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Políticas de Atenção à

Saúde da Criança
e Adolescente
Autoras: Profa. Giane Elis de Carvalho Sanino
Profa. Neisa Castells Fontes
Colaboradoras: Profa. Renata Guzzo
Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano
Professoras conteudistas: Giane Elis de Carvalho Sanino / Neisa Castells Fontes

Giane Elis de Carvalho Sanino

Doutora e mestre em Educação na linha de pesquisa de Políticas em Educação. Especialista em: Nefrologia,
Educação Profissional na Área de Saúde, Planejamento, Implementação e Gestão da Educação a Distância. Possui
aprimoramento em pediatria pelo Hospital Menino Jesus de São Paulo. Profissional com experiência na área clínica e
educacional, com atividade clínica voltada para a nefrologia e atuação em clínicas e hospitais (particulares e públicos).
Possui vivência acadêmica em escolas técnicas e universidades, atuando tanto na parte administrativa quanto na
pedagógica. É professora adjunta da UNIP nos cursos de Enfermagem, Educação Física, Fisioterapia e Nutrição.
Atualmente, estuda as temáticas juventude e formação, pedagogia da simulação, políticas públicas de educação e
saúde e mediação pedagógica na formação em EAD.

Neisa Castells Fontes

Mestre em Enfermagem. Especialista em Enfermagem em Terapia Intensiva e em Enfermagem Cardiovascular.


Graduou-se enfermeira pela Universidade Federal de Santa Catarina em 1997, na qual fez seu trabalho de conclusão
de curso em Pediatria. Nele, atuou em um projeto como enfermeira escolar, trabalhando com crianças e adolescentes.
Foi enfermeira assistencial no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas-USP e no Hospital Sírio Libanês e trabalhou
como enfermeira de pesquisa no Hospital Israelita Albert Einstein. É professora adjunta da UNIP nos cursos da área da
saúde, lecionando as seguintes disciplinas: Saúde do Adulto, Gestão em Enfermagem, Atenção à Saúde da Família e
Pessoa em Situação de Risco, bem como Suporte Básico de Vida.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

S227p Sanino, Giane Elis de Carvalho.

Políticas de Atenção à Saúde da Criança e Adolescente / Giane Elis


de Carvalho Sanino, Neisa Castells Fontes. – São Paulo: Editora Sol, 2018.

132 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXIV, n. 2-110/18, ISSN 1517-9230.

1. Saúde da criança. 2. Saúde do adolescente. 3. Estatuto da


criança e do adolescente. I. Fontes, Neisa Castells. II. Título.

CDU 342.115.7

A-XVIII

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
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Vice-Reitora de Unidades Universitárias

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Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez


Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Vitor Andrade
Lucas Ricardi
Sumário
Políticas de Atenção à Saúde da Criança e Adolescente

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 PANORAMA ATUAL DA INFÂNCIA E DA ADOLESCÊNCIA NO BRASIL ...........................................9
1.1 Indicadores demográficos, socioeconômicos e morbimortalidade destacando
os principais problemas de saúde por faixa etária.......................................................................... 13
1.2 Comitês de prevenção do óbito ..................................................................................................... 16
1.3 A morbimortalidade entre crianças, adolescentes e jovens brasileiros .......................... 21
2 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) E O CONSELHO TUTELAR ....................... 30
2.1 Conceito, objetivo, aplicabilidade, ações específicas.............................................................. 33
2.2 Atuação do enfermeiro diante do ECA......................................................................................... 34
2.3 Acompanhamento da criança e do adolescente saudável................................................... 37
3 A CRIANÇA E O ADOLESCENTE NA ESCOLA.......................................................................................... 42
3.1 Programa de Saúde na Escola (PSE).............................................................................................. 42
3.2 Atuação do enfermeiro na saúde do escolar............................................................................. 44
4 PREVENÇÃO DE ACIDENTES NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA................................................ 45

Unidade II
5 IMPACTO DA VIOLÊNCIA NA SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE................................... 52
5.1 Conceito e classificação da violência............................................................................................ 53
5.2 Políticas de enfrentamento contra a violência......................................................................... 55
5.3 Atuação dos enfermeiros diante das crianças vitimizadas.................................................. 57
5.4 A criança e o adolescente institucionalizados.......................................................................... 63
5.5 Conceitos, objetivos e as diferentes instituições – Fundação Casa,
orfanato, abrigo e casa de acolhimento............................................................................................. 64
5.5.1 Abrigos......................................................................................................................................................... 64
5.5.2 Fundação Casa.......................................................................................................................................... 64
5.5.3 Orfanato...................................................................................................................................................... 66
5.5.4 Casa de acolhimento.............................................................................................................................. 67
6 INICIATIVAS E PROJETOS DE ATENÇÃO À CRIANÇA E INCENTIVO AO
ALEITAMENTO MATERNO.................................................................................................................................. 67
6.1 Semanas Mundiais de Aleitamento Materno (SMAM) ......................................................... 72
6.2 Iniciativa Hospital Amigo da Criança............................................................................................ 75
6.3 Projeto Carteiro Amigo da Amamentação.................................................................................. 79
6.4 Empresa Amiga da Criança .............................................................................................................. 80

Unidade III
7 PROGRAMA NACIONAL DE IMUNIZAÇÃO (PNI).................................................................................. 85
7.1 Conceito de vacina, objetivo, imunidade ativa e passiva..................................................... 86
7.1.1 História da vacina.................................................................................................................................... 86
7.1.2 Imunidade ativa e passiva.................................................................................................................... 87
7.2 Cuidados necessários para a vacina segundo as recomendações da Rede de Frio................. 87
7.3 Calendário nacional, estadual e municipal................................................................................. 88
8 PROGRAMA NACIONAL DE TRIAGEM NEONATAL (PNTN) .............................................................. 89
8.1 Doenças diagnosticadas – triagem neonatal biológica (TNB)............................................ 92
8.1.1 Fenilcetonúria (PKU)............................................................................................................................... 93
8.1.2 Hipotireoidismo congênito (HC) primário..................................................................................... 94
8.1.3 Doenças falciformes (DF) e outras hemoglobinopatias .......................................................... 95
8.1.4 Fibrose cística (FC) .................................................................................................................................. 98
8.1.5 Hiperplasia adrenal congênita (HAC) ou hiperplasia congênita da suprarrenal........................100
8.1.6 Deficiência de biotinidase (DB)........................................................................................................101
8.2 Técnica para a coleta da tiragem neonatal biológica..........................................................102
8.3 Assistência Integral das Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI).................................109
8.4 Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (Pnaisc)...............................111
APRESENTAÇÃO

A disciplina de Políticas Públicas voltadas à Atenção à Saúde da Criança e do Adolescente estuda


e discute os programas nacionais do Ministério da Saúde voltados para a assistência à criança e ao
adolescente, além de acentuar as leis nacionais que os protegem enquanto indivíduos, visando zelar e
propor medidas para garantir o adequado crescimento e desenvolvimento.

O livro-texto pauta seu conteúdo em parâmetros legais, destacando o dever da família, da sociedade,
dos órgãos de proteção a crianças e adolescentes e, ainda, o papel exercido pelo Estado para proteger
essa população, em especial à de maior vulnerabilidade social.

Seguindo orientações do Ministério da Saúde, vamos aprender o quão importante é prevenir


quando o assunto é saúde. Nesse contexto, evidenciamos as políticas de promoção destinadas a
campanhas de vacinação.

INTRODUÇÃO

A partir da Portaria nº 1.130, de 5 de agosto de 2015 (BRASIL, 2015), o Ministério da Saúde instituiu
as diretrizes da Política Nacional de Atenção integral à Saúde da Criança e do Adolescente (Pnaisc), no
âmbito do Sistema único de Saúde (SUS).

A criação dessa política pública abrangente tem como objetivo executar e garantir cuidados essenciais
à saúde da criança e do adolescente como indivíduos portadores de direitos. O programa se estabelece
pautado em sete eixos principais:

– Atenção humanizada e qualificada à gestação, ao parto, ao nascimento e


ao recém-nascido.

– Aleitamento materno e alimentação complementar saudável.

– Promoção e acompanhamento do crescimento e desenvolvimento integral.

– Atenção a crianças com agravos prevalentes na infância e com doenças crônicas.

– Atenção à criança em situação de violências, prevenção de acidentes e


promoção da cultura de paz.

– Atenção à saúde de crianças com deficiência ou em situações específicas


e de vulnerabilidade.

– Vigilância e prevenção do óbito infantil, fetal e materno.

Tais princípios visam articular os programas focados nessa população com as demais ações
existentes, atendendo ao anseio de iniciativas sociais e organismos de proteção à criança e ao
7
adolescente. Segundo dados do Portal Brasil (2016), entre 1990 e 2015, o Brasil reduziu em 73%
suas taxas de mortalidade infantil. O gráfico a seguir ilustra essa situação:
30,0

Taxa de mortalidade infantil


22,5

15,0

7,5

0,0
00

09
03
04
05
06

08
02
01

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07

10
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20
20
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20
20
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20
Anos

Figura 1 - Taxa de mortalidade infantil por mil nascidos vivos - Brasil (2000 a 2015)

A ONU creditou o avanço no combate à mortalidade infantil no Brasil ao fortalecimento do SUS e


às políticas de assistência social, como o programa de transferência de renda Bolsa Família. A Unicef
acentua que houve uma combinação de estratégias responsáveis pelo combate de forma efetiva à
mortalidade infantil (ONU, 2015).

Com as referências deste livro-texto, será possível analisar o panorama social e de saúde pública em
que estão inseridas as crianças e os adolescentes brasileiros. Notaremos que a diminuição do quadro de
mortalidade infantil está associada à execução de políticas sociais inclusivas.

Todavia, ainda há muito que se fazer, sobretudo quanto ao entendimento do que é a infância e a
adolescência, quais são as metas do milênio e qual lugar o Brasil quer ocupar quando comparado a
outras nações.

Assim, é vital refletir sobre o papel dos profissionais da enfermagem nesse contexto: como podem
promover melhorias nos serviços para atender às especificidades do público? Estudaremos como o
Poder Público deve se posicionar e como os agentes de saúde devem conduzir essas políticas de saúde,
transformando-as em ações cotidianas.

O objetivo deste livro-texto é destacar informações científicas para o planejamento e a execução de


medidas que tenham impacto positivo na saúde, no desenvolvimento e no crescimento da população de
crianças e adolescentes brasileiros de forma saudável, principalmente naqueles que ainda se encontram
em situação de maior vulnerabilidade social.

8
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Unidade I
1 PANORAMA ATUAL DA INFÂNCIA E DA ADOLESCÊNCIA NO BRASIL

Para assimilarmos os resultados das ações executadas pelos profissionais de saúde para a população
de crianças e adolescentes brasileiros, é essencial conhecer os diversos aspectos aos quais este grupo
está submetido, em especial às situações de vulnerabilidade e fatores de risco específicos dessa faixa
etária. Nesse contexto, a mortalidade infantil é o principal parâmetro, trata-se de um indicador global
que acompanha o grau de vulnerabilidade aos quais o grupo está exposto.

A mortalidade infantil está intrinsecamente ligada ao nível de desenvolvimento social do país e à


região em que a criança nasceu.

As nações desenvolvidas denotam baixo índice de mortalidade, situação bem diferente de países
em desenvolvimento, reconhecidos como social e economicamente periféricos, que apresentam as
maiores taxas. Os principais indicadores para os casos de mortalidade infantil se concentram na
fragilidade ou inexistência de boa assistência pré-natal ao recém-nascido, além de dificuldades
primárias, como ausência de saneamento básico e desnutrição.

Segundo o relatório da Unicef intitulado Situação mundial da infância 2015:

No momento em que uma criança chega ao mundo, até mesmo sua segurança
depende de sorte em relação ao local de nascimento e às condições de vida
de sua família – e a desigualdade estende-se ao longo da infância, e além
dela (UNICEF, 2014, p. 3).

A ONU (2015) acompanha a quantidade mundial de mortalidade infantil. Em 2015, divulgou que a
cada mil nascidos vivos no mundo, 49,4 falecem.

Saiba mais

Para ter mais informações sobre a taxa de mortalidade infantil no


mundo e a expectativa de vida ao nascer em cada país, leia:

MAPA comparativo entre países. Taxa de mortalidade infantil.


Index Mundi, [s.d.]. Disponível em: <https://www.indexmundi.com/
map/?v=29&l=pt>. Acesso em: 8 mar. 2018.

9
Unidade I

No Brasil, esse índice está em 22 a cada mil nascidos vivos. Embora o Brasil não esteja entre os líderes
neste ranking, o quadro é alarmante. Para compreendê-lo, é preciso examinar as especificidades que
traduzem nossa formação como nação.

