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XXII SEMANA DE ENGENHARIA MECÂNICA

27 de Agosto a 01 de Setembro de 2001


unesp - Ilha Solteira

Análise de Falhas
Daniel Yvan Martin Delforge

Promoção
Grêmio Estudantil de Engenharia Mecânica
Departamento de Engenharia Mecânica
Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira
Curso de Análise de Falhas

ÍNDICE
1. CONSIDERAÇÕES GERAIS 1
2. INTRODUÇÃO 1
2.1. Tipos de fratura 4
2.2. Resistência coesiva teórica dos metais 6
2.3. Comportamento dúctil e frágil dos materiais 7
2.4. Afinal, em que se constitui uma Falha Mecânica? 8
3. A FADIGA DOS MATERIAIS METÁLICOS 13
3.1. Introdução 13
3.2. Ciclos de tensão 14
3.3. A Curva S-N 15
3.4. Natureza estatística da fadiga dos materiais metálicos 17
3.5. Fadiga de baixo ciclo 18
3.6. Características estruturais da fadiga 19
3.7. Efeitos da concentração de tensão, na fadiga 26
3.8. Efeito do tamanho do componente 27
3.9. Efeito de superfície na vida em fadiga 27
3.10. Fadiga por corrosão 31
4. ANÁLISE DE FALHAS EM COMPONENTES MECÂNICOS 33
5. RESISTÊNCIA DOS AÇOS AO DESGASTE 38
6. BIBLIOGRAFIA BÁSICA 42
7. BIOGRAFIA DO MINISTRANTE 42

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Curso de Análise de Falhas 1

1. CONSIDERAÇÕES GERAIS

A ocorrência de falhas mecânicas pode ser atribuída a:

a) Deficiências do projeto e fragilização dos materiais;


b) Processamento inadequado:
• impurezas no interior dos materiais;
• defeitos internos microestruturais e superficiais;
• tratamentos térmicos inadequados;
• outros.
c) Deterioração em serviço:
• erosão;
• corrosão;
• ataque químico;
• radiação;
• outros.
d) Operação incorreta dos equipamentos:
• sobrecarga estática e/ou dinâmica;
• manutenção inadequada;
• outros.

A análise das causas de falhas pode, em muitos casos, ser realizada através da
interpretação e caracterização da superfície danificada que em muitos casos é capaz de revelar a
história dos eventos que precederam a falha.
A importância da Análise de Falhas reside no fato de elementos de caracterização das
suas causas. Logo o seu objetivo é o de se conhecer as causas das falhas de certos materiais e
equipamentos, para a partir daí chegar-se à sua meta final que é, dentro do possível, prevenir
novas ocorrências.

2. INTRODUÇÃO

Uma maneira bem simples de se definir fratura é dizer que ela é a separação ou a
fragmentação de um corpo sólido em duas ou mais partes, sob a ação de uma tensão.
Genericamente, dizemos que o processo de fratura pode ocorrer em duas etapas:
a) O início de uma trinca;
b) A propagação desta trinca.
Além disto, uma fratura pode ser classificada em duas grandes categorias:
a) Fratura frágil;
b) Fratura dúctil.
A fratura dúctil é caracterizada pela ocorrência de uma apreciável deformação plástica
antes e durante a propagação da trinca. Além disso, dizemos que a propagação de uma trinca
dúctil se dá de forma estável. Neste caso a superfície de fratura apresenta normalmente uma
quantidade considerável de deformação. Já a fratura frágil dos metais é caracterizada pela rápida
propagação da trinca, ou seja, pela propagação instável da trinca, com nenhuma deformação
macroscópica e muito pouca micro-deformação. No caso de aços de baixa e média resistência
que geralmente apresentam boa ductilidade, a ocorrência de fratura frágil em baixas temperaturas
tende a aumentar, podendo levar a acidentes catastróficos e neste caso dizemos que houve a
fragilização do material.
Os problemas causados pela fragilização de componentes e estruturas metálicas

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remontam desde o final do século passado, em particular, com estruturas soldadas ocorreu uma
série de acidentes espetaculares dos quais pode-se citar os seguintes:
- Ponte do zoo de Berlim (Alemanha/1936);
- Ponte do canal Albert (Bélgica/1938);
- Ponte de “Ouest des Trois Riviéres”(Canadá/1951);
- Transatlântico “Titanic” (Mar do Norte/1906).
Com outras estruturas de aço soldadas tais como vasos de pressão gasodutos, navios e
aeronaves, também ocorreram fraturas, algumas das quais incríveis, devido à fragilização dos
materiais.
Para se ter uma noção da extensão do problema que a fragilização de estruturas metálicas
representa, pode-se citar que com o advento da II Grande Guerra, devido à necessidade de alta
produção, os americanos optaram pela fabricação de cascos de navios inteiramente soldados e
não rebitados como era feito normalmente àquela época. Dos 4.694 navios da série “Liberty”,
1.289 apresentaram falhas estruturais importantes e 233 belonaves apresentaram fraturas frágeis
graves e muitos partiram-se completamente. É interessante ressaltar que parte desses incidentes
ocorreu em dias de inverno rigoroso e com as embarcações paradas no porto ou seja, a
fragilização dessas estruturas não permitiu que elas se deformassem devido ao simples vai-e-vem
das águas do mar.
Estudos posteriores de amostras retiradas dessas estruturas mostraram que essas fraturas
frágeis dependem, entre outras, de quatro fatores fundamentais:
a) Temperatura;
b) Defeitos na estrutura interna dos materiais;
c) Concentrações de tensão em certas regiões da estrutura, provenientes de erros
no projeto de fabricação;
d) Taxas de deformação.
As figuras de 2.1 a 2.4, ilustram alguns casos de fraturas citados acima.

Figura 2.1 - Rompimento de um vaso de pressão de 920mm de diâmetro. Nota-se uma região de
concentração de tensão.

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Figura 2.2 - Ruptura completa de um navio da série “Liberty”.

Figura 2.3 - Rompimento de um reservatório de ar comprimido a 6 OC

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Figura 2.4 - Rompimento de um gasoduto a -16OC. Neste caso, a fratura estendeu-se por várias
dezenas de quilômetros.

2.1. Tipos de fratura

Os componentes metálicos que compõem máquinas e equipamentos podem apresentar


muitos tipos diferentes de fraturas. E isso irá depender essencialmente do tipo de material, do
estado de tensões e como foi visto anteriormente, da taxa de carregamento. A figura 2.5 exibe
esquematicamente alguns tipos de fratura. Nesse caso considerou-se um elemento submetido à
tração monotônica. Uma fratura frágil, fig.2.5(a), é caracterizada pela separação normal à tensão
de tração. Externamente não há evidências de deformação, entretanto análises da difração de
Raio X poderiam detectar uma camada fina de metal deformado, logo abaixo da superfície de
fratura. A fratura frágil tem sido observada em metais cúbicos de corpo centrado (ferro,
tungstênio) e hexagonal compacto (titânio, zinco magnésio) , mas não em metais cúbicos de faces
centradas (alumínio, cobre, níquel).
A fratura dúctil pode assumir várias formas. Monocristais HC podem deslizar em planos
basais sucessivos até que o cristal finalmente se separa por cisalhamento, fig.2.5(b). Materiais
policristalinos de metais muito dúcteis, como o ouro ou o chumbo, podem ter a sua seção
reduzida a um ponto, antes que se rompam, fig.2.5(c). Na fratura em tração de metais com
ductilidade moderada, a fratura pode assumir um formato denominado taça-cone, fig.2.5(d).
Uma fratura por cisalhamento ocorre como resultado de um deslizamento intenso de planos
preferenciais. Esse tipo de fratura é provocado por tensões cisalhantes. Já a fratura por clivagem
é controlada pela tensão de tração atuando perpendicularmente ao plano de clivagem. A
superfície de fratura causada por cisalhamento aparenta ser, quando observada com pequenos
aumentos, cinza e fibrosa, enquanto que a fratura por clivagem aparenta ser brilhante e granular,
devido à reflexão da luz nas superfícies lisas dos grãos rompidos por clivagem. As superfície de
fratura freqüentemente consistem numa mistura de fratura fibrosa e granular, e é comum nos
referirmos à percentagem de área superficial ocupada por cada uma dessas categorias. Com
base no exame metalográfico, a fratura em amostras policristalinas pode ser classificada como
transgranular (a trinca se propaga através dos grãos) ou intergranular (a trinca se propaga entre
os grãos). Conforme foi visto, a fratura dúctil é aquela que apresenta um considerável grau de
deformação. O limite entre a fratura dúctil e a fratura frágil, se quisermos estabelecer uma relação
entre o tipo de fratura e os materiais envolvidos, é arbitrário e depende da situação a ser
considerada. Por exemplo, o ferro fundido nodular é dúctil quando comparado com o ferro fundido
comum, mas será considerado frágil se comparado com o aço doce.

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Figura 2.5 - Tipos de fraturas observados em metais sujeitos a tensão uniaxial. (a) Fratura frágil
em monocristal e policristal. (b) Fratura cisalhante em monocristais dúcteis. (c) Fratura
completamente dúctil em policristais. (d) Fratura dúctil do tipo taça-cone em policristais.

A figura 2.6, exibe uma fractografia na qual podemos observar os cristais que caracterizam
a estrutura policristalina de um aço inox do tipo ABNT 304.

Figura 2.6 - Alguns cristais, também denominados grãos, de um aço inox ABNT 304. Observam-
se com facilidade a presença de algumas trincas intergranulares microscópicas.

