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Apocalipse 4

a. Deus em seu trono (4.1-11)


A cena da sala do trono é um caleidoscópio de imagens do AT, em que nenhuma delas
predomina. Talvez a imagem mais aludida seja a de Ezequiel 1.4-28: a visão do trono "em
um vento tempestuoso". Porém, paralelos importantes são encontrados também na sala
do trono de Isaías 6.1-4 e na cena do trono de Daniel 7.9,10. Além disso, há uma imagem
da criação oriunda de Ezequiel 1 e talvez de Gênesis 1, uma conexão com o templo (a
arca em forma de trono, o "mar" de bronze, a liturgia e o incenso) e um paralelo com a
corte imperial. Este capítulo tem ecos frequentes no restante do livro. O trono de Deus
predomina em todo o livro. Os anciãos funcionam como intérpretes das visões em 5.5 e

7.13-17, e cantam hinos a Deus em 4.10,11; 5.8-10; 11.16-18; e 19.4.

Um dos quatro seres viventes inicia o relato dos selos (6.1) e outro dá as sete taças da ira
aos anjos, para que as derramem sobre a terra (15.7). Em resumo, a sala do trono do
capítulo 4 está no centro das imagens do livro.

A segunda visão é semelhante a primeira, mas com uma diferença importante: em


1.10-11 João estava em Patmos, enquanto aqui ele é levado para o próprio céu.

A Bíblia frequentemente descreve Deus como luz (SI 18.12; 104.2;1Tm 6.16; 1Jo 1.5,7) e
três pedras translúcidas são usadas aqui para retratá-lo. Em primeiro lugar, ele é
semelhante a uma pedra de jaspe). O jaspe é uma joia opaca, geralmente de cor
avermelhada, mas, às vezes, verde, marrom, azul, amarela ou branca. Com base em
Apocalipse 21.11 ("como uma pedra preciosa, como se fosse jaspe cristalino"), ela talvez
seja uma opala ou um diamante e ela é, uma pedra que sumariza as outras joias do livro,
visto que também compõe o muro da cidade de Deus (21.18) e encabeça a lista das doze
pedras de fundação em 21.19,20, sendo especialmente associada à glória de Deus
(21.11).

Em segundo lugar, ele é descrito como (sardio, sárdio), uma pedra de cor vermelha
flamejante, muito popular no mundo antigo e possivelmente a origem do nome
"semelhante a uma esmeralda). O "arco-íris" (ipis) é um termo raro, usado somente aqui e
em 10.1 na Bíblia grega, e pode significar tanto arco-íris quanto auréola. Quase todos os
estudiosos concordam que arco-íris é o sentido pretendido aqui, porém ele tem uma
forma incomum, pois está "ao redor do trono". pois este arco-íris tem a forma de um halo
de luz circundando o trono.

A imagem combina a tipificação do arco-íris como a luz radiante ao redor de Deus, em


Ezequiel 1.28, com a aliança dele com Noé, em Gênesis 9.13-17 A promessa de nunca
mais destruir a terra com água prepara o leitor para o tema do juízo no restante do livro
(observe-se a imagem do dilúvio de Ap 11.18).

Os vinte e quatro anciãos


Os tronos e as coroas de ouro poderiam ser uma referência à função régia deles abaixo
de Deus, da mesma forma que os reis no primeiro século estavam sujeitos ao
imperador romano.

Seu papel principal é de adoração (5.14; 11.16; 19.4) e de louvor

(4.11;5.9,10; 11.17,18; 14.3; 19.4). Eles também servem como intermediários e


intérpretes (5.5;7.13-17). Um exame profundo desses textos mostra uma diferenciação
evidente entre os anciãos e os santos. Em 5.8, os anciãos seguram as taças de ouro
que contêm as orações dos santos; em 7.13,14, um deles explica quem são os santos
vitoriosos; em 11.18, eles dão graças a Deus por recompensar os santos; em 14.3, os
144 mil cantam " um cântico novo, diante do trono e diante dos quatro seres viventes e
dos anciãos"; e, em 19.4, eles se unem ao coro celestial.