Em apontamentos realizados pela Unicef no relatório sobre a Infância e a Adolescência no Brasil,


ressalta-se que:

O Brasil possui uma população de 201,5 milhões de pessoas, das quais 59,7
milhões têm menos de 18 anos de idade (PNAD, 2013). Mais da metade
de todas as crianças e os adolescentes brasileiros são afrodescendentes, e
mais de um terço dos 821 mil indígenas do País são crianças (CENSO, 2010)
(UNICEF, 2014).

A tabela a seguir apresenta a distribuição da população infantojuvenil no País por região:

Tabela 1

População entre % da população entre 0 e 19


Grandes regiões População total 0 e 19 anos anos sobre a população total
Região Norte 17.523.777 6.411.579 36,6%
Região Nordeste 56.640.710 18.564.043 32,8%
Região Sudeste 85.916.158 23.128.103 26,9%
Região Sul 29.290.154 7.796.413 26,6%
Região Centro-Oeste 15.489.302 4.646.559 30,0%
Brasil 204.860.101 60.546.697 29,6%

Fonte: Fundação Abrinq (2017, p. 9).

O gráfico e a tabela a seguir destacam a situação de infantojuvenis conforme a situação de domicílio:

17,5%

Urbano
Rural

82,5%

Figura 2

10
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Tabela 2

Grandes regiões População rural População urbana


Região Norte 1.763.626 4.647.953
Região Nordeste 5.538.899 13.025.144
Região Sudeste 1.748.483 21.379.620
Região Sul 1.059.247 6.737.166
Região Centro-Oeste 491.746 4.154.813
Brasil 10.602.001 49.944.696

Fonte: Fundação Abrinq (2017, p. 10).

Com base nas informações acentuadas, podemos concluir que a grande concentração está na região
Norte e que a maioria de crianças e adolescentes centralizada nas regiões Norte e Nordeste habita, em
maior parte, a zona rural de suas cidades. Nas regiões Sul e Sudeste, a concentração maior está na área
urbana dessas cidades. Esse recorte geográfico também nos ajuda a compreender as estatísticas da
mortalidade infantil no país, pois as regiões Norte e Nordeste, historicamente, apresentam condições
sociais mais precárias que o Sudeste e o Sul.

Ao discutirmos as taxas de mortalidade infantil no Brasil, não podemos deixar de considerar as


especificidades das populações indígenas. Diversas pesquisas indicam que as crianças indígenas
possuem maior vulnerabilidade se comparadas às não indígenas, e seus índices regionais de
mortalidade infantil também são maiores. Ao refletirmos sobre tal constatação, é importante
considerar os traços culturais desse grupo, além das questões sociais que os permeiam. Há tribos
indígenas que praticam o infanticídio quando a criança apresenta algum problema de saúde ou
de desenvolvimento, em gestações gemelares (nas quais apenas uma das crianças tem sua vida
poupada), em infrações de regras de parentesco etc.

Saiba mais

Para ampliar seus conhecimentos sobre o infanticídio praticado pelos


povos indígenas, leia:

PINEZI, A. K. M. Infanticídio indígena, relativismo cultural e direitos


humanos: elementos para reflexão. Aurora, São Paulo, 8, 2010. Disponível em:
<http://www.pucsp.br/revistaaurora/ed8_v_maio_2010/artigos/download/
ed/2_artigo.pdf>. Acesso em: 2 mar. 2018.

A violação de direitos de crianças e adolescente é identificada na sistemática vulnerabilidade


das políticas sociais, de saúde, de educação e de lazer, pois esses setores, ao não serem bem
estruturados, reforçam as múltiplas violências sobre essa população. A alta taxa de homicídios de
11
Unidade I

adolescentes no Brasil traduz as condições sociais vulneráveis nas quais crianças e adolescentes
se encontram:

De 1990 a 2014, o número de homicídios de brasileiros de até 19 anos


mais que dobrou: passou de 5 mil para 11,1 mil casos ao ano (DATASUS,
2014). Isso significa que, em 2014, a cada dia, 30 crianças e adolescentes
foram assassinados. As vítimas têm cor, classe social e endereço. São
em sua maioria meninos negros, pobres, que vivem nas periferias e nas
áreas metropolitanas das grandes cidades. A taxa de homicídio entre
adolescentes negros é quase quatro vezes maior do que aquela entre
os brancos: 36,9 a cada 100 mil habitantes, contra 9,6 entre os brancos
(DATASUS, 2013). Dos adolescentes que morrem no País, 36,5% são
assassinados. Na população total, esse percentual é de 4,8% (ÍNDICE
DE HOMICÍDIOS NA ADOLESCÊNCIA NO BRASIL, 2015). Esse cenário
perturbador coloca o Brasil em segundo lugar no ranking dos países com
maior número de assassinatos de meninos e meninas de até 19 anos,
atrás apenas da Nigéria (UNICEF, 2014).

Esses observações não deixam dúvida do abismo social existente no Brasil e de como crianças e
adolescentes são amplamente atingidos por seus aspectos. Nos mapas a seguir, é possível identificar a
concentração geográfica de crianças e adolescentes em situação de pobreza ou extrema pobreza em
nosso país.

2,5 | (54%)
8,0 | (60,6%)

0,9 | (28,4%)
4,5 | (27,8%)

1,2 | (23,1%)

Brasil = 17,3 milhões (40,2%)

Figura 3 – Pobres

12
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

0,9 | (19,7%)
3,4 | (26,3%)

0,1 | (5%)
0,9 | (5,9%)

0,2 | (5,2%)

Brasil = 5,8 milhões (13,5%)

Figura 4 – Extremamente pobres

Lembrete

A mortalidade infantil está intrinsecamente ligada ao nível de


desenvolvimento social do país e à região em que a criança nasceu.

1.1 Indicadores demográficos, socioeconômicos e morbimortalidade


destacando os principais problemas de saúde por faixa etária

Hoje, o Brasil tem cerca de 60,5 milhões de crianças e adolescentes (de 0 a 19 anos). A maior
parte está centralizada demograficamente no Sudeste, totalizando 18,6 milhões. Contudo, quando
comparamos essa fração à população total, a maior concentração ocorre nas regiões Nordeste e Norte,
que são afetadas severamente pelos baixos níveis dos indicadores sociais, desprotegendo ainda mais
esses habitantes.

Quando pensamos em indicadores sociais, pensamos em como se dá o acesso de qualidade a aspectos


como: educação, assistência social, saúde, saneamento básico, lazer e segurança. Historicamente, o
acesso a esses setores são mais difíceis nas regiões Norte e Nordeste se comparados ao Sul e ao Sudeste.

Nessa perspectiva, o relatório da Fundação Abrinq (2017, p. 9-25) aponta que:

Na região Norte, por exemplo, o número de crianças e adolescentes


representa 36,6% da população total, enquanto no Nordeste essa proporção
soma 32,8%. No Sudeste, o número de crianças e adolescentes corresponde
a 26,9% do total.

Ao observar tais relatos, notamos que crescer e se desenvolver no Norte e no Nordeste é desafiador. É
importante ressaltar que também há problemas nas outras regiões, especificamente quanto à violência
e ao trabalho infantil, causados pela constante falta de acesso a direitos básicos, como saúde e escola
de qualidade.

13
Unidade I

Quanto menor o desenvolvimento social local, maiores serão as dificuldades de desenvolvimento


enfrentadas pela população.

Saiba mais

Para ter acesso a dados detalhados de indicadores específicos da


situação de crianças e adolescentes em vários segmentos sociais, acesse:

<https://observatoriocrianca.org.br/>.

Observação

Observatório da Criança e do Adolescente é uma ferramenta de busca


que organiza informações de diversas fontes sobre a qualidade de vida e
bem-estar da população de 0 a 18 anos.

Destacamos a seguir relevantes dados estatísticos sobre crianças e adolescentes brasileiros:

Em 2014, a grande maioria da população infantojuvenil estava localizada na


área urbana: 82,57%, com apenas 17,43% na área rural. A distribuição por
faixa etária na área urbana é a seguinte: 20,54% (de 0 a 4 anos), 22,13% (de
5 a 9 anos), 23,88% (de 10 a 14 anos) e 16,02% (de 15 a 17 anos). Na área
rural, a distribuição por faixa etária é de 3,96% (de 0 a 4 anos), 4,66% (de 5
a 9 anos), 5,47% (de 10 a 14 anos) e 3,33% (de 15 a 17 anos).

Na área urbana, observa-se que de 2008 para 2014 houve uma diferença
proporcional de 1,16% e 1,40% nas faixas etárias de 0 a 4 anos e de 15
a 17 anos, respectivamente, o que indica aumento populacional. Houve
diminuição da população nas faixas etárias de 5 a 9 anos (-0,03%) e de 10 a
14 anos (-0,87%). Na área rural, os dados indicam diferenças proporcionais
negativas, o que representa diminuição na população infantojuvenil em
todas as faixas etárias: de 0 a 4 anos (-0,46%), de 5 a 9 anos (-0,73%), de 10
a 14 anos (-0,45%), e de 15 a 17 anos (-0,02%).

A população infantojuvenil brasileira está distribuída, segundo dados das


fontes oficiais, por raça/cor conforme declarado por cada entrevistado.
Neste sentido, os dados de 2014 mostram que as 54.494.819 crianças
e adolescentes estão assim divididos: a maioria, declarada parda, é de
27.289.171 (50,07%), seguida de 23.237.051 brancos (42,64%); 3.547.854
desta população declararam-se pretos (6,51%), 258.918 declararam-se
indígenas (0,48%), e 161.825, amarelos (0,30%).

14
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

A série histórica de 2008 para 2014 mostra uma diminuição na população


infantojuvenil declarada branca (-2.527.901), parda (-817.704) e amarela
(-60.156). Por outro lado, houve um aumento da população autodeclarada
preta (591.659), e indígenas (117.894).

A projeção da série histórica revela uma diminuição na população infantojuvenil


na faixa etária de 0 a 17 anos entre 2000 e 2029, passando de 31.320.914 para
22.946.751 crianças e adolescentes do sexo masculino, o que representa uma
diferença percentual de -26,74%, e de 30.562.379 para 22.230.630 crianças e
adolescentes do sexo feminino, diferença percentual de -27,26%.

Em relação à população do sexo masculino na faixa etária de 0 a 6 anos, a


projeção é de que a população diminua em 28,85%, caindo de 12.022.065
para 8.554.106 crianças de 2000 para 2029. Na faixa etária de 7 a 14 anos,
a diminuição projetada será de 25,47%, passando de 13.807.821 para
10.291.623 no ano 2029. Já na faixa etária de 15 a 17 anos, passará de
5.491.028 no ano 2000 para 4.101.022 adolescentes no ano 2029, diminuindo
em 25,31%.

Em relação à população do sexo feminino na faixa etária de 0 a 6 anos, a


projeção é de que a população diminua em 29,19%, caindo de 11.677.792
para 8.269.372 crianças de 2000 a 2029. Na faixa etária de 7 a 14 anos, a
diminuição projetada será de 26,09%, caindo de 13.495.259 no ano 2000
para 9.974.777 em 2029. Finalmente, na faixa etária de 15 a 17 anos, o
número passará de 5.389.328 para 3.986.481 adolescentes no ano 2029,
diminuição total de 26,03%.

Os dados revelam um crescimento na população infantojuvenil indígena


tanto na área urbana (44,46%), passando de 73.508 para 106.190, quanto
na área rural (126,21%), passando de 67.516 para 152.728 crianças e
adolescentes. Quando recortados por faixa etária na área urbana, verifica-se
que em 2014 22.865 estavam na faixa etária de 0 a 4 anos de idade; 25.553,
de 5 a 9 anos; 30.417, de 10 a 14 anos; e 27.355, de 15 a 17 anos. Quanto à
área rural, a população infantojuvenil apresenta a seguinte distribuição: de
0 a 4 anos, 50.520; de 5 a 9 anos, 51.761; de 10 a 14 anos, 34.710; e de 15
a 17 anos, 15.737.

A série histórica evidencia um significativo aumento na população indígena


tanto do sexo masculino, de 63.781 em 2008 para 129.667 em 2014 (103,3%),
como do sexo feminino, que passou de 77.243 em 2008 para 129.251 em
2014 (67,86%). O crescimento desta população pode ser observado em
todas as faixas etárias. Os dados indicam queda na taxa bruta de natalidade
no Brasil, indo de 16,56 em 2007 para 14,66 em 2014 (-1,90).

15
Unidade I

Neste mesmo período, no entanto, apresentaram aumento nas suas taxas


de natalidade os seguintes estados: Espírito Santo (0,02%), Rio de Janeiro
(0,39%), Paraná (0,36%), Santa Catarina (0,28%), Rio Grande do Sul (0,73%),
Mato Grosso do Sul (0,20%) e Mato Grosso (1,19%). As demais unidades da
Federação apresentaram queda nas suas taxas de natalidade. As maiores
quedas da taxa bruta de natalidade foram verificadas em Alagoas (-8,65),
Roraima (-7,24), Bahia (-6,25), Amapá (7,14), Piauí (5,93) e Sergipe (5,93)
(IMAS, 2016, p. 77-78).