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2.2 Resistência coesiva teórica dos metais

Sabe-se que os metais são de grande valor tecnológico devido às suas resistências
elevadas combinada com um certo grau de elasticidade e de plasticidade, conforme o caso. Em
termos básicos, a resistência é devida às forças de coesão entre os átomos. Em geral, forças
coesivas elevadas são relacionadas com elevadas constantes elásticas, elevados pontos de fusão
e coeficientes de expansão térmica pequenos.
Para certos tipos de aço de alta resistência, o limite teórico de resistência encontra-se
próximos de 1,8x103 kgf/mm2. No entanto, ensaios realizados nesses materiais mostraram que
esse valor caía na faixa de 210kgf/mm2, o que não deixa de ser um valor excepcional. Isso
mostra que materiais típicos de engenharia têm limites de resistência de 10 a 1.000 vezes
menores do que os valores teóricos. Os únicos materiais que se aproximam do valor teórico de
resistência, são pequeníssimos whiskers metálicos livres de defeitos ou falhas em sua estrutura
interna e fibras de sílica de diâmetros muito pequenos. Isso nos leva a concluir que trincas ou
falhas, não importando o seu tamanho, são responsáveis pelo fato da resistência à fratura nos
materiais de engenharia ser mais baixa do que a resistência teórica.
Do exposto, parece ser razoável considerar que falhas, trinca, porosidades e micro-
porosidades, inclusões metálicas ou não metálicas, conforme o material e as condições de
carregamento, podem representar concentradores de tensão que levariam os materiais ao
colapso, mesmo quando utilizados em condições previstas nos projetos. A figura 2.7, ilustra uma
inclusão de óxido de ferro no interior de uma massa metálica de aço com baixo teor de carbono e
alto teor de oxigênio. O efeito de um concentrador de tensão se apresenta muito mais
pronunciado em materiais frágeis do que em materiais de comportamento dúctil. Num material
dúctil ocorre deformação plástica quando o limite de escoamento é excedido. Um aumento
posterior na carga acarreta um aumento local em deformação na região criticamente tensionada,
com pequeno incremento na tensão aplicada. Devido ao encruamento a tensão cresce em regiões
adjacentes ao concentrador de tensão, até que, se o material for suficientemente dúctil, a
distribuição de tensão se torna essencialmente uniforme. Assim, um material dúctil carregado
estaticamente não desenvolverá totalmente o concentrador de tensão. Entretanto, em um material
frágil, devido à sua limitação de se deformar plasticamente, nunca ocorrerá a redistribuição de
tensão, resultando assim maior perigo de ocorrência de dano irreversível.
Embora concentradores de tensão geralmente não levam perigo aos materiais de
comportamento dúctil submetido a carregamento estático, efeitos apreciáveis de concentração de
tensão ocorrerão neste mesmo material se solicitado em condições de fadiga ou de tensões
alternadas.
Assim, considerando-se o projeto e a fabricação sob controle, estruturas e componentes
confeccionados com materiais de comportamento dúctil, dificilmente causam acidentes de
grandes proporções e isto é devido principalmente ao fato de que a propagação de uma trinca
dúctil cessa tão logo o carregamento seja anulado, ou seja, a propagação de uma trinca dúctil se
dá de forma estável ao passo que em um material de comportamento frágil, a propagação de uma
trinca frágil se dá de forma instável ou seja, mesmo que a estrutura seja descarregada no início
de sua propagação, ela não se detém. Para se ter uma idéia, a velocidade de propagação de uma
trinca frágil no aço, gira em torno de 2.000km/h. Isto significa que mesmo que se consiga
perceber o início da propagação de uma trinca frágil, o colapso da estrutura é praticamente
inevitável.

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Figura 2.7 - Inclusão de um óxido de ferro na superfície de fratura de aço com baixo teor de
carbono. Observa-se que esta partícula deformou plasticamente o metal de base que a envolvia,
provavelmente devido a uma micro-movimentação relativa entre as superfícies fraturadas.

2.3. Comportamento dúctil e frágil dos materiais

Neste ponto do nosso curso, torna-se importante reforçar alguns conceitos a respeito de
fragilidade e ductilidade dos materiais metálicos.
Foi visto que os materiais submetidos a uma carga podem ser classificados quanto ao seu
comportamento mecânico em dúcteis ou frágeis, dependendo da sua capacidade ou habilidade de
suportar e absorver ou não deformações plásticas. Neste sentido, dizemos que materiais de
comportamento dúctil conseguem absorver energia e se deformar plasticamente ao passo que
materiais frágeis já não possuem esta propriedade ou seja, ao invés de se deformarem eles se
rompem.
A ductilidade e a fragilidade dos materiais, pode também ser expressa em termos de
tenacidade. A tenacidade dos materiais é definida como sendo a quantidade de energia que um
determinado material submetido a um certo carregamento consegue absorver sem se romper. Ou,
consegue absorver até a sua ruptura. Visto isto, um material muito dúctil, em temperaturas
ambientes e em condições de carregamento quase-estático, terá uma elevada tenacidade ao
passo que um material frágil terá uma baixa tenacidade embora possa ter resistência mecânica
elevada. Este conceito aplica-se muito bem em materiais de utilização convencional pois existem
materiais especiais de ultra-alta resistência e que de certa forma não seguem totalmente o que foi
dito.
A figura 2.8(a) ilustra uma curva tensão-deformação de um material dúctil e a figura 2.8(b)
exibe uma curva tensão-deformação típica, de um material frágil.

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Figura 2.8 - (a) curva tensão-deformação típica de um material dúctil. Observa-se uma
deformação (ε) considerável quando comparada com a deformação do gráfico tensão-deformação
(b) de um material frágil como por exemplo o ferro fundido branco. Ainda no caso da figura(b), um
material completamente frágil, romperia um pouco antes do limite elástico(E).

Em se tratando de componentes mecânicos e estruturas de modo geral, uma ductilidade


adequada é um fator de grande importância pois quando solicitado, o material consegue
redistribuir tensões localizadas. Se as tensões localizadas em entalhes ou em outros
concentradores de tensão acidentais não precisam ser considerados, os projetos são idealizados
com base em tensões médias desde que o carregamento seja estático. Entretando, nos materiais
frágeis, essas tensões localizadas continuam a aumentar pois não existe um escoamento
localizado, até que se desenvolvam trincas em um ou mais pontos de concentração de tensão,
que se propagam rapidamente por toda a seção. Em um material frágil, mesmo não havendo
concentradores de tensão, ainda assim, uma trinca irá se propagar inesperadamente e esse fato é
facilmente comprovado no ensaio de tração onde verifica-se que o limite de escoamento e o limite
de resistência à tração são praticamente idênticos.
Torna-se muito importante ressaltar que a fragilidade não é uma propriedade absoluta de
um metal. O tungstênio à temperatura ambiente é muito duro e frágil, porém em altas
temperaturas, se comporta de maneira dúctil. Um certo metal pode comportar-se de modo frágil
em tração e assumir um comportamento dúctil se solicitado de modo hidrostático. Além disso, a
maioria dos aços de baixo e médio carbono, em temperaturas ambientes possuem
comportamento dúctil e em baixas temperaturas (abaixo de -5OC), comportam-se, em sua maioria,
de modo frágil ou misto. Existem ainda os elementos que são fragilizantes tais como o hidrogênio
e as elevadas taxas de carregamento que transformam materiais normalmente dúcteis em
materiais frágeis.

2.4. Afinal, em que se constitui uma falha mecânica?

Um componente estrutural ou um elemento de uma máquina, pode ter o seu desempenho


comprometido de três maneiras:

1) Deformação elástica excessiva;


2) escoamento ou deformação plástica excessiva;
3) fratura.
Para se poder proceder a uma boa análise de falhas, além de ser necessário ter uma boa
dose de sensibilidade e senso de observação, é importante ter-se conhecimento dos tipos mais
comuns de falhas possíveis de ocorrer, porque é sempre preciso relacionar as condições de
trabalho, as dimensões e outros fatores com alguns parâmetros de significância para o material,
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que possam limitar o desempenho esperado. A cada tipo de falha associam-se parâmetros
específicos de expressiva importância.
Em geral, dois tipos de deformação elástica excessiva podem ocorrer:

1) Deflexão exagerada sob condições de equilíbrio estável, como no caso de uma


viga sendo gradualmente carregada;
2) Deflexão ou flambagem repentinas, sob condições de equilíbrio estável.
A deformação elástica excessiva de uma peça em um equipamento pode significar uma
falha como se esta peça fosse completamente fraturada. Como exemplo, pode-se citar o rápido
desgaste de mancais causado por eixos muito flexíveis ou a interferência ou mesmo dano
causado às peças pela excessiva deflexão de partes acopladas em contato entre si. O tipo de
falha que ocorre como uma flambagem repentina pode se manifestar em uma coluna delgada
quando o carregamento axial excede a carga crítica de Euler ou quando a pressão externa
atuando em uma cápsula de paredes finas ultrapassa um certo valor crítico. As falhas devido à
deformação elástica excessiva são controladas não pela resistência do material, mas pelo seu
módulo de elasticidade. Geralmente, pouco controle metalúrgico pode ser exercido sobre esse
parâmetro. A maneira mais efetiva de se aumentar a rigidez de um componente é variando as
dimensões da sua seção reta. O escoamento ou deformação plástica de um metal ocorre quando
seu limite elástico é ultrapassado, causando uma mudança de forma permanente podendo
provocar conseqüências danosas irreversíveis. O escoamento de um metal dúctil sob condições
de carregamento estático à temperatura ambiente raramente provoca fraturas, porque à medida
que o metal se deforma ele encrua aumentando assim a sua resistência mecânica; até um certo
valor em que a área da seção reta começa a diminuir elevando as tensões envolvidas, podendo
assim causar a falha estrutural do material. Neste caso, geralmente são tomadas medidas
corretivas antes que ocorram danos irreversíveis. A figura 2.9 exibe a fratura completamente frágil
de uma conexão em aço inox, submetida a um meio rico em hidrogênio.

