito: uma apoia a outra. Se você quiser estudar
abelhas, você vai examinar a natureza interna de uma abelha, você também vai
examinar a organização social das abelhas, os sistemas de comunicação das abelhas.

Como a gramática gerativa compreende o texto como unidade?


Isso não ocorre, porque o problema é difícil demais. Nem a gramática gerativa nem
qualquer outro tópico compreende o texto como unidade. É certamente verdadeiro que
25
mesmo que embriólogo: aquele que se ocupa de ou é versado em embriologia: ramo da biologia e da
medicina que estuda o desenvolvimento do ser vivo desde a fecundação do ovo até o final do estado
embrionário (no ser humano, o fim do segundo mês).
26
denominação substituída por lente: parte lenticular (biconvexa: que apresenta duas faces convexas
opostas) e transparente do olho, entre o corpo vítreo e a câmara anterior, atuando como um dos
componentes do mecanismo de refração. Denomina-se “refração” ao desvio que a luz sofre ao passar de
um meio transparente a outro (isto é: do ar, que tem uma densidade, para dentro do olho, que possui outra
densidade, através de uma superfície curva). A forma como o olho refrata (isto é, desvia a luz) é que
determina sua capacidade de focalizar, que depende de vários fatores: da curvatura da córnea, que
compreende a maior parte do poder de refração do olho; do grau do cristalino, que focaliza a imagem
sobre a retina; e do comprimento do olho. Quando um ou mais destes fatores estiver alterado, o olho não
consegue focalizar sobre a retina de modo correto, e a visão fica, então, distorcida.

27
que está ou existe ao mesmo tempo em toda parte; que se difundiu extensamente; geral, universal.
28
ou seja, as proteínas cristalinas terem as propriedades de proteger contra danos e refratar a luz.
um texto é uma unidade, mas, como em muitas questões complicadas, simplesmente
não compreendemos quais são os princípios. Está muito além do alcance da gramática
gerativa, da análise de texto, da análise do discurso, ou qualquer outra matéria. A
compreensão teórica está faltando, como na maioria das coisas complicadas. Não
compreendemos como um nematódeo29 se comporta, embora saibamos exatamente
como é organizado e interconectado. E quando chegamos ao texto, está muito além da
compreensão teórica.

O senhor acha que o sentido é anterior à palavra, ou é gerado por ela, ou a


pergunta não tem sentido?
Se estamos considerando uma pessoa que está ouvindo alguém falando, a palavra vem
antes do sentido, obviamente. Os ossos se movem em seu ouvido e então as coisas vão
para o seu sistema auditivo, e então de certa forma atingem seu sistema cognitivo e
então, por último, você compreende algo. Isso é para o ouvinte. Se pensarmos no
falante, eu, ninguém tem a mínima ideia. Não sabemos se o significado vem primeiro e
então produzo a sentença, ou se começo a falar e então me dou conta do que estou
falando e então continuo a sentença. Isso está completamente além do alcance do
entendimento humano – agora, talvez sempre. Assim, do ponto de vista do falante, não
há nada a dizer. Do ponto de vista do ouvinte, é óbvio. Do ponto de vista da linguagem
em si mesma, a questão não se coloca. A linguagem em si mesma é um sistema de
informação armazenada, e num sistema de informação armazenada nada vem primeiro.
Cada uma das partes está simplesmente lá. É o mesmo que perguntar o que vem
primeiro no seu sistema circulatório. Não é uma pergunta com sentido, está tudo
simplesmente lá, trabalhando em interação com os outros sistemas.