1.2 Comitês de prevenção do óbito

Em 2013, cerca de dois em cada três arranjos familiares residentes em domicílio particular
tinham ao menos uma criança, adolescente ou jovem de 0 a 29 anos de idade. Do ponto de vista do
rendimento mensal familiar per capita, são núcleos mais vulneráveis, uma vez que o ganho mensal
familiar per capita médio desses conjuntos sem pessoas nesta faixa etária é quase duas vezes maior
do que naqueles em que há ao menos um indivíduo de 0 a 29 anos (BRASIL, 2009a).

Mesmo sendo um grupo populacional que tende a diminuir, tanto em termos absolutos quanto
em percentuais, é importante destacar a relevância das políticas públicas de saúde, educação,
trabalho e proteção social que são voltadas a esse público, bem como a preocupação com a
qualidade de equipamentos e serviços sociais ofertados. O grupo de crianças, adolescentes e
jovens é tão amplo e heterogêneo que, para realizar uma análise mais substantiva, é preciso
fazê‑la em partes (BRASIL, 2009a).

A vida e a saúde de crianças e adolescentes estão entre os direitos fundamentais garantidos no


Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e eles estão associados ao acesso a serviços de saneamento
básico. Em 2004, 53,7% das crianças com até 14 anos de idade residiam em domicílios com esgotamento
sanitário impróprio, ou seja, não havia rede geral ou fossa séptica ligada à rede coletora de esgoto.
Em 2013, esse indicador passou para 44,5%. Considera-se que, quando as três formas de saneamento
(água, esgoto ou lixo) são inadequadas no domicílio – e de forma simultânea –, isto é, quando não há
abastecimento de água por meio de rede geral, o esgotamento sanitário não se dá via rede geral ou
fossa séptica ligada à rede coletora e o lixo não é coletado, há maior exposição da população residente
ao risco de doenças, especialmente as crianças (BRASIL, 2009a).

Em 2004, essa situação foi observada para 15,5% de crianças e adolescentes com até 14 anos de
idade, diminuindo para 9,8% em 2013, sendo mais agravante para os residentes na região Norte (20,7%)
e Nordeste (17,0%) (BRASIL, 2009a).

Um indicador que reflete as condições sanitárias a que a população está exposta corresponde à
proporção de óbitos por doença diarreica aguda nas crianças menores de 5 anos. Pelos dados do Sistema
de Informações de Mortalidade (SIM) sobre aspectos demográficos, em vinte anos esse indicador
diminuiu consideravelmente, passando de 9,3% dos óbitos de crianças com menos de 5 anos, em 1991,
para 1,6% em 2011 (BRASIL, 2009a).

16
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

A queda nesse indicador foi mais significativa para as regiões Sul e Sudeste, e na região Sul
registrou-se o menor valor (0,7%), em 2011. Relacionado com a maior proporção de crianças vivendo
em domicílios com saneamento inadequado, as regiões Norte (2,7%) e Nordeste (2,3%) apresentaram
maior proporção de mortes por doença diarreica aguda em crianças com até 5 anos. O gráfico a seguir
denota essa situação:
%
0
14,4
12,0
9,3 9,3
8,8
6,7 6,1
4,4 4,9 4,2
2,7 2,3 2,5 2,5
1,6 1,6
0,9 0,7
0
Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

1991 2001 2011

Figura 5

Observação
Em 2016, o Ministério da Saúde lançou uma série de ações para reduzir
em 20% as mortes de bebês e crianças indígenas com até 5 anos.

Apesar do declínio observado no Brasil, a mortalidade infantil permanece


como uma grande preocupação em Saúde Pública. Os níveis atuais são
considerados elevados e incompatíveis com o desenvolvimento do País,
havendo sérios problemas a superar, como as persistentes e notórias
desigualdades regionais e intraurbanas [...].

Essas mortes precoces podem ser consideradas evitáveis, em sua maioria,


desde que garantido o acesso em tempo oportuno a serviços qualificados de
saúde. Decorrem de uma combinação de fatores biológicos, sociais, culturais
e de falhas do sistema de saúde. As intervenções dirigidas à sua redução
dependem, portanto, de mudanças estruturais relacionadas às condições de
vida da população, assim como de ações diretas definidas pelas políticas
públicas de saúde (BRASIL, 2009a, p. 7).

No campo da enfermagem, podemos considerar que a redução nos números da mortalidade infantil
é resultado de intenso trabalho de pesquisa e formação profissional. Para Barbeiro et. al. (2015, p. 2-3),

A taxa de mortalidade fetal (TMF) é considerada um dos melhores indicadores


de qualidade de assistência prestada à gestante e ao parto. Em relação a esse
prognóstico, basta verificar os números ocorridos e registrados na primeira
década do século XXI.

17
Unidade I

[...]

De acordo com os últimos dados no Brasil, entre 2001 e 2011, o número


absoluto de óbitos fetais (considerando peso de 500 g ou idade gestacional
de 22 semanas), caiu de 38.759 para 31.613. A TMF no Brasil possui algumas
limitações, sendo recomendado seu uso apenas para as unidades da Federação
nas quais a TMF seja calculada pelo método direto. Ainda assim, pode ser
estimada grosseiramente usando as estatísticas vitais: a TMF caiu de 12,3/1.000
nascimentos para 10,7/1.000 nascimentos neste período. No início da década de
2000, 30,0% da informação sobre peso ao nascer era ignorada, mas, em 2011,
esse percentual caiu para 9,0% e cerca de 30,0% dos óbitos fetais no Brasil
tinham, nesse ano, peso igual ou maior que 2.500 g (BARBEIRO et al., 2015, p. 3).

Vejamos o excerto a seguir:

As iniciativas de investigação de óbitos datam do início do século XX,


com a organização dos Comitês de Morte Materna nos Estados Unidos.
Diversas experiências no mundo apontam a estruturação de comitês de
mortalidade e investigação de óbitos como uma estratégia importante para
a compreensão das circunstâncias de ocorrência dos óbitos, identificação
de fatores de risco e definição das políticas de saúde dirigidas à redução da
mortalidade materna e infantil.

[...]

Os Comitês de Prevenção do Óbito Infantil e Fetal são organismos


interinstitucionais, de caráter eminentemente educativo e formativo, com
atuação sigilosa. [...] São instrumentos de gestão que permitem avaliar
a qualidade da assistência à saúde prestada à gestante, ao parto e ao
nascimento e à criança no primeiro ano de vida, para subsidiar as políticas
públicas e as ações de intervenção (BRASIL, 2009a, p. 46).

De acordo com o Ministério da Saúde, os Comitês de Prevenção do óbito atuam com os


seguintes objetivos:

Geral

– Avaliar as circunstâncias de ocorrência dos óbitos infantis e fetais e propor


medidas para a melhoria da qualidade da assistência à saúde e demais ações
para sua redução.

Específicos

– Avaliar a situação e distribuição dos óbitos infantis e fetais e seus componentes.


18
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

– Envolver e sensibilizar os gestores, os profissionais de saúde e a sociedade


civil sobre a importância e a magnitude da mortalidade infantil e fetal, sua
repercussão sobre as famílias e a sociedade como um todo.

– Conhecer as circunstâncias de ocorrência dos óbitos para identificar


possíveis problemas nos diferentes níveis de assistência.

– Definir e caracterizar os óbitos infantis evitáveis como eventos-sentinela, ou


seja, óbitos que não deveriam ocorrer com uma adequada assistência à saúde.

– Estimular a investigação dos óbitos pelos serviços de saúde, segundo os


critérios preconizados.

– Avaliar a qualidade da assistência prestada à gestante e à criança pelos


serviços de saúde.

– Estimular processo de educação continuada dos profissionais de saúde


para o correto preenchimento dos registros de saúde, como a Declaração de
Nascidos Vivos e a Declaração de Óbito, além dos registros de atendimento
nos prontuários ambulatorial e hospitalar, Cartão da Gestante e Caderneta
de Saúde da Criança.

– Estimular processo de aprendizagem crítico, contextualizado e transformador


dos profissionais de saúde, por meio da responsabilização e discussão dos
óbitos ocorridos na sua área de atuação.

– Identificar e recomendar estratégias e medidas de atenção à saúde


necessárias para a redução da mortalidade infantil e fetal, com destaque
para as mortes por causas evitáveis.

– Divulgar a magnitude e a importância da mortalidade infantil e fetal na


forma de relatórios, boletins, publicações, reuniões e eventos científicos
(BRASIL, 2009a, p. 47-48).

A seguir acentuamos um exemplo de caso clínico de uma criança que veio a falecer:

Criança do sexo masculino, 5 meses, em aleitamento artificial, pesando 3.800  g,


foi admitida com história de diarreia há 4 dias, com várias dejeções/dia e vômitos
ocasionais. Mãe estava oferecendo soro caseiro, porém nas últimas 12  horas a
criança começou a gemer e a vomitar tudo o que lhe era oferecido. Ao exame
de admissão no pronto atendimento, apresentava-se hipoativa, olhos encovados,
fontanela deprimida, pele com turgor diminuído, respiração irregular, com
taquicardia (FC = 160 bpm), pulsos finos, perfusão capilar diminuída e abdome
escavado. Foi entubada e iniciou-se hidratação venosa, porém a criança
apresentou parada cardiorrespiratória 20 minutos após a admissão e não
respondeu às manobras de reanimação (BRASIL, 2009a, p. 42-43).

19
Unidade I

A classificação de Wigglesworth é utilizada em diversos países do mundo para análise do óbito


perinatal (fetais e neonatais precoces). Aponta os principais grupos de causas de óbito perinatal,
considerando o peso ao nascer e a relação com as circunstâncias do óbito e o momento da assistência
à saúde. Utiliza informações clínicas que podem ser obtidas por meio da análise de prontuários,
selecionando os aspectos passíveis de intervenção pelos serviços (BRASIL, 2009a, p. 76).

Vejamos o grupos de causas de óbito perinatal e sua classificação:

1) Anteparto: morte fetal que ocorre antes do trabalho de parto.

Taxas elevadas: falhas na atenção pré-natal e condições maternas adversas.

2) Malformação congênita.

Taxas elevadas: falhas no diagnóstico/terapia na gravidez (lesões


potencialmente tratáveis).

3) Imaturidade: nascidos vivos com menos que 37 semanas de gestação, sem


hipóxia/anóxia; todos os nascidos vivos com peso ao nascer menor que 1000 g.

Taxas elevadas: falhas no manejo obstétrico e pré-natal/neonatal.

4) Asfixia: perda fetal intraparto; óbito fetal sem maceração; fresh stillbirth,
ou seja, natimorto recente (menos que 12 horas); óbitos neonatais por
hipóxia, exceto peso ao nascer menor que 1000 g.

Taxas elevadas: falhas no manejo obstétrico e/ou reanimação neonatal.

5) Causas específicas: óbitos por infecções especificas (TORSCH), causas


típicas de prematuridade em recém-nascidos, outros.

Taxas elevadas: falhas na assistência pré-natal e assistência ao RN


[recém‑nascido] (BRASIL, 2009a, p. 76).

O quadro a seguir apresenta os principais instrumentos para coletar as informações sobre o óbito infantil:

Quadro 1

Instrumentos de coleta e de análise de dados Objetivos


DO para investigação Identificar o óbito e orientar os procedimentos e as fontes de
DO Epidemiológica informação para a investigação do óbito.
Cópia da Declaração de Nascido Vivo (DN) Complementar a identificação do caso e orientar para as fontes de
DNV Epidemiológica informação para a investigação do óbito.

20
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

I1 = Ficha de Investigação do Óbito Infantil –


Serviço de saúde ambulatorial
I2 = Ficha de Investigação do Óbito Infantil –
Serviço de saúde hospitalar Coletar dados referentes à assistência da mãe e da criança em
serviços de saúde nos registros do atendimento na atenção básica,
F1 = Ficha de Investigação do Óbito Fetal – urgência/emergência e hospitalar.
Serviço de saúde ambulatorial
F2 = Ficha de Investigação do Óbito Fetal –
Serviço de saúde hospitalar
I3 = Ficha de Investigação do Óbito Infantil – Coletar as informações verbais do(s) cuidador(es) da criança
Entrevista domiciliar falecida (mãe ou familiar responsável) acerca da história de vida
F3 = Ficha de Investigação do Óbito Fetal – e de saúde da mãe e da criança e da assistência em serviços de
Entrevista domiciliar saúde, inclusive durante a doença que levou à morte.
Coletar as informações verbais do(s) cuidador(es) da criança
AV1 = Autópsia Verbal – Formulário 1: falecida (mãe ou familiar) para esclarecer a causa da morte
criança menor de um ano quando mal definida ou desconhecida.
Coletar dados registrados nos Institutos Médicos Legais (IML)
IF4 = Ficha de coleta de dados de Laudo ou Serviços de Verificação de Óbito (SVO) e nos relatórios de
de Necropsia encaminhamento médico para esses serviços.
Reunir e organizar de forma sumária os principais dados coletados
para análise e interpretação, com a identificação dos problemas e
IF5 = Ficha de Investigação do Óbito Infantil e as recomendações específicas para o caso. Organizar os dados para
Fetal – Síntese, Conclusões e Recomendações inserção e correção de campos no Sistema de Informações sobre
Mortalidade (SIM) e no Sistema de Informações sobre Nascidos
Vivos (Sinasc).
Organizar os eventos investigados para acompanhamento e
IF6 = Planilha Municipal de Vigilância do Óbito monitoramento da investigação dos óbitos e para avaliação
Infantil e Fetal situacional da mortalidade fetal e infantil para subsidiar o
planejamento e as intervenções de saúde local e regional.

