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ENOLOGIA

Luana Costa
Enologia no Brasil

Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Descrever a história do vinho no Brasil. 


„„ Reconhecer os principais estados produtores de uvas viníferas. 
„„ Identificar as castas de uvas mais cultivadas no Brasil para a produção
de vinhos. 

Introdução
A arte da enologia no Brasil ainda é bastante recente, pois, embora as
uvas já existam no país há pelo menos cinco séculos e desde essa época
houvesse uma pequena produção de vinho, esse produto não era co-
mercializado, e sim feito para consumo próprio, principalmente pelos
imigrantes italianos e portugueses, que já tinham o hábito de consumir
vinho diariamente.
Com o passar dos anos, as técnicas para a elaboração de bons vinhos
foram chegando ao país, com as mais variadas castas de uvas que, aos
poucos, foram se adequando a cada terroir plantada. Após o cultivo no
Brasil já ter se tornado uma grande potência, as técnicas e tecnologias
utilizadas na produção de vinhos foram modificadas, o que tem melho-
rado cada vez mais a qualidade dos vinhos nacionais.

História do vinho no Brasil


As primeiras mudas de videira chegaram ao Brasil pelas grandes navegações
em 1532, porém, com o medo da concorrência na produção, Portugal proibiu o
plantio da fruta, fato que fez a história da vitivinicultura na região só começar
de verdade no país a partir de meados de 1900. Com o passar do tempo, as
mudas de videiras foram levadas para outras partes do Brasil, para se adap-
tarem aos poucos aos diferentes climas existentes no país (POMMER, 2003).
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Segundo Luisa Valduga (2017), o primeiro vinicultor no Brasil foi o por-


tuguês Brás Cubas. Ao fundar a Vila de Santos, ele deu início à plantação de
videira por toda a encosta, ainda que o clima quente, úmido e tropical não
tenha deixado a plantação vingar, fazendo todas as mudas morrerem. Contudo,
ele não deixou a ideia de lado e, ao conhecer e ganhar mais territórios Brasil
afora, chegando ao Tatuapé, tentou novamente o plantio das videiras, obtendo a
produção de uvas que, mais tarde, se tornariam vinho, de baixíssima qualidade
e muito inferior àqueles que chegavam de Portugal.
Muitas vezes, o Brasil não proporcionava lucro para Portugal e, assim que
os vinhos locais começaram a ter melhor qualidade e maior quantidade, criando
concorrência para o país colonizador, este fez com que o Brasil deixasse de
transformar uvas em vinhos, para que somente os vinhos portugueses fossem
vendidos por aqui. A lei era bastante clara e dizia que o Brasil poderia con-
tinuar cultivando uvas, mas que estas não poderiam mais ser transformadas
na bebida (VALDUGA, 2017).
Já em meados do século XX, as colônias italianas que habitavam — e
ainda habitam — o sul do país começaram a implantar novamente a cultura
de produção do vinho. Surgiram, assim, as primeiras vinícolas brasileiras,
que existem até hoje, com plantios de cada vez mais tipos de castas de uvas,
melhorando a qualidade dos vinhos em relação aos do antigo mundo, por meio
de novas técnicas de cultivo, colheita, produção, envase e transporte, para
que o produto sofra menos com os processo empregados (VALDUGA, 2017).
Além da melhora da qualidade dos vinhos nacionais, o consumo de vinho
pelos brasileiros vem aumentando gradativamente, aliado à alta nos impos-
tos de importação, o que aponta para um maior consumo da produção local
(VALDUGA, 2017).

Estados produtores de uvas vitiviníferas


Segundo Mello (2013), a vitivinicultura ocupa no Brasil uma área de aproxima-
damente 82 mil hectares, com vinhedos estabelecidos desde o extremo sul do
país até regiões situadas muito próximas à linha do Equador. O Rio Grande do
Sul contém mais de 60% da área plantada no país, seguido de outros estados
que vêm se consolidando no cultivo de uvas vitiviníferas, como Pernambuco,
São Paulo, Paraná e Santa Catarina, os quais, juntos, são responsáveis por
aproximadamente 35% da produção nacional.
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A tradição vitivinícola do estado do Rio Grande do Sul foi a que mais se


