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UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL E SUDESTE DO PARÁ

ALDECI EVA DOS SANTOS SANTANA

RELATÓRIO DE ESTÁGIO BÁSICO I: DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Marabá-PA

2019

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ALDECI EVA DOS SANTOS SANTANA

RELATÓRIO DE ESTÁGIO BÁSICO I: DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Relatório da disciplina de Estágio Básico I


realizado no Núcleo de Educação Infantil
Rafael Barbosa Fernandes.

Orientador: Prof. Dr. Normando José Queiroz


Viana

Marabá-PA

2019

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SUMÁRIO

1.INTRODUÇÃO..............................................................................................................4

2.REFERENCIAL TEÓRICO...........................................................................................5

3.METODOLOGIA...........................................................................................................6

3.1 POPULAÇÃO ALVO............................................................................................6

3.2INSTRUMENTOS UTILIZADOS...........................................................................7

3.3 PROCEDIMENTOS................................................................................................7

4.RESULTADOS E DISCUSSÃO..................................................................................8

5.CONCLUSÃO..............................................................................................................8

6.REFERÊNCIAS...........................................................................................................10

7. APÊNDICES...............................................................................................................11
7.1 APÊNDICE A: LISTA DE FREQUÊNCIA ................................................
7.2 APÊNDICE B: DIÁRIOS DE CAMPO....
7.3 APÊNDICE C: TERMO DE COMPROMISSO

1. INTRODUÇÃO

Neste relatório apresentamos informações sobre o Estágio Básico I, um dos


Estágios obrigatórios na formação do profissional de Psicologia na Universidade
Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA). Além deste Estágio, o estudante de
Psicologia na UNIFESSPA realiza ainda os Estágios Básicos II e III e os Estágios
Específicos. De acordo com o Artigo 2º do Regulamento do Estágio Obrigatório do
Curso de Psicologia, o Estágio na formação Psicólogo na UNIFESSPA “visa

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proporcionar ao (a) aluno(a) formação prática, com desenvolvimento das competências
e habilidades necessárias à atuação profissional”.
Assim, nosso objetivo neste documento é refletir sobre a experiência de
observação com uso do referencial teórico, instrumentos e de ferramentas da Psicologia
no ambiente escolar com foco no processo de construção do autoconceito na primeira
infância a partir da observação de crianças em turmas de Educação Infantil.
Assumimos que o Estágio é de fundamental importância para que, como
futuros profissionais de Psicologia, possamos construir um olhar sobre as diferentes
realidades com as quais realizaremos nosso trabalho. A inserção no ambiente escolar
nos permitiu relacionar os conhecimentos produzidos ao longo dos quatro semestres de
formação acadêmica ás demandas que se apresentam ao Psicólogo no contexto escolar,
relacionando teoria e prática.
Além disso, o Estágio possibilitou a vivência na prática dos conceitos e
referenciais estudados em sala de aula, tal como no caso dos estudos realizados na
disciplina de Teoria do Desenvolvimento Humano I, cujo foco era o Desenvolvimento
Infantil. No Estágio Básico I foi possível observar em situações reais de vida,, os
fatores, as características, conceitos e aspectos vistos teoricamente. A observação em
contexto escolar propiciou o aprendizado sobre o desenvolvimento infantil, sobre o
trabalho do psicólogo escolar e também, certamente, contribuirá, a partir das ações de
intervenção que serão realizadas, com o trabalho desenvolvido pelos profissionais das
escolas que nos acolheram e orientaram de modo que a Educação Básica ofertada na
rede pública de ensino seja beneficiada com o conhecimento produzido na Academia a
partir dos dados gerados durante o período de Estágio.
As observações realizadas no Estágio Básico I foram orientadas pelos
princípios da observação etnográfica, posto que a etnografia é “a arte e a ciência de
descrever um grupo humano, suas instituições, seus comportamentos interpessoais, suas
produções materiais e suas crenças” (ANGROSINO, 2009, p.30). Isso nos desafiou a
construir neste relatório uma escrita que também seja interpretativa. Ao apresentarmos,
através do texto, o nosso local de pesquisa estaremos também construindo uma
interpretação sobre o campo de observação do Estágio. Esse campo, em certa medida,
será por nós construído ao mesmo tempo em que sobre ele refletimos a partir das
anotações feitas no diário de campo.

