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Universidade do Estado da Bahia

Departamento de Ciências Humanas – Campus I


Curso: Licenciatura de História
Componente Curricular: Aspectos do Ocidente Medieval
Docente: Márcia Maria da Silva Barreiros
Discente: Bruna Silva Pereira

DUBY, Georges. A História Continua. Rio de Janeiro: Zahar Editora, 2002. p. 9-


83.
Escrito em 1991, o ensaio de ego-história “A História Continua”, de
Georges Duby, traça a trajetória do autor na pesquisa historiográfica medieval,
mostrando através dela o processo de escrita da sua tese, desde as pesquisas,
leituras, quem o influenciou, os debates da época, as debilidades etc.
Importante destacar a sua formação inicial em geografia, acabando por se
interessar pela História, sobretudo a História Medieval, após um contato com a
obra “A Sociedade Medieval” de Marc Bloch. Desse encontro também vem
umas das principais influências das obras do historiador: a Nova História,
escola francesa fundada pelos Annales de Lucien Febvre e Marc Bloch, na
década de 30.

Esse movimento historiográfico se propunha a trazer uma nova


perspectiva, contrapondo a corrente positivista do século XIX, que pregava a
aproximação entre os métodos das Ciências Humanas e das Ciências Naturais,
tendo a História que ser neutra, cientificamente objetiva, centrada nas fontes
documentais oficiais e nos “grandes homens”. Já os Annales, em contrapartida,
defendem a pluralidade de fontes e a interrogação dessas, a “história vista de
baixo”, a interdisciplinaridade, o olhar crítico do historiador, a longa duração
histórica, dentre outras coisas. É desse movimento que Duby mistura o objeto
de Bloch, o medieval, com o estudo do imaginário e das mentalidades daquela
sociedade, advinda de Febvre, tentando entende-la pelos seus próprios olhos,
acrescendo ainda uma última influência: o materialismo marxista e a visão das
estruturas econômicas dessa sociedade.

Dada essa contextualização, inicialmente, temos um panorama do que


estava ocorrendo nos anos 40, quando o autor inicia a escolha da sua tese, em
que os pesquisadores estavam enveredando pela história econômica,
priorizando os números e relegando os homens em segundo plano. Em
contrapartida, Duby escolhe o estudo da formação social da sociedade feudal,
através, principalmente, dos arquivos da abadia de Cluny, enxergando nesses
a evolução das relações sociais, sempre se voltando as mentalidades, aos
comuns e a vida cotidiana. Vemos também a forma como um de seus
orientadores, Charles-Edmond Perrin, recomenda-o um contato primeiro com a
fonte, antes de definir o tema, demonstrando a importância desse contato
conduzir a escolha da pesquisa a ser feita, do que se tem em posse ser o
delimitador desta.

É apresentado também, quando Duby analisa os escritos de monges


copistas da Escola dos Forais, o problema do contato com fontes secundárias
em comparação as primárias, como a veracidade e a vivacidade nessas são
perdidas, pela confiança desses em sua memória, pelo lugar que ocupam e
pela interpretação inerente da transcrição. Além disso, há a questão da falta de
datação dos séculos X, XI e boa parte do XII, tendo que se estabelecer uma
cronologia pelo cruzamento com outras fontes ou com relatos cotidianos, como
quem está ocupando tal cargo naquele momento. E ainda, para as lacunas que
os materiais não conseguem preencher, é preciso da imaginação do
historiador, de sua criatividade, vendo através dos detalhes e da interrogação
dos documentos, aspectos da vida naquele tempo.

Outro ponto interessante é a necessidade de se debruçar por diversos


tipos de fonte, não só relacionados a história, mas usar do contato com outras
ciências, como a geografia e a antropologia. E, após essa análise, se inicia o
que é posto como o verdadeiro ofício do historiador: a síntese de todo esses
matérias, entendo que, é necessário não se deixar levar pelas facilidades de
recortar a fonte para fazê-la caber na sua pesquisa, mas ao mesmo tempo, que
o historiador precisará tomar uma posição em um momento de divergência de
informações, e que essa subjetividade é essencial na construção dessa
narrativa de interesse ao leitor, tentando chegar a uma “verdade” que será
subjetiva daquele pesquisador, sendo essa a questão essencial que os
positivas não conseguiam entender e tentavam apagar.

Por fim, o que se pode perceber, é a trajetória de pesquisa em medieval


de um historiador que conseguia mesclar fontes diversas, interroga-las, e
compreender a forma de se pensar das pessoas mais humildes daquele
período, através do estudo de suas mentalidades, diversificando influências,
dos Annales ao Marxismo, para entender na totalidade do espaço social
estudado. E essa é o principal procedimento deixado por Georges Duby:
entender a Idade Média pelos olhos de quem ali viveu, sem floreios ou
preconcepções.

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