Figura 2.9 - Conexão em aço inoxidável ABNT 431 submetida a um ambiente rico em hidrogênio.
Neste caso houve fratura frágil por fragilização pelo hidrogênio.

A figura 2.10 mostra dois parafusos fraturados. O parafuso (a) rompeu-se de modo
totalmente frágil e o parafuso (b) rompeu-se de maneira bastante dúctil, tendo sofrido uma
deformação de longo alcance, até ocorrer a fratura. Os dois parafusos foram fabricados em aço
ABNT 1045. A diferença entre eles reside no fato de que o primeiro foi temperado em água e
revenido por uma hora a 200OC, tendo alcançado a dureza próxima de 57 RC portanto, com
elevada dureza e como conseqüência, baixa ductilidade. O segundo foi temperado em óleo e

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revenido por quatro horas à mesma temperatura, alcançando a dureza de 25 RC e portanto uma
menor dureza, o que certamente conferiu ao material maior ductilidade.

Figura 2.10- O parafuso (a) rompeu-se sem deformação aparente o que caracteriza uma fratura
frágil. O parafuso (b) rompeu-se com grande deformação aparente o que caracteriza uma fratura
dúctil de longo alcance, o que pode ser evidenciado na ampliação à direita.

Os metais falham por fratura de três maneiras diferentes:


1) Fratura frágil repentina;
2) Fadiga ou fratura progressiva;
3) Fratura retardada.
Foi visto que metais frágeis sob carregamento estático podem romper-se sem grandes
evidências externas de escoamento. Uma fratura frágil repentina pode também ocorrer em metais
dúcteis sob certas condições específicas. O aço ao carbono estrutural pode ser citado como
sendo um exemplo mais comum de um material que apresenta uma transição de comportamento
dúctil-frágil.
A mudança do comportamento característico de fratura dúctil para o de fratura frágil é
favorecida pelo decréscimo da temperatura, aumentada taxa de carregamento e pela presença de
um estado complexo de tensão provocado por um entalhe. A figura 2.11 exibe um diagrama que
relaciona energia de impacto com variação de temperatura. No caso, trata-se do ensaio de
impacto Charpy, através do qual é possível verificar a transição de comportamento dúctil-frágil
dos aço de baixa, média e elevada resistência.
Todos os materiais utilizados em engenharia apresentam uma certa variabilidade nas
propriedades mecânicas que podem ser influenciadas pelos diversos tipos de tratamentos
térmicos ou processos de fabricação. Além disso, em geral existem incertezas quanto à
magnitude das cargas aplicadas e necessitam-se usualmente de certas aproximações para o
cálculo das tensões em todos os componentes, exceto os mais simples. Deve-se levar em conta o
surgimento de cargas acidentais de elevada magnitude, o que nem sempre é possível de ser feito,
por razões de projeto, econômicas ou de limitações de fabricação. No entanto, sob condições
normais, a prevenção de falhas mecânicas é feita adotando-se uma margem de segurança ou
seja: é necessário que as tensões permitidas sejam menores do que aquelas que levarão à
falhas. Denomina-se tensão de trabalho (σ w), o valor da tensão para um determinado material
utilizado sob certas condições consideradas de segurança. Para carregamento estático, a tensão
de trabalho de um metal dúctil é em geral baseada no limite de escoamento, σ o , e para materiais
frágeis na resistência máxima à tração σ u. Os valores de trabalho são estabelecidos em normas;
no Brasil, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT.

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Figura 2.11- Dados obtidos do ensaio de impacto Charpy, para aços com baixa, média e elevada
resistência. Verifica-se que aços de alta resistência possuem baixa tenacidade e que os aços de
média e baixa resistência possuem a transição dúctil-frágil bem definida.

A tensão de trabalho pode ser considerada como sendo a razão entre a tensão de
escoamento ou o limite de resistência à tração, conforme o caso, e um número denominado fator
de segurança.

σ w = σ o/no ou σ w = σ u/nu

onde:
σ w = tensão de trabalho [kgf/mm2];
σ o = limite de escoamento [kgf/mm2];
σ u = limite de resistência à tração [kgf/mm2];
no = fator de segurança baseado na tensão de escoamento;
nu = fator de segurança baseado no limite de resistência à tração.

O valor conferido ao coeficiente de segurança depende de uma estimativa de todos os


fatores que já foram discutidos. Uma consideração especial deve ser dada às conseqüências de
uma falha mecânica. Para falhas que podem originar perigo de vida, utilizam-se fatores de
segurança maiores. O tipo de equipamento e os tipos de solicitações também influenciam na
determinação do fator de segurança.
Além do que foi visto, temos também o caso em que os metais não mais apresentam
encruamento a temperaturas significantemente maiores que a temperatura ambiente. Em lugar
disto, podem se deformar continuamente à tensão constante, apresentando escoamento
dependente do tempo conhecido como Fluência. Sob condições de fluência, o critério do início do
escoamento torna-se razoavelmente complicado pelo fato da tensão não ser proporcional à
deformação e também porque as propriedades mecânicas do material podem variar
apreciavelmente quando em serviço e em elevadas temperaturas.
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A figura 2.12 exibe uma superfície rompida por fluência. A observação da figura 2.12(a)
revela que houve uma profunda modificação na morfologia granular da superfície fraturada. Na
figura 2.12(b) pode-se verificar a presença de uma inclusão e de uma região oxidada.

Figura 2.12 - Fractografia da superfície de uma peça fraturada por fluência. Nota-se uma grande
modificação ao na morfologia da superfície granulométrica. Verifica-se com facilidade o
aparecimento de uma inclusão e as facetas deixadas pela ruptura da mesma.

A maioria das fraturas em componentes de máquinas ocorrem por fadiga. A fratura por
fadiga ocorre em partes submetidas a tensões cíclicas ou tensões alternadas ou ainda, flutuantes.
O componente é levado à fratura quando uma trinca diminuta pontualmente localizada,
geralmente em um entalhe ou concentrador de tensões, gradualmente se propaga pela seção reta
do material. A falha por fadiga ocorre sem nenhum sinal visível de escoamento, em tensões
médias ou nominais bem abaixo da resistência à tração do metal. Esta falha é causada por uma
tensão crítica localizada de muito difícil avaliação. Desta forma, os projetos que levam em conta a
falha por fadiga baseiam-se principalmente em relações empíricas que utilizam tensões nominais.
A fadiga dos metais será discutida detalhadamente no próximo ítem.
A figura 2.13 apresenta uma fratura típica por fadiga. Nesta representação, local do início
da fratura, marcas de praia, sentido de propagação da trinca e fratura final, podem ser facilmente
visualizados.

Figura 2.13 - Fratura de um eixo por fadiga. Notam-se local de início da propagação da trinca,
sentido dessa propagação, marcas de praia e fratura final.
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Curso de Análise de Falhas 13
3. A FADIGA DOS MATERIAIS METÁLICOS

3.1. Introdução

Em meados do século IX o homem tomou conhecimento de que um metal submetido a


uma tensão repetida ou flutuante romperá a uma tensão muito inferior àquela necessária para
ocasionar fratura devido à aplicação de uma carga estática. Naquela época os engenheiros
ferroviários projetavam eixos de locomotivas e estes se rompiam após um determinado tempo de
uso. Acreditava-se que aumentando o diâmetro desses eixos, o problema seria resolvido.
Todavia, tal não acontecia. Os eixos continuavam a se romper a tensões abaixo dos limites de
resistência foi quando esses engenheiros começaram a desconfiar que algum mecanismo de
fratura até então desconhecido, estava em jogo. Descobriram, então, a fadiga dos materiais
metálicos. A fadiga tornou-se progressivamente importante à medida que a tecnologia
desenvolveu um número maior de equipamentos, tais como automóveis, aviões, compressores,
bombas, turbinas e muitos outros conjuntos mecânicos sujeitos a carregamento repetitivo e a
vibrações, em condições cada vez mais severas. Nos dias atuais, pode-se dizer que a fadiga é
responsável por pelo menos 90 por cento das falhas em serviço, relativas a causas puramente
mecânicas.
Uma fratura por fadiga é particularmente insidiosa porque acontece sem que haja qualquer
aviso. A fadiga dá origem a uma fratura de aparência frágil, sem existência de deformação
macroscópica em parte da sua superfície. A superfície de fadiga, em escala macroscópica, é
quase sempre normal à direção principal de tração. Uma falha por fadiga pode ser reconhecida,
geralmente, a partir do aspecto da superfície de fratura, a qual apresenta uma região lisa
decorrente da fricção que se verifica entre as superfície durante a propagação da trinca através
da seção transversal do material. A figura 3.1 ilustra muito bem a zona onde a trinca progrediu
lentamente que é justamente a região lisa e uma zona fibrosa onde ocorreu a fratura brusca.

Figura 3.1 - Superfície de fratura por fadiga de um tender de locomotiva. Pode-se notar uma
região fortemente deformada que corresponde à zona de fratura brusca e uma região lisa, por
onde a trinca iniciou-se e progrediu lentamente.

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Curso de Análise de Falhas 14
São três os fatores básicos necessários para causar a falha por fadiga:
1) Uma tensão de tração suficientemente elevada;
2) Uma flutuação ou uma variação na tensão aplicada suficientemente elevada;
3) Um número de ciclos de aplicação da tensão suficientemente grande.
Além destas, existem outras diversas variáveis que tendem a alterar as condições de
ocorrência da fadiga dos materiais metálicos, tais como:
1) Concentração de tensão;
2) Corrosão;
3) Temperatura;
4) Sobrecarga;
5) Estrutura metalúrgica;
6) Tensões residuais;
7) Tensões combinadas.
Uma vez que ainda não possuímos um entendimento básico do que leva um metal a se
romper por fadiga, será necessário que discutamos cada um destes fatores a partir de um ponto
de vista essencialmente empírico. Devido ao grande números de dados experimentais existentes,
será possível apenas descrever os pontos fundamentais da relação entre estes fatores e a fadiga
em si.