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2. REFERENCIAL TEÓRICO

As observações realizadas se pautaram na geração de dados sobre o


desenvolvimento infantil tendo em vista a construção do conceito de si mesmo ou o
autoconceito por crianças de 05 e 06 anos de idade. Essa realidade psicológica é
bastante complexa e defini-la tem gerado muitos debates teóricos ao longo dos anos. O
trabalho de L`cuyer (1985), que apresenta ampla revisão dos trabalhos já produzidos na
Europa e América do Norte sobre o conceito de si mesmo, embasaram nossa observação
em campo e as reflexões apresentadas neste relatório.
O autor destaca que as definições de conceito de si mesmo mais recorrentes se
assentam nos pressupostos dos estudos Fenomenais e da Psicologia Social. Para os
autores do campo da Cognição Social, o si mesmo é também um si mesmo social, o qual
resultaria da complementaridade entre o si mesmo e o próximo. O si mesmo social
consistiria no modo como o indivíduo percebe os outros, como ele imagina que os
outros o percebem e como os outros o percebem (L’ÉCUYER, 1985, p. 18). Os estudos
Fenomenais teriam definido melhor o conceito de si mesmo porque analisam o humano
mais do ponto de vista interno do que externo.
Ainda de acordo com L’écuyer (1985), entre os teóricos norte americanos as
diferenças na construção das definições do conceito de si mesmo se assentam,
principalmente, nas distinções entre a noção de eu (ego) e si mesmo (self). Para alguns
teóricos o si mesmo (self) estaria relacionado aos processos perceptuais, ao que o
indivíduo pensa de si mesmo e formula a respeito de si mesmo. Já o “eu” (ego) estaria
relacionado aos processos ativos. Outros autores tratam como equivalentes esses termos
e consideram superficial e supérflua essa distinção. Outros ainda invertem as definições
tratando o si mesmo como relacionado a processos perceptuais e o “eu” (ego)
relacionado a processos ativos. L’écuyer ressalta que essas posições teóricas causam
uma confusão na compreensão dessas realidades psicológicas, uma vez que o sujeito
conhecido é ao mesmo tempo o sujeito conhecedor (L’ÉCUYER, 1985p.24).
Já os autores europeus vão centrar o debate no percurso da construção da
consciência de si até o conceito de si mesmo. Para esses autores o recém nascido, à
medida que interage com o mundo e com os cuidadores, constrói uma consciência de si
-diferenciação entre o eu e o não- eu, toma consciência do outro. Esse é o primeiro
passo para, posteriormente, ao longo da primeira infância, construir uma imagem de si

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mesmo, uma representação de si mesmo até se construir uma identidade, um conceito
de si mesmo. Disso resulta uma

Concepção mais geral de si mesmo, “obtida a partir das experiências


vividas, logo percebida e, finalmente, simbolizada e conceituada pelo
indivíduo” (L’écuyer, 1975 a, p.31), constitui o conceito de si mesmo.
O conceito de si mesmo será deste modo uma espécie de ponto de
chegada – embora nunca alcançado apesar de tudo- após um longo
período de elaboração; transcende cada um dos elementos
experienciais (Gendlin, 1964) e perceptuais considerados
separadamente, mas não pode existir sem eles (L’ÉCUYER, 1985, p.
29).

