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Unitermos: RESUMO
insuficiência renal Pacientes renais crônicos apresentam diversas manifestações bucais,
crônica, manifesta- por isso, o atendimento odontológico envolve uma série de peculia-
ções bucais, trata- ridades inerentes à doença renal. O cirurgião dentista deve estar apto
mento odontológi- para o manejo desses pacientes, pois são necessários cuidados espe-
co. cíficos em relação ao uso adequado de medicações e o melhor mo-
mento para intervenções odontológicas. O aumento da prevalência
da doença renal crônica no Brasil requer um preparo por parte de toda
equipe médica e dos cirurgiões dentistas, em relação ao tratamento
destes pacientes, tanto no ambiente hospitalar, atuando em conjunto
com a equipe multidisciplinar, ou em ambiente ambulatorial.O objeti-
vo deste trabalho é revisar a literatura a respeito do manejo odontoló-
gico em pacientes com doença renal crônica em tratamento dialítico
e dos pacientes transplantados.
Uniterms: ABSTRACT
renal chronic insuffi- Chronic kidney disease patients present several characteristic oral
ciency, oral manifes- manifestations and require that their dental treatment take in consi-
tations, dental care. deration the vast range of particularities related to this disease. The
dentist needs to be prepared to handle patients with chronic kidney
disease due to the specific considerations related to these patients,
when prescribing drugs and identifying the best time for dental inter-
ventions. The increase in the prevalence of chronic kidney disease in
Brazil demands a good coordinated multidisciplinary involvement of
the medical and dental professionals to treat those compromised pa-
tients in the hospital or ambulatory care. The objective of this article
is to review the literature on the topic of handling dental patients with
chronic kidney disease undergoing dialysis and patients that had kid-
ney transplant.
*Especialista em Periodontia - UFBA/Salvador, BA, Brasil; Especialista em Implantodontia – FTC/Salvador. Profª. de Periodontia e
Clínica Odontológica - FTC/Salvador, BA. Profª. da Especialização em Implantodontia - - FTC/Salvador, BA.
**Especialista em Endodontia - UFBA/Salvador, BA.
***Doutora em Odontologia. Profª. da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia
****Especialista em pacientes com necessidades especiais; Habilitada em Odontologia Hospitalar – USP/São Paulo, SP. Doutoranda
em Medicina e Saúde - UFBA/Salvador, BA.
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MANEJO ODONTOLÓGICO DO PACIENTE RENAL CRÔNICO: UMA REVISÃO DE LITERATURA REVISÃO DE
DENTAL MANAGEMENT OF THE CHRONIC RENAL PATIENT LITERATURA
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primária dos rins, doenças sistêmicas que aco- gue. O exame, portanto, mostra o quanto de
metem os rins e doenças do trato urinário. A creatinina está presente no sangue e o quanto
nefropatia diabética, hipertensão e glomeru- está sendo excretada na urina8.
lonefrite primária são as causas mais comuns A disfunção renal crônica tem como
da IRC. No paciente com IRC observa-se de- consequência acúmulo de toxinas, desequi-
gradação das funções bioquímicas e fisioló- líbrio hidroeletrolítico e ácido-base, hipovo-
gicas do organismo, decorrente da falha de lemia, hipercalemia, hiperfosfatemia, anemia
filtração glomerular2,12com diminuição da fun- e distúrbio hormonal, hiperparatireoidismo,
ção renal e/ou lesão no parênquima,por pelo infertilidade, retardo no crescimento, entre
menos três meses consecutivos4,13. outros2. Devido ao acúmulo de eletrólitos,
O melhor parâmetro para avaliar a taxa desequilíbrio dos fluidos e hormônios, decor-
de filtração glomerular é o Clearence de Crea- rentes da falha da função renal, aparecem os
tinina. Esse exame ajuda a diagnosticar disfun- primeiros sinais e sintomas da uremia (Qua-
ções renais. Trata-se de um comparativo entre dro 1), também conhecida como uremia ou
a dosagem de creatinina no sangue e na urina. síndrome urêmica. A uremia é o aumento nos
A creatinina deve ser filtrada nos rins e excre- níveis de ureia no sangue que causa um com-
tada na urina. Quando os rins não estão em prometimento sistêmico em diversos órgãos e
pleno funcionamento, a filtragem da creatini- sistemas5.
na é comprometida e essa permanece no san-
Quadro 1: Sinais e sintomas da uremia.5
ALTERAÇÕES SISTÊMICAS DECORRENTES DA UREMIA
Cardiovasculares Arritmias, cardiomiopatias, hipertensão arterial, pericardite.