Os anciãos estão assentados em tronos (4.4; 11.16), enquanto os santos estão em pé


diante do trono (7.9). A partir dessas evidências, o mais provável é que eles sejam seres
celestiais que reinam com Deus e que sejam parte da comitiva que cerca o trono. Além
disso, visto que "todos os anjos" também estão diante do trono (7.11), os anciãos
devem ser seres celestiais com funções de governança.

Como no caso dos seres viventes (v. 8), não sabemos que tipo de seres celestiais eles
são, apenas que fazem parte da assembleia celestial. Suas "vestes brancas" significam
pureza e santidade (talvez parte de sua função sacerdotal de apresentar as orações dos
santos e de sua liderança na adoração) e as "coroas

"de ouro" indicam posição de nobreza.

O número "vinte e quatro" poderia ser uma referência às ordens sacerdotais, caso essa
função esteja sendo destacada aqui, ou aos patriarcas e apóstolos, caso sejam a
contraparte da igreja na terra.

O papel sacerdotal se harmonizaria bem com a posição de líderes na adoração celestial


e daqueles que apresentam as orações dos santos a Deus (5.8; 8.3,4). vê uma ligação
entre os seres angelicais e os santos, no sentido de que eles simbolizam as doze tribos
e os doze apóstolos, ou seja, os redimidos de ambos os testamentos. Os anciãos são
uma classe de seres celestiais de posição de governança, que rodeiam o trono e
lideram o louvor celestial, mostrando assim uma função sacerdotal.

Quatro seres viventes


Esses seres celestiais são cheios de olhos, na frente e atrás). Essa figura é retirada de
Ezequiel 1.18, em que os aros das rodas do trono-carruagem estavam "cheios de olhos
ao redor". As rodas não são parte da visão aqui, mas o significado de "olhos, na frente
e atrás" é semelhante. Eles indicam vigilância incessante. Como são, em certo sentido,
os "olhos" de Deus, eles podem ser também uma extensão da onisciência dele,
enquanto observam

cuidadosamente sua criação. Nada pode escapar da supervisão que esses seres

realizam dos negócios divinos.

O ponto essencial para a compreensão delas é sua relação com o leão, o touro, o
homem e a águia. João nos diz que eles são "semelhantes a" ou que se parecem com
essas quatro criaturas. Em relação à sua "aparência", eles tinham as formas
mencionadas.

As quatro são desenvolvidas com base em Ezequiel 1.5,6,10,11a, em que a ordem

difere (homem, leão, touro, águia), mas o sentido é semelhante.

Com base em Ezequiel, é possível supor que a "aparência" esteja relacionada apenas
com o rosto, porém, isso é improvável, visto que somente o terceiro ser é descrito com
um "rosto de".

Os pais da igreja viam esses seres como representantes

dos quatro Evangelhos, mas houve pouca unanimidade sobre isso.

Em resumo, tudo que podemos saber, com certeza, é que eles representam as ordens
mais elevadas de seres celestiais, talvez anjos,» e dirigem a adoração e o juízo.

Desenvolvidos com base nos querubins e serafins de Ezequiel e Isaías, eles vão além
dessas figuras na sua participação na justiça divina. Uma vez mais, vemos que a sala
do trono desse capítulo, focalizada na adoração e na glória, prepara o leitor para o tema
do juízo no restante do livro.

Embora esses quatro seres transcendam a natureza, em certo sentido, como seres
celestiais (cf. 5.13), eles também representam a totalidade da ordem criada quando
estão diante de Deus.

A parte final de sua descrição, em 4.8, é composta por outros dois detalhes: suas seis
asas e seus "olhos em volta". Como já afirmado, João extrai a imagem das "seis asas"
de Isaías 6.2. No relato de Isaías, duas asas cobriam suas faces, duas, os seus pés e
duas eram usadas para voar. E se os olhos representam vigilância, as asas podem
representar velocidade.

