Você está na página 1de 3

        As alterações no texto da Lei de Arbitragem foram, acertadamente, pontuais –

a aplicação da versão original da Lei nº 9307/96 pelos tribunais, notadamente o


STJ, apresenta saldo amplamente positivo e não há razões que justificassem a
substituição total das regras em vigor. Como se sabe, a grande virada da
arbitragem no Brasil se deu justamente com a edição da lei em vigor. Antes de sua
edição, essa forma de solução de controvérsias nunca chegou a alcançar o
destaque atingido em países europeus e nos Estados Unidos, principalmente em
razão do panorama legislativo vigente.    Os três principais empecilhos então
existentes eram (1) a equiparação da cláusula compromissória à mera obrigação
de fazer, cujo descumprimento resolvia-se, quando muito, por meio de indenização
pecuniária; (2) a exigência de que o laudo arbitral proferido no Brasil fosse
homologado pelo Judiciário; e (3) a exigência de dupla homologação dos laudos
arbitrais estrangeiros.

        A lei de arbitragem eliminou todos estes obstáculos, conferindo força


vinculante à cláusula compromissória, que neste ponto se equipara ao
compromisso arbitral (art. 3º), suprimindo a necessidade de homologação das
sentenças arbitrais proferidas no Brasil, corolário da equiparação entre sentenças
arbitrais e judiciais (arts. 18 e 31) e afastando a exigência da homologação judicial
estrangeira não prevista no direito estrangeiro (art. 38).

   

Além disso, consagrou o princípio da Kompetenz-kompetenz – leia-se: reserva de


primeira palavra –, que estabelece a competência do árbitro para decidir, em
primeiro lugar, sobre a sua própria competência (arts. 8º e 20), estabeleceu de
forma ampla a possibilidade de estipulação, por pessoas capazes, da arbitragem
como meio de resolver litígios relacionados a direitos patrimoniais disponíveis (art.
1º) e ainda encerrou parte de longa discussão doutrinária acerca da possibilidade
de escolha da lei aplicável às disputas entre particulares (art. 2º, § 1º).
        De forma geral, as mudanças promovidas pela Lei nº 13129 consolidaram
orientações jurisprudenciais favoráveis à arbitragem – é esse o caso da
autorização da arbitragem envolvendo a Administração Pública indireta, já
reconhecida por ao menos 4 precedentes do STJ ( RESP 904.813, RESp 612.439,
REsp 606.345 e AgRg MS 11308), e também da arbitragem em matéria societária.
É importante perceber também que alguns refinamentos constantes na lei foram
além da legalização de orientações jurisprudenciais – é o caso da autorização
expressa para a arbitragem envolvendo a Administração Pública direta, observada
a publicidade e vedada a resolução por equidade (art. 2º § 3º), e também a
regulamentação expressa do quorum para inserção de convenção de arbitragem
em estatuto social (art. 136-A da Lei 6.404/1976), bem como dos casos em que tal
inclusão confere direito de retirada aos acionistas dissidentes.

Esse também é o caso da criação da carta arbitral. Embora antes mesmo da


promulgação da Lei nº 13129 já houvesse previsão expressa no CPC de 2015 (Lei
nº 13.105/2015, art. 237, IV), vale lembrar que quando da elaboração do projeto
de Reforma da Lei de Arbitragem ainda havia incertezas acerca do conteúdo e da
efetiva entrada em vigor do novo CPC.

        Esta última mudança elimina alguns inconvenientes. Inexistindo meio


institucionalizado próprio para a cooperação entre Judiciário e tribunais arbitrais, a
efetivação de decisões do tribunal ao longo do procedimento arbitral – medidas
cautelares, determinação de oitiva de testemunhas ou produção de provas em
geral – poderia mesmo depender do ajuizamento de ação perante o órgão
jurisdicional competente, o que tornava menos eficiente o procedimento arbitral e
frustrava algumas de suas finalidades, notadamente a celeridade. Sem pretender
prever o efeito concreto da carta arbitral, é seguro afirmar que o instituto criado é
em tese apto a solucionar todos os inconvenientes descritos. A mudança permitirá
que o atendimento a solicitações oriundas de tribunais arbitrais pelo Judiciário
ocorra por via semelhante àquela disponível para solicitações formuladas por
órgãos judiciais de competência diferentes (carta precatória) ou oriundos de outro
Estado (carta rogatória). A equiparação faz sentido, pois o árbitro é juiz de fato e
de direito (Lei de Arbitragem, art. 18) e a sentença proferida ao final do
procedimento produz os mesmos efeitos das sentenças proferidas por órgãos do
Judiciário (art. 31).

        Outra alteração sutil, consiste na nova redação do art. 13, § 4º. A versão
original do dispositivo previa a escolha do presidente do tribunal arbitral pelos co-
árbitros, quando houver, elegendo, ainda, a idade como método de solução de
eventual impasse.

        A nova lei aboliu ambas as regras: a forma de escolha do presidente de


tribunais compostos por mais de um árbitro deve ser estipulada diretamente pelas
partes ou pelo regulamento a que se referirem. Ademais, reafirmou-se a
centralidade da ideia de liberdade das partes na arbitragem ao se permitir que as
partes consensualmente afastem a limitação, constante em regulamento de
arbitragem, da escolha do árbitro a nomes que integram listas institucionais.

        Pode-se considerar que a Lei nº 13129 inaugura nova fase da arbitragem no


Brasil. A promulgação da Lei nº 9307 foi o marco formal do ingresso tardio do
Brasil no período iluminista – a Lei de Arbitragem criou cenário normativo
favorável, propiciou a ampla divulgação do instituto e foi bem recebida pelo
Judiciário.

Você também pode gostar