3.2. Ciclos de tensão

Iremos agora definir brevemente os tipos gerais de tensões flutuantes que podem gerar
fadiga. A figura 3.2 ilustra ciclos de tensões típicos em fadiga. A figura 3.2(a) ilustra um ciclo de
tensões alternadas de forma senoidal. Esta é uma situação idealizada a qual é produzida por uma
máquina de ensaios à fadiga, do tipo flexão rotativa. Para esse tipo de ciclo de tensões, as
tensões máximas e mínimas são iguais. A figura 3.2(b) exibe um ciclo de tensão flutuante no qual
a tensão máxima e a tensão mínima são diferentes. Neste caso, ambas as tensões são de tração,
embora um ciclo de tensão flutuante possa perfeitamente apresentar tensões máxima e mínimas
de sinais opostos ou ambas em compressão. A figura 3.2(c) mostra um ciclo de tensões
complicado que pode por exemplo ser encontrado numa asa de aeronave, que é sujeita a
sobrecargas repentinas devido ao vento e à sua própria sustentação.
Um ciclo de tensão flutuante pode ser dividido em duas componentes, uma tensão média
ou estática σ m e uma componente de tensão alternada ou variável σ a. Devemos considerar
também o intervalo de tensões σ r . Como pode ser visto na figura 3.2(b), o intervalo de tensões é a
diferença algébrica entre as tensões máximas e as tensões mínimas em um ciclo.

σ r = σ máx. - σ min. (3.1)

A tensão alternada é, então, a metade do intervalo de tensões.

σ a = σ r /2 (3.2)

A tensão média, é a média das tensões máxima e mínima no ciclo.

σ m = (σ máx. + σ min )/2 (3.3)

São utilizadas duas quantidades para apresentação dos dados de fadiga em termos da
relação de tensões:

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R = σ máx./σ min. (3.4)

A = σ a/σ m (3.5)

Figura 3.2 - Ciclos de tensão típicos em fadiga. (a) Tensão alternada; (b) tensão flutuante; (c) ciclo
de tensão irregular ou aleatório.

3.3. A Curva S-N

O método básico de apresentação de dados experimentais de fadiga dos materiais


metálicos é através da curva S-N, onde é lançada em gráfico a tensão S contra o número N de
ciclos necessários para a fratura. Normalmente emprega-se uma escala logarítmica para N. O
valor da tensão lançada no gráfico pode ser σ a , σ máx. ou σ min e são geralmente tensões
nominais, isto é, não há ajuste para concentração de tensões. A relação S-N é determinada para
um valor específico de σ m , R ou A. A maioria das determinações de propriedades da fadiga dos
materiais metálicos são realizadas em flexão rotativa, onde a tensão média é zero. A figura 3.3
exibe curvas S-N típicas do ensaio de bareta rotativa.
Podemos notar que estas curvas estão relacionadas principalmente com falhas de fadiga
para números grandes de ciclos ( N>105 ciclos ) Nestas condições, a tensão, grosso modo, é
elástica, mas, como será visto adiante, o metal se deforma plasticamente de forma altamente
localizada. Para tensões maiores, a vida em fadiga decresce progressivamente, mas a
deformação generalizada torna difícil a interpretação em termos de tensão. Para a região de
fadiga em baixo ciclo ( N<104 ) ciclos, os ensaios são conduzidos com ciclos controlados de
deformação elástica mais plástica, em vez de ciclos de tensão ou cargas controlados. Na seção
3.5, será discutida a fadiga de baixo ciclo.

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Curso de Análise de Falhas 16

Figura 3.3 - Curvas de fadiga típicas para metais ferrosos e não ferrosos. Como pode ser visto, o
número de ciclos de tensão que um metal pode suportar antes de se romper com o decréscimo da
tensão é em alguns casos da ordem de 107 ou 108 ciclos e às vezes até mais

A não ser que haja indicação em contrário, N é tomado como sendo o número de ciclos de
tensão necessários para causar a fratura completa do corpo de prova. Os ensaios de fadiga a
baixas tensões são geralmente levados até 107 ciclos e, algumas vezes, no caso de não ferrosos,
por exemplo os alumínios de alta resistência, até 5x108 ciclos. Para alguns materiais, muito
importantes na engenharia, como certos tipos de aços e o titânio , a curva S-N se torna horizontal
em uma determinada tensão limite. Abaixo desta tensão limite de resistência à fadiga, o material
pode presumivelmente suportar um número infinito de ciclos sem se romper. A maioria dos metais
não ferrosos como por exemplo o alumínio, magnésio e ligas de cobre, apresentam uma curva S-
N que decresce continuamente com o aumento do números de ciclos. Estes materiais não
apresentam um limite de resistência à fadiga, uma vez que a curva S-N nunca se torna horizontal.
Neste caso costumam-se caracterizar as propriedades de fadiga do material fornecendo-se a
resistência à fadiga para um número arbitrário de ciclos como por exemplo 108 ciclos.
Procedimento usual para determinação de uma curva S-N consiste em se testar o primeiro
corpo de prova a uma tensão na qual se espera que ocorra fratura num número de ciclos bastante
pequeno, por exemplo, cerca de dois terço do limite de resistência estático do material. A tensão
do ensaio é diminuída gradativamente para cada corpo de prova que se sucede, até que uma ou
duas amostras não se rompam no número de ciclos especificado, geralmente 107 ciclos. A maior
tensão para a qual não se verifica fratura é considerada o limite de fadiga do material. Para os
materiais que não apresentam limite de resistência à fadiga o ensaio é interrompido,
normalmente, para considerações práticas, em uma tensão baixa onde a vida em fadiga seja
cerca de 108 ou 5x108 ciclos. A curva S-N é determinada com geralmente 10 ou 12 corpos de
prova. Normalmente observa-se uma dispersão razoável nos resultados experimentais, embora
seja possível, sem muita dificuldade, o traçado de uma curva suave abrangendo os pontos
obtidos. No entanto, se vários corpos de prova forem ensaiados à mesma tensão, ocorrerá uma
grande dispersão nos valores observados de um número de ciclos para a fratura, dispersão esta
que chega a atingir uma ordem de grandeza na escala logarítmica entre os valores máximos e
mínimos.

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Curso de Análise de Falhas 17
3.4. Natureza estatística da fadiga dos materiais metálicos

A análise estatística dos dados experimentais de fadiga e as razões da variação dos


resultados dos ensaios de fadiga têm sido objeto de muitos estudos. Uma vez que a vida em
fadiga e o limite de fadiga são quantidades estatísticas, deve ser esperado que ocorra um desvio
considerável de uma curva média levantada com apenas alguns poucos corpos de prova. É
necessário que se raciocine em termos da probabilidade de um corpo de prova atingir uma certa
vida a uma dada tensão, ou da probabilidade de ocorrer fratura a uma dada tensão nas
vizinhanças do limite de fadiga. Para fazer isto, é necessário o ensaio de um número muito maior
de corpos de prova do que anteriormente, pois dessa forma torna-se possível a determinação dos
parâmetros estatísticos necessários para a estimativa destas probabilidades. O método básico
para apresentação dos dados experimentais de fadiga deverá ser, então, uma superfície
tridimensional representando a relação entre tensão, número de ciclos para fratura e
probabilidade da fratura. A figura 3.4 mostra como isto pode ser representado num gráfico
bidimensional.
Nesta figura está ilustrada de forma esquemática uma distribuição da vida em fadiga a
tensão constante, e, tomando-se como base, foram representadas curvas de probabilidade de
ruptura constante.

Figura 3.4 - Representação estatística dos dados de fadiga.

Ainda com relação à figura 3.4, para σ1, seria de se esperar que 1 por cento dos corpos de
prova se rompesse com N1 ciclos. 50 por cento com N2 ciclos e assim por diante. A figura indica
um decréscimo de dispersão para a vida em fadiga com o aumento da tensão, o que geralmente
se verifica na prática. A função de distribuição estatística que descreve a distribuição da vida em
fadiga, a tensão constante, não é conhecida com precisão e, para tal, seria preciso que se
ensaiassem mais de 1.000 amostras idênticas sob condições idênticas para uma tensão
constante. Ensaios com 200 corpos de prova de aço para uma única tensão mostraram que a
frequência de distribuição de N seguia a distribuição de Gauss, ou a normal, se a vida em fadiga
for expressa como Log N. Para fins de engenharia, é suficientemente preciso assumir uma
distribuição normal logarítmica da vida em fadiga a tensão constante, no intervalo de
probabilidade de ruptura de P=0,10 a P=0,90. Todavia, frequentemente, é importante que
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Curso de Análise de Falhas 18
sejamos capazes de prever a vida em fadiga correspondente a uma probabilidade de ruptura
menor ou igual a 1 %. A suposição de uma distribuição normal logarítmica neste limite externo da
curva de distribuição não mais se justifica, embora seja comumente empregada. Para este caso, a
distribuição do valor-extremo ou a distribuição de Weibull têm sido as alternativas utilizadas.
Quando se determina o limite de resistência à fadiga de um material, deve-se ter em
mente que cada amostra possui seu próprio limite de fadiga e que para tensões acima ela se
romperá e para tensões abaixo permanecerá em serviço. No entanto, esta tensão critica varia de
amostra para amostra por razões ainda muita pouco compreendidas. É sabido que as inclusões
no aço exercem um efeito muito importante sobre o limite à fadiga e sua variação, mas mesmo os
aço fundidos a vácuo apresentam dispersão no limite à fadiga. O problema da determinação
precisa do limite à fadiga torna-se complexo devido ao fato de não podermos medir seu valor
individual para um dado corpo de prova, pois podemos apenas ensaiá-lo para a uma tensão
particular e, caso ocorra fratura, deduzimos que esta tensão é superior ao limite à fadiga. Uma
vez que o copo de prova não pode ser reensaiado , mesmo que não se rompa para a tensão de
ensaio, devemos estimar a estatística do limite à fadiga testando grupos de amostras a várias
tensões para vermos quantas se rompem a cada tensão. Assim, próximo ao limite à fadiga,
dependendo da amostra ela poderá romper-se ou não, e tudo que podemos fazer é estimar o
comportamento de um universo de copos de prova através de uma amostragem cuidadosa. Os
dois métodos estatísticos para a estimativa do limite à fadiga são chamados Probit analysis e
Método da escada e, evidentemente, fogem ao escopo deste curso.