L’écuyer observa que há conteúdos comuns nas definições de conceito de si


mesmo elaboradas por autores norte americanos e europeus, tais como a referência ao
“conjunto de traços, de imagens e de sentimentos que o indivíduo reconhece como
formando parte de si, conjunto influenciado pelo entorno e organizado de forma mais ou
menos consciente” (1985, p.32). Para L’écuyer, portanto, o conceito de si mesmo deve
ser compreendido como multifacetado, uma vez que se trata “de uma organização
hierarquizada de um conjunto de percepções que abarcam os mais variados aspectos no
que se refere à maneira segundo a qual a pessoa se percebe” (1985, p. 33). Assim, o
conceito de si mesmo relaciona-se tanto a processos perceptuais quanto ativos e deve ser
entendido como um conceito multidimensional.

3. METODOLOGIA
3.1 População alvo
As observações do Estágio Básico I, com foco no Desenvolvimento Infantil,
foram realizadas no Núcleo de Educação Infantil (NEI) Rafael Barbosa Fernandes,
localizado no Núcleo Nova Marabá, Folha 33, Qd 18, Lt 50. Esse NEI tem turmas de
Maternal, Jardim I e Jardim II, atendendo crianças de 03 a 06 anos de idade. Nossas
observações foram realizadas numa turma de Jardim II formada por 22 crianças com
idades entre 05 e 06 anos, sendo que somente 07 dessas crianças eram meninas. Fator
que nos chamou a atenção, especialmente, pelo modo como as crianças eram agrupadas
pela professora durante as aulas.

3.2 Instrumentos utilizados

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Foram realizadas observações etnográficas com registro escrito em diário de
campo.

3.3 Procedimentos

Antes do início das observações no Núcleo de Educação Infantil, foram


realizadas orientações em sala de aula pelo orientador do Estágio Básico I. Nessas
orientações foram estudados os aspectos metodológicos da observação etnográfica e da
pesquisa em contexto escolar. Além disso, foram estudados textos teóricos que tratavam
dos aspectos que deveriam ser focados na observação do cotidiano escolar das crianças
na primeira infância. Esses textos abordavam o debate teórico sobre a construção do
conceito de si mesmo.
No primeiro dia de observação no Núcleo de Educação Infantil nos
apresentamos à equipe gestora da escola. A supervisora do Estágio na escola já nos
aguardava e conduziu-nos à sala onde realizaríamos as observações. Fomos
apresentadas à professora regente e às crianças. Sentamo-nos ao fundo da sala de aula
em uma das mesas onde havia três crianças. É importante ressaltar que a sala se
organizava por grupos de crianças ao redor de mesas que formavam um círculo. Nos
primeiros minutos as crianças ficaram curiosas e nos observando, mas logo que
iniciaram as atividades previstas na rotina do dia e nos viram participar com eles- rezar
e cantar- as crianças voltaram a interagir normalmente entre si e com a professora.
Foram realizadas 12 horas de observação em sala de aula com o registro escrito em
diário de campo.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A estrutura da escola não oferece muito espaço para o desenvolvimento de


atividades lúdicas com as crianças. O pátio é muito pequeno e em concreto. As salas de
aulas também são muito pequenas. Apesar disso há dois balanços e um pula-pula feitos
de pneu reciclado por funcionários da escola. Esses e uma bola feita de meias são os
brinquedos disponíveis para as crianças na hora do recreio.
Todas as salas de aula têm ar condicionado, porém algumas estão com os
equipamentos quebrados e são muito quentes, de acordo com os funcionários da escola.