destacou no país inteiro, pois o clima e o terroir são muito propícios para
esse tipo de cultivo, embora esses aspectos positivos não estejam presentes
somente na região da Serra Gaúcha (MELLO, 2013).
Em meio ao Pampa Gaúcho, crescem os parreirais, com o solo e o clima
favoráveis para a vitivinicultura. Nessa região, as chuvas são distribuídas de
maneira mais favorável ao longo do ano e acontecem em menor proporção.
Além disso, o solo arenoso, com boa drenagem e pouca matéria orgânica,
é propício para uvas de melhor qualidade, assim como menores custos em
razão da redução de necessidade de tratamentos fitossanitários, o que conferia
características organolépticas diferenciadas ao cultivo (MELLO, 2013).
Muitos consideram o terroir dos pampas mais adequado para variedades
tintas de maturação tardia, como Cabernet Sauvignon e Tannat, e castas
brancas, como Sauvignon Blanc e Gewürztraminer (VELLOSO, 2014).
De acordo com informações do FEE (CARACTERÍSTICAS..., 2015) , nos
pampas, as áreas antes destinadas à produção de arroz e soja e à criação de
gado, agora dividem espaço com as uvas, produzindo cerca de 25% de toda
a sua produção no estado do Rio Grande do Sul.
Os vinhedos comerciais da região dos pampas tiveram início na década
de 1970, mas passaram a se expandir mais significativamente a partir da
década 1980 e 1990, com a instalação de novas empresas que investiram no
treinamento e em novas tecnologias para a produção dos vinhos (GUARNIER
FILHO, 2018).
As áreas produtoras também aumentaram e se expandiram, a produção de
uvas cresceu vertiginosamente e a qualidade dos vinhos e espumantes adquiriu
prestígio e respeito em nível mundial. Vários vinhos gaúchos foram premiados
nos mais variados e importantes concursos internacionais (GUERRA, 2005).
De acordo com o Instituto Brasileiro do Vinho, o estado de Santa Catarina
também dispõe da produção de uvas e de vinho; na parte mais fria do estado, a
região de São Joaquim, esse tipo de cultivo ainda é bastante pequeno e recente,
porém, por conta das altitudes e da temperatura, a implantação é promissora.
Uma pequena parte restante dos vinhos brasileiros provém de pequenas
regiões vitivinícolas situadas nos estados de Minas Gerais (um grande produtor
de cachaça), embora sejam considerados de média qualidade. Já o Paraná
também representa uma pequena parte da produção brasileira de bons vinhos.
São Paulo produz vinhos, embora sejam principalmente de uvas ameri-
canas, que produzem uma bebida de qualidade inferior. Nas cidades de São
Roque e Jundiaí, contudo, já há o cultivo de castas de uvas mais apreciadas,
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como as merlot e as cabernet sauvignon, melhorando a qualidade dos vinhos


produzidos (REGIÕES..., [2019]).
E, embora não se conheça tanto a respeito, na região Nordeste, houve um
aumento expressivo na quantidade e na qualidade das uvas viníferas, em razão
do Vale do Rio São Francisco, com as plantações situadas em sua maior parte
na cidade de Santa Maria da Boa Vista entre Pernambuco e Bahia, região que
tem ganhado investimento por fabricantes de vinho do Brasil e do mundo
por ter um bom clima e terroir propício para o cultivo de uvas de qualidade
(REGIÕES..., [2019]).

Castas de uvas mais produzidas no Brasil


No mundo, há uma infinidade de castas de uvas, porém nem todas foram
plantadas ou tiveram bons resultados de produção no terroir brasileiro. Por ser
um país do novo mundo, as uvas que foram trazidas nas grandes navegações
são ainda as que mais se destacam em sua produção vitivinífera. Cada casta de
uva adaptou-se a uma região na qual o clima e os solos são muito diferentes,
algumas melhoradas com o passar dos anos para chegar ao seu melhor estágio,
podendo até mesmo ser comparadas às europeias.

Variedades tintas (PACHECO; HELENA, 2000)


Cabernet Franc: uva provinda das terras francesas por volta do ano de 1900,
adaptou-se muito bem no terroir do Rio Grande do Sul, sendo uma das primei-
ras a produzirem vinhos tintos finos de boa qualidade e personalidade no Brasil.

Cabernet Sauvignon: outra casta de uva francesa que começou a ser plantada
em meados de 1913 na região do Rio Grande do Sul, adaptou-se perfeitamente
ao terroir do estado e, até os dias atuais, é considerada a vinha de casta tinta
mais utilizada na produção vinífera. Ainda, atualmente compreende a casta
de uva tinta que teve melhor produção e resultado na Região do Vale do São
Francisco e de São Joaquim (Santa Catarina).

Merlot: outra casta francesa que se destaca nas produções brasileiras, chegou
ao Brasil em meados de 1900, começou a ser plantada e a dar bons resultados
por volta do ano de 1920, adaptou-se muito bem ao terroir e ao clima frio dos
pampas e, com a cabernet sauvignon, faz parte da maior parte das produções
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de vinhos do Brasil. Seu vinho tem alta qualidade, podendo ser comparado
aos melhores do mundo de uva da casta merlot.

Syrah: casta de uva que chegou ao Brasil em meados do século XX e é uma


das mais plantadas e comercializadas no mundo. Trata-se de uma das principais
uvas utilizadas na produção de vinhos espumantes no país.

Pinot Noir: casta de uvas muito utilizada para a produção de vinhos espu-
mantes, porém o seu cultivo é bastante difícil no terroir brasileiro, já que os
frutos apodrecem com muita rapidez pelas fortes chuvas sazonais no país.

