Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Palavras-chave
Moçambique- Emancipação feminina- Frelimo- Independência
Introdução
Este trabalho tem como objetivo analisar o conceito de emancipação feminina no seio
da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) e a participação de mulheres no
processo de luta pela independência de Moçambique. Isso será feito a partir da análise
documental e bibliográfica sobre a participação feminina no movimento de libertação
nacional de Moçambique e a concepção de emancipação feminina defendida pelo
movimento.
Em 1955, ocorreu a Conferência de Bandung (Indonésia) que reuniu as então colônias
africanas e asiáticas com o objetivo de mapear a oposição à colonização europeia. Nesse
contexto pós-Segunda Guerra Mundial, o reflexo dessa conferência foi a eclosão de inúmeros
conflitos armados no continente africano e asiático anos mais tarde. Em 1961, se inicia o
conflito armada em Angola e em Guiné Bissau e, posteriormente, em Moçambique que foram
duramente reprimidos pelo governo português que tentava minimizar a situação conflituosa
por meio do envio constante de tropas militares às colônias (Brito e Rosas, 1996).
Nesse contexto, Portugal era governado por Antônio de Oliveira Salazar, que foi o
principal líder do Estado Novo do país e instaurou um regime ditatorial que durou até sua
morte, em 1970. Assim, a principal estratégia do governo português para reprimir os conflitos
nas colônias africanas foi transformando-as em províncias ultramarinas, que compunham o
território de Portugal, tomando este proporções multicontinentais (Nogueira, 1961: 41). Essa
ação foi o estopim para a eclosão, em 1965, do conflito armado em Moçambique, no qual a
FRELIMO teve um papel fundamental para a independência do país.
2
As iniciativas de resistência à colonização foram de fundamental importância para o
movimento de independência. Segundo, Bárbara Isaacman e June Stefhan (1984), as
iniciativas anti-colonialistas foram conduzidas por mulheres, sendo mais abrangentes no
âmbito rural e algumas dessas ações tiveram grande importância. Um exemplo notório foi a
greve de Buzi, realizada em 1947, esse movimento incluiu a participação de 7.000 mulheres
que se recusaram ao cultivo do algodão, queimaram as sementes e participaram em outras
ações contra as concessionárias algodoeiras, obtendo a isenção deste trabalho para mulheres
grávidas e mães com crianças até 4 anos de idade. A propaganda de desprestígio do governo
colonial realizada pelas mulheres para a população também foi uma ação importante, além da
participação da a Frente de Libertação de Moçambique.
O movimento foi criado em 1962 como resultado de junção de três movimento de luta
contra a ocupação colonial portuguesa, nomeadamente, UDENAMO (União Democrática
Nacional de Moçambique), MANU (Mozambique African National Union) e UNAMI (União
Africana de Moçambique Independente). Tendo surgido como um movimento de luta contra
a colonização portuguesa, foi reconhecida internacionalmente recebendo solidariedade de
vários países do mundo, em particular do bloco soviético, e foi o principal articulador da
independência de Moçambique, em 1975. Transformou-se em partido político após a
realização do seu 3° Congresso, em 1977 (dois anos depois da proclamação da independência
do país), como um partido marxista-leninista de orientação socialista (NUVUNGA, 2007;
MANNING, 2007).
De acordo com Macagno (2009), nos debates no seio da FRELIMO, havia um
antagonismo no grupo, no qual disputavam de um lado, o projeto de um “nacionalismo
anti-colonial”, voltado para o combate ao inimigo externo e para a causa da independência; e,
de outro, uma noção de “socialismo” como instância político ideológica capaz de levar o país
a uma nova era modernizante. Ainda durante a luta anticolonial, a FRELIMO já controlava
várias áreas do território moçambicano, denominadas “zonas liberadas”, nas quais buscava a
superação da herança colonial e onde já havia implementado uma rede de ensino – primário,
secundário e técnico – e escolas de formação política e militar.
De acordo com Aquino de Bragança, ainda que tenha se tornado política oficial em
1977, a definição do inimigo em “termos de classe” já havia sido postulada no 1º Congresso
do Partido, em setembro de 1964, no qual se definiu como função da organização “por fim à
exploração do homem pelo homem”; buscava-se combater, além do “sistema colonial-
3
fascista”, as relações capitalistas e imperialistas no país (1980:46). Para os líderes do
movimento, a noção de homem novo moçambicano estava imbricada na luta armada: era
forjada no embate entre a “velha” ordem (colonial e tradicional) e a “nova” (revolucionária).