O legado do conhecimento, enquanto estrutura inata, leva o homem a uma


postura espiritualista30 diante da realidade. Essa postura espiritualista não
deixa de ser política31. A pergunta é: O senhor vê algo de espiritual em sua
teoria linguística, em sua postura política?
O mundo é um lugar místico. O que isso significa ninguém sabe. No caso da linguagem,
não sabemos relacionar aspectos do mundo que entendemos parcialmente com os
mecanismos do cérebro e não temos meios de predizer como esse relacionamento será
eventualmente estabelecido – se alguma vez o for.
Estende-se isso a relações entre linguagem e política? Há vínculos, entretanto não são
conexões lógicas. Elas são conexões de analogia e especulação. A natureza humana é
uma dessas coisas sobre as quais simplesmente não entendemos muito. Temos
entendimento humano a respeito, mas não entendimento teórico. Talvez algum dia haja
um entendimento melhor, e será possível dar alguma substância a essas ideias. No
momento, elas permanecem somente especulativas.
29
Filo (ramo) de vermes em forma de fio. Seu tamanho é muito variável, indo de aproximadamente um
mm até cerca de oito metros de comprimento. Ancilóstomos, lombrigas, oxiúros e filárias são alguns
exemplos de nematelmintos (ou nematódeos) que parasitam os seres humanos.
30
relativo ao espiritualismo: doutrina que remonta às origens gregas da filosofia, e que consiste na
afirmação da existência ou realidade substancial do espírito, e de sua autonomia, diferença e
preponderância em relação ao corpo material.
31
relativo ou pertencente à política (arte ou ciência de governar; conjunto de princípios ou opiniões
políticas); formulado de maneira engenhosa, convincente, persuasiva; que ou aquele que revela esperteza,
astúcia.
Qual o seu julgamento sobre a teoria funcionalista da mente? Eu penso que
tem alguma relação com a sua abordagem anti-reducionista, não tem?
Não concordo com a teoria funcionalista. E não sou anti-reducionista. Reducionismo
não é uma questão nas ciências. Se você examina a história do caso clássico da física e
da química, as duas ciências básicas, elas se desenvolveram em relativo isolamento até
o século XX. Nos anos 30, a conexão foi estabelecida pela primeira vez. Linus Puling
ganhou o prêmio Nobel por ter mostrado que a ligação química poderia ser explicada
em termos físicos. Ele foi capaz de explicar por que certas moléculas, como O2, eram
estáveis. Ninguém tinha compreendido isso antes. Quer dizer, era verdade, mas não
havia razão física. Foi preciso a revolução quântica, que mudou totalmente a física,
antes que a relação pudesse ser estabelecida. Assim a química nunca foi reduzida à
física. De fato, o reducionismo32 é um fenômeno muito raro nas ciências naturais, em
larga escala. Algumas vezes se obtém unificação, mas ambas as partes mudam – as
partes mais fundamentais e as partes mais abstratas. Uma parte das ciências naturais é
buscar a unificação; não se pode prever o que vai acontecer. Os funcionalistas deixam
de lado a preocupação com redução ou outras formas de unificação. Eles não
consideram as descrições funcionalistas como parte do mundo real. É como se as
pessoas estivessem descrevendo as propriedades dos átomos e moléculas, digamos,
moléculas orgânicas, e dizendo: “Bem, são só propriedades que a matéria tem, não é
uma explicação do que a matéria é”. Mas isso me parece uma estranha maneira de
proceder. Não é um quadro funcionalista da matéria, é a matéria. Ela tem essas
propriedades. Por que elas as tem, não se sabia, em “termos físicos”, até recentemente,
mas agora se sabe, em termos de uma física totalmente revisada. O estudo da linguagem
deve ser igual, na minha opinião. Tanto a química como a linguística estão estudando
como coisas simples formam estruturas complexas. E estamos tentando descobrir quais
são essas coisas simples e quais são os princípios de combinação e quais os de
interação.