Dermatológicas Prurido, equimoses, palidez, hiperpigmentação, xerose, pseudo-
porfiria.
Endócrinas Amenorreia, osteodistrofia renal, hiperparatireodismo, perda da
libido e função sexual.
Gastrointestinais Náuseas, anorexia, esofagite, vômitos, hemorragia gastrointesti-
nal, pancreatite, ascite, perda de apetite, soluços.
Hematológicas Anemia, disfunção plaquetária, diminuição na produção de eri-
tropoietina.
Neuromusculares Desmaios, tonturas, cefaleia, convulsões.
Musculares Enfraquecimento, câimbras, desnutrição/desgaste muscular.
Neurológicas e Incapacidade de concentração, comprometimento do sono, so-
Psicológicas nolência durante o dia, neuropatia periférica, ansiedade, depres-
são, coma, convulsões.
Hidreletrolíticas Hipocalcemia, hipercalemia, hiperfosfatemia, acidose metabóli-
ca.
Ósseas Osteopenia, risco de fratura aumentado.
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tituir a função renal e remover os produtos pressão são mais propensos a desenvolverem
tóxicos, quando os rins, em falência, não são candidíase oral11, gengivite ulcerativa necro-
capazes de excretar. Não é considerado um sante aguda e doença periodontal. Vale res-
tratamento integral da DRC, já que não é ca- saltar que essas infecções bucais não estão
paz de repor a função endócrina14,15. Existem relacionadas apenas ao quadro de imunossu-
dois tipos de diálise, a peritoneal e a hemo- pressão,mas à condição de higiene oral, que é
diálise. Na diálise peritoneal, um cateter com preponderante5.
acesso à cavidade peritoneal permite a infu- Também são achados clínicos bucais
são e a drenagem de uma solução especial,a a presença de sangramento gengival20, peté-
fim de remover os produtos tóxicos acumu- quias e equimoses, devido às alterações he-
lados. Na hemodiálise, um cateter instalado matológicas e à disfunção plaquetária, pato-
em uma veia central ou em uma fístula arte- logias inerentes a DRC8,21.Dentre as alterações
riovenosa, realizada cirurgicamente, permite a hematológicas, a anemia é um achado clínico
filtração do sangue através de uma máquina e comum nesses pacientes, já que é possível
o devolve ao corpo do paciente com menos observar palidez na mucosa oral em 90% de-
impurezas5,14. les11,17.
O tratamento dialítico, independente Em consequência da diminuição dos ní-
da sua modalidade, não proporciona a cura veis de cálcio, a hipoplasia de esmalte pode
para a DRC, porém aumenta a sobrevida dos estar presente8,11. Ainda, em relação a pouca
pacientes. A cura só é possível mediante tera- absorção de cálcio do metabolismo, o orga-
pia substitutiva com transplante renal, entre- nismo reage aumentando os níveis de para-
tanto, vale ressaltar que o risco de rejeição do tormônio (PTH) da tireoide. O hiperparatire-
órgão pode ser um empecilho para essa tera- odismo, por sua vez, está relacionado com
pia14. manifestações ósseas conhecidas como oste-
odistrofia renal22. A osteodistrofia favorece o
Manisfestações bucais aparecimento de alterações ósseas na maxila
Cerca de 90% dos pacientes renais crô- e na mandíbula, tais como: desmineraliza-
nicos apresentam algum tipo de manifestação ção óssea, perda do trabeculado, perda total
bucal, seja devido à própria doença ouao efei- ou parcial da lâmina dura, com aspecto de
to colateral do tratamento e dos medicamen- vidro despolido, lesão de células gigantes ou
tos utilizados5. A DRC pode acarretar defeitos tumor marrom5,11,23.Além disso, pode ocorrer
de esmalte dentário, atraso na cronologia de um maior risco de fratura durante exodontias.
erupção e xerostomia. Medicamentos como Mobilidade dental, má oclusão, calcificação
carbonato de cálcio, sulfato ferroso, vitaminas, pulpar e problemas relacionados à articula-
antibióticos, anti-hipertensivos e corticoides, ção temporomandibular também podem ser
utilizados no tratamento da DRC, podem pro- observados nos pacientes com osteodistro-
vocar manchas nos dentes, hipossalivação, cá- fia8,19,23.