A transformação da “cultura” viria por meio da transformação da sociedade, e somente a
“atitude de solidariedade” surgida durante a luta poderia criar uma nova nação. Um ano antes
da Independência, Samora Machel declarava:
Criar uma atitude de solidariedade entre os homens capaz de desenvolver o trabalho coletivo
pressupõe a eliminação do individualismo. Desenvolver uma moral sã e revolucionária que
promova a libertação da mulher, a criação de gerações com um sentido de responsabilidade,
exige a destruição das ideias e gostos corruptos herdados. Para implantar as bases de uma
economia próspera e avançada, é necessário que a ciência vença a superstição. Unir os
moçambicanos, para além das tradições e línguas diversas, requer que na nossa consciência
morra a tribo para que nasça a Nação (...). Devemos adquirir uma atitude científica, aberta,
livre de todos os pesos da superstição e tradições dogmáticas” (Machel, 1974:51 apud
Cabaço, 2007:405).
A atuação das mulheres na luta armada foi antecedida pela sua atuação em
movimentos contra o colonialismo. A organização de mulheres camponesas e das zonas
urbanas compriram um papel importante na propagando anticolonial, estudantes das cidades
de Maputo e Xai-Xai que atuavam no Núcleo dos Estudantes Secundários Africanos de
Moçambique (NESAM), foram as primeiras lideranças que compuseram os quadros iniciais
da Frelimo (ISAACMAM;STEFHAN,1984, p. 22).
O Núcleo dos Estudantes Secundários Africanos de Moçambique (NESAM), teve um
importante papel por fomentar a participação de mulheres a lutar pela independência. Um
caso emblemático foi de Josina Machel, da província de Inhambane, que se inseriu na
Frelimo em 1965, devido ao seu desempenho ocupou cargos importantes como a chefia do
Departamento de Relações Exteriores e Assuntos Sociais, dedicando-se, em especial, às
causas das mulheres integrantes, ou não, da Frente de Libertação – tendo como iniciativa a
criação de um orfanato para os filhos das combatentes (ISAACMAM; STEFHAN, 1984, P
23).
Em 1968, Josina Machel foi convidada a participar do II° Congresso da FRELIMO na
posição de delegada, onde ofereceu importantes reflexões sobre os obstáculos da participação
4
feminina na revolução e apresentou algumas estratégias (Tempo, abril. 1999, P. 19). O
Congresso foi emblemático, pois discutiu as diretrizes políticas do movimento, a forma de
luta, os inimigos a serem combatidos,o papel das mulheres na revolução, entre outros
aspectos.
Em 7 de Abril de 1971, Josina Machel morreu durante a Luta Armada e se tornou
uma figura histórica de Moçambique, sendo em 1972, declarado o 7 de abril como o dia
nacional das mulheres moçambicanas (Tempo, abril. 1999, P. 19). Outras figuras importantes
fizeram parte desse processo de luta pela independência em suas diversas frentes.
A revista Tempo (apud SANTANA, 2006), publicou uma série de entrevistas com
guerrilheiras que possibilitam conhecer as diferentes opiniões de algumas mulheres
envolvidas nessa experiência de guerrilheira. Em uma entrevista publicada em 1983,
Filomena Likune, afirma que foi colega de Josina Machel, na base de Beira a partir de 1968,
sendo uma das primeiras 25 mulheres Macondes a serem treinadas, ela relata que havia
pessoas contrárias à proposta de criar um segmento feminino do exército da Frelimo. De
acordo com Likune, duvidava-se da capacidade das mulheres para a guerra e achava-se que a
contribuição delas ao processo revolucionário deveria se restringir ao trabalho nas
machambas (roças) e demais tarefas de apoio. No entanto, “a direção do Partido decidiu que
iríamos por experiência. Os resultados foram excelentes. Nenhuma de entre nós caiu durante
os treinos, corríamos grandes distâncias sem problemas, conseguimos convencer sobre a
nossa capacidade” (Tempo, mar. 1983, P 22).Outra integrante da primeira turma de
treinamento militar foi Mônica Chitupila, em sua em sua entrevista a revista Tempo mostrou
o significado da inserção das mulheres no exército:
Esta decisão encontrou muitos obstáculos no seio do movimento, por parte de homens e
mulheres. As mulheres que se haviam juntado à luta funcionavam, muitas vezes, como
produtoras, reprodutoras, fonte de prazer sexual para os guerrilheiros que, sob a direção de
alguns charmien (chefes tradicionais homens), organizavam o controle da sua força de
trabalho e o controle dos homens, ao seu acesso. Alguns homens afirmavam que mulher era
um ser fraco, que não aguentava os treinos militares e que era perigoso aproximar fogo do
capim (CASIMIRO, 2004, p.173-174).