3.5. Fadiga de baixo-ciclo

Embora os estudos de fadiga estejam relacionados com condições de serviço nas quais a
falha ocorria para ciclos de tensão superiores a 104, existe um crescente interesse quanto a falhas
por fadiga que ocorrem para tensões relativamente altas e baixo número de ciclos. Este tipo de
problema deve ser considerado nos projetos de vaso de pressão para a indústria nuclear, turbinas
a vapor e na maioria dos outros equipamentos da maquinaria mecânica. As condições para
ocorrer fadiga de baixo-ciclo são freqüentemente criadas quando as tensões repetidas são de
origem térmicas. Uma vez que as tensões térmicas devem-se à expansão e à contração térmicas
do material, podemos verificar facilmente que neste caso a fadiga resulta de deformação cíclica
em vez de tensão cíclica.
A figura 3.5 apresenta um ciclo de tensão-deformação resultante de um ensaio de fadiga
de baixo ciclo onde a deformação cíclica era mantida constante. A curva tensão-deformação
durante o carregamento inicial é O-A-B. Durante o descarregamento o escoamento se inicia em
compressão a uma tensão menor C, devido ao efeito Bauschinger.
Quando se recarrega em tração , desenvolve-se um ciclo de histerese que tem suas
dimensões descritas pela sua largura (∆ ε),o intervalo total de deformação e por sua altura (∆ σ),
que é o intervalo de tensões. O intervalo de deformação ∆ ε consiste em uma componente de
deformação elástica ∆ εe = ∆ σ/E mais uma componente de deformação plástica ∆ εp. A largura do
ciclo de histerese dependerá do nível de deformação cíclica: com este nível pequeno, o ciclo de
histerese torna-se muito estreito. Para os ensaios realizados sob ∆ ε constante, o intervalo de
tensão ∆ σ normalmente varia com o aumento do número de ciclos. Os materiais recozidos
experimentam endurecimento cíclico, o que significa que ∆ σ aumenta com o número de ciclos até
atingir a saturação após cerca de 100 ciclos de deformação.

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Figura 3.5 - Ciclo de tensão-deformação para ensaio cíclico a deformação constante.

O aumento no intervalo de tensões será maior quanto maior for o valor de ∆ ε. Os materiais
que previamente sofreram trabalho a frio experimentam amolecimento cíclico, isto é, ∆ σ decresce
com o aumento do número de ciclos de deformação.

3.6. Características estruturais da fadiga

Os estudos relacionados com as variações estruturais básicas experimentadas por um


metal sujeito a tensões cíclicas levaram à divisão do processo de fadiga nos seguintes estágios:

1) Iniciação da trinca: inclui o desenvolvimento inicial dos danos causados por


fadiga, os quais podem ser removidos através de tratamento térmico ou
termomecânico adequados;
2) Crescimento da trinca em bandas de deslizamento: relativo ao aprofundamento
da trinca inicial nos planos de alta tensão cisalhante. Este estágio é
freqüentemente denominado estágio I de crescimento da trinca;
3) Crescimento da trinca nos planos de alta tensão de tração: envolve o crescimento
de uma trinca bem definida em direção normal à tensão de tração máxima. Este
estágio é geralmente denominado estágio II de crescimento da trinca;
4) Ruptura final estática: ocorre quando a trinca atinge um tamanho tal que a seção
transversal resistente não pode mais suportar a carga, devido ao demasiado
aumento das tensões envolvidas. Este estágio é denominado estágio III
A fração relativa do número total de ciclos para a ruptura, que está associada a cada
estágio, depende das condições de solicitação cíclica e do material. Todavia, já se encontra muito
bem firmado o fato de que uma trinca de fadiga pode ser formada antes que o componente tenha
cumprido 10 por cento da sua vida útil total. Evidentemente, a decisão de quando uma banda de
deslizamento aprofundada deva ser considerada uma trinca pode ser bastante ambígua. De uma
maneira geral, a propagação de trincas no estágio II consome uma fração relativa do número de
ciclos total, que é maior no caso da fadiga de baixo-ciclo do que na fadiga de longa vida,
enquanto que o estágio I de crescimento da trinca consome a maior parte da fadiga de alto-ciclo

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Curso de Análise de Falhas 20
ou de baixa-tensão. Caso o esforço de tração seja grande, como ocorre na fadiga de peças com
entalhes agudos, o estágio I pode não ser observado.
Uma consideração estrutural marcante na fadiga é o fato das trincas de fadiga geralmente
terem início numa superfície livre. Nas raras oportunidades em que uma trinca de fadiga inicia-se
no interior do material, sempre existe uma interface envolvida, como por exemplo, a interface
entre uma camada cementada e o metal de base ou a interface entre impurezas e vazios e o
metal. As figura 3.6 e 3.7 exibem inclusões a partir das quais desenvolveram-se trincas de fadiga.
Já a figura 3.8 mostra uma segregação e a interface da camada cementada e o metal de base, a
partir das quais desenvolveu-se uma falha por fadiga.

Figura 3.6 - Inclusão não metálica a partir da qual desenvolveu-se uma ruptura por fadiga.

Figura 3.7 - Inclusões não metálicas e segregações a partir das quais desenvolveu-se uma falha
por fadiga.

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Curso de Análise de Falhas 21

Figura 3.8 - Interface entre camada cementada e metal de base e uma segregação (s).
Provavelmente a ruptura por fadiga iniciou-se num destes dois pontos.

A fadiga apresenta determinados aspectos em comum com o escoamento plástico e a


fratura sob deformação estática ou unidirecional. Vários trabalhos mostram que um metal sob
carregamento cíclico se deforma por deslizamento nos mesmos planos atômicos e nas mesmas
direções cristalográficas que em deformação unidirecional. Enquanto nesta última o deslizamento
ocorre geralmente espalhado em todos os grãos, na fadiga alguns grãos apresentam linha de
deslizamento ao passo que outros não mostram evidências de deslizamento. As linhas de
deslizamento geralmente são formadas durante os primeiros poucos mil ciclos de tensão: os
ciclos que se sucedem produzem bandas de deslizamento adicionais, mas o número de bandas
de deslizamento não é diretamente proporcional ao número de ciclos de tensão. Em muitos
metais o aumento do deslizamento visível atinge rapidamente um valor de saturação, o qual é
observado como regiões de deslizamento intenso. As trincas ocorrem em regiões de deformação
intensa, paralelas ao que originalmente foi uma banda de deslizamento. As bandas de
deslizamento têm sido observadas para tensões inferiores ao limite de fadiga dos metais ferrosos.
Desta forma, a ocorrência de deslizamento durante a fadiga não significa por si que irá se formar
uma trinca.
Uma característica estrutural importante que parece ser única para a deformação em fadiga
é a formação de ressaltos e reentrâncias na superfície, denominadas intrusões e extrusões.
Análises metalográficas mostraram que as trincas de fadiga têm início em intrusões e extrusões.
A figura 3.9 exibe esquematicamente o mecanismo do aparecimento dessa falhas em
bandas de deslizamento.
Pesquisadores propuseram um mecanismo para a formação de extrusão e intrusões que,
como pode ser visto na figura 3.9, depende da existência de deslizamento em dois sistemas de
deslizamento. Durante a atuação das componentes de tração do ciclo de tensões, os dois
sistemas operam em seqüência produzindo dois degraus na superfície ( fig. 3.9 b e 3.9 c ).

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Figura 3.9 - Mecanismo para a formação das intrusões e das extrusões.

Quando entra em ação a componente de compressão, o deslizamento do primeiro sistema


a operar dá origem à formação da intrusão ( fig. 3.9 d ), enquanto que uma extrusão é formada
quando o outro sistema de deslizamento opera ( fig.3.9 e ).
A figura 3.10 ilustra esquematicamente o conceito de Wood para a formação das intrusões
e das extrusões.

Figura 3.10 - Conceito de Wood. Microdeformação levando à formação da trinca de fadiga. (a)
Deformação estática; (b) deformação de fadiga originando um entalhe superficial ou seja, uma
intrusão ; (c) deformação de fadiga originando extrusão.

No estágio I a trinca se propaga inicialmente ao longo das bandas de deslizamento


persistentes. Num metal policristalino pode ocorrer poucos diâmetros de grãos antes que a trinca
mude para o estágio II. A taxa de propagação de trinca no estágio I é geralmente muito pequena,
da ordem de angstrons por ciclo (10-10m), comparada com as taxas de propagação do estágio II ,
da ordem de mícron por ciclo (10-6m). A superfície de fratura do estágio I se apresenta sem
propriedades características .
Por outro lado, a superfície do estágio II apresenta freqüentemente a formação de rugas ou
estrias de fratura por fadiga. Essas estrias de fadiga não podem ser vista a olho nú pois elas são
microscópicas. As figuras 3.11 e 3.12 exibem um conjunto de estrias. Torna-se importante
salientar que as estrias de fadiga não são visíveis a olho nu, elas são microscópicas.