rie e calcificação das partes moles16,17causando Pacientes em falência renal que estão
o estreitamento da câmara pulpar11. na fila do transplante têm alto risco de infec-
Halitose, gosto metálico, xerostomia e ções orais e infecções secundárias, devido ao
estomatites urêmicas, devido ao excesso de protocolo de imunossupressão19,23.Algumas
ureia na saliva, são consequências da doença drogas imunossupressoras causam aumento
renal8,11,12,18.As lesões da estomatite apresen- do volume gengival como efeito adverso1. A
tam dor intensa, localizadas na língua e na ciclosporina é uma droga imunossupressora
gengiva, podem permanecer pelo tempo em amplamente utilizada e que causa esse efei-
que o nível de ureia estiver aumentado e re- to8,17,21.
gridem espontaneamente entre duas ou três
semanas, quando o problema é resolvido8. O Cuidados para o atendimento odontológico
excesso de ureia na saliva também favorece a O atendimento odontológico aos pa-
diminuição da prevalência de cárie, pela inibi- cientes renais crônicos exige cuidados espe-
ção do crescimento bacteriano8. ciais, principalmente devido às complicações
Alguns estudos relacionam a presença decorrentes da perda da função renal, das
de erosão dentária em pacientes com DR- medicações utilizadas para o tratamento da
C5,11,19.A erosão foi observada na superfície lin- DRC e seus efeitos adversos. Assim, o proto-
gual dos dentes provavelmente devido ao vô- colo terapêutico odontológico e a terapêutica
mito, como efeito adverso de medicações19.A medicamentosa devem ser diferenciados de
regurgitação, inerente ao tratamento da DRC, acordo com estado clínico de cada paciente1,5.
pode causar erosões dentárias severas5,17. Pacientes submetidos à diálise renal fa-
Pacientes com DRC e com imunossu- zem uso de anticoagulante como a heparina,
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devem ser utilizados com cautela e com ajuste O anestésico indicado não deve conter
de dose e intervalo de administração, de acor- vasoconstrictor em casos de hipertensão arte-
do com a recomendação do nefrologista17,28. rial associada à DRC. Quando a pressão arte-
Em relação ao uso de analgésico, o parace- rial está controlada pode-se considerar o uso
tamol é a droga de escolha, já que a sua me- do vasoconstrictor. AINES devem ser evitados,
tabolização é hepática, não possuindo efeito e o Paracetamol é o analgésico de escolha. As
nefrotóxico8,9,11. consultas devem ser feitas preferencialmente
Durante uma consulta odontológica, na pela manhã1.
qual é necessário o uso do anestésico local, a No pós-transplante inicial,durante seis
literatura indica a lidocaína como anestésico meses, o tratamento odontológico deve se
mais seguro9, pois seu metabolismo é hepáti- restringir às emergências7. Os primeiros seis
co11. Muitos pacientes com DRC também apre- meses após o transplante são os mais críticos
sentam hipertensão arterial sistêmica (HAS) já que estão sendo administradasas maiores
como consequência da doença, entretanto doses de imunossupressores. Por isso, o trata-
nos casos de pacientes com DRC e com HAS mento odontológico deve ser restrito a medi-
compensada, a lidocaína com vasoconstrictor das essenciais, paliativas e preventivas, como
na concentração de 1:100.000 seria bem indi- motivação de higiene oral, uso de bochecho
cada, já para os casos de HAS não compensa- de clorexidina e avaliação constante de infec-
da, a mepivacaína 3%, sem vasoconstrictor5. ções oportunistas1.
Em um caso clínico relatado por Rocha, Carva- Após o transplante, qualquer procedi-
lho e Júnior 24 (2016), no tratamento odontoló- mento odontológico deve ser avaliado jun-
gico cirúrgico de um paciente em hemodiálise tamente com o nefrologista, caso seja neces-
e com HAS, foi utilizado lidocaína a 2% com sário ajuste de doses de imunossupressores
epinefrina, na concentração de 1:100.000, por e anticoagulantes. O paciente transplantado
ser menos tóxico, na quantidade máxima de 2 deve fazer uso pelo resto da vida de corticoide
tubetes, devido à HAS. (prednisona) associado ao imunossupressor.