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O mobiliário da escola e os banheiros seguem os princípios da pedagogia Montesoriana,
tudo tem tamanho adequado à estatura das crianças, vaso sanitário, pias, bebedouros,
mesas e cadeiras, garantindo a autonomia delas.
A rotina da turma observada se iniciava com a acolhida das crianças pela
professora na porta da sala. Depois que todas as crianças estavam em sala recebiam o
desjejum, geralmente uma fruta servida às crianças antes do início da aula. Ao
retornarem para a sala a professora convidava a turma a fazer uma oração. Essa era
seguida de uma música religiosa, leitura dos números de 1 a 9, leitura das letras do
alfabeto. Na leitura do alfabeto a professora lia com as crianças todas as letras e depois
perguntava a cada uma a família silábica de uma letra e pedia para soletrar uma palavra
que iniciasse com a letra lida pela criança.
Depois dessa atividade a professora lia com a turma o calendário para
identificarem o dia e o mês, contavam quantos meninos e quantas meninas havia na sala
e qual o total de alunos na turma naquele dia; marcavam em um cartaz como estava o
tempo, se ensolarado, nublado ou chuvoso. Em seguida a professora sorteava o nome da
criança que seria ajudante do dia, alternando entre meninos e meninas. Depois realizava
a leitura de algum conto de fadas e colocava no quadro, para as crianças copiarem, um
resumo da história. Depois iam para o recreio para lanchar e brincar no pátio e
retornavam para organizar o material e aguardar o horário da saída.
Nas 12 horas de observação em sala de aula notamos que as crianças ficavam o
tempo todo sentadas nos grupos de seis mesas que, agrupadas, formam um círculo.
Esses grupos eram formados pela professora que dividia as crianças segundo o sexo. Na
turma havia 07 meninas e 15 meninos. Assim, havia uma mesa só de meninas e duas só
com meninos, os demais ficavam em uma mesa mista. As crianças pouco circulavam
pela sala, pois ao se levantarem a professora já chamava a atenção e mandava de volta
para o lugar delas. Quando as crianças começavam a conversar a professora falava alto
para que fizessem silêncio. Elas paravam alguns minutos e logo reiniciavam as
conversas.
Nos questionamos se a forma como a sala era organizada com a separação dos
grupos por sexo estaria contribuindo para que as crianças construíssem representações
conservadoras sobre as relações entre meninos e meninas ao longo da vida escolar e das
relações fora da escola. O professor é o principal cuidador no ambiente escolar e suas
ações se tornam referência para as crianças acerca dos padrões de comportamento e das
expectativas sobre elas colocadas no ambiente escolar.

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Uma situação pode ilustrar nosso questionamento. Em uma aula, durante a
leitura do alfabeto os pequenos A., G. e a menina L. brincavam com uma faixa de
cabelo com um laço vermelho que L. tinha em sua cabeça. A. desafiou G. a colocar a
faixa de L. em sua cabeça. L. riu e disse que eles não podiam colocar porque era coisa
de mulher. G. então disse que A. devia colocar a faixa primeiro e depois ele colocaria.
A. colocou a faixa torta em sua cabeça para produzir o riso nos colegas. Quando chegou
a vez de G., esse mudou as regras da brincadeira e não colocou a faixa na cabeça. L.
estava rindo dos meninos e nos mostrou que eles estavam usando “coisa de mulher” na
cabeça. Em seguida, G. disse a L. para voltar para a mesa das meninas, pois ali não era
o lugar dela.
Relacionado a isto também observamos como se dava a construção do
autoconceito entre as crianças no que se refere a descoberta do corpo, das diferenças
entre o próprio corpo e dos colegas. A questão da sexualidade pareceu ser um tema que
causava uma tensão no ambiente. Havia nas portas das salas de aula cartazes com a
frase “criança não namora”. Esses cartazes nos pareceram ser direcionados aos pais das
crianças para orientar sobre a necessidade de não sexualizar as relações infantis.
Também as atividades de sala de aula eram orientadas nesse sentido. Como observamos
no ensaio da encenação da música “Linda rosa juvenil”. A letra da música é a seguinte:
A linda rosa juvenil, juvenil, juvenil
A linda rosa juvenil, juvenil
Vivia alegre em seu lar, em seu lar, em seu lar
Vivia alegre em seu lar, em seu lar
E um dia veio uma bruxa má, muito má, muito má
Um dia veio uma bruxa má, muito má
Que adormeceu a rosa assim, bem assim, bem assim
que adormeceu a rosa assim, bem assim
E o tempo passou a correr, a correr, a correr
E o tempo passou a correr, a correr
E o mato cresceu ao redor, ao redor, ao redor
E o mato cresceu ao redor, ao redor
E um dia veio um belo rei, belo rei, belo rei
E um dia veio um belo rei, belo rei
Que despertou a rosa assim, bem assim, bem assim
que despertou a rosa assim, bem assim
Batemos palmas para o rei, para o rei, para o rei
batemos palmas para o rei, para o rei