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Figura 3.11- Estrias microscópicas de fadiga.

Figura 3.12- Foto (A): (a) uma descontinuidade que provocou duas frentes diferentes de
propagação de estrias de fadiga; (b)estrias microscópicas de fadiga.
Foto (B): (a) Porosidade; (b) inclusões; (c) diferentes frentes de propagação das estrias de fadiga.

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Cada estria representa a posição sucessiva de uma frente de trinca que avança num plano
normal ao da máxima tensão de tração. Cada estria é produzida por um único ciclo de tensões. A
presença dessas estrias define, sem dar margens a dúvidas, que a falha foi produzida por fadiga,
mas sua ausência não exclui a possibilidade da fratura ter ocorrida por fadiga. A não observação
das estrias na superfície de fratura por fadiga pode ser devido a um espaçamento muito pequeno
entre elas, que necessita de aumentos muito grandes, ao microscópio, por ductilidade na ponta da
trinca para produzir por deformação uma estria suficientemente grande para ser observada, ou
extinção das estrias por algum tipo de interferência na superfície de fratura tal como o
espelhamento das superfícies devido ao micromovimento relativo que acaba se instalando, entre
as duas superfícies. Uma vez que a propagação do estágio II não ocorre para a vida total em
fadiga, isto não significa que a contagem do número de estrias fornecerá a história completa dos
ciclos para a ruptura. O estágio II de propagação da trinca ocorre por um processo plástico que
torna a ponta da trinca rombuda, o que pode ser visto esquematicamente na figura 3.13.

Figura 3.13 - Esquematização do processo plástico de alargamento da ponta da trinca para o


estágio II de crescimento de trinca por fadiga.

No início do carregamento cíclico a ponta da trinca é aguda (fig. 3.13 a). À medida que o
esforço de tração é aplicado o pequeno entalhe duplo na ponta da trinca concentra o
deslizamento ao longo dos planos que fazem 45o com o plano que contém a trinca (fig. 3 .13 b) À
medida que a trinca se alarga para sua extensão máxima (fig. 3.13 c), ela caminha ainda mais por
cisalhamento plástico ou seja, ela cisalha uma região encruada, ao mesmo tempo que sua ponta
se torna rombuda. Quando a carga muda para compressão as direções de deslizamento na
extremidade são invertidas (fig. 3.13 d), as faces da trinca são compactadas e a nova superfície
da trinca, criada na tração, é forçada para o plano da trinca (fig. 3.13 e) onde é parcialmente
dobrada por flambagem formando uma ponta de trinca novamente aguda. Desta forma, a trinca
está pronta para avançar e se torna rombuda no próximo ciclo de tensões.
Finalmente, os quatro estágio da fadiga, podem ser resumidos da seguinte maneira:
1) Iniciação da trinca (nucleação/intrusão e extrusão): Esta geralmente se dá na
superfície (podendo também iniciar-se no interior, numa interface), em locais
concentradores de tensão tais como cantos vivos, marcas de punção, marcas
provocadas por solda a arco, rugosidade superficial e outros;

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2) Crescimento da trinca em planos preferenciais de deslizamento: (estágio I) Este
se dá em planos de máxima tensão cisalhante, numa taxa de propagação da ordem
de angstrons por ciclo. Tendo a dimensão da ordem de alguns diâmetros de grãos;
3) Crescimento da trinca nos planos de alta tensão de tração: (estágio II) Este se dá
num plano normal à direção de tração máxima, havendo um certo incremento de
avanço por ciclo, formando as estrias de fadiga;
4) Ruptura final estática: Ocorre quando a trinca atinge um tamanho tal, que a seção
transversal resistente não mais pode suportar a carga, devido ao aumento das
tensões envolvidas.

A figura 3.14 ilustra esquematicamente os estágios da fadiga dos metais.

Figura 3.14 - Ilustração esquemática dos três estágios da fadiga dos metais.

Finalizando, é preciso definir ainda marcas de praia e marcas de catraca.

1) Marcas de praia: são visíveis macroscopicamente, definem a direção de avanço da trinca


de fadiga e conforme o material e as condições gerais, são formadas por conjuntos de
milhares de estrias. A figura 3.15 ilustra muito bem as marcas de praia em virabrequim de
aço, rompido por fadiga.

2) Marcas de catraca: Todas as vezes que o carregamento em fadiga sofre algum tipo de
perturbação tal como variação do valor da tensão ou variação na frequência de solicitação,
podem aparecer as chamadas marcas de catraca que nada mais são do que uma mudança
de plano, no avanço da trinca de fadiga ou seja, aparecem “degraus” na superfície de
fratura. A figura 3.16 exibe uma região contendo marcas de catraca na superfície de um
aço rompido por fadiga.

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Figura 3.15 - Marcas de praia formadas por um conjunto de centenas ou milhares de estrias de
fadiga.

Figura 2.16- Marcas de catraca. Neste caso é interessante notar que houve fadiga por torção.

3.7. Efeito da concentração de tensão na fadiga

A presença de um concentrador de tensão no material, como um entalhe, uma porosidade,


algum tipo de descontinuidade, diminui seriamente a resistência à fadiga dos componentes
mecânicos. Uma vez que os elementos de máquina contêm invariavelmente concentradores de

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Curso de Análise de Falhas 27
tensões tais como rasgos de chaveta, filetes de roscas, furos e outros, não causa surpresa o fato
de que as trincas de fadiga em partes estruturais principiarem nestas irregularidades geométricas.
Uma das melhores maneiras de minimizar a falha por fadiga é pela redução deste tipo de
concentradores de tensões, evitáveis através de um projeto cuidadoso e pela prevenção de
concentradores de tensões acidentais provenientes do processo de fabricação e dos sistemas de
manutenção e prevenção que em muitos casos podem introduzir defeito superficiais tais como
marcas de punção, pit de arco elétrico acidental, superaquecimento local por exemplo, durante
esmerilhamento enfim, qualquer dano superficial acidental, pode transformar-se em um ponto de
origem de fratura por fadiga.

3.8. Efeito de tamanho do componente

A previsão do desempenho em fadiga de grandes componentes de máquinas, a partir dos


ensaios de laboratório de amostras pequenas, constitui um problema prático de grande
importância. A experiência tem mostrado que na maioria dos casos existe um efeito de tamanho,
isto é, a resistência à fadiga de componentes grandes é inferior à das amostras pequenas. A
tabela 3.1 apresenta valores da resistência à fadiga para um eixo em aço ao carbono, usinado de
uma mesma barra e variando-se diâmetros.

Tabela 3.1- Limite de fadiga de aço-carbono normalizado em flexão alternada

Porquê do efeito de tamanho?

Em primeiro lugar, aumentando, digamos, o diâmetro de um eixo, aumenta a quantidade de


área superficial do componente o que é de grande importância visto que as falhas por fadiga
geralmente se iniciam na superfície ou seja: aumentando-se o volume superficial, aumenta-se a
probabilidade de se ter, por exemplo, concentradores de tensão, tais como imperfeições e
irregularidades superficiais. Em segundo lugar, para componentes mecânicos, um aumento de
diâmetro geralmente reduz o gradiente de tensão através do diâmetro e aumenta o volume de
material que está altamente tensionado.

3.9. Efeito de superfície na vida em fadiga

Conforme já foi visto, praticamente todas as falhas por fadiga se iniciam a partir da
superfície do componente. Para muito tipos comuns de carregamento, como flexão e torção, a
tensão máxima ocorre na superfície, o que torna lógico que o início da trinca lá se verifique.
Contudo, no carregamento axial, a falha por fadiga quase sempre começa na superfície. A grosso
modo, os fatores que afetam a superfície de um componente quanto à fadiga, podem ser
classificados em três categorias:

1) Rugosidade superficial ou concentradores de tensão na superfície;


2) Variações na resistência à fadiga do metal, na superfície;
3) Variações nas condições de tensão residual da superfície.
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Curso de Análise de Falhas 28

Além disso, a superfície está sujeita à oxidação e à corrosão, além de outros tipos de
ataque.

Rugosidade da superfície

Os diferentes acabamentos superficiais produzidos pelos vários processos de usinagem


empregados, podem afetar apreciavelmente o desempenho em fadiga. Os componentes
fabricados dentro de limites de acabamento superficial apertados, ou seja, com bom acabamento
superficial, tendem a ter um limite de resistência à fadiga em mais alto nível. Poderia-se dizer que
pequenos riscos na superfície dos componentes agem como pequenos e até micro
concentradores de tensão. A figura 3.17 mostra a influência, para o aço, de vários acabamentos
superficiais, na redução do limite de resistência à fadiga, em laboratório. Observa-se que o
acabamento da superfície é caracterizado pelo processo utilizado para formá-la. Pode também
ser observada a grande sensibilidade às condições superficiais apresentadas pelos aço de alta
resistência.

Figura 3.17 - Fator de redução para o limite de fadiga do aço devido a vários tratamentos e vários
acabamentos superficiais.

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Curso de Análise de Falhas 29

Figura 3.18 - Fratura por fadiga à torção. Nota-se que a origem (o) dessa falha deu-se na
superfície e num local de concentração de tensão. Em (A), tem-se a região de propagação inicial
e em (B), a de propagação final da ruptura.