Supondo a existência de uma gramática universal, haveria, porém construtos 33


linguísticos mais aptos e adequados (ou línguas concretas) para expressar o
pensamento?
Se os humanos são parte da natureza, há uma gramática universal. Poderíamos fazer a
mesma pergunta sobre o sistema visual. Cada cientista pressupõe que há um sistema
visual humano que é determinado pelo dote genético, e a teoria desse sistema é a
contraparte34 da gramática universal. O mesmo é verdadeiro a respeito do sistema
circulatório, ou o fato de que temos braços e não asas. Cada aspecto de um organismo,
tem-se por certo, é a expressão de seu dote biológico sob as condições específicas de
desenvolvimento. A linguagem parece ser um desenvolvimento evolutivo recente,
exclusivo dos seres humanos, com todas as propriedades muito especiais que os outros
sistemas não têm. Na verdade, é mais como um órgão especificamente humano do que
as coisas que são comumente chamadas órgãos. Dessa forma é mais isolada do que o
rim, por exemplo, em suas propriedades. Assim, é um sistema do corpo e, se pensamos
que os seres humanos são parte do mundo, tem um estado inicial, que parece ser uma
propriedade da espécie. E a teoria desse estado é o que chamamos gramática universal.
32
tendência a reduzir uma área do conhecimento a outra mais particular, que se considera fundamental e
nuclear (por exemplo, reduzir a biologia à química, a matemática à lógica, etc.)
33
construção puramente mental, criada a partir de elementos mais simples, para ser parte de uma teoria.
34
contrapartida; aquilo que completa; complemento.
Então, não há realmente nenhuma alternativa em relação a se pressupor a gramática
universal, exceto o misticismo. A única questão que surge é: O que ela é? E aqui não faz
sentido perguntar se há uma linguagem melhor para descrevê-la. Sem dúvida, há. Se
você olhar para a história das ciências, tudo tem estado errado. E essas são ciências
jovens. As chances de que magicamente atinjam a resposta correta são muito escassas.
Assim, é claro, presumo que as teorias mudarão. Este é o modo como a ciência é. Você
aprende mais à medida que prossegue. Você pressupõe que o que está fazendo está
provavelmente errado, mas talvez seja melhor do que era antes. A teoria do sistema
visual, por exemplo, já registrou muitas realizações, mas não pode explicar por que
vemos objetos tridimensionais, por exemplo. Parece simples, mas está além do alcance
da teoria contemporânea do sistema visual, embora nesse caso seja possível faze
experimentos diretos com outros organismos.

Segunda Palestra

Sendo que as línguas são transmitidas socialmente, e não biologicamente, e


que noções tão fundamentais da lógica humana, como noções espaciais e
temporais, que variam de uma cultura para outra, também se relacionam com
o social, será que não se deveriam levar em conta processos sociais para
explicar não só a estrutura, mas até mesmo a lógica gerativa de uma língua?
Eu falo uma das variantes do inglês, e não uma das variantes do português. Nesse
sentido, a língua é socialmente transmitida. No mesmo sentido, todos os demais
aspectos da minha natureza atual são determinados, em parte, pelo meio ambiente em
que cresci. Minha altura, por exemplo. Se alguém com minha estrutura genética exata
viveu duas centenas de anos atrás, seria muito mais baixo do que eu, porque a nutrição
não era, em parte alguma, tão boa.
Na verdade, em cada área que se examine, há, é claro, mudanças significativas que são
introduzidas pelo ambiente, e a transmissão social das línguas é somente uma delas, não
muito diferente das outras. As interações sociais — como as relações entre mãe e filho,
ou também em outros mamíferos entre a mãe e o filhote — têm grandes efeitos no
crescimento, na visão, em todo tipo de coisas. Não somente nutrição, mas algo acerca
dos tipos de relações que se constroem entre mãe e filho. Sabe-se que têm efeitos muito
amplos.
Quanto à ideia de que há conceitos espaciais e temporais muito diferentes nas diferentes
culturas, isso é muito duvidoso. Parece que as línguas são muito diferentes também, até
que se comece a entendê-las. E então você vê que elas são todas basicamente a mesma
coisa. Quanto mais você entende sobre noções espaço-temporais, mais elas parecem
basicamente a mesma coisa. Por exemplo, o inglês não tem passado, presente e futuro.
Esse não é o modo como o tempo semântico é determinado em inglês. Você poderia
dizer que tem passado e não-passado. Não tem futuro, só tem um conjunto de conceitos
modais, como shall e must, can e will, que têm propriedades complicadas, mas não
futuro. Assim, se para analisar o inglês, você pensar no tempo como um tipo de linha na
qual estou de pé num ponto específico e estou olhando em direção ao futuro, e, olhando
para trás, por cima do ombro, em direção ao passado (e esse é de fato o modo como eu
penso no tempo, e, estou certo, o modo como você pensa no tempo), você prediria que
não penso no tempo do modo como realmente penso no tempo. Esses são problemas
sérios. Não há outro modo de as pessoas, de uma criança, adquirir, sem evidência,
sistemas muito complexos de organização do pensamento. E uma criança simplesmente
não tem a evidência. A vida é curta demais. Sabemos agora, a partir de experimentos
com crianças bem pequenas, que os conceitos básicos de espaço e tempo estão lá muito
cedo, muito antes de a criança poder falar ou dar qualquer indicação de como está
pensando. E, na medida em que isso é verdadeiro, eles são uniformes para todas as
culturas. Assim, tem-se de ser muito cauteloso sobre isso. Meu palpite é que a
transmissão social das línguas é provavelmente como as interações com os outros
sistemas.