Ao cantarem o verso “E um dia veio um belo rei, belo rei; Que despertou a rosa
assim, bem assim, bem assim, que despertou a rosa assim, bem assim” as crianças
começaram a rir com certo constrangimento. A professora perguntou por que estavam

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rindo e as crianças responderam que o colega que estava representando o rei teria de
beijar a bochecha da menina que estava representando a rosa.
A professora foi incisiva em esclarecer as crianças que não teria beijo no rosto e
orientou que o menino que representava o rei deveria fazer-de-conta, colocando a ponta
dos dedos na bochecha da menina que representava a rosa, que estava dando-lhe um
beijo para despertá-la. Como as questões da afetividade e da sexualidade infantil
estavam sendo trabalhadas com aquele grupo de crianças, como estavam se percebendo
meninos e meninas? Questões relacionadas a essa temática nos acompanharam desde o
primeiro dia de observação tendo em vista que para alguns teóricos a construção do si
mesmo “resulta da complementaridade entre o si mesmo e o próximo”, ou seja, o si
memos social” ( L’ÉCUYER, 1985, p. 19). O papel do professor tem grande relevância
na construção do autoconceito pelas crianças, haja vista que os cuidadores, entre eles o
professor, oferecem um parâmetro de avaliação para as crianças sobre suas capacidades,
seus comportamentos e as expectativas sobre elas.
Como nos apresenta L’écuyer em sua revisão da literatura sobre o tema, a
transmissão dos padrões de comportamento aceitos socialmente para as crianças se faz
também a partir das habilidades e competências que são ressaltadas pelos cuidadores
como sendo as “corretas”, os comportamentos que se espera que elas apresentem em
cada situação (CAMPOS-RAMOS, 2015, p. 62). Nesse sentido a professora da turma
desempenhava um papel importante sobre a construção que as crianças produziam de
autoimagens e representações de si com um certo apagamento da sua corporeidade.
Ao mesmo tempo, no que tange ao desenvolvimento de competências
relacionadas à aquisição da escrita, a professora favorecia a construção de autoimagens
positivas e uma boa autoestima nas crianças. A cada criança que realizava a atividade de
leitura das letras do alfabeto a professora convoca toda a turma a dar os parabéns e bater
palmas para o colega. Quando uma das crianças apresentava dificuldade na realização
da atividade de leitura ou cópia do texto do quadro a professora a incentivava e
auxiliava a lembrar o nome da letra ou a soletrar a palavra solicitada e comentava com
as demais crianças que o colega estava pensando e que precisava de silêncio.
Quando uma das crianças se apressava em responder no lugar daquele que
estava com dificuldade, a professora pedia que tivessem paciência e esperassem o
coleguinha pensar e lembrar, pois cada um teria sua vez de ler e soletrar. A professora
estimulava as crianças e elogiava cada uma em cada atividade realizada, sempre
solicitando a toda a turma que parabenizasse os colegas.

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Em uma aula, durante a leitura do alfabeto o pequeno A., que parecia já estar
alfabetizado, se antecipou aos colegas e queria soletrar todas as palavras que a
professora falava. A professora o repreendeu e disse que ele estava atrapalhando os
colegas, que cada um soletraria uma palavra. Ele continuou se antecipando e foi punido
pela professora não tendo o direito de soletrar uma palavra como cada colega fez
durante a aula. A. ficou inquieto na mesa e sem prestar atenção na atividade. Em outra
mesa o pequeno J. brincava de faz-de-conta e não participava da atividade de leitura.
Em todas as aulas notamos que ele era frequentemente disperso, desatento e pouco
interagia com os colegas, brincando e falando sozinho. Em uma das aulas a professora
comentou conosco que J. era sempre disperso, mas muito criativo, que ele tinha muita
imaginação.
Em outra aula, porém, quando o pequeno P.F terminou a tarefa, as crianças
cantaram “alelulia, aleluia”, depois bateram palmas e repetiam o nome dele. Neste dia
ele estava bastante desatento, foi para o lanche sem concluir a tarefa e a turma demorou
sair para brincar porque ele ainda estava terminando de copiar o texto do quadro. Esse
episódio ilustra como os colegas também exercem um papel de relevância na construção
do autoconceito pelas crianças. Ainda que a professora se esforce por destacar aspectos
positivos nas atividades realizadas por cada criança, os colegas ressaltam elementos
negativos. É nessas interações com todos os indivíduos que participam de sua vida
escolar que cada criança se representa e, paulatinamente, constrói um conceito de si
mesma.