Figura 3.19 - Região da origem da fratura. provavelmente num concentrador de tensão, devido ao
acabamento superficial insatisfatório. Em (A) tem-se o início da fratura final, de modo bastante
dúctil, devido à grande deformação plástica que pode ser verificada em (B). Em (C) verificam-se
dois caminhos percorridos pela fratura

Variações nas propriedades da superfície

Uma vez que a falha por fadiga é tão dependente das condições superficiais, Qualquer
coisa que mude a resistência à fadiga da superfície do material irá alterar muito as suas
propriedades de fadiga. Por exemplo, a descarbonetação superficial é bastante deletéria ao

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desempenho em fadiga. As propriedades de fadiga de componentes em aço podem ser
consideravelmente melhoradas a partir do endurecimento superficial que pode ser obtido através
da cementação, nitretação ou até pela carbonitretação. No entanto, uma vez que estes processos
introduzem na superfície tensões residuais compressivas favoráveis, não se pode considerar que
as propriedades de fadiga sejam melhoradas exclusivamente pela formação, na superfície, de um
material de maior resistência. A eficiência do endurecimento superficial através destes processos
termoquímicos, na melhoria do desempenho em fadiga de um material, é maior nos casos em que
existe um grande gradiente de tensão, como na torção e na flexão do que na solicitação axial. O
fato da trinca de fadiga ter início na interface das camadas mole e dura, em vez de na superfície,
constitui uma característica geral do seu comportamento em fadiga.
A eletrodeposição na superfície dos aços geralmente diminui seu limite de fadiga. A
deposição de cromo é particularmente difícil de ser realizada sem causar piora das propriedades
de fadiga. As condições do processo de deposição da camada aletrodepositada podem ter grande
influência nas propriedades de fadiga, porque podem produzir grandes variações nas tensões
residuais, adesão, porosidade e dureza da cobertura.

Tensão residual na superfície

Sem duvida, o método de se melhorar as propriedades em fadiga de componentes


mecânicos consiste na formação de um espectro favorável de tensão residual compressiva. As
tensões residuais podem ser consideradas como tensões aprisionadas, que estão presentes
numa parte não submetida a uma força externa. Em nosso estudo, serão consideradas apenas as
macrotensões, as quais atuam sobre regiões que são grandes quando comparadas com o
tamanho de grão. Elas podem ser medidas por meio de raio X ou pelo registro de variações
dimensionais que ocorrem quando uma camada muito fina de material é removida da superfície.
As tensões residuais aparecem quando a deformação plástica através da seção transversal total
da parte deformada é não uniforme. Consideremos um componente mecânico metálico submetido
a flexão no qual a superfície foi deformada em tração, de modo que parte dela tenha sido
deformada plasticamente. Quando a força externa é retirada, as regiões que foram deformadas
plasticamente impedem as regiões elásticas adjacentes de experimentarem uma recuperação
elástica completa para a condição de não-deformadas.
Desta forma, as regiões deformadas elasticamente são deixadas em tração residual e as
regiões que foram deformadas plasticamente devem estar num estado de compressão residual, a
fim de promover um balanço de tensões ao longo da seção transversal do componente em
questão. De uma maneira geral, para o caso em que parte da seção transversal é deformada
plasticamente, enquanto que o resto sofre deformação elástica, a região que foi deformada
plasticamente em tração apresentará após o descarregamento, um estado de tensão residual
compressivo, enquanto que a região que foi deformada plasticamente em compressão
apresentará um estado de tensão residual de tração quando a força externa for retirada. O valor
máximo de tensão residual que pode ser produzido é igual ao limite elástico do metal.
As tensões residuais podem, para vários objetivos, ser consideradas idênticas às tensões
produzidas por uma força externa. Então, a adição de uma tensão residual compressiva, que
existe num ponto da superfície, a uma tensão de tração externamente aplicada sobre esta
superfície, diminui a probabilidade de ocorrer falha por fadiga neste ponto. A fig.3.20(a) mostra a
distribuição de tensão elástica em uma viga na presença de tensões residuais. A fig.3.20(b)
apresenta uma distribuição típica de tensão residual, tal como seria produzida por jateamento. É
interessante observar que elevadas tensões residuais compressivas na superfície devem ser
equilibradas por tensões residuais trativas no interior da seção transversal. Na fig.3.20(c) é
mostrada a distribuição de tensões devido à soma algébrica das tensões de flexão externas e das
tensões residuais. Pode-se notar que a tensão trativa máxima na superfície é reduzida de uma
quantidade igual à tensão residual compressiva que atua nesta superfície.

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Figura 3.20 - Superposição das tensões aplicada e residual.

3.10. Fadiga Por Corrosão

A ação simultânea de tensões cíclicas e ataque químico é conhecida como fadiga por
corrosão. 0 ataque corrosivo sem tensão superimposta produz, muitas vezes, o aparecimento de
pites nas superfícies dos metais. Os pites atuam como entalhes e causam a redução da
resistência à fadiga. No entanto quando o ataque corrosivo ocorre simultaneamente com o
carregamento em fadiga, há uma redução muito superior das propriedades do material, redução
esta que é maior do que a produzida pela corrosão prévia da superfície. Quando corrosão e
fadiga atuam simultaneamente, o ataque químico acelera muito a taxa de propagação das trincas
de fadiga. Os materiais que apresentam um limite de fadiga definido quando ensaiados ao ar na
temperatura ambiente não apresentam indicação do limite de fadiga quando o ensaio é realizado
em meio corrosivo. Uma vez que o ataque corrosivo é um fenômeno que depende do tempo,
quanto mais rápido for o ensaio menor será o dano devido à corrosão. Os ensaios de fadiga por
corrosão podem ser realizados de duas maneiras. O método usual consiste em submeter o corpo
de prova, continuamente, às influências combinadas de corrosão e tensão cíclica, até que ocorra
ruptura. No ensaio de duplo-estágio, o ensaio de fadiga é interrompido após um determinado
período e o dano introduzido é avaliado através da determinação da vida restante, ao ar. Este
último tipo de ensaio ajudou a determinar o mecanismo de fadiga por corrosão.' A ação da carga
cíclica causa uma destruição localizada da proteção superficial (quer seja através de
endurecimento superficial, eletrodeposição, tintas de proteção superficial e outros), permitindo que
possam ser produzidos pites. É muito maior o número de pites produzidos na fadiga por corrosão
do que num ataque corrosivo sem a ação de tensões. Outro efeito da tensão cíclica é remover ou
desalojar quaisquer produtos de corrosão que possam de alguma maneira impedir o avanço da
corrosão. Os fundos dos pites são mais anódicos do que o resto do metal e, desta forma, a
corrosão prossegue para o interior, ajudada pela destruição do filme de óxido decorrente da
deformação cíclica. Quando o pite se torna pontiagudo o bastante para produzir uma grande
concentração de tensões, a trinca é nucleada.

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Curso de Análise de Falhas 32
Existem evidências indicando que mesmo os ensaios de fadiga realizados ao ar na
temperatura ambiente são influenciados pela fadiga por corrosão. Ensaios de fadiga em cobre
mostraram que a resistência à fadiga em vácuo parcial era superior à resistência na atmosfera.
Ensaios realizados separadamente em oxigênio e vapor d'água mostraram pouca redução da
resistência em fadiga quando comparada àquela obtida no vácuo. Concluiu-se que o vapor d'água
age como catalisador para reduzir a resistência à fadiga ao ar, indicando que a umidade relativa
pode ser uma variável a considerar no ensaio de fadiga.
Um trabalho subseqüente realizado em cobre mostrou que a vida em fadiga era muito mais
longa em atmosfera de oxigênio puro (sem nitrogênio) do que no ar. A observação metalográfica
mostrou que o desenvolvimento de bandas de deslizamento persistentes era desacelerado
quando os ensaios eram realizados em nitrogênio.
Existem vários métodos disponíveis para minimizar o dano causado pela fadiga por
corrosão. De uma maneira geral, a escolha de um material para este tipo de serviço deve ser
baseada nas suas propriedades de resistência à corrosão, em vez das propriedades de fadiga
convencionais. Desta maneira, o aço inoxidável, bronze ou cobre-berílio prestariam,
provavelmente, melhor serviço do que o aço tratado termicamente. A proteção do metal contra o
contato com o meio agressivo pode ser feita com sucesso através de cobertura metálica ou não-
metálica, desde que esta não se rompa como conseqüência da deformação cíclica. As coberturas
de zinco e cádmio no aço e coberturas de alumínio em ligas de alumínio Alclad podem obter
sucesso em muitas aplicações de fadiga por corrosão, apesar destas coberturas poderem causar
redução na resistência à fadiga quando os ensaios são conduzidos ao ar. A formação de tensões
residuais compressivas na superfície tende a impedir que os entalhes superficiais se abram dando
acesso ao meio corrosivo. A nitretação é particularmente efetiva no combate à fadiga por
corrosão, e o jateamento de areia, esferas de vidro ou granalha de ferro, tem sido utilizado com
êxito sob determinadas condições. Em sistemas fechados, é possível reduzir o ataque corrosivo
com a adição de um inibidor de corrosão. Finalmente, a eliminação de concentradores de tensão,
através de projetos cuidadosos, é muito importante quando a fadiga por corrosão deve ser
considerada. A figura 3.21 exibe um caso típico do aparecimento de pites de corrosão.

Figura 3.21 - Pites de corrosão.