Além disso, como a maioria dos renais crôni-
Cuidados aos pacientes transplantados cos são também diabéticos, hipertensos ou
Em pacientes candidatos ao transplante cardíacos,utilizamoutras medicações, como
renal, é necessária uma consulta e avaliação anticoagulantes ou antiagregante plaquetá-
odontológica previamente ao transplante, a rio, o INR deve ser avaliado antes de qualquer
fim de evitar focos sépticos e assegurar uma procedimento odontológico com risco de
boa condição bucal7. Todos os focos infec- hemorragia. Se o valor estiver acima de 2,5, o
ciosos devem ser removidos tais como: cavi- nefrologista deve ser consultado e, se neces-
dades de cárie, lesões endodônticas, doença sário, reduzir a dose ou suspender tempora-
periodontal, ajuste de próteses. Dentes com riamente a medicação por até sete dias antes
mobilidade e com bolsa periodontal maior e cinco a sete dias após o procedimento, de
que 6mm, com lesão endo-perio, com lesão acordo com a conduta médica1.
periapical e com cáries extensas devem ser ex- Os pacientes que foram submetidos a
traídos previamente ao transplante, devido ao uma cirurgia de transplante de órgãos apre-
prognóstico duvidoso dessas condições clíni- sentam um maior risco às infecções bacteria-
cas. Terapia com implantes devem ser adiadas nas, virais e fúngicas graves1 como infecções
para o pós-transplante, quando o paciente es- por pseudomonas, cândida, herpes simples e
tiver completamente estabilizado. Caso seja zoster11. A decisão de administrar antibióticos
necessária a instalação de implantes antes do antes de qualquer procedimento odontoló-
transplante, deve ser respeitado o período de gico, assim como a seleção de antibióticos,
osseointegração11. sempre deve ser feita em consulta com o mé-
Além disso, é necessária a remoção de dico do paciente. Apesar de não haver na lite-
aparelho ortodôntico, já que algumas drogas ratura, diretrizes claras sobre administração de
imunossupressoras causam aumento do volu- antibioticoterapia profilática para pacientes
me gengival, como efeito adverso1.Pacientes transplantados que estão prestes a ser subme-
submetidos a esse tipo de terapia devem ser tidos a procedimentos dentários, a fim de pre-
inseridos em um programa de reforço con- venir a bacteremia transitória, a maioria dos
tínuo da higiene oral, afim de reduzir o risco médicos recomenda o uso de antibioticotera-
de aumento gengival. O profissional também pia profilática a todos os pacientes que foram
deve estar atento para eventuais ulcerações submetidos a transplante, de acordo com re-
bucais, tendo em vista o importante risco de gime padrão da AHA, para prevenir endocar-
desenvolvimento de tumores nesses pacien- dite1. Além disso, a AAC sugere o protocolo de
tes7. profilaxia antibiótica nos pacientes transplan-
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sistêmica19,dentre outras, deve ser tomada em disciplinar para garantir o bem-estar, a saúde e
conjunto com o nefrologista e a equipe multi- a qualidade de vida desses pacientes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Devido às peculiaridades sistêmicas dos terais do tratamento da DRC podem provocar
pacientes com DRC em tratamento dialítico, alterações bucais significativas. Por isso, o ci-
no pré e no pós-operatório de transplante, rurgião dentista deve estar preparado para o
revisadas e discutidas ao longo deste estudo, atendimento odontológico desses pacientes
é essencial que o cirurgião dentista tenha um e ter conhecimento de todas as necessidades
profundo conhecimento sobre o estado de especiais e implicações acerca do tratamento.
saúde do seu paciente e uma boa comunica- Com base nesta revisão da literatura,
ção com o nefrologista. segue uma sugestão de protocolo clínico que
Tanto a doença quanto os efeitos cola- deve ser seguido pelo cirurgião dentista:
- Pedido de avaliação médica.
- Evitar procedimentos longos.
- Procedimentos odontológicos preventivos a fim de evitar infecção crônica ou aguda.
- Realizar o controle da pressão arterial.
- Avaliar hematócrito, plaquetas, tempo de protrombina, tempo de tromboplastina parcial.
- Evitar tratamentos odontológicos eletivos no dia da hemodiálise, considerando a meia vida
da heparina e o bem estar físico e mental do paciente.
- Realizar profilaxia antibiótica em pacientes com fístula arteriovenosa especialmente em ca-
sos de cirurgia, periodontia e endodontia.
- Monitorar sangramento no trans e no pós- operatório.
- Considerar o uso de clorexidina no pré e pós- operatório.
- Deve-se trabalhar de modo multidisciplinar a fim de garantir a integridade do paciente.
- Proservação do paciente.
- Pacientes transplantados:
Eliminar todos os focos infeciosos bucais antes da cirurgia de transplante;
Profilaxia antibiótica será sempre indicada para procedimentos odontológicos invasivos;
Manutenção de boa higiene oral.
REFERÊNCIAS
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