Como o programa minimalista trabalha a questão dos traços fortes e fracos?


Isto é, quando um traço é fraco e, portanto, pode ser checado na Forma Lógica
em movimento coberto?
Bem, essa e uma questão técnica e um tipo de diferença desagradável. Você gostaria de
se livrar dela, se pudesse... Em meu livro mais recente chamado The minimalist
program, está lá e desempenha um papel central. Mas há um “Capítulo 5” não
publicado e não escrito desse livro – que está como que circulando no método informal
como essas coisas acontecem –, que tenta dar um argumento de que é possível se livrar
do traço forte. Isso significa mostrar que o princípio de projeção estendido é universal,
que existe em cada língua, e que as línguas VSO 35 têm, de fato, um alçamento adicional
do verbo. Se isso for verdade, então um elemento do traço de força é desnecessário. O
outro aspecto principal tem a ver com o alçamento de objeto. Assim, você encontra
alçamento manifesto do objeto em línguas como o islandês e o japonês, mas não em
inglês e francês. Essa diferença, também, foi expressa em termos de força, mas pode ser
um engano. Parece que se encontra em todas as línguas, e que a razão para que não se
veja em francês e inglês seja por causa de outras propriedades, tendo a ver com
propriedades flexionais do tempo, que também permitem que se dê uma explicação para
o que se conhece como a “generalização de Holmberg36”, as condições sob as quais o
alçamento ocorre. Se isso é verdade, então é possível se livrar do traço de força
completamente, pelo menos para movimento de sintagmas plenos. Há alguma razão
para se crer que o mesmo seja verdadeiro para “movimento de núcleo”.

35
VSO (Verbo Sujeito Objeto) é um termo utilizado em tipologia linguística. Representa um tipo de
línguas quando estas são classificadas segundo a sequência destes constituintes em expressões neutras,
por exemplo: Comeu João as maçãs. Exemplos de línguas VSO são a língua árabe padrão, o ramo das
línguas celtas insulares da família das línguas celtas, a língua maia clássica e a língua egípcia entre outras.
36
A generalização de Holmberg diz que o movimento do objeto será licenciado somente se o verbo for
movimentado para fora de VP (sintagma verbal). Assim, um objeto alçado para fora do VP força o
alçamento do verbo também para fora do VP, como ilustrado em:
JOÃOa MARIAb aDARb LIVRO NÃO
[AgrSP JOÃOi [TP [ AgrOIP MARIAj [AgrOI’ aDARbk [AgrODP LIVROm [NegP NÃO [VP ti tj tk tm]]]]]]]
Existem interpretações diversas sobre o processo de checagem de traços
formais, como a checagem de Caso, por exemplo. Alguns afirmam que essa
checagem é necessária porque a Forma Lógica não é capaz de interpretar
esses traços. Dessa forma, a checagem é interpretada como um processo que
verifica esses traços e depois os elimina. Há outra interpretação do processo,
entendendo-se como apenas uma verificação e não como eliminação. A
pergunta não é muito simples, mas o que é uma checagem de traços?
Todo mundo gostaria de saber. Meu palpite é o que eu acabei de falar na palestra: que o
motivo para checar é eliminar um traço que não pode ser lido pelo sistema semântico,
porque não tem significado. O que eu tentei sugerir é que você pode explicar as
propriedades centrais do sistema transformacional nesses termos. Mas isso não é óbvio.
Outras pessoas têm ideias diferentes, e não sabemos em que vai resultar.