5. CONCLUSÃO

De acordo com Michel Angrosino (2009), a etnografia busca modelos de


observação cuidadosa dos comportamentos vividos. O psicólogo, nessa área, atua como
participante e observador, emergindo-se na comunidade, participando de várias
atividades, através dessa observação atenciosa e atento aos processos de afinidades,
procurando observar o estilo pessoal adotado pela comunidade estudada para saber
sobre as pessoas e o seu modo de vida.
Esse estágio nos proporcionou relacionar os conhecimentos produzidos nesses
quatro semestres com as demandas de um psicólogo que atua no âmbito escolar e
infantil e a prática teórica estudada na faculdade, nos auxiliando em uma posterior
necessidade de aplicação, para que desde já pensemos em uma intervenção e na forma

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mais coerente para se agir diante dos dilemas ali encontrados. A nossa prolongação em
campo foi muito limitada para apontamento de dados sobre a construção do conceito de
si mesmo pelas crianças, figuração que era essência dessa observação. As rotinas
escolares não possibilitavam as crianças falarem de si.
Diante da realidade ali encontrada, percebi que as crianças aprendem através da
imitação do que veem, sendo, portanto, um reflexo dos seus pais e familiares e do seu
cotidiano, daquilo que vivenciam em seus lares. As crianças são como esponjas, que
absorvem tudo do convívio social (igreja, família, coleguinhas, etc) e transferem para
micro sociedade, que é a sala de aula. Porém, o ambiente em que vivem são de pessoas
sem muitas perspectivas de melhoria de vida, onde viver abaixo da linha da pobreza é
um fato e os pais utilizam os seus meios para sobreviver, sendo estes, algumas vezes,
ilícitos ou indignos. Assim, as crianças refletem essa realidade, demonstrando-se muitas
vezes agressivas, ou carentes, devido a maioria delas terem muitos irmãos e os pais não
conseguirem dar a atenção necessária. Ademais, apesar da escola auxiliá-las com
alimentação e com uma criatividade e dinâmica muito proveitosa para trabalhar com o
que lhe é oferecido, ela não consegue sobressair aos alunos que eles têm a oportunidade
de melhoria de vida através dos estudos.
Dessa forma, esperava que dentro da sala de aula, crianças nessa faixa etária de
5 anos, além de ter um bom ensino, também obtivessem mais momentos de
socialização, porém, percebe-se que é mais voltado a um sistema de ensino jesuítico e o
foco da professora na sala de aula é a alfabetização e não essa coletivização.
Observamos que havia um poder disciplinador semelhante à teoria do poder
disciplinador de Foucault, ao qual há um sistema de controle social rígido, trazendo uma
regra rígida de ter que ser alfabetizado.

6. REFERÊNCIAS

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ANGROSINO, Michael. Etnografia e Observação Participante. Porto Alegre: Artmed,
2009.
CAMPOS-RAMOS, Patrícia C. Desenvolvimento das interpretações de si, do outro e
mundo por crianças na transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental.
Tese (Doutorado), Universidade de Brasília: Brasília, DF, 2015, 200fl.
L’ÉCUYER, René. El concepto de sí mismo. Barcelona: Oikos Tau Ediciones, 1985.

7.APÊNDICES

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