6
Existem pessoas no nosso seio, a organização está consciente disso, que acham que devemos
consagrar todos os nossos esforços à luta contra o colonialismo, que a tarefa da emancipação
da mulher neste quadro é secundária, pois leva-nos a um desperdício das nossas forças.
Acrescentam ainda que a situação em que vivemos, com escassez de escolas, com poucas
mulheres instruídas, com as mulheres apegadas à tradição, não nos fornece as bases de partida
para uma acção consequente; por isso importa aguardar a independência, a construção duma
base económica, social e educacional sólida para desencadear a batalha. Outros dizem ainda,
8
interpretando tendenciosamente os Estatutos, que é necessário respeitar certas particularidades
tradicionais locais, que não as podemos combater nesta fase, pois arriscamo-nos a perder o
apoio das massas (MACHEL, 1973, p.17).
Objetivos
Este trabalho tem como objetivo analisar o conceito de emancipação feminina no seio
da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) e a participação de mulheres no
processo de luta pela independência de Moçambique. Ressaltando as contradições internas do
10
movimento sobre o papel da mulher na revolução e a importância de sua emancipação para
romper com as estruturas coloniais.
Apesar de a FRELIMO, desde a sua fundação, apresentar uma preocupação com a
mulher e sua inserção no desenvolvimento da luta armada, de modo que a ela caberia um
papel central para o avanço da revolução, tal visão não foi facilmente aceita pelos homens.
No geral, a emancipação da mulher era tratada nos discursos socialista em todo o
mundo, mas, ao contrário desses movimentos que adiaram essa ação para um fase posterior
da revolução, a FRELIMO entendia que a emancipação da mulher deveria ser feita
simultaneamente a libertação nacional e estruturação do socialismo.
Antes da inserção das mulheres na luta armada, algumas experiências se mostram
relevantes para luta anticolonial, uma vez a iniciativa do treinamento militar partiram das
mulheres. É importante investigar o discurso oficial do movimento nacionalista e as diversas
opiniões dessas mulheres envolvidas nesse contexto. A experiência das mulheres como
guerrilheiras deu lugar a conflitos e divergências no movimento nacionalista, como também a
emergência de novas concepções sobre a mulher e o seu lugar na sociedade, possibilitando a
construção de um discurso sobre a mulher pela Frelimo.
Metodologia
Cronograma de atividades
Pesquisa documental * * * *
e bibliográfica
Leitura do material * * *
coletado
Análise de dados * * *
Elaboração do *
relatório parcial
Elaboração do *
relatório final
Bibliografia
12
ALAMBERT, Zuleica. Feminismo: O ponto de vista Marxista. São Paulo: Nobel, 1986.
MACHEL, Samora. et al. A Libertação da mulher. São Paulo: Parma, 1979. p. 13-44.
(Coleção bases n. 15)
BÂ, Hampate. A tradição viva In: KIZERBO, Joseph (coord).História geral da África:
metodologia e pré-história daÁfrica. São Paulo: Ática, 1982, pp 162-171.
13
MATEUS, Dalila Cabrita. A Luta pela independência: a formação das elites fundadoras da
Frelimo, MPLA, PAIGC. Portugal: Inquérito, 1999. pp 50-124.
COMITINI, Carlos. A África arde: lutas dos povos africanos pela liberdade. Rio de Janeiro:
Codecri, 1980. p. 18-119.
___________. Nem pai nem mãe: crítica do parentesco: o caso macua. Lisboa:Ndjira, 2000.
GRANJA, ANA CARLA. O aborto e o direito de controlar o próprio corpo. Notícias de
Moçambique. Maputo. N. 76. 7 de abr 1996.
OLIVEIRA, Irene Dias de. Identidade negada e o rosto desfigurado do povo africano. São
Paulo: Universidade Católica de Goiás, 2002.
14
FONTES
MACHEL, Samora. Estabelecer o poder popular para servir as massas. Rio: Codecri,
1979.
MACHEL, Samora. Declaremos guerra ao inimigo inteiro. São Paulo: Quilombo, 1980.
SEMINÁRIO NACIONAL DE INFORMAÇÃO, 1977, 1. 1977,Maputo. Anais... Maputo:
ONJ, 1977.
Revista Tempo de 1975-1985 (513 edições)
Dia da mulher moçambicana. In: A Voz da Revolução, na 21, janeiro-abril de 1974, p.09.