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Disciplina: Introdução à Ciência Política

Professor: Jorge Chaloub | Semestre: 2021.1

Aluna: Andressa Nora dos Anjos | DRE: 121045600

Conceitos: Política e Poder

1ª PROVA

O ilustre conto de Machado de Assis, A Sereníssima República, publicado no século XXI,


período em que se colocava em xeque a monarquia brasileira, relata a conferência de Cônego
Vargas, um narrador privilegiado da trama que declara ter descoberto a língua das aranhas, e
que, através delas, foi capaz de organizar uma sociedade com a espécie. Em sua obra,
Machado de Assis retrata a realidade da época a partir do comportamento humano,
analisando os assuntos sociais, econômicos e políticos por meio de alegorias, sendo elas, a
própria população brasileira do século XXI. Logo, ao longo do conto, observa-se uma relação
que Machado de Assis constrói que perpassam entre os conceitos de poder e política. Sendo
assim, é possível dizer que houve uma invenção da política na sociedade das aranhas?
De acordo com o filósofo Francis Wolff, em sua obra A Invenção da Política, “existe
política a partir do momento em que uma comunidade se coloca a par da questão do poder ou
desde que o poder exercido por alguns (tais indivíduos, tais castas ou tal classe social) se
exerça no quadro de uma comunidade, tendo em vista o seu modo de vida”, ou seja, nenhuma
sociedade é mais política que a outra ou teve a virtude de criá-la, pois a política, segundo
Wolff, passa a existir a partir do momento em que houve humanidade em alguma parte da
terra. Tendo em vista essa definição, não é cabível afirmar que houve uma invenção da
política entre as aranhas, visto que elas, enquanto uma espécie, sempre foram um coletivo,
que, vivendo de forma independente ou não, obtinham o político, isto é, a existência de uma
relação de poder.
Dessa forma, no conto, verifica-se a urgência de Cônego Vargas em restaurar ou dar origem
a um governo para a comunidade das aranhas, pois era necessário um governo que fosse
capaz de gerir as relações de poder existentes. Vargas, conclui, portanto, que a república
seria o modelo de governo mais adequado para organizar as aranhas, visto que, como aponta
João Ubaldo Ribeiro, em Política: quem manda, por que manda, como manda, “a política
refere-se ao exercício de alguma forma de poder e, naturalmente, às múltiplas consequências
desse exercício” (...) “em que toda sociedade possui mecanismos estabelecidos, através dos
quais as decisões públicas são formuladas e efetivadas”. Desse modo, com a criação de uma
república na sociedade das aranhas, o conceito de João Ubaldo Ribeiro aponta que, a política
tende a perpassar por relações de poder, não apenas reproduzindo-o, mas sim, criando novas
relações de poder. Pois política é um jogo de poder que, segundo o filósofo Michel Focault,
em Omnes et singulatim: Para uma crítica da razão política, possui dimensões micro e
macro, não estando presente somente nas instituições, mas também na relação com o outro.
Sendo assim, a relação de poder se constrói com base na legitimidade, na qual o indivíduo
passa a seguir e obedecer determinadas regras com base no que é legítimo para ele, ou seja,
na figura que possui o poder e a representatividade. Como por exemplo, a ideia do pastor que
Foucault apresenta em sua obra, em que o pastor, uma figura de liderança, representatividade,
sabedoria possui contato mais próximo com Deus e interliga a relação dele com a de seus
fiéis. Assim como em A Sereníssima república, o exemplo de legitimidade se apresenta
também próximo a ideia de Deus, visto que a comunidade das aranhas só obedecia ao Cônego
Vargas por pensar que ele era uma espécie de divindade que estaria ali para julgar os seus
pecados as suas virtudes. Além disso, outra forma de exemplificar as relações de poder
existentes na sociedade das aranhas é através da implantação de um governo e sob a decisão
de que as aranhas precisavam trabalhar para que a sociedade pudesse funcionar. Então, cria-
se um sistema eleitoral, pois acreditava-se que estava no ato eleitoral a base de uma vida
pública e política. A partir disso, foi através desse sistema que se viu a possibilidade de
administrar a vida social das aranhas por meio do sorteamento de leis que decidiriam a ordem
social da comunidade. Porém, um sistema que era pra apresentar regularidade, apresentava
fraudes e mais fraudes, o que colocava em disputa o poder que as aranhas tinham umas sob as
outras, desvalidando, assim, o seu regime. Posto isto, percebe-se que nenhum governo
sobrevive sem legitimidade e sem a conciliação do poder entre seus indivíduos.
Conclui-se, portanto, que a comunidade das aranhas é quem vai adaptando uma instância
política e a unidade do político ao longo de sua formação. E, nota-se, ainda, que as questões
trazidas por Machado de Assis naquela época ainda permanecem atuais, pois é necessário
compreender o conto desde o seu ponto de vista histórico. Assim, ao longo da obra, Machado
de Assis ironiza o modelo de governo da comunidade das aranhas que, apesar de tentar copiar
Veneza, as aranhas, individualistas como eram, nunca seriam como as formigas,
trabalhadoras e harmônicas, pois a sociedade das aranhas possuía esse “jeitinho” brasileiro de
ser. Mas, apesar das eventualidades, segundo Cônego Vargas, um dia elas talvez
conseguissem alcançar a sociedade republicana ideal devido a sua persistência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

Machado de Assis, Joaquim M. em “A Sereníssima República”.


Wolff, Francis. em “A Invenção da Política”.
Ribeiro, João Ubaldo. em “Política: quem manda, por que manda, como manda, capítulos 1
e 2”.
Foucault, Michel. em “Omnes et singulatim: por uma crítica da ‘razão política’”.

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