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Curso de Análise de Falhas 33
Fricção (Fretting)

Quando duas superfícies em contato experimentam periodicamente um pequeno


movimento relativo, tem origem um defeito superficial denominado dano por fricção. Este
fenômeno está mais relacionado ao desgaste do que à fadiga por corrosão. No entanto, ele difere
do desgaste pelo fato de que a velocidade relativa das duas superfícies é muito inferior à que
normalmente se encontra no desgaste e também porque, como as duas superfícies nunca
perdem o contato, não há possibilidade dos produtos de corrosão serem removidos. O dano por
fricção é muito encontrado na superfície de um eixo com um mancal ou com um cubo de roda
montado sob pressão.
Não existem métodos de prevenção contra o dano por fricção que sejam completamente
satisfatórios. No entanto, ele não ocorrerá se o movimento relativo puder ser eliminado. Caso
esse movimento relativo não possa ser eliminado, então a redução do coeficiente de atrito entre
as partes acopladas poderá ser benéfica. Uma vez que o problema principal consiste em manter
um filme lubrificante por um longo período de tempo. Os lubrificantes sólidos como o bissulfeto de
molibdênio são os que alcançam o maior sucesso.

Figura 3.22 - Descascamento provocado por fricção entre as esferas e a pista de um rolamento.

4. ANÁLISE DE FALHAS EM COMPONENTES MECÂNICOS

A seguir, será apresentada uma série de figuras a partir das quais são realizadas análises
de falhas. Iniciaremos com uma inspeção visual de falhas em mancais de deslizamento.

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Figura 4.1 - Formação de canais caracterizados como sendo “marcas de rio” provocada pelo
efeito hidráulico da pressão do óleo Esse fato se dá devido a uma elevada concentração de
material deslocado, impedindo a passagem de lubrificante. Neste caso, dependendo das
condições gerais do mancal, este poderá ser reutilizado.

Figura 4.2 - (A) Ponto de desgaste anormal com bronze exposto, devido a um pedaço de metal
entre o mancal e o envólucro; (B) Dorso do mancal de deslizamento de um virabrequin de
locomotiva. (a)Pedaço de metal estranho; (b)fricção; (c)erosão, provavelmente iniciada por
fricção.

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Figura 4.3 - Arrancamento de metal patente. Trata-se de um defeito de aderência da camada de


metal patente ao metal de base, geralmente bronze. Este tipo de falha ocorre principalmente
devido ao superaquecimento localizado devido a falhas de lubrificação, com conseqüente
agarramento do metal patente ao munhão. Neste caso recomenda-se a troca de todos os mancais
inferiores.

Figura 4.4 - Fadiga por corrosão sob tensão.

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Figura 4.5 - Superfície típica de falha por fratura. É interessante notar que essa fratura iniciou-se
num rasgo de chaveta que provocou um importante concentrador de tensão.

Figura 4.6 - Fratura típica em um componente em aço forjado. Nota-se que o direcionamento das
fibras (figura B) serviram como caminho para a propagação da fratura. É interessante notar que a
trinca iniciou-se numa “quina” ou seja numa região de concentração de tensão.

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Figura 4.7 - Fratura de um componente forjado em alumínio de alta resistência. Novamente pode-
se observar que a falha se deu numa região de concentração de tensão.

Figura 4.8 - Componente fabricado em aço ABNT 1045. Observa-se em (a) que houve forte
deformação plástica na região da rosca e fratura completa numa região de mudança de diâmetro.
Já em (b) observa-se que a fratura avançou em duas frente de propagação.

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Figura 4.9 - Componente em aço forjado, para trabalho em elevadas temperaturas. Em (b)
verifica-se que a fratura foi intergranular e em (c) é evidenciada uma forte descarbonetação nos
contornos de grão. Em (d) tem-se o surgimento de trincas superficiais, a partir das quais ocorreu a
fratura completa do componente.

5. RESISTÊNCIA DOS AÇOS AO DESGASTE

Além do desgaste em buchas, mancais e bronzinas, temos também o desgaste das partes
em movimento, como em eixos, válvulas e árvores, que constituem um grande número de
equipamentos utilizados na engenharia e na Indústria. Podemos considerar três tipos de
desgaste:
1) Desgaste de metal contra líquidos ou vapores (erosivo);
2) Desgaste de metal contra partículas abrasivas;
3) Desgaste de metal contra metal.
Esses tipos de desgastes ocorrem através de dois mecanismos. "Abrasivo" ou por
"Aderência".

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Figura 4.10 - Pitting em dente de engrenagem. Provavelmente esse defeito iniciou-se devido à
fadiga por contato a partir de um defeito interno ou a partir de um ponto de corrosão intergranular.

Desgaste abrasivo: neste caso temos dois mecanismos de desgaste. O primeiro, envolve duas
superfícies. Uma superfície dura e áspera, deslizando sobre outra de menor dureza, provocando,
nesta última, um arrancamento de partículas. O segundo, envolve partículas duras de impurezas
ou as próprias partículas desprendidas, do caso anterior.

Figura 5.1 - Ilustração esquemática do desgaste abrasivo.

Desgaste por aderência: Neste caso, duas superfícies em contato e pressionadas, geram micro-
regiões de fusão, o que resulta em micro-soldas, que são arrancadas devido ao movimento
relativo, entre as superfícies. As partículas arrancadas, por sua vez, podem causar um desgaste
abrasivo.

Figura 5.2 - Ilustração do desgaste por aderência.

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Meios de Melhorar a Resistência ao Desgaste de Peças em Movimento.

A resistência ao desgaste dos metais, além da lubrificação, depende principalmente dos


seguintes fatores:
Acabamento superficial que quanto melhor, minimiza o arrancamento de partículas das
superfícies em contato que, pela energia produzida, proporciona uma elevação na temperatura;
dureza que na superfície deve ser elevada para dificultar a penetração inicial; resistência
mecânica e tenacidade que dificultam o arrancamento de partículas metálicas.
Existe um outro fator muito importante e que freqüentemente não é levado em conta, trata-
se da microestrutura dos metais. Quando temos um metal apresentando um sistema de duas
fases, a presença de partículas relativamente grandes de um constituinte de baixa dureza e,
portanto, vulnerável ao desgaste, numa matriz dura, prejudica a sua resistência ao desgaste,
ainda que o conjunto tenha elevada dureza.
Por outro lado, se a estrutura do metal apresentar partículas duras, carbonetos geralmente,
numa matriz mais mole, esta possuirá maior resistência ao desgaste, sobretudo se essas
partículas não forem excessivamente frágeis e quebradiças e, quando forem de pequenas
dimensões e distribuídas na matriz de forma uniforme. Foi inclusive este fato que inspirou Isaac
Babbit na obtenção do metal patente (89% estanho 9% antimônio e 2% cobre, em 1839).
Nos aços, alta dureza estrutura adequada e elevados valores de resistência e tenacidade,
são conseguidos através dos seguintes artifícios:
1) Encruamento, ou seja, deformação a frio;
2) composição química de elementos de liga;
3) tratamentos térmicos ou termo-químicos adequados.
Assim sendo, o aumento da resistência ao desgaste dos metais, pode ser obtida mediante
os seguintes meios:
- Trabalho mecânico ou encruamento proporcionados por laminação, estiramento e
forjamento; ou pela aplicação do processo de jateamento nas superfícies das peças (esse último,
como foi visto, melhora a resistência à fadiga);
- Tratamentos térmicos de têmpera ou têmpera superficial;
- Tratamentos termo-quimicos de endurecimento superficial (cementação, nitretação e
cianetação, além da carbonitretação)
- Revestimentos superficiais pela eletrodeposição, metalização, aplicação de "cromo duro".

Aços Resistentes ao Desgaste

Os aços carbono comerciais resistentes ao desgaste, mais comumente utilizados, são os


aços ligados ao Manganês ou ao Cromo.

Aços Manganês Austeníticos

A melhor maneira de se elevar a dureza superficial desses aços e, consequentemente a


sua resistência ao desgaste, é pelo encruamento. A austenita retida é pouco estável e, pelo
encruamento, pode se transformar em martensita. Esses aços são os chamados “aços-
manganês”, ou aços “hadfield”.
Esse tipo de aço é caracterizado por elevados teores de carbono e de manganês, alta,
resistência mecânica, alta ductilidade, além de excelente resistência ao desgaste.
Além da presença do manganês, temos outros constituintes que são: silício como
desoxidante, enxofre, fósforo e outros elementos, como níquel, molibdênio, cromo, cobre e
vanádio.

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Tratamento Térmico dos Aços - Manganês Austenítico

Normalmente, as propriedades mecânicas normais dos aços-manganês austenítico são


obtidas com um tratamento de austenitização a temperaturas elevadas (de 1000 a 1050 oC), para
assegurar a completa dissolução dos carbonetos, com um tempo de permanência que pode variar
de 20 a 40 minutos, por polegada de espessura. Em seguida, resfriar em água.

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6. BIBLIOGRAFIA BÁSICA

[1]Commitee on Analysis of Fracture,” Failure Analysis and Prevention”,Metals Handbook of


American Society for Metals - 8Th. Edition, Metals Park, USA, 1986.
[2]Commitee on Analysis of Fracture,”Fractography and Atlas of Fractograph”, Metals
Handbook of American Society for Metals -8Th. Edition, Metals Park, USA, 1986.
[3] Juvinal, Robert C., Marshek, Kurt M.,” Fundamentals of Machine Component Design “;
Ed. John Whiley & Sons, New York 1991.
[4] Shigley, Joseph E.; “Elementos de Máquinas “; Ed. Livros Técnicos e Cientificos S.A;
Rio de Janeiro, 1986.
[5]Dieter, George E., “Mechanical Metallurgy “; Mc. Graw-hill, mc, USA, 1991.
[6] Russel, J.B.,”General Chemistry Mc. Graw-hill, Inc, USA, 1980.

7. BIOGRAFIA DO MINISTRANTE
Professor DANIEL YVAN MARTIN DELFORGE
Engenheiro Mecânico pela Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira/UNESP – 1984
Mestre em Engenharia Mecânica pela Faculdade de Engenharia Mecânica/UNICAMP,1994
Doutorando em Engenharia Mecânica pela Faculdade de Engenharia Mecânica/UNICAMP

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