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Projeto de Mestrado

O debate sobre a emancipação feminina no seio da FRELIMO

Marina Felicio Santos


Orientadora: Prof. Dra. Melvina Afra Mendes de Araújo

Departamento de Ciências Sociais - Unifesp

São Paulo, 2018


1
Resumo

Nesse projeto pretendemos analisar o conceito de emancipação feminina no seio da


FRELIMO e a participação de mulheres no processo de luta pela independência de
Moçambique. Isso será feito a partir da análise documental e bibliográfica sobre esta
temática.

Palavras-chave
Moçambique- Emancipação feminina- Frelimo- Independência

Introdução

Este trabalho tem como objetivo analisar o conceito de emancipação feminina no seio
da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) e a participação de mulheres no
processo de luta pela independência de Moçambique. Isso será feito a partir da análise
documental e bibliográfica sobre a participação feminina no movimento de libertação
nacional de Moçambique e a concepção de emancipação feminina defendida pelo
movimento.
Em 1955, ocorreu a Conferência de Bandung (Indonésia) que reuniu as então colônias
africanas e asiáticas com o objetivo de mapear a oposição à colonização europeia. Nesse
contexto pós-Segunda Guerra Mundial, o reflexo dessa conferência foi a eclosão de inúmeros
conflitos armados no continente africano e asiático anos mais tarde. Em 1961, se inicia o
conflito armada em Angola e em Guiné Bissau e, posteriormente, em Moçambique que foram
duramente reprimidos pelo governo português que tentava minimizar a situação conflituosa
por meio do envio constante de tropas militares às colônias (Brito e Rosas, 1996).
Nesse contexto, Portugal era governado por Antônio de Oliveira Salazar, que foi o
principal líder do Estado Novo do país e instaurou um regime ditatorial que durou até sua
morte, em 1970. Assim, a principal estratégia do governo português para reprimir os conflitos
nas colônias africanas foi transformando-as em províncias ultramarinas, que compunham o
território de Portugal, tomando este proporções multicontinentais (Nogueira, 1961: 41). Essa
ação foi o estopim para a eclosão, em 1965, do conflito armado em Moçambique, no qual a
FRELIMO teve um papel fundamental para a independência do país.
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As iniciativas de resistência à colonização foram de fundamental importância para o
movimento de independência. Segundo, Bárbara Isaacman e June Stefhan (1984), as
iniciativas anti-colonialistas foram conduzidas por mulheres, sendo mais abrangentes no
âmbito rural e algumas dessas ações tiveram grande importância. Um exemplo notório foi a
greve de Buzi, realizada em 1947, esse movimento incluiu a participação de 7.000 mulheres
que se recusaram ao cultivo do algodão, queimaram as sementes e participaram em outras
ações contra as concessionárias algodoeiras, obtendo a isenção deste trabalho para mulheres
grávidas e mães com crianças até 4 anos de idade. A propaganda de desprestígio do governo
colonial realizada pelas mulheres para a população também foi uma ação importante, além da
participação da a Frente de Libertação de Moçambique.
O movimento foi criado em 1962 como resultado de junção de três movimento de luta
contra a ocupação colonial portuguesa, nomeadamente, UDENAMO (União Democrática
Nacional de Moçambique), MANU (Mozambique African National Union) e UNAMI (União
Africana de Moçambique Independente). Tendo surgido como um movimento de luta contra
a colonização portuguesa, foi reconhecida internacionalmente recebendo solidariedade de
vários países do mundo, em particular do bloco soviético, e foi o principal articulador da
independência de Moçambique, em 1975. Transformou-se em partido político após a
realização do seu 3° Congresso, em 1977 (dois anos depois da proclamação da independência
do país), como um partido marxista-leninista de orientação socialista (NUVUNGA, 2007;
MANNING, 2007).
De acordo com Macagno (2009), nos debates no seio da FRELIMO, havia um
antagonismo no grupo, no qual disputavam de um lado, o projeto de um “nacionalismo
anti-colonial”, voltado para o combate ao inimigo externo e para a causa da independência; e,
de outro, uma noção de “socialismo” como instância político ideológica capaz de levar o país
a uma nova era modernizante. Ainda durante a luta anticolonial, a FRELIMO já controlava
várias áreas do território moçambicano, denominadas “zonas liberadas”, nas quais buscava a
superação da herança colonial e onde já havia implementado uma rede de ensino – primário,
secundário e técnico – e escolas de formação política e militar.
De acordo com Aquino de Bragança, ainda que tenha se tornado política oficial em
1977, a definição do inimigo em “termos de classe” já havia sido postulada no 1º Congresso
do Partido, em setembro de 1964, no qual se definiu como função da organização “por fim à
exploração do homem pelo homem”; buscava-se combater, além do “sistema colonial-
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fascista”, as relações capitalistas e imperialistas no país (1980:46). Para os líderes do
movimento, a noção de homem novo moçambicano estava imbricada na luta armada: era
forjada no embate entre a “velha” ordem (colonial e tradicional) e a “nova” (revolucionária).
A transformação da “cultura” viria por meio da transformação da sociedade, e somente a
“atitude de solidariedade” surgida durante a luta poderia criar uma nova nação. Um ano antes
da Independência, Samora Machel declarava:

Criar uma atitude de solidariedade entre os homens capaz de desenvolver o trabalho coletivo
pressupõe a eliminação do individualismo. Desenvolver uma moral sã e revolucionária que
promova a libertação da mulher, a criação de gerações com um sentido de responsabilidade,
exige a destruição das ideias e gostos corruptos herdados. Para implantar as bases de uma
economia próspera e avançada, é necessário que a ciência vença a superstição. Unir os
moçambicanos, para além das tradições e línguas diversas, requer que na nossa consciência
morra a tribo para que nasça a Nação (...). Devemos adquirir uma atitude científica, aberta,
livre de todos os pesos da superstição e tradições dogmáticas” (Machel, 1974:51 apud
Cabaço, 2007:405).

O Papel das Mulheres na Revolução de Moçambique

A atuação das mulheres na luta armada foi antecedida pela sua atuação em
movimentos contra o colonialismo. A organização de mulheres camponesas e das zonas
urbanas compriram um papel importante na propagando anticolonial, estudantes das cidades
de Maputo e Xai-Xai que atuavam no Núcleo dos Estudantes Secundários Africanos de
Moçambique (NESAM), foram as primeiras lideranças que compuseram os quadros iniciais
da Frelimo (ISAACMAM;STEFHAN,1984, p. 22).
O Núcleo dos Estudantes Secundários Africanos de Moçambique (NESAM), teve um
importante papel por fomentar a participação de mulheres a lutar pela independência. Um
caso emblemático foi de Josina Machel, da província de Inhambane, que se inseriu na
Frelimo em 1965, devido ao seu desempenho ocupou cargos importantes como a chefia do
Departamento de Relações Exteriores e Assuntos Sociais, dedicando-se, em especial, às
causas das mulheres integrantes, ou não, da Frente de Libertação – tendo como iniciativa a
criação de um orfanato para os filhos das combatentes (ISAACMAM; STEFHAN, 1984, P
23).
Em 1968, Josina Machel foi convidada a participar do II° Congresso da FRELIMO na
posição de delegada, onde ofereceu importantes reflexões sobre os obstáculos da participação
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feminina na revolução e apresentou algumas estratégias (Tempo, abril. 1999, P. 19). O
Congresso foi emblemático, pois discutiu as diretrizes políticas do movimento, a forma de
luta, os inimigos a serem combatidos,o papel das mulheres na revolução, entre outros
aspectos.
Em 7 de Abril de 1971, Josina Machel morreu durante a Luta Armada e se tornou
uma figura histórica de Moçambique, sendo em 1972, declarado o 7 de abril como o dia
nacional das mulheres moçambicanas (Tempo, abril. 1999, P. 19). Outras figuras importantes
fizeram parte desse processo de luta pela independência em suas diversas frentes.
A revista Tempo (apud SANTANA, 2006), publicou uma série de entrevistas com
guerrilheiras que possibilitam conhecer as diferentes opiniões de algumas mulheres
envolvidas nessa experiência de guerrilheira. Em uma entrevista publicada em 1983,
Filomena Likune, afirma que foi colega de Josina Machel, na base de Beira a partir de 1968,
sendo uma das primeiras 25 mulheres Macondes a serem treinadas, ela relata que havia
pessoas contrárias à proposta de criar um segmento feminino do exército da Frelimo. De
acordo com Likune, duvidava-se da capacidade das mulheres para a guerra e achava-se que a
contribuição delas ao processo revolucionário deveria se restringir ao trabalho nas
machambas (roças) e demais tarefas de apoio. No entanto, “a direção do Partido decidiu que
iríamos por experiência. Os resultados foram excelentes. Nenhuma de entre nós caiu durante
os treinos, corríamos grandes distâncias sem problemas, conseguimos convencer sobre a
nossa capacidade” (Tempo, mar. 1983, P 22).Outra integrante da primeira turma de
treinamento militar foi Mônica Chitupila, em sua em sua entrevista a revista Tempo mostrou
o significado da inserção das mulheres no exército:

Fazíamos o trabalho de mobilização do povo, de produção agrícola para alimentar os


combatentes. O nosso trabalho era importante porque havia pessoas que estavam convencidas
de que a guerra seria de curta duração e então desesperavam. Tínhamos de encorajá-las.
Íamos fazendo estas tarefas, mas só depois do treino político em Nachingwea, a nossa ação se
mostrou mais vigorosa. Em 1967 fiz parte do primeiro grupo que partiu do Niassa para treinar
em Nachingwea juntamente com as mulheres de Cabo Delgado... cerca de 40 mulheres
começaram os trabalhos na base (Tempo, abr. 1982, p. 23).

A condição de guerrilheiras foi uma conquista importante para as mulheres, mas de


acordo com Josina Machel, a maior contribuição delas se efetivou no campo político. Elas
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mobilizavam a população e, de modo especial às mulheres, visando despertar uma
“compreensão política da guerra” e a adesão ao movimento. Essa atuação possibilitou ao
Destacamento Feminino um substancial crescimento (Voz da Revolução, Jan. 1970, p.1-13).
Segundo Casimiro (2004), a iniciativa de solicitar treinamento militar à Frelimo partiu
das próprias mulheres com o propósito de defender as populações que se encontravam sob
sua responsabilidade. Devido a promessa de igualdade de gênero e fim da opressão pelo
colonizador, a FRELIMO criou espaço para o surgimento de organizações de mulheres em
Moçambique, sendo estas criadas até mesmo de forma independente. Apesar de oficialmente
serem regidas pelo partido. A Liga Feminina de Moçambique (Lifemo) foi a primeira
instituição criada com o intuito de dar apoio às famílias que aderiram à causa da luta sob os
objetivos da FRELIMO.
O Destacamento Feminino (DF) criado em 1966, foi composto por mulheres
guerrilheiras e a iniciativa de formar essa organização partiu da própria FRELIMO de acordo
com as publicações oficiais. No entanto, Casimiro afirma que as mulheres sentiram
necessidade de defender suas famílias tanto das zonas libertadas quanto das controladas pelo
colonialismo e solicitaram à FRELIMO um treinamento militar (CASIMIRO, 2004. P 52-54).
A Organização da Mulher Moçambicana foi criada em 1973, com o objetivo de
fomentar a emancipação e o engajamento político da mulher, tanto no âmbito nacional quanto
no internacional. Essa organização incorporou o Destacamento Feminino e se tornou um
órgão estratégico para FRELIMO, uma vez que o DF desenvolvia um trabalho político
autônoma em relação ao movimento nacionalista e com isto surgiu a necessidade de criar um
órgão que gerisse a questão da mulher subordinado a ele. Apesar de a FRELIMO, desde a sua
fundação, apresentar uma preocupação com a mulher e sua inserção no desenvolvimento da
luta armada, de modo que a ela caberia um papel central para o avanço da revolução, tal visão
não foi facilmente aceita pelos homens. De acordo Casimiro:

Esta decisão encontrou muitos obstáculos no seio do movimento, por parte de homens e
mulheres. As mulheres que se haviam juntado à luta funcionavam, muitas vezes, como
produtoras, reprodutoras, fonte de prazer sexual para os guerrilheiros que, sob a direção de
alguns charmien (chefes tradicionais homens), organizavam o controle da sua força de
trabalho e o controle dos homens, ao seu acesso. Alguns homens afirmavam que mulher era
um ser fraco, que não aguentava os treinos militares e que era perigoso aproximar fogo do
capim (CASIMIRO, 2004, p.173-174).
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O OLHAR DA FRELIMO SOBRE A EMANCIPAÇÃO FEMININO

O debate sobre a libertação e a emancipação feminina no seio da FRELIMO sempre


causou divergências internos. A decisão de incluir as mulheres no processo revolucionário
não foi resultado de um consenso. Um discurso histórico proferido por Samora Machel,
presidente da Frente Nacional de Libertação de Moçambique e da República Popular de
Moçambique intitulado “A libertação da mulher é uma necessidade da revolução, garantia de
continuidade, condição de seu triunfo”, se tornou um clássico sobre uma determinada noção
de emancipação feminina no contexto dos anos 70.
De forma geral, o discurso de emancipação da mulher fez parte do discurso socialista,
apesar de a FRELIMO ter sido o primeiro movimento socialista a incorporar a emancipação
feminina à luta de libertação nacional (CASIMIRO, 2004, P 172). Sob influência do discurso
socialista, mulheres se tornaram combatentes na Europa, Ásia, África e América Latina se
envolvendo em processos de lutas político-militares de seus países, como nos casos da China,
Timor Leste, Rússia, Albânia, Moçambique, Angola, Zimbábue, Argélia, Nicarágua, Cuba e
San Salvador, dentre outros.
O pensamento socialista no geral, entendia a opressão feminina como resultado do
isolamento das mulheres no espaço domiciliar, considerado pelas feministas como um grande
obstáculo à sua inserção no campo da produção. Porém, em Moçambique, as mulheres que
controlavam a produção, cabendo-lhes o trabalho na agricultura e no comércio ambulante a
fim de proverem suas famílias. Durante a colonização, as mulheres foram marginalizadas das
relações de produção do Estado, além do trabalho ser um atributo legalmente da população
masculina, predominou nesse período, uma agricultura de modelo capitalista voltada para o
mercado exterior e de mão-de-obra assalariada. Entretanto, a atuação feminina na produção
familiar se manteve, sendo recrutadas também para o trabalho em roças de particulares ou do
Estado colonial, na abertura de estradas e trabalhos domésticos, como forma de pagamento
das dívidas de seus parentes masculinos.
A emancipação feminina esteve presente, de maneira geral, nos discursos socialistas
em todo o mundo, mas, ao contrário desses movimentos que adiaram essa ação para um fase
posterior da revolução, a FRELIMO entendia que a emancipação da mulher deveria ser feita
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simultaneamente a libertação nacional e estruturação do socialismo, sendo a participação
feminina essencial no processo revolucionário. Segundo Somara:

A Revolução tem por objetivo essencial a destruição do sistema de exploração, a construção


duma nova sociedade libertadora das potencialidades do ser humano e que o reconcilia com o
trabalho com a natureza. É dentro deste contexto que surge a questão da emancipação da
mulher. De uma maneira geral, no seio da sociedade, ela aparece como o ser mais oprimido,
mais humilhado, mais explorado. Ela é explorada até pelo explorado, batida pelo homem
rasgado pela palmatória, humilhada pelo homem esmagado pela bota do patrão e do colono
(MACHEL, 1973, p.18)

A primeira Conferência das Mulheres Moçambicanas foi realizado em


1973, na Tanzânia. Esse evento teve como objetivo discutir a condição
social das mulheres moçambicanas e pensar estratégias para a sua
emancipação. Nessa Conferência estiveram reunidas mulheres de diferentes

Províncias, profissões, condições sociais, idades e “etnias” − tanto do


norte quanto do sul de Moçambique, incluindo camponesas, professoras,
enfermeiras, militares, estudantes, solteiras e casadas (MACHEL, 1979. P
13-44).
Em seu discurso, Machel revelou alguns aspectos do debate que vinha ocorrendo
sobre a mulher na FRELIMO, explicando as razões pelas quais era tão importante emancipar
a mulher libertando–a da opressão sofrida até então, apontando as contradições existentes no
seio do partido com relação a tal assunto e qual seria o momento correto de se fazer isto.
Segundo ele:

Existem pessoas no nosso seio, a organização está consciente disso, que acham que devemos
consagrar todos os nossos esforços à luta contra o colonialismo, que a tarefa da emancipação
da mulher neste quadro é secundária, pois leva-nos a um desperdício das nossas forças.
Acrescentam ainda que a situação em que vivemos, com escassez de escolas, com poucas
mulheres instruídas, com as mulheres apegadas à tradição, não nos fornece as bases de partida
para uma acção consequente; por isso importa aguardar a independência, a construção duma
base económica, social e educacional sólida para desencadear a batalha. Outros dizem ainda,
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interpretando tendenciosamente os Estatutos, que é necessário respeitar certas particularidades
tradicionais locais, que não as podemos combater nesta fase, pois arriscamo-nos a perder o
apoio das massas (MACHEL, 1973, p.17).

O movimento frisava a importância da mulher no processo revolucionário e a sua


libertação e emancipação, apesar disso, o papel que a mulher exercia no lar e o seu lado
materno era bastante exaltado. As guerrilheiras da FRELIMO faziam um trabalho
clandestino, na preparação dos quadros e no abastecimento de novas frentes, mas a elas eram
destinadas tarefas específicas como: formar uma nova geração, criar crianças e as apresentar
uma nova mentalidade. A partir da exposição dessas tarefas Samora reforçou o papel clássico
associado à mulher como aquela que é responsável por educar, cuidar e orientar essa geração
que faria nascer a nova sociedade moçambicana calcada nos ideais de progresso e abandono
das tradições. Conforme Samara:

Considerando ainda a necessidade fundamental de a Revolução ser prosseguida pelas novas


gerações, como poderemos assegurar a formação revolucionária das gerações de
continuadores, se a mãe, primeira educadora, se encontra à margem do processo
revolucionário? Como fazer do lar do explorado, do oprimido, uma célula do combate
revolucionário, um centro difusor da nossa linha, um estímulo para o engajamento da família,
quando a mulher permanece apática a este processo, indiferente à sociedade que está sendo
criada e surda ao apelo do Povo? (MACHEL, 1973, p.18).

A representação da mulher é feita de forma estereotipado e reforça a maternidade


como algo inerente à natureza feminina, reforçando o imaginário de que a mulher deve ser
uma boa esposa, mãe afetuosa e privar pela família. Por essa razão, a emancipação da mulher
era vista como algo urgente e necessário, pois sua natureza formadora e orientadora, teria de
grande importância para a luta. A FRELIMO almejava um projeto de nação e nesta o
racismo, o tribalismo, e o obscurantismo não deveriam existir. Por meio de uma relação
dicotômica entre o novo e o velho, em uma tentativa de transformar os valores e a tradição
baseada nos costumes acreditava- se que

Logo que se desencadeou o processo de exploração, a mulher na sua generalidade,como o


homem, foi submetida à dominação das camadas privilegiadas. A mulher é também um
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produtor, um trabalhador, mas com qualidades particulares. Possuir mulheres é possuir
trabalhadores, trabalhadores gratuitos, trabalhadores cuja totalidade do esforço de trabalho
pode ser apropriada sem resistência pelo esposo, que é amo e senhor. Casar-se com muitas
mulheres na sociedade de economia agrária torna-se um meio certo para acumular muitas
riquezas. O marido assegura-se de uma mão-de-obra gratuita, que não reclama nem se revolta
contra a exploração. Daí a importância da poligamia nas zonas rurais de economia agrária
primitiva.A sociedade, compreendendo que a mulher é uma fonte de riqueza, exige que um
preço seja pago. Os pais requerem do futuro genro o pagamento dum preço, o “lobolo”, para
cederem a filha. A mulher é comprada, herdada, como se fosse um bem material, uma fonte
de riquezas (MACHEL, 1973, p.22).