Tannat: a uva tannat começou a ser cultivada no país por volta dos anos de
1980 e representa uma casta que se adaptou bem ao clima do país, sendo
bastante produtiva. Porém, os vinhos produzidos a partir dessa casta são de
média qualidade quando jovens, melhorando a partir do envelhecimento.

Variedades brancas (PACHECO; HELENA, 2000)


Chardonnay: variedade originária da França, foi introduzida em São Paulo,
mais precisamente na região de São Roque, em meados dos anos 1930, e mais
tarde no Rio Grande do Sul. Sua adaptação ao terroir brasileiro é boa, sendo
bastante utilizada na produção de vinhos brancos finos e espumantes mais
adocicados, uma característica da casta.

Malvasia Bianca: principal uva que produz vinho espumante do tipo moscatel,
trata-se de uma uva muito aromática e que se adaptou muito bem na Serra
Gaúcha e em São Roque, podendo produzir vinhos de média qualidade quando
utilizada sozinha e em blends para adicionar aroma, sua principal característica.

Moscato Branco: casta de uva que se adaptou facilmente ao clima e ao terroir


do Sul do país, é uma espécie muito resistente a chuvas e pragas, embora suas
uvas não tenham teor de açúcar muito alto e sejam demasiadamente ácidas. Pro-
duz vinhos espumantes moscatel de boa qualidade e acidez bastante acentuada.

Moscato Canelli: variedade de uva provinda da Itália que chegando ao país


por volta de 1980, direto para as terras do Vale do São Francisco, adaptando-
-se muito bem às condições climáticas e ao terroir da região. Compreende a
casta branca principal nas produções de vinhos finos brancos e espumantes
do tipo moscatel.
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Prosecco: essa casta também se adaptou muito bem em todas as regiões


produtoras de vinhos do país e é a que produz um vinho espumante que leva
o seu nome, um dos mais consumidos tanto no Brasil quanto no mundo.

Riesling: outra variedade de casta de uvas brancas vindas da Itália, adaptou-


-se muito bem ao terroir gaúcho, porém é um tipo de uva que não suporta as
fortes chuvas de algumas épocas do ano, acabando por apodrecer. Assim, são
colhidas antecipadamente para que isso não ocorra e utilizadas principalmente
na produção de espumantes muito bem conceituados entre todos os demais
produzidos no país.

Embora também haja a produção de outras castas de uvas, as apresentadas


são as que mais se adaptaram ao terroir e ao clima no Brasil, destacando-se
tanto em qualidade quanto em quantidade (PACHECO; HELENA, 2000).

Leia, no link a seguir, uma reportagem sobre a expansão das vinícolas no sertão brasileiro.

https://qrgo.page.link/6ymQE

CARACTERÍSTICAS da agropecuária do RS. FEE, Porto Alegre, 1 ago. 2015. Disponível


em: https://www.fee.rs.gov.br/sinteseilustrada/caracteristicas-da-agropecuaria-do-rs/.
Acesso em: 13 mai. 2019.
GUARNIER FILHO, I. Os vinhedos do pampa. Plant Project, [s. l.], 22 nov. 2018. Disponível
em: http://plantproject.com.br/novo/2018/11/coluna-terroir-irineu-14-os-vinhedos-do-
-pampa/. Acesso em: 13 mai. 2019.
GUERRA, C. C. et al. Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos. Documentos no 48. Bento
Gonçalves: Embrapa Uva e vinho, 2005. Disponível em: https://www.agencia.cnptia.
embrapa.br/Repositorio/Doc48_000fr0xs4b002wyiv80084arlty8ck45.pdf. Acesso em:
10 mai. 2019.
MELLO, L. M. R. Atuação do Brasil no mercado vitivinícola mundial em 2012. A Vindima,
Flores da Cunha, v. 5, n. 49, p. 15, mar. 2013. Disponível em: https://www.infoteca.
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cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/953485/1/MelloAvindimav5n49p152013.
pdf. Acesso em: 10 mai. 2019.
PACHECO, A. O. S.; HELENA, S. Vinhos e uvas. São Paulo: SENAC, 2000.
POMMER, C. V. Uva tecnologia de produção pós mercado. Porto Alegre: Cinco Conti-
nentes, 2003.
REGIÕES produtoras. IBRAVIN, Bento Goncalves, [2019]. Disponível em: https://www.
ibravin.org.br/Regioes-Produtoras. Acesso em: 13 mai. 2019.
VALDUGA, L. A história do vinho no Brasil: conheça a trajetória da bebida em território
nacional. Blog Curiosidades, [s. l.], 28 fev. 2017. Disponível em: https://blog.famigliavalduga.
com.br/a-historia-do-vinho-no-brasil-conheca-a-trajetoria-da-bebida-em-territorio-
-nacional/. Acesso em: 10 mai. 2019.
VELLOSO, G. Os vinhos feitos nos pampas. Estadão, São Paulo, 30 dez. 2014. Dispo-
nível em: https://paladar.estadao.com.br/noticias/bebida,os-vinhos-feitos-nos-pam-
pas,10000008201. Acesso em: 10 mai. 2019.

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