Fonte: Brasil (2009a, p. 65).

Lembrete

Quanto menor o desenvolvimento social local, maiores serão as


dificuldades de desenvolvimento enfrentadas pela população.

1.3 A morbimortalidade entre crianças, adolescentes e jovens brasileiros

A violência ganha espaço quando analisamos a causa de morte entre crianças, adolescentes
e jovens. Há um grupo específico que é alvo dessa estatística: negros em situação de grande
vulnerabilidade social.

Vejamos o que relata o Mapa da Violência 2016 sobre as vítimas de homicídio por arma de
fogo (HAF):

Como vimos constatando desde o primeiro Mapa da Violência, divulgado em


1998, a principal vítima da violência homicida no Brasil é a juventude. Na faixa de
15 a 29 anos de idade, o crescimento da letalidade violenta foi bem mais intenso
do que no resto da população. [...] No conjunto da população, o número de HAF

21
Unidade I

passou de 6.104, em 1980, para 42.291, em 2014: crescimento de 592,8%. Mas,


na faixa jovem, este crescimento foi bem maior: pula de 3.159 HAF, em 1980, para
25.255, em 2014: crescimento de 699,5%.

[...]

Fato altamente preocupante: segundo estimativas do IBGE, os jovens de 15


a 29 anos de idade representavam, aproximadamente, 26% da população
total do país no período analisado. Mas a participação juvenil no total de
HAF mais que duplica o peso demográfico dos jovens: 58% (WAISELFSZ,
2016, p. 49).

Agora vamos apresentar dados que detalham a distribuição dos HAF no ano de 2014, segundo as
idades simples das vítimas.

Tabela 3 – Número de homicídios por AF – Brasil, 2014*

Vítimas
Ano
Total Jovem Juvenil
1980 6.104 3.159 51,8
1981 6.452 3.325 51,5
1982 6.313 3.118 49,4
1983 6.413 3.215 50,1
1984 7.947 4.061 51,1
1985 8.349 4.482 53,7
1986 8.803 4.750 54,0
1987 10.717 5.711 53,3
1988 10.735 5.760 53,7
1989 13.480 7.513 55,7
1990 16.588 9.193 55,4
1991 15.759 8.560 54,3
1992 14.785 7.718 52,2
1993 17.002 9.317 54,8
1994 18.889 10.455 55,3
1995 22.306 12.168 54,6
1996 22.976 12.428 54,1
1997 24.445 13.680 56,0
1998 25.674 14.643 57,0
1999 26.902 15.475 57,5
2000 30.865 18.252 59,1
2001 33.401 19.800 59,3
2002 34.160 20.567 60,2
2003 36.115 21.755 60,2

22
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

2004 60.900 20.827 60,9


2005 33.419 20.336 60,9
2006 34.921 20.939 60,0
2007 34.147 20.546 60,2
2008 35.676 21.475 60,2
2009 36.624 21.912 59,8
2010 36.792 21.843 59,4
2011 36.737 21.594 58,8
2012 40.077 23.867 59,6
2013 40.369 23.984 59,4
2014* 42.291 25.255 59,7
Total 830.420 481.683 58,0
∆ % 1980/2003 491,7 588,7 16,4
∆ % 2003/2014* 17,1 16,1 -0,9
∆ % 1980/2014* 592,8 699,5 15,4
*2014: dados preliminares

Fonte: Waiselfsz (2016, p. 49).

Brasil 2014
80,0
20 anos = 67,4
Taxas de HAF (por 100 mil)

70,0
60,0
50,0
40,0 29 anos
30,0
20,0 15 anos
10,0
0,0
0
3
6
9
12
15
18
21
24
27
30
33
36
39
42
45
48
51
54
57
60
63
66
69

Idades simples

Figura 6 – Taxas de homicídio por AF (por 100 mil) por idade simples

Tabela 4 – Taxas de HAF (por 100 mil) por idade simples – Brasil, 2014*

Idade Taxa Idade Taxa Idade Taxa


0 0,5 24 57,2 48 10.1
1 0,4 25 53,1 49 11,0
2 0,3 26 48,6 50 9,4
3 0,3 27 47,4 51 10,6
4 0,4 28 43,0 52 7,3
5 0,3 29 41,9 53 8,2
6 0,5 30 38,6 54 7,3
7 0,4 31 39,9 55 7,3

23
Unidade I

8 0,3 32 32,6 56 6,2


9 0,3 33 31,4 57 7,3
10 0,3 34 29,2 58 5,5
11 0,5 35 27,3 59 5,4
12 1,1 36 25,5 60 5,4
13 4,0 37 23,6 61 5,1
14 9,7 38 22,5 62 4,9
15 21,2 39 19,5 63 3,9
16 39,2 40 17,7 64 3,2
17 54,5 41 17,7 65 3,7
18 60,6 42 15,3 66 4,0
19 63,8 43 15,0 67 4,6
20 67,4 44 14,8 68 3,4
21 64,2 45 13,4 69 3,9
22 58,2 46 12,9 70 e + 2,5
23 55,6 47 12,6 *2014: dados preliminares

Fonte: Waiselfsz (2016, p. 50).

Pode ser vista a enorme concentração de mortalidade nas idades jovens, com pico nos 20 anos de
idade, quando os homicídios por AF atingem a impressionante marca de 67,4 mortes por 100 mil jovens.
Mas a escalada de violência começa nos 13 anos de idade, quando as taxas iniciam uma pesada espiral,
passando de 1,1 HAF, nos 12 anos, para 4,0, nos 13 anos, quadruplicando a incidência da letalidade e
crescendo de forma contínua até os 20 anos de idade (WAISELFSZ, 2016, p. 51).

Tabela 5 – Número e taxas de HAF nas Ufs (por 100 mil) segundo
faixa etária – Brasil, 2014*

UF/região/faixa Número Taxas (por 100 mil)


etária <1 a 14 15 a 29 30 a 59 60 e + <1 a 14 15 a 29 30 a 59 60 e +
Acre 3 60 47 5 1,2 27,6 17,7 8,8
Amapá 4 95 43 0 1,8 44 16 0
Amazonas 10 449 273 16 0,9 41,8 19,7 5,2
Pará 40 1.333 836 56 1,8 62,1 28,8 7
Rondônia 4 167 194 14 0,9 36,9 27,8 8,8
Roraima 2 22 20 3 1,4 15,5 10,8 8,6
Tocantins 2 97 57 6 0,5 26,1 10,1 3,4
Norte 65 2.223 1.470 100 1,3 48,1 23,5 6,3
Alagoas 26 1.123 615 54 3,1 124 50,3 15,2
Bahia 64 2.818 1.433 77 1,8 75,8 24 3,9
Ceará 88 2.487 1.125 75 4,4 108,1 33,8 6,1

24
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Maranhão 23 950 643 33 1,2 52,8 27,8 4,3


Paraíba 25 754 430 33 2,7 76,9 28,3 6,3
Pernambuco 29 1.530 863 75 1,4 67,3 24,2 5,7
Piauí 11 280 151 10 1,4 34,1 12,5 2,5
Rio Grande do Norte 18 871 3831 20 2,4 95,3 28,1 5
Sergipe 8 550 317 20 1,5 95,8 37,1 7,7
Nordeste 292 11.363 5.960 397 2,2 79,5 27,9 5,5
Espírito Santo 26 838 398 28 3,1 92,5 24,5 5,3
Minas Gerais 44 2.107 1.102 71 1 42,5 12,7 2,4
Rio de Janeiro 60 2.032 1.296 73 2 54,9 18,7 2,5
São Paulo 42 1.647 1.457 105 0,5 18,1 7,7 1,6
Sudeste 172 6.794 4.252 277 1 34,4 11,8 2,2
Paraná 27 1.195 787 48 1,2 45,9 16,8 3,1
Rio Grande do Sul 21 1.080 892 55 1 43,9 18,8 2,8
Santa Catarina 7 254 210 21 0,6 16,6 7,1 2,2
Sul 55 2.529 1.888 124 1 38,4 15,2 2,8
Distrito Federal 15 445 216 10 2,4 62,7 17,6 3,2
Goiás 19 1.245 652 35 1,3 77,5 24,3 4,2
Mato Grosso 7 454 350 28 0,9 57,7 26,1 8,2
Mato Grosso do Sul 11 202 131 7 1,8 32,5 12,1 2,2
Centro-Oeste 52 2.346 1.349 80 1,5 63 21,3 4,4
Brasil 636 25.255 14.920 978 1,4 51,6 18,1 3,5
*2014: dados preliminares

Fonte: Waiselfsz (2016, p. 52).

Essas informações também são reiteradas pelo levantamento feito na síntese de indicadores sociais
do IBGE:

Atualmente, um fator de risco que atinge especialmente a população jovem


é a violência. Os resultados das tábuas de mortalidade projetada para o ano
de 2012 evidenciaram a maior mortalidade masculina no grupo de adultos
jovens, de 15 a 29 anos de idade, em relação à população feminina. Este
fenômeno pode ser explicado pela maior incidência dos óbitos por causas
violentas, que atingem com maior intensidade a população masculina
(TÁBUAS..., 2013), com reflexos importantes nas diferenças de expectativa
de vida entre homens e mulheres (IBGE, 2014, p. 36).

Na análise do Imas (2016, p. 129), podemos entender a dimensão desses homicídios por estado e por
faixa etária:

25
Unidade I

Os dados de 2008 indicam que foram registradas 4.090 mortes na faixa


etária de 5 a 17 anos por causas externas por homicídios, sendo 713 registros
na faixa etária de 5 a 14 anos e 3.377 casos na faixa etária de 15 a 17 anos.
Em 2014, os dados indicam 5.714 registros, dos quais 856 na faixa etária de
5 a 14 anos e 4.858 na faixa etária de 15 a 17 anos. Os estados do Ceará,
Bahia e Rio de Janeiro registraram em 2014 os maiores números de casos de
mortalidades por causas externas por homicídios, respectivamente, de 615,
626 e 550 registros, totalizando 1.719 mortes.

Por conta desse cenário, foi sancionada a Lei nº 13.431/07, resultado de um projeto de
lei proposto pela deputada Maria do Rosário (PT-RS) e mais dez outros deputados. Com sua
instituição, crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência puderam contar com um
sistema de garantias nos inquéritos e no curso dos processos. A lei normatiza mecanismos para
prevenir a violência contra menores, assim como estabelece medidas de proteção para a tomada
de depoimentos (IMAS, 2016).

A violência tem ocupado destaque nos debates sobre a condição de vida de crianças e adolescentes,
hoje é vista como uma questão de saúde pública. Nos grandes centros urbanos, as taxas de atendimentos
médicos provocados pela violência aumentaram consideravelmente, tornando-se referência em
especialização médica de atendimento e socorro a feridos por arma de fogo. No Rio, por exemplo, a
violência supera locais onde há conflitos e guerras civis.

A violência vem aterrorizando cidadãos. E isso tem produzido reflexos na


rotina dos hospitais de emergência e unidades de saúde.

Uma rotina de guerra. Com números de guerra. De janeiro a março de 2017,


601 pessoas feridas a tiros foram atendidas nas emergências da região
metropolitana, 30% a mais do que no mesmo período de 2016.

O número de feridos a bala vem crescendo tanto que algumas unidades de


saúde estão sendo obrigadas a se adaptar, inclusive as UPAs, as unidades
de pronto atendimento, equipadas para atender casos menos complexos.
Médicos e enfermeiros estão sendo treinados (ROTINA..., 2017).

Além da violência, há indicadores de saúde pública muito importantes que compõem as taxas de
mortalidade, morbimortalidade e expectativa de vida de crianças e adolescentes brasileiros. Segundo
o Plano Nacional de Saúde 2016-2019 (BRASIL, 2016b, p. 10), o perfil da morbidade brasileira é
caracterizado pela crescente prevalência e incidência de doenças crônicas não transmissíveis que
já poderiam ter sido eliminadas, coexistindo com as doenças classificadas como emergentes e
reemergentes, bem como pela alta carga de acidentes e violência e, consequentemente, com reflexo
nos indicadores das taxas de mortalidade.