Os "olhos em volta e por baixo" acrescentam mais detalhes à imagem de 4.6, "olhos,
na frente e atrás", que é resumida, aqui, por "em volta" (4.6 foi desenvolvido a partir de
Ez 1.18, em que os aros das rodas tinham "olhos ao redor"). O quadro dos olhos " em
volta e por baixo".

O que eles "diziam sem cessar" é o primeiro dos muitos hinos de adoração do livro. Os
hinos são estrategicamente distribuídos por todo o livro de Apocalipse para chamar a
atenção para dois pontos: a majestade e a soberania de Deus, e a adoração por parte
de seu povo, tanto no céu quanto na terra. A ênfase está no Deus que liberta e vindica
seu povo, bem como julga aqueles que praticam o mal. O louvor é a resposta adequada
dos que são objeto do seu amor onipotente. Os hinos desses dois capítulos (4.8,11;
5.9,10,12,13) expressam a unidade do Pai e do Filho. Os dois primeiros se relacionam
com Deus, os outros dois, com o Cordeiro, e o hino final se dirige a ambos. Ademais, o
coral se torna cada vez maior, começando com os quatro seres viventes e concluindo
com "todas as criaturas que estão no céu, [e] na terra" (5.13).

Nesse cântico, os quatro seres viventes lideram a adoração litúrgica (como também em
5.8,9,14) e celebram três atributos divinos: sua santidade, sua onipotência e sua
eternidade.

Resumo
Este capítulo é certamente uma das passagens mais esplêndidas da Bíblia,
desenvolvido com base nas cenas da sala do trono exaltado de Isaías 6 e de Ezequiel
1. De início, devemos observar que não há uma descrição literal de Deus, como de fato
não existe nenhuma em toda a Bíblia. Como diz João: "Ninguém jamais viu a Deus"

(1.18).

Entretanto, a apresentação de Deus em Apocalipse 4 é majestoso e lança o


fundamento de nossa adoração. Este capítulo tem três propósitos principais:

(1) Fundamentar a nossa própria adoração litúrgica com base na adoração que
oferecem os seres celestiais na sala do trono;

(2) Contrastar a grandeza de Deus com a "glória" terrena de César e de todos os


governantes terrenos;

(3) Mostrar que o juízo de Deus (cap. 6-20) está fundamentado em sua santidade e em
sua obra redentora (cap. 4-5).

Deus é o Criador de todas as coisas e, como tal, é soberano sobre tudo. Sempre que as
pessoas escolhem adorar a criatura (como no culto ao imperador) em lugar do

Criador, elas blasfemam e, por isso, receberão o juízo divino.

Cada um desses temas é relevante para a igreja de hoje e precisa ser entendido mais
claramente pelos cristãos. A confissão de Westminster diz que a humanidade foi criada
para "glorificar a Deus e desfrutá-lo eternamente", e a adoração de nossos dias precisa
retornar ao modelo encontrado no NT, que a vê como um estilo de vida diário, não
apenas como parte do momento de culto na igreja.
Além disso, embora não tenhamos o "culto ao imperador" atualmente, enfrentamos
algo bem mais sutil e tão insidioso quanto o perigo anterior, que podemos chamar de
"culto da personalidade".

Muitos cristãos, às vezes, têm um "deus na prateleira", geralmente um líder religioso.


Qualquer pessoa ou coisa que receba maior importância do que Deus em nossa vida
resulta em uma adoração idólatra. Deus deve ser tudo e estar em tudo na nossa vida.

Há um grande número de artigos e livros que tratam da crise na adoração da igreja de


hoje.

Os cultos geralmente concentram o foco na vida horizontal dos cristãos com tanta
intensidade, que a experiência de admiração na adoração a Deus, a sensação de que
estamos na presença dele, é quase sempre perdida.

A igreja como o trono de Deus e o ministro como mediador da presença divina (da
mesma maneira que os seres viventes e os anciãos o fazem neste capítulo) são um
antídoto a essa falta de adoração verdadeira. Os cristãos necessitam experimentar
Deus em seu esplendor glorioso, e poucas passagens bíblicas são mais importantes do
que esta para promover tal experiência na igreja de Cristo.

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