Como lidar com adjunção no programa minimalista? Os advérbios possuiriam


traços formais ininterpretáveis, ou todos os seus traços já viriam do léxico?
Uma coisa sobre advérbios é que eles não se movem. Assim, você nunca interpreta um
advérbio como se ele estivesse em outra parte. Ele não tem a propriedade de
deslocamento. Um segundo fato sobre advérbios é que parecem estar adjungidos –
assim, em termos técnicos, são adjuntos, não especificadores. Agora, um programa
minimalista realmente restrito não tem muito lugar para movimento por adjunção –
talvez nenhum lugar. Guglielmo Cinque tenta mostrar que os advérbios têm posições
universais, que sua posição é universal para todas as línguas, e que as línguas só diferem
a respeito de para onde o verbo se move entre os advérbios. Ele interpreta isso em
termos de categorias funcionais vazias. Minha própria intuição era o contrário: não se
deveria ter muitas categorias dessas. A intuição de Cinque é o oposto: você deveria tê-
las em toda parte.

Nós, professores, estamos muito angustiados de perceber que, apesar dos


avanços na gramática gerativa, o ensino de gramática nas escolas de primeiro
e segundo graus continua sendo nos moldes da gramática tradicional. O
professor acha que é necessário “ensinar” gramática nas escolas? Caso
afirmativo, como abordá-la de forma que se aproxime do modelo gerativo? 
Como se deve ensinar depende de todo tipo de questão. Essas questões têm a ver com os
objetivos do sistema educacional, com problemas sociais e culturais. Quanto aos
métodos de ensino, qualquer professor sabe que cerca de 99% do problema é motivação.
Se algo é feito de maneira maçante, não importa quão maravilhosos sejam os métodos,
crianças ou adultos, indistintamente, não estarão interessados e não aprenderão nada.
Quanto a se a gramática deve ser ensinada, eu penso que, de alguma maneira, uma
pessoa devia ter alguns conceitos a respeito do modo como sua língua funciona. As
pessoas deviam saber, por exemplo, por que as sentenças significam o que significam.
Além disso, no ensino de língua, a gramática gerativa pode ser usada. Mas, além disso,
as decisões têm de ser tomadas por professores, pela comunidade e pelos pais. Eles têm
de decidir o que estão tentando ensinar às crianças. É útil para os professores entender
como a língua funciona, mas se deve usar essa informação no ensino é outra questão. E
se os professores querem ensinar os mecanismos internos das línguas é uma questão que
tem de ser respondida pelas circunstâncias e objetivos do sistema educacional. 

Qual a relação existente entre as condições de legibilidade e a interpretação da


linguagem metafórica? 
Bem, sem dúvida, há uma grande quantidade de linguagem metafórica, e ela usa
informação tanto do lado do som quanto do lado semântico. O modo como as coisas são
ditas – mesmo o som que têm – se relaciona de fato com o modo como são
interpretadas. Isso significa que há algo de errado com a ideia de que a linguagem tem
som e significado que são desconectados. A língua literária integra o lado do som e o
lado do significado de maneiras que realmente não são muito bem entendidas. Quanto
às metáforas só do lado semântico, são parte da interpretação semântica. Quer dizer, não
são somente palavras que são interpretadas. Sintagmas, algumas vezes, recebem uma
interpretação independente. Algumas vezes completamente independente, como nas
expressões idiomáticas puras, algumas vezes parcialmente independentes, como nas
metáforas em que se introduz conhecimento compartilhado sobre as circunstâncias e as
condições e a cultura, e assim por diante. Todas elas são parte do sistema interpretativo.
Está tudo acontecendo nos níveis de interface. 

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