Nessa conjuntura, as crianças e os adolescentes são os mais vulneráveis, são os mais atingidos por
essas estatísticas. As mortes causadas por doenças imunopreviníveis ganham relevância, e todas as
26
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

ações preventivas estão no Programa Nacional de Imunização, que fixa as campanhas de vacinação
(BRASIL, 2016a).

O Brasil possui um calendário nacional de vacinação disponibilizado pelo SUS em todas as unidades
básicas de saúde e que acompanham os cuidados iniciados no pré-natal.

A imagem a seguir possui gráficos que refletem a importância da adesão às práticas de imunização
para diminuir as taxas de morbimortalidade:
Tétano neonatal Doença meningocócica
(número de casos) (número de casos)
50 5000
39 4164
40 4000
30 -92 3000 -49
% % 2109
20 2000
10 3 1000
0 0
2001 2013 2001 2013

Meningite por Haemophilus influenzae Rubéola congênita


(número de casos) (número de casos)
500 120 108
385 100
400
-73 80 -97
300 % %
60
200 40
104
100 20 3
0 0
2001 2013 2001 2013

Figura 7

90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
2010 2011 2012 2013 2014
Cobertura (%) 79,1 84 86,3 91,6 86,3
Doses aplicadas 15,4 25,1 26 29,2 35,6
(milhões)

Figura 8 – Vacinação contra influenza: cobertura e doses aplicadas em grupos prioritários

27
Unidade I

Saiba mais
Para saber mais sobre os componentes e causas da mortalidade infantil
no Brasil, leia:
BRASIL. Saúde Brasil 2011: uma análise da situação de saúde e a
vigilância da saúde da mulher. Brasília: Editora do Ministério da Saúde,
2012a. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_
brasil_2011.pdf>. Acesso em: 7 mar. 2018.

No Brasil, a TMI [taxa de mortalidade infantil] vem apresentando tendência


constante de queda, com uma redução de 26,6 óbitos infantis por mil
nascimentos em 2000 para 16,2/1.000 NV [nascidos vivos] em 2010, o que
representa uma diminuição de 39% neste período. Esta queda ocorreu em
todas as regiões brasileiras, com destaque para a região Nordeste, com 48%
de redução, passando de 38,4/1.000 NV para 20,1/1.000 NV no mesmo
período (BRASIL, 2012a, p. 168, grifo nosso).

O gráfico a seguir evidencia essa situação:


45
40
35
30
Taxa (por mil nv)

25
20
15
10
5
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Norte 33,2 31,0 29,1 28,3 27,0 26,4 25,9 24,4 23,2 22,8 21,8
Nordeste 38,4 34,7 32,9 31,6 27,6 27,0 25,4 23,9 21,8 21,4 20,1
Sudeste 19,6 18,3 17,4 17,0 16,3 15,5 15,0 14,4 14,1 13,8 13,1
Sul 16,9 16,0 15,7 15,4 14,7 13,6 13,1 12,6 12,5 11,8 11,3
Centro-Oeste 21,8 21,1 20,0 19,5 19,5 18,9 17,7 17,5 16,9 16,9 15,9
Brasil 26,6 24,8 23,5 22,9 21,0 20,3 19,4 18,5 17,5 17,2 16,2

Figura 9 – Tendência da taxa de mortalidade infantil (TMI) – Brasil e regiões (de 2000 a 2010)

28
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Nas últimas três décadas, o Brasil experimentou sucessivas transformações


nos determinantes sociais das doenças e na organização dos serviços de
saúde. [...] Nesse período, os coeficientes de mortalidade infantil foram
substancialmente reduzidos, com taxa anual de decréscimo de 5,5%
nas décadas de 1980 e 1990 e 4,4% no período 2000-2008, atingindo
vinte mortes por 1.000 nascidos vivos em 2008. [...] Apesar de todo esse
progresso, a mortalidade de crianças menores de 5 anos ainda é sete
vezes maior que em países com os menores coeficientes, e a prevalência
de déficit de altura é três vezes maior que a encontrada em populações
bem nutridas, indicando a necessidade de novos avanços (VICTORA et
al., 2011, p. 32-44).

Vejamos a redução significativa da mortalidade infantil no País nas últimas décadas por região:

60 1974-75
Prevalência de déficit de altura (%)

1989
50 1996
2006-07
40

30

20

10

0 Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste


Região

Figura 10 – Prevalência de déficit de altura por região e ano

As mortes neonatais foram responsáveis por 68% das mortes infantis.


Déficits de altura entre crianças menores de 5 anos diminuíram de
37%, em 1974-1975, para 7%, em 2006-2007. As diferenças regionais
referentes aos déficits de altura e à mortalidade de crianças foram
igualmente reduzidas. O acesso à maioria das intervenções de saúde
dirigidas às crianças foi ampliado, quase atingindo coberturas
universais, e as desigualdades regionais de acesso a tais intervenções
foram severamente reduzidas. A duração mediana da amamentação
aumentou de 2,5 meses nos anos 1970 para 14 meses em 2006-2007
(VICTORA et al., 2011, p. 32).

29
Unidade I

Agora destacamos as principais causas da mortalidade infantil no Brasil e o decréscimo que ocorreu
nas últimas décadas:
25

Mortalidade (por mil nascidos vivos)


1990
2000
20
2007

15

10

0
Perinatal Má-formação Infecções Diarreia Outras
congênita respiratórias infecções

Figura 11 – Mortalidade infantil por causa e ano

As razões para a melhora desses coeficientes incluem: modificações


socioeconômicas e demográficas; [...] melhoria na educação das mulheres
e redução nas taxas de fecundidade; intervenções externas ao setor de
saúde (programas condicionais de transferência de renda e melhorias no
sistema de água e saneamento); [...] promoção da amamentação, hidratação
oral e imunizações; criação do SUS e [...] do Programa de Saúde da Família
(VICTORA et al., 2011, p. 32).

2 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) E O CONSELHO TUTELAR

“Durante muito tempo, a infância foi marginalizada pela sociedade e no seio familiar, subjugada à
vontade e poderio adulto, ficando inclusive em uma situação de invisibilidade social, visto que não era
vista como um ator social” (LELIS; LELIS, 2014, p. 36).

A criança começou a ter seus direitos reconhecidos a partir do século XX. Em 1923, publicou-se o
primeiro documento internacional em defesa da criança, por reconhecimento à sua vulnerabilidade,
o qual foi incluído à Declaração dos Direitos da Criança, conhecida como Declaração de Genebra
(LIMA, 2012).

A reformadora social Eglantyne Jebb iniciou seu interesse pelas ciências sociais quando se instalou
na cidade de Cambridge, Reino Unido. Fundou e dirigiu a União Internacional de Proteção à Infância.
Era conhecida por ter uma “vontade de ferro”, e ela sabia despertar nos outros o sentimento de
responsabilidade e consciência social. Acreditava na solidariedade humana e no poder da ação individual
mais do que em uma reforma radical ou intervenção das autoridades. Segundo ela, o nível de um país
mede-se pela proteção da qual usufruem os mais vulneráveis. Entende-se por vulnerável a condição de
fragilidade observada desde o nascimento até o amadurecimento emocional, fase em que crianças e
adolescentes são dependentes de adultos para viver e sobreviver.

30
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Acentuamos o texto da primeira Declaração de Direitos da Criança, redigido por Eglantyne Jebb:

À criança devem ser concedidos os meios necessários para seu


desenvolvimento normal, tanto material como espiritual.

A criança que tem fome deve ser alimentada, a criança que está doente deve
receber os cuidados de saúde necessários, a criança que está atrasada deve
ser ajudada, a criança delinquente deve ser recuperada, e o órfão e a criança
abandonada devem ser protegidos e abrigados.

A criança deve ser a primeira a receber o socorro em tempos de crise ou emergência.

À criança devem ser dadas todas as ferramentas para que ela se torne capaz
de sustentar-se, e deve ser protegida contra toda forma de exploração.

A criança deve ser criada na consciência de que seus talentos devem ser
colocados a serviço de seus semelhantes (LELIS; LELIS, 2014, p. 37).

No Brasil, em 1978 (Ano Internacional da Criança), o impulso de proteção à criança ganhou


visibilidade e, a “partir desse momento, instituições não governamentais criaram alianças em favor dos
direitos de crianças e adolescentes, culminando com a política pública traduzida no Estatuto da Criança
e do Adolescente” (LIMA, 2012).

No artigo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente, “considera-se criança, para os efeitos desta


Lei, a pessoa até 12 anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade”
(BRASIL, 1990).

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi engendrado pela Lei nº 8.069, de 13 de junho de 1990
(BRASIL, 1990), com o objetivo de criar condições de exigibilidade para os direitos da criança e do adolescente,
que estão definidos no artigo 227 da Constituição Federal, estipulando que é dever da família, da sociedade e
do Estado assegurar-lhes seus direitos. Também prevê que todos têm o dever de colocar crianças e adolescentes
a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Em outras
palavras, tudo o que for direito de crianças e adolescentes é dever dos adultos.

Saiba mais
Conheça a lei que regulamenta o Estatuto da criança e do adolescente
na íntegra:
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília, 1990. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em: 9 mar. 2018.

31
Unidade I

Recém-nascidos e bebês precisam de alguém para alimentá-los e trocar suas fraldas, ou seja, são
completamente dependentes. Conforme o bebê cresce, desenvolve funções corporais e cognitivas e,
gradativamente, começa a tornar-se independente. Aos poucos, aprende a andar, a comer e a vestir-se
sem ajuda. Contudo, mesmo conseguindo executar as tarefas do dia a dia, ainda necessitam dos adultos
para protegê-los física e emocionalmente.

Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais


inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que
trata esta lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as
oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade
(BRASIL, 1990).

A adolescência é uma fase na qual se inicia o amadurecimento psíquico, que costuma começar
ao mesmo tempo em que ocorre a maturação sexual, chamada de puberdade. É uma etapa de novas
descobertas e de experimentação, servindo como uma espécie de treino para a vida adulta. Como não há
consenso entre o exato início da adolescência, usaremos a faixa etária definida no ECA (BRASIL, 1990),
originando-se aos 12 e terminando aos 18 anos.

Uma das principais características desse estágio é a construção da identidade própria, pois a criança
assume a personalidade dos pais, ou seja, gosta do que os pais gostam. Para formar sua identidade,
é preciso descontruir a identidade paterna e assumir a identidade de grupo. Por isso, é comum que
adolescentes façam o que seus amigos fazem, testando seus limites com os pais ou responsáveis. Além de
receber condições dignas de vida, é vital que seus pais ou responsáveis imponham-lhe limites, evitando
que coloquem suas vidas em risco.

Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do


Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1990).

Figura 12

32
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Vejamos o que diz a lei no caso de os adultos responsáveis pela criança ou adolescente não seguirem
tal obrigação: “Art. 5º. Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado,
por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais” (BRASIL, 1990).

Em seu Título V, o ECA traz definições sobre o Conselho Tutelar, sua formação, área de atuação,
competências, atribuições e escolha dos conselheiros. Define que o Conselho Tutelar goza de
autonomia funcional, não tendo nenhuma relação de subordinação com qualquer outro órgão
do Estado, pois realiza um trabalho de fiscalização a todos os entes de proteção à criança. “Art.
131. O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela
sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta
Lei” (BRASIL, 1990).

Observação

São considerados entes de proteção à criança: família, comunidade


e Estado.

O ECA define que cada município deverá ter, no mínimo, um conselho formado por cinco
conselheiros. Tais integrantes devem ser membros da comunidade, residir no município, ter mais de
21 anos e possuir reconhecida idoneidade moral. Cabe a eles atender e aconselhar pais, crianças e
adolescentes, visando sempre à proteção dos direitos da criança e do adolescente.

Saiba mais

Conheça mais sobre o Conselho Tutelar:

GOVERNO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Comentários dos


artigos 131 a 140 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Rio Grande do
Sul, [s.d.]. Disponível em: <https://www.mprs.mp.br/media/areas/infancia/
arquivos/comentart.pdf>. Acesso em: 6 mar. 2018.

2.1 Conceito, objetivo, aplicabilidade, ações específicas

O ECA é uma lei federal, um conjunto de normas do ordenamento jurídico brasileiro que cria
condições de exigibilidade para os direitos da criança e do adolescente, que estão definidos no artigo
227 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). É o marco legal e regulatório dos direitos humanos de
crianças e adolescentes.

33
Unidade I

Observação
Ordenamento jurídico é como se chama a disposição hierárquica
das normas jurídicas dentro de um sistema normativo. Essas normas
regulamentam as regras e princípios de um grupo ou sociedade.

Com o objetivo de amparar a criança e o adolescente de modo integral, o ECA é uma lei que visa à
proteção dos menores de 18 anos, preparando-os para a vida adulta em sociedade por meio da promoção
de desenvolvimento físico, mental, moral e social condizentes com os princípios constitucionais da
liberdade e da dignidade.

Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do


Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a


proteção à infância e à juventude (BRASIL, 1990).

Além desses preceitos, o ECA aborda questões de políticas de atendimento, medidas protetivas ou
socioeducativas, entre outras providências. Todavia, muitas vezes é preciso que o Estado, a família e a
sociedade não só cumpram a lei, mas que ocupem o lugar da criança quando houver descumprimento
da lei, denunciando qualquer contravenção por ela. Ao Estado, que se faça cumprir a lei. À família, que
trate com dignidade e respeito suas crianças. À sociedade, que denuncie a lesão aos direitos que devem
ser assegurados pelo Estado e respeitado por todos, dando voz às crianças, caladas pelo medo e ameaças
de seus agressores (MIÃO, 2010).

2.2 Atuação do enfermeiro diante do ECA

Como um membro da sociedade, o enfermeiro deve denunciar o não cumprimento do ECA. Deve
prestar cuidados à criança e ao adolescente, tratando-os com respeito e dignidade.

“Art. 7º. A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação
de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em
condições dignas de existência” (BRASIL, 1990).

34
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

O enfermeiro possui diversas atribuições, desde ações assistenciais e gerenciais até ações de
pesquisa. Ele e sua equipe são os membros do quadro de saúde que permanecem em contato direto
com o paciente e sua família por mais tempo durante a internação hospitalar. Desse modo, devem
garantir que todos os direitos de seus pacientes sejam assegurados.

Pautando-se no ECA, Lima (2012, p. 1) destaca os direitos da criança e do adolescente hospitalizado:

– proteção à vida e à saúde, com absoluta prioridade e sem qualquer forma


de discriminação;

– serem hospitalizados quando necessário ao tratamento, sem distinção de


classe social, condição econômica, raça ou crença religiosa;

– não serem ou permanecerem hospitalizados desnecessariamente por


qualquer razão alheia ao melhor tratamento;

– serem acompanhados por sua mãe, pai ou responsável, durante o período


de hospitalização, bem como receber visitas;

– não serem separados de sua mãe ao nascer;

– receberem aleitamento materno sem restrições;

– não sentirem dor quando houver meios para evitá-la;

– terem conhecimento adequado de sua enfermidade, dos cuidados


terapêuticos e diagnósticos, respeitando sua fase cognitiva, além de
receberem amparo psicológico, quando se fizer necessário;

– desfrutarem de alguma forma de recreação, programas de educação para


a saúde, acompanhamento do curriculum escolar durante a hospitalização;

– que seus pais ou responsáveis participem ativamente do tratamento e


prognóstico, recebendo informações sobre os procedimentos aos quais
serão submetidos;

– receberem apoio espiritual e religioso, conforme a prática familiar;

– não serem objeto de ensaio clínico, provas diagnósticas e terapêuticas, sem


o consentimento informado de seus pais ou responsáveis e o seu próprio,
quando tiverem discernimento para tal;

– receberem todos os recursos terapêuticos disponíveis para sua cura


e reabilitação;
35
Unidade I

– proteção contra qualquer forma de discriminação, negligência ou maus‑tratos;

– respeito à integridade física, psíquica e moral;

– preservação da própria imagem, identidade, autonomia de valores, dos


espaços e objetos pessoais;

– não serem utilizados pelos meios de comunicação de massa, sem a expressa


vontade de seus pais ou responsáveis ou da própria vontade, resguardando-
se a ética;

– confidência dos seus dados clínicos, bem como o direito de tomarem


conhecimento deles, arquivados na instituição pelo prazo estipulado em lei;

– terem morte digna, junto a seus familiares, quando esgotados os recursos


terapêuticos disponíveis;

– terem seus direitos constitucionais e os contidos no Estatuto da Criança e


do Adolescente respeitados pelos hospitais, integralmente.

Saiba mais

Para conhecer melhor os direitos da criança hospitalizada, leia:

AQUINO, F. M. et al. A produção científica nacional sobre os direitos


da criança hospitalizada. Revista Eletrônica de Enfermagem, v. 10, n. 3,
p. 796-804, 2008. Disponível em: <http://www.fen.ufg.br/revista/v10/n3/
v10n3a25.htm>. Acesso em: 10 mar. 2018.

Figura 13

36
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

É importante salientar que o cuidado à saúde não se restringe à atenção terciária, mas a qualquer
local onde há pessoas. Por exemplo, o enfermeiro de uma creche deve acompanhar o crescimento
e desenvolvimento de todas as crianças por meio de avalições rotineiras, observando necessidades
especiais, estimulando e orientando os responsáveis pela criança. Podemos citar o enfermeiro escolar,
que orienta e auxilia crianças e adolescentes com seus problemas de saúde, desde questões relacionadas
ao início da vida sexual até dores de barriga.

Há também o cuidado no campo da pesquisa. Quando examina um assunto, o enfermeiro busca a


excelência em seu cuidado. Por se tratar de um grupo vulnerável, crianças e adolescentes que participam
como sujeitos de pesquisas estão amparados pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Essa
resolução regulamenta a pesquisa em seres humanos e obriga o uso de um instrumento que formalize
o consentimento livre e esclarecido dos pais ou responsáveis pela criança ou adolescente para que eles
possam participar da pesquisa (BRASIL, 1996).

2.3 Acompanhamento da criança e do adolescente saudável

O crescimento e a evolução psicomotora de uma criança constituem a principal medida para avaliar
se suas necessidades essenciais de nutrientes, sociais e de afeto estão sendo atendidas. Se ela cresce e
se desenvolve, é uma criança saudável.

O crescimento depende de fatores genéticos e ambientais. Para tal, a criança e o adolescente


precisam desfrutar de um espaço saudável, com saneamento básico, um local social que crie condições
de cuidados adequadas, nutrição apropriada às suas necessidades corporais etc.

As medidas antropométricas da criança e do adolescente e seu controle em gráficos de


crescimento são o principal passo para verificar a adequação do crescimento, que deve ser gradual
e contínuo.

A Caderneta de Saúde da Criança utiliza como parâmetros para avaliação


do crescimento de crianças (menores de 10 anos) os seguintes gráficos:
perímetro cefálico (de 0 a 2 anos), peso para a idade (de 0 a 2 anos, de 2 a
5 anos e de 5 a 10 anos), comprimento/estatura para a idade (de 0 a 2 anos,
de 2 a 5 anos e de 5 a 10 anos), índice de massa corporal (IMC) para a idade
(de 0 a 2 anos, de 2 a 5 anos e de 5 a 10 anos) (BRASIL, 2012b).

Essa avaliação deve ser realizada periodicamente, a fim de detectar riscos de desnutrição e obesidade
infantis e agir preventivamente, evitando os agravos que podem decorrer dos distúrbios alimentares. O
Ministério da Saúde adota o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) como base de dados
para esse controle. Este sistema acompanha o estado nutricional de todas as faixas etárias e forma um
extenso registro sobre o estado nutricional.

37
Unidade I

Quadro 2 – Índices antropométricos

Índice Conceito Uso Material utilizado


É o acompanhamento do ganho de
peso, refletindo a situação global
Expressa a relação entre a da criança; porém, não diferencia o
Peso para comprometimento nutricional atual
massa corporal e a idade Balança
idade (P/I) ou agudo dos pregressos ou crônicos.
cronológica da criança.
Complementa a avaliação com outro
índice antropométrico.
Indica a harmonia entre as É usado tanto para identificar o
Peso para Balança e régua
dimensões de massa corporal emagrecimento da criança como
estatura (P/E) antropométrica
e estatura. o excesso de peso.
Destaca o crescimento linear
da criança. É o índice que melhor indica o efeito
Estatura para
idade (E/I) É considerado o indicador mais cumulativo de situações adversas Régua antropométrica
sensível para aferir a qualidade sobre o crescimento da criança.
de vida de uma população.
É aplicado para identificar o excesso
Índice de Massa Expressa a relação entre o de peso entre crianças e tem a Balança, régua
Corporal (IMC) peso da criança e o quadrado vantagem de ser um índice que será antropométrica e
para idade da estatura. utilizado em outras fases do curso calculadora
da vida.
Expressa a relação entre o É usado para verificar eventos
Perímetro perímetro cefálico da criança graves relacionados ao sistema Fita métrica
cefálico/idade até 2 anos e sua idade. nervoso central.

Adaptado de: Brasil (2011a).

Como observado no quadro anterior, acompanhar o crescimento por meio da antropometria é fácil,
tem baixo custo e é eficiente, por isso tem ampla utilização.

O desenvolvimento da criança e do adolescente é avaliado por marcos de desenvolvimento, ou seja,


tarefas específicas conforme a idade, as mudanças físicas, cognitivas e sociais. Por exemplo: espera-se
que crianças entre 4 e 5 anos contem ou inventem pequenas histórias e tenham um comportamento
predominantemente egocêntrico; entre 7 e 9 anos, que comecem a ter influência de seus amigos,
diminuindo a influência de seus pais ou responsáveis.

Saiba mais

Para obter informações mais detalhadas sobre a Caderneta de Saúde da


Criança, leia:

BRASIL. Caderneta de Saúde da Criança. Passaporte da cidadania.


Brasília: Ministério da Saúde, 2007a. Disponível em: <http://bvsms.
saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderneta_saude_crianca_5ed.pdf>.
Acesso em: 4 mar. 2018.

38
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

O cronograma de visitas de rotina proposto pelo Ministério da Saúde para as crianças que não foram
classificadas como de alto risco é o seguinte: 1ª semana, 1º mês, 2º mês, 4º mês, 6º mês, 9º mês, 12º mês,
18º mês e 24º mês. A partir dos 2 anos de idade, as consultas de rotina podem ser anuais, próximas ao
mês de aniversário (BRASIL, 2012b).

O teste do pezinho identifica a fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito e hemoglobinopatias,


como anemia falciforme e traço falciforme. O objetivo primário é a detecção e tratamento precoce,
prevenindo o retardo mental, infecções e outras complicações que podem ocasionar a morte em
crianças com hemoglobinopatias. O teste deve ser realizado logo após o nascimento, entre o
3º e 5º dia, conforme estabelecido no Programa de Triagem Neonatal do Ministério da Saúde.
Esse documento tem como objetivo detectar seis doenças: fenilcetonúria (PKU), hipotireoidismo
congênito (HC) primário, doenças falciformes (DF) e outras hemoglobinopatias, fibrose cística
(FC), hiperplasia adrenal congênita (HAC) ou hiperplasia congênita da suprarrenal e deficiência de
biotinidase (DB) (BRASIL, 2002b).

Durante o atendimento da criança e do adolescente saudável, seja em visita domiciliar, seja


em consulta na Unidade Básica de Saúde, é vital que o enfermeiro avalie sinais de situações de
risco, condições ambientais, fatores sociais e familiares desfavoráveis, desnutrição, crescimento e
desenvolvimento inadequados etc. Nesse contexto, é essencial saber a opinião dos pais, pois eles
são os cuidadores principais. A convivência traz dados importantes que nem sempre podem ser
observados durante a consulta.

No primeiro exame, o enfermeiro deve realizar a avaliação física e a análise de anamnese


com detalhe. Durante a anamnese, é necessário identificar os fatores de risco, como: ausência
de acompanhamento pré‑natal ou controle incompleto, problemas na gestação, parto ou
nascimento, prematuridade, baixo peso ao nascer, icterícia neonatal grave, hospitalização no
período neonatal, doenças graves como meningite, trauma cranioencefálico e convulsões,
parentesco entre os pais, casos de deficiência ou doença mental na família, fatores de risco
ambientais como depressão materna, uso abusivo de substâncias psicoativas (álcool e drogas)
entre os moradores da residência, violência doméstica e suspeita de abuso sexual. Após a coleta
de dados, o enfermeiro elabora um plano de cuidados visando à adaptação ao ambiente social
do recém-nascido. Para tal, deve tornar o ambiente saudável e fazer as primeiras orientações e
aconselhamentos pertinentes.

Nas demais consultas, o enfermeiro acompanha as mudanças e faz as devidas orientações e os


cuidados necessários.

O sinais vitais constituem uma importante medida do funcionamento do organismo e devem ser
aferidos em toda consulta. A frequência respiratória reflete a capacidade do organismo em inspirar,
expirar e trocar gases. Em recém-nascidos, principalmente se forem prematuros, os movimentos podem
ser irregulares, intermitentes e arrítmicos.

39
Unidade I

Tabela 6 – Frequência respiratória normal, segundo a


Organização Mundial da Saúde (OMS)

Idade Frequência respiratória


De 0 a 2 meses Até 60 mrm*
De 2 a 11 meses Até 50 mrm
De 12 meses a 5 anos Até 40 mrm
De 6 a 8 anos Até 30 mrm
Acima de 8 anos Até 20 mrm
*Movimentos respiratórios por minuto

Adaptada de: Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (2007 apud BRASIL, 2012b, p. 37).