O discurso Samora, demonstra a visão sobre a emancipação feminina defendida no


seio FRELIMO, na qual divergia em relação aos tipos de mulher emancipada que era
defendida em algumas sociedades, sendo uma concepção errônea na sua opinião. Para a
FRELIMO, a emancipação feminina não consistia em igualar homens e mulheres em suas
atitudes, ações e estilos de vida. Para ele,

Se na FRELIMO ainda não há mulheres tratoristas ou motoristas é necessário imediatamente


que haja, sem ter em conta as condições objetivas e subjetivas. A emancipação concebida
mecanicamente leva, como vemos por exemplo nos países capitalistas, a reclamações e
atitudes que deturpam inteiramente o sentido da emancipação da mulher. A mulher
emancipada é a que bebe, é a que fuma, é a que usa calças e mini saias, a que se dedica à
promiscuidade sexual, a que recusa ter filhos, etc. Outros, identificam a emancipação com a
acumulação de diplomas, o diploma universitário em particular aparecendo como um
certificado de emancipação.Há ainda quem considere que a emancipação consiste em ter
acesso a um certo nível econômico, social, cultural.Todas estas concepções são erradas e
superficiais. Nenhuma delas atinge o coração da contradição nem propõe uma linha que
verdadeiramente emancipe a mulher (MACHEL, 1973, p.27).

Objetivos

Este trabalho tem como objetivo analisar o conceito de emancipação feminina no seio
da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) e a participação de mulheres no
processo de luta pela independência de Moçambique. Ressaltando as contradições internas do
10
movimento sobre o papel da mulher na revolução e a importância de sua emancipação para
romper com as estruturas coloniais.
Apesar de a FRELIMO, desde a sua fundação, apresentar uma preocupação com a
mulher e sua inserção no desenvolvimento da luta armada, de modo que a ela caberia um
papel central para o avanço da revolução, tal visão não foi facilmente aceita pelos homens.
No geral, a emancipação da mulher era tratada nos discursos socialista em todo o
mundo, mas, ao contrário desses movimentos que adiaram essa ação para um fase posterior
da revolução, a FRELIMO entendia que a emancipação da mulher deveria ser feita
simultaneamente a libertação nacional e estruturação do socialismo.
Antes da inserção das mulheres na luta armada, algumas experiências se mostram
relevantes para luta anticolonial, uma vez a iniciativa do treinamento militar partiram das
mulheres. É importante investigar o discurso oficial do movimento nacionalista e as diversas
opiniões dessas mulheres envolvidas nesse contexto. A experiência das mulheres como
guerrilheiras deu lugar a conflitos e divergências no movimento nacionalista, como também a
emergência de novas concepções sobre a mulher e o seu lugar na sociedade, possibilitando a
construção de um discurso sobre a mulher pela Frelimo.

Metodologia

1. Realização de pesquisa bibliográfica e documental sobre o conceito de emancipação


feminina no seio da FRELIMO.
2. Análise bibliográfica e documental da participação feminina no movimento de libertação
nacional de Moçambique

A análise desse projeto parte da compreensão do discurso produzido pela Frelimo


sobre a emancipação feminina, por meio do discurso do Samora Machel A Libertação da
Mulher de 1979. E também as narrativas de mulheres fora do discurso oficial, em sua
maioria, publicadas em revistas com a Tempo e a Voz da Revolução .
11
Essa investigação será feita por meio de coleta e análise do material bibliográfico e
documental produzido pela FRELIMO e veículos de informações não oficiais, atentando-se
para as diversas narrativas, sobretudo as narrativas de mulheres envolvidas nesse contexto.
Como aporte teórico diversos autores seguem essa linha de investigação, como : Cruz
e Silva (2001[1992]), CASIMIRO (2004 [2001]), Mamdani (1998 [1996]), Fortes (2010
[1937]); SAACMAM, Bárbara e STEFHAN (1984), entre outros.

Cronograma de atividades

SEMESTRES/ 2019: 2019: 2020: 2020:


ATIVIDADES 2° sem 1º sem 2º sem 1º sem

Pesquisa documental * * * *
e bibliográfica

Leitura do material * * *
coletado

Análise de dados * * *

Elaboração do *
relatório parcial

Elaboração do *
relatório final

Bibliografia
12
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