A frequência cardíaca expressa a capacidade de o coração bombear sangue aos órgãos e levar os nutrientes
e oxigênio necessários para as células do corpo. Nos lactentes, verifica-se a ausculta do pulso apical, pois é
mais difícil palpar os pulsos periféricos. É possível auscultar sopros nos primeiros dias de vida no recém-nascido
devido ao não fechamento completo da comunicação interatrial necessária na circulação intrauterina.

Tabela 7 – Frequência cardíaca normal

Idade Variação Média normal


Recém-nato 70 a 170 120
11 meses 80 a 160 120
2 anos 80 a 130 110
4 anos 80 a 120 100
6 anos 75 a 115 100
8 anos 70 a 110 90
10 anos 70 a 110 90

Fonte: Dieckmann; Brownstein; Gausche-Hill (2000, p. 43-45 apud BRASIL, 2012b, p. 65).

A pressão arterial destaca a força que o sangue deve fazer para passar pelas artérias e depende da força de
contração do coração, do volume de líquido circulante e do diâmetro do vaso. Como os demais sinais vitais, a
aferição deve ser feita com a criança descansada, de preferência no colo da mãe ou do responsável, local em que se
sente segura, pois a respiração, a frequência cardíaca e a pressão arterial são alteradas por estresse e movimentação.

Tabela 8 – Classificação da pressão arterial em menores de 18 anos

Média das duas últimas de três aferições da pressão arterial na consulta Definição
PA sistólica e diastólica < percentil 90 Normal
PA sistólica média e/ou diastólica média entre o percentil 90 e 95 Normal alta
PA sistólica média e/ou diastólica média > percentil 95 Alta ou hipertensão arterial

Fonte: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2006 apud BRASIL, 2012b, p. 69).

40
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

A temperatura deve ser medida com uso de termômetro e, no caso de avaliação da temperatura axilar,
pode ser mais fácil aferi-la com a criança no colo da mãe ou do responsável. Os limites considerados
normais variam conforme a localização do termômetro. A temperatura axilar varia de 35,9 a 36,7 ºC; já
a temperatura oral, de 35,8 a 37,2 ºC; e a temperatura retal, menos utilizada devido ao desconforto que
pode causar, de 36,2 a 38 ºC.

Saiba mais

Para mais informações sobre o exame físico na criança, leia:

VASCONCELOS, J. de M. B.; PEREIRA, M. A.; OLIVEIRA, E. F. de. Exame


físico na criança: um guia para o enfermeiro. Rev. Bras. Enferm., Brasília,
v.  52, n. 4, p. 529-538, out./dez. 1999. Disponível em: <http://www.scielo.
br/pdf/reben/v52n4/v52n4a06.pdf>. Acesso em: 5 mar. 2018.

A partir dos 10 anos, deve-se avaliar os sinais da puberdade, como a presença de pelos pubianos e
axilares e o desenvolvimento das mamas e da genitália masculina. Análises de dados antropométricos
também são necessárias e a anotação no gráfico de IMC por idade é fundamental para acompanhar o
crescimento e a evolução saudável do adolescente.

Nessa fase, as preocupações com o corpo começam a tomar dimensão maior. Alguns jovens adotam
dietas emagrecedoras pouco recomendáveis e, em alguns casos, adquirem distúrbios alimentares como
reflexo do descontentamento com o próprio corpo ou como reação às mudanças físicas e emocionais
características da puberdade e da adolescência.

Saiba mais

Conheça os critérios de Tanner para meninas e meninos em:

BRASIL. Orientações para o atendimento à saúde do adolescente:


menina. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/
orientacoes_atendimento_adolescnte_menina.pdf>. Brasília: Ministério da
Saúde, [s.d.]c. Acesso em: 5 mar. 2018.

BRASIL. Orientações para o atendimento à saúde do adolescente:


menino. Brasília: Ministério da Saúde, [s.d.]d. Disponível em: <http://bvsms.
saude.gov.br/bvs/publicacoes/orientacoes_atendimento_adolescnte_
menino.pdf>. Acesso em: 5 mar. 2018.

41
Unidade I

Situações de risco e possíveis vulnerabilidades devem ser comunicadas aos responsáveis


sempre que detectadas, realizando as devidas orientações e acompanhamento do caso. Alterações
de crescimento e desenvolvimento devem ser assistidas pelo médico, conforme protocolos fixados
pelo Ministério da Saúde.

Lembrete

Além de cumprir a lei, o Estado, a família e a sociedade devem ocupar o


lugar da criança quando houver transgressão da lei, denunciando qualquer
contravenção por ela.

3 A CRIANÇA E O ADOLESCENTE NA ESCOLA

A partir do sexto ano de vida, a criança deve, obrigatoriamente, frequentar uma escola. Devido às
características sociais que se iniciam de forma mais intensa nessa faixa etária, observamos a escola
como o meio de convívio social mais importante, pois é lá que o jovem passa a maior parte do tempo
social, ou seja, em grupo.

É nessa época que a criança inicia seu período de educação formal. Passa a pensar com lógica,
embora de modo predominantemente concreto, sua memória e sua habilidade com a linguagem
aumentam e seus ganhos cognitivos melhoram sua capacidade de tirar proveito da educação formal. Os
amigos assumem papel fundamental, e a criança começa a compreender a constância de gênero, o que
faz com que meninos e meninas “não se misturem”. A partir dessa idade, a influência dos pais diminui
gradativamente, enquanto a influência de amigos aumenta, em especial na adolescência, quando
o jovem tem a necessidade de construção de sua própria identidade. Essa diminuição da influência
dos progenitores ocorre de maneira gradativa e tem seu ápice na adolescência. Em geral, por volta
dos 10 anos, alguns adultos ainda possuem certo poder de persuasão, sendo ouvidos e até mesmo
procurados por meninos e meninas para receberem orientação. Aos 13 anos, os adultos passam a não
ser considerados confiáveis. Por conta dessa característica, indica-se que orientações sobre saúde sejam
iniciadas desde o começo da vida social, período no qual ainda há confiança e empatia com os pais, e
devem ser englobadas em toda a vida escolar da criança e do adolescente.

Nesse contexto, observamos a importância de um ambiente escolar saudável, que pense desde a
nutrição adequada até o desenvolvimento biopsicossocial e que incentive dietas saudáveis, jogos que
promovam o convívio social, o respeito às diferenças e o estímulo de atividades físicas e ações de
aperfeiçoamento cognitivo.

3.1 Programa de Saúde na Escola (PSE)

É um programa do Ministério da Educação e do Ministério da Saúde instituído em 2007 pelo Decreto


Presidencial nº 6.286. Seu objetivo principal é o aumento da qualidade de vida da população por meio de
ações que articulem educação e saúde de crianças, adolescentes, jovens e adultos da educação pública
brasileira (BRASIL, 2007b).
42
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Para alcançar esses propósitos, o PSE foi constituído por cinco componentes:

• avaliação das condições de saúde de crianças, adolescentes e jovens que estão na escola pública;

• promoção da saúde e de atividades de prevenção;

• educação permanente e capacitação dos profissionais da educação e da saúde e de jovens;

• controle e avaliação da saúde dos estudantes;

• monitoramento e avaliação do programa (BRASIL, 2007b).

As ações devem ser parte integrante do projeto político-pedagógico da escola, levando-se em


consideração as diferenças socioculturais regionais, o respeito à competência político-executiva
dos estados e municípios e a autonomia dos educadores e da equipe pedagógica. Devem ser
realizadas por meio de medidas de promoção, prevenção e atenção à saúde, enfrentando as
vulnerabilidades que comprometem o pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes da rede
pública de ensino (BRASIL, 2009b).

Nas escolas, o trabalho de promoção da saúde com os estudantes, e


também com professores e funcionários, precisa ter como ponto de
partida “o que eles sabem” e “o que eles podem fazer”, desenvolvendo
em cada um a capacidade de interpretar o cotidiano e atuar de modo a
incorporar atitudes e/ou comportamentos adequados para a melhoria da
qualidade de vida. Nesse processo, as bases são as “forças” de cada um
no desenvolvimento da autonomia e de competências para o exercício
pleno da cidadania (PORTUGAL, 2006; DEMARZO; AQUILANTE, 2008
apud BRASIL, 2009b).

Saiba mais

BRASIL. Passo a passo PSE: Programa Saúde na Escola. Brasília:


Ministério da Saúde, 2011b. Disponível em: <http://189.28.128.100/dab/
docs/legislacao/passo_a_passo_pse.pdf>. Acesso em: 6 mar. 2018.

A execução das ações de educação em saúde deverá acontecer nos territórios definidos segundo
a área de abrangência da Estratégia Saúde da Família (Ministério da Saúde), podendo acontecer em
parques, unidades básicas de saúde ou centros de educação, por exemplo. Desse modo, é vital que
profissionais da saúde e da educação unam forças e saberes e os incorpore no cotidiano da escola
durante as aulas, no intervalo ou nas consultas de enfermagem.

43
Unidade I

3.2 Atuação do enfermeiro na saúde do escolar

Em 1986, após a VIII Conferência Nacional de Saúde, veio à tona o questionamento sobre a
complexidade do termo saúde, destacando que ela não poderia ser compreendida apenas como a
ausência de doença, mas como um conjunto de fatores subjetivos referentes a como um indivíduo vive
e como se relaciona com o meio e com outras pessoas. Foi a partir dessa conferência que as discussões
sobre promoção da saúde como uma estratégia para aumentar a qualidade de vida se intensificaram.
Acentuou-se, ainda, que cuidar da saúde não é um ato exclusivo dos profissionais da saúde, e sim de
todos (CARDOSO; REIS; IERVOLINO, 2008).

Programas como a Estratégia de Saúde da Família (ESF) e a Estratégia de Escolas Promotoras


da Saúde (EEPS) nascem dessas discussões, e todas possuem como objetivo principal a promoção
da saúde (CARDOSO; REIS; IERVOLINO, 2008). “A estratégia de escolas promotoras de saúde surgiu
no fim da década de 1980 como uma das mudanças conceituais e metodológicas que incorporam
o conceito de promoção de saúde na saúde coletiva, envolvendo o entorno escolar” (CARDOSO;
REIS; IERVOLINO, 2008).

Na EEPS, o professor estimula hábitos saudáveis de vida e avalia riscos ao escolar e a sua família.
Como exerce influência contínua em seus alunos, a sensibilidade e a didática do docente facilitam esse
processo de educação em saúde (CARDOSO; REIS; IERVOLINO, 2008).

A presença de um enfermeiro dentro da escola ainda não é comum, embora a descrição da


especialidade “enfermeiro escolar” e suas atribuições estão descritas nos Anais de Enfermagem 1936.
Nesta época a escassez de profissionais de enfermagem com formação acadêmica e a política sanitarista
transformou o enfermeiro escolar em um fiscal da saúde escolar (RASCHE; SANTOS, 2013).

O enfermeiro é um profissional capacitado para assistir o crescimento e a evolução do aluno.


Presta orientação acerca das mudanças físicas e psicossociais e pode realizar consultas individuais
ou grupos de aconselhamento com os mais diversos temas, como: relacionamento com os pais,
sexualidade, drogas, DSTs, nutrição saudável, mudanças no corpo em cada fase do desenvolvimento,
menarca e outras diretrizes pertinentes, conforme a demanda do paciente/grupo.

Figura 14 – O enfermeiro na escola

44
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Há três estratégias básicas que podemos usar para iniciar os trabalhos na escola, pois é vital que
sejamos reconhecidos como parte do “grupo”:

• Formar grupos de discussão: primeiramente, é importante conhecer a demanda do público. Para


tal, o professor pode passar pelas salas e entregar papéis com diversos temas a cada aluno, que
escolhe um ou mais. Então, coloca seu voto em uma urna, e os temas mais cotados serão pautas
das reuniões. Após a eleição, são comunicados horários e locais dos grupos. A formação de grupos
pode aumentar o vínculo entre enfermeiro e adolescente, pois essa prática é um espaço aberto de
conhecimento e aprendizagem.

• Triagem de peso e estatura: esse método é mais utilizado em crianças até os 10 anos. É possível
detectar sobrepeso, excesso de peso, risco para desnutrição e desnutrição. Ao identificar crianças
com essas alterações, agendam-se consultas de enfermagem para orientação e assistência.

• Ações educativas: deve-se propor ações lúdicas que envolvam a criança ou o adolescente na
construção do saber em saúde, abordando temas como nutrição e autocuidado, conforme a
demanda. A educação dialógica, na qual os saberes do educando fazem parte do aprendizado, é a
forma mais indicada de trabalho.

Quadro 3 – Comunicado sobre os grupos de discussão

Grupo Adolescência
Para quem estuda de manhã Para quem estuda de tarde
Quinta-feira, 16h Sexta-feira, 10h
Nós somos: Wagner, Eder, Juliana, Karen, Nós somos: Fernando, Getúlio, Camila,
Roberto, Douglas, Mariana, Jorge, Rafael, Joyce, Kelly, Kleber, Renata, Tatiana e
Rodrigo, Vânia, Janaína e Vanessa Domênico
Falamos sobre: sexualidade Falamos sobre: relação com os pais

A escolha dos temas é importante, pois demonstra que estamos interessados em ajudar os
alunos com seus problemas. Assim, eles são protagonistas, e não apenas espectadores. Isso traz
maior envolvimento e compromisso. Ademais, tudo o que eles aprendem na escola pode ser
repassado por eles mesmos aos pais, tornando-os agentes de educação em saúde.

4 PREVENÇÃO DE ACIDENTES NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA

Conforme Martins (2006, p. 344-345), “os acidentes, classificados atualmente como causas externas,
são definidos, culturalmente, como situações inevitáveis. No entanto, um novo conceito tem considerado
o acidente como um evento previsível”. Todavia, se o evento é previsível, o conceito transforma-se,
havendo vitimização, pois os acidentes ocorrem a partir da falta de cuidado necessário.

Será descuido ou desleixo das pessoas? Muitas vezes, o acidente ocorre por falta de informação ou
porque o indivíduo duvida do perigo iminente. O conceito de vitimização já nos fornece uma pista sobre
o como e o porquê acontecem alguns acidentes envolvendo crianças de 0 a 15 anos.

45
Unidade I

Nesse sentido, os pesquisadores têm apontado os acidentes como


passíveis de serem controlados e evitados através de cuidados
físicos, materiais, emocionais e sociais, colocando em discussão a
“acidentalidade” dessas ocorrências e destacando a necessidade de
prevenção (MARTINS, 2006, p. 345).

Então, a questão é vista em outra perspectiva: como orientar as pessoas para evitar acidentes
envolvendo crianças?

Saiba mais

Há muitos estudos sobre causas e prevenções de acidentes com crianças.


Destacaremos os mais relevantes:

SOUZA, L. J. E. X. de; BARROSO, M. G. T. Revisão bibliográfica sobre


acidentes com crianças. Rev. Esc. Enf. USP, São Paulo, v. 33, n. 2, p. 107-112,
1999. Disponível em: <http://www.ee.usp.br/reeusp/upload/pdf/479.pdf>.
Acesso em: 5 mar. 2018.

SERRA, G. A.; DORIA FILHO, V. Epidemiologia dos acidentes e demais


causas externas. In: COMITÊ DE ACIDENTES NA INFÂNCIA. Manual de
acidentes na infância e adolescência. São Paulo: Sociedade Brasileira de
Pediatria, 1994.

Assim, vimos que não é novidade que crianças se acidentam por falta de atenção dos cuidadores.

Ainda segundo Martins (2006, p. 345), “vários autores apontam o trauma resultante das
causas externas como o principal mal dos últimos 60 anos, em todas as partes do mundo,
ocorrendo tanto em países desenvolvidos, devido à industrialização [...] como também em
países subdesenvolvidos”.

O Ministério da Saúde adota o termo acidente na Política Nacional de


Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências (Portaria nº
737/2001), tendo em vista que a expressão está consagrada pelo uso,
retirando-lhe, contudo, as conotações fortuita e causal que lhe podem
ser atribuídas. O MS assume, portanto, que tais eventos são, em maior
ou menor grau, previsíveis e preveníveis (BRASIL, 2001 apud BRASIL,
2012b, p. 185).

Nesse contexto, todos os profissionais da saúde devem estar alerta. Precisam tomar conhecimento
e estudar as categorias acerca da abordagem sobre casos de acidentes que exponham a criança a risco

46
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

(BRASIL, 2012b). Conhecendo o perfil desses acidentes, é possível avaliar a magnitude da violência
contra a criança em distintos locais do País.

É importante destacar o esforço do Ministério da Saúde para diferenciar as formas pelas quais os
acidentes sofridos pelas crianças acontecem. Para tanto, os atendimentos foram classificados em dois
grupos: acidentes e violências.

O acidente foi definido como um evento não intencional e evitável,


causador de lesões físicas e emocionais, ocorrido no ambiente doméstico
(moradia/espaço de convivência familiar) ou social (trabalho, escola, esporte
e lazer). A violência é entendida como o uso da força contra um grupo ou
uma comunidade, de forma que resulte ou tenha qualquer possibilidade de
resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento
ou privação [...] (BRASIL, 2012b, p. 186).

A questão primordial que se coloca é: como fazer a prevenção?

Os acidentes constituem o extremo de um processo cuja cadeia causal


pode ser antecipada, razão pela qual é fundamental contextualizá-los para
propor ações possíveis e viáveis de prevenção. O procedimento de atribuir
uma multidimensionalidade, que contemple inclusive a tomada de decisão
informada, enriquece a análise e a variedade de opções de intervenção
(ROCHA et. al., 2001 apud Brasil 2012b, p. 186).

Quadro 4 – Dimensão epidemiológica dos acidentes

Ambiente
Fases Criança Agente causador Ambiente físico socioeconômico
Reduzir a
Campanhas de Separar o agente Modificações
Pré-evento quantidade e/ou
prevenção da vítima ambientais
intensidade
Instalação de
Diminuir a liberação Afastar outros
Evento Estabilizar e reparar barreiras ou
de energia agentes proteções
Suporte e
Centros de treinamento em
Pós-evento Reabilitar Avaliar seu controle trauma atendimento de
emergência

Fonte: Brasil (2012b, p. 186).

O quadro a seguir traça um planejamento a ser instituído nas quedas infantis.

47
Unidade I

Quadro 5 – Dimensão epidemiológica no contexto de um exemplo de acidente

Aberturas e vãos
Fases Criança Residência Comunidade
desprotegidos
Orientar a família para não
Orientar a criança Manter as janelas instalar móveis junto às janelas
Impedir o acesso
Antes da queda para não se pendurar protegidas com redes e providenciar a instalação de
da criança à janela
em janelas ou grades barreiras de acesso a janelas,
escadas e sacadas.
Diminuir o risco de nova Ensinar normas de primeiros
queda pela retirada de socorros à comunidade. Elaborar
Durante a queda ou Prestar os Instalar barreiras
móveis de perto das normas que regulamentem a
imediatamente depois primeiros socorros de proteção
janelas e pela instalação instalação mandatória de barreiras
de barreiras de acesso a aberturas e vãos.
Providenciar o Avaliar a qualidade Construir Facilitar o acesso ao atendimento
Depois da queda atendimento da instalação do moradias com pós-queda e o acompanhamento
necessário equipamento de proteção proteção incluída da família envolvida.

Fonte: Brasil (2012b, p. 187).

Esses exemplos servem para que analisemos as práticas relativas aos procedimentos necessários
para conhecer as vulnerabilidades, fazendo com que repensemos a maneira de incentivar hábitos e
comportamentos saudáveis. Sem dúvida, trabalhar junto aos órgãos de saúde e à família previne tanto
acidentes quanto situações de violência com as crianças (BRASIL, 2010a).

Resumo
Nesta unidade, estudamos o panorama atual da infância e da
adolescência, seus aspectos demográficos, políticos e sociais, contemplando
os programas de proteção e fortalecimento destinados a esta população.
Acentuamos quais são as contribuições da enfermagem para a efetividade
dessas ações.

Por meio dos conteúdos abordados, pudemos refletir sobre nossa


atuação profissional e sua direta participação em processos de garantia
de direitos às crianças e adolescentes, que perpassa a saúde, mas não se
encerra nela.

Conhecemos a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança


e do Adolescente (Pnaisc), instituída por meio da Portaria nº 1.130, de 5 de
agosto de 2015. Com a introdução dessa política, as taxas de mortalidade
infantil diminuíram, mas ainda são alarmantes, sobretudo nas populações
de maior vulnerabilidade. A maioria das crianças brasileiras está na zona
rural das regiões Norte e Nordeste. Vimos, ainda, que as crianças indígenas
possuem maior vulnerabilidade.

48
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Também relatamos que de 1990 a 2014 o número de homicídios dobrou


em vítimas adolescentes, ou seja, a cada dia, 30 crianças e adolescentes
foram assassinados em 2014. A maioria das causas de óbitos precoces podem
ser evitadas, desde que seja garantido o acesso a serviços qualificados de
saúde em tempo oportuno.

Examinamos o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que tem


o objetivo de criar condições de exigibilidade para os direitos da criança e
do adolescente. Preceitua que é dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar às crianças e adolescentes seus direitos à vida, à saúde, à alimentação,
à educação, à cultura, ao lazer e à profissionalização, à liberdade, ao respeito, à
dignidade e à convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1990).

Em nossos estudos, destacamos a figura do enfermeiro, que possui muitas


atribuições e responsabilidades para garantir que os direitos da criança e do
adolescente sejam cumpridos. Tais encargos vão desde a assistência direta,
acompanhando crianças e adolescentes – saudáveis ou não –, até a pesquisa
clínica para a descoberta de novas formas de cuidar deles.

Outro tema abordado foi o Programa de Saúde na Escola (PSE), projeto


com o fito de aumentar a qualidade de vida da população por meio de
ações que articulem educação e saúde de crianças, adolescentes, jovens e
adultos da educação pública brasileira.

Aprendemos algumas formas de prevenção de acidentes na infância


e adolescência, bem como sua importância, pois os acidentes constituem
o extremo de um processo cuja cadeia causal pode ser antecipada e suas
consequências podem ser fatais para a vítima. Vimos que esses eventos
previsíveis muitas vezes ocorrem, por exemplo, pela falta de informação
ou porque a pessoa dúvida do perigo iminente. O Ministério da Saúde
(2007a) adota o termo acidente na Política Nacional de Redução da
Morbimortalidade por Acidentes e Violências (Portaria nº 737/2001), tendo
em vista que a expressão está consagrada pelo uso, retirando-lhe, contudo,
as conotações fortuita e causal que lhe podem ser atribuídas.

Exercícios

Questão 1. (FCC 2012) A taxa de mortalidade infantil é um importante indicador das condições de
vida, saúde e renda de uma população. Assim sendo, sua redução indica importantes vitórias sociais.
A taxa de mortalidade infantil no Brasil caiu 61,7% entre 1990 e 2010, ou seja, de 52,04 mortes por
mil nascimentos em 1990 para 19,88/mil em 2010. Apesar de ainda ser alta, em relação a outros países
com taxas de mortalidade da ordem de 2,6 a 2,7, o Brasil está a caminho de cumprir uma das metas do
Milênio da ONU: diminuir a mortalidade infantil em dois terços até 2015.
49
Unidade I

Considere as afirmativas a seguir e assinale a alternativa que explique de forma correta as razões que
levaram a esta redução da taxa de mortalidade infantil brasileira.

I – Melhores condições de vida e trabalho.

II – Menos infecções, especialmente aquelas que se previnem com vacinas; o que contribuiu para
uma grande redução de casos de meningite e pneumonia na população.

III – Significativa redução de diarreias como causa de morte, em consequência de melhor saneamento
e aplicação de vacinas contra os enteropatógenos associados com a diarreia aguda.

IV – Maior taxa de fecundidade.

V – Maior quantidade e qualidade de alimentação.

É correto apenas o que se destaca na(s) afirmativa(s):

A) I.

B) I, II e V.

C) II e III.

D) I e V.

E) III, IV e V.

Resposta correta: alternativa B.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.

Justificativa: as melhores condições de vida, tais como habitação urbana, facilitaram o acesso a
vacinação e a renda proporcionou melhores hábitos alimentares, reduzindo a mortalidade infantil.

II – Afirmativa correta.

Justificativa: a vacinação previne doenças e infecções, reduzindo a mortalidade infantil.

III – Afirmativa incorreta.

Justificativa: a diarreia é a segunda maior causa de morte infantil, oriunda do rotavírus e do


saneamento. Este ainda é um problema a ser resolvido.
50
POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

IV – Afirmativa incorreta.

Justificativa: quando havia maior taxa de mortalidade, havia também maiores taxas de fecundidade.

V – Afirmativa correta.

Justificativa: o acesso aos alimentos em diversidade e quantidade devido aos direitos à remuneração
trabalhista contribuiu com a redução da mortalidade infantil.

Questão 2. (Fepese 2014) A caderneta de saúde da criança utiliza como parâmetros para avaliação
do crescimento de crianças menores de 10 anos os seguintes gráficos:

A) Perímetro cefálico, peso, comprimento/estatura e índice de massa corporal.

B) Peso, comprimento/estatura, índice da massa corporal; densitometria e pregas cutâneas.

C) Perímetro cefálico, peso, comprimento/estatura e a bioimpedância eletromagnética.

D) Perímetro cefálico e torácico, peso, comprimento/estatura, pregas cutâneas e índice de massa corporal.

E) Peso, comprimento/estatura, densitometria, bioimpedância eletromagnética e pregas cutâneas.

Resolução desta questão na plataforma.

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